Language of document : ECLI:EU:T:2018:67

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Segunda Secção)

5 de fevereiro de 2018 (*)

«Acesso aos documentos — Regulamento (CE) n.o 1049/2001 — Documentos na posse da EMA e apresentados no âmbito do pedido de autorização de introdução no mercado do medicamento veterinário Bravecto — Decisão de conceder a um terceiro o acesso aos documentos — Exceção relativa à proteção dos interesses comerciais — Inexistência de presunção geral de confidencialidade»

No processo T‑729/15,

MSD Animal Health Innovation GmbH, com sede em Schwabenheim (Alemanha),

Intervet international BV, com sede em Boxmeer (Países Baixos),

representadas inicialmente por P. Bogaert, advogado, B. Kelly e H. Billson, solicitors, J. Stratford, QC, e C. Thomas, barrister e, em seguida, por P. Bogaert, B. Kelly, J. Stratford e C. Thomas,

recorrentes,

contra

Agência Europeia de Medicamentos (EMA), representada por T. Jabłoński, A. Spina, S. Marino, A. Rusanov e N. Rampal Olmedo, na qualidade de agentes,

recorrida,

que tem por objeto, com base no artigo 263.o TFUE, um pedido de anulação da Decisão EMA/785809/2015 da EMA, 25 de novembro de 2015, que concede a um terceiro, nos termos do Regulamento (CE) n.o 1049/2001 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 maio de 2001, relativo ao acesso do público aos documentos do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão (JO 2001, L 145, p. 43), o acesso a documentos que contêm informações apresentadas no âmbito de um pedido de autorização de introdução no mercado do medicamento veterinário Bravecto,

O TRIBUNAL GERAL (Segunda Secção),

composto por: M. Prek (relator), presidente, E. Buttigieg e B. Berke, juízes,

secretário: S. Spyropoulos, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 16 de maio de 2017,

profere o presente

Acórdão

 Factos na origem do litígio

1        As recorrentes, MSD Animal Health Innovation GmbH (a seguir «MSD») e Intervet international BV (a seguir «Intervet»), fazem parte do grupo de sociedades Merck, líder mundial nos cuidados de saúde.

2        Em de novembro de 2012, a Intervet apresentou um pedido de autorização de introdução no mercado (AIM) do Bravecto, um medicamento veterinário utilizado no tratamento de infestações de cães por carraças e pulgas. A MSD é o promotor de cinco ensaios toxicológicos feitos sob a forma de relatórios detalhados de ensaios não clínicos e que foram submetidos à Agência Europeia de Medicamentos (EMA) no processo de pedido de AIM do Bravecto.

3        Em 11 de fevereiro de 2014, a Comissão Europeia emitiu a AIM para os comprimidos mastigáveis de Bravecto em diferentes dosagens destinadas a cães de diferentes pesos. O Bravecto foi, portanto, autorizado para o tratamento das infestações de cães por carraças e pulgas.

4        Por mensagem de correio eletrónico de 24 de agosto de 2015, a EMA informou as recorrentes de que tinha recebido um pedido de um terceiro, com base no Regulamento (CE) n.o 1049/2001 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 maio de 2001, relativo ao acesso do público aos documentos do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão (JO 2001, L 145, p. 43), de acesso aos cinco relatórios de ensaios toxicológicos que constavam do processo do Bravecto. Como previa divulgar o conteúdo de três desses cinco relatórios, a EMA convidou as recorrentes a comunicarem‑lhe as suas propostas de ocultação com vista à divulgação desse três relatórios agrupados sob a denominação de «Relatórios de estudos do lote 1», a saber, o estudo de toxicidade por exposição cutânea de ratazanas com a referência C45151, o estudo de toxicidade por exposição cutânea de ratazanas com a referência C88913 e o estudo de toxicidade oral em ratazanas com a referência C45162 (a seguir, em conjunto, «relatórios de estudos do lote 1»).

5        Por carta de 8 de setembro de 2015, as recorrentes indicaram que tinham identificado nos relatórios de estudos do lote 1 as informações que consideravam confidenciais e anexaram esses relatórios, sublinhando as partes cuja confidencialidade reivindicavam.

6        Pela Decisão EMA/671379/2015, de 9 de outubro de 2015 (a seguir «decisão de 9 de outubro de 2015»), a EMA comunicou às recorrentes que aceitava certas propostas de ocultação — a saber, o intervalo de concentração da substância ativa, os pormenores da norma de referência interna utilizada nos testes analíticos e as referências aos futuros projetos de desenvolvimento — e que rejeitava outras.

7        Por mensagem de correio eletrónico de 19 de outubro de 2015, as recorrentes salientaram que, com a decisão de 9 de outubro de 2015, a EMA, na realidade, rejeitava a sua proposta de não divulgação da maioria das informações que consideravam confidenciais. Indicaram que cada relatório de estudos do lote 1 gozava de uma presunção de confidencialidade.

8        Em 28 de outubro de 2015, a EMA e as recorrentes reuniram‑se via teleconferência. As recorrentes esclareceram aí as razões por que entendiam que as informações que tinham identificado deviam permanecer confidenciais. A EMA, por seu lado, reafirmou a posição que tinha assumido na decisão de 9 de outubro de 2015.

9        Por carta de 3 de novembro de 2015, as recorrentes salientaram que a presunção de confidencialidade se aplicava aos relatórios de estudos do lote 1 e que tinham proposto a título estritamente subsidiário as expurgações específicas dos relatórios de estudos, acompanhadas da respetiva justificação.

10      Por carta de 25 de novembro de 2015 (a seguir «decisão recorrida»), por um lado, a EMA indicou que a presente decisão substituía a de 9 de outubro de 2015. Por outro lado, salientou que mantinha a sua posição expressa nessa decisão e confirmou a sua decisão de divulgar os documentos que, em seu entender, não tinham caráter confidencial. Juntos à decisão recorrida estavam quadros justificativos que expunham os fundamentos atualizados das recorrentes e as respostas atualizadas da EMA.

 Tramitação do processo e pedidos das partes

11      Em 17 de dezembro de 2015, as recorrentes interpuseram o presente recurso. Por requerimento separado da mesma data, apresentaram, nos termos do artigo 278.o TFUE, um pedido de medidas provisórias para suspensão da execução da decisão recorrida.

12      Por Despacho de 20 de julho de 2016, MSD Animal Health Innovation e Intervet international/EMA (T‑729/15 R, não publicado, EU:T:2016:435), o presidente do Tribunal Geral suspendeu a execução da decisão recorrida.

13      As recorrentes concluem pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        anular a decisão recorrida;

–        condenar a EMA nas despesas do processo.

14      A EMA conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar as recorrentes nas despesas.

 Questão de direito

15      Na decisão recorrida, a EMA lembra, antes de mais, que os relatórios a que se refere o pedido de acesso aos documentos e que são o objeto da decisão recorrida eram os relatórios de estudos do lote 1.

16      Tendo precisado que a decisão recorrida anulava e substituía a decisão de 9 de outubro de 2015, a EMA lembrou que tinha dado um prazo suplementar para permitir à MSD apresentar outros argumentos que demonstrassem o caráter confidencial dos documentos cuja divulgação considerava não prejudicar seriamente os processos decisórios em curso e futuros da EMA nem a posição concorrencial ou o interesse económico das recorrentes. Afirma ter examinado os argumentos suplementares que lhe foram apresentados em 3 de novembro de 2015 e ter dado o seu acordo quanto aos dados relativos ao intervalo de concentração da substância ativa, aos pormenores da norma de referência interna utilizada nos testes analíticos e a um pedido de fixação dos limites de resíduos. Em contrapartida, recusou ocultar outros dados e, a esse respeito, remeteu para três quadros elaborados para cada um dos estudos, respetivamente, com 64, 72 e 48 páginas. Os quadros anexos à decisão recorrida contêm, portanto, as justificações detalhadas da sua recusa.

17      As recorrentes invocam cinco fundamentos de recurso, relativos, respetivamente: o primeiro, à proteção dos relatórios de estudos do lote 1, pelo artigo 4.o, n.os 2 ou 3, do Regulamento n.o 1049/2001, por força de uma presunção geral de confidencialidade; o segundo, à proteção dos mesmos relatórios de estudos, pelo artigo 4.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1049/2001, enquanto informações confidenciais no plano comercial; o terceiro, à proteção dos mesmos relatórios de estudos, pelo artigo 4.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1049/2001, contra as violações do processo decisório; o quarto, à falta de uma ponderação dos interesses; e o quinto, a uma ponderação inadequada dos interesses.

 Quanto ao primeiro fundamento, relativo à proteção dos relatórios de estudos do lote 1 pelo artigo 4.o, n.os 2 ou 3, do Regulamento n.o 1049/2001, por força de uma presunção geral de confidencialidade

18      No âmbito do primeiro fundamento, as recorrentes alegam, em substância, que existe uma presunção geral de confidencialidade dos documentos apresentados no procedimento de AIM de um medicamento e, a esse respeito, apresentam os seguintes argumentos:

–        na regulamentação setorial relativa aos medicamentos, o legislador previu um regime próprio de divulgação que prevalece sobre o regime de acesso aos documentos previsto no Regulamento n.o 1049/2001. Entendem que, segundo esse regime, os documentos apresentados no procedimento de AIM de um medicamento estão protegidos por uma presunção geral de confidencialidade para efeitos da aplicação do artigo 4.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1049/2001;

–        de resto, faz parte da própria essência do regime de AIM que todos os documentos juntos como documentos de um processo de AIM, em particular os estudos clínicos e não clínicos, estejam protegidos pela presunção geral de confidencialidade instituída pelo artigo 4.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1049/2001;

–        a existência dessa presunção é reforçada pela interpretação do Regulamento n.o 1049/2001 e do Regulamento (CE) n.o 726/2004 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de março de 2004, que estabelece procedimentos comunitários de autorização e de fiscalização de medicamentos para uso humano e veterinário e que institui uma Agência Europeia de Medicamentos (JO 2004, L 136, p. 1), à luz dos requisitos impostos pelo Acordo sobre os Aspetos dos Direitos de Propriedade Intelectual relacionados com o Comércio (ADPIC), de 15 de abril de 1994 (JO 1994, L 336, p. 214, a seguir «Acordo ADPIC»), nomeadamente pelo seu artigo 39.o, n.o 3;

–        a presunção geral de confidencialidade deve aplicar‑se durante todo o período e para além do período de exclusividade dos dados comerciais e não expirar depois da adoção da decisão de AIM. Qualquer outra interpretação seria incompatível com o efeito útil do Regulamento n.o 726/2004;

–        de qualquer forma, os relatórios presumem‑se confidenciais, pelo menos até ao termo dos processos decisórios previstos;

–        de acordo com a jurisprudência, todos os relatórios de estudos do lote 1 pertencem à mesma categoria de documentos e devem gozar da presunção geral de confidencialidade, a fim de garantir os objetivos do procedimento de AIM e preservar a integridade da tramitação do procedimento bilateral, limitando a ingerência de partes terceiras. Acresce que os relatórios de estudos do lote 1 deveriam gozar de maior proteção do que os relatórios do Comité dos Medicamentos, pois foram criados pelas recorrentes e não pelo Comité dos Medicamentos para Uso Veterinário (a seguir «CMUV»);

–        a EMA não fundamentou suficientemente as razões por que a divulgação das passagens que constam dos relatórios de estudos do lote 1 era justificada a título de derrogação da presunção geral de confidencialidade. Pelo contrário, sem a menor fundamentação, introduziu a presunção inilidível de que todas as informações relativas à AIM em causa podiam ser divulgadas, pondo em causa a política de não divulgação que tinha aplicado até 2010.

19      A EMA refuta estes argumentos.

20      No âmbito deste fundamento, as recorrentes alegam em substância que, uma vez que as presunções gerais de confidencialidade que justificam a recusa de acesso são aplicáveis a certas categorias de documentos, dizem igualmente respeito aos relatórios de estudos do lote 1 apresentados no procedimento de AIM do Bravecto, previsto nos Regulamentos n.os 141/2000 e 726/2004, e, portanto, que a divulgação desses documentos lesaria, em princípio, os interesses comerciais. Assim, a presunção geral de confidencialidade invocada pelas recorrentes assenta na exceção relativa à proteção dos seus interesses comerciais, prevista no artigo 4.o, n.o 2, primeiro travessão, do Regulamento n.o 1049/2001.

