Language of document : ECLI:EU:C:1999:245

CONCLUSÕES DO ADVOGADO-GERAL

ANTONIO SAGGIO

apresentadas em 18 de Maio de 1999 (1)

Processo C-269/97

Comissão das Comunidades Europeias

contra

Conselho da União Europeia

«Regulamento (CE) n.° 820/97 que estabelece um regime de identificação e registo de bovinos - Base jurídica»

1.
    No presente recurso, a Comissão solicita a anulação do Regulamento (CE) n.° 820/97 do Conselho, de 21 de Abril de 1997, que estabelece um regime de identificação e registo de bovinos e relativo à rotulagem da carne de bovino e dos produtos à base de carne de bovino (2) (a seguir «regulamento»). O recurso contesta a escolha do artigo 43.° do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 37.° CE) como base jurídica deste regulamento, que foi adoptado no contexto da crise surgida com a «doença das vacas loucas» cientificamente conhecida pelo nome de encefalopatia espongiforme bovina (a seguir «EEB»). Tendo em consideração esta situação, a Comissão, apoiada pelo Parlamento Europeu, entende que o acto impugnado devia ter sido fundado no artigo 100.°-A do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 95.° CE) por ter como objectivo principal a protecção da saúde humana. Por seu lado, o Conselho considera que a base jurídica deve ser escolhida exclusivamente em função do conteúdo e dos objectivos dos actos a adoptar, o que aponta para a escolha do artigo 43.° do Tratado CE, por se tratar da produção ou comércio de produtos agrícolas incluídos no anexo II do Tratado.

Matéria de facto

2.
    A Comissão apresentou ao Conselho, em 2 de Outubro de 1996, duas propostas de regulamento. Uma tinha por objecto a rotulagem da carne de bovino e dos produtos à base de carne de bovino e a outra o estabelecimento de um sistema de identificação e registo de bovinos (3). As duas propostas tinham a base jurídica do artigo 43.° do Tratado CE.

3.
    Em relação a uma das propostas - a do regulamento relativo à rotulagem -, o Parlamento Europeu propôs como base jurídica o artigo 100.°-A do Tratado CE, em vez do artigo 43.° do Tratado CE. No que se refere à outra proposta - relativa à identificação e registo de bovinos -, os deputados não conseguiram chegar a acordo no Parlamento quanto a essa alteração. Todavia, o relator da Comissão de Agricultura, com o apoio de vários deputados, sugeriu à Comissão também neste caso o artigo 100.°-A do Tratado CE como base jurídica do acto.

4.
    A Comissão fundiu então as duas propostas, inicialmente distintas, num novo projecto que tinha o artigo 100.°-A do Tratado CE como base jurídica e, em 7 de Março de 1997, submeteu ao Conselho esta nova proposta assim alterada.

5.
    Em 21 de Abril de 1997, o Conselho adoptou por unanimidade o regulamento impugnado, indicando todavia como base jurídica o artigo 37.° CE.

Fundamentos e argumentos das partes

6.
    A Comissão considera que, ao fundar o regulamento no artigo 43.° do Tratado CE, o Conselho preteriu formalidades essenciais. Uma vez que devia ter como base jurídica o artigo 100.° do Tratado CE, o regulamento impugnado devia ter sido adoptado - diferentemente do previsto no artigo 43.°, n.° 2, ou seja, com mera consulta ao Parlamento - em conformidade com o processo de co-decisão do artigo 189.°-B do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 251.° CE).

7.
    Antes de o regulamento impugnado ter sido adoptado, já existiam normas de comercialização da carne de bovino e de conhecimento dos antecedentes dos animais. Algumas dessas normas foram adoptadas no âmbito da Política Agrícola Comum, outras no contexto do funcionamento do mercado interno, designadamente com o objectivo de proteger os consumidores (4). A crise da EEB demonstrou que estas normas não eram suficientes, tendo em consideração, designadamente, as consequências da doença para a saúde dos consumidores. Por conseguinte, no âmbito das suas propostas, a Comissão pretendeu, numa primeira fase, criar um instrumento relativo à rotulagem da carne de bovino e, numa segunda, estabelecer um sistema fiável de identificação e registo de bovinos a fim de encorajar os consumidores a confiarem nas informações constantes da rotulagem.

8.
    A Comissão analisa, em seguida, o conteúdo e os objectivos do regulamento impugnado para daí poder deduzir qual a base jurídica adequada.

9.
    No que se refere ao estabelecimento de um sistema de identificação e registo de bovinos, a Comissão remete para o título I do regulamento impugnado. O artigo 3.° define os elementos subjacentes do sistema. Trata-se de marcas auriculares para identificar individualmente os animais, de bases de dados informatizadas, de passaportes para os animais e de registos mantidos em cada exploração. Os requisitos a que todos estes elementos devem obedecer estão definidos, a seguir, nos artigos 4.° a 7.° Estas regras devem possibilitar o rápido e exacto conhecimento dos antecedentes dos bovinos (5).

