Language of document : ECLI:EU:T:1999:37

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Primeira SecçãoAlargada)

4 de Março de 1999 (1)

«Concentração — Regulamento (CEE) n.° 4064/89 — Empresa comum —Qualificação — Carácter definitivo ou preparatório da decisão que reconhece ocarácter de cooperação de uma empresa comum — Critérios de uma empresacomum com carácter de concentração: autonomia funcional e ausência decoordenação entre as empresas em causa — Direito das empresas interessadas aserem ouvidas — Fundamentação»

No processo T-87/96,

Assicurazioni Generali SpA e Unicredito SpA , sociedades de direito italiano,estabelecidas, respectivamente, em Trieste e em Treviso (Itália), representadas porAurelio Pappalardo, advogado no foro de Trapani, e Cláudio Tesauro, advogadono foro de Nápoles, com domicílio escolhido no Luxemburgo no escritório doadvogado Alain Lorang, 51, rue Albert 1er,

recorrentes,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada por Richard Lyal e FabiolaMascardi, membros do Serviço Jurídico, na qualidade de agentes, com domicílioescolhido no Luxemburgo no gabinete de Carlos Gómez de la Cruz, membro doServiço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,

recorrida,

apoiada pela

República Italiana, representada por Umberto Leanza, chefe do Serviço doContencioso Diplomático do Ministério dos Negócios Estrangeiros, na qualidadede agente, assistido por Ivo M. Braguglia, avvocato dello Stato, com domicílioescolhido no Luxemburgo na Embaixada de Itália, 5, rue Marie-Adélaïde,

interveniente,

que tem por objecto um pedido de anulação da decisão da Comissão no Processon.° IV/M. 711 — Generali/Unicredito, de 25 de Março de 1996, relativa a umprocesso de aplicação do Regulamento (CEE) n.° 4064/89 do Conselho, de 21 deDezembro de 1989, relativo ao controlo das operações de concentração deempresas (versão rectificada, JO 1990, L 257, p. 14),

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Primeira Secção Alargada),

composto por: B. Vesterdorf, presidente, C. W. Bellamy, R. M. Moura Ramos, J.Pirrung e P. Mengozzi, juízes,

secretário: H. Jung,

vistos os autos e após a audiência de 14 de Julho de 1998,

profere o presente

Acórdão

Factos e tramitação do processo

1.
    Por decisão de 25 de Março de 1996, a Comissão reconheceu, em aplicação doartigo 6.°, n.° 1, alínea a), do Regulamento (CEE) n.° 4064/89 do Conselho, de 21de Dezembro de 1989, relativo ao controlo das operações de concentração deempresas (versão rectificada, JO 1990, L 257, p. 14, a seguir «Regulamenton.° 4064/89»), que a criação de uma empresa comum denominada Casse e GeneraliVita SpA (a seguir «CG Vita» ou «empresa comum»), em execução dos acordosque lhe tinham sido notificados em 9 de Fevereiro de 1996 pela AssicurazioniGenerali SpA (a seguir «Generali») e a Unicredito SpA (a seguir «Unicredito»),não constituía uma concentração na acepção do artigo 3.° do Regulamento

n.° 4064/89 — tal como estava redigido na altura da adopção dessa decisão, antesde ser alterado pelo Regulamento (CE) n.° 1310/97 do Conselho, de 30 de Junhode 1997, que altera o Regulamento (CEE) n.° 4064/89 relativo ao controlo dasoperações de concentração de empresas (JO L 180, p. 1, a seguir «Regulamenton.° 1310/97») — e não cabia, por isso, no âmbito de aplicação desse regulamento(Processo n.° IV/M. 711) — Generali/Unicredito, a seguir «decisão impugnada»).Os acordos supramencionados apresentavam-se sob a forma de uma carta deintenções de 10 de Janeiro de 1996 completada por uma carta de 9 de Fevereirode 1996 e de acordos parassociais assinados nessa mesma data.

2.
    Em consequência, a Comissão, a pedido das partes notificantes, tratou a notificaçãosuprareferida como um pedido (de certificado negativo) na acepção do artigo 2.°ou uma notificação na acepção do artigo 4.° do Regulamento n.° 17 do Conselho,de 6 de Fevereiro de 1962, Primeiro Regulamento de execução dos artigos 85.° e86.° do Tratado (JO 1962, 13, p. 204; EE 08 F1 p. 22, a seguir «Regulamenton.° 17»), em conformidade com o disposto no artigo 5.° do Regulamento (CE)n.° 3384/94 da Comissão, de 21 de Dezembro de 1994, relativo às notificações,prazos e audições previstos no Regulamento (CEE) n.° 4064/89 do Conselhorelativo ao controlo das operações de concentração de empresas, que estava emvigor na altura dos factos (JO L 377, p. 1, a seguir «Regulamento n.° 3384/94»).Por carta de 1 de Abril de 1996, informou as partes do arquivamento do processo,em virtude de o artigo 85.° do Tratado não ser aplicável na medida em que osacordos notificados não eram susceptíveis de afectar de maneira sensível ocomércio entre os Estados-Membros.

3.
    Na altura da notificação à Comissão dos acordos supra mencionados, que prevêemo controlo conjunto da sociedade CG Vita pela Unicredito e pela Generali, essasociedade era denominada Quercia Vita SpA e exclusivamente controlada pelaUnicredito. Segundo as indicações contidas na carta de intenções supra mencionadabem como no formulário relativo à notificação da operação em causa, emconformidade com o Regulamento n.° 4064/89 (a seguir «formulário CO»), asociedade não estava em actividade e não dispunha ainda da autorização do Istitutoper la Vigilanza sulle Imprese di Assicurazione Private e di Interesse Collettivo (aseguir «ISVAP») (Instituto de fiscalização das empresas seguradoras privadas deinteresse colectivo) requerida pelo Decreto Legislativo italiano n.° 174, de 17 deMarço de 1995, que subordina o exercício de uma actividade no sector dos segurosa tal autorização, com a finalidade de protecção dos consumidores.

4.
    A empresa CG Vita é destinada a exercer a sua actividade no sector dos seguros,nos ramos «vida», «capitalização» e «fundos de reforma», nos limites, para esteúltimo ramo, das actividades que a regulamentação italiana reserva exclusivamenteàs companhias de seguros (ponto 1.1.1 da carta de intenções). Mais precisamente,nos termos do artigo 4.° dos seus estatutos, tem por objecto o exercício daactividade de seguros e de resseguros nos ramos previstos nos pontos A e B doquadro anexo ao Decreto Legislativo n.° 174, de 17 de Março de 1995, em Itália

e no estrangeiro, e a participação em sociedades com o mesmo objecto. O primeiroprograma quinquenal de actividade da CG Vita, estabelecido em aplicação daregulamentação italiana suprareferida com vista ao seu exame pelo ISVAP, prevêque a empresa comum operará essencialmente, pelo menos de início, no sector dosseguros individuais, com produtos muito simples (a seguir «programa deactividade»).

5.
    Nos termos dos artigos 6.° e 7.° dos seus estatutos, a CG Vita dispõe de um capitalsocial de 2 000 milhões de LIT, que poderá ser elevado a 20 000 milhões ou,segundo o formulário CO e a carta de intenções supramencionados, a um nívelsuperior em função do plano industrial. Nos termos das observações do Governoitaliano mencionadas na decisão impugnada, o compromisso financeiro inicial daGenerali limitava-se, então, a 300 milhões de LIT. Os efectivos da empresa comum,compostos de início por quinze pessoas — entre as quais um director responsável,um responsável comercial (dirigente) e um responsável técnico-administrativo —,será regularmente aumentado para atingir 23 pessoas ao longo do quinto exercício,segundo o organigrama contido no programa de actividade. Segundo o artigo 5.°dos seus estatutos, a empresa comum é constituída por um período que deveterminar em 31 de Dezembro de 2050, mas cuja duração poderá ser prorrogada.

