Language of document : ECLI:EU:C:2019:445

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

MICHAL BOBEK

apresentadas em 23 de maio de 2019(1)

Processo C239/18

SaatgutTreuhandverwaltungs GmbH

contra

Freistaat Thüringen

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Thüringer Oberlandesgericht (Tribunal Regional Superior da Turíngia, Alemanha)]

«Pedido de decisão prejudicial — Variedades vegetais — Sistema de proteção — Artigo 14.o, n.o 3, do Regulamento (CE) n.o 2100/94 e artigo 11.o do Regulamento (CE) n.o 1768/95 — Utilização do produto da colheita pelos agricultores — Organismos oficiais envolvidos no controlo da produção agrícola — Conceito — Dever de prestar informação ao titular do direito comunitário — Âmbito — Conteúdo do pedido de informação — Espécies ou variedades — Exceções ao dever de prestar informação — Encargo adicional ou custos envolvidos na recolha de informação de uma base de dados»






I.      Introdução

1.        A Saatgut‑Treuhandwaltungs GmbH (a seguir «Recorrente») representa um conjunto de empresas de produção de sementes que detêm direitos de proteção das variedades vegetais. Nos termos da legislação da União, as variedades de géneros e espécies botânicas podem ser objeto de direitos comunitários de proteção das variedades vegetais. Os titulares desses direitos de propriedade intelectual devem receber uma remuneração a título de compensação pela utilização das variedades protegidas. Para o efeito, os titulares de variedades têm o direito de solicitar e receber determinadas informações dos agricultores, processadores ou organismos oficiais envolvidos no controlo da produção agrícola, a fim de fazer valer o seu direito à remuneração.

2.        Nos Acórdãos Schulin (2) e Brangewitz (3), o Tribunal de Justiça abordou a questão do tipo e do âmbito da informação que os titulares de variedades protegidas podiam solicitar aos agricultores e aos processadores, respetivamente. No caso em apreço, solicita‑se ao Tribunal de Justiça que complete este quadro no que diz respeito aos pedidos apresentados pelos titulares aos organismos oficiais: em que medida pode um titular de uma variedade protegida obter (que tipo de) informações de (que) organismos oficiais para exercer o seu direito à remuneração?

II.    Quadro jurídico da União

A.      Regulamento de Base

3.        O artigo 5.o, n.o 2, do Regulamento (CE) n.o 2100/94 do Conselho, de 27 de julho de 1994, relativo ao regime comunitário de proteção das variedades vegetais (4) (a seguir «Regulamento de Base») tem a seguinte redação:

«Para efeitos do presente regulamento, entende‑se por “variedade” um conjunto vegetal pertencente a um mesmo táxon botânico da ordem mais baixa conhecida […]»

4.        Nos termos do artigo 13.o, n.o 2, do Regulamento de Base:

«Sem prejuízo do disposto nos artigos 15.o e 16.o, carecem da autorização do titular os seguintes atos relativos aos constituintes varietais, ou ao material de colheita da variedade protegida, ambos a seguir conjuntamente designados por “material”:

a) Produção ou reprodução (multiplicação); […]»

5.        O artigo 14.o do Regulamento de Base, com a epígrafe «Exceção ao direito comunitário de proteção das variedades vegetais», dispõe, no seu n.o 1: «Sem prejuízo do disposto no n.o 2 do artigo 13.o, e no intuito de proteger a produção agrícola, os agricultores podem utilizar, para fins de multiplicação nas suas próprias explorações, o produto da colheita que tenham obtido por plantação, nas suas explorações, de material de propagação de uma variedade que não seja um híbrido ou uma variedade artificial, que beneficie da proteção comunitária das variedades vegetais.»

6.        O artigo 14.o, n.o 2, do Regulamento de Base especifica que o disposto no n.o 1 apenas se aplica às espécies agrícolas que enumera.

7.        A disposição fundamental, o artigo 14.o, n.o 3, tem a seguinte redação:

«As condições para a aplicação da exceção prevista no n.o 1 e para salvaguardar os legítimos interesses do titular e do agricultor serão estabelecidas, antes da entrada em vigor do presente regulamento, nas regras de execução a que se refere o artigo 114.o, com base nos seguintes critérios:

–      não serão estabelecidas restrições quantitativas a nível da exploração agrícola, desde que se trate de necessidades da exploração,

–      o produto da colheita poderá ser processado para plantação, quer pelo próprio agricultor, quer por serviços que lhe sejam prestados, sem prejuízo das restrições que os Estados‑Membros possam estabelecer para a organização do processamento do referido produto da colheita, em particular para garantir que o produto resultante do processamento seja idêntico ao produto a processar,

–      os pequenos agricultores não serão obrigados a pagar qualquer remuneração ao titular; consideram‑se pequenos agricultores:

–        no caso das espécies vegetais a que se refere o n.o 2 do presente artigo, a que se aplica o Regulamento (CEE) n.o 1765/92 do Conselho, de 30 de junho de 1992, que institui um sistema de apoio aos produtores de determinadas culturas arvenses [(JO 1992, L 181, p. 12)], os agricultores que não cultivem uma área superior à que seria necessária para produzir 92 toneladas de cereais; para o cálculo dessa área, aplica‑se o n.o 2 do artigo 8.o do citado regulamento,

–        no caso das outras espécies vegetais a que se refere o n.o 2 do presente artigo, os agricultores que preencham critérios adequados comparáveis,

–      os restantes agricultores devem pagar ao titular uma remuneração equitativa, que deve ser significativamente inferior ao preço da produção licenciada do material de propagação da mesma variedade na mesma área; o nível real dessa remuneração poderá variar ao longo do tempo, de acordo com o uso que for feito da exceção prevista no n.o 1 no caso da variedade em questão,

–      a verificação do cumprimento do presente artigo ou das disposições adotadas com base nele será da exclusiva responsabilidade dos titulares; na organização desse controlo, não podem ser assistidos por organismos oficiais,

–      sempre que os titulares o solicitem, os agricultores e os prestadores de serviços de processamento devem prestar‑lhes as informações pertinentes; os organismos oficiais envolvidos no controlo da produção agrícola podem igualmente prestar aos titulares informações pertinentes, desde que estas tenham sido obtidas no desempenho normal das suas funções, sem quaisquer encargos ou custos suplementares. No que se refere aos dados pessoais, a presente disposição não prejudica a legislação comunitária e nacional sobre a proteção dos indivíduos relativamente ao processamento e à livre transmissão de dados pessoais.»

B.      Regulamento de Execução

8.        O artigo 11.o do Regulamento (CE) n.o 1768/95 da Comissão, de 24 de julho de 1995, que estabelece as regras de aplicação relativas à exceção agrícola prevista no artigo 14.o, n.o 3, do Regulamento (CE) n.o 2100/94 do Conselho, relativo ao regime comunitário de proteção das variedades vegetais (5) (a seguir «Regulamento de Execução»), prevê o seguinte:

«1. Os pedidos de informações sobre a utilização efetiva do material, através de plantação, de espécies ou variedades concretas, ou sobre os resultados dessa utilização, dirigidos pelos titulares aos organismos oficiais, devem ser formulados por escrito. No pedido, o titular deve indicar o seu nome e endereço, a variedade ou variedades relativamente às quais pretende obter informações e o tipo de informações que pretende. O titular deve fazer prova da sua titularidade.

2. Sem prejuízo do disposto no artigo 12.o, o organismo oficial só pode recusar‑se a prestar as informações requeridas se:

–      não estiver envolvido no controlo de produções agrícolas,

–      as normas, comunitárias ou dos Estados‑Membros, que regem a discrição geralmente aplicável às atividades dos organismos oficiais não permitirem a prestação de tais informações aos titulares,

–      nos termos da legislação comunitária ou dos Estados‑Membros ao abrigo da qual a informação foi recolhida a recusa de prestação de tal informação estiver abrangida pelo seu poder discricionário,

–      a informação requerida não estiver ou já não estiver disponível,

–      a informação pretendida não puder ser obtida através do exercício normal das atribuições do organismo oficial,

–      a informação pretendida só puder ser obtida com encargos ou custos adicionais, ou

–      se a informação pretendida se relacionar especificamente com material que não pertença a variedades do titular.

Os organismos oficiais em causa devem informar a Comissão sobre a forma como exercem o poder discricionário referido no terceiro travessão.

3. Ao prestar as informações, o organismo oficial não deve discriminar os titulares. O organismo oficial pode prestar as informações requeridas através da disponibilização ao titular de cópias extraídas de documentos que contenham outras informações além das relativas ao material pertencente a variedades do titular, contanto que seja eliminada qualquer possibilidade de identificação de indivíduos protegidos nos termos das disposições mencionadas no artigo 12.o

4. Sempre que o organismo oficial tomar a decisão de recusar a prestação das informações, deve informar por escrito o titular requerente e indicar o motivo de tal decisão.»