10.
    No que se refere ao sistema uniformizado de rotulagem da carne de bovino e dos produtos à base de carne de bovino, a Comissão remete para o título II do regulamento. Este título define, no artigo 12.°, antes de mais, a informação que orótulo deve conter sobre o local de venda. Assim, o artigo 12.°, n.° 1, do regulamento contém informações sobre a origem, certas características ou condições de produção da carne rotulada ou do animal donde provém. Por força do artigo 19.° do regulamento, este sistema de rotulagem obrigatória da carne de bovino entra em vigor e é vinculativo em todos os Estados-Membros em 1 de Janeiro de 2000. Em relação à comercialização da carne de bovino, os operadores devem apresentar um caderno de especificações aprovado pelas autoridades nacionais. Segundo o artigo 14.° do regulamento, no caderno de especificações indicam-se as informações a incluir no rótulo, as medidas a tomar para assegurar a exactidão dessas informações e os controlos a efectuar em todas as fases da produção e da venda. O artigo 16.° fixa em pormenor as informações que o rótulo pode conter. Finalmente, o título II prevê as sanções que podem ser aplicadas aos operadores que não cumpram as regras de rotulagem.

11.
    Quanto a esses elementos do conteúdo do regulamento, o Conselho, recorrido no processo, não contestou as afirmações da Comissão.

12.
    Todavia, no que se refere à finalidade do regulamento, as teses das partes são amplamente divergentes.

13.
    A Comissão admite que o regulamento diz respeito a produtos incluídos no anexo II do Tratado, objecto de uma organização comum de mercado (6). Isso não significa, porém, que o regulamento prossiga essencialmente objectivos da Política Agrícola Comum.

14.
    O verdadeiro objectivo do regulamento resulta designadamente dos primeiro e terceiro considerandos. A EEB suscitou na população inquietação relativa aos perigos que o consumo de carne de bovino podia representar para a saúde humana. Por conseguinte, era necessário adoptar medidas que garantam um nível elevado de protecção da saúde dos consumidores.

15.
    É unicamente deste contexto da crise da EEB que resulta a razão verdadeira e essencial para adoptar o regulamento impugnado, ou seja, a protecção da saúde humana. É certo que, num plano geral, não se pode conceber a rotulagem da carne de bovino sem conexão com a protecção da saúde. Todavia, pretende-se com as medidas tomadas, no caso em apreço, fornecer aos consumidores informações relativas à origem e a certas características ou condições de produção. Ora, essas informações devem precisamente garantir aos consumidores que o produto que pretendem comprar não apresenta risco algum do ponto de vista da sua saúde.

16.
    As medidas relativas ao conhecimento dos antecedentes previstas no regulamento foram concebidas especificamente tendo em vista a luta contra a EEB, o que explica que essas medidas se limitem exclusivamente aos bovinos. Estas disposições permitem não só identificar individualmente os animais como também localizar as explorações e as manadas donde provêm. Isso possibilita conhecer melhor a doença como tal e também as medidas mais eficazes para o seu combate.

17.
    Segundo a Comissão, se se considerar assim o contexto em que se adoptou o regulamento controvertido, o elemento determinante não foi o funcionamento da organização comum de mercado, mas sim, pelo contrário e essencialmente, a protecção da saúde humana.

18.
    A Comissão conclui, assim, que a base jurídica adequada para o regulamento devia ter sido o artigo 100.°-A do Tratado CE.

19.
    Em relação às suas duas propostas de regulamento iniciais, a Comissão seguiu a jurisprudência do Tribunal de Justiça. Numa primeira fase, situou-se no âmbito de uma legislação relativa aos produtos incluídos no anexo II do Tratado, considerando que a prossecussão dos objectivos da Política Agrícola Comum não podia abstrair de exigências de interesse geral, nomeadamente da protecção da saúde. Por esta razão, a Comissão baseou inicialmente as propostas no artigo 43.° Todavia, após nova análise, concluiu que a crise da EEB exigia medidas especiais que tivessem como principal consideração a protecção da saúde dos consumidores. Por isso, finalmente, baseou a sua proposta no artigo 100.°-A do Tratado CE.

20.
    Por outro lado, no contexto do artigo 100.°-A, a Comissão evoca a ideia subjacente ao artigo 129.° do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 152.° CE), de que, em matéria de protecção da saúde, o Parlamento deve ser associado no âmbito do processo previsto no artigo 189.°-B (co-decisão). Afastar as disposições sobre co-decisão nos actos destinados directamente a proteger a saúde, só por estarem abrangidos por normas relativas aos produtos agrícolas, constituiria uma «anomalia» do Tratado. No caso em apreço, há que ter especialmente em consideração que o regulamento impugnado se destina essencialmente a proteger a saúde humana e que a regulamentação da produção e comercialização de produtos agrícolas constitui só um objectivo marginal. Por esta razão, havia que escolher, para base jurídica adequada, não o artigo 43.° mas sim o artigo 100.°-A do Tratado CE.

21.
    A título supletivo, a Comissão alega que o regulamento devia basear-se, em todo o caso, no artigo 37.° CE conjugado com o artigo 95.° CE.

22.
    Além disso, a Comissão entende que, se o Regulamento n.° 820/97 for anulado, o Tribunal de Justiça deve declarar subsistentes os seus efeitos, nos termos do artigo 174.°, segundo parágrafo, do Tratado CE (actual artigo 231.° CE). O dispositivo estabelecido pelo regulamento constitui uma fase importante na lutacontra a EEB; a Comissão já adoptou, de resto, com base neste regulamento, modalidades de aplicação que também devem ser mantidas em vigor.

23.
    Em consequência, a Comissão interpôs, em 22 de Julho de 1997, o presente recurso contra o Conselho da União Europeia, pedindo que o Tribunal se digne:

1)    anular o Regulamento (CE) n.° 820/97 do Conselho, de 21 de Abril de 1997, que estabelece um regime de identificação e registo de bovinos e relativo à rotulagem da carne de bovino e dos produtos à base de carne de bovino;

2)    manter subsistentes os efeitos do regulamento anulado até à entrada em vigor de nova regulamentação adoptada na matéria pelo legislador comunitário com base jurídica adequada;

3)    condenar o Conselho nas despesas.

