Language of document : ECLI:EU:T:2016:739

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção)

15 de dezembro de 2016 (*)

«União aduaneira — Importação de produtos derivados do atum provenientes do Equador — Cobrança a posteriori de direitos de importação — Pedido de não cobrança dos direitos de importação — Artigo 220.o, n.o 2, alínea b), e artigo 236.o do Regulamento (CEE) n.o 2913/92 — Aviso aos importadores publicado no Jornal Oficial — Boa‑fé — Pedido de dispensa do pagamento dos direitos de importação — Artigo 239.o do Regulamento (CEE) n.o 2913/92»

No processo T‑548/14,

Reino de Espanha, representado inicialmente por A. Rubio González e, em seguida, por V. Ester Casas, abogado del Estado,

recorrente,

contra

Comissão Europeia, representada por P. Arenas, A. Caeiros, e B.‑R. Killmann, na qualidade de agentes,

recorrida,

que tem por objeto um pedido baseado no artigo 263.o TFUE, destinado a obter a anulação do artigo 2.o da Decisão C (2014) 3007 final da Comissão, de 15 de maio de 2014, que declara que, num determinado caso, a dispensa do pagamento dos direitos de importação é justificada para um certo montante, mas não para outro (REM 03/2013),

O TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção),

composto, durante as deliberações, por A. Dittrich, presidente, J. Schwarcz (relator) e V. Tomljenović, juízes,

secretário: J. Palacio González, administrador,

vista a fase escrita do processo e após a audiência de 6 de abril de 2016,

profere o presente

Acórdão

 Factos na origem do litígio

1        Entre 30 de junho de 2009 e 24 de setembro de 2010, a ACTEMSA SA (a seguir «devedor»), empresa com sede em Espanha, importou para a União Europeia produtos resultantes da transformação do atum, nomeadamente, conservas de atum e lombos de atum congelados, declarados como sendo originários do Equador (a seguir «importações controvertidas»).

2        O devedor requereu às autoridades aduaneiras espanholas a aplicação do sistema de preferências pautais generalizadas (a seguir «SPG») para as importações controvertidas, apresentando em apoio das suas declarações aduaneiras os certificados de origem «formulário A», emitidos pelas autoridades equatorianas com base num formulário depositado pelo exportador, que declarava que a origem dos produtos era efetivamente o Equador e que os requisitos para a obtenção dos certificados de origem estavam preenchidos.

3        Com base nos certificados de origem apresentados pelo devedor, as autoridades aduaneiras espanholas concederam o benefício do tratamento pautal preferencial às importações controvertidas.

4        Durante o período das importações controvertidas, recordado no n.o 1, supra, nomeadamente, em 21 de maio de 2010, a Comissão Europeia publicou um aviso aos importadores sob a epígrafe «Importações para a [União] de atum proveniente da Colômbia e de El Salvador» (JO 2010, C 132, p. 15, a seguir «aviso»), cujas passagens pertinentes para efeitos do presente processo, para delimitar o alcance do aviso e determinar se diz respeito às importações controvertidas são as seguintes:

«A Comissão […] informa os operadores da União […] de que existem dúvidas fundamentadas quanto à correta aplicação do tratamento preferencial e à aplicabilidade da prova de origem apresentada na União […] relativamente às conservas de atum e aos lombos de atum congelados da subposição SH 1604 14 importados da Colômbia e de Salvador.

Na sequência da realização de vários inquéritos apurou‑se que quantidades significativas de conservas de atum e lombos de atum congelados da subposição SH 1604 14 são declaradas como originárias da Colômbia ou de Salvador, mas não são elegíveis para beneficiar do tratamento preferencial.

Além disso, não é de excluir que as remessas sejam importadas de outros países que beneficiam do [SPG] sem cumprir as disposições das regras de origem do SPG no que respeita à cumulação da origem.»

5        De 14 a 30 de setembro de 2010, uma missão conjunta composta pelos representantes do Organismo Europeu de Luta Antifraude (OLAF) e de alguns Estados‑Membros deslocou‑se ao Equador para determinar a origem das matérias‑primas utilizadas no fabrico de produtos resultantes da transformação do atum provenientes deste país e exportados para a União com certificados de origem «formulário A» emitidos nestes país para beneficiar do tratamento pautal preferencial.

6        O relatório final do OLAF concluiu que as autoridades equatorianas emitiram erradamente certificados de origem «formulário A» para produtos à base de atum transformados no Equador a partir de matérias‑primas capturadas por navios de pesca salvadorenhos e panamenses, sem terem sido cumpridas as regras que permitem considerar que as mercadorias eram originárias do Equador.

7        O OLAF observou, no que respeita ao peixe cru capturado por navios salvadorenhos, que as autoridades deste país não tinham demonstrado a origem do peixe em conformidade com os artigos 72.o‑A e 80.o do Regulamento (CEE) n.o 2454/93 da Comissão, de 2 de julho de 1993, que fixa determinadas disposições de aplicação do Regulamento (CEE) n.o 2913/92 do Conselho que estabelece o Código Aduaneiro Comunitário (JO 1993, L 253, p. 1), e, no que respeita ao peixe cru capturado por barcos panamenses, que os certificados de origem «formulário A» tinham sido emitidos pelas autoridades panamenses, mas que a regra sobre o valor acrescentado prevista no artigo 70.o do Regulamento n.o 2454/93 não tinha sido observada.