21      Para apreciar esta questão, há que recordar que, nos termos do artigo 2.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1049/2001, as disposições relativas ao acesso do público aos documentos da EMA são aplicáveis a todos os documentos detidos por esta agência, ou seja, a todos os documentos por ela elaborados ou recebidos que se encontrem na sua posse, em todos os domínios de atividade. Além disso, embora este regulamento tenha por objetivo permitir o direito de acesso mais amplo possível do público aos documentos das instituições, tal direito está sujeito a determinados limites baseados em razões de interesse público ou privado (Acórdão de 27 de fevereiro de 2014, Comissão/EnBW, C‑365/12 P, EU:C:2014:112, n.o 85).

22      Refira‑se igualmente que o Tribunal de Justiça já reconheceu a possibilidade de as instituições e as agências em causa se basearem em presunções gerais aplicáveis a certas categorias de documentos, uma vez que podem ser aplicadas considerações de ordem geral semelhantes a pedidos de divulgação de documentos da mesma natureza (Acórdão de 1 de julho de 2008, Suécia e Turco/Conselho, C‑39/05 P e C‑52/05 P, EU:C:2008:374, n.o 50). A existência dessa presunção não exclui o direito de o interessado demonstrar que um determinado documento cuja divulgação seja pedida não está coberto por essa presunção (Acórdão de 21 de setembro de 2010, Suécia e o./API e Comissão, C‑514/07 P, C‑528/07 P e C‑532/07 P, EU:C:2010:541, n.o 103).

23      No entanto, há que salientar que a existência de uma presunção geral de confidencialidade de certas categorias de documentos constitui uma exceção ao dever, imposto pelo Regulamento n.o 1049/2001, de a instituição em causa examinar de forma concreta e individual cada um dos documentos a que se refere um pedido de acesso, a fim de determinar se estão abrangidos por uma das exceções previstas, nomeadamente, no artigo 4.o, n.o 2, desse regulamento. Do mesmo modo que a jurisprudência impõe que as exceções à divulgação previstas nessa disposição sejam interpretadas e aplicadas de forma estrita — na medida em que derrogam o princípio do acesso mais amplo possível do público aos documentos na posse das instituições da União (v., neste sentido, Acórdãos de 21 de julho de 2011, Suécia/MyTravel e Comissão, C‑506/08 P, EU:C:2011:496, n.o 75, e de 3 de julho de 2014, Conselho/in’t Veld, C‑350/12 P, EU:C:2014:2039, n.o 48) —, o reconhecimento e a aplicação de uma presunção geral de confidencialidade devem ser encarados de forma estrita (v., neste sentido, Acórdão de 16 de julho de 2015, ClientEarth/Comissão, C‑612/13 P, EU:C:2015:486, n.o 81).

24      O juiz da União identificou, portanto, em vários acórdãos, certos critérios para o reconhecimento dessa presunção consoante o tipo de processos.

25      Por um lado, resulta de vários acórdãos do Tribunal de Justiça que, para uma presunção geral ser validamente oposta à pessoa que pede acesso a documentos com base no Regulamento n.o 1049/2001, é necessário que os documentos pedidos façam parte da mesma categoria de documentos ou sejam da mesma natureza (v., neste sentido, Acórdãos de 1 de julho de 2008, Suécia e Turco/Conselho, C‑39/05 P e C‑52/05 P, EU:C:2008:374, n.o 50, e de 17 de outubro de 2013, Conselho/Access Info Europe, C‑280/11 P, EU:C:2013:671, n.o 72).

26      Por outro lado, a aplicação de presunções gerais pode ser imposta pela necessidade imperativa de assegurar o funcionamento correto dos procedimentos em questão e de garantir que os seus objetivos não sejam comprometidos. Assim, o reconhecimento de uma presunção geral pode basear‑se na incompatibilidade do acesso aos documentos de certos procedimentos com a sua boa tramitação e com o risco de os prejudicar, permitindo as presunções gerais preservar a integridade da tramitação do procedimento ao limitar a ingerência de partes terceiras (v., neste sentido, Conclusões do advogado‑geral M. Wathelet nos processos apensos LPN e Finlândia/Comissão, C‑514/11 P e C‑605/11 P, EU:C:2013:528, n.os 66, 68, 74 e 76).

27      Foi neste sentido, por exemplo, que o Tribunal Geral considerou que, enquanto, na fase pré‑contenciosa de um inquérito levado a cabo no âmbito de um procedimento EU Pilot, existisse um risco de alterar o caráter do processo por incumprimento, de alterar a sua tramitação e de prejudicar os seus objetivos, se justificava a aplicação da presunção geral de confidencialidade aos documentos trocados entre a Comissão e o Estado‑Membro em causa (v., neste sentido, Acórdão de 25 de setembro de 2014, Spirlea/Comissão, T‑306/12, EU:T:2014:816, n.os 57 a 63).

28      Além disso, em todos os processos que deram origem às decisões que aplicavam tais presunções, a recusa de acesso em causa era relativa a um conjunto de documentos claramente circunscritos pela sua pertença comum a um processo administrativo ou jurisdicional em curso (v., neste sentido, Acórdãos de 28 de junho de 2012, Comissão/Éditions Odile Jacob, C‑404/10 P, EU:C:2012:393, n.o 128; de 14 de novembro de 2013, LPN e Finlândia/Comissão, C‑514/11 P e C‑605/11 P, EU:C:2013:738, n.os 49 e 50; e de 27 de fevereiro de 2014, Comissão/EnBW, C‑365/12 P, EU:C:2014:112, n.os 69 e 70).

29      Por último, o juiz da União considera que a aplicação de regras específicas previstas num ato jurídico relativo a um procedimento tramitado numa instituição da União para efeitos do qual foram apresentados os documentos pedidos é também um dos critérios capazes de justificar o reconhecimento de uma presunção geral (v., neste sentido, Acórdão de 11 de junho de 2015, McCullough/Cedefop, T‑496/13, não publicado, EU:T:2015:374, n.o 91, e Conclusões do advogado‑geral P. Cruz Villalón no processo Conselho/Access Info Europe, C‑280/11 P, EU:C:2013:325, n.o 75). As exceções ao direito de acesso aos documentos que constam do artigo 4.o do Regulamento n.o 1049/2001 não podem ser interpretadas sem ter em conta as regras específicas do acesso a esses documentos, previstas nos regulamentos em causa.

30      Foi neste sentido que o Tribunal de Justiça referiu que, no âmbito de um processo de aplicação do artigo 101.o TFUE, certas disposições do Regulamento (CE) n.o 1/2003 do Conselho, de 16 de dezembro de 2002, relativo à execução das regras de concorrência estabelecidas nos artigos [101.o] e [102.o TFUE] (JO 2003, L 1, p. 1), e do Regulamento (CE) n.o 773/2004 da Comissão, de 7 de abril de 2004, relativo à instrução de processos pela Comissão para efeitos dos artigos [101.o] e [102.o TFUE] (JO 2004, L 123, p. 18), regiam de forma restritiva o uso dos documentos que constavam desse processo, uma vez que previam que as partes num procedimento de aplicação do artigo 101.o TFUE não dispunham de um direito de acesso ilimitado aos documentos que constavam do processo da Comissão e que os terceiros, com exceção dos denunciantes, não dispunham, no âmbito desse procedimento, do direito de acesso aos documentos do processo da Comissão. O Tribunal de Justiça entendeu que autorizar um acesso generalizado com base no Regulamento n.o 1049/2001 aos documentos de um processo de aplicação do artigo 101.o TFUE podia pôr em perigo o equilíbrio que o legislador da União tinha querido assegurar nos Regulamentos n.os 1/2003 e 773/2004 entre a obrigação de as empresas em causa comunicarem à Comissão informações comerciais eventualmente sensíveis, para lhe permitirem detetar a existência de um cartel e apreciar a respetiva compatibilidade com esse artigo, por um lado, e a garantia de proteção reforçada ligada, ao abrigo do segredo profissional e do segredo dos negócios, às informações transmitidas à Comissão, por outro. O Tribunal de Justiça inferiu daí que, para efeitos de aplicação das exceções previstas no artigo 4.o, n.o 2, primeiro e terceiro travessões, do Regulamento n.o 1049/2001, a Comissão podia presumir, sem proceder a um exame concreto e individual de cada um dos documentos de um processo relativo a um procedimento de aplicação do artigo 101.o TFUE, que a divulgação desses documentos era, em princípio, prejudicial à proteção dos interesses comerciais das empresas envolvidas nesse procedimento (v., neste sentido, Acórdão de 27 de fevereiro de 2014, Comissão/EnBW, C‑365/12 P, EU:C:2014:112, n.os 86, 87, 90 e 93).

31      Foi também em função desse critério que o Tribunal Geral, pelo contrário, considerou que nenhuma presunção geral de confidencialidade resultava das disposições do Regulamento (CE) n.o 1907/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de dezembro de 2006, relativo ao registo, avaliação, autorização e restrição de substâncias químicas (REACH), que cria a Agência Europeia das Substâncias Químicas, que altera a Diretiva 1999/45/CE e revoga o Regulamento (CEE) n.o 793/93 do Conselho e o Regulamento (CE) n.o 1488/94 da Comissão, bem como a Diretiva 76/769/CEE do Conselho e as Diretivas 91/155/CEE, 93/67/CEE, 93/105/CE e 2000/21/CE da Comissão (JO 2006, L 396, p. 1), uma vez que esse regulamento não regia de forma restritiva o uso dos documentos do processo relativo a um procedimento de autorização de utilização de uma substância química, diferentemente das situações em que o Tribunal de Justiça e o Tribunal Geral admitiram serem aplicáveis as presunções gerais de confidencialidade que justificam a recusa de acesso aos documentos (v., neste sentido, Acórdão de 13 de janeiro de 2017, Deza/ECHA, T‑189/14, EU:T:2017:4, n.o 39).

32      No caso, os documentos controvertidos não são relativos a um procedimento administrativo ou jurisdicional em curso, uma vez que a AIM do Bravecto foi emitida em 11 de fevereiro de 2014 e que o pedido de acesso aos documentos controvertidos só foi feito em 24 de agosto de 2015. Consequentemente, mesmo admitindo que fosse aplicável num procedimento de AIM a jurisprudência referida nos n.os 26 e 27, supra, nos termos da qual a aplicação de uma presunção geral pode ser justificada pela necessidade imperativa de garantir o funcionamento correto do procedimento em causa, a divulgação dos documentos controvertidos não pode alterar esse procedimento, visto que este foi encerrado antes da apresentação do pedido de acesso aos documentos controvertidos por um terceiro.

33      Do mesmo modo, ao contrário das situações em que o Tribunal de Justiça e o Tribunal Geral admitiram serem aplicáveis as presunções gerais de confidencialidade que justificam a recusa de acesso aos documentos, o Regulamento n.o 726/2004 não rege de forma restritiva o uso dos documentos do processo relativo a um procedimento de AIM de um medicamento. Tão‑pouco prevê uma limitação do acesso ao processo às «partes em causa» ou aos «denunciantes».

34      No seu artigo 73.o, o Regulamento n.o 726/2004 dispõe expressamente que o Regulamento n.o 1049/2001 se aplica aos documentos na posse da EMA e que o seu conselho de administração aprova as formas de aplicação do Regulamento n.o 1049/2001. Nenhuma outra disposição do Regulamento n.o 726/2004 pode ser interpretada no sentido de que revela a intenção do legislador da União de aprovar um regime de acesso restrito aos documentos por meio de uma presunção geral de confidencialidade destes.

35      Com efeito, o Regulamento n.o 726/2004 impõe à EMA, nos seus artigos 11.o, 13.o, n.o 3, 36.o, 38.o, n.o 3, e 57.o, n.os 1 e 2, a publicação de três documentos, a saber, o Relatório Público Europeu de Avaliação (a seguir «EPAR»), um resumo das características dos medicamentos em causa e a bula destinada ao utilizador, depois de ter suprimido todas as informações com caráter de confidencialidade comercial. Estas disposições referem as informações mínimas, através dos três documentos acima referidos, que a EMA deve disponibilizar ao público de forma proativa. O objetivo do legislador da União é, por um lado, que sejam indicados da forma mais inteligível possível aos profissionais de saúde as características do medicamento em causa e a maneira de o prescrever aos pacientes e, por outro, que o público não profissional seja informado, numa linguagem compreensível, do modo de utilização ótima do medicamento e dos seus efeitos. Este regime de publicação proativa de um mínimo de informações não constitui, portanto, um regime específico de acesso aos documentos que deva ser interpretado no sentido de que todos os dados e informações que não constam desses três documentos se presumem confidenciais.