24.
    O Parlamento, que interveio na causa em apoio das conclusões da Comissão, considera que a protecção da saúde humana constitui o objectivo principal do regulamento. Para melhor compreender um acto, há que tomar em consideração, além do seu conteúdo e objectivos, o seu contexto factual e político. Perante a crise da EEB, o regulamento prossegue dois objectivos principais. Por um lado, há que proteger a saúde humana dos riscos conexos com a EEB; por outro, convém informar melhor os consumidores acerca da origem e da qualidade da carne de bovino. Por estas razões, o legislador decidiu estabelecer transparência absoluta acerca da criação de bovinos e da produção e comercialização da carne de bovino. A este respeito, o objectivo principal, e talvez único, consistia em estabelecer uma cadeia completa, permitindo aos consumidores verificarem todas as fases do processo desde a origem até ao consumo. Os meios previstos para o efeito são a identificação e o registo de bovinos bem como a rotulagem da carne de bovino.

25.
    Para o Parlamento, não há diferença alguma, no caso em apreço, em relação às regras relativas à rotulagem dos géneros alimentícios em geral. Estas regras devem basear-se no artigo 100.°-A e não no artigo 43.° do Tratado CE. A jurisprudência proferida até agora teve por objecto actos cuja finalidade principal consistia na comercialização dos produtos agrícolas no mercado interno; só acessoriamente é que estas disposições tinham também o objectivo da protecção da saúde. Ora, isso não sucede no presente processo, em que o objectivo principal do regulamento consiste na protecção da saúde humana.

26.
    Decorre do próprio Tratado que, em matéria de protecção da saúde, o Parlamento deve ser associado ao processo legislativo, nos termos do procedimento do artigo 189.°-B. Donde resulta que o artigo 100.°-A constituiria a base jurídica adequada do regulamento impugnado.

27.
    O Parlamento também alega, a título subsidiário, que ainda assim teria sido necessário escolher para base jurídica o artigo 43.° conjugado com o artigo 100.°-A. O regulamento tinha incontestavelmente por objectivo não só restabelecer a estabilidade do mercado da carne de bovino e de produtos à base de carne de bovino como também restaurar a confiança dos consumidores nesses produtos.

28.
    Finalmente, também o Parlamento entende que, se o regulamento for anulado, os seus efeitos devem subsistir.

29.
    O Conselho concluiu solicitando que o Tribunal se digne negar provimento ao recurso e condenar a Comissão nas despesas.

30.
    O Conselho considera que, apesar de, para se compreender o seu alcance, se poder tomar em consideração o contexto em que se adoptou o acto, este contexto não pode ser determinante em relação à escolha da base jurídica. Essa escolha deve basear-se em elementos objectivos susceptíveis de controlo jurisdicional. Segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, esses elementos são designadamente o conteúdo e os objectivos do acto.

31.
    Entre as partes não há divergência quanto ao conteúdo do regulamento.

32.
    Em contrapartida, no que se refere ao objectivo, o Conselho considera que este não consiste principalmente na protecção da saúde humana. A este respeito, refere o primeiro considerando do regulamento, que dispõe:

«... o mercado da carne de bovino e dos produtos à base de carne foi desestabilizado pela crise da encefalopatia espongiforme bovina... é necessário restabelecer a estabilidade deste mercado... a forma mais eficaz de realizar esse restabelecimento é através de uma melhoria da transparência das condições de produção e comercialização desses produtos, nomeadamente em matéria de conhecimento dos antecedentes».

33.
    O Conselho considera que tal transparência é susceptível de restaurar a confiança dos consumidores em relação ao mercado e aos produtos. Isso permite restabelecer a estabilidade do mercado, afectado pela crise da EEB.

34.
    Para o efeito, era fundamental estabelecer um sistema eficaz de identificação e de registo na fase da produção e um sistema de rotulagem comunitário específico, baseado em critérios objectivos, na fase da comercialização (7).

35.
    Segundo o Conselho, além do objectivo principal do regulamento, ou seja, a estabilização do mercado da carne de bovino e dos produtos à base de carne debovino, estão igualmente preenchidas determinadas exigências de interesse geral, tais como a protecção da saúde pública e animal (8).

36.
    Todavia, esta protecção da saúde pública e animal só constitui um objectivo acessório do acto, o qual regula também o comércio intracomunitário de animais vivos, uma vez que os animais destinados a esse comércio devem ser identificados e registados em conformidade com as exigências da regulamentação comunitária. Esta identificação e este registo devem permitir conhecer a exploração, o centro ou o organismo de origem ou de passagem dos animais (9). A identificação individual de certos tipos de gado, no caso em apreço os bovinos, destina-se, além disso, à gestão de determinados regimes de ajudas comunitárias no domínio da agricultura (10).

37.
    No que se refere à rotulagem da carne de bovino e dos produtos à base de carne de bovino, este sistema limita-se a fornecer informações aos consumidores com vista a uma decisão de compra importante, mas não lhes garante que a carne colocada no comércio não apresente perigo algum do ponto de vista da sua saúde. Outras medidas, no âmbito da legislação veterinária, oferecem-lhes essas garantias.

