Language of document : ECLI:EU:T:2010:68

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Oitava Secção)

4 de Março de 2010 (*)

«Dumping – Importações de calçado com a parte superior de couro originário da China e do Vietname – Estatuto de empresa que opera em economia de mercado – Tratamento individual – Amostragem – Direitos de defesa – Igualdade de tratamento – Prejuízo – Confiança legítima – Dever de fundamentação»

Nos processos apensos T‑407/06 e T‑408/06,

Zhejiang Aokang Shoes Co., Ltd, com sede em Yongjia (China),

recorrente no processo T‑407/06,

Wenzhou Taima Shoes Co., Ltd, com sede em Wenzhou (China),

recorrente no processo T‑408/06,

representadas por I. MacVay, solicitor, R. Thompson, QC, e K. Beal, barrister,

contra

Conselho da União Europeia, representado por J.‑P. Hix, na qualidade de agente, assistido por G. Berrisch, advogado,

recorrido,

apoiado pela

Comissão das Comunidades Europeias, representada por H. van Vliet e T. Scharf, na qualidade de agentes,

pela

Confédération européenne de l’industrie de la chaussure (CEC), com sede em Bruxelas (Bélgica), representada inicialmente por P. Vlaemminck, G. Zonnekeyn e S. Verhulst e, mais tarde, por P. Vlaemminck e A. Hubert, advogados,

e pela

BA.LA. di Lanciotti Vittorio & C. Sas, com sede em Monte Urano (Itália), e dezasseis intervenientes cujos nomes figuram em anexo representadas por G. Celona, P. Tabellini e C. Cavaliere, advogados,

intervenientes,

que têm por objecto os pedidos de anulação parcial do Regulamento (CE) n.° 1472/2006 do Conselho, de 5 de Outubro de 2006, que institui um direito antidumping definitivo e estabelece a cobrança definitiva do direito provisório instituído sobre as importações de determinado tipo de calçado com a parte superior de couro natural originário da República Popular da China e do Vietname (JO L 275, p. 1), na medida em que diz respeito às recorrentes,

O TRIBUNAL GERAL DA UNIÃO EUROPEIA (Oitava Secção),

composto por: M. E. Martins Ribeiro, presidente, S. Papasavvas (relator) e A. Dittrich, juízes,

secretário: C. Kantza, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 11 de Fevereiro de 2009,

profere o presente

Acórdão

 Quadro jurídico

1        O artigo 1.°, n.os 1 e 2, do Regulamento (CE) n.° 384/96 do Conselho, de 22 de Dezembro de 1995, relativo à defesa contra as importações objecto de dumping de países não membros da Comunidade Europeia (JO 1996, L 56, p. 1), conforme alterado (a seguir «regulamento de base») dispõe:

«1.      Qualquer produto objecto de dumping pode ser sujeito a um direito antidumping sempre que a sua introdução em livre prática na Comunidade causar prejuízo.

2.      Um produto é objecto de dumping se o seu preço de exportação para a Comunidade for inferior ao preço comparável de um produto similar, no decurso de operações comerciais normais, estabelecido para o país de exportação.»

2        Nos termos do artigo 2.°, n.° 1, primeiro parágrafo, do regulamento de base, «[o] valor normal baseia‑se habitualmente nos preços pagos ou a pagar, no decurso de operações comerciais normais, por clientes independentes no país de exportação».

3        Quanto às condições de concessão do estatuto de empresa que opera nas condições de uma economia de mercado, o artigo 2.°, n.° 7, alínea b), do regulamento de base prevê:

«Nos inquéritos antidumping relativos a importações originárias […] da República Popular da China, […] o valor normal será determinado de acordo com o disposto nos n.os 1 a 6, caso se prove, com base em pedidos devidamente fundamentados, apresentados por um ou mais produtores objecto de inquérito […], a prevalência de condições de economia de mercado para esse produtor ou produtores no que se refere ao fabrico e à venda do produto similar em causa. Se não for este o caso, aplicar‑se‑ão as regras definidas na alínea a).»

4        Nos termos do artigo 9.°, n.° 6, do regulamento de base:

«6.      Quando a Comissão tiver limitado o seu exame nos termos do artigo 17.°, qualquer direito antidumping aplicado a importações de exportadores ou de produtores que se tenham dado a conhecer, como previsto no artigo 17.°, mas que não foram incluídos no exame, não poderá exceder a margem de dumping média ponderada estabelecida para as partes incluídas na amostra […] Os direitos individuais serão aplicados às importações de qualquer exportador ou produtor a quem tenha sido concedido tratamento individual, como previsto no artigo 17.°»

5        Quanto à técnica consistente em recorrer à amostragem, o artigo 17.°, n.os 1 e 3, do regulamento de base dispõe:

«1.      Nos casos em que o número de autores da denúncia, exportadores ou importadores, tipos de produtos ou transacções for elevado, o inquérito pode limitar‑se a um número razoável de partes, produtos ou transacções, recorrendo‑se a uma amostragem estatisticamente válida com base nas informações disponíveis aquando da selecção, ou com base no volume mais representativo da produção, vendas ou exportações sobre o qual possa razoavelmente incidir o inquérito no prazo disponível.

[…]

3.      Nos casos em que o exame seja limitado em conformidade com o presente artigo, será, no entanto, calculada uma margem de dumping individual para qualquer exportador ou produtor que não tenha inicialmente sido seleccionado e que tenha apresentado as informações necessárias nos prazos previstos no presente regulamento, excepto se o número de exportadores ou produtores for de tal modo elevado que torne os exames individuais demasiado morosos e impeça a conclusão do inquérito num prazo razoável.»

6        Quanto à determinação da existência de um prejuízo, o artigo 3.°, n.os 1, 2 e 6, do regulamento de base prevê:

«1.      Para efeitos do presente regulamento, entende‑se por ‘prejuízo’, salvo disposição em contrário, um prejuízo importante causado à indústria comunitária, uma ameaça de prejuízo importante para a indústria comunitária ou um atraso importante na criação dessa indústria, sendo interpretado em conformidade com o disposto no presente artigo.

2.      A determinação da existência de prejuízo deve basear‑se em elementos de prova positivos e incluir um exame objectivo a) do volume das importações objecto de dumping e do seu efeito nos preços dos produtos similares no mercado comunitário e b) da repercussão dessas importações na indústria comunitária.

[…]

6.      É necessário demonstrar, através de todos os elementos de prova relevantes apresentados em conformidade com o n.° 2, que as importações objecto de dumping estão a causar prejuízo na acepção do presente regulamento. Concretamente, tal facto implicará a demonstração de que o volume e/ou os níveis de preços identificados nos termos do n.° 3 se repercutem na indústria comunitária conforme disposto no n.° 5 e de que esta repercussão pode ser classificada de importante.»

7        Segundo o artigo 9.°, n.° 4, último período, do regulamento de base, «[o] montante do direito antidumping não excederá a margem de dumping estabelecida, devendo, no entanto, ser inferior à margem de dumping, caso um direito inferior seja suficiente para eliminar o prejuízo para a indústria comunitária».

8        Nos termos do artigo 18.°, n.os 3 e 4, do regulamento de base:

«3.      Ainda que as informações fornecidas por uma parte interessada não sejam ideais em todos os aspectos não deverão ser ignoradas, desde que as eventuais deficiências não dificultem indevidamente a obtenção de conclusões suficientemente exactas, as informações tenham sido transmitidas em tempo útil e sejam verificáveis, e a parte interessada tenha procedido da melhor forma dentro das suas possibilidades.

4.      Caso os elementos de prova ou as informações não sejam aceites, a parte que as forneceu será imediatamente informada das razões que levaram à sua rejeição e terá a possibilidade de fornecer explicações complementares no prazo fixado. Caso as explicações não sejam consideradas satisfatórias, as razões da rejeição desses elementos de prova ou das informações serão divulgadas e constar das conclusões publicadas.»

9        O artigo 20.°, n.os 1, 2, 4 e 5, do regulamento de base dispõe:

«1.      Os autores de denúncia, os importadores, os exportadores, as associações representativas e os representantes do país de exportação podem requerer a divulgação das informações sobre os factos e considerações essenciais, com base nos quais foram instituídas as medidas provisórias. Os pedidos de divulgação devem ser apresentados por escrito imediatamente a seguir à instituição das medidas provisórias, devendo a divulgação ser efectuada por escrito o mais cedo possível após o pedido.

2.      As partes referidas no n.° 1 podem solicitar a divulgação final dos factos e considerações essenciais com base nos quais se tenciona recomendar a instituição de medidas definitivas, ou o encerramento de um inquérito ou processo sem instituição de medidas, devendo ser conferida uma especial atenção à divulgação de quaisquer factos ou considerações diferentes dos utilizados para as medidas provisórias.

[…]

4.      A divulgação final, que terá devidamente em conta a protecção de informações confidenciais, será efectuada por escrito no mais curto prazo, normalmente o mais tardar um mês antes da decisão definitiva ou da apresentação pela Comissão de qualquer proposta de instituição de medidas definitivas nos termos do artigo 9.° Caso a Comissão não esteja em posição de divulgar determinados factos ou considerações nesse momento, estes serão divulgados o mais brevemente possível após essa data. A divulgação não prejudicará qualquer decisão posterior que possa vir a ser tomada pela Comissão ou pelo Conselho, mas caso tal decisão se baseie em factos ou considerações diferentes, estes devem ser divulgados o mais cedo possível.

5.      As observações apresentadas depois da divulgação final só serão tomadas em consideração se forem recebidas no prazo fixado pela Comissão para cada caso, que será de pelo menos dez dias, tendo devidamente em conta a urgência da questão.»

10      Segundo o ponto 6.9 do Acordo sobre a aplicação do artigo VI do Acordo Geral sobre Pautas Aduaneiras e Comércio de 1994 [JO L 336, p. 103, a seguir «código antidumping de 1994» que figura no Anexo IA do Acordo que institui a Organização Mundial do Comércio (OMC) (JO 1994, L 336, p. 3)]:

«Antes de estabelecer uma determinação final, as autoridades informarão todas as partes interessadas dos factos essenciais examinados com base nos quais decidirão aplicar ou não medidas definitivas. A divulgação das referidas informações deverá ocorrer a tempo de as partes defenderem os seus interesses.»

 Antecedentes do litígio e regulamento impugnado

11      As recorrentes, Zhejiang Aokang Shoes Co., Ltd e Wenzhou Taima Shoes Co., Ltd, são sociedades produtoras e exportadoras de calçado estabelecidas na China.

12      As importações de calçado proveniente da China que é incluído em certas classes da Nomenclatura Combinada estavam sujeitas a um regime de contingentes quantitativos que expirou em 1 de Janeiro de 2005.

13      Na sequência de uma denúncia apresentada em 30 de Maio de 2005 pela Confédération européenne de l’industrie de la chaussure (CEC), a Comissão das Comunidades Europeias deu início a um processo antidumping respeitante às importações de determinado tipo de calçado com parte superior de couro natural originário da China e do Vietname. O aviso de início desse processo foi publicado no Jornal Oficial da União Europeia de 7 de Julho de 2005 (JO C 166, p. 14, a seguir «aviso de início de processo»).

14      Tendo em conta o elevado número de partes em causa, foi previsto, no ponto 5.1, alínea a), do aviso de início de processo, recorrer à técnica de amostragem, em conformidade com o disposto no artigo 17.° do regulamento de base.

