Language of document : ECLI:EU:T:2023:606

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Décima Secção)

4 de outubro de 2023 (*)

«Medidas de salvaguarda — Mercado dos produtos siderúrgicos — Importação de certos produtos de aço — Regulamento de Execução (UE) 2021/1029 — Recurso de anulação — Interesse em agir — Legitimidade — Admissibilidade — Prorrogação de uma medida de salvaguarda — Necessidade — Ameaça de prejuízo grave — Medidas de ajustamento — Interesse da União — Erro manifesto de apreciação»

No processo T‑598/21,

European Association of NonIntegrated Metal Importers & distributors (Euranimi), com sede em Bruxelas (Bélgica), representada por M. Campa, D. Rovetta, P. Gjørtler e V. Villante, advogados,

recorrente,

contra

Comissão Europeia, representada por G. Luengo e P. Němečková, na qualidade de agentes,

recorrida,

O TRIBUNAL GERAL (Décima Secção),

composto por: O. Porchia, presidente, M. Jaeger (relator) e P. Nihoul, juízes,

secretário: M. Zwozdziak‑Carbonne, administradora,

vistos os autos, designadamente a Decisão de 3 de novembro de 2021 que indeferiu o pedido de tramitação acelerada apresentado pela recorrente,

após a audiência de 7 de março de 2023,

profere o presente

Acórdão

1        Com o seu recurso interposto ao abrigo do artigo 263.o TFUE, a recorrente, European Association of Non‑Integrated Metal Importers la distributors (Euranimi), pede a anulação do Regulamento de Execução (UE) 2021/1029 da Comissão, de 24 de junho de 2021, que altera o Regulamento de Execução (UE) 2019/159 da Comissão, no sentido de prorrogar a medida de salvaguarda sobre as importações de certos produtos de aço (JO 2021, L 225 I, p. 1; a seguir «regulamento impugnado»).

 Antecedentes do litígio

2        A recorrente é uma associação de empresas da União Europeia que representa os interesses de importadores, distribuidores, comerciantes e transformadores de aço não integrado, aço inoxidável e produtos metálicos.

3        Em 23 de março de 2018, os Estados Unidos da América instituíram direitos sobre as importações ao abrigo da section 232 do Trade Expansion Act (Lei relativa à Expansão do Comércio).

4        Tendo em conta os dados estatísticos recolhidos na sequência da introdução das medidas de vigilância, a Comissão deu início a um inquérito de salvaguarda a fim de analisar a situação de várias categorias de produtos siderúrgicos.

5        Na medida em que a análise dos dados a que procedeu a levou a concluir, a título provisório, que a indústria siderúrgica da União estava sob a ameaça de um prejuízo grave relativamente a vinte e três das vinte e oito categorias de produtos que foram objeto do inquérito de salvaguarda, a Comissão adotou o Regulamento de Execução (UE) 2018/1013, de 17 de julho de 2018, que institui medidas de salvaguarda provisórias em relação às importações de certos produtos de aço (JO 2018, L 181, p. 39).

6        Considerando posteriormente que a indústria siderúrgica da União estava perante a ameaça de um prejuízo grave relativamente a vinte e seis categorias de produtos de aço, a Comissão adotou o Regulamento de Execução (UE) 2019/159, de 31 de janeiro de 2019, que institui medidas de salvaguarda definitivas contra as importações de certos produtos de aço (JO 2019, L 31, p. 27). Este regulamento de execução instituiu uma medida de salvaguarda definitiva por um período de três anos, com a possibilidade de prorrogação até oito anos, sob a forma de contingentes pautais específicos por categoria cujo limiar quantitativo era fixado no volume médio das importações dos países em causa no período compreendido entre 2015 e 2017, majorado de 5 %, para garantir a manutenção dos fluxos comerciais tradicionais e um apoio suficiente aos atuais utilizadores e à indústria de importação da União. A taxa do direito extracontingente, fixada em 25 % na fase da medida provisória, foi confirmada aquando da adoção da medida definitiva.

7        Contrariamente à situação que prevalecia no quadro das medidas de salvaguarda provisórias, o Regulamento de Execução 2019/159 estabeleceu contingentes específicos por país para os países com um interesse significativo enquanto fornecedores (ou seja, os países detentores de uma quota superior a 5 % das importações no que respeitava à categoria de produto em causa). Foi igualmente estabelecido um contingente pautal «residual» ou «global» para os outros países que exportam para o território da União. A Comissão considerou ainda que, quando um país fornecedor tivesse esgotado o seu contingente pautal específico, devia poder ter acesso ao contingente pautal residual para assegurar a manutenção dos fluxos comerciais tradicionais e também para evitar que, conforme o caso, permanecessem inutilizadas partes do contingente pautal residual.

8        De 2 de fevereiro de 2019, data de entrada em vigor do Regulamento de Execução 2019/159, até 30 de junho de 2021, a medida de salvaguarda foi regularmente reexaminada e progressivamente liberalizada, a intervalos regulares, a fim de aumentar gradualmente os limiares quantitativos para permitir que a indústria da União se adaptasse.

9        Por ocasião dos reexames efetuados nos meses de setembro de 2019 e junho de 2020, a Comissão introduziu alterações na administração do sistema de contingentes pautais, a fim de ter em conta, nomeadamente, os dados comerciais mais recentes.

10      Em 15 de janeiro de 2021, a Comissão recebeu um pedido fundamentado de doze Estados‑Membros da União para examinar, nos termos do artigo 19.o do Regulamento (UE) 2015/478 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de março de 2015, relativo ao regime comum aplicável às importações (JO 2015, L 83, p. 16; a seguir «regulamento de base sobre as medidas de salvaguarda»), se a medida de salvaguarda em vigor deveria ser prorrogada.

11      Em 26 de fevereiro de 2021, a Comissão publicou um aviso de início de inquérito no Jornal Oficial da União Europeia, no qual convidava as partes interessadas a participar num inquérito relativo à eventual prorrogação da medida de salvaguarda, apresentando as suas observações e elementos de prova justificativos.

12      Em 24 de junho de 2021, considerando, por um lado, que, no contexto da pandemia de COVID‑19, a supressão da medida de salvaguarda podia provocar uma súbita vaga de importações que agravaria seriamente a situação financeira ainda frágil da indústria siderúrgica da União e, por outro, que os utilizadores, no que respeitava a todas as categorias de produtos, tinham tido a possibilidade de se abastecer de aço com isenção de direitos junto de múltiplas fontes, uma vez que cerca de 11 milhões de toneladas de contingentes pautais isentos de direitos continuavam por utilizar, ou seja, 36 % do total dos contingentes pautais disponíveis, a Comissão adotou o regulamento impugnado que prorroga a medida de salvaguarda por um período de três anos até 30 de junho de 2024.