36      Os artigos 11.o, 12.o, 36.o e 37.o, n.o 3, do Regulamento n.o 726/2004 traduzem igualmente a vontade do legislador de que o procedimento de AIM seja transparente, mesmo que não dê origem a uma decisão ou leve a uma decisão de recusa de AIM. Com efeito, estas disposições preveem que tanto as informações relativas a um pedido de AIM que o requerente tenha retirado antes de a EMA dar um parecer como as informações relativas a um pedido de AIM que tenha sido indeferido devem ser acessíveis ao público.

37      Daí resulta que o princípio que prevalece nos Regulamentos n.os 726/2004 e 1049/2001 é o do acesso do público às informações e que as exceções a esse princípio são as previstas no artigo 4.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1049/2001, incluindo as relativas às informações comerciais confidenciais. Tendo em conta a exigência de uma interpretação estrita lembrada no n.o 23, supra, não se pode deixar de considerar que o legislador da União não previu um regime específico de acesso aos documentos e, neste sentido, não criou uma presunção geral de confidencialidade dos relatórios de estudos do lote 1.

38      Em face do exposto, há que considerar que não existe uma presunção geral de confidencialidade dos documentos e dos relatórios de um processo de AIM de um medicamento que resulte da aplicação conjugada das disposições dos Regulamentos n.os 1049/2001 e 726/2004. Assim, depois do fim do procedimento de AIM de um medicamento, não se pode considerar que os documentos do processo administrativo, incluindo os relatórios de estudos de inocuidade, beneficiam de uma presunção geral de confidencialidade pela razão implícita de estarem, por princípio e na íntegra, manifestamente cobertos pela exceção relativa à proteção dos interesses comerciais dos requerentes de AIM. Cabe, pois, à EMA assegurar‑se, através de um exame concreto e efetivo de cada documento do processo administrativo, se esse documento está abrangido, nomeadamente, pelo segredo comercial na aceção do artigo 4.o, n.o 2, primeiro travessão, do Regulamento n.o 1049/2001.

39      Por outro lado, há que acrescentar que, nos termos do artigo 73.o do Regulamento n.o 726/2004, a EMA adotou as modalidades de execução do Regulamento n.o 1049/2001. Do mesmo modo, a fim de reforçar a sua política relativa ao acesso aos documentos, adotou, em 30 de novembro de 2010, o documento EMA/110196/2006, intitulado «Política da [EMA] sobre o acesso aos documentos (relativos aos medicamentos para uso humano e veterinário)». Aí se salienta que, não deixando de oferecer uma proteção adequada às informações comerciais confidenciais, aos dados de caráter pessoal e aos outros interesses específicos, o acesso a um documento só é recusado se for considerada aplicável uma das exceções previstas no artigo 4.o do Regulamento n.o 1049/2001.

40      Refira‑se ainda que, ao aplicar a sua política relativa ao acesso aos documentos, a EMA redigiu o documento EMA/127362/2006, onde figura o resultado da sua política sobre o acesso aos documentos relativos aos medicamentos para uso humano e veterinário. Esse documento contém um quadro de resultados que foi sendo completado à medida da experiência adquirida pela agência em matéria de pedidos de acesso aos documentos. Esse quadro foi completado, por um lado, pelo documento EMA/484118/2010, relativo às recomendações dos diretores das agências de medicamentos sobre a transparência, e, por outro, pelo guia comum da EMA e dos chefes das agências de medicamentos relativo à identificação das informações comerciais confidenciais e dos dados pessoais no âmbito do procedimento de AIM, que podiam ser publicados imediatamente após a adoção de uma decisão. Resulta desse quadro que, quanto aos processos dos requerentes de autorização, a EMA considera que, assim que termina o procedimento de AIM de um medicamento e após consulta do titular desses documentos, estes ficam, em princípio, acessíveis.

41      Daí resulta que o fundamento relativo à existência de uma presunção geral de confidencialidade das informações controvertidas deve, de qualquer forma, ser julgado improcedente.

42      Nenhum dos argumentos apresentados pelas recorrentes pode pôr em causa esta conclusão.

43      Primeiro, o facto de os relatórios de estudos do lote 1 terem sido elaborados pelas recorrentes e não provirem de um relatório de avaliação do CMUV com base em informações transmitidas pelo requerente de AIM não é, só por si, uma justificação para esses relatórios gozarem de maior proteção. Com efeito, a questão de saber se a informação em causa tem ou não caráter comercial confidencial é o elemento determinante, sendo irrelevante que essa informação tenha sido inserida pelo CMUV no seu relatório de avaliação ou provenha diretamente do titular da AIM. Neste contexto, há que referir que o simples facto de todos os dados que constam dos relatórios de estudos do lote 1 pertencerem à mesma categoria de documentos não basta para considerar que estes beneficiam da presunção geral de confidencialidade.

44      Segundo, as recorrentes afirmam em vão que é da própria essência do regime de AIM que todos os documentos juntos a um processo de AIM, nomeadamente os estudos clínicos e não clínicos, estejam protegidos pela presunção geral de confidencialidade prevista no artigo 4.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1049/2001 e que a jurisprudência em matéria cautelar ou resultante do Acórdão de 23 de janeiro de 1997, Biogen (C‑181/95, EU:C:1997:32), vai neste sentido. Antes de mais, esta afirmação não é sustentada. Seguidamente, não é evidente que os estudos clínicos e não clínicos sejam confidenciais só por si. Com efeito, podem limitar‑se a responder a um esquema regulamentar imposto pela EMA e não conter nenhum elemento de novidade. Além disso, há que salientar que a transparência do processo seguido pela EMA e a possibilidade de obter acesso aos documentos utilizados pelos peritos dessa agência para elaborar a sua avaliação científica contribuem para conferir a essa autoridade uma maior legitimidade aos olhos dos destinatários dos seus atos e para aumentar a sua confiança nessa autoridade, tal como para aumentar a sua responsabilidade para com os cidadãos de um sistema democrático (v., por analogia, Acórdão de 16 de julho de 2015, ClientEarth e PAN Europe/EFSA, C‑615/13 P, EU:C:2015:489, n.o 56). Por último, não se pode inferir do Acórdão de 23 de janeiro de 1997, Biogen (C‑181/95, EU:C:1997:32), nem dos Despachos de 25 de abril de 2013, AbbVie/EMA (T‑44/13 R, não publicado, EU:T:2013:221), e de 1 de setembro de 2015, Pari Pharma/EMA (T‑235/15 R, EU:T:2015:587), invocados pelas recorrentes, qualquer reconhecimento da existência de uma presunção geral de confidencialidade dos relatórios de estudos do lote 1. Como acertadamente salienta a EMA, essa conclusão não pode ser inferida dos despachos em matéria cautelar. Quanto ao Acórdão de 23 de janeiro de 1997, Biogen (C‑181/95, EU:C:1997:32), além do facto de ter ocorrido antes da adoção do Regulamento n.o 1049/2001, dele não resulta que o Tribunal de Justiça tivesse confirmado o caráter confidencial de todas as informações que constam de uma AIM.

45      Terceiro, é irrelevante o argumento de que a presunção geral de confidencialidade dos relatórios de estudos do lote 1 é indispensável para garantir os objetivos do procedimento de AIM e preservar a integridade da tramitação do procedimento bilateral. No caso, não se pode deixar de observar, antes de mais, que os relatórios de estudos do lote 1 foram apresentados e avaliados no âmbito do pedido de AIM do Bravecto, seguidamente, que a EMA concedeu às recorrentes a AIM desse medicamento para uma indicação terapêutica determinada e, por último, que o procedimento de AIM do Bravecto foi encerrado quando o pedido de acesso a esses relatórios foi apresentado por um terceiro.

46      Neste contexto, as recorrentes alegam que, para garantir o efeito útil do Regulamento n.o 726/2004, a presunção geral de confidencialidade deve aplicar‑se durante todo e mesmo além do período de exclusividade dos dados comerciais e não expirar depois da adoção da decisão de AIM. Alegam que outros dados podem ser reutilizados no âmbito de novos pedidos de AIM. Estes argumentos não colhem. Com efeito, a possibilidade de uma reutilização dos dados não constitui só por si um fundamento para considerar que essas informações são confidenciais ou suscetíveis de prejudicar o processo decisório, na aceção do artigo 4.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1049/2001. Resulta da decisão recorrida que só os elementos dos relatórios de estudos do lote 1 não relacionados com a indicação já autorizada, que revelem pormenores específicos do pedido em curso ou dos futuros projetos de desenvolvimento e que não constem de um documento acessível ao público (como o EPAR) podem ser considerados informações comerciais confidenciais. A EMA não pode, pois, recusar o acesso aos elementos contidos nos relatórios de estudos do lote 1 que não digam respeito aos três tipos de dados acima referidos. Neste sentido, há que salientar que a decisão recorrida indicou que as referências feitas nos relatórios de estudos do lote 1 a qualquer futuro projeto de desenvolvimento das recorrentes foram expurgadas e que essas informações «não revelam pormenores sobre o pedido atualmente em curso com vista ao alargamento a uma nova forma farmacêutica». Estas considerações não foram, aliás, postas em causa pelas recorrentes.

47      Quarto, há que examinar o argumento de que a interpretação dos Regulamentos n.os 1049/2001 e 726/2004 à luz das exigências do Acordo ADPIC, nomeadamente do seu artigo 39.o, n.os 2 e 3, deveria ter levado a EMA à conclusão de que os relatórios de estudos do lote 1 gozavam de uma presunção geral de confidencialidade.

48      Há que salientar que, embora o artigo 39.o, n.o 2, do Acordo ADPIC, a que se referem as recorrentes, não possa, enquanto tal, ser invocado para invalidar a decisão recorrida, os Regulamentos n.os 1049/2001 e 726/2004 devem ser interpretados de maneira a assegurar a sua conformidade com o conteúdo dessa disposição. Com efeito, as disposições do Acordo ADPIC, que faz parte dos acordos da OMC assinados pela Comunidade Europeia e seguidamente aprovados pela Decisão 94/800/CE do Conselho, de 22 de dezembro de 1994, relativa à celebração, em nome da Comunidade Europeia e em relação às matérias da sua competência, dos acordos resultantes das negociações multilaterais do Uruguay Round (1986/1994) (JO 1994, L 336, p. 1), são parte integrante do ordenamento jurídico da União. Quando uma regulamentação da União existe num domínio abrangido pelo Acordo ADPIC, o direito da União é aplicável, o que leva à obrigação, tanto quanto possível, de proceder a uma interpretação conforme a esse acordo, sem que se possa, porém, conferir efeito direto a essa disposição desse acordo (v. Acórdão de 11 de setembro de 2007, Merck Genéricos — Produtos Farmacêuticos, C‑431/05, EU:C:2007:496, n.o 35 e jurisprudência aí referida).

49      Há que lembrar que o artigo 39.o, n.o 2, do Acordo ADPIC dispõe que as informações com valor no plano comercial são protegidas contra a utilização e a divulgação por terceiros, se forem secretas no sentido de que, na sua globalidade ou na configuração e compilação exatas dos seus elementos, não são «geralmente conhecidas» das pessoas que pertencem aos meios que, em regra, se ocupam do tipo de informações em questão ou que não lhes estão facilmente acessíveis. O n.o 3 desse artigo impõe aos Estados‑Membros que protejam os dados não divulgados resultantes de ensaios ou de outros dados não divulgados contra a exploração desleal no comércio, quando sujeitam a aprovação da comercialização de produtos farmacêuticos que contêm entidades químicas novas à comunicação desses dados cujo apuramento exige um esforço considerável.

50      O artigo 39.o, n.os 2 e 3, do Acordo ADPIC não pode, porém, implicar que se deva dar primado absoluto à proteção conferida aos direitos de propriedade intelectual sobre a presunção a favor da divulgação das informações apresentadas no âmbito de um pedido de derrogação da exclusividade comercial de um medicamento órfão. Neste sentido, o critério defendido pelas recorrentes para considerar que todas as informações que apresentaram são confidenciais leva a não ter em conta o equilíbrio instituído pelos regulamentos acima referidos e a não aplicar o mecanismo que, em substância, prevê a publicação das informações relativas aos medicamentos objeto de um procedimento de autorização, com exceção das que têm caráter de confidencialidade comercial. Esse critério não pode ser aceite, pois, na realidade, leva a pôr em causa a legalidade do mecanismo dos Regulamentos n.os 1049/2001 e 726/2004 à luz do artigo 39.o, n.os 2 e 3, do Acordo ADPIC.