8        Na medida em que as importações controvertidas não podiam beneficiar do tratamento pautal preferencial, as autoridades espanholas iniciaram, em 2012, um procedimento de cobrança a posteriori dos direitos de importação e aplicaram às operações em causa a pauta aduaneira comum de 24%, pelo que o montante dos direitos aduaneiros reclamados ascendia a 2 094 850,62 euros.

9        Através de várias cartas, a última das quais de 7 de fevereiro de 2013, o devedor solicitou às autoridades espanholas a dispensa do pagamento dos direitos de importação nos termos do artigo 236.o, conjugado com o artigo 220.o, n.o 2, alínea b), do Regulamento (CEE) n.o 2913/92 do Conselho, de 12 de outubro de 1992, que estabelece o Código Aduaneiro Comunitário (JO 1992, L 302, p. 1, a seguir «CAC») ou, a título subsidiário, nos termos do artigo 239.o do CAC.

10      Por carta de 18 de abril de 2013, as autoridades espanholas requereram à Comissão que determinasse se se justificava proceder a uma dispensa do pagamento dos direitos de importação nos termos do artigo 236.o, conjugado com o artigo 220.o, n.o 2, alínea b), do CAC e com os artigos 869.o e 871.o do Regulamento n.o 2454/93 ou, a título subsidiário, nos termos do artigo 239.o do CAC e do artigo 905.o do Regulamento n.o 2454/93.

11      Por cartas de 8 de maio e de 17 de setembro de 2013, a Comissão requereu informações complementares que as autoridades espanholas forneceram por cartas de 28 de maio e de 21 de outubro de 2013. O devedor tomou conhecimento de cada um destes dois pedidos de informações e de formulou observações relativas à resposta que as autoridades espanholas previam enviar.

12      Por carta de 12 de fevereiro de 2014, a Comissão convidou o devedor, em conformidade com os artigos 873.o e 906.o‑A do Regulamento n.o 2454/93, a formular as suas observações sobre qualquer questão de direito ou de facto suscetível, em seu entender, de conduzir ao indeferimento do seu pedido. O devedor respondeu por carta de 5 de março de 2014, na qual afirmou que não lhe cabia assumir a responsabilidade por um erro das autoridades equatorianas. Salientou igualmente a sua boa‑fé e a sua discordância com as constatações da Comissão relativas à sua falta de diligência no que respeita às importações realizadas depois de 21 de maio de 2010.

13      Em 8 de maio de 2014, em conformidade com os artigos 873.o e 907.o do Regulamento n.o 2454/93, um grupo de especialistas composto por representantes dos Estados‑Membros reuniu‑se para apreciar o processo.

14      Através da Decisão C (2014) 3007 final, de 15 de maio de 2014, a Comissão considerou que, num determinado caso, a dispensa do pagamento dos direitos de importação era justificada para um certo montante, mas não para outro (REM 03/2013) (a seguir «decisão recorrida»).

15      No âmbito da apreciação do pedido fundamentado no artigo 236.o, conjugado com o artigo 220.o, n.o 2, alínea b), do CAC, a Comissão constatou, no considerando 26 da decisão recorrida, que, por um lado, as autoridades aduaneiras equatorianas tinham aplicado de forma incorreta as regras relativas à emissão dos certificados de origem «formulário A» e que, por outro, o facto de a sociedade exportadora ter prestado declarações inexatas no pedido de certificados era insuficiente para excluir a existência de um erro imputável às autoridades equatorianas. Por conseguinte, a Comissão considerou que devia verificar se o erro podia ser razoavelmente detetado pelo devedor, tendo em conta as circunstâncias do caso em apreço, a natureza do erro, a experiência profissional e a diligência do devedor.

16      Quanto à natureza do erro, a Comissão declarou, no considerando 28 da decisão recorrida, que a repetição do erro, resultante da emissão de certificados de origem «formulário A» pelas autoridades equatorianas durante um longo período, militava a favor da boa‑fé do devedor e que, no que respeita às importações realizadas antes de 21 de maio de 2010, não era possível determinar se o devedor podia ter detetado o erro assim cometido.

17      No considerando 29 da decisão recorrida, a Comissão declarou que o devedor era profissionalmente muito experiente, sendo ativo no setor da importação e da exportação de produtos da pesca provenientes da América Latina, de África e de países da Ásia de Leste.

18      Quanto à diligência do devedor, a Comissão distinguiu, nos considerandos 30 a 36 da decisão recorrida, as importações realizadas pelo devedor antes de 21 de maio de 2010, data em que tinha publicado o aviso, das importações realizadas depois desta data. Referindo‑se ao facto de o aviso indicar que «não é de excluir que as remessas sejam importadas de outros países que beneficiam do [SPG] sem cumprir as disposições das regras de origem do SPG no que respeita à cumulação da origem», considerou que o devedor, após 21 de maio de 2010, deveria ter adotado todas as precauções necessárias para controlar as provas de origem a fim de garantir a aplicação correta das regras relativas ao tratamento preferencial e, mais particularmente, das regras sobre a acumulação regional. Por conseguinte, desde a publicação do aviso, já não era possível considerar que o devedor estava de boa‑fé. Em contrapartida, no que respeita às importações realizadas antes da publicação do aviso, nada permitia duvidar da boa‑fé do devedor nem da sua diligência.