 Pedidos das partes

13      A recorrente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        anular o regulamento impugnado;

–        condenar a Comissão nas despesas.

14      A Comissão conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        declarar o recurso inadmissível;

–        a título subsidiário, negar provimento ao recurso;

–        condenar a recorrente nas despesas.

 Questão de direito

 Quanto à admissibilidade

15      Sem invocar formalmente uma exceção de inadmissibilidade, a Comissão contesta a admissibilidade do presente recurso, considerando que a recorrente não tem interesse em agir nem legitimidade. A recorrente, por seu turno, alega que tem interesse em agir e legitimidade para interpor recurso do regulamento impugnado.

 Quanto ao interesse em agir

16      Em primeiro lugar, a Comissão considera que, na fase da interposição do presente recurso, a recorrente não demonstrou que preenchia os requisitos relativos à demonstração de um interesse em agir.

17      Antes de mais, refere que o regulamento impugnado não impede as importações das categorias de produtos siderúrgicos em causa para a União, uma vez que o direito de salvaguarda só se aplica caso ocorra um prejuízo grave devido ao aumento das importações para além dos fluxos comerciais habituais. Assim, no que respeita à obrigação de pagamento do direito extracontingente de 25 %, o interesse da recorrente é hipotético.

18      Em seguida, no momento em que o recurso foi interposto, o contingente pautal relativo às categorias de produtos importados pelas sociedades representadas pela recorrente não estava esgotado. Por conseguinte, segundo a Comissão, a anulação do regulamento impugnado não pode conferir nenhum benefício à recorrente, dado que este regulamento ainda não produziu efeitos jurídicos relativamente a ela ou aos seus membros. Assim, o interesse em agir da recorrente não existe nem é atual.

19      Neste contexto, a Comissão considera que o facto de os membros da recorrente terem em conta a existência de contingentes pautais na sua planificação comercial não significa que a sua situação jurídica tenha sido alterada pelo regulamento impugnado. Aliás, a hipótese de os contingentes pautais produzirem efeitos já foi rejeitada pelo Tribunal Geral no Acórdão de 20 de outubro de 2021, Novolipetsk Steel/Comissão (T‑790/19, não publicado, EU:T:2021:706). Além disso, a Comissão sustenta que o facto de as importações continuarem a ser constantes quando o nível dos contingentes pautais não utilizados aumenta mostra que a medida de salvaguarda não produz os efeitos negativos sobre os fluxos comerciais alegados pela recorrente.

20      Por último, o facto de as importações estarem sujeitas a contingentes pautais não impõe um encargo específico aos importadores. Por conseguinte, a recorrente não retira nenhum benefício da anulação do regulamento impugnado a este respeito.

21      Em segundo lugar, a Comissão sublinha que, na medida em que procede a reexames com intervalos regulares durante o período de aplicação da medida de salvaguarda, o facto de o regulamento impugnado, num determinado momento, poder ter efeitos jurídicos sobre os produtos importados pelos membros da recorrente é incerto.

22      Em terceiro lugar, a Comissão indica que o facto de a recorrente e os seus membros terem interesse em agir se e quando for aplicado o direito extracontingente de 25 % não significa que não exista um recurso efetivo. Com efeito, segundo a Comissão, nesta situação, ser‑lhes‑á dada a possibilidade de contestar a cobrança desse direito pelas autoridades aduaneiras nacionais perante os órgãos jurisdicionais nacionais, os quais podem submeter ao Tribunal de Justiça a questão da validade do regulamento impugnado, nos termos do artigo 267.o TFUE.

23      A recorrente contesta os argumentos da Comissão.

24      Segundo jurisprudência constante, o interesse em agir constitui a condição essencial e primeira de qualquer ação judicial. Um recurso de anulação interposto por uma pessoa singular ou coletiva só é admissível na medida em que o recorrente tenha interesse em que o ato impugnado seja anulado. O interesse em agir de uma parte recorrente pressupõe que a anulação do ato impugnado seja suscetível, por si só, de ter consequências jurídicas, que o recurso possa, pelo seu resultado, conferir um benefício à parte que o interpôs e que esta prove um interesse legítimo e atual na anulação do referido ato (v. Acórdão de 18 de maio de 2022, Uzina Metalurgica Moldoveneasca/Comissão, T‑245/19, EU:T:2022:295, n.o 32 e jurisprudência referida).

25      No presente caso, resulta do mecanismo introduzido pelo regulamento impugnado que o regime jurídico aplicável à atividade de importação para a União dos produtos em causa é menos favorável do que o que se aplicava sem as medidas de salvaguarda (v., por analogia, Acórdão de 18 de maio de 2022, Uzina Metalurgica Moldoveneasca/Comissão, T‑245/19, EU:T:2022:295, n.o 33).

26      Assim, a anulação do regulamento impugnado por uma decisão favorável à recorrente seria suscetível, por si mesma, de ter consequências jurídicas e seria adequada, através do seu resultado, a conferir um benefício à recorrente, que, consequentemente, tem interesse em agir (v., por analogia, Acórdão de 18 de maio de 2022, Uzina Metalurgica Moldoveneasca/Comissão, T‑245/19, EU:T:2022:295, n.o 34).

27      A este respeito, os considerandos 85 e 86 do regulamento impugnado preveem um processo de reexame e de liberalização da medida de salvaguarda (v., neste contexto, n.o 8, supra). Esse processo visa, nomeadamente, permitir a instituição de um regime de importação mais aberto, beneficiando assim os importadores. A liberalização progressiva dos contingentes pautais altera a situação jurídica em que se encontram os importadores. Uma anulação do regulamento impugnado seria, pois, comparável a uma liberalização total dos referidos contingentes. Por conseguinte, é inegável que a recorrente tem interesse em que o referido regulamento seja anulado, a fim de exercer a sua atividade no âmbito de um regime jurídico desprovido de condicionalismos ligados a limiares quantitativos.