15      As recorrentes entraram em contacto com a Comissão fornecendo‑lhe, em 25 de Julho de 2005, as informações requeridas pelo ponto 5.1, alínea e), do aviso de início de processo a fim de lhes ser concedido o tratamento de empresa que opera em economia de mercado (a seguir «TEM»), ou caso tal não aconteça, beneficiarem de um tratamento individual (a seguir «TI»). Por correio electrónico de 13 de Janeiro de 2006, o advogado das recorrentes interrogou a Comissão relativamente às suas intenções respeitantes ao procedimento a seguir a propósito dos pedidos TEM/TI, formulados por exportadores que não fazem parte da amostra e cujos pedidos não tinham sido individualmente examinados. Por correio electrónico de 17 de Janeiro de 2006, a Comissão indicou que, estando em curso o inquérito, recusava pronunciar‑se sobre esse assunto.

16      Em 23 de Março de 2006, a Comissão aprovou o Regulamento (CE) n.° 553/2006 que institui um direito antidumping provisório sobre as importações de determinado tipo de calçado com a parte superior de couro natural originário da República Popular da China e do Vietname (JO L 98, p. 3, a seguir «regulamento provisório»).

17      Segundo o considerando 9 do regulamento provisório, o inquérito sobre o dumping e o prejuízo abrangeu o período compreendido entre 1 de Abril de 2004 e 31 de Março de 2005 (a seguir «período de inquérito»). A análise dos elementos úteis para a avaliação do prejuízo incidiu sobre o período compreendido entre 1 de Janeiro de 2001 e 31 de Março de 2005 (a seguir «período considerado»).

18      Tendo em conta a necessidade de determinar um valor normal para os produtos dos produtores‑exportadores chineses e vietnamitas que pudessem não vir a beneficiar do TEM, a Comissão procedeu a uma inspecção com vista a estabelecer o valor normal com base nos dados referentes a um país análogo, neste caso, a República Federativa do Brasil, nas instalações de três empresas brasileiras (considerando 8 do regulamento provisório).

19      Quanto ao produto em causa, resulta dos considerandos 10, 11, 40 e 41 do regulamento provisório que este engloba essencialmente as sandálias e chinelas, as botas e botins e sapatos de uso corrente todos fabricados com a parte superior em couro natural ou reconstituído. Resulta, além disso, dos considerandos 12 a 31 do regulamento provisório que a Comissão excluiu da definição do produto em causa o calçado de desporto que exige tecnologia especial (Special Technology Athletic Footwear, a seguir «STAF») e que na referida definição incluiu o calçado para criança.

20      Para a determinação do dumping, a Comissão recorreu à técnica de amostragem. Segundo o considerando 55 do regulamento provisório, entre os produtores‑exportadores chineses que se manifestaram a fim de ser incluídos na amostra, 154 exportaram para a Comunidade durante o período de inquérito. Segundo esse mesmo considerando, essas empresas foram consideradas, numa primeira fase, como tendo cooperado e foram tomadas em conta para efeitos da constituição da amostra.

21      Resulta do considerando 57 do regulamento provisório que a Comissão escolheu uma amostra que compreende treze produtores‑exportadores chineses que representam mais de 20% do volume das exportações chinesas para a Comunidade. Segundo o considerando 59 do mesmo regulamento, os critérios tomados em consideração para efeitos da selecção em questão foram, em primeiro lugar, a importância do produtor‑exportador em termos de vendas à exportação para a Comunidade e, em segundo lugar, a sua importância em termos de vendas realizadas no mercado interno. No tocante a este último critério, a Comissão indicou, no considerando 60 do regulamento provisório, que os dados ligados às vendas internas aumentavam a representatividade da amostra fornecendo informações sobre os preços e os custos associados à produção e à venda do produto em causa nos mercados internos. Segundo o considerando 61 do regulamento provisório, as empresas chinesas seleccionadas na amostra asseguravam, 25% das exportações para a Comunidade e 42% das vendas realizadas no mercado interno por produtores que colaboraram no inquérito. Segundo esse mesmo considerando, a exclusão dos produtos de tipo STAF não influenciou significativamente a representatividade das amostras.

22      Em conformidade com o considerando 62 do regulamento provisório, os produtores‑exportadores não incluídos na amostra foram informados de que o eventual direito antidumping sobre as respectivas exportações seria calculado em conformidade com o artigo 9.°, n.° 6, do regulamento de base. Quanto aos pedidos apresentados por esses produtores‑exportadores que visam o cálculo de uma margem de dumping individual segundo o artigo 9.°, n.° 6, e o artigo 17.°, n.° 3, do regulamento de base, a Comissão considerou, no considerando 64 do regulamento provisório, que a análise individual desses pedidos complicaria indevidamente a sua tarefa e impediria a conclusão do inquérito em tempo útil. Nestas condições, a margem de dumping desses produtores foi determinada estabelecendo a média ponderada das margens de dumping das empresas incluídas na amostra (considerandos 135 e 143 do regulamento provisório).

23      Por carta de 7 de Abril de 2006, a Comissão transmitiu às recorrentes, em conformidade com o disposto no artigo 14.°, n.° 2, e no artigo 20.°, n.° 1, do regulamento de base, respectivamente, uma cópia do regulamento provisório e um documento com informações sobre pormenores que suportam os factos e considerações essenciais na base dos quais foram impostos os direitos antidumping provisórios (a seguir «documento de divulgação intermédio») A Comissão convidou as recorrentes a transmitir‑lhe os seus eventuais comentários sobre esses documentos até 8 de Maio de 2006.

24      Por telecópia de 7 de Julho de 2006, a Comissão transmitiu às recorrentes, em conformidade com o artigo 20.°, n.os 2 a 4, do regulamento de base, um documento de divulgação final sobre os factos e considerações essenciais nos quais se baseia a proposta de imposição de direitos antidumping definitivos.

25      No título H desse documento, a Comissão expôs as suas considerações quanto às medidas antidumping definitivas que seriam propostas ao Conselho da União Europeia. Quanto ao tipo de medidas, a Comissão salientou, em primeiro lugar, que os compromissos por parte dos produtores de não venderem abaixo do nível de preço que eliminava o prejuízo importante que suportava a indústria comunitária, não constituíam medidas adequadas e, em segundo lugar, que havia que aplicar um sistema de direitos diferidos (pontos 278 a 291 do documento de divulgação final).

26      No que diz respeito ao sistema de direitos diferidos, a Comissão salientou que o volume das importações teve um efeito prejudicial importante na indústria comunitária a partir de 1 de Janeiro de 2005, data da extinção do regime de contingentes (v. n.° 12 supra). Com efeito, durante os três primeiros meses do ano de 2005, incluídos no período de inquérito (v. n.° 17 supra), a indústria comunitária conheceu, proporcionalmente, o declínio mais significativo no decurso do período considerado no que diz respeito a vários indicadores económicos, tais como a rentabilidade, os preços de venda, as quotas de mercado, as vendas, o emprego e a produção. Nestas condições, a Comissão dedicou atenção especial ao elemento quantitativo das práticas de dumping aquando da determinação da existência de um prejuízo. Assim, considerou que só as importações que ultrapassavam um certo volume estavam na origem de um prejuízo e que, por isso, não era necessária uma intervenção sob a forma de direitos ad valoram para restabelecer condições de concorrência leal. Portanto, os direitos antidumping deviam ser unicamente aplicados às quantidades de produtos importados para além de um determinado volume anual. No caso em apreço, tal sistema de direitos diferidos seria adequado para efeitos da eliminação do prejuízo na medida em que tomaria em conta os efeitos do regime de contingentes e em que equilibraria os interesses das partes interessadas. Seria, portanto, às importações efectuadas para além de um limiar de 140 milhões de pares de sapatos por ano provenientes da China que os direitos antidumping propostos deveriam aplicar‑se. Esse volume reflectia a apreciação da Comissão sobre as importações provenientes da China em 2005, tendo em conta as quantidades importadas em 2004 (pontos 285 a 287 e 291 do documento de divulgação final).

27      Assim, a Comissão propôs a imposição de um direito antidumping definitivo, igual à margem de eliminação do prejuízo, às importações efectuadas para além do limiar de 140 milhões de pares de sapatos por ano originários da China. Essa margem era estabelecida ao nível da subcotação dos preços de referência, a saber, 23% (ponto 293 do documento de divulgação final).

28      A Comissão convidou as recorrentes a transmitirem‑lhe os seus comentários sobre o documento de divulgação final até 17 de Julho de 2006.

29      Por carta de 28 de Julho de 2006, a Comissão transmitiu às recorrentes um documento de divulgação final adicional. Segundo os seus dois primeiros parágrafos, esse documento tinha por objecto informar as partes interessadas de uma mudança em relação à configuração dos direitos antidumping definitivos que seriam propostos. A Direcção‑Geral (DG) «Comércio» da Comissão examinara as observações formuladas por algumas partes interessadas quanto ao sistema de direitos diferidos inicialmente contemplado (v. n.os 25 a 27 supra). Por intermédio desse documento, a Comissão abandonou a ideia de tal sistema. No quadro da sua nova abordagem, a Comissão sublinhou que o aumento verdadeiramente prejudicial das importações tinha tido lugar durante o ano de 2004, e isto até ao fim do período de inquérito, e que 2005 tinha sido o primeiro ano durante o qual as importações de calçado proveniente da China já não estavam submetidas a um regime de contingentes. Além disso, a Comissão estabeleceu um volume de importações não prejudicial baseando‑se nas importações originárias da China e do Vietname em 2003, concretamente, 109 milhões de pares de sapatos. Em conformidade com essa nova abordagem, o impacto económico desse volume devia ser tomado em consideração na determinação do nível de eliminação do prejuízo. Assim, por um lado, o nível de eliminação do prejuízo foi diminuído a fim de ter em conta o volume de importações não prejudicial e, por outro, os direitos definitivos foram aplicados a partir do primeiro par importado. Segundo esse método, que prevê quatro etapas expostas nesse documento, a Comissão concluiu, quanto às importações provenientes da China, com base na «regra do direito inferior» pela imposição de um direito antidumping definitivo igual ao nível requerido para a eliminação do prejuízo, na ocorrência 16,5%.

30      Para efeitos da formalização dessa nova proposta, a Comissão anexou à carta de 28 de Julho de 2006 os pontos que devem figurar no novo título H do documento de divulgação final e substituir os que figuram no título correspondente deste último (v. n.° 25 supra). A Comissão expôs, nos pontos 278 e 279 que devem figurar no novo título H do documento de divulgação final, que só as exportações que excedam um certo volume antes da extinção do regime de contingentes podiam causar prejuízo importante, de modo que, no quadro da determinação do nível de eliminação do prejuízo com base nos resultados do período de inquérito, o facto de determinadas quantidades importadas não terem causado prejuízo devia ser tomado em consideração. Por conseguinte, as quantidades que não causavam prejuízo importante deviam ser tomadas em consideração na determinação do nível de eliminação do prejuízo. No ponto 280 do mesmo documento, a Comissão expôs o método que tinha sido aplicado.

31      A Comissão convidou as recorrentes a transmitirem‑lhe os seus comentários sobre o documento de divulgação final adicional até 2 de Agosto de 2006. As recorrentes transmitiram as suas observações nessa data.

32      Em 5 de Outubro de 2006, o Conselho adoptou o Regulamento (CE) n.° 1472/2006 que institui um direito antidumping definitivo e estabelece a cobrança definitiva do direito provisório instituído sobre as importações de determinado tipo de calçado com a parte superior de couro natural originário da República Popular da China e do Vietname (JO L 275, p. 1, a seguir «regulamento impugnado»). Por virtude do regulamento impugnado, o Conselho instituiu um direito antidumping definitivo sobre as importações de calçado com a parte superior de couro natural ou reconstituído, com exclusão do calçado para desporto, do calçado de tecnologia especial, das pantufas e outro calçado de interior e do calçado com biqueira protectora originário da China e classificado em vários códigos da Nomenclatura Combinada (artigo 1.° do regulamento impugnado). A taxa do direito antidumping definitivo aplicável ao preço líquido, franco‑fronteira comunitária, antes do desalfandegamento, foi estabelecido, para o calçado procedente da produção das recorrentes, em 16,5%. Segundo o artigo 3.° do regulamento impugnado, este vigorava durante de dois anos.

