Language of document : ECLI:EU:T:2022:314

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Terceira Secção alargada)

1 de junho de 2022 (*)

«União económica e monetária — União bancária — Mecanismo único de resolução das instituições de crédito e de certas empresas de investimento (MUR) — Procedimento de resolução aplicável em caso de situação ou risco de insolvência de uma entidade — Adoção pelo CUR de um programa de resolução relativamente ao Banco Popular Español — Delegação de poderes — Dever de fundamentação — Princípio da boa administração — Artigo 20.o do Regulamento (UE) n.o 806/2014 — Direito de audiência — Direito de propriedade»

No processo T‑570/17,

Algebris (UK) Ltd, com sede em Londres (Reino Unido),

Anchorage Capital Group LLC, com sede em Nova Iorque, Nova Iorque (Estados Unidos),

representadas por T. Soames, N. Chesaites, advogados, e R. East, solicitor,

recorrentes,

contra

Comissão Europeia, representada por L. Flynn e A. Steiblytė, na qualidade de agentes,

recorrida,

apoiada por:

Conselho Único de Resolução (CUR), representado por J. King e Fernández Rupérez, na qualidade de agentes, assistidos por B. Meyring, S. Schelo, F. Fernández de Trocóniz Robles, T. Klupsch e S. Ianc, advogados,

e por

Banco Santander, SA, com sede em Santander (Espanha), representado por J. Rodríguez Cárcamo, A. M. Rodríguez Conde, D. Sarmiento Ramírez‑Escudero, advogados, e G. Cahill, barrister,

intervenientes,

que tem por objeto um pedido, com base no artigo 263.o TFUE, de anulação da Decisão (UE) 2017/1246 da Comissão, de 7 de junho de 2017, que aprova o programa de resolução do Banco Popular Español, SA (JO 2017, L 178, p. 15),

O TRIBUNAL GERAL (Terceira Secção alargada),

composto por: M. van der Woude, presidente, M. Jaeger, V. Kreuschitz, G. De Baere (relator) e G. Steinfatt, juízes,

secretário: P. Cullen, administrador,

vistos os autos e após audiência de 24 de junho de 2021,

profere o presente

Acórdão

 Quadro jurídico

1        Na sequência da crise financeira de 2008, foi decidido criar uma união bancária na União Europeia, baseada num conjunto único de regras completo e pormenorizado para os serviços financeiros, válido para todo o mercado interno e que incluísse um mecanismo único de supervisão e novos enquadramentos para a garantia de depósitos e a resolução de insolvências bancárias.

2        A primeira etapa da criação da união bancária consistiu na instituição de um mecanismo único de supervisão (MUS) pelo Regulamento (UE) n.o 1024/2013 do Conselho, de 15 de outubro de 2013, que confere ao BCE atribuições específicas no que diz respeito às políticas relativas à supervisão prudencial das instituições de crédito (JO 2013, L 287, p. 63). Segundo o considerando 12 desse regulamento, um mecanismo único de supervisão deverá assegurar que a política da União no que se refere à supervisão prudencial das instituições de crédito seja aplicada de forma coerente e eficaz, que o conjunto único de regras para os serviços financeiros seja aplicado da mesma forma às instituições de crédito de todos os Estados‑Membros interessados e que essas instituições de crédito sejam sujeitas a uma supervisão da mais elevada qualidade, isenta de considerações não prudenciais. Para o efeito, o Regulamento n.o 1024/2013 confere ao Banco Central Europeu (BCE) atribuições específicas no que diz respeito às políticas relativas à supervisão prudencial das instituições de crédito, a fim de contribuir para a segurança e solidez das instituições de crédito e para a estabilidade do sistema financeiro na União e em cada Estado‑Membro.

3        Subsequentemente, foi adotada a Diretiva 2014/59/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio de 2014, que estabelece um enquadramento para a recuperação e a resolução de instituições de crédito e de empresas de investimento e que altera a Diretiva 82/891/CEE do Conselho e as Diretivas do Parlamento Europeu e do Conselho 2001/24/CE, 2002/47/CE, 2004/25/CE, 2005/56/CE, 2007/36/CE, 2011/35/UE, 2012/30/UE e 2013/36/UE e os Regulamentos do Parlamento Europeu e do Conselho (UE) n.o 1093/2010 e (UE) n.o 648/2012 (JO 2014, L 173, p. 190). Indica, no seu considerando 1, o seguinte:

«A crise financeira demonstrou uma grande falta de instrumentos adequados a nível da União para tratar com eficácia o problema das instituições de crédito e das empresas de investimento […] pouco sãs ou em situação de insolvência. Esses instrumentos são necessários, nomeadamente, para evitar procedimentos de insolvência ou, se tal não for possível, para minimizar as suas repercussões negativas, preservando as funções de importância sistémica das instituições em causa. Durante a crise, estes desafios constituíram um fator essencial que obrigou os Estados‑Membros a salvarem instituições utilizando o dinheiro dos contribuintes. A finalidade de um enquadramento credível para a recuperação e a resolução consiste em evitar, ao máximo, a necessidade de proceder a tal intervenção.»

4        O objetivo da Diretiva 2014/59 é o de instituir regras comuns de harmonização mínima das disposições nacionais que regulam a resolução dos bancos na União e prevê uma cooperação entre autoridades de resolução nas situações de insolvência de bancos transfronteiriços. A este respeito, a Diretiva 2014/59 prevê, nomeadamente no seu artigo 3.o, n.o 1, que cada Estado‑Membro designa uma ou, excecionalmente, mais autoridades de resolução habilitadas a aplicar os instrumentos de resolução e a exercer os poderes de resolução.