51      Acresce que a argumentação das recorrentes leva a crer que não existe nenhum mecanismo de proteção da propriedade intelectual. Ora, por um lado, os titulares dos dados gozam de um período de proteção nos termos do artigo 39.o, n.o 10, do Regulamento n.o 726/2004. Por outro, ao abrigo das exceções previstas no artigo 4.o do Regulamento n.o 1049/2001, beneficiam de uma proteção das informações comerciais confidenciais contidas num processo de AIM, incluindo as relativas ao fabrico do produto e às outras especificações técnicas e industriais dos processos de qualidade levados a cabo para fabricar a substância.

52      Quinto, as recorrentes acusam a EMA de não ter fundamentado suficientemente as razões por que entendia que os relatórios de estudos do lote 1 não gozavam de uma presunção geral de confidencialidade ao mesmo tempo que contestam os fundamentos dessa consideração. Na medida em que os argumentos das recorrentes devam, na realidade, ser entendidos como uma alegação de violação do dever de fundamentação, devem ser julgados improcedentes. Com efeito, a decisão recorrida inclui um raciocínio completo e detalhado que permite compreender completamente as razões por que a EMA concluiu pela falta de presunção geral de confidencialidade das informações controvertidas. Em particular, a EMA salienta que a presunção geral de confidencialidade é contrária às disposições do Tratado FUE e do Regulamento n.o 1049/2001 relativas à transparência. A esse respeito, lembra o conteúdo do artigo 2.o, n.os 3 e 4, e do artigo 4.o, n.o 6, do Regulamento n.o 1049/2001. Quanto à afirmação da existência de um risco de exploração desleal dos dados a fim de justificar a presunção geral de confidencialidade, a EMA refere que os dados apresentados em apoio de um pedido de AIM estão protegidos por um período de exclusividade dos dados previstos nos artigos 13.o e 13.o‑A da Diretiva 2001/82/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de novembro de 2001, que estabelece um código comunitário relativo aos medicamentos veterinários (JO 2001, L 311, p. 1). A esse respeito, a EMA assinala que a comunicação de informações nos termos do Regulamento n.o 1049/2001 não pode prejudicar a proteção instituída pelo artigo 39.o do Acordo ADPIC e pelos artigos 13.o e 13.o‑A da Diretiva 2001/82. A decisão recorrida indica ainda que, de acordo com o artigo 16.o do Regulamento n.o 1049/2001, a decisão da EMA de facultar o acesso aos documentos é sem prejuízo dos direitos de propriedade intelectual que possam existir sobre os documentos ou sobre o seu conteúdo e não pode ser interpretada como uma autorização expressa ou tácita ou uma licença que permita ao requerente do acesso utilizar, reproduzir, publicar, divulgar ou explorar de outro modo os documentos ou o seu conteúdo. A EMA indica, além disso, que o risco de utilização dos documentos contornando a exclusividade dos dados em violação da Diretiva 2001/82 e do Regulamento n.o 1049/2001 não pode constituir um fundamento de recusa de acesso aos documentos, uma vez que o critério contrário leva, na prática, a uma paralisia quase total das atividades ligadas ao acesso aos documentos da EMA. Esse critério seria contrário às disposições do Tratado FUE e do Regulamento n.o 1049/2001 sobre a transparência. A EMA refere, por último, que o risco de utilização ilegal de documentos emitidos de acordo com o Regulamento n.o 1049/2001 existe sempre e que as outras legislações europeias e nacionais preveem medidas corretivas conexas. Por conseguinte, os fundamentos da decisão recorrida para a rejeição da existência de uma presunção geral de confidencialidade dos relatórios de estudos do lote 1 respeitam as exigências de fundamentação do artigo 296.o TFUE.

53      Na medida em que a impugnação das recorrentes é relativa aos próprios fundamentos dessa conclusão, não pode proceder. Antes de mais, como resulta da análise feita nos n.os 20 a 41, supra, não se pode inferir das disposições do Regulamento n.o 726/2004 a existência de qualquer presunção geral de confidencialidade dos relatórios de estudos do lote 1.

54      Seguidamente, a exigência do Acordo ADPIC de proteger os documentos apresentados à EMA contra a sua exploração desleal no comércio é respeitada pelas razões lembradas nos n.os 47 a 51, supra. A esse respeito, as recorrentes afirmam erradamente que a iniciativa da EMA pressupõe necessariamente que todos os seus concorrentes respeitarão sempre a lei e que não poderão obter uma qualquer vantagem económica utilizando legalmente os relatórios de estudos do lote 1. Com efeito, por um lado, a proteção dos dados prevista no Regulamento n.o 726/2004 visa precisamente impedir os concorrentes de utilizarem os estudos que constam de um processo de AIM. Por outro lado, a confidencialidade de certos dados garantida pelo artigo 4.o do Regulamento n.o 1049/2001 constitui uma proteção contra a exploração desleal de dados comercialmente sensíveis.

55      As recorrentes alegam que a EMA previu condições de utilização proativa dos documentos e admitiu, assim, a eventualidade da sua exploração desleal. Salientam que a EMA declina qualquer responsabilidade quanto ao respeito dessas condições pelos interessados e que isso constitui o reconhecimento de que essas condições são inaptas para impedir os concorrentes de obterem vantagens injustas. Estes argumentos improcedem pelo facto de pressuporem que os dados que possam ser explorados de forma desleal devem ser considerados confidenciais. Ora, a ausência total de risco de uma exploração desleal de dados não pode ser garantida. É normal, portanto, que a EMA decline a sua responsabilidade a esse respeito. De resto, esse fundamento não permite considerar que todos os dados devam beneficiar da presunção de confidencialidade.

56      Além disso, as recorrentes alegam que existem muitos meios através dos quais os seus concorrentes poderão utilizar os conhecimentos adquiridos à vista dos relatórios de estudos do lote 1, para deles retirarem uma vantagem concorrencial em prejuízo das recorrentes. Contudo, isso em nada demonstra que todas as informações tenham que ser protegidas por uma presunção geral de confidencialidade.

57      Por último, as recorrentes afirmam em vão que, tendo em conta a divulgação dos dados, os requerentes de AIM teriam interesse em apresentar o mínimo de informações para cumprir as condições exigidas para apresentar o processo de AIM e obter a AIM para o seu medicamento. Este argumento pressupõe que a EMA consideraria suficiente um mínimo de informações para dar um parecer favorável a uma AIM para um medicamento, o que, tendo em conta o nível de exigência imposto pela regulamentação da União, é pouco provável.

58      Em face do exposto, há que julgar improcedente o primeiro fundamento.

 Quanto ao segundo fundamento, relativo à proteção, pelo artigo 4.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1049/2001, dos relatórios de estudos do lote 1, enquanto informações confidenciais no plano comercial

59      No âmbito do segundo fundamento, as recorrentes alegam que os relatórios de estudos do lote 1 apresentam globalmente um caráter de confidencialidade comercial na aceção do artigo 4.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1049/2001, pois revelam nomeadamente um knowhow regulamentar, capacidades de avaliação clínica e a iniciativa estratégica inventiva seguida pela MSD para realizar os seus estudos de inocuidade. Com efeito, os dados científicos que são do domínio público e os que estão abrangidos pelo segredo foram configurados e compilados segundo uma estratégia inovadora e formam um todo inseparável com valor económico. Fornecem, assim, um ponto de referência capaz de ajudar os concorrentes e indicam o itinerário ou a «guia de marcha» que leva à obtenção de uma AIM para qualquer medicamento com a mesma substância ativa. Revelam futuros desenvolvimentos de produtos e poderiam ser integralmente utilizados para completar os processos de pedido de AIM apresentados pelos concorrentes. A esse respeito, as recorrentes alegam ter investido recursos substanciais na elaboração dos relatórios de estudos do lote 1 e alegam que a utilização destes para efeitos de benchmarking daria, desse modo, uma vantagem a um potencial concorrente. Entendem que o período de exclusividade dos dados concedido aos titulares de AIM não garante uma proteção infalível contra a concorrência desleal.

60      A EMA refuta os argumentos das recorrentes.

61      A título preliminar, há que lembrar, em primeiro lugar, que, nos termos do artigo 15.o, n.o 3, TFUE, qualquer cidadão da União e qualquer pessoa singular ou coletiva que resida ou tenha a sua sede estatutária num Estado‑Membro tem direito de acesso aos documentos das instituições, órgãos e organismos da União, sem prejuízo dos princípios e das condições que sejam fixados de acordo com o processo legislativo ordinário. O Regulamento n.o 1049/2001 tem por objetivo, como indicado no seu considerando 4 e no seu artigo 1.o, permitir o direito de acesso mais amplo possível do público aos documentos das instituições (Acórdãos de 28 de junho de 2012, Comissão/Éditions Odile Jacob, C‑404/10 P, EU:C:2012:393, n.o 111, e de 28 de junho de 2012, Comissão/Agrofert Holding, C‑477/10 P, EU:C:2012:394, n.o 53; v., igualmente, neste sentido, Acórdão de 14 de novembro de 2013, LPN e Finlândia/Comissão, C‑514/11 P e C‑605/11 P, EU:C:2013:738, n.o 40).

62      Por outro lado, há que lembrar que o procedimento de pedido de AIM de medicamentos se rege pelo Regulamento n.o 726/2004, que aprova um procedimento de direito da União a esse respeito. O artigo 73.o do Regulamento n.o 726/2004 dispõe que o Regulamento n.o 1049/2001 se aplica aos documentos na posse da EMA. Daqui resulta que o princípio do acesso mais amplo possível do público aos documentos deve, em princípio, ser respeitado no que se refere aos documentos na posse da EMA.

63      O princípio do acesso mais amplo possível do público aos documentos não deixa de estar sujeito a certos limites baseados em razões de interesse público ou privado. Com efeito, o Regulamento n.o 1049/2001, nomeadamente no seu considerando 11 e no seu artigo 4.o, prevê um regime de exceções que impõe às instituições e aos organismos que não divulguem documentos no caso de a divulgação lesar um desses interesses (v., neste sentido, Acórdãos de 28 de junho de 2012, Comissão/Éditions Odile Jacob, C‑404/10 P, EU:C:2012:393, n.o 111; de 28 de junho de 2012, Comissão/Agrofert Holding, C‑477/10 P, EU:C:2012:394, n.o 53; e de 14 de novembro de 2013, LPN e Finlândia/Comissão, C‑514/11 P e C‑605/11 P, EU:C:2013:738, n.o 40).

64      Dado que as exceções previstas no artigo 4.o do Regulamento n.o 1049/2001 derrogam o princípio do acesso mais amplo possível do público aos documentos, devem ser interpretadas e aplicadas de forma estrita (v., neste sentido, Acórdãos de 21 de julho de 2011, Suécia/MyTravel e Comissão, C‑506/08 P, EU:C:2011:496, n.o 75, e de 3 de julho de 2014, Conselho/in’t Veld, C‑350/12 P, EU:C:2014:2039, n.o 48).

65      Há que assinalar igualmente que o regime das exceções previsto no artigo 4.o do Regulamento n.o 1049/2001, nomeadamente no seu n.o 2, se baseia numa ponderação dos interesses que se opõem numa dada situação, a saber, por um lado, os interesses que serão favorecidos pela divulgação dos documentos em causa e, por outro, os que serão ameaçados por essa divulgação. A decisão tomada sobre um pedido de acesso a documentos depende da questão de saber qual o interesse que deve prevalecer no caso concreto (Acórdãos de 14 de novembro de 2013, LPN e Finlândia/Comissão, C‑514/11 P e C‑605/11 P, EU:C:2013:738, n.o 42, e de 23 de setembro de 2015, ClientEarth e International Chemical Secretariat/ECHA, T‑245/11, EU:T:2015:675, n.o 168).

66      Refira‑se que, para justificar a recusa de acesso a um documento, não basta, em princípio, que esse documento seja relativo a uma atividade ou a um interesse mencionado no artigo 4.o do Regulamento n.o 1049/2001, devendo a instituição em causa demonstrar igualmente de que modo o acesso a esse documento poderá lesar concreta e efetivamente o interesse protegido por uma exceção prevista nesse artigo (v., neste sentido, Acórdãos de 28 de junho de 2012, Comissão/Éditions Odile Jacob, C‑404/10 P, EU:C:2012:393, n.o 116; de 28 de junho de 2012, Comissão/Agrofert Holding, C‑477/10 P, EU:C:2012:394, n.o 57; e de 27 de fevereiro de 2014, Comissão/EnBW, C‑365/12 P, EU:C:2014:112, n.o 64) e que o risco de lesão desse interesse é razoavelmente previsível e não puramente hipotético (Acórdãos de 13 de abril de 2005, Verein für Konsumenteninformation/Comissão, T‑2/03, EU:T:2005:125, n.o 69, e de 22 de maio de 2012, Sviluppo Globale/Comissão, T‑6/10, não publicado, EU:T:2012:245, n.o 64).

