Language of document : ECLI:EU:T:2006:39

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quarta Secção)

1 de Fevereiro de 2006 (*)

«Marca comunitária – Processo de oposição – Marca figurativa que contém o elemento nominativo ‘PERFIX’ – Marca figurativa comunitária anterior que contém o elemento nominativo ‘cerfix’ – Motivo relativo de recusa de registo – Risco de confusão – Artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento (CE) n.° 40/94»

No processo T‑206/04,

Fernando Rodrigues Carvalhais, residente em Almada (Portugal), representado inicialmente por P. Graça e em seguida por J. Lopes, advogados,

recorrente,

contra

Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), representado por J. Novais Gonçalves, na qualidade de agente,

recorrido,

sendo a outra parte no processo na Câmara de Recurso do IHMI, interveniente no Tribunal,

Profilpas Snc, com sede em Cadoneghe (Itália), representada inicialmente por J. L. Revenga Santos e em seguida por J. M. Monravá, advogados,

que tem por objecto um recurso da decisão da Primeira Câmara de Recurso do IHMI de 18 de Março de 2004 (processo R 408/2003‑1), relativa a um processo de oposição entre Fernando Rodrigues Carvalhais e Profilpas Snc,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Quarta Secção),

composto por: H. Legal, presidente, P. Lindh e V. Vadapalas, juízes,

secretário: J. Plingers, administrador,

vista a petição entrada na Secretaria do Tribunal em 2 de Junho de 2004,

vista a resposta entrada na Secretaria do Tribunal em 4 de Fevereiro de 2005,

vista a resposta da interveniente entrada na Secretaria do Tribunal em 26 de Janeiro de 2005,

vista a réplica entrada na Secretaria do Tribunal em 27 de Junho de 2005,

após a audiência de 27 de Outubro de 2005,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

1       Em 2 de Maio de 2000, o recorrente apresentou ao Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI) um pedido de marca comunitária ao abrigo do Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, de 20 de Dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (JO 1994, L 11, p. 1), alterado.

2       A marca cujo registo foi pedido (a seguir «marca PERFIX») tem a seguinte representação gráfica:

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3       Os produtos para os quais o registo foi pedido pertencem às classes 6, 17 e 19 do Acordo de Nice relativo à Classificação Internacional dos Produtos e dos Serviços para o registo de marcas, de 15 de Junho de 1957, revisto e alterado, e correspondem, relativamente a cada uma dessas classes, à seguinte descrição:

–       classe 6: «Perfis metálicos e seus acessórios»;

–       classe 17: «Perfis em matérias plásticas e seus acessórios, juntas e guarnições em matérias plásticas»;

–       classe 19: «Materiais para construção não metálicos, rebordos (guarnições) e juntas para cerâmicas, rebordos (guarnições) e juntas para mármores, rebordos (guarnições) e juntas para revestimentos em geral (não incluídos noutras classes)».

4       Em 21 de Maio de 2001, o pedido de marca foi publicado no Boletim de Marcas Comunitárias n.° 44/01.

5       Em 17 de Julho de 2001, a Profilpas Snc (a seguir «interveniente») deduziu oposição ao registo da marca PERFIX para todos os produtos abrangidos pelo pedido de registo, baseando‑se, nomeadamente, na seguinte marca figurativa comunitária (a seguir «marca CERFIX»):

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6       Esta marca foi registada em 29 de Julho de 1999, sob o número 587725, para os seguintes produtos:

–       «Perfis metálicos», incluídos na classe 6;

–       «Perfis em material plástico», incluídos na classe 17;

–       «Junções para cerâmica, materiais antideslizantes para cerâmica, rebordos para cerâmica; junções para mármore, antideslizantes para mármore, rebordos para mármore; junções para pavimentos, antideslizantes para pavimentos, rebordos para pavimentos; materiais de construção», incluídos na classe 19.

7       Como fundamento da sua oposição, a interveniente invocou o motivo relativo de recusa previsto no artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94.

