Language of document : ECLI:EU:C:2017:720

Processos apensos C361/15 P e C405/15 P

Easy Sanitary Solutions BV e Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia (EUIPO)

contra

Group Nivelles NV

«Recurso de decisão do Tribunal Geral — Propriedade intelectual — Desenhos ou modelos comunitários — Regulamento (CE) n.o 6/2002 — Artigo 5.o — Novidade — Artigo 6.o — Caráter singular — Artigo 7.o — Divulgação ao público — Artigo 63.o — Competências do Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia (EUIPO) no âmbito da produção de prova — Ónus da prova que incumbe ao requerente da nulidade — Requisitos atinentes à reprodução do desenho ou modelo anterior — Desenho que representa um sifão de chuveiro — Indeferimento do pedido de declaração de nulidade pela Câmara de Recurso»

Sumário – Acórdão do Tribunal de Justiça (Quarta Secção) de 21 de setembro de 2017

1.        Desenhos ou modelos comunitários – Renúncia e nulidade – 92170 / Pedido de declaração de nulidade baseado na existência de um desenho ou modelo anterior – Ónus da prova

[Regulamento n.° 6/2002 do Conselho, considerando 12, artigos 3.°, alínea a), 5.° a 7.°, 25.°, n.° 1, alínea b), 52.°, n.os 1 e 2, e 53.°, n.os 1 e 2; Regulamento n.° 2245/2002 da Comissão, artigo 28.°, n.° 1, alínea b), v)]

2.        Recurso de decisão do Tribunal Geral – Fundamentos – Fundamentos de um acórdão que enfermam de violação do direito da União – Parte decisória procedente por outros fundamentos de direito – Rejeição

(Artigo 256.°, n.° 1, TFUE; Estatuto do Tribunal de Justiça, artigo 58.°, primeiro parágrafo)

3.        Desenhos ou modelos comunitários – Motivos de nulidade – Inexistência de nulidade – Divulgação anterior de um desenho ou modelo idêntico Desenho ou modelo anterior destinado a ser incorporado num produto diferente ou a ser nele aplicado – Irrelevância

(Regulamento n.° 6/2002 do Conselho, artigos 5.°, n.° 1, 10.°, 19.° e 36.°)

4.        Desenhos ou modelos comunitários – Motivos de nulidade – Falta de caráter individual – Desenho ou modelo que não produz no utilizador informado uma impressão global diferente da produzida pelo desenho ou modelo anterior – Utilizador informado – Conceito – Conhecimento pelo utilizador avisado de um desenho ou modelo anterior incorporado num produto de um setor industrial diferente do abrangido pelo desenho ou modelo contestado ou aplicado a esse produto – Irrelevância

(Regulamento n.° 6/2002 do Conselho, artigos 5.° a 7.°)

1.      Por um lado, segundo o artigo 28.o, n.o 1, alínea b), v), do Regulamento n.o 2245/2002 de execução do Regulamento (CE) n.° 6/2002 do Conselho relativo aos desenhos ou modelos comunitários, quando o fundamento do pedido de declaração de nulidade de um desenho ou modelo for o facto de o desenho ou modelo comunitário não reunir os requisitos previstos nos artigos 5.o e 6.o do Regulamento n.o 6/2002, o pedido de declaração de nulidade deve indicar e reproduzir os desenhos ou modelos anteriores que poderiam constituir um obstáculo à novidade ou à singularidade do desenho ou modelo comunitário registado, bem como os documentos comprovativos da existência desses desenhos ou modelos anteriores.

Por outro lado, no âmbito de um pedido de declaração de nulidade baseado no artigo 25.o do Regulamento n.o 6/2002, resulta do artigo 52.o, n.os 1 e 2, e do artigo 53.o, n.os 1 e 2, desse regulamento que não cabe ao EUIPO nem ao Tribunal Geral, mas a quem invoca o motivo de nulidade previsto no artigo 25.o, n.o 1, alínea b), do mesmo regulamento, fornecer os elementos aptos a demonstrar a existência desse motivo.

Por conseguinte, quando o requerente da nulidade invoca o motivo de nulidade previsto no artigo 25.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 6/2002, deve fornecer elementos aptos a demonstrar que o desenho ou modelo contestado não respeita as condições fixadas nos artigos 4.o a 9.o do mesmo regulamento.