III. Matéria de facto, tramitação processual e questões prejudiciais

9.        A recorrente é uma empresa alemã que exerce a atividade de gestão fiduciária, atuando principalmente em nome de empresas de produção de sementes (6). Essas empresas são titulares de direitos de proteção de variedades vegetais e/ou titulares de direitos exclusivos de utilização de variedades protegidas para utilização agrícola na Alemanha. Essas mesmas empresas confiaram à Recorrente a tarefa de fazer valer, em seu próprio nome, o direito a uma remuneração que os titulares obtêm do cultivo de variedades vegetais protegidas.

10.      O Freistaat Thüringen (a seguir «Recorrido»), representado pelo seu Landesverwaltungsamt (Gabinete Administrativo), é responsável pelo controlo dos fundos da União Europeia, no âmbito da administração e supervisão das subvenções do Fundo Europeu Agrícola de Garantia (FEAGA) e do Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural (FEADER), nos termos do artigo 7.o do Regulamento (UE) n.o 1306/2013 (7) e do artigo 1.o do Regulamento Delegado (UE) n.o 907/2014 (8) (em conjugação com o Anexo I.1.A.).

11.      De acordo com o órgão jurisdicional de reenvio, em relação a subvenções provenientes de fundos da União Europeia e ao controlo do cumprimento das regras de financiamento, o Recorrido conserva os dados na base de dados Integriertes Verwaltungs‑ und Kontrollsystem (sistema integrado de administração e supervisão; a seguir «InVeKoS»). Essa base de dados contém dados relativos às explorações agrícolas ativas situadas no território do Recorrido, em especial as informações fornecidas pelos agricultores que apresentam pedidos de financiamento. As informações relativas às espécies vegetais utilizadas encontram‑se aparentemente disponíveis nessa base de dados, para efeitos de garantir do cumprimento das regras relativas à rotação de culturas.

12.      Por carta de 5 de abril de 2016, a Recorrente solicitou ao Recorrido a disponibilização dos dados armazenados na base de dados InVeKoS. O Recorrido recusou‑se a disponibilizar os dados com base no § 9, n.o 1, da Thüringer Informationsfreiheitsgesetz (Lei da Turíngia relativa à liberdade da informação; a seguir «ThürIFG»).

13.      Em 23 de dezembro de 2016, a Recorrente propôs a presente ação para invocar o direito à informação junto do Landgericht Erfurt (Tribunal Regional de Erfurt, Alemanha). A Recorrente requereu que fosse ordenado que a Recorrida lhe facultasse as seguintes informações, armazenadas na base de dados:

–      os nomes e endereços das explorações agrícolas;

–      as áreas, em hectares, de cada uma das explorações em que os vegetais crescem;

–      as áreas, em hectares, nas quais são cultivados cereais e batatas.

14.      A Recorrente alegou que tinha o direito de obter informações do Recorrido nos termos do artigo 11.o, n.o 1, do Regulamento de Execução, o que também se aplicaria às espécies vegetais. Na qualidade de organismo oficial envolvido no controlo da produção agrícola, o Recorrido não tinha o direito de recusar a informação solicitada que estava em seu poder e poderia ser partilhada sem encargos ou custos adicionais significativos. Do ponto de vista da Recorrente, nenhuma disposição da legislação nacional permitia ao Recorrido recusar a informação. Em especial, o § 9, n.o 2, da ThürIFG não era aplicável. Antes pelo contrário, a ponderação de interesses nos termos do § 9, n.o 1, da ThürIFG pesa a favor do interesse da Recorrente em obter a informação.

15.      O Recorrido alegou que a ação devia ser julgada improcedente, uma vez que a sua decisão de recusa em prestar a informação estava justificada. Não era de modo algum um organismo oficial na aceção do artigo 11.o, n.o 1, do Regulamento de Execução e, em todo o caso, essa disposição estabelecia um direito à informação apenas em relação às variedades. Além disso, para além do direito de recusar a prestação das informações que resulta da ThürIFG, existe também o direito de recusar a prestação de informações que resulta do facto de a recolha de informações acarretar encargos e custos adicionais.

16.      Por Acórdão de 17 de agosto de 2017, o Landesgericht Erfurt (Tribunal Regional de Erfurt) julgou essa ação improcedente. O Landgericht fundamentou a decisão no sentido de que o Recorrido se pode recusar‑se a prestar informações nos termos do artigo 11.o, n.o 2 (segundo e terceiro travessões), em conjugação com o artigo 12.o do Regulamento de Execução.

17.      A Recorrente interpôs recurso desta decisão para o Thüringer Oberlandesgericht (Tribunal Regional Superior da Turíngia, Alemanha), o órgão jurisdicional de reenvio.

18.      Com o seu recurso, a Recorrente alega um direito à informação do Recorrido com base no artigo 11.o, n.o 1, do Regulamento de Execução e que o direito à informação por parte dos organismos oficiais não se refere apenas às variedades. Cabe à Recorrente determinar o fim a que destinará a informação. Em especial, a informação recusada pelo Recorrido forneceria à Recorrente uma perspetiva sobre a dimensão das áreas efetivamente a ser cultivadas pelos agricultores, bem como informação sobre quem se enquadra na categoria de «pequeno agricultor». Deste modo, seria possível evitar ter de solicitar essa informação aos próprios pequenos agricultores. A Recorrente comprometeu‑se a reembolsar o Recorrido de quaisquer custos que possam resultar da pesquisa dos dados solicitados, tais como os custos associados à programação do software.

19.      Segundo o Recorrido, o Landgericht Erfurt (Tribunal Regional de Erfurt) considerou corretamente que o direito da Recorrente à informação é limitado nos termos do artigo 11.o, n.o 2, segundo e terceiro travessões, do Regulamento de Execução. A base de dados InVeKoS não contém qualquer informação relacionada com variedades específicas, com exceção do cânhamo e do lúpulo, uma vez que os agricultores que se candidatam a subvenções não têm de prestar tal informação. Além disso, o Recorrido alega que também não possui capacidades próprias de programação para uma nova busca específica que seria necessária para a recolha dos dados solicitados. A contratação de um prestador de serviços para a realização destes trabalhos de programação implicaria custos na ordem dos 6 000,00 euros.

20.      Foi neste contexto factual e jurídico que o Thüringer Oberlandesgericht (Tribunal Regional Superior da Turíngia) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1.      O artigo 11.o, n.o 1, do Regulamento (CE) n.o 1768/95, confere um direito à informação perante os organismos oficiais, relativo apenas às espécies vegetais, sem que, através desse pedido, seja também solicitada informação relativa a uma variedade protegida?

2.      Caso a resposta à primeira questão seja no sentido de que esse direito à informação pode ser invocado:

a)      Pode considerar‑se que uma autoridade encarregada do controlo das subvenções aos agricultores através de fundos da União Europeia e que, nessa medida, armazena os dados dos agricultores candidatos que também dizem respeito a espécies de culturas, é um organismo oficial encarregado do controlo de produções agrícolas, na aceção do artigo 11.o, n.o 2 (primeiro travessão) do Regulamento (CE) n.o 1768/95?

b)      Pode um organismo oficial recusar‑se a prestar a informação solicitada nos casos em que a sua disponibilização exige o tratamento ou a especificação por um terceiro dos dados em seu poder com um custo financeiro de cerca de 6 000,00 euros? Neste caso, é relevante que o requerente esteja disposto a assumir os custos incorridos?»

21.      A Recorrente, o Recorrido, o Governo espanhol e a Comissão Europeia apresentaram observações escritas. Todos apresentaram alegações na audiência que teve lugar em 31 de janeiro de 2019.

IV.    Análise

22.      As presentes conclusões estão estruturadas do seguinte modo. Irei começar com esclarecimentos preliminares quanto ao regime e ao funcionamento global do sistema comunitário de proteção das variedades vegetais, em especial no que diz respeito à exceção prevista no artigo 14.o, n.o 3, do Regulamento de Base (A). Seguidamente, passarei à 1.a Questão, relativa à natureza das informações que podem ser solicitadas aos organismos oficiais pelos titulares de variedades protegidas nos termos do artigo 11.o do Regulamento de Execução (B). Por último, passarei à 2.a Questão, relativa ao conceito de «organismo oficial envolvido no controlo da produção agrícola» e à questão de saber se os organismos oficiais competentes podem recusar as informações solicitadas quando a sua prestação exige um processamento adicional, concluindo com a questão dos potenciais custos adicionais (C).

A.      A exceção agrícola nos termos do artigo 14.o, n.o 3, do Regulamento de Base

23.      O artigo 13.o do Regulamento de Base estabelece os direitos do titular de um direito comunitário de proteção de uma variedade vegetal. Nos termos do artigo 13.o, n.o 2, a autorização do titular é, em princípio, necessária para a produção ou reprodução (multiplicação) dos constituintes varietais, ou do material de colheita da variedade protegida (ambos a seguir designados «material»).