6.
    Segundo a carta de intenções e o formulário CO, a sociedade Generali é umacompanhia de seguros que exerce uma actividade de seguros e de resseguros emtodos os ramos «danos» e no ramo «vida». Controla o grupo Generali que,segundo a decisão impugnada, é o primeiro grupo de seguros em Itália.

7.
    A Unicredito é uma sociedade financeira que tem por objecto, nomeadamente, atomada de participações e a gestão destas em sociedades do sector da banca, dafinança e dos seguros. Encontra-se à cabeça do grupo bancário Unicredito,composto pelas sociedades Cassa di Risparmio di Verona Vicenza Belluno eAncona (a seguir «Cariverona») e Cassa di Risparmio della Marca Trivigiana (aseguir «Cassamarca»), bem como pelas sociedades controladas por estas.

8.
    Na carta de intenções de 10 de Janeiro de 1996, suprareferida, a Generali e aUnicredito dão conta liminarmente da sua intenção de concluir acordos denatureza participativa e de cooperação nos sectores da banca, da finança e dosseguros e das actividades parabancárias, com vista a realizar uma integração mútuadas suas actividades. Sublinham, em substância, que essa iniciativa se inscreve nalógica das evoluções mais recentes no sector da banca e dos seguros, as quaistendem a favorecer o processo de integração intersectorial na perspectiva de umalargamento da oferta de produtos bancários, financeiros, de seguros eparabancários em geral, através de uma melhor e mais extensa utilização dasrespectivas redes de distribuição dos operadores, e a acentuar a economia, aeficácia e as sinergias.

9.
    Neste quadro, e com a finalidade de «consolidar posteriormente as suas relaçõesde cooperação», esclarecem que pretendem desenvolver as suas relações de

«participação/colaboração», por um lado, criando a empresa comum CG Vita e,por outro, prevendo «actividades operacionais» (n.° 1 da carta de intenções).

10.
    Só a criação da empresa CG Vita foi objecto da notificação suprareferida. Essaoperação realizou-se, em conformidade com a carta de intenções (ponto 1.1.1), pormeio da aquisição pela Generali de 50% do capital da CG Vita, até entãointeiramente detido pela Unicredito. Os acordos parassociais supra mencionadosespecificam que o conselho de administração se compõe paritariamente demembros nomeados, metade pela Cariverona e pela Cassamarca e metade pelaGenerali. Segundo o artigo 14.° dos estatutos da CG Vita, a assembleia geralextraordinária delibera, em matéria comercial, por maioria absoluta do capitalsocial.

11.
    A carta de intenções indica que a carteira de apólices de seguros da Eurovitainvestidas pela Cariverona e pela Cassamarca e detida pela sociedade Eurovitaserá, por força de um acordo entre essas três sociedades, transferida da Eurovitapara CG Vita (ponto 1.1.2).

12.
    Por outro lado, a carta de intenções (ponto 1.1.1) prevê que a CG Vitacomercializará os seus produtos através da rede de agências dos bancos controladospela Unicredito. Poderão igualmente ser celebrados acordos com outras redes,bancárias ou não. Segundo as indicações contidas no programa de actividade econfirmadas pelas sociedades-mãe nas suas respostas de 29 de Fevereiro e de 12de Março de 1996 a pedidos de informação da Comissão, a rede bancária daUnicredito assegurará a distribuição dos produtos da CG Vita no quadro decontratos de agência e não de contratos de distribuição.

13.
    A carta de intenções especifica também que os bancos do grupo Unicreditoconfiarão à CG Vita todas as coberturas relativas ao seguro de vida, incluindo asque dizem respeito aos seus empregados (ponto 1.1.1). Por outro lado, os fundosdessa empresa comum serão depositados junto de bancos do grupo Unicredito, osquais gerirão igualmente os valores mobiliários investidos tendo em conta asreservas técnicas (ponto 1.1.3).

14.
    Quanto às «actividades operacionais» suprareferidas, a Generali compromete-se,em substância, a recorrer progressivamente, de maneira privilegiada, aos serviçosbancários e financeiros do grupo Unicredito, que lhe serão fornecidos nas melhorescondições do mercado. Quanto à sociedade Unicredito, compromete-se a dirigirinstruções aos bancos que controla a fim de que subscrevam todas as novasapólices de seguro, no ramo «danos», na Generali, nas melhores condições domercado. Além disso, os bancos do grupo Unicredito e Generali estudarão apossibilidade de adoptar iniciativas comuns com vista a definir e a colocar produtosde seguro no ramo «danos», igualmente destinados à clientela dos bancoscontrolados pela Unicredito, sem excluir a constituição em comum de uma novacompanhia neste sector específico (ponto 1.2 da carta de intenções).

15.
    A Unicredito e a Generali acordam em instituir uma comissão de estudoencarregada de desenvolver estas iniciativas comuns e de arrancar com novasiniciativas tais como, nomeadamente, a instalação, junto das agências de Generali,de instrumentos de pagamento automatizados; o estabelecimento de umacooperação no domínio dos cartões de crédito e da moeda em geral; no segmentodos serviços bancários às empresas, a colocação em comum dos serviços oferecidospelos bancos do grupo Unicredito e pela Generali; o exame da oportunidade deconseguir uma contiguidade entre as agências bancárias da Unicredito e os serviçosou as agências da Generali (ponto 3 da carta de intenções).

16.
    No que toca à formação profissional, a carta de intenções indica que a Generalicolaborará estreitamente na colocação em funcionamento de estruturas deformação do pessoal da Unicredito encarregado da promoção e da venda dosprodutos de seguro. Segundo o programa de actividade da CG Vita, acordos entreessa empresa e as suas sociedades-mãe prevêem para esse efeito a instituição decursos coordenados por professores («esperti docenti») da Escola de FormaçãoProfissional dos Seguros Generali (Scuola di Formazione Professionale dellaAssicurazioni Generali). Os custos dessa formação, a cargo da empresa em causa,escalonar-se-á de 500 milhões de LIT durante o primeiro exercício, a 243 milhõesao longo do quinto exercício, segundo os dados constantes no programa deactividade.

17.
    A carta de intenções contém igualmente acordos de exclusividade, que se aplicamunicamente, segundo a resposta da Generali e da Unicredito a um pedido formalde informações da Comissão, à constituição da empresa CG Vita pela aquisição de50% do seu capital pela Generali e à distribuição dos produtos dessa empresa pelarede bancária da Unicredito. A Generali renuncia expressamente, na carta deintenções, a concluir, sem o acordo da Unicredito, acordos de cooperação e/ou departicipação de conteúdo similar com outros bancos nas regiões italianas em queos bancos deste grupo estejam presentes em número suficientemente importante.

18.
    A Unicredito assume um compromisso similar para com a Generali. Maisprecisamente, renuncia a adquirir directa ou indirectamente, sem o acordo daGenerali, participações em outras companhias de seguros a título de investimentopermanente e funcional. São excluídas deste compromisso eventuais tomadas departicipação em sociedades e/ou holdings bancárias que disponham, por seu turno,de participações directas ou indirectas em companhias de seguros.

19.
    No que toca mais especialmente à distribuição dos produtos da CG Vita,especifica-se na carta complementar de 9 de Fevereiro de 1996, supramencionada,que a duração da exclusividade imposta à Unicredito para essa distribuição élimitada a um período de cinco anos.