28      Além disso, contrariamente ao que alega a Comissão (v. n.o 18, supra), esse interesse era efetivo e atual na data de interposição do recurso. Com efeito, resulta do considerando 1 do regulamento impugnado que o mecanismo de salvaguarda instituído comporta duas etapas, a primeira das quais consiste na imposição de contingentes pautais e a segunda na aplicação de um direito adicional às importações se os limiares quantitativos desses contingentes pautais forem excedidos. Embora, por definição, a segunda etapa só ocorra de maneira diferida relativamente à primeira, esta última existe na data de aplicação do regulamento que a prevê, ou seja, no caso em apreço, em 1 de julho de 2021. Ora, a recorrente interpôs o seu recurso em 20 de setembro de 2021.

29      Do mesmo modo, em conformidade com a jurisprudência constante segundo a qual o interesse em agir não pode dizer respeito a uma situação futura e hipotética e não pode decorrer de meras hipóteses (v. Despacho de 28 de setembro de 2021, Airoldi Metalli/Comissão, T‑611/20, não publicado, EU:T:2021:641, n.o 42 e jurisprudência referida), o interesse da recorrente no caso em apreço é certo, contrariamente ao que sustenta a Comissão (v. n.os 17 e 21, supra), na medida em que, por força do artigo 2.o do regulamento impugnado, o sistema de contingentação se torna efetivo na data de aplicação do referido regulamento. A este respeito, há que salientar a falta de pertinência do argumento da Comissão baseado na existência de reexames periódicos (v. n.o 21, supra), na medida em que, entre cada reexame, a situação não suscita nenhuma incerteza quanto à imposição de contingentes e, consequentemente, quanto aos efeitos jurídicos associados ao sistema de contingentação.

30      A posição da Comissão de considerar que o interesse em agir só pode existir na data, eventual, da imposição do direito adicional por terem sido excedidos os limiares parece resultar de uma confusão entre as duas etapas mencionadas no n.o 28, supra. O interesse da recorrente não se limita à contestação da imposição do direito adicional, estendendo‑se também à contestação do regime de contingentação que, pela sua própria existência, vem modificar a situação jurídica dos seus membros. A anulação do regulamento impugnado implicaria, assim, a inversão dessa modificação na medida em que restabeleceria a anterior situação jurídica dos membros da recorrente, que era mais favorável do que a sujeição a um sistema de contingentação, conferindo‑lhes assim um benefício, contrariamente ao que alega a Comissão (v. n.o 20, supra).

31      A este respeito, não é pertinente destacar, como a Comissão faz (v. n.o 19, supra), por um lado, o facto de os contingentes pautais alegadamente preservarem os níveis históricos de importação e, por outro, o facto de o regulamento impugnado não impedir as importações, por maioria de razão tendo em conta que não se esgotaram os contingentes pautais. Sem analisar as dificuldades invocadas pela recorrente, nos articulados e na audiência, para explicar as razões do não esgotamento dos contingentes pautais, há que sublinhar que, de qualquer modo, essas considerações têm consequências não jurídicas mas factuais, destinadas a, sendo caso disso, ocorrer posteriormente.

32      Por outro lado, condicionar a existência do interesse em agir da recorrente quanto à contestação do regime de contingentação à imposição de um direito adicional poderia ter a consequência de obrigar a recorrente a importar volumes superiores aos limiares quantitativos para poder contestar o referido regime e a ignorar a situação desfavorável que representa para um importador a aplicação desse regime em si mesma.

33      Por último, há que salientar a falta de pertinência da argumentação da Comissão, recordada no n.o 19, supra, e reiterada na audiência, de que o Tribunal Geral, no Acórdão de 20 de outubro de 2021, Novolipetsk Steel/Comissão (T‑790/19, não publicado, EU:T:2021:706), rejeitou a hipótese segundo a qual os contingentes pautais produziam efeitos.

34      Primeiro, no Acórdão de 20 de outubro de 2021, Novolipetsk Steel/Comissão (T‑790/19, não publicado, EU:T:2021:706), o Tribunal Geral não se pronunciou sobre a admissibilidade do recurso que lhe foi submetido. As considerações em que se apoia a Comissão são, assim, desprovidas de pertinência no âmbito do exame do interesse em agir da recorrente no quadro do presente recurso.

35      Segundo, no processo que deu origem ao Acórdão de 20 de outubro de 2021, Novolipetsk Steel/Comissão (T‑790/19, não publicado, EU:T:2021:706), o Tribunal Geral salientou que a recorrente não tinha feito prova bastante da existência de efeitos antes da aplicação do direito extracontingente. Ora, esta conclusão resulta de um exame dos efeitos dos contingentes pautais destinados a determinar a existência de um erro manifesto de apreciação na análise da Comissão. Neste contexto, o grau de fiscalização do Tribunal Geral é um elemento essencial, que, em contrapartida, é alheio ao exame que esse órgão jurisdicional deve efetuar na verificação da existência do interesse em agir de um recorrente.

36      Terceiro, no âmbito dessa verificação, os efeitos em causa devem ser de natureza jurídica, como sublinhado pela jurisprudência referida no n.o 24, supra. Ora, a análise do Tribunal Geral no Acórdão de 20 de outubro de 2021, Novolipetsk Steel/Comissão (T‑790/19, não publicado, EU:T:2021:706), tem por objeto as provas apresentadas para demonstrar a existência de efeitos que cumpriam o grau de intensidade exigido antes do esgotamento dos contingentes pautais. Assim, o raciocínio do Tribunal Geral assenta em dados estatísticos de fluxo e na declaração de um importador destinada a demonstrar a existência de efeitos comerciais de suficiente intensidade, conforme exigido pela legislação em causa nesse processo.

37      Por conseguinte, o fundamento de inadmissibilidade relativo à falta de interesse em agir da recorrente deve ser julgado improcedente.

 Quanto à legitimidade

38      Segundo jurisprudência constante, o artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE prevê duas situações nas quais é reconhecida legitimidade a uma pessoa singular ou coletiva para interpor recurso de anulação de um ato do qual não é destinatária. Por um lado, esse recurso pode ser interposto na condição de o referido ato lhe dizer direta e individualmente respeito. Por outro, essa pessoa pode interpor recurso de um ato regulamentar que não necessite de medidas de execução se este lhe disser diretamente respeito (v. Acórdãos de 16 de maio de 2019, Pebagua/Comissão, C‑204/18 P, não publicado, EU:C:2019:425, n.o 26 e jurisprudência referida, e de 18 de maio de 2022, Uzina Metalurgica Moldoveneasca/Comissão, T‑245/19, EU:T:2019:295, n.o 35 e jurisprudência referida).

39      À luz dos elementos dos autos, há que examinar, antes de mais, a segunda situação.