24.      O artigo 14.o do Regulamento de Base prevê uma derrogação à obrigação de obter a autorização do titular (a seguir «exceção agrícola»). Nos termos do disposto no n.o 1 do artigo 14.o, e no intuito de proteger a produção agrícola, os agricultores podem utilizar, para fins de multiplicação nas suas próprias explorações, o produto da colheita que tenham obtido por plantação, nas suas explorações, de material de propagação de uma variedade que não seja um híbrido ou uma variedade artificial, que beneficie da proteção comunitária das variedades vegetais. O artigo 14.o, n.o 2, limita o âmbito da exceção às espécies agrícolas aí enumeradas. O artigo 14.o, n.o 3, prevê regras de execução a fim de estabelecer as condições para a aplicação dessa exceção agrícola. Estabelece igualmente os critérios que quaisquer regras de execução devem seguir.

25.      Com o Regulamento de Execução, a Comissão deu forma à exceção agrícola com vista a salvaguardar os legítimos interesses tanto do produtor, representado pelo titular, como do agricultor. Quando um agricultor fizer uso da exceção agrícola, o titular tem o direito a receber dele uma «remuneração equitativa». Nos termos do artigo 5.o, n.o 1, do Regulamento de Execução, o nível de remuneração equitativa a pagar ao titular «pode ser objeto de contrato entre o titular e o agricultor em causa». Caso não tenha sido celebrado um contrato entre o titular e o agricultor em causa, o artigo 5.o, n.o 2, do Regulamento de Execução estabelece que «o nível da remuneração deve ser significativamente inferior ao montante cobrado pela produção autorizada de material de propagação da categoria mais baixa, certificada oficialmente, da mesma variedade e na mesma área».

26.      Os pequenos agricultores que utilizem a exceção agrícola não têm de pagar qualquer remuneração ao titular. O artigo 14.o, n.o 3, terceiro travessão, do Regulamento de Base define os pequenos agricultores como agricultores que não cultivem uma área superior à que seria necessária para produzir 92 toneladas de cereais ou que preencham critérios adequados comparáveis, em função das espécies vegetais.

27.      Num sistema assim concebido, o conhecimento de quem se baseou na exceção agrícola é fundamental para que os titulares possam fazer valer os seus direitos de propriedade intelectual e receber a remuneração (equitativa) a que têm direito. Por conseguinte, o Regulamento de Execução contém uma série de disposições que permitem aos titulares obter informações junto de vários intervenientes relevantes. Embora o Tribunal de Justiça já tenha interpretado, em processos que também envolvem a Recorrente, as disposições relativas à informação a prestar pelos agricultores e pelos processadores,(9) o presente processo diz especificamente respeito ao tipo de informações que determinados organismos oficiais devem fornecer aos seus titulares.

B.      1.a Questão: âmbito de aplicação do direito dos titulares a informações em relação aos organismos oficiais nos termos do artigo 11.o do Regulamento de Execução

28.      Com a 1.a questão, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se, essencialmente, sobre o tipo de informações que devem ser fornecidas, nos termos do artigo 11.o do Regulamento de Execução, por um organismo oficial a pedido de um titular: o titular tem o direito de obter informações relativas às espécies de vegetais ou apenas no que se refere a variedades específicas do titular?

29.      Segundo a Recorrente, o artigo 14.o, n.o 3, sexto travessão, do Regulamento de Base, juntamente com o artigo 11.o, n.o 1, do Regulamento de Execução, concede aos titulares um direito de acesso a informações de organismos oficiais relativamente às espécies, sem que seja necessário que o pedido de informação diga respeito a uma variedade específica. Em especial, os titulares têm o direito de obter informações que identifiquem os «pequenos agricultores», na aceção do artigo 14.o, n.o 3, terceiro travessão, do Regulamento de Base, que estão totalmente isentos da obrigação de remunerar os titulares. Saber se um agricultor é um pequeno agricultor permitiria ao titular não procurar informações e, a fortiori, pagamento desses pequenos agricultores. No entanto, os pequenos agricultores não são eles próprios definidos em relação a uma variedade específica, mas em ligação com a superfície cultivada com determinadas espécies vegetais. De qualquer modo, a Recorrente alega que a obrigação de informação que incumbe ao organismo oficial é mais ampla do que o dos agricultores, uma vez que o artigo 11.o não especifica as informações «relevantes» a fornecer.

30.      Segundo a Comissão, o direito à informação nos termos do artigo 11.o, n.o 1, do Regulamento de Execução não se limita às variedades.  Pode incluir espécies para determinar quais os agricultores que são pequenos agricultores. No entanto, o objeto do pedido de informação tem de ser uma variedade. Assim, os titulares não podem apresentar pedidos de informação generalizados aos organismos oficiais, sem dar indicações sobre se os agricultores adquiriram material de multiplicação de variedades protegidas. A Comissão observa igualmente que o pedido de informações de organismos oficiais não diz respeito a um direito público autónomo de acesso a documentos ou de reutilização de dados do setor público (nos termos da Diretiva 2003/98/CE (10)). Trata‑se apenas de um direito privado, acessório à relação entre os titulares e os agricultores.

31.      Por seu lado, o Recorrido e o Governo espanhol argumentam que os pedidos de informação aos organismos oficiais devem dizer respeito a variedades específicas, por oposição às espécies. O artigo 11.o, n.o 1, do Regulamento de Base, interpretado à luz do artigo 14.o, n.o 3, do Regulamento de Base, não pode ser invocado para obter informações gerais sobre os agricultores.

1.      O âmbito do acesso às informações na posse de organismos oficiais nos termos do artigo 11.o do Regulamento de Execução

32.      Uma primeira clarificação é necessária, antes de mais, no que se refere à relação entre as disposições específicas do artigo 11.o do Regulamento de Execução e do artigo 14.o, n.o 3, terceiro travessão, do Regulamento de Base, bem como as regras nacionais em matéria de acesso à informação.

33.      O órgão jurisdicional de reenvio procura especificamente uma interpretação do âmbito de aplicação do acesso à informação nos termos do artigo 11. o do Regulamento de Execução. Segundo a Recorrente, esta disposição constitui uma base jurídica válida para obter, nomeadamente, informações que lhe permitam identificar os «pequenos agricultores» que estão isentos do pagamento de qualquer remuneração e que, consequentemente, não devem receber pedidos de informação dos titulares.

34.      O artigo 11.o do Regulamento de Execução é uma disposição específica de um ato de execução consagrado à exceção agrícola prevista no artigo 14.o, n.o 3, do Regulamento de Base. Por conseguinte, é lógico estabelecer uma correlação entre o âmbito de aplicação do artigo 14.o, n.o 3, do Regulamento de Base e o âmbito de aplicação do artigo 11.o do Regulamento de Execução. Além disso, um Regulamento de Execução deve respeitar o âmbito e os limites da base sobre a qual foi adotado.

35.      Com efeito, é verdade que o artigo 14.o, n.o 3, terceiro travessão, do Regulamento de Base menciona, por meio de uma exceção a uma exceção, os pequenos agricultores. No entanto, o Regulamento de Execução em si não diz respeito a essa categoria, seguramente no que diz respeito ao acesso à informação detida pelos organismos oficiais. O artigo 11.o não se refere aos pequenos agricultores. No âmbito do Regulamento de Execução, os pequenos agricultores só são mencionados no artigo 7.o, no capítulo relativo à remuneração. Esta disposição define ainda, para efeitos de identificação de quem é um pequeno agricultor, «uma área cultivada» na aceção do n.o 3, terceiro travessão, do artigo 14.o do Regulamento de Execução (11). No entanto, não estabelece uma obrigação de os agricultores, processadores ou organismos oficiais fornecerem informações gerais sobre a dimensão dessas áreas aos titulares.

36.      A questão de saber se, num contexto deste tipo, o termo «espécie» constante da primeira frase do artigo 11.o, n.o 1, do Regulamento de Execução deve ser lido como fazendo referência ao artigo 14.o, n.o 3, terceiro travessão, do Regulamento de Base pode ser interpretado no termo, será analisada na secção seguinte. Nesta fase, são necessárias duas observações sistemáticas.

37.      Em primeiro lugar, mesmo que as informações gerais sobre a dimensão das superfícies cultivadas tenham alguma relevância para o exercício do direito de remuneração do titular, não permitem ainda assim ao titular fazer valer as suas reivindicações relacionadas com as suas variedades. A lógica de ambos os regulamentos começa com a utilização de variedades, para as quais o estatuto de pequeno agricultor constitui então uma espécie de «defesa». Não é o oposto. Pelo contrário, há que estabelecer, antes de mais, como elemento de informação preliminar, se os agricultores utilizaram ou pretendiam utilizar o produto da colheita obtida pela plantação do material de variedades específicas. A exceção relativa aos pequenos agricultores, prevista no artigo 14.o, n.o 3, terceiro travessão, do Regulamento de Base, pode desempenhar um papel apenas mais tarde, como uma linha de defesa para os agricultores que preencham os requisitos para esse efeito, entre o grupo mais amplo de agricultores que cultivem as variedades protegidas abrangidas pelo âmbito de aplicação do artigo 14.o, n.o 1, do Regulamento de Base.