20.
    Finalmente, o programa de actividade prevê que as sociedades fundadoras prestema sua assistência, a preço de custo, à empresa comum em certo número dedomínios. Segundo essas previsões, o montante do reembolso às sociedades-mãe

elevar-se-à a 800 milhões de LIT para o primeiro exercício e aumentaráanualmente 5%. A CG Vita beneficiará na medida mais ampla possível dos serviçosinformáticos das sociedades-mãe. Os processos de carácter técnico e administrativorelativos às apólices de seguro de vida (emissão das apólices, contabilidade,liquidação, cálculo das reservas de balanço, etc.) serão os da Generali. Emconsequência, pelo menos enquanto o volume da carteira não permitir absorver oscustos de um serviço de revisão interno, a actividade de fiscalização interna seráexercida pelo serviço de auditoria interna da Generali (Ufficio di InternalAuditing). Além disso, para a avaliação médica e profissional dos riscos propostos,a CG Vita poderá, «pelo menos durante o primeiro período do exercício da suaactividade», recorrer ao serviço de selecção médica da Generali. Finalmente, aassistência técnico-actuarial ser-lhe-á igualmente fornecida pela Generali, que poráà sua disposição um actuário. O programa de actividade sublinha, no entanto, «avontade de tornar a gestão da sociedade autónoma, com o decorrer do tempo, [oque] se realizará progressivamente, em paralelo com o crescimento do volume denegócios».

21.
    Na sequência da notificação dos acordos que acabam de ser descritos, o processodesenrolou-se da forma seguinte: em 23 de Fevereiro de 1996, a Comissãotransmitiu às partes, em aplicação do artigo 11.° do Regulamento n.° 4064/89, umprimeiro pedido formal de informações. Sublinhava a necessidade, para poderqualificar a CG Vita de empresa comum de pleno exercício, a) «de obter demaneira geral precisões e explicações suplementares relativas ao carácter autónomoe de pleno exercício (desta) empresa, nomeadamente no que toca (aos seus)recursos, e uma indicação do 'timing‘ previsto para o exercício efectivo da suaactividade»; b) de tomar conhecimento do seu projecto industrial; c) de dispor deinformações suplementares respeitantes à Eurovita e d) de especificar a carteirade contratos que será transmitida à CG Vita. As sociedades-mãe comunicaram oprograma de actividade à Comissão e responderam a este pedido de informaçõespor carta de 29 de Fevereiro de 1996, especificando nomeadamente que adistribuição dos produtos da CG Vita seria assegurada pelas agências da Unicreditoque actuam na qualidade de agentes.

22.
    Em 4 de Março de 1996, a Autorità Garante della Concorrenza e del Mercato(autoridade italiana competente em matéria de concorrência) dirigiu à Comissãouma comunicação pedindo a remessa do processo a título do artigo 9.° doRegulamento n.° 4064/89. A Generali e a Unicredito foram informadas dessacomunicação pela Comissão que lhes dirigiu, em 6 de Março de 1996, um segundopedido formal de informações destinado essencialmente a precisar a sua posiçãono mercado, a descrever a rede de distribuição da Generali para os produtos doseguro de vida e a indicar os eventuais acordos em vigor entre a Generali e outrasempresas bancárias. Responderam a esse pedido por carta de 12 de Março de 1996e, após uma reunião informal com os funcionários da task-force «controlo dasoperações de concentração entre empresas» da direcção geral concorrência(DG IV) da Comissão (a seguir «task-force 'concentração‘») em 13 de Março de

1996, aduziram, numa carta à Comissão de 15 de Março seguinte, especificaçõesrelativas nomeadamente ao carácter acessório do acordo de distribuição exclusivados produtos da empresa comum.

23.
    Em 25 de Março de 1996, a Comissão adoptou a decisão impugnada declarandoque a operação notificada não constitui uma concentração na acepção do artigo 3.°,n.° 2, do Regulamento n.° 4064/89, em virtude de a CG Vita não possuir «umaautonomia funcional efectiva e apresentar uma série de elementos de cooperaçãoque conduzem à conclusão de que, no seu conjunto, a operação tem carácter decooperação» (pontos 21 e 22).

24.
    No que toca, antes de mais, à autonomia funcional, a Comissão declara na decisãoimpugnada que «os elementos de informação e de prova de que dispõe não lhepermitem concluir, com grau de probabilidade suficiente, pela existência de umaautonomia funcional efectiva e suficiente da empresa comum» (ponto 13). Essaafirmação baseia-se em duas constatações. Em primeiro lugar, «a despeito davontade declarada das partes de tornar a gestão da empresa progressivamenteautónoma [...] a quase totalidade dos serviços associados à actividade de produçãoe de gestão das apólices de seguros (processos de emissão, de contabilidade, deliquidação, de cálculo das reservas de balanço, da avaliação dos riscos, deassistência em matéria de técnica actuarial, etc.) (será) assegurada pelas estruturasorganizativas da Generali, pelo menos até ao momento (evidentemente impossívelde precisar) em que o desenvolvimento da carteira de seguros (for) tal que permitaà empresa comum absorver os custos ligados ao exercício independente dasactividades e dos serviços em questão» (ponto 16). Em segundo lugar,diferentemente, em particular, do que aconteceu no processo Zurigo/Banco diNapoli (IV/M.543), «o facto de os produtos de seguro CG Vita não (apresentarem)características tais que possam ser distinguidos de maneira inequívoca, quanto à suanatureza e ao seu conteúdo, daqueles que foram já desenvolvidos e comercializadospela Generali por intermédio do sistema bancário (parece) enfraquecer ainda maisos argumentos tendentes a apoiar o carácter autónomo [...] da empresa comum»(ponto 17).

25.
    A Comissão avalia, em seguida, «no que toca ao conjunto da operação, aimportância económica dos elementos de cooperação entre as empresas fundadorasno que respeita ao acesso privilegiado ao mercado de produtos de seguro do ramo'vida‘ pelo canal bancário» (ponto 18). Salienta, em primeiro lugar, que aoperação contemplada se inscreve num projecto mais vasto de cooperação entrea Generali e a Unicredito no sector da banca, da finança, dos seguros e dasactividades parabancárias, esboçado na carta de intenções e de que operação emcausa constitui apenas uma das etapas. Além disso, a existência dos interesses daspartes na realização de amplas formas de cooperação, nos sectores da finança edos seguros, parece ainda reforçada pelos acordos de exclusividade recíproca —previstos na carta de intenções — que cobrem, segundo a Comissão, o conjunto dossectores que são objecto da cooperação (ponto 19). Em segundo lugar, a Comissãoreconhece, em substância, que a operação se inscreve «num contexto de mercado,

relativo à distribuição de produtos de seguro de vida em Itália», já caracterizado,por um lado, por uma larga difusão de acordos de exclusividade que vinculam, naqualidade de mandatários únicos, redes de agências às diversas companhias deseguros e, por outro, pelo crescimento rápido da actividade de intermediárioexercida pelos bancos no que toca a distribuição dos produtos de seguro de vida.Neste contexto, o canal bancário representará cada vez mais um sistema dedistribuição privilegiado, ou mesmo, em certos casos, essencial, para aceder aomercado do seguro de vida, em razão das dificuldades e dos custos ligados àcriação de redes de distribuição suficientemente espalhadas e variadas (ponto 20).

26.
    Por petição registada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância, em 5 deJunho de 1996, a Generali e a Unicredito pediram a anulação da decisãoimpugnada.

27.
    Por requerimento registado na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 28de Fevereiro de 1997, a República Italiana pediu para intervir em apoio dospedidos da Comissão. O presidente da Terceira Secção Alargada admitiu essaintervenção por despacho de 21 de Abril de 1997.

28.
    Na sequência da entrada em funções de um novo membro do Tribunal de PrimeiraInstância, o processo foi reatribuído, em 4 de Março de 1998, à Primeira SecçãoAlargada e foi nomeado um novo juiz-relator.

29.
    Com base em relatório do juiz-relator, o Tribunal decidiu abrir a fase oral doprocesso sem proceder a medidas de instrução prévias. As partes apresentaramalguns documentos, antes da data da audiência, a pedido do Tribunal, no quadrodas medidas de organização do processo previstas pelo artigo 64.° do seuRegulamento de Processo. A audiência teve lugar em 14 de Julho de 1998.