19      Em seguida, a Comissão examinou, nos considerandos 39 a 48 da decisão recorrida, os requisitos previstos pelo artigo 239.o do CAC para a concessão de uma dispensa do pagamento dos direitos às importações posteriores a 21 de maio de 2010. Quanto ao primeiro requisito, a Comissão considerou que o devedor não se encontrava numa situação especial em relação à de outros operadores que exerciam a mesma atividade económica, após ter recordado que a confiança na validade de certificados de origem, que se revelavam inválidos, não significava que existia uma situação especial. A Comissão também precisou que o segundo requisito relativo à diligência expectável por parte de um importador experiente também não estava preenchido e remeteu para as considerações referentes à diligência do devedor apreciada para efeitos da aplicação do artigo 220.o do CAC.

20      Por conseguinte, na decisão recorrida, a Comissão concluiu o seguinte:

«Artigo 1.o

Procede‑se à dispensa do pagamento dos direitos de importação de um montante de 999 863,58 euros, requerida pelo Reino de Espanha em 18 de abril de 2013, relativamente às importações efetuadas entre 1 de janeiro de 2009 e 20 de maio de 2010.

Artigo 2.o

Não se procede à dispensa do pagamento dos direitos de importação de um montante de 1 094 987,04 euros, requerida pelo Reino de Espanha em 18 de abril de 2013, relativamente às importações efetuadas entre 21 de maio de 2010 e 24 de setembro de 2010.»

 Tramitação processual e pedidos das partes

21      Por petição entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 24 de julho de 2014, o Reino de Espanha interpôs o presente recurso. A Comissão apresentou a sua contestação em 7 de outubro de 2014. Em 22 de dezembro de 2014, o Reino de Espanha apresentou a réplica e, em 17 de fevereiro de 2015, a Comissão a tréplica.

22      Mediante proposta do juiz‑relator, o Tribunal Geral (Quinta Secção) decidiu iniciar a fase oral do processo.

23      Os argumentos e as respostas das partes às questões do Tribunal Geral foram ouvidos na audiência de 6 de abril de 2016.

24      O Reino de Espanha conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        anular o artigo 2.o da decisão recorrida;

–        condenar a Comissão nas despesas.

25      A Comissão conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        negar provimento ao recurso na totalidade;

–        condenar o Reino de Espanha nas despesas.

 Questão de direito

26      O Reino de Espanha apresenta três fundamentos de recurso. O primeiro é relativo à violação do artigo 220.o, n.o 2, alínea b), quinto parágrafo, do CAC, o segundo diz respeito à violação do artigo 239.o do CAC e o terceiro, invocado a título subsidiário, é relativo à violação do artigo 220.o, n.o 2, alínea b), quinto parágrafo, do CAC no que respeita à regra da acumulação regional prevista pelo Regulamento n.o 2454/93.

 Quanto ao primeiro fundamento, relativo à violação do artigo 220.o, n.o 2, alínea b), quinto parágrafo, do CAC

27      A título preliminar, importa recordar que o artigo 220.o, n.o 2, alínea b), do CAC faz depender a não cobrança a posteriori, pelas autoridades nacionais, de três requisitos cumulativos (v., por analogia, acórdão de 14 de novembro de 2002, Ilumitrónica, C‑251/00, EU:C:2002:655, n.o 37 e jurisprudência referida).

28      Assim, antes de mais, é necessário que os direitos não tenham sido cobrados devido a erro das próprias autoridades competentes. Em segundo lugar, o erro cometido por estas autoridades deve ser tal que não podia ser razoavelmente detetado pelo devedor de boa‑fé, apesar da sua experiência profissional e da diligência por ele demonstrada. Finalmente, o devedor deve ter observado todas as disposições previstas pela regulamentação em vigor no que respeita à declaração aduaneira (v., por analogia, acórdão de 14 de novembro de 2002, Ilumitrónica, C‑251/00, EU:C:2002:655, n.o 38 e jurisprudência referida).

29      O respeito destes requisitos é apreciado à luz do objetivo do artigo 220.o, n.o 2, alínea b), do CAC, que consiste na proteção da confiança legítima do devedor quanto ao caráter fundado de todos os elementos que concorrem para a decisão de cobrar ou não os direitos aduaneiros (v., por analogia, acórdão de 14 de novembro de 2002, Ilumitrónica, C‑251/00, EU:C:2002:655, n.o 39 e jurisprudência referida).

30      Todavia, nos termos do artigo 220.o, n.o 2, alínea b), quinto parágrafo, do CAC, o devedor não pode invocar a sua boa‑fé quando a Comissão tenha publicado no Jornal Oficial da União Europeia um aviso aos importadores que assinale dúvidas fundamentadas sobre a boa aplicação do regime preferencial pelo país terceiro beneficiário (v., neste sentido, despacho de 1 de outubro de 2009, Agrar‑Invest‑Tatschl/Comissão, C‑552/08 P, EU:C:2009:605, n.os 56 e 57), não estando prevista a possibilidade de o devedor demonstrar a sua boa‑fé tomando medidas suplementares para assegurar a autenticidade e a exatidão dos certificados com finalidade preferencial (acórdão de 8 de outubro de 2008, Agrar‑Invest‑Tatschl/Comissão, T‑51/07, EU:T:2008:420, n.o 42).

31      O primeiro fundamento do recurso deve ser apreciado à luz destas considerações.

32      A título principal, o Reino de Espanha alega, em substância, que a Comissão, quando decide afastar‑se da posição adotada pelas autoridades nacionais, deve provar, com base em elementos de facto pertinentes, a existência de um comportamento manifestamente negligente por parte do operador. A Comissão limitou‑se a fazer referência à obrigação, que consta do aviso, de os importadores adotarem todas as precauções necessárias para controlar as provas de origem, sem demonstrar de que modo é que o devedor não cumpriu a sua obrigação de diligência ou de boa‑fé. Ora, segundo o Reino de Espanha, a publicação do aviso não impedia o devedor de invocar a sua boa‑fé, uma vez que este aviso apenas era relativo às importações originárias da Colômbia e de El Salvador e os seus efeitos não podem estender‑se a outros países que fazem parte do grupo regional II, tal como o Equador, aos quais é aplicável a regra de acumulação regional (v., igualmente, n.o 48, infra).