Além disso, no tocante à alegada violação do artigo 5.o do Regulamento n.o 6/2002, importa acrescentar que, ao exigir para que o desenho ou modelo seja considerado novo que «nenhum desenho ou modelo idêntico [tenha] sido divulgado ao público», esta disposição implica que a apreciação da novidade de um desenho ou modelo se deva efetuar por comparação com um ou vários desenhos ou modelos precisos, individualizados, determinados e identificados de entre todos os desenhos ou modelos divulgados ao público anteriormente.

Importa referir, a este respeito, que, segundo o artigo 3.o, alínea a), do mesmo regulamento, o desenho ou modelo é definido como «a aparência da totalidade ou de uma parte de um produto resultante das suas características, nomeadamente, das linhas, contornos, cores, forma, textura e/ou materiais do próprio produto e/ou da sua ornamentação». Daqui decorre que, no quadro do sistema previsto no Regulamento n.o 6/2002, a aparência constitui o elemento determinante de um desenho ou modelo.

Por conseguinte, o facto de uma característica de um desenho ou modelo ser visível constitui uma condição essencial dessa proteção. Assim, é referido no considerando 12 do Regulamento n.o 6/2002 que a proteção dos desenhos ou modelos não é extensiva aos componentes que não são visíveis durante a utilização normal do produto, nem às características invisíveis de um componente quando este se encontra montado e que portanto estas características não devem ser tidas em consideração para apreciar se outras características desse desenho ou modelo preenchem as condições para obtenção de proteção.

Resulta das considerações que precedem que é essencial que as instâncias do EUIPO disponham de uma imagem do desenho ou modelo anterior, que deve permitir apreender a aparência do produto em que o desenho ou modelo está incorporado e identificar de maneira precisa e exata o desenho ou modelo anterior a fim de proceder, em conformidade com os artigos 5.o a 7.o do Regulamento n.o 6/2002, à apreciação da novidade e singularidade do desenho ou modelo contestado e à comparação que ela implica entre os desenhos ou modelos em causa. Com efeito, examinar se o desenho ou modelo contestado é efetivamente desprovido de novidade ou de singularidade exige manifestamente que se disponha de um desenho ou modelo anterior preciso e determinado.

Daqui decorre que cabe à parte que pediu a declaração de nulidade fornecer ao EUIPO as indicações necessárias e, em especial, a identificação e a reprodução precisas e completas do desenho ou modelo cuja anterioridade é alegada, a fim de demonstrar que o desenho ou modelo contestado não pode ser validamente registado.

(cf. n.os 58‑65)

2.      Resulta contudo da jurisprudência do Tribunal de Justiça que um erro de direito cometido pelo Tribunal Geral não é suscetível de invalidar o acórdão recorrido se a sua parte decisória se mostrar fundada por outras razões jurídicas.

(cf. n.° 73)

3.      Resulta do artigo 5.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 6/2002 relativo aos desenhos ou modelos comunitários que um desenho ou modelo comunitário registado será considerado novo se nenhum desenho ou modelo idêntico tiver sido divulgado ao público antes da data de depósito do pedido de registo do desenho ou modelo para o qual é reivindicada proteção ou, caso seja reivindicada prioridade, antes da data de prioridade.

A letra desta disposição não faz depender a novidade de um desenho ou modelo dos produtos em que é suscetível de ser incorporado ou em que é suscetível de ser aplicado.

Importa ainda lembrar que, em conformidade com o artigo 10.o, n.o 1, do Regulamento n.o 6/2002, a proteção conferida pelo desenho ou modelo comunitário abrange «qualquer desenho ou modelo» que não suscite no utilizador informado uma impressão visual global diferente.

Assim, se se aceitasse a posição de que a proteção de um desenho ou modelo depende da natureza do produto em que esse desenho ou modelo está incorporado ou ao qual é aplicado, tal proteção seria limitada aos desenhos ou modelos pertencentes a um setor determinado. Essa posição não pode, portanto, ser acolhida.

Além disso, resulta quer do artigo 36.o, n.o 6, quer do artigo 19.o, n.o 1, do Regulamento n.o 6/2002 que um desenho ou modelo comunitário registado confere ao seu titular o direito exclusivo de utilizar em todo o tipo de produtos, e não apenas ao produto indicado no pedido de registo, o desenho ou modelo em causa.

Com efeito, nos termos do referido artigo 36.o, n.o 6, as informações referidas, designadamente, no n.o 2 desse mesmo artigo, não afetam o âmbito de proteção do desenho ou modelo enquanto tal. Por conseguinte, essas informações, que consistem na indicação dos produtos em que o desenho ou modelo se destina a ser incorporado ou aplicado, não podem limitar a proteção desse desenho ou modelo, tal como prevista, em especial, no artigo 10.o do Regulamento n.o 6/2002.