67      Quanto ao conceito de interesses comerciais, resulta da jurisprudência que não se pode considerar que toda a informação relativa a uma sociedade e às suas relações de negócios está coberta pela proteção que deve ser garantida aos interesses comerciais em conformidade com o artigo 4.o, n.o 2, primeiro travessão, do Regulamento n.o 1049/2001, sob pena de se pôr em causa a aplicação do princípio geral que consiste em conferir ao público o acesso mais amplo possível aos documentos na posse das instituições (Acórdãos de 15 de dezembro de 2011, CDC Hydrogene Peroxide/Comissão, T‑437/08, EU:T:2011:752, n.o 44, e de 9 de setembro de 2014, MasterCard e o./Comissão, T‑516/11, não publicado, EU:T:2014:759, n.o 81). Há que precisar igualmente, aliás, que o guia comum da EMA e dos chefes das agências de medicamentos relativo à identificação das informações comerciais confidenciais e dos dados pessoais no âmbito do procedimento de AIM define a «informação confidencial no plano comercial» como qualquer informação que não seja do domínio público ou acessível ao público e cuja divulgação possa lesar os interesses económicos ou a situação concorrencial do seu proprietário.

68      Assim, para se aplicar a exceção prevista no artigo 4.o, n.o 2, primeiro travessão, do Regulamento n.o 1049/2001, é necessário demonstrar que os documentos controvertidos contêm elementos suscetíveis de, pela sua divulgação, lesar os interesses comerciais de uma pessoa coletiva. É o que acontece quando, nomeadamente, os documentos pedidos contêm informações comerciais sensíveis, relativas, nomeadamente, às estratégias comerciais das empresas em causa ou às suas relações comerciais ou quando contêm dados específicos da empresa que apresentam a sua especialização (v., neste sentido, Acórdão de 9 de setembro de 2014, MasterCard e o./Comissão, T‑516/11, não publicado, EU:T:2014:759, n.os 82 a 84).

69      É à luz das considerações feitas nos n.os 61 a 68, supra, que devem ser analisados os argumentos das recorrentes de que a EMA violou o artigo 4.o, n.o 2, primeiro travessão, do Regulamento n.o 1049/2001 ao adotar a decisão recorrida, que autoriza a divulgação das informações controvertidas.

70      Há que lembrar previamente que a análise do primeiro fundamento revelou que não havia nenhuma presunção geral de confidencialidade que protegesse da divulgação todos os relatórios de estudos do lote 1. Daí resulta que, para se poder considerar que os relatórios de estudos do lote 1 apresentam globalmente um caráter de confidencialidade comercial na aceção do artigo 4.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1049/2001, é necessário que todos os dados que constam desses relatórios constituam informações comerciais confidenciais.

71      Em primeiro lugar, as recorrentes alegam que os relatórios de estudos do lote 1 revelam knowhow regulamentar, capacidades de avaliação clínica e a iniciativa estratégica inventiva seguida pela MSD para realizar os seus estudos de inocuidade.

72      Contudo, a EMA lembra acertadamente que todos os ensaios de inocuidade incluídos nos pedidos de AIM de medicamentos veterinários devem preencher os requisitos previstos no anexo I da Diretiva 2001/82. Do mesmo modo, há que ter em conta o facto de a EMA ter publicado orientações para os ensaios de toxicidade, depois da celebração de um acordo harmonizado entre a União, o Japão e os Estados Unidos da América, e que essas orientações públicas, elaboradas progressivamente ao longo de muitos anos, constituem hoje um vasto acervo com o objeto de guiar a indústria farmacêutica na condução dos estudos exigidos para a aprovação de um medicamento veterinário.

73      No caso, na decisão recorrida, a EMA lembra que os estudos foram concebidos no respeito das orientações e das recomendações aceites internacionalmente. Visa, em particular, as «[o]rientações da OCDE para os ensaios de produtos químicos, [s]ecção 4, [e]feitos para a saúde, n.o 410, [t]oxicidade cutânea em doses repetidas: 21/28 dias, adotadas em 12 de maio de 1981», a «Conferência Internacional sobre a Harmonização, Topic S 3A Toxicokinetics: A Guidance for Assessing Systemic Exposure in Toxicology Studies (CPMP/ICH/384/95)» [Conferência Internacional sobre a Harmonização dos Requisitos Técnicos para o Registo de Medicamentos para Uso Humano (CIH), tema S 3A, toxicocinética: orientações para a avaliação da exposição sistémica nos estudos toxicológicos], os «VICH, Guideline 31, Studies to evaluate the Safety of Residues of Veterinary Drugs in Human Food: Repeat‑Dose (90 Days) Toxicity Testing, de outubro de 2002» [Conferência Internacional sobre a Harmonização dos Requisitos Técnicos para o Registo de Medicamentos para Uso Veterinário (CIHV), Guia 31, Estudos de avaliação da segurança dos resíduos de medicamentos para uso veterinário na alimentação humana: Estudo da toxicidade por administração reiterada (90 dias), de outubro de 2002] e o «Guidance for Industry. Bioanalytical Method Validation, U. S. Department of Health and Human Services, Food and Drug Administration, Center for Drug Evaluation and Research (CDER), Center for Veterinary Medicine (CVM), may 2001» [Orientações para o setor. Validação do método bioanalítico, Ministério da Saúde e dos Serviços Sociais dos Estados Unidos, Administração dos Alimentos e dos Medicamentos, Centro de Avaliação e de Pesquisa sobre os Medicamentos (CERM), Centro de Medicina Veterinária (CMV), maio de 2001].

74      Há que observar que as recorrentes não negam ter seguido o protocolo previsto nas orientações e nas recomendações acima referidas. Assim, não puseram em causa o facto de os relatórios de estudos do lote 1 respeitarem as orientações aplicáveis e assentarem nos princípios conhecidos e amplamente acessíveis na comunidade científica. Esta circunstância tende, assim, a confirmar a conclusão da EMA de que esses relatórios não têm caráter inovador.

75      Acresce que a afirmação das recorrentes de que os relatórios de estudos do lote 1 fornecem uma estratégia inovadora sobre a forma de planificar um programa de toxicologia não é sustentada. Com efeito, as recorrentes não apresentaram elementos concretos destinados a demonstrar que os relatórios continham elementos únicos e importantes que permitem dar esclarecimentos sobre a sua estratégia inventiva global e sobre o seu programa de desenvolvimento.

76      No mesmo sentido, as recorrentes alegam que, mesmo embora, na sua conceção, os estudos de inocuidade estejam em parte estandardizados, as orientações não podem substituir o knowhow em matéria de dados relativos à substância ativa. Contudo, como salienta a EMA, a afirmação de um knowhow alegadamente contido nos documentos é vaga e não permite determinar em que consiste a abordagem inovadora seguida. Pelas mesmas razões, as recorrentes alegam em vão que existe uma diferença considerável entre documentos de orientações com recomendações sobre os documentos que devem ou não ser apresentados para efeitos de um pedido e os documentos incluídos realmente no processo junto em apoio desse pedido.

77      Invocam igualmente pormenores sobre as normas de gestão interna que um estudo de toxicologia implica, desenvolvidas pela MSD, mas não as identificam nem, por maioria de razão, juntam elementos concretos que permitem compreender de que modo essas normas refletiriam um «knowhow secreto desenvolvido por meio de esforços e despesas consideráveis». De resto, é útil salientar que a EMA aceitou que não fossem divulgados pormenores relativos à norma de referência interna utilizada nos ensaios analíticos.

78      Em segundo lugar, as recorrentes acusam, em substância, a EMA de não ter indicado nenhum fundamento que permitisse desmentir o argumento de que as informações eram confidenciais por indicarem o itinerário ou a «guia de marcha» que leva à obtenção de uma AIM para qualquer medicamento com a mesma substância ativa.

79      Primeiro, esta consideração improcede na medida em que deva ser entendida como uma alegação de falta de fundamentação. Com efeito, a decisão recorrida contém fundamentos precisos sobre os argumentos das recorrentes quanto a esse ponto, conforme resulta tanto das respostas às considerações gerais como das, particulares, relativas às informações controvertidas que, segundo a EMA, não têm caráter confidencial (v. páginas 331 e 339 do anexo da carta de 25 de novembro de 2015).

80      Segundo, se os argumentos das recorrentes forem de interpretar como uma alegação do caráter confidencial de todos os relatórios de estudos do lote 1 e de que a EMA não fez prova do contrário, essa alegação deve ser julgada improcedente. Antes de mais, a consideração de que todas as informações controvertidas são confidenciais por indicarem o itinerário ou a «guia de marcha» para a obtenção de uma AIM assemelha‑se mais à invocação de uma presunção geral de confidencialidade que caberia à EMA elidir. Ora, a análise do primeiro fundamento revelou que essa presunção não existia no âmbito dos procedimentos de AIM de medicamentos veterinários. Seguidamente, os argumentos em apoio dessa alegação são vagos e não sustentados. Com efeito, a simples afirmação de que as informações controvertidas indicam o itinerário ou a «guia de marcha» para a obtenção de uma AIM não permite determinar que sejam confidenciais. Não se pode, pois, alegar validamente que a EMA deveria ter apresentado fundamentos para demonstrar o contrário. Por último, há que salientar que, na decisão recorrida, a EMA decidiu ocultar um certo número de informações. Com efeito, afirma, sem impugnação das recorrentes nesse ponto, que os documentos não contêm informações sobre a composição ou o fabrico do Bravecto, uma vez que foram ocultadas as seguintes informações dos relatórios de estudos do lote 1: pormenores relativos aos intervalos de concentração das substâncias ativas, pormenores relativos à norma de referência interna utilizada nos ensaios analíticos e referências aos projetos de desenvolvimento futuros.

81      Em terceiro lugar, não colhe o argumento das recorrentes de que, na aplicação da jurisprudência dos Despachos de 25 de julho de 2014, Deza/ECHA (T‑189/14 R, não publicado, EU:T:2014:686), e de 23 de maio de 2016, Pari Pharma/EMA (T‑235/15 R, não publicado, EU:T:2016:309), os relatórios de estudos do lote 1 formam um todo inseparável com valor económico e que merecem, por isso, tratamento confidencial na íntegra. Por um lado, não se contesta que esses relatórios contêm um certo número de informações que foram publicadas. Com efeito, o EPAR relativo ao Bravecto está acessível ao público e contém dados que provêm diretamente dos relatórios de estudos do lote 1, o que implica necessariamente que pelo menos uma parte dos dados que constam desses relatórios estão acessíveis ao público. Consequentemente, para poder reivindicar o tratamento confidencial da totalidade dos relatórios, cabe às recorrentes demonstrar que a compilação completa dos dados acessíveis ao público com os que não o estão constitui um dado comercial sensível cuja divulgação lesaria os seus interesses comerciais. O facto, alegado pelas recorrentes, de que o EPAR é menos detalhado e não contém explicações sobre as modalidades seguidas para chegar aos resultados relativos ao Bravecto é irrelevante a esse respeito. As recorrentes apenas apresentaram explicações vagas e genéricas para demonstrar que essa compilação das informações controvertidas poderia dar origem às consequências alegadas em termos de violação do seu knowhow e dos seus segredos comerciais. Como recordado no n.o 64, supra, ainda eram mais necessárias explicações precisas e concretas quando, uma vez que as exceções previstas no artigo 4.o do Regulamento n.o 1049/2001 derrogam o princípio do acesso mais amplo possível do público aos documentos, devem ser interpretadas e aplicadas de forma estrita.

82      Por outro lado, a violação da proteção dos interesses comerciais de uma pessoa, conforme prevista no artigo 4.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1049/2001, não se determina necessariamente à luz do valor patrimonial da informação objeto da divulgação.

83      Neste âmbito, improcede igualmente o argumento de que, ao contrário dos relatórios redigidos pelo Comité dos Medicamentos para Uso Humano, que contêm dados apresentados pelo requerente de uma AIM, os relatórios de estudos do lote 1 provêm das próprias recorrentes, o que reforça o seu caráter confidencial. Com efeito, como indicado no n.o 81, supra, as recorrentes não demonstraram em concreto que a divulgação das informações controvertidas lesaria os seus interesses comerciais.