33      A Comissão considera que a argumentação do Reino de Espanha deve ser rejeitada. No essencial, recorda previamente que, em princípio, quando uma mercadoria que eventualmente beneficiou do tratamento pautal preferencial não tem a origem invocada, ou quando a sua origem não pode ser verificada, as autoridades competentes devem efetuar o registo de liquidação a posteriori os direitos de importação.

34      Segundo a Comissão, o primeiro requisito previsto pelo artigo 220.o, n.o 2, alínea b), do CAC para que não haja cobrança a posteriori está preenchido na medida em que as autoridades equatorianas cometeram um erro ao emitirem certificados de origem «formulário A» não obstante o desrespeito das regras sobre a acumulação regional.

35      Embora os dois outros requisitos previstos por este artigo estivessem preenchidos antes de 21 de maio de 2010, posteriormente deixaram de o estar. A partir desta data, o devedor já não podia, nos termos do artigo 220.o, n.o 2, alínea b), quinto parágrafo, do CAC, invocar a sua boa‑fé, na medida em que o aviso era igualmente aplicável ao Equador e em que não fez prova de diligência para garantir o respeito dos requisitos relativos ao tratamento pautal preferencial.

36      A Comissão considera que a jurisprudência da União não decidiu a questão de saber se o artigo 220.o, n.o 2, alínea b), quinto parágrafo, do CAC estabelece uma presunção inilidível. A Comissão considera que, em certas circunstâncias excecionais, um operador pode invocar a sua boa‑fé após ter demonstrado que tinham sido efetuadas verificações adicionais na sequência da publicação de um aviso aos importadores.

37      Além disso, a Comissão considera que, em caso de publicação de um aviso aos importadores, o ónus da prova da boa‑fé e da diligência incumbe ao devedor. No caso em apreço, o Reino de Espanha não apresentou qualquer prova das medidas adicionais adotadas pelo devedor para garantir a origem das mercadorias após a publicação do aviso.

38      A Comissão afirma que o aviso menciona a Colômbia e El Salvador e, em relação aos outros nove países do grupo regional II, a eventualidade de irregularidades nos produtos abrangidos pela mesma subposição pautal que as importações controvertidas. Assim, em seu entender, o aviso faz referência a estes outros nove países, sem os nomear expressamente. Um operador experiente deduziria do aviso que existiam riscos para todos os países do grupo regional II no que respeita à acumulação regional. A Comissão também recorda que pode referir‑se legitimamente e de forma geral a vários países num aviso aos importadores, tal como fez em duas ocasiões anteriores.

39      O aviso chama a atenção dos importadores para a necessidade de adotarem precauções relativamente às importações de qualquer país do grupo II. Com efeito, as matérias‑primas provenientes da Colômbia ou de El Salvador poderiam ser exportadas para outro país do grupo II para serem utilizadas na elaboração de produtos resultantes da transformação do atum com vista à sua exportação para a União. Por aplicação do princípio da acumulação regional, estes produtos poderiam ser considerados como sendo originários de Equador, sem que a origem da matéria‑prima seja conhecida pelo importador na União.

40      Além disso, a Comissão alega que não resulta da redação do artigo 220.o, n.o 2, alínea b), do CAC, nem da sua Comunicação de 5 de dezembro de 2000, que precisa as condições de informação dos operadores económicos e das administrações dos Estados‑Membros sobre os regimes pautais preferenciais em caso de «dúvida fundamentada» quanto à origem dos produtos (JO 2000, C 348, p. 4) ou da sua Comunicação de 30 de outubro de 2012, que precisa as condições de informação dos operadores económicos e das administrações dos Estados‑Membros sobre os regimes pautais preferenciais em caso de «dúvida razoável» quanto à origem das mercadorias (JO 2012, C 332, p. 1), às quais se refere o Reino de Espanha no Tribunal Geral, que as dúvidas fundamentadas devam ser expressas em relação aos países ou aos produtos abrangidos pelo âmbito de aplicação deste aviso, uma vez que estas dúvidas, formuladas a respeito de certos países, implicam igualmente a existência de irregularidades que afetam outros países do mesmo grupo regional.

41      Quanto ao período posterior à publicação do aviso, a Comissão considera que o devedor deveria ter tomado medidas para garantir a origem das mercadorias. Em seu entender, o aviso instava ao redobramento da precaução no que respeita às importações provenientes de qualquer país do grupo regional II, uma vez que um produto supostamente originário do Equador podia incluir a matéria‑prima proveniente da Colômbia ou de El Salvador potencialmente irregular. Tendo em conta o número bastante limitado de avisos aos importadores publicados pela Comissão, um devedor que importa produtos de um país que pertence ao mesmo grupo regional que o país objeto do aviso sem tomar este último em consideração não pode ser qualificado de diligente. Em todo caso, o devedor não adotou as precauções necessárias para garantir um controlo adequado das provas de origem para a aplicação do tratamento pautal preferencial.