33      No que diz respeito às questões ligadas aos pedidos formulados por várias empresas que têm em vista a concessão do TEM, sobre os quais a Comissão não se pronunciara, o Conselho consagrou‑lhes os considerandos 60 a 65 do regulamento impugnado.

34      Segundo esses considerandos, o facto de a Comissão não ter respondido individualmente a cada pedido que lhe tinha sido apresentado a esse respeito não constitui uma violação do regulamento de base. Isso está, pelo contrário, em conformidade com o disposto no seu artigo 17.° O método de amostragem contemplado por esse artigo aplica‑se igualmente no caso de um elevado número de empresas em causa pedir que lhe seja concedido ou o TEM ou um TI. No caso em apreço, o número excepcionalmente elevado de pedidos apresentados pelas empresas em causa não deixou outra alternativa à administração que não a de examinar unicamente os que provêm das empresas da amostra a fim de conciliar os imperativos decorrentes de uma análise do dossier tão individualizada quanto possível com o cumprimento dos prazos obrigatórios. Isto implicou a aplicação a todas as empresas não incluídas na amostra da margem média ponderada calculada para as empresas da amostra. Daí resulta que alegações formuladas durante o procedimento administrativo, segundo os quais o cálculo do dumping não é representativo, devem igualmente ser rejeitadas.

35      Essas considerações são também válidas quanto aos pedidos que visam a concessão de um TI.

36      No tocante ao nível necessário de direitos para efeitos da eliminação do prejuízo ocasionado pelas importações provenientes da China, o Conselho expôs nos considerandos 296 a 301 do regulamento impugnado, reproduzindo os pontos 275 a 280 que figuram no título H do documento de divulgação final e anexados ao documento de divulgação final adicional (v. n.° 30 supra), que havia que ter em conta as particularidades do presente processo, e nomeadamente a existência do regime de contingentes até 1 de Janeiro de 2005. Dado que o regime de contingentes impediu a indústria comunitária de sofrer um prejuízo importante, quando o crescimento das importações após a extinção desse regime teve um efeito prejudicial particularmente sensível, o Conselho considerou que só as importações que ultrapassassem um certo volume antes da supressão do regime de contingentes podiam causar um prejuízo importante. Por conseguinte, o limiar de prejuízo, determinado com base nos resultados do período de inquérito, devia tomar em consideração o facto de determinados volumes de importações não terem causado prejuízo importante. Essa operação, que foi baseada no valor dos volumes importados em 2003, redundou, para as importações provenientes da China, num limiar de prejuízo de 16,5% em vez do limiar de 23% que foi aplicado, segundo o considerando 295 do regulamento impugnado, se o Conselho não tivesse tido em conta as particularidades do presente processo.

 Tramitação processual e pedidos das partes

37      Por petições apresentadas na Secretaria do Tribunal Geral, em 21 de Dezembro de 2006, as recorrentes interpuseram os presentes recursos.

38      Por requerimentos apresentados na Secretaria do Tribunal Geral em 2 de Abril de 2007, a Comissão pediu que fosse autorizada a intervir nos presentes processos em apoio dos pedidos do Conselho. Por cartas de 4 de Outubro de 2007, a Comissão informou o Tribunal que renunciava à apresentação de articulado de intervenção, mas participaria nas audiências.

39      Por requerimentos apresentados na Secretaria do Tribunal Geral em 5 de Abril de 2007, a CEC pediu que fosse autorizada a intervir nos presentes processos em apoio dos pedidos do Conselho.

40      Por requerimentos apresentados na Secretaria do Tribunal Geral em 13 de Abril de 2007, a Provincia di Ascoli Piceno (Itália), a Comune di Monte Urano (Itália), a BA.LA. di Lanciotti Vittorio & C. Sas e dezasseis outras empresas italianas produtoras de calçado cujos nomes figuram em anexo pediram que fossem autorizadas a intervir nos presentes processos em apoio das conclusões do Conselho.

41      Por despacho de 4 de Setembro de 2007, o presidente da Segunda Secção do Tribunal Geral admitiu os pedidos de intervenção formulados pela Comissão e pela CEC bem como pela BA.LA. di Lanciotti Vittorio & C. e pelas dezasseis outras empresas italianas produtoras de calçado (a seguir «produtores italianos»). Em contrapartida, os pedidos da Provincia di Ascoli Piceno e da Comune di Monte Urano foram indeferidos.

42      Tendo sido modificada a composição das Secções do Tribunal Geral, o juiz relator foi afectado à Oitava Secção, à qual, por conseguinte, os presentes processos foram distribuídos.

43      Por petições apresentadas na Secretaria do Tribunal de Justiça em 4 de Outubro de 2007, a Provincia di Ascoli Piceno e a Comune di Monte Urano, nos termos do artigo 57.°, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça, interpuseram recurso pelo qual pediam a anulação do despacho de 4 de Setembro de 2007, na medida em que o Tribunal Geral indeferiu os seus pedidos de intervenção. Por dois despachos de 25 de Janeiro de 2008, Provincia di Ascoli Piceno e Comune di Monte Urano/Conselho [C‑463/07 P(I) e C‑462/07 P(I), não publicados na Colectânea], o presidente do Tribunal de Justiça negou provimento a esses recursos.

44      A CEC e os produtores italianos apresentaram os seus articulados de intervenção em 15 e 18 de Outubro de 2007 respectivamente.

45      Por despacho de 8 de Janeiro de 2009, o presidente da Oitava Secção do Tribunal decidiu, ouvidas as partes, apensar os processos T‑407/06 e T‑408/06 para efeitos da fase oral do processo e do acórdão, em conformidade com o disposto no artigo 50.° do Regulamento de Processo do Tribunal Geral.

46      Com base no relatório do juiz‑relator, o Tribunal Geral decidiu abrir a fase oral do processo.

47      Foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às questões colocadas pelo Tribunal na audiência de 11 de Fevereiro de 2009.

48      As recorrentes concluem pedindo que o Tribunal se digne:

–        anular o regulamento impugnado na medida em que diz respeito às recorrentes;

–        condenar o Conselho nas despesas;

–        condenar as intervenientes nas suas próprias despesas.

49      O Conselho conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–        julgar os recursos inadmissíveis ou negar‑lhes provimento;

–        condenar as recorrentes nas despesas.

50      A Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne negar provimento ao recurso.

51      A CEC e os produtores italianos concluem pedindo que o Tribunal se digne:

–        negar provimento aos recursos;

–        condenar as recorrentes nas despesas.

 Questão de direito

52      Em apoio dos seus recursos, as recorrentes invocam sete fundamentos baseados respectivamente:

–        na violação do artigo 2.°, n.° 7, alíneas b) e c), do regulamento de base e do princípio da igualdade de tratamento;

–        na violação do artigo 9.°, n.° 5, do regulamento de base;

–        na violação do princípio da protecção da confiança legítima;

–        na violação dos direitos de defesa, na violação do dever de fundamentação e do direito a uma protecção jurisdicional efectiva;

–        no cálculo errado da sua margem de dumping;

–        na violação do artigo 20.° do regulamento de base, na violação dos direitos de defesa e na falta de fundamentação no que respeita ao prejuízo sofrido pela indústria comunitária;

–        num erro de direito e num erro manifesto de apreciação no que respeita ao prejuízo causado à indústria comunitária.

53      Através dos seus três primeiros fundamentos bem como através do quinto, as recorrentes alegam que a Comissão cometeu diversos erros de direito, na media em que ela lhes recusou o TEM ou o TI, mesmo sem ter examinado o seu pedido de TEM/TI.

54      Todos estes fundamentos serão examinados conjuntamente a seguir.

 Quanto aos três primeiros fundamentos bem como quanto ao quinto, baseados na violação do artigo 2.°, n.° 7, alíneas b) e c), e do artigo 9.°, n.° 5, do regulamento de base, na violação do princípio da igualdade de tratamento, no princípio da protecção da confiança legítima e no cálculo errado da margem de dumping das recorrentes

 Argumentos das partes

55      As recorrentes alegam que as disposições do artigo 2.°, n.° 7, alíneas b) e c), do regulamento de base não permitem invocar o seu artigo 17.° para recusar a um exportador o direito de apresentar o seu pedido de TEM e de que este seja examinado pela Comissão.

56      Essa tese resulta, em primeiro lugar, da interpretação literal do artigo 2.°, n.° 7, do regulamento de base. Com efeito, segundo a sua redacção, um pedido de TEM deve ser apresentado por, e examinado em relação a, cada produtor considerado individualmente e as instituições comunitárias são obrigadas a responder, com base nas provas apresentadas pelo requerente, à questão de saber se este satisfaz os critérios pertinentes, sem que o artigo 17.° do regulamento de base introduza qualquer excepção a esse respeito. Assim, o Conselho não tem o poder de fixar a margem de dumping nem de tratar as questões respeitantes ao prejuízo sem ter decidido os pedidos de TEM.

57      Essa abordagem é confirmada pelas considerações ligadas à história legislativa do artigo 2.°, n.° 7, alíneas b) e c), do regulamento de base, bem como ao objectivo dessa disposição que consiste no exame individual do comportamento e das condições de actividade das diversas empresas face às reformas económicas realizadas na China. O «formulário de pedido de TEM/TI» confirma a obrigação de a Comissão examinar tal pedido sem prever excepção a esse respeito.

58      A posição do Conselho é, além disso, contrária à jurisprudência, que já afirmou, em primeiro lugar, que o TEM só pode ser concedido aos exportadores que tenham apresentado um pedido e que preencham as condições pertinentes e, em segundo lugar, que o resultado da análise desse pedido não pode ser aplicado de maneira mais geral. A jurisprudência afirmou, por outro lado, que o processo de concessão do TEM é distinto do relativo à adopção dos direitos antidumping definitivos e que as instituições são obrigadas a efectuar um exame individual de cada pedido de concessão do referido tratamento. Ora, no caso em apreço, as recorrentes não gozam mesmo da possibilidade de contestar a apreciação das instituições sobre a questão de saber se preenchem os requisitos para lhes ser concedido o TEM.

59      A favor da análise das recorrentes milita também a prática administrativa das instituições, segundo a qual estas nunca se abstiveram de examinar um pedido de TEM, e isso mesmo quando o número de requerentes era elevado e não obstante o recurso à técnica de amostragem.

60      Da mesma forma, o princípio da igualdade de tratamento impõe às instituições examinar a totalidade de pedidos TEM e não unicamente os provenientes das empresas que fazem parte da amostra. Ora, nenhuma razão objectiva justificativa dessa «discriminação» poder ser avançada e o artigo 17.° do regulamento de base não pode ser aplicado de forma a permitir tal desigualdade de tratamento entre os operadores em causa. Pelo contrário, a jurisprudência exclui a possibilidade de recorrer à amostragem para decidir sobre pedidos de TEM/TI. Além disso, contrariamente às alegações do Conselho, constituir uma amostra sem ter ideia da percentagem dos operadores chineses que merecem o TEM comprometeria a sua representatividade.

61      Assim, em caso de recurso à amostragem, as instituições devem aplicar às empresas não incluídas na amostra, mas cujo pedido de TEM/TI foi deferido, a margem média ponderada de dumping estabelecida para as empresas da amostra beneficiárias do TEM ou, consoante o caso, de um TI. Essa operação, que não implica o cálculo de uma margem de dumping individual para cada exportador não incluído na amostra, mas que beneficia do TEM, não ocasiona qualquer encargo administrativo que o Conselho não possa suportar.