40      A título preliminar, importa recordar que, segundo a jurisprudência, a recorrente, como associação que representa os interesses de importadores, distribuidores, comerciantes e transformadores de aço não integrado, aço inoxidável e produtos metálicos, não tem legitimidade para interpor um recurso de anulação a não ser que invoque um interesse próprio ou, se não for esse o caso, que as empresas que representa, ou algumas delas, tiverem legitimidade a título individual (Acórdão de 13 de março de 2018, European Union Copper Task Force/Comissão, C‑384/16 P, EU:C:2018:176, n.o 87).

41      No caso em apreço, em conformidade com o artigo 263.o, quarto parágrafo, último segmento de frase, TFUE, se, por um lado, o ato impugnado for um ato regulamentar que diga diretamente respeito aos membros da recorrente e, por outro, esse ato não necessitar de medidas de execução, a legitimidade desses membros estará demonstrada.

42      Neste contexto, a Comissão considera que a recorrente não pode interpor recurso de anulação do regulamento impugnado com base no artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE, na medida em que, por um lado, não demonstrou que o referido regulamento dizia diretamente respeito aos seus membros e, por outro, não demonstrou a inexistência de medidas de execução em relação aos seus membros.

–       Quanto à natureza regulamentar do ato impugnado

43      Segundo jurisprudência constante, o conceito de «atos regulamentares» na aceção do artigo 263.o, quarto parágrafo, último segmento de frase, TFUE abrange todos os atos de alcance geral, com exceção dos atos legislativos (v., neste sentido, Acórdão de 6 de novembro de 2018, Scuola Elementare Maria Montessori/Comissão, Comissão/Scuola Elementare Maria Montessori e Comissão/Ferracci, C‑622/16 P a C‑624/16 P, EU:C:2018:873, n.os 23 e 28 e jurisprudência referida). A distinção entre um ato legislativo e um ato regulamentar, segundo o Tratado FUE, assenta no critério do processo, legislativo ou não, que conduziu à sua adoção (v., neste sentido, Acórdão de 6 de setembro de 2017, Eslováquia e Hungria/Conselho, C‑643/15 e C‑647/15, EU:C:2017:631, n.o 58, e Despacho de 6 de setembro de 2011, Inuit Tapiriit Kanatami e o./Parlamento e Conselho, T‑18/10, EU:T:2011:419, n.o 65).

44      Ora, no caso em apreço, por um lado, o regulamento impugnado, na medida em que prorroga uma medida de salvaguarda sobre as importações de certos produtos de aço, apresenta um alcance geral. Por outro lado, o referido regulamento não é um ato legislativo, uma vez que não foi adotado segundo um processo legislativo ordinário ou especial.

45      Por conseguinte, o regulamento impugnado é um ato regulamentar na aceção do artigo 263.o, quarto parágrafo, último segmento de frase, TFUE.

–       Quanto à afetação direta

46      O requisito segundo o qual a medida objeto do recurso deve dizer diretamente respeito a uma pessoa singular ou coletiva requer a reunião de dois critérios cumulativos, a saber, que a medida contestada, por um lado, produza efeitos diretamente na situação jurídica dessa pessoa e, por outro, não deixe nenhum poder de apreciação aos destinatários encarregados da sua execução, uma vez que esta tem caráter puramente automático e decorre apenas da regulamentação da União, sem aplicação de outras regras intermédias (v. Acórdão de 3 de dezembro de 2020, Changmao Biochemical Engineering/Distillerie Bonollo e o., C‑461/18 P, EU:C:2020:979, n.o 58 e jurisprudência referida).

47      No caso em apreço, a Comissão sustenta que a situação da recorrente não preenche os requisitos relativos à afetação individual. Com efeito, considera que os efeitos jurídicos do regulamento impugnado não se podem materializar oficiosamente apenas nesse regulamento, na medida em que, no momento da interposição do recurso, os membros da recorrente podiam continuar a exercer as suas atividades da mesma maneira que antes da adoção do referido regulamento.

48      A este respeito, a Comissão afirma que qualquer importador da União só é afetado depois de as autoridades aduaneiras dos Estados‑Membros terem tomado posição sobre o montante do direito de salvaguarda mediante a aplicação do regulamento impugnado sob a forma de uma notificação da dívida aduaneira ou de uma declaração semelhante.

49      No que respeita ao cumprimento do primeiro critério recordado no n.o 46, supra, importa salientar que o regulamento impugnado determina o quadro jurídico e as condições em que os membros da recorrente têm a faculdade de exportar para a União, tanto em termos de volume como de preço, passando os seus produtos a estar sujeitos a um sistema de contingentação e deixando de ser colocados em livre prática na União, a qual não impõe nem a atribuição de quantidades nem a autorização por parte da Comissão. Nesse sistema de contingentação, a faculdade de os membros da recorrente utilizarem o contingente com direito nulo depende da atribuição pela Comissão de quantidades para esse contingente no que respeita aos seus produtos (v., por analogia, Acórdão de 18 de maio de 2022, Uzina Metalurgica Moldoveneasca/Comissão, T‑245/19, EU:T:2022:295, n.o 44). Por conseguinte, há que concluir que o regulamento impugnado produz efeitos diretos na situação jurídica dos membros da recorrente.

50      Neste contexto, importa sublinhar que seguir a posição da Comissão equivaleria a diminuir a importância da separação das duas etapas do mecanismo de salvaguarda (v. n.o 28, supra), bem como da diferença substancial entre os efeitos de natureza jurídica e os efeitos de natureza comercial (v. n.o 31, supra).

51      No que respeita à satisfação do segundo critério recordado no n.o 46, supra, o teste jurídico pertinente é o da inexistência de qualquer poder de apreciação deixado aos destinatários do ato em causa responsáveis pela sua implementação (v., neste sentido, Despacho de 14 de janeiro de 2015, SolarWorld e o./Comissão, T‑507/13, EU:T:2015:23, n.o 40).