8       Em 8 de Maio de 2003, a Divisão de Oposição do IHMI indeferiu a oposição da interveniente.

9       Em 2 de Julho de 2003, a interveniente interpôs recurso dessa decisão.

10     Por decisão de 18 de Março de 2004 (a seguir «decisão recorrida»), a Primeira Câmara de Recurso do IHMI anulou a decisão da Divisão de Oposição, indeferiu o pedido de registo do recorrente em relação a todos os produtos em causa e condenou‑o nas despesas. Considerou, no essencial, que existia uma semelhança entre os produtos abrangidos pelo pedido de marca comunitária e os abrangidos pelas marcas anteriores e uma semelhança fonética entre os sinais correspondentes, de natureza a criar um risco de confusão para o público pertinente na acepção do artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94.

 Pedidos das partes

11     O recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–       anular a decisão recorrida;

–       condenar o IHMI nas despesas.

12     O IHMI conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–       negar provimento ao recurso;

–       condenar o recorrente nas despesas.

13     A interveniente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–       confirmar na íntegra a decisão recorrida;

–       condenar o recorrente nas despesas.

 Questão de direito

14     O recurso baseia‑se num único fundamento, mais precisamente a violação do artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94.

 Argumentos das partes

15     O recorrente critica a Câmara de Recurso por ter atribuído uma importância excessiva à semelhança fonética entre os elementos nominativos «cerfix» e «perfix» e ter subavaliado as diferenças visuais e conceptuais entre as marcas em causa. Alega que a Câmara de Recurso não efectuou uma apreciação global dos factores pertinentes para avaliar o risco de confusão (acórdão do Tribunal de Justiça de 22 de Junho de 1999, Lloyd Schuhfabrik Meyer, C‑342/97, Colect., p. I‑3819, n.° 18). Em seu entender, a Câmara de Recurso «dissecou» a marca PERFIX e limitou a sua apreciação a certos elementos que a compõem, sem ter em conta todos os elementos figurativos, nominativos e cromáticos da marca PERFIX e das marcas anteriores, apreciados no seu conjunto.

16     Ora, considerada no seu todo, a marca PERFIX permite aos consumidores, que são, aliás, especializados e particularmente atentos, perceber imediatamente a origem dos produtos em questão.

17     Por outro lado, o recorrente sustenta que a mera presença do elemento nominativo «fix» nas marcas em causa não permite concluir que existe um risco de confusão. Com efeito, este elemento nominativo não é o elemento dominante. É utilizado como prefixo em algumas palavras da língua portuguesa e como prefixo ou sufixo em numerosas marcas comunitárias. Além disso, é pouco distintivo (decisão n.° 2407/2002 da Divisão de Oposição do IHMI, de 8 de Agosto de 2002, no processo relativo à oposição B422628).

18     Por último, o recorrente invoca a tese dita da «equidistância», segundo a qual a Câmara de Recurso só poderia deferir a oposição se o risco de confusão entre a marca PERFIX e a marca CERFIX fosse superior ou igual ao existente entre esta última e outras marcas comunitárias igualmente registadas para produtos das classes 6, 7 e 19. Sustenta a este respeito que não existe um maior risco de confusão entre a marca PERFIX e a marca CERFIX do que entre esta última e as outras marcas comunitárias já registadas.

19     Na réplica, o recorrente acrescenta ter tido conhecimento, posteriormente à interposição do presente recurso, de uma marca nominativa nacional PERFIX, registada no período de 2 de Novembro de 1981 a 2 de Novembro de 2001, na Alemanha, em França e nos países do Benelux, para «buchas para fixação de cargas leves», pertencentes à classe 6. O recorrente salienta que a anterioridade dessa marca nacional PERFIX não tinha então impedido a Câmara de Recurso de registar a marca CERFIX. O recorrente deduz deste facto que, nessa época, a Câmara de Recurso tinha necessariamente concluído que não existia risco de confusão entre essas marcas. A decisão recorrida baseia‑se, no entanto, na tese contrária, quando o risco de confusão alegado é ainda menor pelo facto de a marca PERFIX ser figurativa. A decisão recorrida está, portanto, em contradição com a prática decisória anterior do IHMI e o artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94. Esta decisão viola ainda os princípios da igualdade de tratamento e da confiança legítima.