62      Ao invés, o método aplicado pelas instituições tem por efeito tratar todos os operadores que não fazem parte da amostra da mesma maneira sem distinguir entre os que merecem o TEM e os que não o merecem.

63      Esses argumentos e conclusões impõem‑se igualmente a propósito dos pedidos de obtenção de um TI segundo o artigo 9.°, n.° 5, do regulamento de base. Com efeito, as recorrentes apresentaram um pedido de TI para o caso de o seu pedido de TEM ser indeferido. Essa disposição estabelece critérios específicos à luz dos quais os pedidos devem ser avaliados pela Comissão. Ora, segundo as recorrentes, esta examinou apenas os pedidos de TI provenientes dos exportadores que fazem parte da amostra sem ter informado previamente desse facto as recorrentes.

64      As recorrentes consideram que a interpretação literal e teleológica do artigo 9.°, n.° 5, do regulamento de base, o princípio da igualdade de tratamento e a prática administrativa anterior militam a favor das suas conclusões.

65      Na hipótese de o Tribunal Geral rejeitar os dois primeiros fundamentos, as recorrentes alegam que, ao não examinar os seus pedidos de TEM/TI, as instituições violaram o princípio da protecção da confiança legítima. Com efeito, o aviso de início de processo convidava as recorrentes bem como todos os exportadores em causa a apresentar pedidos de TEM/TI num prazo preciso e indicava que a determinação do valor normal se fizesse, para os produtores cujo pedido fosse acolhido, em conformidade com o disposto no artigo 2.°, n.° 7, alínea b), do regulamento de base. A Comissão não podia, portanto, segundo as recorrentes, modificar retroactivamente a sua posição e recusar examinar os pedidos devidamente apresentados. Além disso, a Comissão previu, no aviso de início de processo, a aplicação de disposições e procedimentos distintos para efectuar a amostragem e examinar os pedidos de TEM/TI. O «formulário de TEM/TI» indica sem ambiguidade que qualquer pedido seria examinado.

66      Incumbia, portanto, às instituições, segundo as recorrentes, notificar aos exportadores em causa a mudança de procedimentos que eram seguidos há muito tempo. Na ausência de tal notificação, as recorrentes puderam legitimamente esperar que a Comissão examinasse os seus pedidos TEM/TI e que o Conselho procedesse da forma descrita no n.° 61 supra. Nestas condições, as recorrentes foram privadas da possibilidade de expor a sua tese quanto à procedência do seu pedido durante o procedimento administrativo, mas também da de pôr em causa a apreciação das instituições a esse respeito perante o juiz comunitário. Segundo as recorrentes, considerações de facilidade administrativa não podem pôr em causa a apreciação das recorrentes.

67      As recorrentes consideram finalmente que, ao aplicar o artigo 17.° do regulamento de base em vez do artigo 2.°, n.° 7, e do artigo 9.°, n.° 5, deste, o Conselho rompeu com a sua prática anterior e efectuou um cálculo errado da margem de dumping. Segundo essa prática, a margem média ponderada dos operadores que fazem parte da amostra e obtiveram o TEM ou que beneficiam de um TI era aplicada aos operadores que não fazem parte da amostra e que obtiveram o mesmo tratamento ou beneficiam do mesmo tratamento. Seguindo esse método, as recorrentes deveriam ter beneficiado da margem de dumping da Foshan City Nanhai Golden Step Industrial Co., Ltd (a seguir «Golden Step»), sociedade que faz parte da amostra, a que foi concedido o TEM. Ora, no caso em apreço, às recorrentes foi aplicada uma margem de dumping de 28,9% correspondente à média ponderada das margens de dumping aplicadas às empresas da amostra cujos pedidos de TEM/TI foram indeferidos, isto é, sem ter em conta a margem de 9,7% calculada para a Golden Step. Mesmo pressupondo, portanto, que foi com razão que o Conselho quis aplicar a todas as empresas que não fazem parte da amostra a margem média ponderada das empresas da amostra, porém, não procedeu desse modo no caso dos autos.

68      O Conselho recorda, antes de mais, que a fiscalização que o juiz comunitário exerce sobre as apreciações das instituições comunitárias em matéria de medidas de defesa comercial contra as importações que são objecto de dumping deve limitar‑se à verificação do respeito das regras de processo, da exactidão material dos factos considerados para proceder à escolha contestada, da inexistência de erro manifesto na apreciação desses factos, ou da inexistência de desvio de poder.

69      Em seguida, o Conselho observa que a concessão do TEM ou de um TI não constitui um fim só por si, mas uma etapa do cálculo da margem de dumping. As instituições não recorreram, portanto, à amostragem para decidir os pedidos de TEM/TI, mas para determinar a margem de dumping dos exportadores, abordagem permitida pelo artigo 17.° do regulamento de base. Portanto, a alegação segundo a qual o regulamento de base não contém disposições que autorizem a tratar diferentemente os exportadores que fazem parte da amostra daqueles que não fazem parte dela deverá ser rejeitada.

70      Quanto ao procedimento seguido, o Conselho expõe que, quando as instituições recorrem à amostragem dos exportadores dos países que não têm economia de mercado, investigam a situação individual de cada exportador que faz parte da amostra e, tal sendo o caso, examinam o pedido que este apresentou. No que diz respeito aos exportadores não incluídos na amostra, as instituições aplicam‑lhes a margem média ponderada de dumping estabelecida para as partes incluídas na amostra (no caso dos autos 28,9%). Estes últimos operadores poderão todavia apresentar as informações necessárias a fim de que lhe seja calculada uma margem de dumping individual nas condições previstas pelo artigo 17.°, n.° 3, do regulamento de base. Ora, esta última disposição deixa às instituições um amplo poder de apreciação a esse respeito, pois não são obrigadas a examinar esses pedidos nos casos em que o número de exportadores ou de produtores for tão elevado que os exames individuais complicariam indevidamente a sua tarefa e impediriam a conclusão do inquérito em tempo útil. Daí resulta que a concessão do TEM a um exportador que não faz parte da amostra não tem qualquer impacto na situação desse exportador quando a Comissão decide não calcular uma margem de dumping individual a seu respeito em conformidade com o disposto no artigo 17.°, n.° 3, do regulamento de base.

71      No caso em apreço, 141 exportadores chineses e 73 exportadores vietnamitas não incluídos na amostra apresentaram pedidos de TEM/TI. Foi, portanto, com razão que as instituições, em aplicação do artigo 17.°, n.° 3, do regulamento de base, não examinaram esses pedidos, pois tal exame, mesmo sob a forma de análise documental, tornaria a conclusão do inquérito dentro dos prazos materialmente impossível. Foi nestas condições que o Conselho aplicou aos exportadores não incluídos na amostra a margem média ponderada de dumping de todos os exportadores da amostra.

72      Segundo o Conselho, a jurisprudência invocada pelas recorrentes não incide na maneira como as instituições devem proceder a uma amostragem para efeitos do cálculo das margens de dumping no caso de exportações provenientes de países que não têm uma economia de mercado nem se pronuncia sobre a apreciação dos pedidos de TEM provenientes de empresas não incluídas na amostra. A jurisprudência não sustenta, por isso, utilmente a posição das recorrentes.

73      Por outro lado, a circunstância de as instituições terem examinado, no quadro de inquéritos anteriores que implicam um número menos elevado de empresas, pedidos de TEM/TI apresentados por operadores não incluídos nas amostras é desprovida de pertinência, dado que, por um lado, o procedimento seguido no caso em apreço é conforme ao artigo 17.°, n.° 3, do regulamento de base e de, por outro, a margem de apreciação conferida às instituições ter por finalidade permitir a adaptação da sua prática consoante as especificidades de cada caso concreto. Segundo o Conselho, daqui se conclui que as instituições não violaram o «princípio da não discriminação». Além disso, a diferença de tratamento entre, por um lado, as empresas que fazem parte da amostra e, por outro, as empresas que não fazem parte dela é objectivamente justificada pelo número excepcionalmente elevado de pedidos, cujo exame individual teria tido por efeito a não conclusão do inquérito dentro dos prazos.

74      Além disso, a aplicação às empresas não incluídas na amostra, mas cujo pedido de TEM/TI foi deferido, da margem média ponderada de dumping estabelecida para as empresas da amostra que beneficiam do TEM ou, consoante o caso, de um TI é apenas uma possibilidade oferecida às instituições. Todavia, o regulamento de base não lhes impõe adoptar essa abordagem. As recorrentes não provaram, aliás, que a aplicação do artigo 17.° do regulamento de base tenha dado lugar, no caso em apreço, a um resultado manifestamente inadaptado.

75      O Conselho considera que, por identidade de razões, o segundo fundamento deve ser rejeitado, dado que o quadro de procedimento que rege o exame dos pedidos de TEM é o mesmo para o dos pedidos de TI.

76      Quanto ao terceiro fundamento, o Conselho recorda que a invocação útil do princípio da protecção da confiança legítima pressupõe, em primeiro lugar, que a administração tenha dado ao interessado garantias individuais precisas e incondicionais e, em segundo lugar, que essas garantias tenham feito nascer nele expectativas fundadas. Ora, nenhum destes requisitos está preenchido no caso em apreço.

77      Com efeito, a Comissão nunca forneceu às recorrentes a garantia precisa e incondicional de que avaliaria os seus pedidos de TEM/TI mesmo no caso de elas não estarem incluídas na amostra. Segundo o Conselho, o aviso de início de processo precisou a esse propósito, no ponto 5.1, alínea b), que, caso a Comissão optasse por recorrer à técnica de amostragem no que respeita aos exportadores/produtores, poderia decidir não calcular margens de dumping individuais para aqueles que não faziam parte da amostra se o seu número fosse de tal forma elevado que uma análise individual complicaria indevidamente a sua tarefa, impedindo a conclusão do inquérito em tempo útil.

78      Qualquer operador diligente poderia, portanto, compreender que, salvo se fizesse parte da amostra ou se o número de produtores‑exportadores fosse menor do que o previsto, a Comissão não estabeleceria uma margem de dumping individual, não calcularia o valor normal com base nos dados provenientes da sua contabilidade e, portanto, não decidiria sobre o seu pedido de TEM/TI. Sucede o mesmo no que diz respeito ao «formulário de pedido de TEM/TI» dado que, no momento em que o formulário foi enviado aos produtores, a Comissão não conhecia o número de pedidos que receberia nem o número ou a identidade das empresas que faziam parte da amostra. Portanto, esse formulário não pode ser interpretado como dando uma garantia precisa de que todos os pedidos de TEM/TI seriam examinados.

79      Além disso, as recorrentes não demonstraram ter sofrido qualquer prejuízo pelo facto de a sua confiança legítima ter sido alegadamente vulnerada. Finalmente, agindo como fizeram, as instituições não se afastaram de uma prática anterior nem excederam os limites do seu poder de apreciação.

80      Quanto ao quinto fundamento, o Conselho considera que os argumentos apresentados no quadro desse fundamento são baseados na premissa errada segundo a qual as instituições recorreram à amostragem para decidir os pedidos de TEM/TI. Além disso, o Conselho afirma que aplicou às recorrentes a margem média ponderada de dumping de todas as empresas que fazem parte da amostra (incluindo a Golden Step).

81      A CEC subscreve os argumentos do Conselho e sublinha que a Comissão recorreu à técnica de amostragem para calcular as margens de dumping e não para decidir os pedidos de TEM/TI. Face ao número de exportadores que pediram o TEM ou um TI, os requisitos para a aplicação dessa técnica estavam com toda a evidência preenchidos. As instituições não tinham a obrigação, em conformidade com o artigo 17.°, n.° 3, do regulamento de base, de decidir os pedidos de TEM/TI apresentados por exportadores que não fazem parte da amostra, dado que tal exame teria impedido atempadamente a conclusão do inquérito. Além disso, tal obrigação seria contrária ao objectivo dessa disposição.