38.      Em segundo lugar, no entanto, mesmo que a ligação sistemática entre o artigo 14.o, n.o 3, terceiro travessão, do Regulamento de Base, e o artigo 11.o do Regulamento de Execução não fosse necessária nos termos do direito da União, é importante sublinhar que, simultaneamente, o artigo 11.o do Regulamento de Execução não pode ser interpretado como abrangendo de forma exaustiva a matéria relativa aos pedidos de informação a organismos oficiais.

39.      Os Estados‑Membros não estão de facto impedidos de conceder acesso a tipos de informação que não estejam abrangidos pelo artigo 11.o O silêncio do direito da União quanto ao acesso a determinado tipo de informação não pode ser interpretado no sentido de que o direito da União «proíbe o acesso», antes pelo contrário: a menos que o direito da União o impeça, as regras nacionais residuais sobre o acesso à informação continuam a ser aplicáveis a quaisquer temas não expressamente abrangidos pelo direito da União. O facto de o Regulamento de Execução não conter disposições específicas relativas ao acesso à informação que permitam a um titular identificar pequenos agricultores significa que a matéria está abrangida simplesmente pelas regras nacionais.

40.      Nas circunstâncias do caso em apreço, afigura‑se que o pedido inicial da Recorrente foi apresentado (e indeferido) ao abrigo da ThürIFG. Não compete ao Tribunal de Justiça, sem dúvida, formular conclusões e apreciações de facto no processo que lhe é submetido, nem interpretar e aplicar a legislação nacional. No entanto, deve sublinhar‑se que os pedidos de informação não relacionados com variedades específicas podem certamente ser apresentados — e que a informação pode ser obtida — pelos titulares com base na legislação nacional, se esta o permitir. Se as informações que os titulares pretendem obter estiver na posse de autoridades nacionais (públicas) e se referirem principalmente a informações administrativas reunidas pelas autoridades nacionais, aplicam‑se as regras nacionais relativas ao acesso à informação (12).

41.      Gostaria de sublinhar este ponto para tornar claro que o artigo 11.o do Regulamento de Execução não pode, ao mesmo tempo, ser interpretado de forma restritiva e exclusiva: de uma forma restritiva, uma vez que seria interpretada como não incluindo as espécies, e exclusiva porque abrangeria de forma exaustiva a matéria, impedindo, assim, de forma eficaz, a aplicação simultânea das normas nacionais sobre o acesso à informação.

42.      Pelas razões que explico na secção que se segue, tenho de concordar com o Recorrido no primeiro ponto: os pedidos de informação que podem ser dirigidos a organismos oficiais nos termos do artigo 11.o do Regulamento de Execução estão, de facto, relacionados com as variedades do titular que apresenta o pedido. No entanto, excluir as informações relativas às espécies do âmbito de aplicação do artigo 11.o significa necessariamente que esse «espaço» continua a ser ocupado pela legislação nacional e os titulares interessados podem apresentar pedidos relativos a espécies ao abrigo do direito nacional.

2.      Âmbito de aplicação do artigo 11.o — variedades ou espécies?

43.      Dois argumentos textuais podem sugerir que os pedidos de informação se referem, de um modo geral, a espécies.

44.      Em primeiro lugar, o artigo 11.o, n.o 1, primeiro período, do Regulamento de Execução menciona expressamente «espécies»: «1. Os pedidos de informações sobre a utilização efetiva do material, através de plantação, de espécies ou variedades concretas, ou sobre os resultados dessa utilização, dirigidos pelos titulares aos organismos oficiais, devem ser formulados por escrito» (o sublinhado é meu).

45.      Em segundo lugar, na hipótese de o artigo 11.o do Regulamento de Execução se destinar igualmente a aplicar o artigo 14.o, n.o 3, terceiro travessão, do Regulamento de Base, esta última disposição define «pequenos agricultores» apor confronto com a dimensão da área em que são cultivadas as espécies vegetais enumeradas no artigo 14.o, n.o 2.

46.      Por estas razões, a menção de «espécies» no artigo 11.o, n.o 1, do Regulamento de Execução pode ser interpretada no sentido de que permite pedidos de informação sobre a superfície dos terrenos em que essas espécies foram cultivadas, para efeitos de identificação de «pequenos agricultores».

47.      Contudo, para além destes dois argumentos textuais, não há muito em termos de argumentos jurídicos para apoiar a interpretação do artigo 11.o do Regulamento de Execução preconizada pela Recorrente. Uma interpretação mais textual desta disposição, mas sobretudo sistemática e teleológica, sugere claramente que os pedidos de informação que são apresentados junto de organismos oficiais pelos titulares devem estar relacionados com variedades vegetais específicas do titular que apresenta o pedido.

48.      Para começar, e permanecendo ao nível textual, o artigo 11.o, n.o 1, segundo e terceiro períodos, do Regulamento de Execução, estabelece os requisitos específicos que um pedido de informação válido deve respeitar. Entre esses requisitos, o titular deve especificar «a variedade ou variedades relativamente às quais pretende obter informações» e «fazer prova da sua titularidade» (o sublinhado é meu). Uma vez que, em conformidade com o artigo 5.o, n.o 1, do Regulamento de Base, só as variedades de géneros e espécies botânicos — e não as espécies em geral — podem ser corretamente objeto do direito comunitário de proteção das variedades vegetais, decorre claramente do artigo 11.o, n.o 1, que os pedidos de informação devem ser adaptados às variedades.

49.      Esta conclusão é confirmada pelo texto do artigo 11.o, n.o 2, sétimo travessão, do Regulamento de Execução, nos termos do qual os organismos oficiais podem recusar as informações solicitadas «se a informação pretendida se relacionar especificamente com material que não pertença a variedades do titular» (o sublinhado é meu). De certo modo, causaria estranheza argumentar que o artigo 11.o, n.o 1, do Regulamento de Execução permite aos titulares solicitar e obter informação sobre as espécies, ao passo que as disposições subsequentes do mesmo artigo 11.o permitem que essas informações sejam (imediatamente) recusadas.

50.      É jurisprudência constante que, para interpretar uma disposição do direito da União, deve ter‑se em conta não só os seus termos mas também o seu contexto e os objetivos prosseguidos pela regulamentação em que se integra (13). No caso em apreço, uma interpretação teleológica e sistemática também argumenta claramente a favor de que os pedidos de informação dizem respeito a variedades específicas.

51.      A exceção agrícola tem um duplo objetivo: salvaguardar a produção agrícola, assegurando simultaneamente o pagamento, pelo agricultor, de uma remuneração (equitativa) ao titular. O artigo 2.o do Regulamento de Execução salienta a necessidade de manter um equilíbrio razoável entre os interesses do agricultor e os interesses do titular quando o agricultor tenha utilizado o produto da colheita pertencente a uma ou mais variedades do titular para plantação na(s) sua(s) exploração(ões). Resulta do facto de os interesses do titular serem afetados pela utilização das suas variedades pelo agricultor que o titular necessita, a fim de proteger os seus próprios interesses, de informações específicas relativas às variedades abrangidas pelo âmbito de aplicação da exceção agrícola, nomeadamente, as variedades protegidas, que não uma variedade híbrida ou sintética (14), pertencentes às espécies vegetais enumeradas no artigo 14.o, n.o 2, do Regulamento de Base.

52.      Quanto ao regime geral relativo às informações, previsto tanto no Regulamento de Base como no Regulamento de Execução, o artigo 11.o do Regulamento de Execução deve ser analisado em conjunto com os seus artigos 8.o e 9.o, conforme interpretados pelo Tribunal de Justiça.

53.      Não são apenas os organismos oficiais que devem fornecer informações ao titular nos termos do artigo 11.o do Regulamento de Execução, conforme decorre do artigo 14.o, n.o 3, sexto travessão, do Regulamento de Base. O artigo 11.o do Regulamento de Execução é apenas uma das disposições do Capítulo 4. No âmbito desse capítulo, consagrado às informações, os artigos 8.o e 9.o estabelecem regras sobre as informações a prestar ao titular, respetivamente, pelo agricultor e pelo processador. Ambas as disposições tornam claro que as informações a fornecer tanto pelos agricultores como pelos processadores dizem igualmente respeito às variedades e não às espécies. Além disso, nos termos dos artigos 8.o, n.o 4, e 9.o, n.o 4, do Regulamento de Execução, no seu pedido, o titular deve indicar «a variedade ou variedades relativamente às quais pretende obter informações, bem como a referência ou referências do direito ou direitos comunitários de proteção das variedades vegetais». Se o agricultor ou o processador assim o exigirem, «o pedido deve ser acompanhado da prova de titularidade».

54.      À primeira vista, estas disposições são já bastante claras, na medida em que, em princípio, apenas as informações relativas às variedades podem ser solicitadas e obtidas pelo titular junto dos agricultores ou processadores. O Tribunal de Justiça chegou mesmo a ir mais longe ao interpretar estas disposições de uma forma bastante restritiva nos seus Acórdãos Schulin e Brangewitz (15).