84      Em quarto lugar, há que relativizar duplamente a afirmação das recorrentes de que os concorrentes poderiam utilizar os estudos como uma ajuda à conceção dos seus próprios estudos de toxicologia e ajustar aos elementos apresentados pela MSD os seus próprios pedidos de AIM. Por um lado, as empresas concorrentes devem, de qualquer forma, levar a cabo os seus próprios estudos de acordo com as orientações científicas aplicáveis e apresentar todos os dados necessários para que o seu processo esteja completo. Não é, portanto, evidente que a divulgação dos relatórios de estudos do lote 1 lhes permita acelerar o processo de obtenção de uma AIM do seu medicamento e obter a aprovação de ensaios clínicos mais rapidamente. Nenhum argumento concreto foi apresentado a esse respeito. Por outro lado, como lembra a EMA na decisão recorrida, o Regulamento n.o 726/2004 e a Diretiva 2001/82 conferem proteção, por meio da exclusividade dos dados, a documentos regulamentares apresentados para efeitos de se obter uma AIM. Uma empresa concorrente não poderá, pois, limitar‑se a utilizar os estudos de inocuidade das recorrentes, pois terá de juntar os estudos que ela própria tenha efetuado.

85      Em quinto lugar, as recorrentes alegam sem razão que o período de exclusividade dos dados concedido aos titulares de AIM não garante uma proteção infalível contra a concorrência desleal e que existem inúmeras desvantagens comerciais a que os titulares de AIM ficam expostos em caso de divulgação erga omnes dos seus dados clínicos e não clínicos. Resulta dos pontos anteriores que as recorrentes não demonstraram a realidade das desvantagens comerciais que alegam nos seus articulados.

86      Neste contexto, as recorrentes alegam que a substância ativa e a norma de referência são ambas indispensáveis para levar a cabo as análises que dão origem aos resultados esperados e que os seus concorrentes não conseguem apresentar esses mesmos resultados sem cometer uma violação dos seus direitos de exclusividade sobre a substância ativa. Contudo, há que lembrar que a EMA considerou que se devia ocultar o intervalo de concentração da substância ativa e os pormenores da norma de referência interna utilizada nos testes analíticos. As recorrentes não apresentaram elementos que permitissem compreender a razão por que essas ocultações não seriam suficientes, nem, portanto, de que modo os concorrentes violariam os seus direitos de exclusividade sobre a substância ativa.

87      Em sexto lugar, as recorrentes referem um risco de perda imediata do benefício do período de exclusividade dos dados, em caso de divulgação dos relatórios de estudos do lote 1, pelo facto de estes poderem ser utilizados por concorrentes em países terceiros que o permitam. Contudo, além de este argumento das recorrentes ser vago e impreciso, nada permite concluir que o acesso às informações em causa, que não têm caráter confidencial do ponto de vista dos interesses comerciais das recorrentes, facilitaria, só por si, a obtenção de uma AIM num país terceiro por uma empresa farmacêutica concorrente. Isto é ainda mais manifesto quando dados como os relativos ao intervalo de concentração da substância ativa, aos pormenores da norma de referência interna utilizada nos testes analíticos e a um pedido de fixação dos limites de resíduo permanecem confidenciais, em seu entender. As recorrentes não apresentaram nenhum argumento concreto destinado a demonstrar a alegada realidade do perigo que existiria em certos países terceiros. Acresce que a não divulgação de todos os estudos, para impedir as autoridades de um país terceiro de concederem acesso de um fabricante ao seu mercado sem este ter de apresentar os seus próprios estudos, seria anular o direito do público a aceder aos documentos com informações sobre medicamentos autorizados, conferido pelo direito da União.

88      Em sétimo lugar, admitindo que os relatórios de estudos do lote 1 pudessem ser utilizados como um elemento do processo de AIM apresentado por concorrentes num procedimento relativo a um medicamento genérico concorrente do Bravecto, não é menos verdade que esse medicamento genérico não parece poder ser comercializado antes do termo de um período de dez anos (v. artigo 13.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Diretiva 2001/82). Assim, é dificilmente concebível que a utilização de informações quase dez anos depois da introdução do Bravecto no mercado possa lesar os interesses comerciais das recorrentes.

89      Em oitavo lugar, as recorrentes alegam igualmente sem razão que investiram recursos consideráveis na elaboração dos relatórios e que isso demonstra de forma evidente o seu potencial valor comercial. Antes de mais, como recordado no n.o 82, supra, a violação da proteção dos interesses comerciais de uma pessoa, conforme prevista no artigo 4.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1049/2001, não se determina necessariamente à luz do valor patrimonial da informação objeto da divulgação. Por outras palavras, o facto de a realização de estudos de inocuidade envolver investimentos financeiros das empresas farmacêuticas não implica só por si que os referidos estudos sejam confidenciais. Seguidamente, como salientado no n.o 72, supra, todos os ensaios de inocuidade incluídos nos pedidos de AIM de medicamentos veterinários devem respeitar os requisitos da Diretiva 2001/82 e das orientações da EMA relativas aos ensaios de toxicidade. Por último, os dados que constam dos relatórios de estudos do lote 1 estão protegidos pela exclusividade (v. n.o 84, supra). Tendo em conta estes elementos, não se pode deixar de observar que todas as empresas farmacêuticas devem realizar os seus próprios estudos de inocuidade, visto que não se podem limitar a basear‑se nos de empresas concorrentes. Devem, pois, proceder a investimentos financeiros da mesma maneira que as recorrentes. Não se verifica, portanto, que a divulgação dessas informações que tenham valor comercial possa, só por isso, prejudicar os interesses comerciais das recorrentes e que essas informações tenham automaticamente caráter comercial confidencial.

90      Em nono lugar, não colhe o argumento de que os concorrentes poderão prejudicar os futuros projetos a que a MSD destine o Bravecto na União e fora dela. Com efeito, resulta da decisão recorrida que a EMA aceitou expurgar as referências feitas nos relatórios de estudos do lote 1 a qualquer projeto de desenvolvimento futuro das recorrentes. Tendo este elemento em conta e como salienta a EMA, não é fácil compreender de que modo a divulgação dos documentos poderia afetar os futuros projetos de desenvolvimento de outras indicações do Bravecto.

91      Em décimo lugar, é totalmente irrelevante a afirmação de que os concorrentes poderão prejudicar as recorrentes ao divulgarem fora do contexto passagens dos relatórios de estudos do lote 1 com o objetivo de prejudicar a reputação do Bravecto. Com efeito, a possibilidade de prejudicar a reputação do titular dos documentos não constitui um critério capaz de identificar se uma informação é confidencial ou não.

92      Em décimo primeiro lugar, improcede a afirmação de que as informações não clínicas que constam dos relatórios de estudos do lote 1 permitiriam aos concorrentes da MSD obter mais facilmente uma AIM. As recorrentes não identificaram nenhum dado desses relatórios nem sustentaram a sua afirmação em qualquer argumentação concreta que permita considerar que as informações não clínicas teriam caráter confidencial.

93      Em último lugar, as recorrentes afirmam que o critério da EMA que lhes exige que demonstrem de que modo a AIM de um produto concorrente se apoia na exploração desleal dos seus documentos não está de acordo com a jurisprudência, que apenas exige que se demonstre que a exploração desleal dos seus dados é razoavelmente previsível e não puramente hipotética. Esse argumento é irrelevante, uma vez que as recorrentes não demonstraram um hipotético risco de utilização desleal dos seus dados, como refere a EMA. Com efeito, no n.o 84, supra, refere‑se que as empresas concorrentes devem, de qualquer forma, realizar os seus próprios estudos de acordo com as orientações científicas aplicáveis e fornecer todos os dados necessários para que o seu processo esteja completo. Nestas circunstâncias, não é razoavelmente previsível que a avaliação comparativa com o processo das recorrentes pudesse permitir aos seus concorrentes acelerarem o seu próprio procedimento de autorização regulamentar e serem autorizados a conduzir ensaios clínicos mais rapidamente.

94      Resulta do exposto que improcede o segundo fundamento.

 Quanto ao terceiro fundamento, relativo à proteção, pelo artigo 4.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1049/2001, dos relatórios de estudos do lote 1 contra as violações do processo decisório

95      Em apoio do terceiro fundamento, as recorrentes alegam, antes de mais, que, de qualquer forma, a divulgação dos relatórios de estudos do lote 1 seria prematura. Salientam que a EMA considera que só pode ocultar informações relativas aos pedidos subsequentes das recorrentes e não as que constam do pedido de AIM que deu origem à apresentação dos relatórios. Entendem que, se a divulgação pode afetar um pedido de AIM futuro, as informações em causa estão abrangidas pelo artigo 4.o, n.o 3 (e também pelo artigo 4.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1409/2001), e devem ser objeto de tratamento confidencial. Seguidamente, alegam que a divulgação de dados incentivará os requerentes de AIM a comunicarem unicamente o mínimo de informações necessário em apoio do seu pedido. Alegam, por último, que os eventuais efeitos da divulgação dos relatórios de estudos do lote 1 no processo decisório da EMA sobre o Bravecto lhes dizem direta e individualmente respeito e que, portanto, podem apresentar os seus argumentos ao abrigo do artigo 4.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1049/2001.

96      A EMA impugna o facto de a divulgação dos relatórios de estudos do lote 1 poder afetar o procedimento de AIM do Bravecto.

97      No âmbito do terceiro fundamento, as recorrentes alegam que a divulgação dos relatórios de estudos do lote 1 viola o processo decisório, pelo que está em contradição com o artigo 4.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1049/2001.

98      A título preliminar, há que lembrar que a aplicação da exceção prevista no artigo 4.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1049/2001 pressupõe que se demonstre que o acesso aos documentos pedidos é suscetível de prejudicar concreta e efetivamente a proteção do processo decisório da Comissão e que esse risco de prejuízo é razoavelmente previsível e não puramente hipotético (v. Acórdão de 18 de dezembro de 2008, Muñiz/Comissão, T‑144/05, não publicado, EU:T:2008:596, n.o 74 e jurisprudência aí referida).

99      Refira‑se igualmente que o artigo 4.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1049/2001 faz uma distinção clara entre os casos em que o procedimento está encerrado e aqueles em que não está. Assim, por um lado, segundo o artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, desse regulamento, faz parte do âmbito de aplicação da exceção que visa a proteção do processo decisório qualquer documento emitido por uma instituição para uso interno ou recebido por uma instituição e relativo a uma questão sobre a qual ainda não tomou uma decisão. Por outro lado, o artigo 4.o, n.o 3, segundo parágrafo, do mesmo regulamento dispõe que, depois de tomada a decisão, a exceção em causa abrange unicamente os documentos com pareceres destinados a utilização interna no âmbito de deliberações e de consultas preliminares no interior na instituição em causa (Acórdão de 21 de julho de 2011, Suécia/MyTravel e Comissão, C‑506/08 P, EU:C:2011:496, n.o 78).

100    Assim, só relativamente a uma parte dos documentos para uso interno, a saber, os que contêm pareceres destinados a utilização interna no âmbito de deliberações e de consultas preliminares no interior da instituição em causa, é que o artigo 4.o, n.o 3, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001 permite opor uma recusa, mesmo depois de a decisão ter sido tomada, quando a sua divulgação prejudique gravemente o processo decisório dessa instituição (Acórdão de 21 de julho de 2011, Suécia/MyTravel e Comissão, C‑506/08 P, EU:C:2011:496, n.o 79).

101    Daí resulta que o legislador da União considerou que, uma vez adotada a decisão, as exigências de proteção do processo decisório apresentavam menor acuidade, pelo que a divulgação de qualquer documento além dos previstos no artigo 4.o, n.o 3, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001 nunca pode prejudicar esse processo e a recusa de divulgação desse documento não pode ser autorizada, mesmo quando a sua divulgação tivesse prejudicado gravemente esse processo se tivesse ocorrido antes da adoção da decisão em causa (Acórdão de 21 de julho de 2011, Suécia/MyTravel e Comissão, C‑506/08 P, EU:C:2011:496, n.o 80).

102    No caso, não se pode deixar de observar, antes de mais, que os relatórios de estudos do lote 1 foram apresentados e avaliados no âmbito do pedido de AIM do Bravecto, seguidamente, que a EMA concedeu às recorrentes a respetiva AIM para uma indicação terapêutica determinada e, por último, que o procedimento de concessão da AIM do Bravecto estava encerrado quando o pedido de acesso a esses relatórios foi apresentado por um terceiro. Assim, o artigo 4.o, n.o 3, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001 é a disposição em que, em substância, se baseiam as recorrentes.