38.
    No que se refere às disposições relativas ao conhecimento dos antecedentes, estas não foram concebidas exclusivamente para combater a EEB. Se é certo que o percurso de um animal desde a exploração até ao matadouro pode ser reconstituído a partir de agora, isso ainda não pode ser considerado uma medida adequada de saúde pública susceptível de eliminar a EEB.

39.
    Além disso, segundo o Conselho, a experiência demonstrou que a aplicação da Directiva 92/102, anteriormente aplicável à identificação e ao registo de bovinos, não foi totalmente satisfatória no caso desses animais e, por conseguinte, devia ser melhorada. Do mesmo modo, foi para reforçar as disposições da directiva que se adoptou o regulamento impugnado, específico para os bovinos (11). A adopção desta directiva também tinha sido baseada no artigo 37.° CE, não tendo a escolha desta base jurídica sido impugnada posteriormente.

40.
    A adopção das disposições relativas à identificação e ao registo de bovinos justificava-se também pelo facto de o conhecimento dos antecedentes, mais fiável a partir de agora, constituir fonte de informação indispensável em relação à rotulagem da carne de bovino.

41.
    Além disso, a protecção da saúde animal está conexa, de forma relativamente estreita, com a comercialização dos produtos correspondentes. Se os animais obedecerem às normas sanitárias que lhes são aplicáveis, a confiança dos consumidores pode finalmente ser melhor readquirida e conservada, o que contribui para a estabilização do mercado. O facto de o regulamento se aplicar exclusivamente aos bovinos e à carne de bovino e não aos suínos, ovinos ou caprinos e às carnes provenientes desses animais não se deve à circunstância de ser necessário fixar para os bovinos regras mais exigentes em matéria de protecção da saúde, mas ao facto de só o mercado da carne de bovino ter sido afectado, devido à doença das vacas loucas, por uma crise tão importante que havia que tomar urgentemente medidas de estabilização.

42.
    Por conseguinte, no que se refere à base jurídica, o Conselho sustenta que ela deve ser escolhida, em última análise, exclusivamente em função do conteúdo e do objectivo das medidas previstas. Uma vez que se trata, no caso em apreço, da produção e da comercialização de produtos incluídos no anexo II do Tratado e, além disso, da prossecussão de objectivos essenciais da Política Agrícola Comum, é com razão que o regulamento impugnado se funda no artigo 43.° do Tratado CE.

43.
    As teses sustentadas pela Comissão e pelo Parlamento levariam a esvaziar de conteúdo o âmbito de aplicação do artigo 43.°, já que qualquer acto que também tivesse como objectivo a protecção da saúde humana devia então fundar-se no artigo 100.° do Tratado CE (actual artigo 94.° CE) ou no artigo 100.°-A do Tratado CE. Ora, as exigências de interesse geral, tais como a protecção dos consumidores ou da saúde e da vida humana e animal, são igualmente tomadas em consideração quando um acto é adoptado com base no artigo 43.°, na medida em que a prossecução dos objectivos da Política Agrícola Comum não pode abstrair dos interesses gerais, como resulta do artigo 129.°, n.° 1, primeiro parágrafo, do Tratado CE e da jurisprudência do Tribunal de Justiça.

44.
    Além disso, o regulamento tem em vista, designadamente, a realização do objectivo referido no artigo 39.° do Tratado CE (actual artigo 33.° CE), ou seja, a estabilização dos mercados. Aliás, as medidas previstas pelo regulamento estão incluídas no artigo 2.° do Regulamento n.° 805/68 (12). Esta disposição permite adoptar, no âmbito da organização comum de mercado no sector da carne de bovino, medidas destinadas a promover uma melhor organização da produção, da transformação e da comercialização, bem como das medidas destinadas a melhorar a qualidade. Ora, foi exactamente este objectivo que o Conselho prosseguiu ao adoptar o regulamento para influenciar o mercado. Uma vez que os interesses gerais constituem também uma componente da Política Agrícola Comum e que esta política deve inserir-se no contexto económico geral, os argumentos da Comissão e do Parlamento teriam como consequência que a escolha do artigo100.°-A do Tratado CE como base jurídica afastaria o disposto no artigo 43.°, que constitui uma lex specialis, de cada vez que fosse adoptado um acto directa ou indirectamente no contexto da crise da EEB, sendo tal acto destinado sempre a proteger a saúde humana. Isso reduzia significativamente o alcance dos objectivos da Política Agrícola Comum referidos no artigo 39.° do Tratado CE.

45.
    Em conclusão, se na escolha da base jurídica da medida prevista os critérios decisivos - conteúdo e objectivos - forem tidos em consideração, parece que o procedimento seguido pelo Conselho, no caso em apreço, foi correcto e legal.

46.
    No que se refere à argumentação subsidiária da Comissão e do Parlamento relativa à escolha conjugada dos artigos 43.° e 100.°-A do Tratado CE, como base jurídica correcta, o Conselho considera que ela só é possível se o acto adoptado prosseguir simultaneamente dois objectivos distintos equivalentes. Ora, isso não sucede precisamente no caso em apreço, porque o objectivo principal do regulamento consiste em restabelecer a estabilidade do mercado da carne de bovino e dos produtos à base de carne de bovino, desestabilizado pela crise da EEB. Os outros objectivos do regulamento referidos no preâmbulo constituem, de resto, no que lhes diz respeito, objectivos secundários, com a consequência de não poderem influenciar a escolha da base jurídica.

Quanto ao mérito

47.
    Segundo a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, a escolha da base jurídica de um acto deve fundar-se em elementos objectivos susceptíveis de controlo jurisdicional. Entre tais elementos incluem-se, designadamente, a finalidade e o conteúdo do acto (13).