42      Na tréplica, a Comissão alega que, embora o relatório final do OLAF preveja a possibilidade de revogação ou de alteração do aviso caso El Salvador modifique o seu comportamento, isto só afeta este país, enquanto o aviso continua a vigorar para os outros países do grupo regional II. Segundo a Comissão, os avisos aos importadores que cita não carecem de falta de segurança jurídica e não constituem uma exceção ao regime geral. No que respeita à diligência do operador, a Comissão acrescenta que, uma vez que o aviso manifestava dúvidas quanto à correta aplicação das disposições relativas à acumulação regional, incumbia ao devedor, segundo a jurisprudência, informar‑se e procurar todos os esclarecimentos possíveis para não violar as disposições referidas, o que não fez.

43      Por último, a Comissão considera que, mesmo que lhe incumbisse provar a falta de diligência do devedor, satisfez tal ónus ao explicar o conteúdo do aviso, ao assinalar a grande experiência do devedor na importação dos produtos em causa, de modo que este deveria ter tido dúvidas sobre a correta aplicação das regras de origem, e ao sublinhar a falta de precauções adicionais adotadas pelo devedor após a publicação do aviso.

44      Segundo jurisprudência constante, os princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança devem ser respeitados, nomeadamente, pelas instituições da União Europeia (v. acórdão de 9 de julho de 2015, Salomie e Oltean, C‑183/14, EU:C:2015:454, n.o 30 e jurisprudência referida). Daqui resulta que a legislação da União deve ser precisa e a sua aplicação previsível para os particulares, impondo‑se tal imperativo de segurança jurídica com especial rigor quando se trate de legislação que pode ter consequências financeiras, a fim de permitir aos interessados conhecerem com exatidão o âmbito das obrigações que essa legislação lhes impõe (acórdãos de 15 de dezembro de 1987, Irlanda/Comissão, 325/85, EU:C:1987:546, n.o 18, e de 9 de julho de 2015, Salomie e Oltean, C‑183/14, EU:C:2015:454, n.o 31).

45      Por outro lado, foi declarado que a exclusão absoluta da boa‑fé em caso de publicação de um aviso aos importadores assegurava um nível de segurança jurídico bastante elevado (acórdão de 8 de outubro de 2008, Agrar‑Invest‑Tatschl/Comissão, T‑51/07, EU:T:2008:420, n.o 43).

46      Com efeito, resulta do próprio teor do artigo 220.o, n.o 2, alínea b), do CAC que a publicação no Jornal Oficial da União Europeia de um aviso aos importadores que assinale dúvidas fundamentadas sobre a boa aplicação do regime preferencial pelo país terceiro beneficiário proíbe que os importadores, a partir da publicação, invoquem a sua boa‑fé, assegurando assim um nível de segurança jurídico bastante elevado e levando as autoridades nacionais ou a Comissão a indeferir o pedido de não cobrança dos direitos de importação.

47      No caso em apreço, o artigo 2.o da decisão recorrida indefere o pedido de não cobrança dos direitos de importação a partir de 21 de maio de 2010, data da publicação do aviso.

48      Uma vez que o Reino de Espanha contesta a aplicação do aviso às importações controvertidas, provenientes do Equador e não da Colômbia e de El Salvador, países a que o aviso se refere, há que determinar o alcance do aviso antes de responder, eventualmente, aos argumentos segundo os quais o devedor agiu de boa‑fé. A este respeito, a título preliminar e tendo em conta os argumentos da Comissão apresentados no Tribunal Geral, importa assinalar que, em conformidade com o artigo 72.o, n.o 3, alínea b), do Regulamento n.o 2454/93, para efeitos da aplicação da acumulação regional, o grupo regional II é composto pelos seguintes países: Bolívia, Colômbia, Costa Rica, Equador, El Salvador, Guatemala, Honduras, Nicarágua, Panamá, Peru e Venezuela.

49      Em primeiro lugar, importa observar que o aviso se dirige aos operadores económicos que importam para a União produtos à base de atum, ou seja, a profissionais, alguns dos quais podem ser experientes ou muito experientes.

50      Em segundo lugar, há que constatar que o aviso não faz nenhuma menção ao Equador, nem no seu título nem mesmo na sua redação. Em contrapartida, resulta claramente do primeiro parágrafo do aviso que este faz referência às importações de produtos à base de atum na União declaradas como sendo originárias da Colômbia ou de El Salvador.

51      Em terceiro lugar, o aviso refere, sem mais precisões, «dúvidas fundamentadas» relativamente à boa aplicação do regime preferencial e à aplicabilidade das provas de origem apresentadas na União, tendo sido apurado em diversos inquéritos que quantidades significativas de produtos à base de atum eram declaradas como sendo originárias da Colômbia ou de El Salvador e que não beneficiavam do regime preferencial.

52      Em quarto lugar, o aviso não exclui a hipótese de as importações serem provenientes de outros países que beneficiam do SPG e de não responderem às regras de origem do SPG relativas à cumulação da origem. Há que observar, a este respeito, que não é fornecida qualquer especificação adicional explícita quanto ao SPG visado.

53      Há que constatar que estes dois últimos elementos não são claros, mesmo tendo em conta que se trata de uma leitura por um profissional experiente ou bastante experiente. Com efeito, não permitem compreender, por um lado, o motivo pelo qual as importações declaradas como sendo provenientes da Colômbia e de El Salvador não beneficiam do regime preferencial e, por outro, se a expressão relativa às importações provenientes de outros países visa os produtos declarados como tais no momento da sua importação para a União ou os produtos declarados como sendo originários da Colômbia ou de El Salvador mas que, na realidade, são provenientes doutros países que beneficiam do SPG. Por último, como afirmou corretamente o Reino de Espanha, é possível questionar se, pela menção do SPG, o aviso refere‑se a todos os países que beneficiam de tal regime ou apenas aos que fazem parte do mesmo grupo regional que a Colômbia e El Salvador, ou seja, o grupo regional II.