52      Ora, no caso em apreço, o regulamento impugnado não deixa nenhum poder de apreciação às autoridades competentes do Estado‑Membro no quadro da implementação das medidas de salvaguarda [v., por analogia, Acórdãos de 3 de dezembro de 2020, Changmao Biochemical Engineering/Distillerie Bonollo e o., C‑461/18 P, EU:C:2020:979, n.o 59, e de 12 de dezembro de 2014, Crown Equipment (Suzhou) e Crown Gabelstapler/Conselho, T‑643/11, não publicado, EU:T:2014:1076, n.o 28], tanto no âmbito da primeira etapa do mecanismo de salvaguarda, tornando‑se o sistema de contingentes efetivo na data de aplicação do regulamento impugnado (v. n.o 28, supra), como no âmbito da segunda etapa deste mecanismo, estando as autoridades competentes obrigadas a aplicar um direito extracontingente de 25 % uma vez esgotados os contingentes pautais (v., por analogia, Acórdão de 18 de maio de 2022, Uzina Metalurgica Moldoveneasca/Comissão, T‑245/19, EU:T:2022:295, n.o 46).

53      Por conseguinte, os membros da recorrente são diretamente afetados pelo regulamento impugnado, na aceção da jurisprudência referida no n.o 46, supra.

–       Quanto à inexistência de medidas de execução

54      Segundo a Comissão, os efeitos da política comercial comum materializam‑se através de medidas de execução que os Estados‑Membros aplicam à situação individual do importador. Com efeito, no domínio da política comercial comum, as medidas de execução são as únicas a materializar os efeitos de um regulamento.

55      Por conseguinte, o referido importador pode contestar essas medidas de execução nos órgãos jurisdicionais nacionais em causa, tendo estes, em seguida, a possibilidade de submeter ao Tribunal de Justiça uma questão prejudicial para apreciação da validade do regulamento no qual se baseiam as referidas medidas, nos termos do artigo 267.o TFUE.

56      A este respeito, a Comissão indica que as limitações contestadas pela recorrente, resultantes da complementaridade das vias de recurso, encontram o seu fundamento no Tratado FUE e, portanto, não podem ser ignoradas.

57      No caso em apreço, há que salientar que o regulamento impugnado prorroga a medida de salvaguarda que consiste, por um lado, no estabelecimento de contingentes pautais aplicáveis a certos produtos siderúrgicos e, por outro, na aplicação de um direito extracontingente de 25 % a todas as importações efetuadas para além dos limiares quantitativos desses contingentes. Resultam, pois, deste sistema a instauração de uma condição associada a um nível volumétrico das importações e, para os importadores que pretendam abastecer‑se excedendo esse nível, a aplicação de uma majoração pautal.

58      A este respeito, mesmo que as medidas aplicadas no presente caso à situação individual de um importador sejam medidas de execução na aceção do artigo 263.o, quarto parágrafo, último segmento de frase, TFUE, resulta da jurisprudência que o facto de um ato regulamentar necessitar de medidas de execução, de forma que alguns efeitos jurídicos do referido regulamento só se materializem através dessas medidas, não exclui que o regulamento produza, na esfera jurídica de uma pessoa singular ou coletiva, outros efeitos jurídicos que não dependem de medidas de execução (v., neste sentido, Acórdão de 13 de março de 2018, European Union Copper Task Force/Comissão, C‑384/16 P, EU:C:2018:176, n.o 45).

59      No caso em apreço, a instituição do sistema de contingentação, que constitui um efeito do regulamento impugnado do mesmo modo que a aplicação do direito extracontingente, é concomitante com a adoção do referido regulamento. Por conseguinte, a partir da adoção do regulamento impugnado, um importador deve agir num quadro jurídico novo, que difere do quadro jurídico anterior. Ora, a produção dos efeitos jurídicos do sistema de contingentação, tais como identificados no n.o 49, supra, não depende de nenhuma medida de execução. A este respeito, pode salientar‑se que as medidas em que a Comissão se baseia para considerar que o critério relativo à inexistência de medidas de execução não está preenchido não dizem respeito aos referidos efeitos jurídicos (v. n.o 58, supra).

60      Daqui resulta que, antes do esgotamento do contingente pautal, não existem necessariamente medidas de execução que os membros da recorrente cuja situação jurídica se encontra afetada pela instituição do sistema de contingentação possam contestar nos órgãos jurisdicionais nacionais.

61      Por conseguinte, os importadores, como os membros da recorrente, encontram‑se numa situação correspondente à prevista no artigo 263.o, quarto parágrafo, último segmento de frase, TFUE, pelo que têm legitimidade para interpor recurso do regulamento impugnado.

62      Nestas condições e em conformidade com a jurisprudência referida no n.o 40, supra, a recorrente, enquanto associação representativa, tem legitimidade, com base no artigo 263.o, quarto parágrafo, último segmento de frase, TFUE, para interpor recurso do regulamento impugnado.

63      Em consequência, o recurso deve ser julgado admissível.

 Quanto ao mérito

64      A recorrente invoca dois fundamentos de recurso.

65      Com o seu primeiro fundamento, a recorrente alega que as condições para a prorrogação da medida de salvaguarda nos termos do artigo 19.o do regulamento de base sobre as medidas de salvaguarda não estão preenchidas.

66      Com o seu segundo fundamento, a recorrente sustenta que a referida prorrogação não é do interesse da União.

67      A título preliminar, há que recordar que, segundo jurisprudência constante, no domínio da política comercial comum e especialmente em matéria de medidas de defesa comercial, as instituições da União dispõem de um amplo poder de apreciação em razão da complexidade das situações económicas, políticas e jurídicas que devem examinar. A fiscalização jurisdicional de tal apreciação deve, pois, ser limitada à verificação do respeito das regras processuais, da exatidão material dos factos considerados para proceder à escolha contestada, da inexistência de erro manifesto na apreciação destes factos ou da inexistência de desvio de poder (v., neste sentido, Acórdãos de 19 de setembro de 2019, Trace Sport, C‑251/18, EU:C:2019:766, n.o 47 e jurisprudência referida, e de 18 de maio de 2022, Uzina Metalurgica Moldoveneasca/Comissão, T‑245/19, EU:T:2022:295, n.os 74 e 75).

 Quanto ao primeiro fundamento, relativo à violação do artigo 19.o do regulamento de base sobre as medidas de salvaguarda

68      Em substância, o primeiro fundamento da recorrente divide‑se em duas partes.

69      Com a primeira parte, a requerente considera que os dados em que se baseia a análise da Comissão para adotar o regulamento impugnado não permitem concluir que a prorrogação da medida de salvaguarda era necessária para prevenir ou reparar um prejuízo grave, na aceção do artigo 19.o, n.o 2, alínea a), do regulamento de base sobre as medidas de salvaguarda.

70      Com a segunda parte, a recorrente considera que a Comissão cometeu um erro ao concluir que existiam elementos que provavam que a indústria da União estava a proceder a ajustamentos, como exige o artigo 19.o, n.o 2, alínea b), do regulamento de base sobre as medidas de salvaguarda.