Pedidos das partes

30.
    As recorrentes concluem pedindo que o Tribunal se digne:

—    anular a decisão impugnada;

—    condenar a Comissão nas despesas do processo.

31.
    A recorrida e a interveniente concluem pedindo que o Tribunal se digne:

—    julgar o recurso inadmissível;

—    a título subsidiário, negar-lhe provimento;

—    condenar as recorrentes nas despesas.

Quanto à admissibilidade

Argumentação das partes

32.
    A Comissão contesta por excepção a admissibilidade do recurso, em virtude de adecisão impugnada não produzir efeitos jurídicos imediatos susceptíveis de afectaros interesses das recorrentes. A decisão impugnada apresentaria o carácter de umsimples acto intermédio, na medida em que determina unicamente o procedimentoa seguir e as disposições materiais aplicáveis quando do exame da operação emcausa. Com efeito, limita-se a reconhecer que tal operação não cabe no âmbito deaplicação do Regulamento n.° 4064/89 e a indicar que a notificação seráconsiderada, em conformidade com o pedido das partes notificantes, como umpedido de certificado negativo na acepção do artigo 2.° do Regulamento n.° 17 ouuma notificação na acepção do artigo 4.° desse regulamento. Só a decisão posteriorda Comissão sobre a compatibilidade da operação em causa com o artigo 85.° doTratado adoptará a posição definitiva dessa instituição, no que toca a questão desaber se essa operação pode ser realizada segundo as modalidades propostas pelaspartes notificantes ou segundo modalidades diferentes.

33.
    Sob esse aspecto, a instituição recorrida estabelece uma distinção entre dois tiposde decisões tomadas a título do artigo 6.°, n.° 1, alínea a), do Regulamenton.° 4064/89. Adoptando, como no caso vertente, uma decisão que reconhece quea operação notificada não constitui uma concentração, a Comissão conserva a suacompetência. A regularidade dessa decisão intermédia poderá ser examinada noquadro de um recurso interposto contra a decisão final da Comissão, no termo doprocesso de aplicação do artigo 85.° do Tratado, sem privar as empresasnotificantes do benefício da protecção do direito comunitário. Com efeito, só se aComissão entender que o artigo 85.°, n.° 1, do Tratado não se aplica e que não há,portanto, que adoptar uma decisão de isenção a título do artigo 85.°, n.° 3, domesmo Tratado é que as autoridades nacionais voltariam a ser competentes paraexaminar a operação.

34.
    Ao invés, quando a Comissão é exclusivamente competente para examinar asconcentrações de dimensão comunitária, uma decisão dessa instituição, a título doartigo 6.°, n.° 1, alínea a), do Regulamento n.° 4064/89, que reconhece que umaoperação constitui uma concentração mas não apresenta dimensão comunitária,implicará automaticamente a incompetência dessa instituição e determinará aaplicabilidade das regras nacionais da concorrência. Tal decisão será susceptível deconstituir objecto de um recurso de anulação nos termos do artigo 173.°, quartoparágrafo, do Tratado, como o entendeu o Tribunal de Primeira Instância no seuacórdão de 24 de Março de 1994, Air France/Comissão (T-3/93, Colect., p. II-121).

35.
    A República Italiana adere à argumentação da Comissão. A decisão impugnadanão constitui o acto final do processo iniciado pela notificação referida no artigo4.° do Regulamento n.° 4064/89. Com efeito, esse processo compreende duas fases.A primeira, necessária, destina-se a verificar se a operação notificada constitui uma

concentração e cabe, portanto, no âmbito de aplicação desse regulamento. Asegunda, unicamente encetada na sequência de uma decisão negativa no termo daprimeira fase, terá em vista apreciar essa operação à luz do artigo 85.° do Tratadoe conduzirá a uma decisão final.

36.
    As recorrentes entendem, por seu lado, que a decisão impugnada constitui um actojurídico definitivo, susceptível de ser objecto de um recurso de anulação, emconformidade com jurisprudência bem assente. (acórdão Air France/Comissão, járeferido).

Apreciação do Tribunal

37.
    Segundo jurisprudência constante, uma decisão apresenta a natureza de um actoimpugnável desde que modifique de forma caracterizada a situação jurídica dasempresas em causa produzindo efeitos jurídicos definitivos (v. acórdão do Tribunalde Justiça, de 11 de Novembro de 1981, IBM/Comissão, 60/81, Recueil, p. 2639,bem como os acórdãos do Tribunal de Primeira Instância, de 10 de Julho de 1990,Automec/Comissão, T-64/89, Colect., p. II-367, e Air France/Comissão, já referido,n.os 43 e 50).

38.
    A qualificação de uma operação económica numa decisão formal da Comissão,adoptada no termo de um processo especial — instituído, neste caso, peloRegulamento n.° 4064/89 — e implicando a escolha por esta instituição de umprocesso de controlo, não constitui uma simples medida preparatória em relaçãoà qual os direitos dos recorrentes possam ser protegidos de maneira adequada porum recurso de anulação da decisão que põe termo ao processo, quando essadecisão ou o recurso facultado contra a mesma não permitam extinguir asconsequências irreversíveis dessa qualificação sobre a situação jurídica dosrecorrentes (v., nomeadamente, em sentido semelhante, os acórdãos do Tribunalde Justiça de 30 de Junho de 1992, Espanha/Comissão, C-312/90, Colect., p. I-4117,n.os 19 a 24, e Itália /Comissão, C-47/91, Colect., p. I-4145, n.os 26 a 30, em que oTribunal de Justiça julgou no sentido de que uma decisão que qualifique um auxíliocomo novo constitui um acto impugnável, na medida em que implica a aplicaçãode um processo de controlo especial, caracterizado pela suspensão do pagamentodo auxílio, por força do artigo 93.°, n.° 3, do Tratado, enquanto aquele não fordeclarado compatível com o Tratado).

39.
    No presente caso concreto, como prevê expressamente o artigo 6.°, n.° 1, alínea a),do Regulamento n.° 4064/89, a decisão impugnada põe termo a um processo deaplicação desse regulamento, encetado pela notificação dos acordos que prevêema criação da empresa CG Vita, reconhecendo que essa operação não constitui umaconcentração pela razão de que apresenta um carácter de cooperação.

40.
    Ora, nos termos do seu artigo 22.°, n.os 1 e 2, tal como estava redigido à data daadopção da decisão impugnada, o Regulamento n.° 4064/89 é o único aplicável às

operações de concentração definidas no artigo 3.°, que são, por essa razão,subtraídas à aplicação do Regulamento n.° 17.

41.
    A decisão impugnada, que reconhece que a criação da CG Vita não constitui umaconcentração e é, por essa razão, excluída do âmbito de aplicação do Regulamenton.° 4064/89, tem portanto como efeito, nomeadamente, submeter essa operação àproibição dos acordos, decisões ou práticas concertadas enunciada pelo artigo 85.°do Tratado e ao processo autónomo e distinto instituído pelo Regulamento n.° 17.

42.
    A decisão impugnada determina os critérios de apreciação da regularidade daoperação em causa, bem como o processo e as sanções eventuais que lhe sãoaplicáveis. Modifica, por esta forma, a situação jurídica das recorrentes privando-asda possibilidade de fazer examinar a regularidade da operação em causaunicamente sob o ângulo estrutural, no quadro do processo acelerado instituídopelo Regulamento n.° 4064/89, a fim de obter uma decisão definitiva decompatibilidade com o direito comunitário.

43.
    Nestas condições, contrariamente às alegações da Comissão, a decisão impugnadanão constitui uma simples medida preparatória contra a irregularidade da qualpoderá ser assegurada às recorrentes uma protecção jurisdicional adequada noquadro de um recurso interposto da decisão relativa à aplicação do artigo 85.° doTratado. Constitui uma decisão definitiva susceptível de ser objecto de recurso deanulação, a título do artigo 173.° do Tratado, com vista a assegurar a protecçãojurisdicional dos direitos que decorrem, para as recorrentes, do Regulamenton.° 4064/89.