54      Para determinar com precisão o sentido e o alcance do aviso, há que verificar as outras versões linguísticas, as quais podem eventualmente revelar de forma mais clara o conteúdo da informação fornecida aos importadores. Todavia, o simples facto de ser necessário comparar as diferentes versões linguísticas de um aviso aos importadores para compreender corretamente o seu alcance já constitui um indício negativo quanto à clareza e à precisão do referido aviso. Com efeito, em princípio, cada uma das versões linguísticas deveria, por si só, permitir que os operadores afetados estivessem suficientemente informados sobre os aspetos relevantes e sobre os riscos referidos pela Comissão, na medida em que não é possível exigir a estes mesmos operadores que procedam, de forma generalizada, a uma exegese comparativa do sentido de um aviso tendo em conta as suas diferentes versões linguísticas.

55      No caso em apreço, em relação ao segundo parágrafo do aviso, cujo sentido e o alcance não resultam de forma evidente da leitura da versão francesa (v. n.o 53, supra), a versão espanhola, particularmente relevante no caso em apreço, devido aos operadores e aos países em causa, tem a seguinte redação: «Diversas investigaciones han permitido constatar que cantidades importantes de atún en conserva y de lomos de atún congelados de la subpartida 1604 14 del SA se declaran como originarias de Colombia o El Salvador, sin cumplir las condiciones para ello». Daqui decorre que as importações declaradas originárias de Colômbia ou de El Salvador não cumprem os requisitos para serem declaradas como sendo originárias de um destes dois países. A versão inglesa faz a mesma referência: «From various investigations, it results that significant quantities of canned tuna and frozen tuna loins of HS subheading 1604 14 are declared as having origin of Colombia or El Salvador, for which they are not eligible».

56      Resulta destas versões linguísticas do aviso que não era possível validamente reconhecer tal origem às importações de produtos à base de atum declaradas como sendo originárias da Colômbia ou de El Salvador, o que em certa medida explica a recusa do benefício do regime preferencial, mencionado na versão francesa de forma insuficiente para compreender corretamente o alcance do aviso. Todavia, há que constatar que as outras versões linguísticas referidas nada acrescentam quanto aos fundamentos exatos da dita recusa. Com efeito, não é indicado o motivo preciso pelo qual não podia validamente reconhecer‑se tal origem às importações em causa.

57      Por conseguinte, dos dois primeiros parágrafos do aviso só se deve deduzir que, devido às dúvidas fundamentadas sobre a aplicabilidade das provas de origem apresentadas na União, as importações de produtos à base de atum declaradas como sendo originárias da Colômbia ou de El Salvador foram consideradas inelegíveis para o regime preferencial, com o fundamento de que estas provas não demonstravam que, em aplicação do SPG, era possível reconhecer tal origem aos produtos em causa.

58      Por outras palavras, o aviso informa os importadores de que não é possível considerar que os produtos declarados como sendo originários da Colômbia ou de El Salvador têm tal origem, independentemente de esta ter sido deduzida do facto de que estes produtos tinham sido pescados e transformados nestes países ou do facto de que tinham sido considerados como sendo originários destes dois países após terem sido pescados ou transformados noutro país que beneficia do SPG. Conforme já foi constatado, o aviso refere o regime preferencial SPG sem outras precisões, nomeadamente quanto ao grupo de países visados.

59      Ora, embora seja certamente possível deduzir de uma das leituras possíveis do aviso que esta referência visa remeter, em substância, para o grupo regional II, do qual fazem parte os dois países em questão, nomeadamente com base na menção da «cumulação da origem», não deixa de ser verdade que, devido à redação imprecisa do aviso, também não é possível excluir que alguns operadores, mesmo que bastante experientes, possam interpretar o aviso no sentido de que se refere a todas as importações provenientes de qualquer país beneficiário de um SPG que, no entanto, não cumprem os critérios exigidos das regras de origem deste SPG relativas à cumulação da origem, e que foram declaradas como provenientes da Colômbia e de El Salvador. Esta interpretação continua a ser possível uma vez que, por um lado, o aviso apenas refere que as importações em causa «[não cumprem] as disposições das regras de origem do SPG no que respeita à cumulação da origem», sem outras explicações e que, por outro, importa ter em conta o facto de que o terceiro parágrafo do aviso deve necessariamente ser lido à luz dos seus dois primeiros parágrafos, que indiciam que os problemas estão relacionados com as importações designadas como sendo originárias da Colômbia e de El Salvador.

60      A este respeito, tendo em conta a especial importância de um aviso aos importadores, em conformidade com o que foi constatado nos n.os 44 e 45, supra, este deve ser particularmente claro, nomeadamente no que respeita à questão de saber quais são os países visados. É tanto mais assim que resulta diretamente da redação do artigo 220.o, n.o 2, alínea b), quinto parágrafo, do CAC que tal aviso deve assinalar dúvidas fundamentadas sobre a boa aplicação do regime preferencial «pelo país beneficiário». Assim, a disposição em causa não remete para um «grupo de países» nem para vários países que os operadores deveriam determinar por dedução, com base em afirmações gerais da Comissão relativas a uma eventual presença de outros riscos não especificados. Além disso, há que constatar que a Comissão podia, sem grandes inconvenientes, precisar o alcance do aviso, país por país, tanto mais que, como admite, no passado, apenas publicou um número bastante limitado de avisos aos importadores (v. n.o 41, supra), o que constitui um facto do qual resulta que não é possível tomar em consideração qualquer necessidade de simplificação administrativa que a obrigaria, por razões de rapidez, a proceder a uma designação por grupo de países.