Conteúdo do regulamento

48.
    O regulamento é composto por duas partes. O título I prevê que os Estados-Membros estabelecem um regime de identificação e registo de bovinos. O título II contém as disposições relativas à rotulagem da carne de bovino e dos produtos à base de carne de bovino.

49.
    Nos termos do artigo 3.°, o regime de identificação e registo baseia-se nos seguintes elementos:

-    Marcas auriculares para identificar individualmente os animais;

-    Bases de dados informatizadas;

-    Passaportes para os animais;

-    Registos individuais mantidos em cada exploração.

A Comissão, as autoridades competentes dos Estados-Membros bem como os interessados, incluindo as organizações de consumidores interessadas, têm acesso a essas informações. Além disso, no artigo 4.°, definem-se os animais que devem ser identificados e as exigências a que devem obedecer as marcas auriculares utilizadas para o efeito. No artigo 5.°, definem-se as informações que as bases de dados informatizadas devem conter. Nos artigos 6.° e 7.°, estão fixados os requisitos a que devem obedecer os passaportes para os animais e os registos. Segundo o artigo 7.°, n.° 3, os detentores de animais devem comunicar à autoridade competente, a pedido desta, todas as informações relativas à origem, identificação e, se for o caso, ao destino dos animais que lhes pertenceram ou possuíram, transportaram, comercializaram ou abateram.

50.
    Por conseguinte, estas disposições contêm essencialmente exigências materiais e técnicas relativas aos mecanismos de controlo. A regulamentação incide sobre as modalidades de identificação e registo de bovinos nos Estados-Membros. Isso implica o estabelecimento de um controlo ao detentor dos animais desde a fase da produção.

51.
    A segunda parte do regulamento contém disposições relativas à rotulagem da carne de bovino e dos produtos à base de carne de bovino. Segundo o artigo 19.° do regulamento, é introduzido um regime de rotulagem obrigatória da carne de bovino que é aplicável em todos os Estados-Membros a partir de 1 de Janeiro de 2000. De resto, as disposições do título II aplicam-se a qualquer operador que pretender rotular carne de bovino no local de venda por forma a prestar informações sobre a origem, certas características ou condições de produção da carne rotulada ou do animal donde provém (14).

52.
    Além disso, nos termos do artigo 14.°, cada operador deve obter a aprovação de um caderno de especificações no Estado-Membro em que for produzida ou vendida a carne de bovino em questão. Em seguida, no artigo 14.°, estão fixadas as indicações que devem constar do caderno de especificações, ou seja, as informações a incluir no rótulo bem como as medidas de controlo e as sanções pelo incumprimento das disposições em causa. O artigo 15.° regula as situações em que a carne de bovino é produzida, na totalidade ou em parte, num país terceiro.

53.
    No que se refere ao próprio rótulo, o artigo 16.° define as informações que o mesmo pode conter, para além de quaisquer outras. Trata-se do lugar de nascimento, engorda e abate, do número de identificação, bem como de outrasinformações que o operador em questão pretende transmitir, autorizadas pela autoridade competente em causa.

54.
    Esta parte do regulamento prevê, além disso, as sanções pela inobservância das exigências previstas nas diferentes disposições.

55.
    Por conseguinte, também estas normas incidem essencialmente sobre exigências materiais e técnicas que se aplicam à rotulagem da carne de bovino e dos produtos à base de carne de bovino. É certo que também têm os produtores como destinatários, mas os seus principais efeitos produzem-se na fase da comercialização dos produtos. O critério de conexão para a rotulagem da carne de bovino é dado pelo local de venda (artigo 12.°, n.° 1).

56.
    Há concordância entre as partes no caso concreto quanto ao conteúdo do regulamento, não sendo necessário, neste caso, aprofundar mais a questão.

Objectivo do regulamento

57.
    Os argumentos da Comissão e do Parlamento podem resumir-se no sentido de que, em seu entender, o objectivo principal do regulamento, ou mesmo único, consiste em assegurar um nível elevado de protecção da saúde humana, enquanto o Conselho contesta esta tese ao afirmar que o objectivo principal do regulamento consiste em restabelecer a estabilidade do mercado da carne de bovino desestabilizado pela crise das vacas loucas.

58.
    No essencial, os objectivos do regulamento podem ser determinados a partir das suas diversas disposições e, sobretudo, do preâmbulo que as antecede.

59.
    Assim, o regulamento pretende melhorar a transparência das condições de produção e de comercialização da carne de bovino, designadamente em matéria de conhecimento dos antecedentes. Isso deve possibilitar o restabelecimento da estabilidade do mercado, afectado pela crise da EEB (15).

60.
    Para alcançar tal transparência, havia, antes de mais, que estabelecer, na fase da produção, um regime de identificação e registo de bovinos mais eficaz que a legislação em vigor. A seguir, havia que instituir, na fase da comercialização, um regime de rotulagem no sector da carne de bovino baseado em critérios objectivos (16). Estas medidas deviam igualmente obedecer a determinadas exigências de interesse geral, como sejam a protecção da saúde pública e animal (17).Genericamente, contava-se encorajar deste modo a confiança dos consumidores na qualidade da carne de bovino e dos produtos à base de carne de bovino (18).

61.
    Todavia, o regulamento também se destina a gerir determinados regimes de ajudas comunitárias no domínio da agricultura, o que exige a identificação individual de determinados tipos de gado (19).