20     O IHMI afirma que a Câmara de Recurso apreciou todas as características das marcas em conflito. O facto de a decisão recorrida se referir em separado aos diferentes elementos que compõem essas marcas não significa que estas últimas não tenham sido objecto de uma apreciação global.

21     O IHMI e a interveniente alegam que as diferenças visuais não são suficientes para neutralizar a semelhança fonética entre as marcas em conflito, tendo em conta a forte semelhança dos produtos em causa e o facto de o público pertinente raramente comparar directamente as marcas.

22     A este respeito, a interveniente salienta que a semelhança fonética entre duas marcas, quando estas designem produtos concorrentes, substituíveis e complementares, pode ser suficiente para criar um risco de confusão [acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 23 de Outubro de 2002, Institut für Lernsysteme/IHMI – Educational Services (ELS), T‑388/00, Colect., p. II‑4301, e Oberhauser/IHMI – Petit Liberto (Fifties), T‑104/01, Colect., p. II‑4359].

23     Por outro lado, embora a apreciação global do risco de confusão deva basear‑se na impressão de conjunto produzida pelas marcas em causa, o IHMI considera, no entanto, que há que ter em conta os seus elementos distintivos e dominantes (acórdãos do Tribunal de Justiça de 11 de Novembro de 1997, SABEL, C‑251/95, Colect., p. I‑6191, n.° 23; de 29 de Setembro de 1998, Canon, C‑39/97, Colect., p. I‑5507, n.° 16, e Lloyd Schuhfabrik Meyer, já referido, n.° 25). Ora, tendo em conta que os produtos em causa são substituíveis e o facto de os mesmos poderem ser adquiridos mediante pedido verbal, as diferenças visuais entre as marcas em causa não permitem neutralizar a sua semelhança fonética.

24     No que se refere aos argumentos do recorrente relativos ao elemento nominativo «fix», o IHMI alega que a decisão recorrida não menciona nunca que esse elemento tem carácter dominante e que a existência de outras marcas que contêm o sufixo «fix» não é pertinente. Com efeito, o registo anterior de marcas semelhantes às marcas da interveniente não é um elemento relevante e a maioria dessas marcas foram registadas posteriormente ao registo das marcas da interveniente e/ou são suficientemente diferentes da marca PERFIX.

25     A interveniente observa que só quatro das marcas invocadas pelo recorrente começam pelas letras «p» ou «c» e contêm o elemento «fix». Estas marcas foram todas registadas posteriormente à marca CERFIX. Devido a esta inexistência de anterioridade, não há que aplicar a tese dita da «equidistância», segundo a qual «o titular de um sinal distintivo não pode exigir que um sinal concorrente mantenha maior distância em relação ao seu sinal do que a distância que ele próprio observou relativamente a sinais preexistentes».

26     A interveniente considera que a decisão n.° 2407/2002 da Divisão de Oposição, já referida, é irrelevante. Com efeito, o presente litígio não diz apenas respeito à presença do elemento «fix», mas também à importante semelhança entre as marcas e os produtos abrangidos por estas.

 Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

27     Deve observar‑se, antes de mais, que as críticas do recorrente relativas à falta de apreciação global do risco de confusão na decisão recorrida são infundadas.

28     Com efeito, segundo jurisprudência assente, no âmbito do artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, o risco de confusão deve ser apreciado globalmente, segundo a percepção que o público pertinente tem dos sinais e dos produtos ou serviços em causa, e tendo em conta todos os factores relevantes do caso, nomeadamente a interdependência entre a semelhança dos sinais e a dos produtos ou serviços designados [v. acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 9 de Julho de 2003, Laboratorios RTB/IHMI – Giorgio Beverly Hills (GIORGIO BEVERLY HILLS), T‑162/01, Colect., p. II‑2821, n.os 31 a 33, e jurisprudência aí referida].

29     Em conformidade com essas exigências, a decisão recorrida contém uma comparação dos sinais em conflito, nos planos visual, conceptual e fonético, à luz das características dos produtos em questão e do público pertinente (n.os 17 a 30). A Câmara de Recurso salientou a este respeito que existe uma forte semelhança, por um lado, entre os produtos em causa e, por outro, entre os elementos nominativos «cerfix» e «perfix». Considerou assim que, na medida em que os produtos em causa são adquiridos mediante pedido verbal, essa forte semelhança fonética «basta para criar um risco de confusão» (n.° 28 da decisão recorrida) que as diferenças visuais e a impossibilidade de uma comparação conceptual não permitem eliminar.