103    É tendo em conta estas considerações que se devem analisar os argumentos das recorrentes.

104    Há que responder previamente ao argumento da EMA em que considera que o terceiro fundamento das recorrentes não deve ser admitido, por estas não terem interesse legítimo concreto em suscitá‑lo. O raciocínio da EMA assenta no facto de o artigo 4.o, n.o 4, do Regulamento n.o 1049/2001 dispor que, nos casos de documentos de terceiros, a instituição deve consultá‑los para avaliar se é aplicável uma das exceções previstas no artigo 4.o, n.os 1 ou 2, do mesmo regulamento, a menos que seja claro que o documento deve ou não ser divulgado. Ora, dado que a redação dessa disposição indica que a exceção invocada pelo titular dos documentos que justifica a sua não divulgação só pode assentar no artigo 4.o, n.os 1 e 2, do Regulamento n.o 1049/2001, as recorrentes não têm interesse em invocar no Tribunal Geral uma eventual violação do artigo 4.o, n.o 3, desse regulamento.

105    Isto traduz‑se, em substância, em considerar que o limite segundo o qual os terceiros na origem dos dados devem ser consultados unicamente «tendo em vista avaliar se qualquer das exceções previstas [no artigo 4.o,] n.os 1 ou 2[, do Regulamento n.o 1049/2001] é aplicável», e não no artigo 4.o, n.o 3, desse regulamento, vale igualmente no processo no Tribunal Geral.

106    Contudo, não se pode deixar de considerar que não existe nenhum obstáculo legal que impeça as recorrentes de suscitarem a violação do artigo 4.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1049/2001 em sede de recurso de anulação no Tribunal Geral. A exigência prevista no artigo 4.o, n.o 4, do mesmo regulamento, imposta às recorrentes na consulta, de se limitar às exceções previstas no artigo 4.o, n.os 1 e 2, desse regulamento, não pode constituir ipso jure um obstáculo à arguição da violação do artigo 4.o, n.o 3, desse regulamento no Tribunal Geral. Isto é ainda mais verdade quando, como salientam as recorrentes, tanto lhes diz diretamente respeito a decisão da EMA de divulgar os documentos que consideram confidenciais como os efeitos dessa divulgação no respetivo processo decisório quanto ao Bravecto.

107    Por conseguinte, não se pode rejeitar o fundamento pela alegada razão de as recorrentes não terem qualquer interesse em suscitá‑lo.

108    Quanto ao mérito, em primeiro lugar, as recorrentes alegam que os relatórios de estudos do lote 1 vão ser utilizados para novos pedidos de autorização, uma vez que contam basear‑se neles para os seus futuros pedidos. Entendem, assim, que as informações em causa estão abrangidas pelo artigo 4.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1049/2001 e que a sua divulgação prejudicará gravemente o processo decisório da EMA no âmbito do procedimento administrativo pendente e de procedimentos administrativos futuros.

109    Contudo, estes argumentos não colhem. Primeiro, como acertadamente refere a EMA, os titulares das AIM — que, para as obterem, apresentaram dados de ensaio de inocuidade — beneficiam de uma proteção dos seus dados a vários níveis no termo do procedimento de AIM. Por um lado, os titulares dos dados gozam de um período de proteção dos mesmos por força do artigo 39.o, n.o 10, do Regulamento n.o 726/2004. Por outro, beneficiam de uma proteção das informações comerciais confidenciais contidas num processo de AIM, incluindo as informações relativas ao fabrico do produto e as outras especificações técnicas e industriais dos processos de qualidade levado a cabo no fabrico da substância. Tendo em conta estas garantias, não se verifica a priori que o acesso aos relatórios de estudos do lote 1, uma vez emitida a AIM, possa prejudicar os interesses das recorrentes.

110    Segundo, o facto de outros dados poderem ser reutilizados no âmbito de novos pedidos de AIM não constitui, em si mesmo, um motivo que permita considerar que essas informações são confidenciais ou que são suscetíveis de prejudicar o processo decisório, na aceção do artigo 4.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1049/2001. Como salientado no n.o 46, supra, a EMA garantiu, na decisão recorrida, que os dados alheios à indicação já autorizada e os dados relativos aos futuros projetos de desenvolvimento permaneçam confidenciais.

111    Terceiro e de qualquer forma, não se pode deixar de observar que as recorrentes não apresentaram elementos que permitissem concluir que o alegado prejuízo para o processo decisório era grave. Ora, como resulta da jurisprudência referida nos n.os 98 e 99, supra, e tendo em conta o que se apurou no n.o 102, supra, cabia às recorrentes demonstrar que o acesso aos relatórios de estudos do lote 1 era suscetível de prejudicar concreta e efetivamente a proteção do processo decisório da Comissão e que esse risco era razoavelmente previsível e não puramente hipotético (v., neste sentido, Acórdão de 18 de dezembro de 2008, Muñiz/Comissão, T‑144/05, não publicado, EU:T:2008:596, n.o 74 e jurisprudência aí referida). A necessidade dessa demonstração justificava‑se com tanto mais intensidade quanto as exigências de proteção do processo decisório apresentavam menor acuidade.

112    Em segundo lugar, as recorrentes afirmam sem razão que a divulgação dos dados como os relatórios de estudos do lote 1 incentivará os requerentes de AIM a confiarem o mínimo de informações sensíveis à EMA e, em substância, terá um efeito contraproducente.

113    Por um lado, as empresas farmacêuticas que tentem obter uma AIM para o seu medicamento não têm interesse algum em transmitir o mínimo possível de informações à EMA, pois isso reduziria significativamente as suas possibilidades de sucesso a esse respeito.

114    Por outro lado, reconhecer a eventual renitência de uma empresa farmacêutica em confiar, no âmbito do seu pedido de AIM de um medicamento, informações à EMA pelo facto de estas poderem ser divulgadas nos termos do Regulamento n.o 1049/2001 não pode constituir o fundamento de um prejuízo grave para o processo decisório, na aceção do artigo 4.o, n.o 3, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001 (v., neste sentido e por analogia, Acórdão de 24 de maio de 2011, Batchelor/Comissão, T‑250/08, EU:T:2011:236, n.o 80).

115    Resulta do exposto que o terceiro fundamento é improcedente.

 Quanto ao quarto fundamento, relativo à falta de ponderação dos interesses

116    As recorrentes assinalam o facto de a EMA ter indicado várias vezes e de forma incidental, na decisão recorrida, que, de qualquer modo, as informações podiam ser divulgadas quando um interesse público superior o justificasse. Observam, contudo, que a EMA não identifica a natureza do interesse público nem as razões por que este prevaleceria sobre os interesses das recorrentes. Entendem que uma interpretação do artigo 4.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1049/2001 à luz do artigo 39.o, n.o 3, do Acordo ADPIC deve levar a considerar que, quando existe um risco de exploração desleal dos dados, os casos de interesse público superior na divulgação limitam‑se àqueles em que é necessário proteger o público, necessidade essa que não existe no caso presente. Acrescentam que, em nome dos seus direitos fundamentais ao respeito da vida privada e à proteção dos seus dados de caráter profissional e do direito de propriedade (incluindo a propriedade intelectual), a EMA deveria ter verificado se a divulgação era proporcionada à lesão dos interesses das recorrentes e se podia haver outras soluções (como uma comunicação reservada aos investigadores universitários independentes). Alegam que as preocupações de saúde pública alegadas pela EMA não são suscetíveis de demonstrar um interesse público superior, na medida em que, na realidade, esses fundamentos se baseiam apenas em alegações gerais e não sustentadas. Neste sentido, a EMA não pode invocar a sua missão de saúde pública nem o dever de transparência previsto no Regulamento n.o 1049/2001 para divulgar os relatórios de estudos do lote 1, pois o Regulamento n.o 726/2004 já institui um regime de acesso detalhado que prevê a não divulgação dos dados de caráter confidencial do ponto de vista comercial.

117    A EMA refuta todos estes argumentos.

118    Há que determinar previamente o alcance exato do quarto fundamento das recorrentes. Resulta do artigo 111.o da petição que a crítica feita à EMA por não ter efetuado a ponderação dos interesses ocorre «uma vez determinado o caráter confidencial (total ou parcialmente) dos relatórios de estudos do lote 1». O fundamento não é relativo, portanto, ao momento — cronologicamente anterior — em que a EMA põe a questão do caráter confidencial ou não de uma ou outra informação. Contudo, o raciocínio das recorrentes nos artigos 114.o e seguintes da petição é ambivalente e leva a crer que também acusam a EMA de não ter feito uma ponderação dos interesses na primeira etapa do seu raciocínio, a saber, na apreciação do caráter confidencial ou não de uma ou outra informação.

119    Esclarecido isto, há que examinar o fundamento, a título principal, na medida em que é relativo à falta de ponderação dos interesses, apesar de as informações controvertidas serem confidenciais e, a título subsidiário, na medida em que é relativo à própria existência de uma das exceções previstas no artigo 4.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1049/2001.

120    Em primeiro lugar, há que lembrar que o artigo 4.o, n.o 2, última parte, do Regulamento n.o 1049/2001 dispõe que as instituições da União não podem recusar o acesso a um documento quando a sua divulgação seja justificada por um interesse público superior, mesmo que isso possa prejudicar a proteção dos interesses comerciais de uma pessoa singular ou coletiva determinada ou a proteção dos objetivos das atividades de inspeção, investigação e auditoria das instituições da União (Acórdão de 7 de outubro de 2014, Schenker/Comissão, T‑534/11, EU:T:2014:854, n.o 74). Neste contexto, há que ponderar, por um lado, o interesse específico que deve ser protegido pela não divulgação do documento em causa e, por outro, nomeadamente, o interesse geral em que este documento seja tornado acessível, atendendo às vantagens que decorrem, conforme especificado no considerando 2 do Regulamento n.o 1049/2001, de uma transparência acrescida, ou seja, uma melhor participação dos cidadãos no processo decisório e uma maior legitimidade, eficácia e responsabilidade da Administração perante os cidadãos num sistema democrático (Acórdão de 21 de outubro de 2010, Agapiou Joséphidès/Comissão e EACEA, T‑439/08, não publicado, EU:T:2010:442, n.o 136).

121    Embora o interesse público superior suscetível de justificar a divulgação de um documento não tenha de ser necessariamente distinto dos princípios subjacentes ao Regulamento n.o 1049/2001 (Acórdão de 14 de novembro de 2013, LPN e Finlândia/Comissão, C‑514/11 P e C‑605/11 P, EU:C:2013:738, n.o 92), resulta da jurisprudência que, só por si, as considerações gerais não são suscetíveis de demonstrar que o princípio da transparência tem uma acuidade particular que possa primar sobre as razões que justificam a recusa de divulgação dos documentos em questão e que cabe ao requerente invocar de forma concreta as circunstâncias que fundamentam um interesse público superior que justifique a divulgação dos documentos em causa (v., neste sentido, Acórdãos de 14 de novembro de 2013, LPN e Finlândia/Comissão, C‑514/11 P e C‑605/11 P, EU:C:2013:738, n.os 93 e 94, e de 23 de setembro de 2015, ClientEarth e International Chemical Secretariat/ECHA, T‑245/11, EU:T:2015:675, n.o 193).

122    Por um lado, como salienta a EMA, esta não concluiu que as informações em causa deviam ser protegidas por um regime de exceção conforme previsto no artigo 4.o, n.os 2 ou 3, do Regulamento n.o 1049/2001. Não tinha, portanto, a obrigação de determinar ou avaliar o interesse público na divulgação das informações, nem de ponderá‑lo com o interesse da recorrente em manter as referidas informações confidenciais.

123    Por outro lado, há que assinalar que é imprecisa e não sustentada a afirmação das recorrentes de que a EMA indicou várias vezes e de forma incidental, na decisão recorrida, que, de qualquer modo, as informações podiam ser divulgadas quando existisse um interesse público superior. Com efeito, as recorrentes não identificam os pontos da decisão recorrida em que a EMA se teria baseado no interesse público superior, pelo que não permitem ter em conta o contexto em que se teriam verificado essas considerações.

124    Em segundo lugar, admitindo que se devesse considerar que as recorrentes acusam a EMA de não ter feito uma ponderação dos interesses na análise do caráter confidencial ou não de cada informação, não se pode deixar de considerar que os argumentos apresentados não colhem.

125    Primeiro, o raciocínio das recorrentes assenta no pressuposto errado de que existe uma presunção geral de confidencialidade. Com efeito, a análise do primeiro fundamento revelou que essa presunção não existe para os relatórios de estudos de inocuidade a que se refere o pedido de acesso aos documentos.