62.
    O estabelecimento do regime de identificação e registo de bovinos pretende, além disso, obter o conhecimento rápido e exacto dos antecedentes. As normas até ali em vigor tinham-se revelado insatisfatórias precisamente no âmbito da crise da EEB e, por conseguinte, deviam ser melhoradas (20) (o que foi feito com o regulamento impugnado).

63.
    De resto, havia que criar um sistema eficaz de rotulagem que facultasse a possibilidade de estabelecer uma correlação entre a carne de bovino com rótulo e o animal ou os animais de que provém (21).

64.
    Para poder garantir a fiabilidade desses sistemas, o regulamento devia prever, designadamente, sanções adequadas em caso de infracção ao que nele se dispõe (22).

65.
    À luz do que antecede, há que concordar com os argumentos do Conselho, uma vez que o regulamento diz respeito à produção e comercialização de produtos incluídos no anexo II do Tratado. Do mesmo modo, o regulamento prevê a realização dos objectivos da Política Agrícola Comum referidos no artigo 39.°, n.° 1, do Tratado CE. Prossegue, designadamente, o objectivo de incrementar a produtividade da agricultura e de estabilizar os mercados.

66.
    Todavia, convém indagar se se trata do objectivo principal exclusivo e determinante do regulamento.

67.
    Segundo a Comissão e o Parlamento, para determinar o objectivo principal do acto há também que tomar em consideração as circunstâncias factuais e políticas que motivaram a sua adopção.

68.
    Ora, quanto a este ponto, há que remeter novamente para a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça segundo o qual a base jurídica de um acto deveser escolhida exclusivamente em função de critérios objectivos susceptíveis de controlo jurisdicional. A este respeito, o Tribunal de Justiça referiu, designadamente, o conteúdo e os objectivos do acto adoptado (23) especialmente relevantes.

69.
    Em princípio, é certo que na determinação da base jurídica isso não obsta à tomada em consideração de outros critérios, sempre que eles sejam objectivos e susceptíveis de controlo jurisdicional.

70.
    É extremamente duvidoso que circunstâncias factuais e políticas que estiveram, entre outras, na origem do acto possam ser tomadas em consideração na determinação da finalidade desse acto ao mesmo nível que o seu conteúdo e os seus objectivos. Os factores políticos estão, precisamente, sujeitos a uma apreciação essencialmente subjectiva; podem de tal modo variar em função das opiniões e das necessidades políticas que razões de continuidade e segurança jurídica obstam a que sejam tomadas em consideração, como critério decisivo, na determinação da base jurídica.

71.
    Isso não significa, porém, que na análise da questão da base jurídica correcta se possa abstrair completamente do contexto do acto adoptado.

72.
    No presente processo, o Conselho não nega o contexto factual, ou seja, a crise da EEB. Afirma até que em razão dessa crise é que houve necessidade de adoptar o regulamento impugnado. Todavia, em seu entender, ao adoptá-lo não pretendeu especificamente alcançar prioritariamente um nível elevado de protecção da saúde humana. Afirma, pelo contrário, que a sua actuação se deveu ao facto de o mercado da carne de bovino estar seriamente ameaçado e dever ser consolidado através de medidas de estabilização. Em seu entender, um dos meios para alcançar esse objectivo consistiu em restaurar e encorajar a confiança dos consumidores nos produtos em causa por meio da identificação e da rotulagem.

73.
    Do outro lado, a Comissão e o Parlamento consideram que, devido à crise da EEB, o objectivo principal do regulamento consiste na protecção da saúde pública e animal.

74.
    Resulta do terceiro considerando que o regulamento obedece às exigências de interesse geral, designadamente da protecção da saúde pública e animal.

75.
    Todavia, o Tribunal de Justiça também declarou em jurisprudência constante que não se pode, na prossecução dos objectivos da Política Agrícola Comum, abstrair das exigências de interesse geral, tais como a protecção dosconsumidores, ou da saúde e da vida humana e animal, exigências estas que as instituições comunitárias devem ter em consideração ao exercerem as suas competências (24).

76.
    O objectivo em causa do regulamento, tal como é referido no terceiro considerando, corresponde ao artigo 129.°, n.° 1, do Tratado CE e ao princípio definido pelo Tribunal de Justiça em jurisprudência constante.

77.
    Por conseguinte, a tomada em consideração dessas exigências de interesse geral não significa, por si só, que constitua o objectivo principal do acto adoptado.

78.
    Em todo o caso, por se tratar de regular a produção e a comercialização de produtos agrícolas para estabilizar o mercado, daí decorre, antes de mais, que o artigo 100.°-A do Tratado CE não podia ser a única base jurídica do regulamento impugnado.

79.
    Todavia, convém questionar se esse regulamento não devia indicar como base jurídica conjuntamente os artigos 43.° e 100.°-A.

80.
    Assim sucederia neste caso, designadamente, se o conjunto do regulamento incluísse em paralelo dois conteúdos e dois objectivos essenciais.

81.
    Ao analisar, antes de mais, a génese do regulamento bem como o seu conteúdo, verifica-se que são tratadas conjuntamente num único regulamento duas matérias diferentes. Trata-se, por um lado, de definir as modalidades da identificação e do registo de bovinos e, por outro, de instituir um sistema de rotulagem da carne de bovino e dos produtos à base de carne de bovino. Estas duas matérias situam-se logo de início a níveis diferentes - produção e venda, respectivamente. Enquadram-se na mesma linha, de modo que podem apresentar diferenças também quanto à respectiva finalidade.