71      A Comissão contesta a procedência do primeiro fundamento.

–       Quanto à primeira parte do primeiro fundamento, relativa ao caráter necessário da prorrogação da medida de salvaguarda para prevenir ou reparar um prejuízo grave

72      Nos termos do artigo 19.o, n.o 2, alínea a), do regulamento de base sobre as medidas de salvaguarda, uma medida de salvaguarda pode ser prorrogada se se determinar que essa prorrogação é necessária para prevenir ou reparar um prejuízo grave.

73      Primeiro, a recorrente considera que, ao não ter em conta certos aspetos do mercado, durante o período abrangido pelo inquérito relativo à eventual prorrogação da medida de salvaguarda, a saber, os anos 2018 a 2020 (a seguir «período de inquérito»), que vêm contrariar a conclusão de que a prorrogação da medida de salvaguarda era necessária para reparar um prejuízo grave, a Comissão cometeu um erro manifesto de apreciação na determinação do caráter necessário da prorrogação na aceção do artigo 19.o, n.o 2, alínea a), do regulamento de base sobre as medidas de salvaguarda.

74      Em primeiro lugar, a recorrente acusa a Comissão de não ter tomado em consideração fatores relativos à capacidade de produção da indústria da União e às quotas de mercado detidas por esta indústria na União.

75      Num primeiro momento, há que matizar a pertinência que a recorrente atribui a cada um desses fatores.

76      Por um lado, a recorrente sustenta que a capacidade de produção da indústria da União se manteve estável. No entanto, resulta expressamente da análise que figura no considerando 12 do regulamento impugnado, que relaciona a evolução do volume de produção, da capacidade de produção e da utilização dessa capacidade, que a utilização da capacidade de produção diminuiu 13 pontos percentuais.

77      Por outro lado, a recorrente indica que as quotas de mercado da indústria da União aumentaram de ano para ano. Esta tendência positiva resulta igualmente da análise suplementar por família ou categoria de produtos efetuada pela Comissão. No entanto, como resulta do considerando 13 do regulamento impugnado, esse aumento foi conjugado com uma diminuição do consumo ao longo de todo o período em causa. Assim, o significado do aumento das quotas de mercado no âmbito de uma análise da situação económica da indústria siderúrgica da União deve ser relativizado, uma vez que, na prática, tal aumento não se traduziu numa melhoria da rendibilidade. A este respeito, importa salientar que esta situação é especificamente referida no considerando 15 do regulamento impugnado, que precisa que a indústria da União se tornou deficitária entre 2018 e 2019 e que a rendibilidade continuou a diminuir entre 2019 e 2020.

78      Num segundo momento, há que relativizar o método subjacente à análise proposta pela recorrente à luz desses fatores.

79      Por um lado, a abordagem da recorrente sofre de falta de contextualização. Com efeito, é importante não negligenciar que, para determinar o significado de uma evolução, positiva ou negativa, de um fator, esta deve ser reposicionada no contexto adequado. Assim, o aumento das quotas de mercado da indústria da União no período considerado deve ser apreciado tendo em conta que o nível das quotas de mercado em questão em 2019 e 2020 estava próximo do de 2017, quando a indústria da União foi afetada por um aumento das importações. Por conseguinte, não se pode deduzir do aumento da quota de mercado da indústria da União que a situação da indústria da União deixou de ser frágil ou vulnerável. Além disso, uma vez que a medida de salvaguarda se baseia na manutenção dos fluxos comerciais habituais em matéria de volume de importações com base no período compreendido entre 2015 e 2017, um aumento das quotas de mercado da União a esses níveis não demonstra a inexistência de prejuízo.

80      Por outro lado, recorde‑se que a análise da situação económica da indústria siderúrgica que a Comissão deve realizar exige que sejam tidos em consideração vários fatores, sem que nenhum deles seja determinante de modo isolado. Assim, a identificação de um possível erro manifesto de apreciação cometido pela Comissão na condução da sua análise deve ter em conta o método que seguiu. Ora, resulta, em especial, das constatações que figuram expressamente no ponto 3.1 do regulamento impugnado que a conclusão a que a Comissão chegou no considerando 17 desse regulamento, a saber, o caráter frágil e vulnerável da situação da indústria da União, se baseia em muitos outros indicadores de prejuízo que, na sua quase totalidade, apresentavam grandes tendências negativas. Assim, os indicadores relativos à produção, às vendas, ao retorno do capital e ao emprego registaram todos uma diminuição num contexto em que as vendas e os preços de venda no mercado interno tinham igualmente diminuído, o que conduziu a uma diminuição da rentabilidade da indústria da União.

81      Tendo em conta o que precede, há que constatar o caráter fragmentário e isolado das apreciações da recorrente.

82      Em segundo lugar, a recorrente acusa a Comissão de não ter tido em conta a diminuição das importações durante o período de inquérito, tal como a mesma resulta dos dados constantes do regulamento impugnado.

83      Todavia, para refutar esta alegação, basta salientar que as apreciações da recorrente não são pertinentes, na medida em que são desprovidas de contextualização. Com efeito, por um lado, o nível volumétrico alcançado pelas importações em 2020 corresponde ao de 2015, já considerado prejudicial, e, por outro, a diminuição das importações em termos de quotas de mercado conduz a um nível equivalente ao observado em 2017, como expressamente indicado no considerando 25 do regulamento impugnado. Aliás, há que observar que a recorrente não apresenta nenhuma contradição direta na conclusão da Comissão segundo a qual, à luz da abordagem contextualizada acima descrita, as importações no mercado do aço da União aumentaram mais em termos relativos em relação ao período anterior à instituição da medida de salvaguarda.

84      Por conseguinte, não se pode acusar a Comissão de não ter tido em conta a alegada diminuição das importações.

85      Segundo, a recorrente alega que, com base num exame positivo e objetivo dos dados mencionados nos n.os 74 e 82, supra, a Comissão não podia concluir pela necessidade de uma prorrogação da medida de salvaguarda para prevenir um prejuízo grave sem cometer um erro manifesto de apreciação à luz do artigo 19.o, n.o 2, alínea a), do regulamento de base sobre as medidas de salvaguarda.

86      A título preliminar, saliente‑se que resulta do regulamento impugnado que a Comissão procedeu a um exame prospetivo, o que a recorrente não contesta. A esse respeito, esta última formula duas alegações.