82      Quanto à violação do princípio da protecção da confiança legítima alegada, a CEC acrescenta que os operadores económicos não têm fundamento para depositar a sua confiança legítima na manutenção de uma situação que pode ser alterada no quadro do poder de apreciação das instituições comunitárias.

 Apreciação do Tribunal Geral

83      Em primeiro lugar, deve salientar‑se que, segundo a redacção do artigo 17.°, n.os 1 e 3, do regulamento de base, o recurso à amostragem, enquanto técnica que permite fazer face ao elevado número de denunciantes, exportadores, importadores, tipos de produtos ou de transacções, constitui uma limitação do inquérito. Esta apreciação é confirmada pelo artigo 9.°, n.° 6, do regulamento de base, segundo o qual os produtores que não fazem parte da amostra não são incluídos no inquérito.

84      O regulamento de base prevê, todavia, que, quando essa limitação seja efectuada, as instituições devem cumprir duas obrigações, Em primeiro lugar, a amostra constituída deve ser válida na acepção do artigo 17.°, n.os 1 e 2, do regulamento de base. Em seguida, o artigo 9.°, n.° 6, do regulamento de base prevê que a margem de dumping estabelecida para os produtores que não fazem parte da amostra não deve exceder a margem média ponderada de dumping estabelecida para as partes incluídas na amostra.

85      Em segundo lugar, esta última disposição, conjugada com o disposto no artigo 17.°, n.° 3, do regulamento de base, para o qual remete, dá a possibilidade a cada produtor que não faz parte da amostra de pedir o cálculo de uma margem de dumping individual, desde que apresente todas as informações necessárias nos prazos previstos para esse efeito e que essa operação não complique indevidamente a tarefa da Comissão nem impeça a conclusão atempada do inquérito.

86      Em terceiro lugar, o artigo 2.°, n.° 7, alínea b), do regulamento de base prevê que o valor normal é determinado de acordo com os n.os 1 a 6 da mesma disposição se estiver demonstrado, com base nas petições apresentadas por um ou vários produtores que sejam objecto do inquérito, que os requisitos enunciados nesse parágrafo, alínea c), estão reunidos.

87      Assim, como alega o Conselho, os produtores que não fazem parte da amostra só podem pedir o cálculo de uma margem de dumping individual, que pressupõe a aceitação de um pedido de TEM/TI quando se trata dos países a que se refere o artigo 2.°, n.° 7, alínea b), do regulamento de base, com fundamento no disposto no artigo 17.°, n.° 3, do mesmo regulamento. Todavia, esta última disposição dá à Comissão o poder de apreciar se, tendo em conta o número de pedidos de TEM/TI, o seu exame complica indevidamente a sua tarefa e impede a conclusão do inquérito em tempo útil.

88      Resulta das considerações que precedem, em primeiro lugar, que, em caso de recurso à técnica de amostragem, o regulamento de base não concede aos operadores que não fazem parte da amostra um direito incondicional a beneficiar do cálculo de uma margem de dumping individual. A aceitação de tal pedido depende, com efeito, da decisão da Comissão relativa à aplicação do artigo 17.°, n.° 3, do regulamento de base.

89      Em seguida, a concessão do TEM ou de um TI que serve, em conformidade com o disposto no artigo 2.°, n.° 7, alínea b), do regulamento de base, apenas para determinar o método de cálculo do valor normal com vista a um cálculo das margens de dumping individuais, a Comissão não é obrigada a examinar os pedidos de TEM/TI provenientes dos operadores que não fazem parte da amostra, quando tiver concluído, no quadro da aplicação do artigo 17.°, n.° 3, do regulamento de base, que o cálculo de tais margens complica indevidamente a sua tarefa e impede‑a de concluir o inquérito em tempo útil.

90      Finalmente, no caso em apreço, não é contestado que o cálculo das margens de dumping individuais a todos os operadores que não fazem parte da amostra e que formularam pedidos nesse sentido complicaria a tarefa das instituições e impediria a conclusão do inquérito em tempo útil.

91      Portanto, a argumentação das recorrentes, segundo a qual o artigo 2.°, n.° 7, alíneas b) e c), do regulamento de base obrigava a Comissão a examinar os pedidos de TEM/TI provenientes dos operadores que não fazem parte da amostra, incluindo quando a margem de dumping individual não lhes seja aplicada, deve ser rejeitada. A este propósito, deve acrescentar‑se que a jurisprudência invocada pelas recorrentes, segundo a qual a Comissão decide da concessão do TEM ou de um TI com base num exame de cada pedido que lhe é apresentado, não implica que essa instituição seja obrigada a examinar cada pedido mesmo quando não tencione calcular margens de dumping individuais em conformidade com o disposto no artigo 17.°, n.° 3, do regulamento de base.

92      Acontece o mesmo com o argumento das recorrentes relativo à violação do princípio da igualdade de tratamento entre as empresas que fazem parte da amostra e as que dela não fazem parte (v. n.° 60 supra). Com efeito, essas duas categorias de empresas encontram‑se em situações diferentes, uma vez que, para as primeiras, a Comissão deve necessariamente calcular uma margem de dumping individual, o que pressupõe o exame e a aceitação de um pedido de TEM/TI, ao passo que não está obrigada a estabelecer uma margem individual para as segundas. Portanto, o respeito do princípio da igualdade de tratamento que proíbe, por um lado, tratar diferentemente situações semelhantes e, por outro, tratar da mesma maneira situações diferentes, excepto se razões objectivas justificarem esse tratamento, não exige o tratamento idêntico dessas duas categorias de empresas.

93      Quanto ao argumento relativo à violação do princípio da igualdade de tratamento entre as empresas que não fazem parte da amostra, não pode, contrariamente ao que sustentam as recorrentes, no caso em apreço, ser considerado que esse princípio impunha à Comissão pronunciar‑se sobre todos os pedidos TEM/TI que lhe tenham sido submetidos, de forma que aos produtores ou exportadores que não fazem parte da amostra, mas aos quais o TEM ou um TI seria concedido, possa ser aplicada a margem média de dumping das empresas da amostra às quais o TEM ou um TI foi concedido.

94      Com efeito, como foi salientado nos n.os 87 a 91 supra, na hipótese de o número de pedidos de TEM/TI ser tão elevado que o seu exame impede as instituições de concluir o inquérito em tempo útil, as instituições não são, em conformidade com o disposto no artigo 17.°, n.° 3, do regulamento de base, obrigadas a pronunciar‑se sobre todos os pedidos, e isso mesmo só para efeitos de distinguir, de entre as empresas que não figuram na amostra, as que possam ou não beneficiar do TEM ou de um TI, com a finalidade de lhes aplicar a margem média de dumping das empresas da amostra às quais o TEM ou um TI tenha sido concedido, sem com isso calcular uma margem de dumping individual.

95      No caso em apreço, foram apresentados à Comissão 141 pedidos de TEM/TI provenientes de produtores‑exportadores chineses, de forma que, mesmo considerando que tenha sido possível examiná‑los unicamente numa base documental sem que tenha sido necessário verificar esses dados por meio de inspecções no local aos produtores ou exportadores em causa, foi com razão que a Comissão considerou que o número de pedidos era manifestamente demasiado elevado para permitir o seu exame sem comprometer a conclusão do inquérito em tempo útil.

96      Portanto, há que reconhecer que a diferença de tratamento invocada pelas recorrentes, inerente à técnica da amostragem prevista no artigo 17.° do regulamento de base, é, no caso em apreço, objectivamente justificada pelo número particularmente elevado de pedidos de TEM/TI que foram apresentados à Comissão.

97      Assim, embora a Comissão tenha o direito de agir da maneira descrita pelas recorrentes no n.° 61 supra, nem o regulamento de base nem o princípio da igualdade a obrigavam a proceder dessa forma.

98      Por identidade de razões, há que rejeitar o segundo fundamento, uma vez que as mesmas considerações são válidas quanto ao exame dos pedidos de TI provenientes das sociedades que não fazem parte da amostra.

99      No tocante à alegada violação do princípio da protecção da confiança legítima, é jurisprudência constante que esse princípio se estende a qualquer sujeito de direito em relação ao qual uma instituição comunitária fez nascer expectativas fundadas. Além disso, ninguém pode invocar uma violação desse princípio na ausência de garantias precisas que lhe tenha fornecido a administração (acórdão do Tribunal de Justiça de 22 de Junho de 2006, Bélgica e Forum 187/Comissão, C‑182/03 e C‑217/03, Colect., p. I‑5479, n.° 147).

100    Ora, resulta do ponto 5.1, alínea a), i), quarto travessão, do aviso de início de abertura do processo, e nomeadamente da nota de pé‑de‑página inserida nesse ponto, que a Comissão informou os operadores em causa da possibilidade de recorrer à técnica da amostragem em conformidade com o disposto no artigo 17.° do regulamento de base e que, em tal hipótese, o cálculo das margens individuais podia ser pedido, em relação às empresas não incluídas na amostra, ao abrigo do disposto no artigo 17.°, n.° 3, do regulamento de base. Essa informação foi reiterada no ponto 5.1, alínea b), do aviso de início do processo. Assim, o facto de ter convidado os operadores em causa a apresentar um pedido de TEM/TI não equivale a uma garantia precisa incondicional e concordante de que o pedido seria examinado.

101    Neste quadro, deve também admitir‑se que essa não reacção da parte da Comissão durante um período de tempo importante não pode ser constitutivo de uma garantia que faça nascer uma confiança legítima na esfera das recorrentes. Com efeito, essa não reacção não afecta o sentido dos termos claros utilizados no aviso de abertura de processo.

102    No que diz respeito à alegação relativa à ruptura com uma prática que as instituições terão seguido no quadro de inquéritos anteriores, há que recordar que a Comissão não excedeu a margem de apreciação que lhe é concedida pelo artigo 17.°, n.° 3, do regulamento de base, ao entender que o exame da totalidade dos pedidos de TEM/TI provenientes dos produtores‑exportadores chineses que não fazem parte da amostra a teria impedido de concluir o inquérito nos prazos previstos pelo regulamento de base. Ora, é jurisprudência constante que, quando as instituições dispõem de uma margem de apreciação para a escolha dos meios necessários para a realização da sua política, os operadores económicos não têm fundamento para depositar a sua confiança legítima na manutenção do meio inicialmente escolhido, o qual pode ser alterado por essas instituições no quadro do exercício da sua competência (acórdãos do Tribunal de Justiça de 7 de Maio de 1987, Nippon Seiko/Conselho, 258/84, Colect., p. 1923, n.° 34, e de 10 de Março de 1992, Canon/Conselho, C‑171/87, Colect., p. I‑1237, n.° 41).

103    Finalmente, quanto ao quinto fundamento, há que salientar que, dado que as instituições não cometeram erro de direito ao não examinar os pedidos de TEM/TI provenientes dos operadores que não fazem parte da amostra e ao aplicar‑lhes a margem média de dumping das empresas da amostra, não procederam a um cálculo errado da margem de dumping das recorrentes por essa razão. Há que acrescentar, a este propósito, que, como especifica o Conselho, a margem de dumping da Golden Step foi tomada em conta para efeitos do cálculo da margem de dumping média ponderada da amostra.