82.
    No que se refere às regras de identificação e de registo de bovinos aplicáveis na fase da produção, pode-se afirmar, face às considerações que antecedem, que se trata essencialmente de disposições relativas à produção cujo objectivo principal consiste, sem qualquer dúvida, em estabilizar o mercado desses produtos. As disposições relativas à identificação devem possibilitar um conhecimento dos antecedentes rápido e exacto, inclusivamente para o agricultor. Isso garante, em primeiro lugar, na fase da produção, no que se refere à origem dos animais, um controlo eficaz pela Comissão e pelas autoridades competentes de cada Estado-Membro. Por isso, o objectivo da estabilização do mercado prevalece sobre as preocupações de protecção dos consumidores uma vez que, nesta fase, osconsumidores ainda não tiram directamente proveito da identificação e do registo de bovinos.

83.
    Por conseguinte, no que se refere a esta parte do regulamento, verifica-se que não era necessário para a escolha da base jurídica tomar em consideração, ao lado do artigo 43.°, também o artigo 100.°-A do Tratado CE.

84.
    Todavia, é diferente o que sucede com a segunda parte do regulamento, ou seja, a rotulagem da carne de bovino e dos produtos à base de carne de bovino.

85.
    A título preliminar, convém notar que aqui se trata de uma parte do regulamento completamente autónoma. O disposto no título II (rotulagem) podia existir independentemente da primeira parte (identificação e registo). Tanto a Comissão como o Parlamento não levantavam objecções, num primeiro momento, a que esta parte constituísse um regulamento autónomo. As disposições sobre a rotulagem só intervêm (unicamente) na fase da venda e só nesta fase têm os operadores como destinatários.

86.
    Ora, quando um regulamento tem por objecto duas matérias distintas sujeitas a considerações diferentes e que coexistem em pé de igualdade, parece lógico verificar se as duas partes do acto prosseguem os mesmos objectivos ou se se está perante objectivos distintos. Nesta última hipótese, não se podia, na análise do conjunto do regulamento, invocar a hierarquia clássica dos objectivos (objectivo principal e objectivo acessório). Tal distinção entre objectivo principal e objectivo acessório é lógica quando se trata de regular uma única matéria. A regulamentação em simultâneo de uma segunda matéria autónoma não pode estar subordinada à primeira só porque tem conexão com esta. Em especial, a conexão entre duas matérias autónomas não deveria (poder) levar a que um objectivo principal (distinto), que existe como tal, se torne um objectivo acessório subordinado só por estar conexo com outra matéria importante. A distinção entre objectivo principal e secundário não faz sentido nesse caso, porque corria-se o risco de subordinar um objectivo ao outro - eventualmente de forma involuntária - só por se conjugarem matérias distintas. Poder-se-ia então imaginar o caso - meramente teórico, obviamente, do ponto de vista da análise do Tribunal de Justiça - em que, graças a uma conjugação «sabiamente doseada», se podia ocultar uma outra base jurídica possível através de considerações diferentes e em que, deste modo, se podiam contornar disposições aplicáveis em matéria processual e de cooperação.

87.
    Por conseguinte, parece efectivamente lógico que perante um acto que regula duas matérias distintas se analise a existência de tal equivalência de objectivos prosseguidos. Essa análise só é inútil se um dos objectivos for manifestamente menos importante que o outro e passar assim a objectivo acessório.

88.
    Analisando então os objectivos do título II do regulamento, verifica-se que eles dizem respeito à comercialização enquanto tal dos produtos à base de carne de bovino.

89.
    A rotulagem deve permitir que se estabeleça uma correlação entre toda a carne de bovino com rótulo e o animal ou os animais donde provém.

90.
    Ora, trata-se nesse caso de informações que aproveitam essencialmente aos consumidores. Este sistema, inicialmente facultativo, é certo, mas obrigatório a partir de 1 de Janeiro de 2000, permite comunicar aos consumidores as informações de que necessitam para poderem tomar uma decisão de compra. É certo que isso se repercute também no mercado, no sentido de que pode ser desestabilizado pelo aumento da procura, mas o ponto de referência escolhido pelo regulamento é a liberdade de decisão dos consumidores.

91.
    Não se tratando de dar aos consumidores uma garantia a 100% quanto à qualidade sanitária da carne de bovino - que não é possível assegurar, de resto -, deve-se permitir-lhes determinar a partir da rotulagem, com base em critérios decisivos, se a compra da carne representa para eles um risco aceitável.

92.
    Como isso tem por objectivo e efeito transmitir aos consumidores melhor informação acerca do produto que pretendem comprar, a informação dos consumidores revela-se, nesta parte do regulamento, o objectivo determinante do título II.

93.
    Em contrapartida, ainda em relação a esta parte do regulamento, o outro objectivo, ou seja, a estabilização dos mercados, passa para plano secundário.

94.
    Ora, isso revela que o objectivo principal (autónomo) desta parte do regulamento não corresponde ao prosseguido pelo título I. Nos termos já expostos (v. o n.° 87), está-se, assim, em relação a duas matérias diferentes, perante dois objectivos diferentes, que constituem, ao mesmo tempo, objecto de um único regulamento. Todavia, daí decorre que, em relação à questão da legalidade da base jurídica, haveria então que apreciar esses objectivos em função da (respectiva) importância de cada um, sem que um ficasse subordinado ao outro.