87      Por um lado, a recorrente acusa a Comissão de não ter tomado em consideração o aumento dos lucros dos principais atores da indústria da União. No entanto, na medida em que se baseia em elementos cuja temporalidade excede o período considerado pela Comissão, esta alegação deve ser julgada inoperante.

88      Por outro lado, a recorrente acusa a Comissão de não ter tomado em consideração a falta de pressão sobre a indústria da União pelas importações provenientes da República Popular da China. No entanto, resulta dos considerandos 39 e 43 do regulamento impugnado que o exame prospetivo efetuado pela Comissão teve em conta a situação de sobreprodução e de sobrecapacidade à escala mundial. Assim, esta alegação também deve ser rejeitada.

89      Resulta do que precede que, contrariamente às alegações da recorrente, a Comissão não ignorou determinados dados nem a sua importância. Ora, na medida em que a recorrente baseia a sua contestação nessa alegada falta de tomada em consideração de dados, há que concluir, em aplicação dos princípios recordados no n.o 67, supra, que a Comissão não cometeu um erro manifesto de apreciação na análise que a levou a considerar que a prorrogação da medida de salvaguarda era necessária para prevenir ou reparar um prejuízo grave.

90      Por último, terceiro, a recorrente acusa a Comissão de não ter efetuado uma análise de não imputação adequada no que respeita às circunstâncias excecionais do mercado em 2020, causadas pela pandemia de COVID‑19. A este respeito, salienta que esta questão apenas é abordada de maneira acessória no regulamento impugnado.

91      A título preliminar, importa salientar que, por um lado, não se contesta que resulta de numerosas passagens do regulamento impugnado que a Comissão examinou os efeitos da pandemia de COVID‑19 no âmbito da sua análise e que, por outro, a argumentação da recorrente não identifica com precisão as referidas passagens que, em seu entender, revelam que esse aspeto foi tratado de maneira insuficiente, limitando‑se a qualificar de incompleta a análise efetuada pela Comissão a este respeito. Por conseguinte, o caráter vago desta alegação impede a identificação de um erro manifesto de apreciação cometido pela Comissão.

92      De qualquer modo, por um lado, na audiência, em resposta ao pedido do Tribunal Geral de que precise o conteúdo desta alegação, a recorrente manteve as suas objeções relativas ao caráter incompleto da análise da Comissão à luz dos dados disponíveis na época. No entanto, absteve‑se de precisar o teor dos referidos dados e referiu‑se, de maneira geral, ao facto de a Comissão ter disposto de informações detalhadas sobre a situação devido a inquéritos realizados no âmbito de outras medidas de defesa comercial. Além disso, a recorrente não determinou especificamente as insuficiências das considerações constantes do regulamento impugnado a esse respeito.

93      Por outro lado, no âmbito da fiscalização que cabe ao Tribunal Geral exercer no processo em apreço, em conformidade com os princípios recordados no n.o 67, supra, há que ter em conta o fator de incerteza particularmente importante associado a uma crise extraordinária na apreciação das análises prospetivas efetuadas pela Comissão. Ora, o argumento da recorrente de que a Comissão se podia basear em dados mais precisos, alegadamente na sua posse, para efetuar uma análise de não imputação não toma em consideração o muito elevado grau de incerteza atinente à evolução de uma crise de dimensão excecional como a pandemia de COVID‑19.

94      Tendo em conta o que precede, a primeira parte do primeiro fundamento deve ser julgada improcedente.

–       Quanto à segunda parte do primeiro fundamento, relativa à prova dos ajustamentos

95      Nos termos do artigo 19.o, n.o 2, alínea b), do regulamento de base sobre as medidas de salvaguarda, uma medida de salvaguarda pode ser prorrogada se se determinar que existem elementos de prova de que os produtores da União estão a proceder a ajustamentos.

96      Primeiro, a recorrente considera que a Comissão cometeu um erro ao concluir que tais elementos de prova existiam, na medida em que o regulamento impugnado não contém suficientes elementos de prova que permitam concluir que a indústria da União tomava medidas adequadas para se adaptar ao aumento das importações. A este respeito, a recorrente salienta que não foi apresentado nenhum plano de ajustamento e afirma que é evidente que os produtores da União não tomaram medidas de ajustamento adequadas durante os dois últimos anos e meio.

97      A título preliminar, resulta do regulamento impugnado que a Comissão tomou em consideração um determinado número de elementos que revelam medidas de ajustamento adotadas pela indústria da União. Embora o considerando 68 do regulamento impugnado indique que foram apresentadas à Comissão informações confidenciais relativas às medidas de ajustamento adotadas pelos produtores da União, os considerandos 69 e 70 do referido regulamento apresentam, no entanto, informações pormenorizadas. Impõe‑se observar que a recorrente prescindiu de qualquer análise dessas informações e se limitou a afirmar que nenhuma das referências às atividades de ajustamento comunicadas pela Comissão era sustentada por qualquer prova.

98      Ora, por força dos princípios recordados no n.o 67, supra, pouco importa que, na falta de contestação específica dos elementos em que se baseia a análise da Comissão, a recorrente indique que teriam sido pertinentes outros tipos de informações.

99      Segundo, de acordo com a recorrente, não foi apresentada nenhuma prova tanto da falta de capacidade de produção da indústria da União como da incapacidade desta de fornecer todas as mercadorias necessárias ao mercado da União.

100    Esta alegação deve ser rejeitada por falta de pertinência, uma vez que, embora todas as medidas tomadas pela indústria da União dissessem respeito a ações destinadas a aumentar a eficácia das ações que visavam sustentar a eficácia da indústria da União e a apoiar corretamente a concorrência num cenário de mercado caracterizado por um aumento das importações, essas medidas não pretendiam, em contrapartida, tornar a indústria da União capaz de cobrir as necessidades de abastecimento no mercado da União.

101    A este respeito, as alegações da recorrente relativas ao facto de a Comissão não ter tomado em consideração o aumento das quotas de mercado da indústria da União e a diminuição das importações, reiteradas neste contexto, devem ser rejeitadas pelas razões expostas nos n.os 77, 83 e 84, supra.

102    Terceiro, a recorrente considera que a indústria da União não procedeu a nenhum ajustamento, na medida em que não se encontrava numa situação de prejuízo ou de ameaça de prejuízo, como ilustram os lucros substanciais obtidos pelas empresas produtoras da União e a inexistência de pressão proveniente das importações da República Popular da China. A este respeito, basta recordar que se concluiu, nos n.os 87 e 88, supra, pela rejeição das premissas deste raciocínio.