104    Daí resulta que os três primeiros fundamentos bem como o quinto fundamento devem ser rejeitados.

 Quanto ao quarto fundamento, relativo à violação dos direitos de defesa, à violação do dever de fundamentação e ao direito a uma protecção jurisdicional efectiva

 Argumentos das partes

105    As recorrentes alegam que, ao informá‑las só em Julho de 2006 da sua intenção de não avaliar os seus pedidos de TEM/TI, as instituições comunitárias violaram os seus direitos de defesa bem como o artigo 18.°, n.° 4, do regulamento de base e não cumpriram o dever de fundamentar a sua decisão. Embora seja verdade que as recorrentes foram informadas, por intermédio do documento de divulgação final, de que os seus pedidos de TEM/TI não seriam examinados devido à sua não inclusão na amostra, não é menos verdade que, nessa fase, as recorrentes já não tinham a possibilidade de contestar a decisão relativa à constituição da amostra. No regulamento provisório, fora indicado que os pedidos de TEM/TI dos produtores não incluídos na amostra não seriam examinados nem que a amostra tinha sido constituída tendo em conta a percentagem dos operadores chineses que merecem o TEM. As recorrentes convidam, por outro lado, o Conselho a produzir a comunicação do Governo chinês, por intermédio da qual esse último contestou a validade da amostra.

106    Uma vez que a Comissão não comunicou o método relativo à constituição da amostra durante os onze primeiros meses do inquérito, as recorrentes foram privadas da possibilidade de lhe pedir que constituísse essa amostra com base nos candidatos que podem obter o TEM. Essa circunstância constitui igualmente uma violação do ponto 6.9 do código antidumping de 1994 (v. n.° 10 supra). Além disso, não pode excluir‑se que as autoridades chinesas se teriam oposto à composição da amostra se tivessem sabido que as instituições não tinham a intenção de examinar os pedidos de TEM/TI provenientes das empresas que não fazem parte da amostra. Nestas condições, o direito das recorrentes a uma protecção jurisdicional efectiva é igualmente comprometido, dado que não tiveram a possibilidade de apresentar os seus argumentos relativos ao indeferimento dos seus pedidos de TEM/TI.

107    O Conselho, apoiado pela Comissão, pela CEC e pelos produtores italianos, contestam a procedência dos argumentos das recorrentes.

 Apreciação do Tribunal Geral

108    Deve recordar‑se, a título preliminar, que, segundo jurisprudência constante, por força do princípio do respeito dos direitos de defesa, às empresas interessadas num processo de inquérito anterior à adopção de um regulamento antidumping deve, durante o processo administrativo, ter sido dada a possibilidade de darem a conhecer utilmente o seu ponto de vista sobre a realidade e a relevância dos factos e circunstâncias alegados e sobre os elementos de prova considerados pela Comissão em apoio da sua apreciação da existência de uma prática de dumping e do prejuízo que daí resultaria (acórdãos do Tribunal de Justiça de 27 de Junho de 1991, Al‑Jubail Fertilizer/Conselho, C‑49/88, Colect., p. I‑3187, n.° 17, e de 3 de Outubro de 2000, Industrie des poudres sphériques/Conselho, C‑458/98 P, Colect., p. I‑8147, n.° 99; acórdãos do Tribunal Geral de 19 de Novembro de 1998, Champion Stationery e o./Conselho, T‑147/97, Colect. p. II‑4137, n.° 55, e de 21 de Novembro de 2002, Kundan e Tata/Conselho, T‑88/98, Colect., p. II‑4897, n.° 132).

109    No caso em apreço, há que salientar que, como decorre dos considerandos 62, 64, 135 e 143 do regulamento provisório, a Comissão expôs que qualquer direito antidumping respeitante aos produtores que não fazem parte da amostra seria calculado segundo as disposições do artigo 9.°, n.° 6, do regulamento de base e que a margem de dumping desses produtores foi determinada calculando a média ponderada das margens de dumping das empresas que constituem a amostra.

110    A Comissão expôs, portanto no regulamento provisório a sua posição quanto ao método de cálculo da margem de dumping dos operadores que não fazem parte da amostra, consistente na aplicação da margem média de dumping das empresas que constituem a amostra. Esse método implicava que os pedidos de TEM/TI desses operadores não seriam examinados, já que tal exame não tem utilidade no quadro do procedimento em questão.

111    Resulta daí que as recorrentes tinham desde a fase da comunicação do regulamento provisório e do documento de divulgação intermédio (v. n.° 23 supra) a possibilidade de invocar o seu ponto de vista sobre o método utilizado pela Comissão para calcular a margem de dumping. Por essas mesmas razões, a alegação relativa à violação do ponto 6.9 do código antidumping de 1994 deve ser rejeitada, uma vez que essa disposição se limita a impor às autoridades de investigação que exponham os factos e as considerações que servem de base à imposição de direitos definitivos.

112    No que respeita à alegação relativa ao facto de que a Comissão deveria ter notificado às recorrentes a sua intenção de não examinar os seus pedidos de TEM/TI numa fase que lhes permitisse contestar utilmente a validade da amostra, deve salientar‑se que, como foi exposto no n.° 100 supra, a Comissão informou, no aviso de início do processo, os operadores em causa da possibilidade de recorrer à técnica da amostragem em conformidade com o disposto no artigo 17.° do regulamento de base e que, em tal hipótese, o cálculo das margens individuais podia ser pedido, em relação às empresas não incluídas na amostra, a título do disposto no artigo 17.°, n.° 3, do regulamento de base.

113    Atendendo ao facto de que a não aplicação dos pedidos de TEM/TI das empresas que não fazem parte da amostra constitui uma actuação conforme ao disposto no artigo 2.°, n.° 7, alínea b), e ao artigo 17.° do regulamento de base (v. n.os 88 a 91 supra), as recorrentes estavam, desde a abertura do inquérito, em posição de saber que a Comissão podia exonerar‑se do exame de tais pedidos, se os requisitos do artigo 17.°, n.° 3, desse regulamento estivessem reunidos. Além disso, a Comissão não estava obrigada a tomar uma posição definitiva a esse respeito desde a fase da abertura do inquérito, dado que, à época, não estava na posse dos elementos que lhe permitissem apreciar se tinha a possibilidade de calcular margens de dumping individuais para os operadores que não faziam parte da amostra. Portanto, essa alegação deve ser rejeitada.

114    Sendo as alegações expostas no n.° 106 supra baseadas na premissa de que as instituições não cumpriram as suas obrigações em matéria de protecção dos direitos de defesa das recorrentes, devem igualmente ser rejeitadas.

115    Daí resulta que o quarto fundamento deve ser rejeitado.

 Quanto ao sexto fundamento, relativo à violação do artigo 20.° do regulamento de base, à violação dos direitos de defesa e à falta de fundamentação

 Argumentos das partes

116    As recorrentes alegam que as instituições não lhes comunicaram de forma adequada a nova análise factual respeitante ao prejuízo sofrido pela indústria comunitária nem lhes proporcionaram a possibilidade de apresentar comentários sobre essa nova apreciação relativa à configuração dos direitos definitivos (v. n.os 24 a 30 supra). Além disso, a Comissão não explicou suficientemente as razões que impunham a mudança da sua análise e a utilização de dados diferentes dos contidos na sua primeira proposta.

117    Quando, no documento de divulgação final de 7 de Julho de 2006, a Comissão considerava que a importação de um volume de 140 milhões de pares de sapatos por ano não tinha efeito prejudicial para a indústria comunitária, diminuiu significativamente esse número para 41,5 milhões de pares no seu documento de divulgação final adicional de 28 de Julho de 2006, sem explicar as razões que justificam essa mudança que teve «o efeito perverso» de inverter, por intermédio de uma manipulação operada com base nos anos de referência, o valor dos direitos impostos entre a China e o Vietname. Quanto ao seu rácio económico, os contingentes instituídos por um sistema de direitos diferidos são destinados a fazer face às pressões resultantes do volume das importações que, todavia, não são consideradas ser procedentes de práticas desleais, ao passo que as medidas antidumping são concebidas para responder às práticas desleais de dumping. As diferenças entre os dois sistemas são também importantes ao nível do comércio internacional, uma vez que um sistema de direitos diferidos implica que um volume de importações seja isento de qualquer direito quando o sistema finalmente adoptado incide sobre a totalidade das importações. Atendendo a essas diferenças, o prazo de cinco dias concedido pela Comissão às recorrentes para apresentarem as suas observações sobre a nova proposta é insuficiente, facto de que as recorrentes se queixaram durante o procedimento administrativo.

118    O regulamento impugnado, no considerando 301 cuja última proposta da Comissão foi seguida, não comporta fundamentação suficiente face a esta divergência e não indica as razões que justificam a aplicação do novo método. Em contrapartida, o considerando 301 do regulamento impugnado limita‑se a reproduzir os termos do ponto 280 do documento de divulgação final adicional, que não contém mais informações. Além disso, o documento de divulgação final adicional não contém qualquer número ou cálculo que sirva de base ao método descrito no considerando 301 do regulamento impugnado e não permite explicar o recurso a anos, valores e volumes diferentes dos que tinham sido utilizados na primeira proposta. As instituições violaram, por outro lado, o artigo 20.° do regulamento de base, que exige a comunicação dos pormenores que sustentam os factos e as considerações essenciais com base nos quais a Comissão entendeu propor a adopção das medidas definitivas. Com efeito, a apreciação factual que serve de base à nova abordagem da Comissão não foi explicada nem justificada.

119    De resto, a Comissão violou os direitos de defesa das recorrentes na medida em que não lhes permitiu fazer valer utilmente a sua posição sobre um número de questões importantes, como o carácter razoável da nova proposta, a exactidão e a pertinência dos factos e das circunstâncias alegados, os cálculos efectuados e os elementos apresentados pela Comissão em apoio das suas conclusões sobre o dumping e o prejuízo sofrido pela indústria comunitária. Com efeito, os dois sistemas são caracterizados por diferenças fundamentais na análise factual em que se baseiam. Essas diferenças deram lugar a consequências radicalmente opostas para os produtores chineses e vietnamitas sem que, mesmo assim, a Comissão tenha explicado como chegara a esse resultado ou tenha dado ocasião aos interessados de exercer os seus direitos de defesa.

120    A tentativa do Conselho de minimizar as diferenças entre as propostas expondo que o sistema adoptado tem em conta o facto de que só importações acima de certos limiares em volume causam prejuízo implica a imposição de direitos antidumping sobre importações que não causam prejuízo, o que é contrário ao artigo 1.°, n.° 1, do regulamento de base. O facto de as recorrentes terem podido formular algumas observações em relação a esse sistema, num prazo inferior ao prazo mínimo de dez dias previsto pelo artigo 20.°, n.° 5, do regulamento de base, não pode, por, outro lado, ser considerado contra elas nem pode remediar a insuficiência das informações fornecidas pela Comissão. Com efeito, a questão de saber se o prazo concedido pela Comissão era adequado para efeitos do respeito dos direitos de defesa das recorrentes deve ser apreciada à luz da extensão da mudança no método adoptado pela Comissão bem como da inexistência de dados ou de explicações sobre a nova apreciação jurídica e factual. A esse propósito, as recorrentes observam que, quando as instituições não proporcionam explicações adequadas sobre o método e a apreciação dos factos que elas efectuam, o facto de poder ter formulado alguns comentários é de valor limitado e não implica que tenham sido satisfeitas as exigências do artigo 20.° do regulamento de base, dos princípios gerais do direito comunitário e do direito da OMC. Além disso, a própria Comissão adoptou um calendário muito restritivo, o que terá excluído qualquer dilação do prazo concedido para formular comentários sobre o documento de divulgação final adicional. Além disso, as discussões que duraram vários meses incidiram sobre o sistema de direitos diferidos e não sobre o sistema finalmente adoptado.

121    As recorrentes consideram que, em razão das falhas do documento de divulgação final adicional e do prazo insuficiente estabelecido, não tiveram a possibilidade de expor à Comissão as razões pelas quais a abordagem adoptada era inadequada ou desfavorável nem de apresentar o seu ponto de vista sobre o método ou os dados quantitativos que servem de base à proposta contida nesse documento. Assim, as instituições infringiram o artigo 20.° do regulamento de base ao não comunicarem às recorrentes os factos e considerações essenciais que servem de base ao regulamento impugnado.