61      Nestas circunstâncias, no que respeita ao terceiro parágrafo do aviso, há que constatar, em particular, que o seu significado não é suficientemente claro para compreender o alcance exato do aviso, quer seja na sua versão francesa, redigida de forma muito geral, ou em algumas das outras versões linguísticas relevantes.

62      A versão espanhola tem a seguinte redação: «Por otro lado, no se puede excluir que haya importaciones procedentes de otros países que se acojan al sistema de preferencias generalizadas (SPG) sin cumplir los requisitos fijados en las normas de origen del SPG relativas a la acumulación de origen». Isto significa que não é possível excluir que haja importações provenientes de outros países que beneficiam do SPG sem cumprirem os requisitos fixados nas regras de origem relativas à acumulação da origem. Ora, mesmo esta formulação continua particularmente ampla e pouco precisa quanto aos países concretamente visados ou aos requisitos exatos que não estavam preenchidos, ou seja, quanto à base sobre a qual foi constatado que a acumulação da origem não podia ser concedida.

63      A versão inglesa não acrescenta precisões adicionais: «Moreover, it cannot be excluded that consignments are imported from other countries benefitting from the generalized system of preferences (GSP) without fulfilling requirements of GSP rules of origin concerning cumulation of origin». As importações em questão podem ser as declaradas como sendo originárias da Colômbia ou de El Salvador mas que, na realidade, são provenientes de outro país.

64      Assim, os três primeiros parágrafos do aviso, mesmo lidos em conjunto, não contêm indicações suficientes para definir com precisão o seu alcance.

65      Como já foi referido, resulta simplesmente dos dois primeiros parágrafos do aviso que, devido a dúvidas fundamentadas sobre a aplicabilidade das provas de origem apresentadas na União, as importações de produtos à base de atum declaradas como sendo originárias da Colômbia ou de El Salvador foram consideradas inelegíveis para o regime preferencial, uma vez que estas provas não demonstravam que, em aplicação do SPG, era possível reconhecer aos produtos em causa tal origem (v. n.o 57, supra). Por conseguinte, foi constatada uma violação das regras de origem relativamente às importações declaradas como provenientes de dois países do grupo regional II para efeitos da aplicação do SPG.

66      Além disso, o terceiro parágrafo do aviso refere que «não é de excluir» que as remessas sejam importadas de outros países que beneficiam do SPG, mas que não cumprem os requisitos exigidos quanto às regras de origem relativas à cumulação da origem, como indica, nomeadamente, a versão espanhola. Ora, por um lado, conforme já foi salientado, mesmo que o artigo 220.o, n.o 2, alínea b), quinto parágrafo, do CAC, faça precisamente referência ao «país beneficiário», o terceiro parágrafo do aviso não indica, expressamente, tal ou tais países. Por outro, contrariamente ao que afirma a Comissão, na falta de mais precisões quanto ao erro cometido, cuja consequência era a impossibilidade de cumprir os requisitos da acumulação da origem, não é possível, pelo menos com certeza suficiente, concluir que todos os operadores económicos compreenderiam que o aviso se referia unicamente aos países do grupo regional II, ou seja, aos países do mesmo grupo que a Colômbia e El Salvador.

67      De facto, a este respeito, importa ainda observar que incumbia à Comissão, se tivesse sido sua intenção, redigir o aviso de modo a limitar de forma precisa o grupo II do SPG para que os «países beneficiários» fossem identificados sem qualquer dúvida por todos os operadores interessados. Ora, esta referência não consta do aviso e não pode ser necessariamente deduzida, como foi indicado, da única referência feita à «acumulação regional». Nestas circunstâncias, não é possível excluir que um operador possa ler o aviso no sentido de que contém uma referência generalizada a todas as situações que podem ocorrer em qualquer regime de SPG e que visam todas as medidas para contornar as regras relativas à acumulação da origem.

68      Por conseguinte, há que considerar que, da leitura do aviso, mesmo um importador experiente não devia necessariamente compreender que as importações de produtos à base atum em questão provenientes de um dos países do mesmo grupo regional que a Colômbia e El Salvador, ou seja, o grupo regional II, eram as únicas afetadas pelas dúvidas manifestadas quanto às provas de origem. O caráter insuficientemente claro do aviso, que apenas continha uma indicação geral segundo a qual não era possível excluir irregularidades noutros países, não permitia afastar as dúvidas quanto à dimensão da sua aplicação geográfica.

69      Por último, o facto de incumbir aos operadores efetuar uma análise meticulosa do aviso, tentando interpretá‑lo em todas as aceções eventualmente possíveis ou comparando as suas diferentes versões linguísticas, constitui um indício adicional de que a sua redação não pode ser considerada suficientemente precisa, para efeitos da aplicação dos princípios fixados pela jurisprudência recordada nos n.os 44 e 45, supra, ou seja, com o objetivo de assegurar a segurança jurídica e a proteção da confiança legítima dos operadores. Aliás, na audiência, a própria Comissão admitiu que teria sido mais preciso mencionar nominativamente os países visados pelo aviso. Nestas circunstâncias, embora o último parágrafo do aviso faça referência ao facto de que os operadores da União devem adotar «todas as precauções necessárias» relativamente aos «ditos produtos», não é possível concluir que estes conceitos podiam ser compreendidos, a partir do texto do aviso, no sentido de que também dizem respeito às importações controvertidas, provenientes do Equador.