103    Tendo em conta o que precede, a segunda parte do primeiro fundamento deve ser julgada improcedente.

104    Na medida em que se concluiu pela improcedência das duas partes que constituem o primeiro fundamento, este deve ser julgado integralmente improcedente.

 Quanto ao segundo fundamento, relativo a erros manifestos cometidos pela Comissão na apreciação do interesse da União em prorrogar a medida de salvaguarda

105    Com o seu segundo fundamento, a recorrente alega que é errada a posição da Comissão segundo a qual não existem razões económicas imperiosas que possam levar à conclusão de que não é do interesse da União prorrogar a medida de salvaguarda existente.

106    Em primeiro lugar, a recorrente contesta a justeza da afirmação, constante do regulamento impugnado, segundo a qual os contingentes pautais isentos de direitos se adequavam à procura. Com efeito, a recorrente indica que, na recuperação económica geral que se seguiu à pandemia de COVID‑19, ocorreu um desequilíbrio entre a elevada procura de matérias‑primas e a escassa oferta dos produtores da União que não puderam satisfazê‑la, o que levou a um aumento significativo dos preços na União. Neste contexto, salienta que, no terceiro trimestre de 2021, o esgotamento dos contingentes dos principais fornecedores de aço de países terceiros dificultou o abastecimento em aço dos utilizadores e dos importadores.

107    Impõe‑se observar que o argumento da recorrente assenta numa abordagem que não tem em conta o mecanismo da medida de salvaguarda, que leva o importador a diversificar as suas fontes de abastecimento pelo recurso, sendo caso disso, a produtores situados em países terceiros para os quais o contingente pautal não está esgotado. Ora, no caso em apreço, resulta dos autos que os contingentes isentos de direitos continuavam por utilizar, o que a recorrente não contesta.

108    Neste contexto, há que concluir que não foi demonstrado nenhum erro manifesto de apreciação que afete a análise da Comissão.

109    Em segundo lugar, a recorrente sustenta que os dados em que se baseia a análise da Comissão não corroboram as afirmações constantes do regulamento impugnado segundo as quais, por um lado, não existe uma relação direta entre a medida de salvaguarda e o aumento dos preços do aço e, por outro, o nível desses preços não se mantém após a adaptação do mercado à situação posterior à pandemia de COVID‑19.

110    No entanto, antes de mais, há que salientar que, se o aumento dos preços fosse devido à medida de salvaguarda, resultaria então dos dados da análise que a indústria siderúrgica da União se podia eximir de qualquer pressão concorrencial restritiva. Ora, a Comissão não podia chegar a essa conclusão em face de um grande número de contingentes isentos de direitos não esgotados procedentes de várias fontes praticamente em todas as categorias de produtos durante o último período da medida de salvaguarda, o que acontecia no processo em análise, como foi salientado no n.o 107, supra.

111    Em seguida, não se pode excluir o impacto de outros fatores — como o aumento paralelo dos preços das matérias‑primas indicado no considerando 100 do regulamento impugnado — na determinação das causas responsáveis pelo aumento dos preços no mercado da União.

112    Por último, resulta dos elementos dos autos que, dado que esses aumentos de preços foram observados nos principais mercados do aço à escala mundial, onde a medida de salvaguarda não se aplicava, as observações da recorrente relativas ao nexo de causalidade entre a medida de salvaguarda e o aumento dos preços não são convincentes.

113    Por conseguinte, a apreciação da Comissão sobre o aumento dos preços no âmbito da avaliação do interesse da União em que a medida de salvaguarda seja prorrogada não é manifestamente errada.

114    Em terceiro lugar, a recorrente contesta o facto de a Comissão qualificar, no regulamento impugnado, de «transitórios» os problemas da oferta verificados após a recuperação económica geral, na medida em que, contrariamente a esta, considera que a retoma do funcionamento das fábricas paralisadas pela indústria da União não pode garantir o restabelecimento, num prazo razoavelmente curto, das condições normais de abastecimento em aço existentes antes da pandemia de COVID‑19.

115    Com efeito, a recorrente alega que o aumento da procura após a recuperação económica geral levou, nomeadamente, a uma escassez progressiva das matérias‑primas, que afetou a atividade dos transformadores dessas matérias. Deste modo, segundo ela, as entregas são regularmente anuladas ou suspensas. Além disso, as despesas de transporte marítimo aumentaram de forma exponencial e a logística tornou‑se cada vez mais difícil de gerir.

116    Antes de mais, importa recordar que, uma vez que os contingentes pautais não estavam esgotados (v. n.o 107, supra), a medida de salvaguarda não pode ser a causa das alegadas incapacidades da indústria da União para cobrir a procura no mercado da União.

117    Em seguida, uma vez que a recorrente não demonstrou a insuficiência da oferta no mercado da União, os seus argumentos relativos aos prazos de fornecimento e às despesas de logística não são pertinentes.

118    Por último, as informações que figuram nos considerandos 110 e 111 do regulamento impugnado, relativas à capacidade da indústria da União de garantir o restabelecimento, num prazo razoável, das condições de abastecimento normais, não podem ser contestadas por uma simples afirmação em sentido contrário da recorrente sem que esta apresente elementos de prova em apoio da mesma.

119    Por conseguinte, a recorrente continua a não demonstrar a existência de um erro manifesto de apreciação da Comissão no que respeita ao interesse da União em prorrogar a medida de salvaguarda.

120    A título exaustivo, pode salientar‑se o caráter inoperante dos argumentos da recorrente baseados em dados relativos à evolução posterior ao período de inquérito, na medida em que esses argumentos não são suscetíveis de demonstrar a existência de um erro manifesto de apreciação que afete a análise da Comissão quanto ao interesse da União em que a medida de salvaguarda seja prorrogada, uma vez que esses dados não podem ser tomados em consideração durante o inquérito relativo à eventual prorrogação da medida de salvaguarda.

121    Tendo em conta tudo o que precede, há que julgar improcedente o segundo fundamento e, portanto, que negar provimento ao recurso na sua totalidade.

 Quanto às despesas

122    Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

123    Tendo a recorrente sido vencida, há que condená‑la nas despesas, nos termos do pedido formulado pela Comissão.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Décima Secção)

decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      A European Association of NonIntegrated Metal Importers & distributors (Euranimi) é condenada nas despesas.

Porchia

Jaeger

Nihoul

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 4 de outubro de 2023.

Assinaturas


*      Língua do processo: inglês.