122    Finalmente, as recorrentes acrescentam que, se tivessem sido colocadas de forma adequada em condições de formular comentários sobre o documento de divulgação final adicional, teriam avançado, em primeiro lugar, que o sistema proposto equivalia a uma violação do artigo 1.°, n.° 1, do regulamento de base, na medida em que redunda na imposição de direitos antidumping a importações que não causam prejuízo, em segundo lugar, que a margem de prejuízo individual deveria ter sido calculada para cada uma de entre elas e, em terceiro lugar, que a última proposta da Comissão era desrazoável e desproporcionada, na medida em que a apreciação factual revista, que não foi explicada nem justificada, tem o «efeito perverso» de inverter o encargo respectivo das medidas antidumping entre a China e o Vietname.

123    O Conselho observa que tanto o sistema de direitos diferidos como o método finalmente utilizado assentam na ideia de que, no caso em apreço, só as importações que excedessem um certo volume causavam um prejuízo importante e que essa circunstância deveria ter sido tomada em conta no método escolhido para a fixação da taxa dos direitos definitivos. Isso seria apenas a forma de ter em conta essa circunstância que difere em função do método do cálculo dos direitos definitivos finalmente escolhido.

124    O Conselho sublinha que, pela adopção do documento de divulgação final adicional, a Comissão não recorreu ao «valor não prejudicial» que as recorrentes afirmam não poder calcular face aos elementos que lhes foram comunicados. Pelo contrário, o elemento quantitativo do dumping, isto é, o volume das importações que são objecto de dumping, continuou a ser o ponto essencial do novo método, quando qualquer referência ao valor das importações para um ano de referência pode ser calculado com base nos elementos incluídos nos pontos 157 e 159 do documento de divulgação final.

125    Além disso, a exposição do método segundo o qual o impacto económico do volume de importações que não tem efeito prejudicial foi tomada em consideração na determinação do nível de eliminação do prejuízo (v. n.° 29 supra) permitiu às recorrentes apresentar observações pormenorizadas a esse respeito no seu correio electrónico de 2 de Agosto de 2006. Se as recorrentes tivessem necessidade de informações complementares para exercer os seus direitos, incumbir‑lhes‑ia apresentar um pedido específico nesse sentido.

126    O Conselho, apoiado pela CEC, refuta igualmente a violação dos direitos de defesa alegada em razão do facto de as recorrentes só terem disposto de cinco dias para fazer valer a sua posição em relação ao documento de divulgação final adicional. Dado que, em primeiro lugar, as recorrentes não formularam considerações quanto ao documento de divulgação final adicional nem um pedido de prorrogação do prazo concedido para esse efeito, em segundo lugar, o processo estava já numa fase bastante avançada e, em terceiro lugar, a tomada em consideração do elemento quantitativo do dumping foi debatida durante vários meses, o prazo em questão deveria ser considerado suficiente. De qualquer forma, as recorrentes não demonstraram estar na impossibilidade de defender os seus interesses em razão desse prazo, uma vez que elas apresentaram observações detalhadas na matéria, sem que a petição faça alusão a outros elementos que poderiam ter apresentado. O Conselho considera que, nessas condições, não é necessário comentar os argumentos que as recorrentes teriam apresentado, se lhes tivesse sido concedido um prazo mais longo.

127    No que respeita, por fim, aos argumentos relativos à legalidade do sistema finalmente adoptado à luz do artigo 1.°, n.° 1, do regulamento de base, o Conselho alega que há que os ignorar, já que o presente fundamento diz respeito apenas à violação dos direitos de defesa das recorrentes.

 Apreciação do Tribunal Geral

128    Através do seu sexto fundamento, em primeiro lugar, as recorrentes alegam que as instituições violaram o artigo 20.° do regulamento de base pelo facto de a Comissão, por um lado, não ter comunicado os elementos em que baseou os cálculos efectuados no documento de divulgação final adicional e, por outro, não lhes concedeu um prazo suficiente e conforme ao disposto no n.° 5 do mesmo artigo para apresentar observações completas sobre a nova abordagem.

129    Em segundo lugar, as recorrentes alegam que as instituições não expuseram nem nos documentos de divulgação final ou de divulgação final adicional nem no regulamento impugnado os motivos que justificavam o método aplicado a fim de tomar em conta a existência de um volume de importações que não causa prejuízo e que consiste em diminuir a margem de prejuízo em vez de isentar as importações não prejudiciais da imposição de direitos antidumping. Estas circunstâncias constituem uma violação dos direitos de defesa das recorrentes bem como falta de fundamentação.

130    A título preliminar, há que salientar que o artigo 20.° do regulamento de base prevê regras relativas ao exercício do direito das partes em causa, nomeadamente dos exportadores, a serem ouvidos, o qual constitui um dos direitos fundamentais reconhecidos pela ordem jurídica comunitária e comporta o direito, de ser informado dos principais factos e considerações com base nos quais é encarada a hipótese de instituir direitos antidumping definitivos (v., neste sentido, acórdãos Al‑Jubail Fertilizer/Conselho, n.° 108 supra, n.° 15, e Champion Stationery e o./Conselho, n.° 108 supra, n.° 55).

131    Nestas condições, há que interpretar os argumentos das recorrentes relativos à violação do artigo 20.° do regulamento de base como referindo‑se a uma violação dos seus direitos de defesa, como são consagrados pela ordem jurídica comunitária, inclusive por essa disposição (v., neste sentido, acórdão Kundan e Tata/Conselho, n.° 108, supra, n.° 131).

132    A esse propósito, há que recordar que, segundo a jurisprudência citada no n.° 108 supra, as empresas envolvidas num inquérito que preceda a adopção de um regulamento antidumping devem ser colocadas em condições, no decurso do procedimento administrativo, de dar a conhecer utilmente o seu ponto de vista sobre a realidade e a pertinência dos factos e circunstâncias alegados e sobre os elementos de prova invocados pela Comissão em apoio da sua apreciação sobre a existência de uma prática de dumping e do prejuízo que daí resulta.

133    Deve igualmente salientar‑se, neste contexto, que o carácter incompleto da divulgação final, só leva à ilegalidade de um regulamento que institui direitos antidumping definitivos quando, devido a essa omissão, as partes interessadas não tiverem sido colocadas em condições de defenderem utilmente os seus interesses Tal será nomeadamente o caso quando a omissão incide sobre factos ou considerações diferentes dos utilizados para as medidas provisórias, aos quais deve ser concedida uma atenção particular na divulgação final, segundo o artigo 20.°, n.° 2, do regulamento de base. Tal é igualmente o caso, por identidade de razões, quando a omissão incidir sobre factos ou considerações diferentes daqueles em que se baseia uma decisão tomada pela Comissão ou pelo Conselho posteriormente à comunicação do documento de divulgação final, como decorre do artigo 20.°, n.° 4, última frase, do regulamento de base.

134    No caso em apreço, como foi salientado nos n.os 25 a 27 supra, a Comissão preconizou, em primeiro lugar, no documento de divulgação final, um sistema de direitos diferidos, baseado no facto de só as importações de mais de 140 milhões de pares de sapatos por ano causarem um prejuízo na acepção do artigo 3.° do regulamento de base. Esta apreciação apoiava‑se na existência do regime de contingentes quantitativos até 1 de Janeiro de 2005, que teria impedido esse prejuízo, bem como num cálculo das quantidades que foram importadas da China em 2005. Segundo essa proposta, devia ser aplicado um direito antidumping definitivo às importações originárias da China para além de 140 milhões de pares de sapatos por ano. Esse direito era igual à margem de subcotação dos preços de referência, no caso dos autos 23%.

135    Todavia, como foi exposto nos n.os 29 e 30 supra, a Comissão alterou, no quadro do documento de divulgação final adicional, a sua proposta relativa à forma dos direitos necessária para a eliminação do prejuízo. Essa nova abordagem assentava igualmente na existência de um volume de importações que não causa prejuízo na acepção do artigo 3.° do regulamento de base. No entanto, segundo o documento de divulgação final adicional, tanto o método de cálculo desse volume de importações não prejudicial como o impacto desse volume na forma dos direitos definitivos propostos diferiam dos evocados no documento de divulgação final.

136    Em particular, no documento de divulgação final adicional, em primeiro lugar, a Comissão recordou que a margem de subcotação dos preços de referência para as importações provenientes da China ascendia a 23%. Em segundo lugar, estabeleceu que o volume das importações provenientes desse país durante o período de inquérito ascendia a 38% das importações provenientes dos dois países em causa. Essa percentagem, aplicada à totalidade das importações provenientes da China e do Vietname em 2003 (109 milhões de pares de sapatos), correspondia a cerca de 41,5 milhões de pares de sapatos, volume que foi considerado não causar prejuízo à indústria comunitária. Em terceiro lugar, a Comissão considerou que esse volume representava 28,26% das importações provenientes da China em 2005. Finalmente, em quarto lugar, reduziu a margem de prejuízo inicialmente estabelecida (23%) de 28,26% o que deu lugar a uma margem de prejuízo «ponderada» de 16,5%.

137    Resulta do que precede que as diferenças entre o método apresentado no documento de divulgação final e o apresentado no documento de divulgação final adicional são as seguintes. Em primeiro lugar, em vez de estabelecer o volume anual de importações não prejudicial ao nível das importações provenientes da China em 2005, a Comissão estabeleceu esse volume anual multiplicando os 109 milhões de pares de sapatos importados em 2003 por 38%. Trata‑se da percentagem que representavam as importações originárias desse país em relação ao conjunto das importações provenientes dos dois países em causa durante o período de inquérito. Em segundo lugar, em vez de isentar esse volume anual, qualificado de não prejudicial nos pontos 278 a 280 do documento de divulgação final adicional, da aplicação de um direito antidumping, a Comissão escolheu ter em conta esse volume diminuindo o nível de eliminação do prejuízo e não aplicando os direitos antidumping a partir do primeiro par importado.

138    A este propósito, deve reconhecer‑se que o facto de a Comissão ter alterado a sua análise na sequência dos comentários que as partes interessadas formularam sobre o documento de divulgação final não constitui, por si só, uma violação dos direitos de defesa. Com efeito, como resulta do artigo 20.°, n.° 4, última frase, do regulamento de base, o documento de divulgação final não constitui um obstáculo a qualquer decisão posterior da Comissão ou do Conselho. Essa disposição limita‑se a impor à Comissão o dever de comunicar, desde que possível, os factos e as considerações diferentes dos que apoiam a sua abordagem inicial contida no documento de divulgação final. É, com efeito, por intermédio dessa exposição que os interessados estão em condições de compreender os motivos que levaram as instituições a adoptar uma posição diferente.

139    Por conseguinte, para determinar se a Comissão respeitou os direitos das recorrentes que decorrem do artigo 20.°, n.° 4, última frase, do regulamento de base, há que verificar se a Comissão lhes comunicou os factos e as considerações feitas para efeitos da nova análise sobre o prejuízo e sobre a forma das medidas requeridas para o eliminar, na medida em que diferiam das feitas no documento de divulgação final (v. n.° 133 supra).

140    A esse propósito, antes de mais, a Comissão expôs no documento de divulgação final adicional que a sua nova abordagem permitia não fazer distinções entre as diferentes categorias de importadores.