44.
    Por todas estas razões, a excepção de inadmissibilidade suscitada pela Comissãodeve ser rejeitada.

Quanto ao mérito

45.
    Os argumentos das recorrentes, podem ser agrupados em três fundamentos,baseados, respectivamente, na natureza pretensamente concentradora da empresaCG Vita, na violação do seu direito a serem ouvidas durante o processoadministrativo na falta ou insuficiência de fundamentação da decisão impugnada.

Quanto ao primeiro fundamento, que consiste em erro de apreciação da operação emcausa

Argumentação das partes

46.
    As recorrentes sustentam que a CG Vita apresenta um carácter de concentração.Esta empresa comum dispõe de uma autonomia funcional e não tem nem porobjectivo nem por efeito coordenar o comportamento concorrencial das empresasfundadoras. Preenche assim as duas condições enunciadas pelo artigo 3.°, n.° 2,segundo parágrafo, do Regulamento n.° 4064/89, tal como estava redigido na altura

da adopção da decisão impugnada, antes de ser modificado pelo Regulamenton.° 1310/97, e explicitadas pela Comissão na sua Comunicação de 1994 relativa àdistinção entre empresas comuns com carácter de concentração e empresas comunscom carácter de cooperação estabelecer naquele regulamento, aplicável na altura(JO C 385, p. 1, a seguir «Comunicação»).

—    Quanto à condição relativa à autonomia funcional

47.
    No que toca, antes de mais, à condição relativa à autonomia funcional, asrecorrentes sublinham previamente que essa noção deve ser apreciada tendo emconta que as características do mercado em causa que é, neste caso, o dos segurosde vida, e as modalidades segundo as quais as empresas de dimensão reduzida —como a CG Vita — presentes no mercado funcionam normalmente.

48.
    No caso em apreço, a CG Vita dispõe, em primeiro lugar, de recursos suficientes,em termos de financiamento, de pessoal e de activos, para exercer a sua actividadeno sector do seguro de vida de forma durável. Isto é comprovado pela autorizaçãode exercer a sua actividade no sector dos seguros que o ISVAP lhe concedeu em17 de Dezembro de 1996, na sequência, nomeadamente, de um aumento do seucapital social de 2 000 para 15 000 milhões de LIT, em aplicação de uma decisãodo seu conselho de administração de 2 de Setembro de 1996. Quanto aoorganigrama dessa empresa comum, comporta inicialmente 15 pessoas. Essesefectivos serão elevados para 23 pessoas no decurso dos cinco primeiros anos.

49.
    Em segundo lugar, a CG Vita desempenha as funções normalmente exercidas pelasoutras empresas presentes no mercado dos seguros de vida e está em condições dedefinir de maneira independente a sua própria política comercial. Com efeito, aassistência técnica e de gestão fornecida pelas sociedades-mãe à CG Vita não apriva da sua autonomia funcional. As prestações que a Generali lhe fornece apreço de custo fazem parte dos serviços para os quais as companhias de segurosde dimensão comparável habitualmente recorrem a sociedades externas. Emparticular, é usual que as companhias de seguros de vida recorram à selecçãomédica da resseguradora mesmo para os contratos não sujeitos a cessão. Ora, a CGVita confia à Generali, nomeadamente, o resseguro, até ao limite do excedente, dosriscos superiores a um limiar fixado em 100 milhões de liras, no quadro de umaconvenção de excedente com prémio de risco, correspondendo a uma práticacorrente. Além disso, a utilização do serviço de selecção médica da Generali nãoafecta em nada a autonomia de decisão da CG Vita em matéria de aceitação dosriscos. Por outro lado, o programa de actividade (p. 17) calculou o custo inicial datotalidade da assistência em matéria actuarial, de selecção de riscos, de fiscalizaçãointerna da sociedade e de processos informáticos em 800 milhões de LIT. Segundoessas previsões, estes custos aumentarão de 5% por ano para atingir 942 milhõesde LIT no decurso do quinto ano de actividade. Finalmente, esta assistênciaapresenta um carácter puramente provisório. Não ultrapassa os três primeiros anosde actividade, segundo o programa de actividade.

50.
    Sob este aspecto, as recorrentes censuram a Comissão por não ter efectuado uminquérito suficiente sobre o alcance e a duração do apoio das empresas-mãe.Indicam, na petição, que a CG Vita contrará, antes do fim do primeiro semestrede actividade, um actuário independente, que será assistido no decurso do primeiroano por um consultor da Generali. A assistência desta sociedade-mãe em matériade fiscalização interna termina «no encerramento do balanço do primeiro/segundoano de actividade». Quanto aos processos informáticos, o programa de actividadeprevê os custos relativos na aquisição pela CG Vita de um sistema informáticoindependente de gestão destinado às companhias de seguros de vida quando essesistema, comprado pelas sociedades do grupo Generali e em vias depersonalização, estiver disponível no decurso do ano de 1997.

51.
    No que toca à assistência na distribuição, prestada pela Unicredito, a decisãoimpugnada não contém qualquer explicação. Ora, a CG Vita utiliza, paracomercializar os seus produtos, a rede de vendas dessa sociedade-mãe, actuandona qualidade de agente da empresa comum. Segundo uma prática bemestabelecida, a utilização de um tal sistema de distribuição não prejudica aautonomia funcional de uma empresa comum (v., nomeadamente, as decisões daComissão de 15 de Junho de 1995, processo n.° IV/M.586 —Generali/Comit/Flemings, e de 22 de Fevereiro de 1995, processo n.° IV/M.543 —Zurigo/Banco di Napoli). Além disso, a carta de 9 de Fevereiro de 1996 quecompleta a carta de intenções limitou expressamente a cinco anos a duração docompromisso de exclusividade assumido pela Unicredito.

52.
    Em terceiro lugar, é de qualquer forma impossível criar produtos inovadores nomercado dos seguros de vida. Nesse domínio, os produtos simplificados, com aúnica finalidade de facilitar a tarefa do vendedor, comercializados pelointermediário da rede bancária, são fundamentalmente idênticos, para o segurado,aos vendidos pelas redes de distribuição tradicionais. No sector dos seguros de vida,os produtos novos — em relação aos quais o compromisso de exclusividadeassumido pela sociedade-mãe encarregada da sua distribuição se justifica porquese afigura indispensável para ter acesso ao mercado — são assim os que sãolançados no mercado pela primeira vez por uma nova empresa.

53.
    É assim, aliás, que deve ser interpretada a posição adoptada pela Comissão nassuas decisões anteriores. Em particular, na decisão Zurigo/Banco di Napoli, suprareferida, a «novidade» do produto da empresa comum em relação aos oferecidospela companhia de seguros mãe é contestável, na medida em que, segundo asrecorrentes, essa «novidade» se limita à forma de pagamento do prémio de seguro.No mesmo sentido, a Comissão referiu-se, na decisão Toro Assicurazioni/Banca diRoma, Processo n.° IV/M.707, ao facto de «a empresa comum comercializarprodutos sob a sua própria marca», sem se preocupar com a diferença de naturezae de conteúdo entre os seus produtos e os da Toro (ponto 8 da decisão).

54.
    De qualquer forma, no caso em apreço, a CG Vita comercializa os seus produtossob o seu próprio rótulo. Após um período normal e limitado de rodagem, estes

são «personalizados» com vista a orientá-los para certas categorias determinadasde clientela.