126    Segundo, as recorrentes alegam, em substância, que, atendendo às disposições especiais que constam do Regulamento n.o 726/2004, a EMA deveria ter tido uma iniciativa prudente quando analisou a questão da divulgação dos relatórios de estudos do lote 1 nos termos do Regulamento n.o 1049/2001 e que, desse modo, deveria ter introduzido a questão do interesse público superior na sua apreciação.

127    Contudo, o artigo 73.o do Regulamento n.o 726/2004 prevê expressamente que as disposições do Regulamento n.o 1049/2001 se aplicam aos documentos na posse da EMA. Assim, em nome do princípio da transparência consagrado no artigo 15.o TFUE e no Regulamento n.o 1049/2001, esta tem de facultar o acesso aos documentos na sua posse, a saber, nomeadamente, os relatórios de estudos que lhe tenham sido transmitidos no âmbito de pedidos de AIM. Só se deve recusar o acesso no caso de esses documentos se integrarem numa das exceções previstas no artigo 4.o do Regulamento n.o 1049/2001. Assim, e ao contrário do que afirmam as recorrentes, o Regulamento n.o 726/2004 não prevê um regime especial de acesso aos documentos que derrogue o princípio geral da transparência previsto no Regulamento n.o 1049/2001.

128    A EMA não cometeu, portanto, um erro de direito ao não introduzir o critério do interesse público superior na sua apreciação do caráter confidencial ou não dos dados que constam dos relatórios de estudos do lote 1.

129    Terceiro, as recorrentes alegam, em substância, que o artigo 4.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1049/2001 deveria ter sido interpretado e aplicado à luz do artigo 39.o, n.o 3, do Acordo ADPIC. Alegam que, uma vez que existia um risco de exploração desleal dos dados, os relatórios de estudos do lote 1 só podiam ser divulgados se houvesse um interesse público superior nessa divulgação, interesse que só podia existir se fosse necessário proteger o público. Ora, esse interesse não existiu no caso presente.

130    Estes argumentos são improcedentes. Há que lembrar que os «dados regulamentares» previstos no artigo 39.o, n.o 3, do Acordo ADPIC estão protegidos tanto pelo artigo 39.o, n.o 10, do Regulamento n.o 726/2004 como pelo artigo 4.o do Regulamento n.o 1049/2001. Com efeito, estas duas disposições preveem medidas destinadas a assegurar que os dados estejam protegidos contra a exploração desleal no comércio. Essas medidas respeitam o disposto no artigo 39.o, n.o 3, in fine, do Acordo ADPIC. Cabia, pois, às recorrentes indicar de que modo a proteção prevista nas disposições acima referidas não teria sido suficiente e que, por isso, se impunha a demonstração de um interesse público superior.

131    Quarto, as recorrentes entendem que, em nome dos direitos fundamentais das recorrentes ao respeito da vida privada e à proteção dos seus dados de caráter profissional e do direito de propriedade (incluindo a propriedade intelectual), a EMA deveria ter verificado se a divulgação era proporcionada à lesão causada aos interesses das recorrentes e se podia haver outras soluções (como uma comunicação reservada aos investigadores universitários independentes). Contudo, estes argumentos não colhem. Com efeito, o exame dessa questão deve ser feito no contexto das disposições do Regulamento n.o 1049/2001. Ora, como acertadamente lembra a EMA, resulta da aplicação conjugada dos Regulamentos n.os 1049/2001 e 726/2004 que qualquer cidadão tem direito de acesso aos documentos da EMA, incluindo os que são apresentados pelas empresas farmacêuticas para a obtenção de uma AIM, sem prejuízo das exceções previstas nesse Regulamento n.o 1049/2001. No caso, a EMA mais não fez do que aplicar essas disposições. Tendo em conta a inexistência de qualquer presunção geral de confidencialidade dos relatórios de estudos do lote 1, esta só podia recusar o acesso a esses relatórios na íntegra se todas as informações neles contidas tivessem sido consideradas informações comerciais confidenciais cuja divulgação podia lesar os interesses comerciais das recorrentes, o que estas não demonstraram. Nestas circunstâncias, a EMA não podia violar os direitos fundamentais das recorrentes ao aplicar as disposições do Regulamento n.o 1049/2001.

132    A esse respeito, quanto à crítica precisa de a EMA não ter verificado se a divulgação era proporcionada à lesão causada aos interesses das recorrentes, é útil salientar que o artigo 4.o, n.o 6, do Regulamento n.o 1049/2001 dispõe que quando só algumas partes do documento pedido forem abrangidas por qualquer das exceções, as restantes partes do documento serão divulgadas, e que a análise do acesso parcial a esse documento da EMA deve ser feita à luz do princípio da proporcionalidade (v., neste sentido, Acórdão de 6 de dezembro de 2001, Conselho/Hautala, C‑353/99 P, EU:C:2001:661, n.os 27 e 28).

133    Com efeito, a jurisprudência salienta que resulta dos próprios termos do artigo 4.o, n.o 6, do Regulamento n.o 1049/2001 que uma instituição ou um órgão deve analisar se se deve conceder acesso parcial aos documentos indicados num pedido de acesso, limitando uma eventual recusa unicamente aos dados cobertos pelas referidas exceções. A instituição ou o órgão deve facultar esse acesso parcial se o objetivo que prossegue, quando recusa o acesso ao documento, puder ser atingido ocultando apenas as passagens que possam lesar o interesse público protegido (v., neste sentido, Acórdãos de 6 de dezembro de 2001, Conselho/Hautala, C‑353/99 P, EU:C:2001:661, n.o 29, e de 12 de setembro de 2013, Besselink/Conselho, T‑331/11, não publicado, EU:T:2013:419, n.o 84).

134    A análise detalhada dos diferentes documentos feita na decisão recorrida revela que a EMA examinou o pedido de acesso aos documentos no estrito respeito do princípio da proporcionalidade, cuja aplicação no domínio do acesso aos documentos foi descrita pela jurisprudência referida nos n.os 132 e 133, supra.

135    Quinto, segundo as recorrentes, as preocupações de saúde pública referidas pela EMA não são suscetíveis de demonstrar a existência de um interesse público superior, na medida em que, na realidade, esses fundamentos se baseiam apenas em alegações gerais e não sustentadas que não estão especificamente ligadas aos relatórios de estudos do lote 1. Este argumento não pode ser aceite, uma vez que as recorrentes não identificam nenhum ponto da decisão recorrida em que a EMA tivesse mencionado considerações de saúde pública. De resto, não parece que a EMA tenha baseado a sua decisão de divulgar os relatórios de estudos do lote 1 em preocupações de saúde pública. Os únicos fundamentos que determinaram o sentido da decisão recorrida dizem respeito à questão de saber se os documentos em causa estão abrangidos por uma das exceções previstas no artigo 4.o do Regulamento n.o 1049/2001.

136    Sexto, a crítica das recorrentes à EMA por fazer referência à segurança do Bravecto para a divulgação dos documentos é irrelevante por razões análogas às que foram apresentadas no n.o 135, supra. Com efeito, as recorrentes não referem nenhum ponto da decisão recorrida que indicasse que a EMA se baseou na segurança do Bravecto para decidir divulgar os relatórios de estudos do lote 1. Como acertadamente lembra a EMA, a regra geral é a de que os documentos na posse das instituições da União sejam públicos. Importa, pois, determinar se todos os relatórios de estudos do lote 1 ou parte deles estavam abrangidos por uma das exceções previstas no artigo 4.o do Regulamento n.o 1049/2001. Visto a EMA ter considerado que essas exceções não tinham aplicação no caso, não tinha de ponderar os interesses nem, por maioria de razão, identificar e demonstrar o interesse público superior que permitia a divulgação, conforme resulta do n.o 128, supra.

137    Quanto ao resto, há que precisar que, com a sua argumentação, as recorrentes lançam a confusão ao darem a impressão de que qualquer divulgação de documentos decidida pela EMA é feita no âmbito da sua missão de proteção da saúde pública e em nome da saúde pública que esta considere ser de interesse público superior. Ora, o facto de o eventual impacto desses documentos na saúde pública ser uma das razões por que o legislador da União reforçou a transparência e instituiu o direito de acesso aos documentos, nomeadamente na posse da EMA, não significa que a divulgação de documentos como os relatórios de estudos do lote 1 é feita automaticamente em nome do interesse público superior de saúde pública e implica automaticamente a necessidade de uma ponderação dos interesses. Como se refere nos n.os 135 e 136, supra, importa começar por determinar se todos os relatórios de estudos do lote 1 ou uma parte deles estavam abrangidos por uma das exceções previstas no artigo 4.o do Regulamento n.o 1049/2001.

138    Em face de todas estas considerações, improcede, de qualquer forma, o quarto fundamento.

 Quanto ao quinto fundamento, relativo a uma ponderação inadequada dos interesses em presença

139    No âmbito do quinto fundamento, as recorrentes alegam que, de qualquer forma, uma ponderação adequada dos interesses que tivesse em conta o regime de divulgação instituído pelo Regulamento n.o 726/2004, o Acordo ADPIC, os direitos fundamentais das recorrentes e o princípio da proporcionalidade teria levado a um resultado que, manifestamente, lhes teria sido favorável. Salientam que o EPAR já tinha facultado ao público o acesso às informações apropriadas e que a partilha dos dados que constam dos relatórios de estudos do lote 1, motivada por razões de saúde pública, poderia ter sido feita de acordo com modalidades menos atentatórias dos direitos do titular da AIM (por exemplo, por meio de acesso restrito e condicionado). De resto, não foi expressado nenhum receio a propósito da inocuidade do Bravecto que justificasse um exame particular.

140    A EMA lembra ter salientado que os documentos não podem ser qualificados de informações comerciais confidenciais e que, portanto, não podia ponderar um interesse público superior que justificasse a divulgação e a não comunicação dos documentos.

141    O quinto fundamento das recorrentes assenta uma vez mais no postulado de que os relatórios de estudos do lote 1 ou uma parte deles são confidenciais. Ora, resulta da análise dos fundamentos anteriores que a EMA não cometeu um erro ao concluir pela falta de informações confidenciais na aceção do artigo 4.o, n.os 2 e 3, do Regulamento n.o 1049/2001 e que, portanto, não tinha de ponderar o interesse particular na confidencialidade com o interesse público superior que justificasse a divulgação.

142    A análise dos quatro primeiros fundamentos revelou igualmente que esse critério da EMA estava em conformidade com o Acordo ADPIC, com os direitos fundamentais das recorrentes ao respeito da vida privada, bem como com a proteção dos seus dados de caráter profissional e do direito de propriedade e com o princípio da proporcionalidade.

143    Daí resulta que não se pode acusar a EMA de qualquer ponderação inadequada dos interesses.

144    Por conseguinte e de qualquer forma, há que julgar improcedente o quinto fundamento.

145    Resulta do exposto que deve ser negado provimento ao recurso.

 Quanto às despesas

146    Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. No caso, tendo as recorrentes sido vencidas no processo principal, há que condená‑las nas despesas da EMA, em conformidade com o pedido desta, incluindo as do processo de medidas provisórias.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Segunda Secção)

decide:

1)      Negase provimento ao recurso.

2)      A MSD Animal Health Innovation GmbH e a Intervet international BV suportarão, além das respetivas despesas, as despesas da Agência Europeia de Medicamentos (EMA), incluindo as do processo de medidas provisórias.

Prek

Buttigieg

Berke

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 5 de fevereiro de 2018.

Assinaturas


Índice


Factos na origem do litígio

Tramitação do processo e pedidos das partes

Questão de direito

Quanto ao primeiro fundamento, relativo à proteção dos relatórios de estudos do lote 1 pelo artigo 4. o, n.os 2 ou 3, do Regulamento n.o 1049/2001, por força de uma presunção geral de confidencialidade

Quanto ao segundo fundamento, relativo à proteção, pelo artigo 4. o, n.o 2, do Regulamento n.o 1049/2001, dos relatórios de estudos do lote 1, enquanto informações confidenciais no plano comercial

Quanto ao terceiro fundamento, relativo à proteção, pelo artigo 4. o, n.o 3, do Regulamento n.o 1049/2001, dos relatórios de estudos do lote 1 contra as violações do processo decisório

Quanto ao quarto fundamento, relativo à falta de ponderação dos interesses

Quanto ao quinto fundamento, relativo a uma ponderação inadequada dos interesses em presença

Quanto às despesas


*      Língua do processo: inglês.