95.
    Em consequência, o regulamento impugnado devia ter em conta no seu conjunto como base jurídica tanto o artigo 37.° como o artigo 100.°-A do Tratado CE. Por isso, devem ser julgados procedentes os pedidos apresentados subsidiariamente pela Comissão e pelo Parlamento.

96.
    Por conseguinte, deve ser anulado o regulamento impugnado, porque foi adoptado com base apenas no artigo 43.° e não também no artigo 100.°-A.

97.
    Em conformidade com o artigo 174.°, segundo parágrafo, do Tratado CE, as partes solicitaram, caso o regulamento fosse anulado, que os efeitos fossem declarados subsistentes, por serem necessários na totalidade. Há que acolher este pedido, pois o regulamento impugnado constitui uma medida eficaz para combater a crise da EEB e para transmitir aos consumidores as mais amplas informações possíveis. Deve julgar-se procedente este pedido das partes, designadamente por razões de segurança jurídica, pois a Comissão já adoptou várias modalidades de aplicação com base no regulamento.

Quanto às despesas

98.
    Nos termos do artigo 69.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. A Comissão pediu a condenação do Conselho nas despesas. Tendo o Conselho sido vencido, há que condená-lo nas despesas, pois o regulamento deve ser anulado na totalidade. Apesar de a Comissão apenas ter obtido ganho de causa quanto ao pedido apresentado subsidiariamente, não há razão especial para se proceder diferentemente à repartição das despesas. Nos termos do artigo 69.°, n.° 4, primeiro parágrafo, o Parlamento, interveniente, deve suportar as respectivas despesas.

Conclusão

99.
    À luz da exposição que antecede, proponho que o Tribunal de Justiça decida o seguinte:

«1)    É anulado o Regulamento (CE) n.° 820/97 do Conselho, de 21 de Abril de 1997, que estabelece um regime de identificação e registo de bovinos relativo à rotulagem da carne de bovino e dos produtos à base de carne de bovino.

2)    Os efeitos do regulamento anulado subsistem até à entrada em vigor de nova regulamentação adoptada na matéria pelo legislador comunitário com base jurídica adequada.

3)    O Conselho é condenado nas despesas.

4)    O Parlamento suportará as respectivas despesas.»


1: Língua original: italiano.


2: -     JO L 117, p. 1.


3: -     Proposta de Regulamento (CE) do Conselho que estabelece um sistema de identificação e registo de bovinos e proposta de Regulamento (CE) do Conselho relativo à rotulagem da carne de bovino e dos produtos à base de carne de bovino (JO C 349, pp. 10 e 14).


4: -     A este respeito, a Comissão refere, por um lado, a Directiva 92/102/CEE do Conselho, de 27 de Novembro de 1992, relativa à identificação do registo de animais (JO L 355, p. 32), e o Regulamento (CEE) n.° 1208/81 do Conselho, de 28 de Abril de 1981, que estabelece a grelha comunitária de classificação das carcaças de bovinos adultos (JO L 123, p. 3; EE 03 F21 p. 191), e, por outro, a Directiva 79/112/CEE do Conselho, de 18 de Dezembro de 1978, relativa à aproximação das legislações dos Estados-Membros respeitantes à rotulagem, apresentação e publicidade dos géneros alimentícios destinados ao consumidor final (JO 1979, L 33, p. 1; EE 13 F9 p. 162).


5: -     V. o primeiro considerando do regulamento.


6: -     Regulamento (CEE) n.° 805/68 do Conselho, de 27 de Junho de 1968, que estabelece a organização comum de mercado no sector de carne de bovino (JO L 148, p. 24; EE 03 F2 p. 157).


7: -     V. o segundo considerando do regulamento.


8: -     V. o terceiro considerando do regulamento.


9: -     V. o quinto considerando do regulamento.


10: -     V. o sétimo e o décimo primeiro considerandos do regulamento.


11: -     V. o nono considerando do regulamento.


12: -     Regulamento que estabelece a organização comum de mercado no sector de carne de bovino (já referido na nota 5).


13: -     Acórdão de 26 de Março de 1987, Comissão/Conselho (45/86, Colect., n.° 11); de 23 de Fevereiro de 1988, Reino Unido/Conselho (131/86, Colect., p. 905, n.° 29), e de 26 de Março de 1996, Parlamento/Conselho (C-271/94, Colect., p. I-1689, n.° 14).


14: -     Artigo 12.°, n.° 1, do regulamento.


15: -     V. o primeiro considerando do regulamento.


16: -     V. o segundo considerando do regulamento.


17: -     V. o terceiro considerando do regulamento.


18: -     V. o quarto considerando do regulamento.


19: -     V. o sétimo considerando do regulamento.


20: -     V. o nono e o décimo primeiro considerandos do regulamento.


21: -     V. o vigésimo terceiro considerando do regulamento.


22: -     V. o vigésimo sexto e o vigésimo sétimo considerandos do regulamento.


23: -     Acórdãos de 16 de Novembro de 1989, Comissão/Conselho (C-131/87, Colect., p. 3743, n.° 7); de 11 de Junho de 1991, Comissão/Conselho (C-300/89, Colect., p. I-2867, n.° 10), e de 13 de Maio de 1997, Alemanha/Parlamento e Conselho (C-233/94, Colect., p. I-2405, n.° 12).


24: -     Despacho de 12 de Julho de 1996, Reino Unido/Comissão (C-180/96 R, Colect., p. I-3903, n.° 63), e acórdão de 5 de Maio de 1998, Reino Unido/Comissão (C-180/96, Colect., p. I-2265, n.° 120).