55.      No Acórdão Schulin, o Tribunal de Justiça declarou que o titular deve ser autorizado a pedir informações a um agricultor desde que disponha de um indício de que este utilizou ou utilizará a derrogação prevista no artigo 14.o, n.o 1, do Regulamento de Base (16) e, portanto, utilizou ou utilizará, para fins de multiplicação na sua própria exploração, o produto da colheita obtido através da cultura, na sua própria exploração, de material de propagação de uma variedade que beneficia dessa proteção, que não seja uma variedade híbrida ou artificial, e pertencente a uma das espécies de plantas agrícolas enumeradas no artigo 14.o, n.o 2, do Regulamento de Base (17). Assim, requerer a todos os agricultores, pelo simples facto de pertencerem a esta profissão, mesmo aqueles que nunca cultivaram material de propagação de uma variedade que beneficia de uma proteção comunitária das variedades vegetais pertencentes a uma das espécies de plantas agrícolas enumeradas no artigo 14.o, n.o 2, que forneçam ao titular todas as informações pertinentes seria contrário ao direito da União (18).

56.      O Tribunal de Justiça forneceu, no essencial, a mesma resposta relativa aos processadores em Brangewitz, embora de uma forma ligeiramente mais aberta para, presumivelmente, ter em conta a especificidade dos processadores, em comparação com os agricultores. O Tribunal de Justiça considerou que as disposições conjugadas dos artigos 14.o, n.o 3, do Regulamento de Base e 9.o do Regulamento de Execução devem ser interpretadas no sentido de que, quando o titular disponha de um indício de que o prestador de serviços de processamento efetuou, ou prevê efetuar, estes serviços sobre o produto da colheita obtido por agricultores por plantação de material de propagação de uma variedade do titular afetada pelo privilégio para fins de plantação, o prestador é obrigado a prestar‑lhe as informações pertinentes referentes não apenas aos agricultores em relação aos quais dispõe de indícios de que o prestador efetuou, ou prevê efetuar, os referidos serviços, mas também todos os outros agricultores para os quais efetuou, ou prevê efetuar, serviços de processamento do produto da colheita obtido por plantação de material de propagação da variedade em causa quando esta tenha sido declarada ao prestador ou seja dele conhecida (19).

57.      Neste contexto, é bastante difícil perceber por que razão os organismos oficiais devem, no âmbito da aplicação do mesmo sistema, estar sujeitos a uma obrigação muito mais ampla de fornecer informações, que seriam mesmo diferentes em espécie (no que se refere ao tipo de informações a fornecer).

58.      É este o caso, em especial, por uma razão sistemática significativa: no âmbito do regime geral estabelecido pelos regulamentos de base e de execução, não parece caber sobretudo aos organismos oficiais fornecer as informações relevantes aos titulares, para que estes possam exercer o seu direito à remuneração (20).

59.      Em primeiro lugar, o artigo 14.o, n.o 3, quinto e sexto travessões, do Regulamento de Base parecem criar uma hierarquia entre os destinatários dos pedidos de informação dos titulares. Essa disposição estabelece, de uma forma bastante categórica, que o controlo do cumprimento das regras relativas à exceção agrícola é da exclusiva responsabilidade dos titulares e não pode prever o auxílio de organismos oficiais. Os titulares devem obter, em primeiro lugar, informações junto dos agricultores e fornecedores de serviços de processamento e, em seguida, de organismos oficiais (21).

60.      O Tribunal de Justiça já sublinhou que, uma vez que o Regulamento n.o 1768/95 é um Regulamento de Execução que pormenoriza as condições que permitem efetivar a derrogação prevista no artigo 14.o, n.o 1, do Regulamento de Base, as suas disposições não podem impor obrigações de alcance mais amplo do que as que resultam do Regulamento de Base (22).

61.      O problema de aceitar a interpretação proposta pela Recorrente (e também parcialmente pela Comissão) é que equivaleria a inverter a lógica e o sistema do Regulamento de Base através de uma interpretação muito extensiva do Regulamento de Execução: os organismos oficiais seriam o ponto de contacto padrão para quaisquer pedidos de informação, tanto para os relacionados com variedades como com espécies. Tal como será discutido na secção seguinte das presentes conclusões, não nego que tal abordagem possa fazer sentido em termos de redução dos encargos administrativos para os agricultores individuais e de redução da burocracia global para todos os interessados. No entanto, não há como esconder que tal esforço dificilmente poderia ser tratado como uma questão de simples interpretação de uma disposição discreta do Regulamento de Execução.

62.      Em segundo lugar, em comparação com os artigos 8.o e 9.o do Regulamento de Execução, o âmbito de aplicação do artigo 11.o parece ser mais limitado, uma vez que o segundo parágrafo do mesmo prevê várias exceções ao dever de informação dos organismos oficiais, sendo que algumas dessas exceções são muito vastas. Em especial, o artigo 11.o, n.o 2, segundo e terceiro travessões, transfere para a legislação nacional de uma forma bastante ampla: os organismos oficiais podem simplesmente recusar o pedido de informação se a legislação nacional que rege a discrição aplicável não o permitir. Daqui resulta que o âmbito do dever dos organismos oficiais de fornecer informações parece ser mais restrito quando comparado com o dos agricultores ou processadores. Por conseguinte, mais uma vez em termos sistemáticos, é difícil interpretar o âmbito de aplicação da obrigação de informação que incumbe aos organismos oficiais de uma forma mais extensiva do que o dever correspondente dos agricultores e processadores.

63.      Daqui resulta que, tal como a legislação da União atualmente em vigor, o artigo 11.o, n.o 1, do Regulamento de Execução deve ser interpretado no sentido de que exige que os pedidos de informação aos organismos oficiais sejam formulados em relação a variedades específicas protegidas do titular em questão. No entanto, esta disposição não impede que os Estados‑Membros facultem o acesso à informação dos organismos oficiais relativa às espécies, nos termos da legislação nacional relativa ao acesso à informação.

3.      Funcionamento e funcionalidade do sistema

64.      Em minha opinião, os argumentos mais fortes apresentados pela Recorrente e, em certa medida, também pela Comissão, a favor da inclusão das informações sobre as espécies no âmbito de aplicação do artigo 11.o do Regulamento de Execução, são de natureza extra jurídica. Dizem respeito ao funcionamento prático (ou, pelo contrário, ao não funcionamento) do sistema instituído pelo Regulamento de Execução.

65.      A Recorrente alega que o fornecimento, por parte de organismos oficiais, de informações que permitam a identificação de pequenos agricultores tornaria o processo de exercício do direito à remuneração mais eficiente e menos oneroso para todos os intervenientes em causa. Por seu turno, ao sugerir uma interpretação que permita igualmente a inclusão de espécies no âmbito de aplicação do artigo 11.o, a Comissão reconheceu, na audiência, que o Regulamento de Execução é um antigo ato de direito derivado que necessita, implicitamente, de uma atualização (interpretativa).

66.      O debate nas observações escritas e na audiência confirmou que o funcionamento da exceção agrícola é, na prática, bastante complexo.

67.      Quando se recorre a essa exceção, a fim de salvaguardar a produção agrícola (isto é, os interesses dos agricultores), parece algo difícil, na prática, garantir que os titulares recebam a remuneração (equitativa) a que têm direito (ou seja, os interesses dos titulares, que representam os produtores). As informações, que são essenciais para este fim, parecem difíceis de obter devido ao regime processual previsto nesses textos legislativos, conforme interpretados pela jurisprudência (23). Esta conclusão parece ainda mais justificada quanto comparada com a situação «normal», ou seja, quando os agricultores que não podem beneficiar da exceção agrícola utilizam variedades protegidas. Neste cenário, é mais fácil para os titulares fazerem valer os seus direitos de propriedade intelectual, uma vez que a sua autorização é necessária, de modo a que os titulares obtenham ex ante as informações necessárias sobre a utilização de variedades protegidas.

68.      Importa recordar que, nos termos do artigo 2.o, n.o 2, do Regulamento de Execução, «os legítimos interesses [do titular e do agricultor] não são salvaguardados se um ou mais desses interesses forem prejudicialmente afetados, sem tomar em conta a necessidade de preservar um equilíbrio razoável entre todos eles». No entanto, o efeito combinado dos Acórdãos Schulin e Brangewitz faz com que, na realidade, seja bastante difícil obter informações junto dos agricultores (ou dos processadores). Conforme explicado supra (24), o Tribunal de Justiça considerou que o titular deve ser autorizado a pedir informações a um agricultor desde que disponha de um indício de que este utilizou ou utilizará a derrogação prevista no artigo 14.o, n.o 1, do Regulamento de Base (25). O Tribunal de Justiça acrescentou que «deve ser possível ao titular organizar‑se de modo a dispor do nome e endereço dos agricultores que adquirem material de propagação de uma das suas variedades vegetais protegidas, qualquer que seja a extensão da cadeia comercial entre o titular e o agricultor» (26). E, «[a]lém disso, ao basear‑se no artigo 13.o, n.o 2, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 2100/94, o titular pode exigir aos seus distribuidores que registem o nome e o endereço dos agricultores que adquiram material de propagação de uma das suas variedades vegetais» (27).