141    Em seguida, quanto aos elementos na base dos quais a Comissão procedeu ao ajustamento da margem de prejuízo de 23 para 16,5%, é sem razão que as recorrentes alegam que não tiveram a eles acesso. Com efeito, o método descrito no n.° 136 supra respeitante ao ajustamento da margem de prejuízo tendo em conta um volume de importações não prejudicial figura no documento de divulgação final adicional. É verdade que esse documento não dá informação sobre o volume exacto das importações provenientes da China em 2005, que permitiria verificar que a percentagem de 28,26% corresponde à realidade. Todavia, dado que, segundo a Comissão, os 41,5 milhões de pares de sapatos representam 28,26% da totalidade das importações provenientes da China em 2005, pode daí deduzir‑se que essas importações ascenderam a 146,85 milhões de pares de sapatos. Esse cálculo foi retomado, aliás, pelas próprias recorrentes no seu correio electrónico de 2 de Agosto de 2006 (v. n.° 31 supra).

142    Resulta das considerações que precedem que a Comissão comunicou às recorrentes o raciocínio que seguiu para calcular a margem de prejuízo tendo em conta um volume de importações não prejudicial. A Comissão expôs a totalidade dos elementos quantificados que considerou pertinentes para esse efeito, de modo que os direitos de defesa das recorrentes não foram violados nesse aspecto.

143    Há também que sublinhar, a exemplo do Conselho (v. n.° 127 supra) que o fundamento das recorrentes, como foi desenvolvido nas petições, é relativo à violação dos seus direitos de defesa e não do artigo 1.°, n.° 1, do regulamento de base. Daí resulta que a questão de saber se o sistema adoptado no regulamento impugnado é compatível com o artigo 1.°, n.° 1, do regulamento de base, na medida em que impõe direitos antidumping a importações inferiores ao limiar anual que foi considerado como não causando prejuízo, não foi submetida como tal à fiscalização do Tribunal.

144    Quanto ao prazo concedido, as partes estão de acordo quanto ao facto de que expirava em 2 de Agosto de 2006.

145    Concedendo às recorrentes um prazo inferior a dez dias para comentar o documento de divulgação final adicional, a Comissão infringiu o artigo 20.°, n.° 5, do regulamento de base (acórdão Champion Stationery e o./Conselho, n.° 108 supra, n.° 80). Todavia, essa circunstância não pode, em si mesma, conduzir à anulação do regulamento impugnado. Com efeito, é necessário ainda demonstrar que o facto de dispor de um prazo inferior ao prazo legal foi de molde a afectar concretamente os seus direitos de defesa no quadro do processo em causa (acórdão do Tribunal Geral de 28 de Outubro de 2004, Shanghai Teraoka Electronic/Conselho, T‑35/01, Colect., p. II‑3663, n.° 331).

146    A este propósito, deve salientar‑se que as recorrentes recordaram, no quadro do seu correio electrónico de 2 de Agosto de 2006, os cálculos da Comissão e que apresentaram um cálculo alternativo que chegou a resultado diferente e, em sua opinião, equitativo. Portanto, as recorrentes compreenderam o raciocínio da Comissão e estiveram em condições de lhe propor uma outra abordagem. Além disso, as recorrentes não explicaram a razão pela qual não estavam em condições de alegar uma violação do artigo 1.°, n.° 1, do regulamento de base no prazo que a Comissão lhes concedeu. Nestas circunstâncias, deve reconhecer‑se que estiveram em condições de fazer valer utilmente o seu ponto de vista.

147    Daqui decorre que os direitos de defesa das recorrentes não foram violados.

148    Por identidade de razões, há que rejeitar a argumentação das recorrentes deduzida da falta de fundamentação no que respeita ao método aplicado para o cálculo do nível de eliminação do prejuízo. Com efeito, a fundamentação do regulamento impugnado deve ser apreciada tendo em conta, nomeadamente, as informações que foram comunicadas às recorrentes e as observações que apresentaram durante o procedimento administrativo (acórdão do Tribunal Geral de 15 de Dezembro de 1999, Petrotub e Republica/Conselho, T‑33/98 e T‑34/98, Colect., p. II‑3837, n.° 107).

149    No caso dos autos, tal como foi salientado no n.° 36 supra, os considerandos 296 a 301 do regulamento impugnado contêm as apreciações que levaram o Conselho à adopção do sistema finalmente aplicado. Por conseguinte, atento o facto de a Comissão ter comunicado às recorrentes o raciocínio que seguiu para calcular a margem de prejuízo tendo em conta um volume de importações não prejudicial e de lhes ter exposto igualmente a totalidade dos elementos quantificados que considerou serem pertinentes para esse efeito (v. n.os 140 a 142 supra), há que concluir que o regulamento impugnado está suficientemente fundamentado do ponto de vista do direito.

150    Portanto, o sexto fundamento deve ser rejeitado.

 Quanto ao sétimo fundamento, relativo a um erro de direito e a um erro manifesto de apreciação no que respeita ao prejuízo sofrido pela indústria comunitária

 Argumentos das partes

151    As recorrentes consideram que a decisão relativa ao prejuízo não é baseada num período suficientemente longo de importações normais e, por isso, não assenta em dados fiáveis e objectivos. Com efeito, dado que o período de inquérito se estende de 1 de Abril de 2004 a 31 de Março de 2005, a Comissão concluiu que o aumento das importações após a extinção do regime de contingentes teve um efeito prejudicial particularmente sensível para a indústria comunitária tomando em conta apenas o primeiro trimestre de 2005. Os indícios manifestos da existência de um prejuízo importante em 2004 aos quais faz referência a Comissão no ponto 227 que figura no novo título H do documento de divulgação final adicional não significam que um prejuízo importante tenha efectivamente sido causado em 2004. A inexistência de prejuízo importante em 2004 é corroborada pelo facto de o aumento das importações desse ano ter sido fraco em comparação com 2003 e pelo ponto 285 do documento de divulgação final.

152    Ora, os três primeiros meses de 2005 constituem o período inicial de abertura de um mercado submetido durante mais de doze anos à aplicação de um regime de contingentes quantitativos estrito. Como a Comissão salientou no documento de divulgação final, esse período a seguir à extinção do regime de contingentes foi artificialmente falseado por expectativas ligadas a esse evento. Segundo as recorrentes, o regulamento impugnado é, portanto, fundado em dados relativos a um período curto que não podia fornecer elementos fiáveis devido ao levantamento dos contingentes. Daí resulta que o Conselho violou o artigo 3.°, n.° 2, do regulamento de base. Além disso, nada prova que a Comissão tenha examinado os factores de prejuízo na totalidade do período considerado.

153    Finalmente, as recorrentes recordam que o regime de contingentes não se destinava a impedir as consequências das importações que são objecto de dumping.

154    O Conselho, apoiado pela Comissão, pela CEC e pelos produtores italianos, contesta a procedência dos argumentos das recorrentes.

 Apreciação do Tribunal Geral

155    Em primeiro lugar, há que salientar que a instituição de direitos antidumping não constitui uma sanção de um comportamento anterior, mas uma medida de defesa e protecção contra a concorrência desleal resultante das práticas de dumping. Assim, é necessário levar a cabo o inquérito com base em informações tão actuais quanto possível a fim de poder fixar os direitos antidumping que são adequados à protecção da indústria comunitária contra as práticas de dumping (acórdão Industries des poudres sphériques/Conselho, n.° 108 supra, n.os 91 e 92, e acórdão do Tribunal Geral de 14 de Novembro de 2006, Nanjing Metalink/Conselho, T‑138/02, Colect., p. II‑4347, n.° 60).

156    Assim, quando as instituições reconhecem que as importações de um produto sujeito até então a restrições quantitativas aumentam após a extinção das referidas restrições, podem ter em conta esse crescimento para efeitos da sua apreciação do prejuízo sofrido pela indústria comunitária.

157    Em segundo lugar, a apreciação da Comissão que figura no n.° 283 do documento de divulgação final, segundo a qual o volume dos produtos importados aumentou após a extinção do regime de contingentes, não demonstra que as instituições se tenham fundado unicamente nesse elemento quantitativo para concluir pela existência de um prejuízo.

158    Finalmente, como resulta dos considerandos 162, 168 a 170, 187 a 206 e 216 a 240 do regulamento impugnado, as instituições tomaram em conta vários factores, respeitantes ao prejuízo e ao nexo de causalidade, relativos não só ao último trimestre do período de inquérito, mas também ao período considerado.

159    Daqui resulta que o sétimo fundamento deve ser rejeitado.

160    Nestas condições, há que negar provimento ao recurso na sua totalidade.

 Quanto às despesas

161    Por força do disposto no artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas, se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo as recorrentes sido vencidas, há que condená‑las nas despesas, em conformidade com os pedidos do Conselho.

162    Em conformidade com o disposto no artigo 87.°, n.° 4, do Regulamento de Processo, a Comissão, a CEC e os produtores italianos suportarão as suas próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Oitava Secção)

decide:

1)      É negado provimento aos recursos.

2)      A Zhejiang Aokang Shoes Co., Ltd e a Wenzhou Taima Shoes Co., Ltd suportarão as suas próprias despesas, bem como as efectuadas pelo Conselho da União Europeia.

3)      A Comissão da Comunidades Europeias, a Confédération européenne de l’industrie de la chaussure (CEC), a BA.LA. di Lanciotti Vittorio & C. Sas e as dezasseis outras intervenientes cujos nomes figuram em anexo suportarão as suas próprias despesas.

Martins Ribeiro

Papasavvas

Dittrich

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 4 de Março de 2010

Assinaturas


Índice


Quadro jurídico

Antecedentes do litígio e regulamento impugnado

Tramitação processual e pedidos das partes

Questão de direito

Quanto aos três primeiros fundamentos bem como quanto ao quinto, baseados na violação do artigo 2.°, n.° 7, alíneas b) e c), e do artigo 9.°, n.° 5, do regulamento de base, na violação do princípio da igualdade de tratamento, no princípio da protecção da confiança legítima e no cálculo errado da margem de dumping das recorrentes

Argumentos das partes

Apreciação do Tribunal Geral

Quanto ao quarto fundamento, relativo à violação dos direitos de defesa, à violação do dever de fundamentação e ao direito a uma protecção jurisdicional efectiva

Argumentos das partes

Apreciação do Tribunal Geral

Quanto ao sexto fundamento, relativo à violação do artigo 20.° do regulamento de base, à violação dos direitos de defesa e à falta de fundamentação

Argumentos das partes

Apreciação do Tribunal Geral

Quanto ao sétimo fundamento, relativo a um erro de direito e a um erro manifesto de apreciação no que respeita ao prejuízo sofrido pela indústria comunitária

Argumentos das partes

Apreciação do Tribunal Geral

Quanto às despesas


Anexo

Calzaturificio Elisabet Srl, com sede em Monte Urano (Itália),

Calzaturificio Iacovelli di Iacovelli Giuseppe & C. Snc, com sede em Monte Urano,

Calzaturificio Leopamy Srl, com sede em Monte Urano,

Calzaturificio Lunella Srl, com sede em Monte Urano,

Calzaturificio Mia Shoe Snc di Gattafoni Carlo & C., com sede em Monte Urano,

Calzaturificio Primitempi di Monaldi Geri, com sede em Monte Urano,

Calzaturificio R.G. di Rossi & Galiè Srl, com sede em Monte Urano,

Calz. S.G. di Seghetta Giampiero e Sergio Snc, com sede em Monte Urano,

Carim Srl, com sede em Monte Urano,

Florens Shoes SpA, com sede em Monte Urano,

Gattafoni Shoe Snc di Gattafoni Giampaolo & C., com sede em Monte Urano,

Grif Srl, com sede em Monte Urano,

Missouri Srl, com sede em Monte Urano,

New Swing Srl, com sede em Monte Urano,

Podosan Medical Shoes di Cirilli Michela, com sede em Monte Urano,

Viviane Sas, com sede em Monte Urano.


* Língua do processo: inglês.