55.
    Além disso, as recorrentes refutam a afirmação da Comissão segundo a qual a CGVita comercializa os produtos já distribuídos pela Generali. Com a única excepçãodos seguros temporários em caso de morte, de capital e prémio anual constantes— que representam o produto melhor vendido — os produtos da CG Vita têm comomodelo as apólices de seguros da companhia Eurovita e foram projectados erealizados de forma totalmente independente das estruturas técnicas da Generali.Além disso, um novo produto — o seguro temporário, em caso de morte, do saldodevido a título de prémio anual — foi criado de forma autónoma pela CG Vita enão é vendido sob forma individual por qualquer outra sociedade do grupoGenerali.

56.
    Resulta do conjunto das considerações que precedem que a Comissão procedeu,no caso em apreço, a uma aplicação rígida da condição relativa à autonomiafuncional. Tratou diferentemente, sem qualquer justificação, uma situaçãofundamentalmente idêntica às que tinha examinado em decisões anteriores. Violoutambém os princípios da segurança jurídica e o da não discriminação e cometeu umabuso de poder.

57.
    As recorrentes baseiam-se, quanto a este ponto, numa série de decisões em que aComissão admitiu a autonomia funcional de empresas comuns cujos laçoseconómicos com as sociedades-mãe eram bem mais profundos que os da CG Vita[Decisão 93/247/CEE da Comissão, de 12 de Novembro de 1992, relativa àcompatibilidade com o mercado comum de uma operação de concentração(Processo n.° IV/M.222 — Mannesmann/Hoesch) (JO 1993, L 114, p. 34); decisõesde 5 de Fevereiro de 1996, Processo n.° IV/M.686 — Nokia/Autoliv; de 22 deNovembro de 1992, Processo n.° IV/M.266 — Rhône Poulenc Chimie/SITA; de 22de Dezembro de 1993, Processo n.° IV/M.394 — Mannesmann/Rewe/DeutscheBank, e de 27 de Novembro de 1995, Processo n.° IV/M.648 — Mc Dermott/ETPM].

58.
    Por seu lado, a Comissão, apoiada pela República Italiana, entende que a CG Vitaé privada de autonomia funcional, devido à amplitude e à importância económicada assistência que a Generali e a Unicredito continuarão a fornecer, bem como aocarácter inteiramente aleatório da limitação dessa assistência no tempo.

59.
    Além disso, no caso de uma empresa comum ainda não operacional, como a CGVita, importa verificar, para apreciar a sua capacidade de operar de maneiraindependente no seu próprio mercado, se está em condições de lançar no mercadoprodutos que não são ainda comercializados por uma das sociedades-mãe ou que,após a criação da empresa comum, cessarão de figurar na carteira de produtosdessa sociedade. A esse propósito, a novidade de um produto não poderá residirnuma simples mudança da marca sob a qual é comercializado por uma dassociedades-mãe.

—    Quanto à condição relativa à ausência de coordenação dos comportamentosconcorrenciais

60.
    As recorrentes contestam que a criação da empresa CG Vita constitua uminstrumento de cooperação entre a Generali e a Unicredito. Alegam, em primeirolugar, que as outras formas de cooperação contempladas na carta de intenções nãoapresentam qualquer ligação com a actividade da CG Vita. Referem-se a relaçõesmútuas privilegiadas nos principais sectores de actividade da Generali e daUnicredito. Além disso, são puramente hipotéticas.

61.
    Acresce que, como apenas uma das duas empresas-mãe exercerá a sua actividadeno mercado da CG Vita, qualquer hipótese de coordenação dos comportamentosconcorrenciais dessas empresas-mãe é de excluir. Com efeito, a Generali e aUnicredito exercem a sua actividade em mercados totalmente distintos e, nasequência da criação da CG Vita, a Unicredito não conserva qualquer participaçãoem sociedades activas nos mercados dos seguros de vida.

62.
    A este propósito, as recorrentes contestam, em particular, a tese do Governoitaliano segundo a qual, «em relação a uma multiplicidade de segmentos, os bancose os seguros fornecem produtos e serviços largamente substituíveis». De qualquerforma, a CG Vita não opera em qualquer dos sectores (corporate banking e gestãode poupanças) em que a concorrência entre bancos e seguros se desenvolve.

63.
    A Comissão sublinha que a decisão impugnada não é de forma nenhuma baseadano facto de a operação em causa se inscrever num contexto de cooperação maisvasto entre as sociedades-mãe. Com efeito, os projectos mais vastos de colaboraçãofutura contemplados na carta de intenções foram apreciados apenas enquantoelementos marginais em relação à argumentação principal, relativa à autonomiafuncional da CG Vita. A Comissão teve em conta esses projectos unicamente emrazão da ausência de indicações suficientes sobre a autonomia funcional da CGVita. Com efeito, segundo essa instituição, a análise do conjunto das relações entreas empresas-mãe expostas na carta de intenções podia fornecer, com outroselementos, melhores indicações para demonstrar, tal sendo o caso, a existência deuma autonomia funcional. Em particular, quanto mais a empresa comum sejasusceptível de ser unicamente um instrumento de cooperação entre associedades-mãe que operam nos mercados ligados verticalmente, tanto mais haveráque duvidar da sua autonomia.

64.
    Segundo o Governo italiano, a carta de intenções deixa transparecer que a empresacomum representa no caso em apreço um meio de coordenação do comportamentoconcorrencial das sociedades-mãe. Segundo os desenvolvimentos mais recentes domercado, por um lado, os bancos tornar-se-ão concorrentes directos dascompanhias de seguros, fornecendo uma multiplicidade de produtos e de serviçosde conteúdo financeiro largamente substituíveis pelos produtos de seguro. Poroutro lado, representam uma rede de distribuição privilegiada desses produtos.Neste caso, a coordenação entre as empresas fundadoras reveste, portanto, uma

importância estratégica particular em termos de eliminação da concorrênciapotencial nesses mercados contíguos e de ocupação de uma distribuiçãoprivilegiada desses produtos.

Apreciação do Tribunal

65.
    O artigo 3.° do Regulamento n.° 4064/89 define as operações de concentraçãoprevistas neste regulamento. A qualificação das empresas comuns rege-se pelodisposto no n.° 2 desse artigo, que enuncia, na sua versão em vigor antes de 1 deMarço de 1998, aplicável ao caso vertente:

«2.    Uma operação, incluindo a criação de uma empresa comum, que tenha porobjecto ou efeito a coordenação do comportamento concorrencial deempresas que se mantêm independentes não constitui uma concentração,na acepção da alínea b), do n.° 1.

    A criação de uma empresa comum que desempenhe de forma duradouratodas as funções de uma entidade económica autónoma e não implique umacoordenação do comportamento concorrencial, quer entre as empresasfundadoras, quer entre estas e a empresa comum, constitui uma operaçãode concentração, na acepção da alínea b), do n.° 1.»

66.
    As referidas disposições do artigo 3.° devem ser interpretadas à luz do vigésimoterceiro considerando do Regulamento n.° 4064/89, assim redigido:

«(23)    considerando que o conceito de concentração deve ser definido de modo asó abranger as operações de que resulte uma alteração duradoura daestrutura das empresas em causa; que é necessário, por conseguinte, excluirdo âmbito de aplicação do presente regulamento as operações que têmcomo objecto ou efeito a coordenação do comportamento concorrencial deempresas que se mantêm independentes, sendo que estas últimas devem serexaminadas à luz das normas adequadas dos regulamentos de execução dosartigos 85.° e 86.° do Tratado; que importa nomeadamente efectuar essadistinção em caso de criação de empresas comuns».

67.
    Resulta dos termos do artigo 3.° que uma concentração só é abrangida peloRegulamento n.° 4064/89 se, por um lado, dispuser de uma autonomia funcionale, por outro, não tiver por objecto ou efeito a coordenação do comportamentoconcorrencial das empresas em causa. Se uma destas condições faltar, a empresacomum é qualificada de empresa com carácter de cooperação e equiparada a umacordo entre empresas, decisão de associação de empresas ou prática concertada.