69.      No entanto, a Recorrente explicou de forma convincente na audiência, sem ser contraditada por qualquer outro participante, a razão pela qual o recurso a distribuidores não é verdadeiramente uma opção para efetivar os direitos dos titulares. Não há, alegadamente, essa cadeia de distribuição na medida em que os titulares representados pela Recorrente não distribuem as suas sementes, mas concedem licenças de produção e de distribuição. Assim, as sementes são, na prática, comercializadas por outras empresas, o que levanta dois problemas diferentes. Em primeiro lugar, essas empresas mostram‑se relutantes em comunicar os nomes dos seus clientes por razões de confidencialidade. Em segundo lugar, solicitar às empresas a jusante da cadeia de distribuição que divulguem os nomes dos seus clientes pode também colocar problemas em termos de direito da concorrência.

70.      Daqui resulta que, na ausência de um contrato entre o agricultor (ou o processador) e o titular que definirá as informações pertinentes a fornecer pelo primeiro aos segundos, tal como previsto no artigo 8.o, n.o 1, e no artigo 9.o, n.o 1, do Regulamento de Execução, não parece ser muito fácil, na prática, que o titular obtenha informações junto dos agricultores ou processadores.

71.      É neste contexto prático que a Recorrente alega, no essencial, que o funcionamento do atual sistema é problemático e que, se o acesso à informação por parte de organismos oficiais nos termos do artigo 11.o fosse interpretado em sentido lato, os custos globais com a documentação e os custos de transação para todas as pessoas envolvidas diminuiriam.

72.      Por uma questão de redação legislativa, tenho muita simpatia pessoal para uma abordagem deste tipo. Qualquer medida destinada a não sobrecarregar o indivíduo de ter de fornecer informações que já estejam na posse da autoridade pública deve, por uma questão de princípio, ser bem‑vinda.

73.      Aqui reside, no entanto, o problema: o que a Recorrente está a propor vai muito para além de tudo o que, normalmente, pode ser considerado como uma interpretação de uma disposição legal. Semelhante interpretação alteraria o sistema e a lógica do Regulamento de Execução, ao mesmo tempo que o colocaria em contradição com a lógica do Regulamento de Base (28). Uma intervenção judicial desta natureza produziria também inconsistências em todo o ato legislativo (29).

74.      Além disso, uma tal intervenção «interpretativa» isolada poderia igualmente criar uma série de novas questões. Ao receber mais informações de caráter geral sobre uma presumível vasta gama de agricultores (pelo menos todos os que cultivem as espécies enumeradas no artigo 14.o, n.o 2, do Regulamento de Base ou, eventualmente, outras espécies), incluindo os que nunca utilizaram ou tencionavam utilizar variedades protegidas nos termos do artigo 14.o, n.o 1, não se pode ignorar que os titulares ganhariam acesso a informações que ultrapassam o âmbito das informações necessárias para efeitos de proteção dos seus direitos de propriedade intelectual. Essa informação poderia potencialmente ser utilizada para uma série de outros objetivos comerciais, que estão bastante afastados — ou mesmo totalmente alheios — à salvaguarda dos direitos de remuneração dos titulares face aos clientes atuais.

75.      Assim, os organismos oficiais não podem, com base no direito da União atualmente em vigor, tornar‑se, por defeito, os principais fornecedores de informação num sistema que depende dos agricultores e processadores e no qual o cumprimento é da exclusiva responsabilidade dos titulares, como decorre claramente do artigo 14.o, n.o 3, quinto e sexto travessões, do Regulamento de Base.

76.      Por todas estas razões, se os problemas delineados nesta secção tiverem efetivamente alguma base na realidade, cabe à Comissão, que pareceu reconhecer na audiência o caráter obsoleto das atuais disposições de execução da legislação da União, regressar ao trabalho e criar um novo sistema (30). É algo estranho tentar passar essa responsabilidade para o Tribunal de Justiça, especialmente num contexto legislativo como o atual, no qual mesmo uma intervenção judicial bem‑intencionada, relativa a uma disposição discreta, sem alterar a lógica geral do sistema, pode gerar mais problemas do que soluções (31).

C.      2.a Questão

77.      A segunda questão divide‑se em duas partes. Em primeiro lugar, o órgão jurisdicional de reenvio questiona sobre a definição de «organismo oficial envolvido no controlo da produção agrícola», na aceção do artigo 11.o, n.o 2, primeiro travessão, do Regulamento de Execução. Em segundo lugar, questiona se esse organismo oficial pode recusar as informações solicitadas se a prestação dessa informação implicar um custo para esse organismo que, no entanto, o titular estaria disposto a suportar.

78.      Não obstante a resposta negativa que defendi relativamente à 1.a questão, que torna desnecessária uma resposta à 2.a questão, irei ainda assim abordar as duas questões do órgão jurisdicional de reenvio no âmbito da 2.a questão, caso o Tribunal de Justiça decida seguir uma via diferente quanto à forma como os pedidos de informação devem ser formulados nos termos do artigo 11.o, n.o 1, do Regulamento de Execução. Além disso, uma vez que nada impede a Recorrente, ou qualquer outro titular de direitos de propriedade intelectual, de apresentar, em qualquer momento, um novo pedido nos termos do artigo 11.o do Regulamento de Execução, gostaria igualmente de sugerir que essas questões são de alguma relevância geral e prática e merecem uma resposta do Tribunal de Justiça.

1.      2.a Questão a): quem pode ser considerado um «organismo oficial envolvido no controlo da produção agrícola»?

79.      Nos termos do artigo 11.o, n.o 2, primeiro travessão, do Regulamento de Execução, um organismo oficial pode recusar‑se a prestar informações «se não estiver envolvido no controlo de produções agrícolas». Uma autoridade pública, como a que está em causa no caso em apreço, a quem cabe controlar a concessão de subvenções a agricultores, é um organismo oficial «envolvido no controlo da produção agrícola»?

80.      A Recorrente e a Comissão partilham em grande parte o mesmo ponto de vista, embora por razões ligeiramente diferentes. A Recorrente alega que um organismo responsável pelas subvenções agrícolas da União Europeia é um organismo oficial envolvido no controlo da produção agrícola, uma vez que a análise da legalidade das subvenções exige o controlo da produção agrícola. A Comissão alega que uma interpretação lata desse conceito é justificada para garantir o direito à informação. Deve abranger todos os organismos oficiais que disponham de informações sobre a produção agrícola, incluindo as autoridades competentes para pagar os subsídios.

81.      O Recorrido e o Governo espanhol são de opinião contrária. Uma autoridade pública responsável pelas subvenções da União Europeia não está envolvida no controlo da produção de vegetais. A gestão das subvenções da União Europeia obriga a que a autoridade obtenha dados relativos a variedades sobre os agricultores que solicitam tais subvenções, a fim de determinar se essas variedades pertencem ao catálogo comum de variedades vegetais da União. No entanto, a autoridade pública não tem de verificar se essas variedades são variedades protegidas e quem são os seus titulares. Essas informações não são relevantes para que essa autoridade desempenhe as suas funções.

82.      É certo que as autoridades públicas que controlam as subvenções da União Europeia não estão, em rigor, envolvidas na produção agrícola. No entanto, tenho poucas dúvidas de que, em qualquer leitura razoável dessa expressão, essas autoridades estejam claramente envolvidas no controlo da produção agrícola.

83.      Em primeiro lugar, mesmo que não estejam envolvidas na produção agrícola, as autoridades públicas que controlam as subvenções da União Europeia controlam efetivamente essa produção, uma vez que as subvenções da União Europeia são adaptadas no seu alcance e valor à atividades de produção dos agricultores (32). Por conseguinte, estas autoridades estão certamente envolvidas no controlo da produção agrícola, apesar de não «controlarem» a produção no sentido de uma economia planeada de forma centralizada, decidindo, por exemplo, se e em que nível a produção deve ser limitada.

84.      A questão de saber se essas autoridades públicas têm acesso, no âmbito das suas atividades globais de controlo, ao tipo exato de informações solicitado pela Recorrente é naturalmente relevante. Trata‑se, no entanto, de uma questão diferente. Uma autoridade pública pode estar envolvida, de um modo geral, no controlo da produção agrícola, mesmo que esse controlo não envolva um tipo de informação muito específico. Dito isto, foi afirmado na audiência que o Recorrido possui certos dados relevantes no que diz respeito às variedades.

85.      Em segundo lugar, o artigo 11.o, n.o 2, do Regulamento de Execução já contém várias exceções — redigidas de forma bastante ampla (33) — à obrigação de fornecer informações que permitam aos organismos oficiais recusar as informações solicitadas. No entanto, essas exceções devem ser interpretadas de forma restritiva, a fim de garantir uma eficácia residual da regra. Uma leitura excessivamente estrita do conceito de «organismo oficial envolvido no controlo da produção agrícola», tal como a sua limitação aos organismos criados apenas para aplicar o artigo 11.o do Regulamento de Execução, tornaria praticamente impossível que qualquer administração fosse caracterizada como um «organismo oficial envolvido no controlo da produção agrícola» (34). Por conseguinte, este conceito deve ser interpretado de uma forma razoável que garanta a eficácia do direito do titular a obter (determinadas) informações provenientes de organismos oficiais (35).