70      Por conseguinte, a Comissão cometeu um erro de direito ao afirmar que o aviso diz respeito às importações controvertidas, originárias do Equador, país que faz parte do grupo regional II para efeitos do SPG, sendo irrelevante o facto de este país não ser mencionado no aviso. Por conseguinte, atendendo à análise que resulta dos n.os 49 a 69, supra, a Comissão também cometeu um erro de direito ao considerar que o devedor não podia, assim, invocar a sua boa‑fé.

71      As outras alegações da Comissão não podem invalidar esta conclusão. Com efeito, em primeiro lugar, a questão da sua prática noutros avisos aos importadores, que também não referem expressamente os países em causa, é indiferente, mesmo que se considere provada, na medida em que, por um lado, os requisitos fixados pela própria redação do artigo 220.o, n.o 2, alínea b), quinto parágrafo, do CAC são claros e, por outro, a questão de saber se um aviso específico aos importadores cumpre, ou não, os requisitos previstos pela legislação deve depender de uma apreciação ad hoc e não de uma análise à luz de uma suposta prática anterior da Comissão.

72      Em segundo lugar, na medida em que a Comissão se refere à finalidade dos avisos, que consiste, por um lado, em permitir aos Estados‑Membros proteger os interesses financeiros da União e, por outro, aos operadores proteger os seus interesses económicos, há que constatar que a imprecisão do aviso em causa não permitia alcançar os referidos objetivos. Se a Comissão considerava que era necessário atuar para que a finalidade do aviso, respeitante à Colômbia e a El Salvador, não fosse contornada, incumbia‑lhe redigir o aviso de maneira mais precisa quanto aos outros países visados, a fim de excluir qualquer eventual deslocação fraudulenta das trocas comerciais relativas à pesca dos produtos em causa.

73      Em terceiro lugar, quanto às múltiplas referências ao facto de os operadores em causa serem, no caso em apreço, profissionais bastante experientes e que atuam em diversas zonas geográficas do mundo, importa observar que não se trata de uma circunstância da qual deva deduzir‑se que recai sobre eles a responsabilidade de uma redação pouco clara, por parte da Comissão, de um aviso que deveria ter servido, precisamente, para os orientar no exercício das suas atividades.

74      Resulta do exposto que, em aplicação do aviso, a Comissão não podia afirmar, na decisão recorrida, que o devedor não podia invocar a sua boa‑fé no que respeita à aplicação do artigo 220.o, n.o 2, alínea b), do CAC para que não fossem cobrados os direitos de importação relativamente à situação posterior a 21 de maio de 2010.

75      Resulta tanto da decisão recorrida, nomeadamente dos considerandos 30 e seguintes, como das respostas às questões do Tribunal Geral que a Comissão forneceu na audiência, que foi com base na aplicação do artigo 220.o, n.o 2, alínea b), quinto parágrafo, e por considerar que o aviso dizia igualmente respeito às importações controvertidas provenientes do Equador, que a Comissão excluiu a boa‑fé do devedor, assim como a sua diligência. Há que acrescentar que, conforme decorre do considerando 28 da decisão recorrida e do seu artigo 1.o, a Comissão considerou que o devedor não podia detetar o erro antes da adoção do aviso. Por outro lado, entre as partes é pacífico que o devedor procedeu com a mesma diligência antes e depois do aviso de 21 de maio de 2010, mas a Comissão acusa‑o de não ter efetuado um controlo mais rigoroso após a publicação do aviso (v., neste sentido, considerando 33 da decisão recorrida).

76      Ora, na medida em que, como foi constatado, este aviso não pode ser interpretado no sentido de que visa igualmente, com suficiente precisão, as importações provenientes do Equador, não era possível exigir ao devedor que alterasse a sua abordagem na sequência da publicação do referido aviso. Uma abordagem diferente reduziria a segurança jurídica dos operadores económicos na medida em que seriam obrigados, em caso de dúvidas sobre o alcance de um aviso aos importadores, a aplicar sempre, por precaução, medidas de proteção adicionais, mesmo em relação às importações provenientes de países não claramente identificados como aqueles sobre os quais recaem as dúvidas da Comissão.

77      Por conseguinte, há que julgar procedente o primeiro fundamento do Reino de Espanha, e, assim, sem que seja necessário apreciar os seus outros fundamentos, anular o artigo 2.o da decisão recorrida, através do qual a Comissão decidiu não proceder à dispensa do pagamento dos direitos de importação no montante de 1 094 987,04 euros.

 Quanto às despesas

78      Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

79      Tendo a Comissão sido vencida, suportará as suas próprias despesas, assim como as despesas do Reino de Espanha, em conformidade com os pedidos deste.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção)

decide:

1)      O artigo 2.o da Decisão C (2014) 3007 final da Comissão, de 15 de maio de 2014, que declara que, num determinado caso, a dispensa do pagamento dos direitos de importação é justificada para um certo montante, mas não para outro (REM 03/2013), é anulado.

2)      A Comissão Europeia é condenada nas despesas.

Dittrich

Schwarcz

Tomljenović

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 15 de dezembro de 2016.

Assinaturas


* Língua do processo: espanhol.