68.
    Todavia, o Regulamento n.° 4064/89 não clarifica os critérios que permitemdeterminar em que medida estas duas condições podem ser consideradas satisfeitas.

69.
    Ao interpretar as referidas condições há que ter em conta antes de tudo a suafinalidade, que é delimitar os âmbitos de aplicação respectivos do Regulamenton.° 4064/89 e do Regulamento n.° 17, os quais se excluem mutuamente, emaplicação do artigo 22.°, n.os 1 e 2, do Regulamento n.° 4064/89. No quadro daantiga versão do Regulamento n.° 4064/89, aplicável no caso em apreço, tal conduza avaliar a importância económica dos elementos de cooperação em relação aosaspectos estruturais.

70.
    No caso vertente, tendo em conta a argumentação das partes e os elementos dosautos, cabe ao Tribunal verificar se a empresa CG Vita dispõe ou não de umaautonomia funcional, no contexto em que se inscreve a sua criação. Essa questãodeve ser examinada com base nos elementos de que dispunha a Comissão nomomento da adopção da decisão.

71.
    A decisão impugnada conclui pela ausência de autonomia funcional da CG Vita,em virtude, nomeadamente, da amplitude e da importância económica particularda assistência que lhe será fornecida de forma duradoura pelas sociedades-mãe emmatéria de produção, de gestão e de distribuição das apólices de seguro (pontos15 e 16 da decisão impugnada).

72.
    A esse propósito, importa salientar que certos argumentos invocados pelasrecorrentes contra apreciações emitidas na decisão impugnada se baseiam emdados que não constam da carta de intenções nem do programa de actividade eque não tinham sido fornecidos à Comissão na altura do seu exame da operaçãoem causa. Tal é, em particular, o caso dos argumentos relativos à limitação notempo da assistência das sociedades-mãe em matéria actuarial e em matéria defiscalização interna (v., supra, n.° 50). Tais elementos não poderão ser tomados emconsideração no quadro da apreciação da legalidade da decisão impugnada, quedeve ser examinada na base dos elementos de que dispunha a Comissão nomomento da sua adopção.

73.
    Por outro lado, para apreciar a incidência do apoio das sociedades-mãe sobre aautonomia funcional da CG Vita, devem ter-se em conta as características domercado em causa e verificar em que medida a CG Vita exerce as funções que sãonormalmente exercidas pelas outras empresas presentes no mesmo mercado.

74.
    No caso em apreço, o mercado em causa foi definido, na decisão impugnada, comoo dos seguros de vida, considerado não de forma estática mas na sua dimensãodinâmica, isto é, como um mercado dos seguros de vida recorrendo largamente aocanal bancário para a distribuição. Essa evolução do mercado em causa é aliásconfirmada pelo facto de a parte dos prémios dos seguros de vida colocados porintermédio do sector bancário ter passado, no decurso do período compreendidoentre 1991 e 1995, de 4 para 20% das receitas geradas pelos prémios dos segurosde vida a nível nacional (ponto 20 da decisão impugnada).

75.
    Tendo em conta essa característica do mercado em causa, as recorrentes alegamque uma empresa existente mas ainda não operacional que recorre, como a CGVita, para a distribuição dos seus produtos, aos serviços de um grupo bancário nãopoderá ser considerada privada de autonomia funcional, pelo simples facto de umacláusula de exclusividade ter sido imposta ao grupo bancário por um períodolimitado, no caso em apreço, a cinco anos. Por outro lado, é conforme à prática dosector em causa que as companhias de seguro de vida com dimensão comparávelà da CG Vita se dirijam a sociedades externas, no que toca, nomeadamente, àdistribuição e à assistência em matéria actuarial, de fiscalização interna, de selecçãomédica e de processos informáticos.

76.
    Se bem que a tese das recorrentes possa ser admitida no que toca a utilização decada um dos serviços supramencionados considerados isoladamente, tal não é ocaso quando a empresa comum depende das sociedades-mãe para o fornecimentoda totalidade dos seus serviços, para além de um período inicial de arranque nodecurso do qual essa assistência pode ser considerada justificada a fim de permitirà empresa comum entrar no mercado.

77.
    Ora, no caso em apreço, o Tribunal constata que o carácter operacional daempresa comum foi assegurado por meio do fornecimento pelas empresasfundadoras da quase totalidade dos serviços que se reportam à actividade deprodução, de gestão e de comercialização das apólices de seguro. Em particular,segundo o programa de actividade, a CG Vita não estará em condições, pelomenos durante os seus cinco primeiros anos de actividade, de gerir de maneiraautónoma os serviços ligados à actividade de produção e de gestão das apólices deseguro. A Generali intervirá nos processos contabilísticos, nos processos de emissãode apólices de seguro, nos processos de liquidação, no cálculo da reserva debalanço, na gestão técnico-administrativa da carteira e, finalmente, na fiscalizaçãointerna da empresa comum. Quanto à Unicredito, porá à disposição da CG Vitaas estruturas e os serviços informatizados necessários com vista à comercializaçãodos produtos de seguro, a fim de canalizar os movimentos de fundos. Ademais,mesmo que a carta de intenções preveja a possibilidade teórica de a empresacomum recorrer a outros canais de distribuição, o programa de actividade refere-seunicamente à rede de agências do grupo Unicredito.

78.
    Além disso, segundo os documentos — juntos aos autos — de que dispunha aComissão na altura da adopção da decisão impugnada, as intervenções dassociedades-mãe não eram limitadas no tempo. Só a cláusula de exclusividadeimposta à Unicredito para a distribuição dos produtos da CG Vita era limitada aum período de cinco anos. As recorrentes indicaram pela primeira vez perante oTribunal de Primeira Instância (na fase da réplica) que essas intervenções dassociedades-mãe na actividade de produção e de gestão da CG Vita se limitariamaos três primeiros anos de actividade.

79.
    Por todas estas razões, a Comissão pôde reconhecer com razão que, na decisãoimpugnada, os elementos de que dispunha não lhe permitiam concluir com umgrau de probabilidade suficiente pela existência de uma autonomia funcionalefectiva da empresa comum.

80.
    Nestas condições, a acusação segundo a qual a Comissão teria tratado osrecorrentes de maneira discriminatória não poderá ser acolhida. O presente casodistingue-se, com efeito, das decisões anteriores da Comissão invocadas pelasrecorrentes, nomeadamente pela amplitude da assistência dispensada à CG Vitapelas sociedades-mãe em todas as fases da sua actividade e pela duração dessaassistência, que não era limitada a uma fase inicial normal de lançamento nomomento da adopção da decisão impugnada.

81.
    Além disso, a Comissão pôde reconhecer com razão que, na ausência de elementosque permitissem demonstrar que a CG Vita beneficiava de uma autonomiafuncional suficiente, o contexto da criação dessa empresa comum confirmava aausência de autonomia desta.

82.
    A este propósito, basta salientar que a carta de intenções indica claramente quea criação da CG Vita se inscreve no contexto de uma cooperação mais ampla dasduas sociedades-mãe, mesmo que, como o observam as recorrentes, o projecto decolaboração contemplado nesse documento não seja preciso e detalhado. Comefeito, esse projecto de colaboração é expressamente mencionado na carta deintenções (v., supra, n.os 9 e 14 a 18). Esta contém, nomeadamente, o compromissodas duas sociedades-mãe de recorrer de maneira privilegiada aos seus serviçosrespectivos, o compromisso da Unicredito de se abster de adquirir participações emoutras companhias de seguros e o da Generali de se abster de celebrar acordossimilares de cooperação e/ou de participação com outros estabelecimentosbancários. Mais geralmente, dá conta da vontade das partes de «realizar umaintegração recíproca (das suas) actividades no quadro e com o contributo (dassuas) competências respectivas», sem todavia contemplar uma tal integração pormeio da concentração das duas sociedades-mãe.