86.      Daqui resulta que uma autoridade pública responsável pelo controlo da concessão de subvenções da União Europeia é um organismo oficial envolvido no controlo da produção agrícola. Por conseguinte, tal organismo não pode beneficiar da exceção ao dever de fornecer a informação prevista no artigo 11.o, n.o 2, primeiro travessão, do Regulamento de Execução.

2.      2.a Questão b): custos adicionais

87.      Na 2.a questão, alínea b), o Tribunal de Justiça é chamado a determinar as condições em que um organismo oficial pode recusar as informações solicitadas quando o tratamento de tais informações implica custos adicionais para esse organismo. Além disso, o facto de o titular, na qualidade de autor do pedido de informações, estar disposto a suportar esses custos, tem alguma importância para essa resposta?

88.      De acordo com a Recorrente e a Comissão, a obtenção da informação deve ser distinguida do seu processamento: um organismo oficial só pode recusar informações se a sua obtenção, por oposição ao seu processamento, gerar custos adicionais. No caso em apreço, é indiscutível que o organismo oficial recebeu informações sem custos adicionais. De qualquer modo, a Recorrente e a Comissão alegam que o organismo oficial não pode recusar‑se a prestar a informação se a pessoa que a solicita estiver disposta a responsabilizar‑se por esses custos.

89.      O Recorrido e o Governo espanhol argumentam que o esforço extra que a pesquisa implicaria para o organismo oficial teria um impacto na sua organização e gestão, podendo mesmo afetar o desempenho normal das suas funções. Embora a informação solicitada pelo titular esteja disponível na base de dados do Recorrido, teria de ser criada uma função de pesquisa especial para recolher essa informação da base de dados. O Recorrido alega que não possui capacidades próprias de programação para levar a cabo a busca necessária para a recolha dos dados exigidos. Para o efeito, teria de recorrer aos serviços de um prestador externo. O custo estimado seria de cerca de 6 000,00 euros.

90.      Na minha opinião, cabe, em última instância, ao órgão jurisdicional de reenvio responder a esta questão, bastante factual, e determinar se, nas circunstâncias do caso concreto, o tratamento necessário dos dados, que já se encontram disponíveis, implica um trabalho adicional de tal forma considerável que não se possa esperar que o organismo oficial o realize. Tenciono, no entanto, fornecer de seguida algumas orientações gerais (36).

91.      Em primeiro lugar, o artigo 11.o, n.o 2, quinto e sexto travessões, do Regulamento de Execução prevê que o organismo oficial pode recusar as informações solicitadas se «a informação pretendida não puder ser obtida através do exercício normal das atribuições do organismo oficial» ou se «a informação pretendida só puder ser obtida com encargos ou custos adicionais».

92.      O Recorrido admitiu na audiência que a informação solicitada estava disponível na base de dados, embora não pudesse recolhêla sem a ajuda de outro prestador de serviços. Tal situação é abrangida pelas duas exceções acima referidas?

93.      Embora eu reconheça a importância da distinção entre a obtenção e o tratamento de informações no contexto dos documentos em papel, como corretamente salientado pelo Recorrido e pela Comissão, não estou plenamente convencido de que esta distinção seja de grande utilidade analítica no contexto das bases de dados eletrónicas. É provável que exista um reservatório de informação (potencialmente ilimitada) em qualquer base de dados ou conjunto de dados eletrónicos de grande dimensão. É a necessidade de extrair a informação dessa fonte de uma forma estruturada e útil que apresenta o verdadeiro problema e o encargo na prática (37).

94.      É certo que qualquer pedido de informação exige algum trabalho por parte da pessoa que detém ou é suscetível de deter a informação. No entanto, segundo o Tribunal de Justiça, no contexto da sua jurisprudência relativa ao acesso a documentos das instituições da União, no interesse de uma boa administração, a carga de trabalho envolvida no tratamento dos pedidos de acesso a documentos não deve ser desproporcionada (38).

95.      Assim, em vez de se concentrar na distinção entre a obtenção de um documento e o tratamento de um documento, poderá ser mais útil, no contexto da obtenção de informações a partir de bases de dados ou conjuntos de dados eletrónicos, analisar o volume global de trabalho adicional necessário. Um pedido de informação não pode ser recusado unicamente com base no facto de implicar um trabalho adicional. O teste consiste, em vez disso, em saber quanto trabalho adicional é necessário e em que momento esse trabalho adicional se torna desproporcionado.

96.      No caso vertente, tal como afirmado pela Recorrente e pela Comissão, a informação já está disponível na base de dados. Além disso, uma vez que nenhum organismo oficial está especificamente encarregado de recolher informações sobre a utilização de variedades protegidas, ainda que para outros fins, o direito à informação seria privado da sua substância se fosse recusado devido aos custos envolvidos do tratamento dessa informação.

97.      Estas duas considerações têm um determinado peso, especialmente no contexto específico das bases de dados eletrónicas. Dependendo da sua estrutura e organização interna, é possível obter uma grande quantidade de informação a partir de uma base de dados eletrónica, muitas vezes com um mínimo de esforço. Tal como olhar através de um caleidoscópio, uma pequena rotação (um comando ou um clique) poderá alterar completamente a imagem (39). Neste contexto, podem ser obtidos todos os tipos de informação mais facilmente, e acedidos com um esforço relativamente reduzido, embora, evidentemente, não se possa permitir que os pedidos individuais transformem a administração numa agência de investigação para fins privados.

98.      Por conseguinte, deve ser aplicada uma regra de razoabilidade e proporcionalidade para decidir se a administração deve conceder o acesso aos dados solicitados, não obstante o facto de o tratamento desses dados ser necessário. Neste contexto global, cabe ao órgão jurisdicional de reenvio apreciar, nas circunstâncias do caso em apreço, se a obtenção das informações solicitadas requer um trabalho adicional considerável que não pode ser razoavelmente suportado pela administração.

99.      Por último, no que diz respeito à proposta da Recorrente de suportar os custos extraordinários na recolha das informações solicitadas na base de dados, importa, desde logo, referir que esta questão é distinta da questão de saber se o acesso às informações deve ser concedido. Os custos constituem uma análise diferente do acesso. A decisão de conceder ou recusar o acesso à informação não está subordinada à condição de uma pessoa se declarar preparada para suportar os custos incorridos pela administração.

100. Tal decorre não só da lógica das regras de acesso aos documentos, em que o acesso é um passo distinto dos custos, mas também do imperativo da igualdade: a (in)capacidade de suportar os custos nunca deve determinar o acesso. Caso contrário, o acesso aos documentos só seria possível para os que podem pagar.

101. Assim, uma vez decidida a concessão de acesso tendo em conta o volume razoável de trabalho adicional necessário, cabe ao organismo oficial determinar, no passo seguinte e independente, se as eventuais despesas incorridas devem ser suportadas pela pessoa que solicita as informações. A este respeito, podem ser de novo introduzidas analogias com o acesso a documentos das instituições da União ou com a reutilização de informação do setor público. Em especial, o Regulamento (CE) n.o 1049/2001 estabelece que o custo de produção e envio das cópias poderá ser cobrado ao requerente, apesar de este custo não poder ser superior ao custo real de produção e envio de cópias (40). Pela mesma razão, a Diretiva 2003/98 estabelece que sempre que forem cobrados emolumentos pela reutilização de documentos, esses emolumentos devem limitar‑se aos custos marginais incorridos na sua reprodução, produção e divulgação (41).

102. Com base nestas regras por analogia, afigura‑se razoável, no presente contexto, que o organismo oficial a quem foi requerida a informação solicite aos titulares que paguem os custos incorridos na produção dessa informação, dentro dos limites dos custos adicionais reais do organismo oficial para o tratamento das informações.

103. Por conseguinte, o artigo 11.o, n.o 2, do Regulamento de Execução deve ser interpretado no sentido de que permite a um organismo oficial recusar as informações solicitadas se o tratamento dos dados já disponíveis for suscetível de implicar uma carga de trabalho desproporcionada que não possa ser razoavelmente suportada por esse organismo.

V.      Conclusão

104. À luz das considerações precedentes, proponho que o Tribunal de Justiça responda às questões colocadas pelo Thüringer Oberlandesgericht (Tribunal Regional Superior da Turíngia, Alemanha) da seguinte forma:

–      O artigo 11.o, n.o 1, do Regulamento (CE) n.o 1768/95 da Comissão, de 24 de julho de 1995, que estabelece as regras de aplicação relativas à exceção agrícola prevista no artigo 14.o, n.o 3, do Regulamento (CE) n.o 2100/94 do Conselho, relativo ao regime comunitário de proteção das variedades vegetais, deve ser interpretado no sentido de que exige que os pedidos de informação aos organismos oficiais sejam formulados em relação a variedades específicas protegidas. No entanto, esta disposição não impede que os Estados‑Membros facultem o acesso à informação dos organismos oficiais relativa às espécies ao abrigo do direito nacional.