Quanto ao artigo 19.o, n.o 1, desse regulamento, a referência a «um produto» no qual o desenho ou modelo está incorporado ou ao qual foi aplicado não permite concluir que o âmbito da proteção do desenho ou modelo comunitário é limitado ao produto em que esse desenho ou modelo está incorporado ou ao qual foi aplicado.

Tendo em conta a interpretação dos artigos 10.o e 19.o e do artigo 36.o do Regulamento n.o 6/2002, um desenho ou modelo comunitário não pode ser considerado novo, na aceção do artigo 5.o, n.o 1, deste Regulamento, se um desenho ou modelo idêntico tiver sido divulgado ao público antes das datas precisadas nesta disposição, ainda que esse desenho ou modelo anterior se destine a ser incorporado num produto diferente ou se destine a ser aplicado nele. Com efeito, o facto de a proteção conferida a um desenho ou modelo não se limitar apenas aos produtos em que se destina a ser incorporado ou aos quais se destina a ser aplicado implica necessariamente que a apreciação da novidade de um desenho ou modelo não deve também ser limitada apenas a esses produtos.

(cf. n.os 89‑96)

4.      Nos termos do artigo 6.o do Regulamento n.o 6/2002 relativo aos desenhos ou modelos comunitários, um desenho ou modelo tem caráter singular se a impressão global que suscita no utilizador informado diferir da impressão global suscitada nesse utilizador por qualquer desenho ou modelo divulgado ao público. O Tribunal de Justiça já declarou que o conceito de utilizador informado, que não é definido neste regulamento, designa um utilizador dotado não de uma atenção média, mas de uma vigilância especial, em razão da sua experiência pessoal ou do seu amplo conhecimento do setor em causa.

É verdade que, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, o adjetivo «informado» sugere que, sem ser um criador ou um perito técnico, o utilizador conhece diferentes desenhos ou modelos existentes no setor em causa, dispõe de um certo grau de conhecimentos quanto aos elementos que estes desenhos ou modelos normalmente incluem e, devido ao seu interesse nos produtos em causa, demonstra um grau de atenção relativamente elevado quando os utiliza.

Todavia, o conceito de utilizador informado não pode ser interpretado no sentido de que é só quando esse utilizador conhece o desenho ou modelo anterior que esse desenho ou modelo anterior pode obstar ao reconhecimento da singularidade do desenho ou modelo posterior. Com efeito, essa interpretação colide com o artigo 7.o do Regulamento n.o 6/2002.

A este respeito, importa salientar que, nos termos dos artigos 5.o e 6.o do Regulamento n.o 6/2002, só há que comparar um desenho ou modelo com outro para constatar a novidade e a singularidade do primeiro se o segundo tiver sido divulgado ao público.

Quando um desenho ou modelo tiver sido considerado como tendo sido divulgado ao público, no sentido do artigo 7.o, n.o 1, do Regulamento n.o 6/2002, essa divulgação é válida quer para a análise da novidade, no sentido do artigo 5.o desse regulamento, do desenho ou modelo com o qual o desenho ou modelo divulgado é comparado quer para a análise da singularidade desse primeiro desenho ou modelo, no sentido do artigo 6.o desse mesmo regulamento.

Além disso, o «setor em causa», na aceção do artigo 7.o, n.o 1, do Regulamento n.o 6/2002, não se limita ao setor do produto em que o desenho ou modelo contestado se destina a ser incorporado ou aplicado.

Ora, a posição segundo a qual só quando o utilizador avisado conhece o desenho ou modelo anterior é que esse desenho ou modelo anterior poderia obstar ao reconhecimento do caráter individual do desenho ou modelo posterior, implica que, para efeitos da apreciação do caráter individual de um desenho ou modelo, no sentido do artigo 6.o, n.o 1, do Regulamento n.o 6/2002, fosse exigido que o desenho ou modelo anterior, cuja divulgação ao público tivesse já sido provada, no sentido do artigo 7.o, n.o 1, deste regulamento, fosse conhecido do utilizador informado do desenho ou modelo contestado.

Todavia, nada no referido artigo 7.o, n.o 1, permite considerar necessário que o utilizador informado do produto em que o desenho ou modelo contestado está incorporado ou aplicado conheça o desenho ou modelo anterior, quando este estiver incorporado ou aplicado num produto de um setor industrial diferente daquele que é visado pelo desenho ou modelo contestado.

(cf. n.os 124‑131)