30     No que se refere à justeza desta apreciação, deve examinar‑se se a Câmara de Recurso podia validamente concluir que existe um risco de confusão entre as marcas PERFIX e CERFIX devido à sua semelhança fonética e não obstante, por um lado, as suas diferenças visuais e, por outro, a impossibilidade de proceder à sua comparação conceptual.

31     A este respeito, deve recordar‑se que, no âmbito da apreciação do risco de confusão, o Tribunal de Justiça considerou que não se pode excluir que a mera semelhança fonética entre duas marcas possa criar um risco de confusão (acórdão Lloyd Schuhfabrik Meyer, já referido, n.° 28).

32     No presente caso, o recorrente não contesta os números da decisão recorrida segundo os quais:

–       os produtos em causa são idênticos ou muito semelhantes (n.os 17, 25 e 29);

–       esses produtos podem ser adquiridos mediante pedido verbal (n.° 28);

–       o público pertinente é constituído por consumidores especializados que são técnicos do sector da construção (n.os 17 e 26);

–       as marcas distinguem‑se no plano visual e não podem ser comparadas no plano conceptual (n.os 20 e 21);

–       os elementos nominativos «perfix» e «cerfix» são foneticamente muito semelhantes (n.os 22 a 24).

33     Na medida em que o recorrente não invocou qualquer elemento destinado a infirmar a validade das conclusões relativas à natureza idêntica ou muito semelhante dos produtos em causa e ao seu modo de aquisição mediante pedido verbal, não é possível considerar que a semelhança fonética entre os sinais em conflito possa ser neutralizada pela ausência de semelhança visual ou conceptual.

34     Por outro lado, uma vez que a Câmara de Recurso examinou a semelhança fonética dos elementos nominativos «perfix» e «cerfix» considerados no seu todo e a semelhança fonética das suas primeiras sílabas «per» e «cer» sem apreciar, em particular, o elemento «fix», os argumentos relativos a este último carecem de pertinência e são, por conseguinte, inoperantes.

35     Quanto ao argumento baseado na decisão do IHMI de admitir o registo da marca CERFIX não obstante um pretenso risco de confusão com outras marcas anteriores que contêm um elemento nominativo comparável ao das marcas em causa, deve recordar‑se que as decisões das Câmaras de Recurso relativas ao registo de um sinal enquanto marca comunitária assentam na aplicação do Regulamento n.° 40/94. Assim, a legalidade das decisões das Câmaras de Recurso deve ser apreciada unicamente com base neste regulamento, tal como interpretado pelo juiz comunitário, e não com base na prática decisória anterior dessas Câmaras [acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 27 de Fevereiro de 2002, Streamserve/IHMI (STREAMSERVE), T‑106/00, Colect., p. II‑723, n.° 66, e de 9 de Outubro de 2002, Glaverbel/IHMI (Superfície de uma placa de vidro), T‑36/01, Colect., p. II‑3887, n.° 35]. Por conseguinte, o argumento do recorrente relativo à existência de decisões anteriores é igualmente inoperante, não sendo necessário que o Tribunal se pronuncie sobre a tese da «equidistância» e sobre os argumentos relativos à violação dos princípios da igualdade de tratamento e da confiança legítima.

36     Decorre do exposto que o recorrente não conseguiu demonstrar que o IHMI concluiu erradamente que existe, no espírito do público pertinente, um risco de confusão entre as marcas em causa, globalmente consideradas.

37     Por conseguinte, há que negar provimento ao recurso.

 Quanto às despesas

38     Por força do disposto no artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

39     Tendo o IHMI e a interveniente pedido a condenação do recorrente nas despesas e tendo este sido vencido, há que condená‑lo nas despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quarta Secção)

decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      O recorrente é condenado nas despesas.

Legal

Lindh

Vadapalas

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 1 de Fevereiro de 2006.

O secretário

 

      O presidente

E. Coulon

 

      H. Legal


* Língua do processo: português.