–      Uma autoridade pública responsável pelo controlo da concessão de subvenções da União Europeia é um organismo oficial envolvido no controlo da produção agrícola. Por conseguinte, tal organismo não pode beneficiar da exceção ao dever de fornecer a informação prevista no artigo 11.o, n.o 2, primeiro travessão, do Regulamento n.o 1768/95.

–      O artigo 11.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1768/95 deve ser interpretado no sentido de que permite a um organismo oficial recusar as informações solicitadas se o tratamento dos dados já disponíveis for suscetível de implicar uma carga de trabalho desproporcionada que não possa ser razoavelmente suportada por esse organismo.


1      Língua original: inglês.


2      Acórdão de 10 de abril de 2003 (C‑305/00, EU:C:2003:218).


3      Acórdão de 14 de outubro de 2004 (C‑336/02, EU:C:2004:622).


4      JO 1994, L 227, p. 1.


5      JO 1995, L 173, p. 14.


6      Resulta do processo nacional apresentado ao Tribunal de Justiça que a Recorrente representa mais de 50 produtores, a maior parte empresas estabelecidas na Alemanha, ao passo que várias delas estão estabelecidas na Dinamarca, em França, nos Países Baixos e na Polónia.


7      Regulamento (UE) n.o 1306/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de dezembro de 2013, relativo ao financiamento, à gestão e ao acompanhamento da Política Agrícola Comum e que revoga os Regulamentos (CEE) n.o 352/78 (CE) n.o 165/94 (CE) n.o 2799/98 (CE) n.o 814/2000 (CE) n.o 1290/2005 e (CE) n.o 485/2008 do Conselho (JO 2013, L 347, p. 549).


8      Regulamento Delegado (UE) n.o 907/2014 da Comissão, de 11 de março de 2014, que completa o Regulamento (UE) n.o 1306/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho no que se refere aos organismos pagadores e outros organismos, à gestão financeira, ao apuramento das contas, às garantias e à utilização do euro (JO 2014, L 255, p. 18).


9      Acórdãos de 10 de abril de 2003, Schulin (C‑305/00, EU:C:2003:218); de 11 de março de 2004, Saatgut‑Treuhandverwaltungsgesellschaft (C‑182/01, EU:C:2004:135); de 14 de outubro de 2004, Brangewitz (C‑336/02, EU:C:2004:622); e de 15 de novembro de 2012, Raiffeisen‑Waren‑Zentrale Rhein‑Main (C‑56/11, EU:C:2012:713).


10      Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de novembro de 2003, relativa à reutilização de informações do setor público (JO 2003, L 345, p. 90).


11      V., também, o sexto considerando do Regulamento de Execução, que estabelece que a Comissão irá acompanhar os efeitos que a definição de «pequenos agricultores» pode produzir em relação ao papel da remuneração.


12      V., por exemplo, as minhas Conclusões no processo Buccioni (C‑594/16, EU:C:2018:425, n.o 32).


13      V., por exemplo, Acórdãos de 12 de outubro de 2017, Kamin und Grill Shop (C‑289/16, EU:C:2017:758, n.o 22) e de 19 de outubro de 2017, Vion Livestock (C‑383/16, EU:C:2017:783, n.o 35 e jurisprudência citada).


14      Esta restrição decorre do artigo 14.o, n.o 1, do Regulamento de Base.


15      Acórdãos de 10 de abril de 2003, Schulin (C‑305/00, EU:C:2003:218) e de 14 de outubro de 2004, Brangewitz (C‑336/02, EU:C:2004:622).


16      Acórdão de 10 de abril de 2003 (C‑305/00, EU:C:2003:218, n.o 63).


17      Ibid. n.o 72.


18      Ibid. n.o 57.


19      Acórdão de 14 de outubro de 2004 (C‑336/02, EU:C:2004:622, n.os 65 a 66).


20      Mas não só – a mesma lógica é repetida e reiterada no artigo 16.o, n.o 1, do Regulamento de Execução.


21      Decorre igualmente dessas disposições que, embora, de um modo geral, os agricultores e os processadores devam fornecer as informações pertinentes, estas podem ser fornecidas por determinados organismos oficiais, sob reserva de um certo número de condições.


22      Esta declaração foi apresentada no Acórdão de 10 de abril de 2003, Schulin (C‑305/00, EU:C:2003:218, n.o 60), no que se refere aos agricultores, e no Acórdão de 14 de outubro de 2004, Brangewitz (C‑336/02, EU:C:2004:622, n.o 48), no que respeita aos transformadores/processadores.


23      É de referir que o Tribunal de Justiça sublinhou expressamente «a dificuldade de o titular exercer o seu direito à informação, pelo facto de que […] o exame de uma planta não permite comprovar se ela foi obtida por utilização do produto da colheita ou por aquisição de sementes». Acórdão de 10 de abril de 2003 (C‑305/00, EU:C:2003:218, n.o 63).


24      V. n.os 55 a 56 destas conclusões.


25      Acórdão de 10 de abril de 2003, Schulin (C‑305/00, EU:C:2003:218, n.o 63).


26      Ibid. n.o 66.


27      Ibid. n.o 68. O artigo 13.o, n.o 2, alíneas c) e d) do Regulamento de Base prevê, nomeadamente, que a autorização do titular seja necessária para efeitos da colocação à venda, venda ou comercialização.


28      V., supra, n.o 61.


29      No próprio artigo 11.o do Regulamento de Execução, mas também com outras disposições dos mesmos – ver n.os 51 a 62, supra.


30      Em geral, no que diz respeito ao dever do legislador da União de acompanhar a evolução do contexto social e económico (ou enfrentar a consequência da contestação da sua legislação relativa à sua validade), ver as minhas Conclusões no processo Confédération paysanne e o. (C‑528/16, EU:C:2018:20, n.o 139) e Lietuvos Respublikos Seimas (C‑2/18, EU:C:2019:180, n.o 99).


31      Do mesmo modo, v. as minhas Conclusões no processo Hiebler (C‑498/16, EU:C:2017:863, n.o 123).


32      Os organismos pagadores, responsáveis pela gestão e controlo dos fundos agrícolas, devem dispor de um sistema de controlo interno que ofereça garantias suficientes de que os pagamentos são legais e regulares. Esse sistema integrado deve incluir uma base de dados informatizada, um sistema de identificação das parcelas agrícolas, de pedidos de ajuda e um sistema integrado de controlo. No que diz respeito a este último, devem ser efetuados controlos dos pedidos de ajuda, a fim de verificar as condições de elegibilidade da ajuda. V., nomeadamente, artigos 59.o, 67.o, 68.o e 74.o do Regulamento n.o 1306/2013.


33      V. n.os 8 e 62, supra.


34      Além disso, como resultou do debate na audiência que, uma vez que o controlo de base e por defeito ao abrigo dos Regulamentos de Base e de Execução foi confiado ao titular, não foi criada nenhuma rede especial de autoridades nacionais designadas.


35      A força da regra segundo a qual os organismos oficiais devem fornecer a informação legalmente solicitada é ainda sublinhada pelo artigo 11.o, n.o 4, do Regulamento de Execução, que estabelece o dever de fundamentação, por escrito, da recusa de acesso às informações solicitadas.


36      Naturalmente, com a ressalva de que o que se segue só seria relevante se o pedido inicial fosse, de facto, abrangido pelo âmbito de aplicação do artigo 11.o do Regulamento de Execução. De acordo com o que foi sugerido supra, nos n.os 38 a 42 das presentes conclusões, se for formulado um pedido à autoridade administrativa nacional sobre as espécies, o direito nacional e os seus princípios relativos ao acesso e aos custos adicionais aplicar‑se‑ão.


37      V., nomeadamente, Acórdão de 11 de janeiro de 2017, no processo Typke/Comissão (C‑491/15 P, EU:C:2017:5, n.o 34). Dito de forma diferente, no contexto dessas bases de dados ou conjuntos de dados eletrónicos, é provável que a maior parte dos encargos reais estejam relacionados com o processamento. A informação está efetivamente disponível, mas sem uma estrutura e um enquadramento adequados é efetivamente inútil.


38      V., por exemplo, Acórdão de 2 de outubro de 2014, Strack/Comissão (C‑127/13 P, EU:C:2014:2250, n.os 27 a 28). V., também, as minhas Conclusões no processo Typke/Comissão (C‑491/15 P, EU:C:2016:711, n.o 41).


39      V. as minhas Conclusões no processo Typke/Comissão (C‑491/15 P, EU:C:2016:711, n.os 45 a 46).


40      V. artigo 10.o, n.o 1, do Regulamento (CE) n.o 1049/2001 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de maio de 2001, relativo ao acesso do público aos documentos do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão (JO 2001, L 145, p. 43).


41      V. artigo 6.o da Diretiva 2003/98.