83.
    Resulta de tudo o que precede que, na ausência de autonomia funcional da CGVita, esta não poderá ser considerada como apresentando um carácter deconcentração. Por conseguinte, não é necessário proceder ao exame dos aspectosrelativos à cooperação entre as empresas em causa, referidas no artigo 3.°, n.° 2,primeiro parágrafo, do Regulamento n.° 4064/89, tal como estava redigido antes dasua alteração no Regulamento n.° 1310/97.

84.
    O primeiro fundamento deve, por isso, ser rejeitado.

Quanto ao segundo fundamento, que consiste na alegada violação do direito dasrecorrentes a serem ouvidas

Argumentação das partes

85.
    As recorrentes acusam a Comissão de ter omitido comunicar-lhes as suas «dúvidassérias» sobre a autonomia funcional da CG Vita, após ter recebido as suasrespostas ao seu primeiro pedido de informações. Abstendo-se de pedir explicaçõessuplementares, por exemplo, na ocasião do segundo pedido de informações de 6de Março de 1996 ou do encontro informal de 13 de Março seguinte, a instituiçãorecorrida terá suscitado junto das empresas em causa a convicção de que elastinham fornecido respostas exaustivas. Estas empresas, por essa razão, não tiverampossibilidade de expor a sua posição sobre a importância e duração da suaassistência à CG Vita e de alterar, se necessário, o seu acordo.

86.
    A Comissão entende ter suficientemente advertido as recorrentes das suas dúvidassobre o carácter de concentração da operação em causa no seu primeiro pedidoformal de informações, datado de 23 de Fevereiro de 1996. Nestas condições, asrecorrentes poderiam ter defendido a sua posição, fornecendo-lhe todos oselementos úteis na sua resposta a esse primeiro pedido de informações, ou naaltura da reunião de 13 de Março de 1996, no decurso da qual os funcionários datask-force «concentração» as informaram de que a Autoridade Garante dellaConcorrenza e del Mercato tinha igualmente formulado dúvidas sobre o carácterde concentração da empresa comum.

Apreciação do Tribunal

87.
    O Regulamento n.° 4064/89 consagra expressamente, no seu artigo 18.°, o direitodas empresas interessadas — entre as quais figuram as empresas notificantes — aserem ouvidas antes da adopção de um certo número de decisões que especifica.Não menciona as decisões que reconhecem, em aplicação do artigo 6.°, n.° 1, alíneaa), que a operação notificada não é abrangida pelo Regulamento n.° 4064/89, comono caso em apreço.

88.
    Todavia, o respeito dos direitos da defesa constitui um princípio fundamental dodireito comunitário (v. o acórdão do Tribunal de Justiça, de 9 de Novembro de1983, Michelin/Comissão, 322/81, Recueil, p. 3461, n.° 7, bem como o acórdão doTribunal de Primeira Instância, de 19 de Junho de 1997, Air Inter/Comissão,T-260/94, Colect., p. II-997, n.° 59) e impõe-se, por isso, antes da adopção dequalquer decisão susceptível de causar prejuízo às empresas em causa. Emconformidade com este princípio, o artigo 11.° do Regulamento n.° 4064/89 lembra,aliás, que num pedido de informações a Comissão deve indicar, nomeadamente,a finalidade do seu pedido. Por outro lado, o Regulamento n.° 3384/94 indica, noseu oitavo considerando, que após a notificação de uma operação de concentraçãoa Comissão «se manterá em contacto estreito com estas partes na medida donecessário para examinar com estas e, se possível, resolver por acordo mútuo, osproblemas práticos ou jurídicos que possa ter detectado aquando do seu primeiroexame do caso».

89.
    No caso em apreço, a Comissão sublinhou claramente, no seu primeiro pedido deinformações, a necessidade de obter mais amplas precisões relativas à autonomiafuncional da CG Vita, a fim de poder qualificá-la de empresa comum de plenoexercício (v., supra, n.° 21).

90.
    Nestas condições, a Comissão chamou suficientemente a atenção das recorrentes,durante o processo administrativo, para as dificuldades suscitadas por estaqualificação. Não é necessário verificar a esse propósito se, como sugere aComissão e contrariamente às alegações das recorrentes, reiterou as suas dúvidasquanto à autonomia da CG Vita quando da reunião informal de 13 de Março de1996.

91.
    Ademais, o Regulamento n.° 3384/94 (artigo 3.° e terceiro considerando) previa quecabe às partes notificantes transmitir à Comissão de modo completo e exacto osfactos e circunstâncias relevantes para a decisão a tomar sobre a concentraçãonotificada.

92.
    À luz desta obrigação, as exigências ligadas ao respeito dos direitos de defesa nãopoderão impor à Comissão, em caso de resposta insuficiente a um pedido deinformações, reiterar o seu pedido.

93.
    Daqui resulta que o segundo fundamento deve ser rejeitado.

Quanto ao terceiro fundamento, que consiste na alegada ausência ou insuficiência defundamentação

Argumentação das partes

94.
    As recorrentes acusam a Comissão de não ter fundamentado a decisão impugnada,limitando-se a declarar que «os elementos de informação e de prova de que dispõenão lhe permitem concluir, com grau de probabilidade suficiente, pela existênciade uma autonomia funcional efectiva e suficiente da empresa comum» (ponto 13).A insuficiência da instrução está na origem dessa falta de fundamentação.

95.
    Segundo a Comissão, a fundamentação da decisão impugnada é conforme aodisposto no artigo 190.° do Tratado. No caso concreto, foram os elementosfornecidos pelas recorrentes durante o processo administrativo que não lhepermitiram concluir com uma probabilidade suficiente que a empresa comumdispunha de uma autonomia funcional.

96.
    A República Italiana entende que a Comissão emitiu, na decisão impugnada, umaapreciação definitiva e suficientemente fundamentada sobre a operação em causa,baseando-se em informações, aliás suficientes, que tinha recolhido.

Apreciação do Tribunal

97.
    Tratando-se, no caso em apreço, do controlo preventivo de uma operação que, pordefinição, não tinha ainda sido realizada, a Comissão só podia verificar se aempresa CG Vita dispunha de uma autonomia funcional com base nos dados quelhe tinham sido fornecidos pelas recorrentes. É à luz das informações e dosdocumentos de que dispunha essa instituição na altura da adopção da decisãoimpugnada que há que verificar se esta está suficientemente fundamentada emtermos de direito.

98.
    A este propósito, resulta claramente do ponto 17 da decisão impugnada que, paraapreciar a autonomia funcional da CG Vita, a Comissão se baseou na análise daextensão e da duração da assistência fornecida a essa empresa comum pelassociedades-mãe, segundo as indicações e os documentos, juntos aos autos, que lhetinham sido fornecidos pelas recorrentes (v., supra, n.° 24). Foi na base dessaanálise, exposta na decisão impugnada, que a Comissão entendeu que não erapossível concluir com um grau de probabilidade adequado pela existência de umaautonomia funcional suficiente da empresa comum. Tendo em conta o queprecede, a decisão impugnada deve ser considerada suficientemente fundamentadaem termos de direito.

99.
    Segue-se que o terceiro fundamento deve ser rejeitado.

Quanto às despesas

100.
    Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento do Processo, a parte vencida écondenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo-o arecorrida requerido e tendo as recorrentes sido vencidas, há que condená-las nasdespesas. A interveniente suportará as suas próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Primeira Secção Alargada),

decide:

1)    É negado provimento ao recurso.

2)    As recorrentes são condenadas nas despesas do processo.

3)    A interveniente suportará as suas próprias despesas.

Vesterdorf
Bellamy
Moura Ramos

Pirrung

Mengozzi

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 4 de Março de 1999.

O secretário

O presidente

H. Jung

B. Vesterdorf


1: Língua do processo: italiano.