5        Todavia, considerando, por um lado, que a Diretiva 2014/59 não conduzia à centralização do processo decisório em matéria de resolução, que punha essencialmente instrumentos de resolução e poderes de resolução comuns à disposição das autoridades nacionais de cada Estado‑Membro e que deixava a estas uma margem de apreciação para o recurso a esses instrumentos e à utilização dos mecanismos nacionais de financiamento para a resolução, e considerando, por outro lado, que essa diretiva não impedia completamente a adoção de decisões distintas e potencialmente divergentes sobre a resolução dos grupos transfronteiriços pelos Estados‑Membros, decidiu instituir um mecanismo único de resolução (MUR).

6        Assim, a segunda etapa para a criação da união bancária consistiu na adoção do Regulamento (UE) n.o 806/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de julho de 2014, que estabelece regras e um procedimento uniformes para a resolução de instituições de crédito e de certas empresas de investimento no quadro de um Mecanismo Único de Resolução e de um Fundo Único de Resolução Bancária, e que altera o Regulamento (UE) n.o 1093/2010 (JO 2014, L 225, p. 1).

7        O considerando 12 do Regulamento n.o 806/2014 dispõe:

«Afigura‑se essencial, para a realização do mercado interno dos serviços financeiros, garantir decisões eficazes em matéria de resolução para os bancos em situação de insolvência no âmbito da União, nomeadamente em relação à utilização dos fundos mobilizados a nível da União. No mercado interno, a insolvência de bancos num Estado‑Membro pode afetar a estabilidade dos mercados financeiros da União como um todo. A garantia de regras efetivas e uniformes em matéria de resolução e de condições de financiamento da resolução idênticas em todos os Estados‑Membros é do interesse, não apenas dos Estados‑Membros em que os bancos operam, mas também de todos os Estados‑Membros em geral, uma vez que permite assegurar condições equitativas de concorrência e melhorar o funcionamento do mercado interno. Os sistemas bancários no mercado interno estão estreitamente interligados, os grupos bancários têm uma dimensão internacional e os bancos detêm uma grande percentagem de ativos estrangeiros. Na ausência do MUR, as crises bancárias nos Estados‑Membros que participam no MUS teriam um maior impacto sistémico negativo também nos Estados‑Membros não participantes. A criação do MUR assegurará uma abordagem neutra no tratamento dos bancos em situação de insolvência e, por conseguinte, aumentará a estabilidade dos bancos dos Estados‑Membros participantes e impedirá a propagação das crises a Estados‑Membros não participantes, facilitando assim o funcionamento do mercado interno no seu todo. Os mecanismos de cooperação relativos às instituições estabelecidas em Estados‑Membros participantes e não‑participantes deverão ser claros e nenhum Estado‑Membro ou grupo de Estados‑Membros deverá ser, direta ou indiretamente, discriminado enquanto local de prestação de serviços financeiros.»

8        Segundo o seu artigo 1.o, primeiro parágrafo, o Regulamento n.o 806/2014, tem por objetivo aprovar regras uniformes e um procedimento uniforme para a resolução das entidades definidas no artigo 2.o que estejam estabelecidas nos Estados‑Membros participantes, a saber, os bancos que tenham como autoridade de supervisão do país de origem o BCE ou a autoridade nacional competente nos Estados‑Membros cuja moeda seja o euro ou nos Estados‑Membros cuja moeda não seja o euro que tenham instituído uma cooperação estreita em conformidade com o artigo 7.o do Regulamento n.o 1024/2013 (v. considerando 15 do Regulamento n.o 806/2014).

9        O artigo 1.o, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 806/2014 prevê que essas regras uniformes e esse processo uniforme serão aplicados pelo Conselho Único de Resolução (CUR), criado ao abrigo do artigo 42.o, em colaboração com o Conselho da União Europeia e a Comissão Europeia e as autoridades nacionais de resolução, no quadro do MUR criado pelo mesmo regulamento. Prevê‑se igualmente que o MUR se apoie num Fundo Único de Resolução (FUR).

10      Nos termos do artigo 16.o, n.o 1, do Regulamento n.o 806/2014, o CUR decide uma medida de resolução em relação a uma instituição financeira estabelecida num Estado‑Membro participante se as três condições previstas no artigo 18.o, n.o 1, do mesmo regulamento estiverem preenchidas.

11      A primeira condição exige que a entidade se encontre em situação ou em risco de insolvência. A avaliação dessa condição é efetuada pelo BCE, após consulta do CUR, ou pelo CUR, e é considerada preenchida se a entidade se encontrar numa ou mais das situações enumeradas no artigo 18.o, n.o 4, do Regulamento n.o 806/2014.

12      A segunda condição pressupõe que não existe nenhuma perspetiva razoável de que outras medidas de natureza privada ou prudenciais impeçam a insolvência da entidade num prazo razoável.

13      A terceira condição implica que uma medida de resolução seja necessária para defesa do interesse público, a saber, que seja necessária para atingir um ou mais dos objetivos da resolução e que a liquidação da entidade segundo um processo normal de insolvência não o permitisse na mesma medida.

14      O artigo 14.o do Regulamento n.o 806/2014 define os seguintes objetivos da resolução: assegurar a continuidade das funções críticas; evitar efeitos adversos significativos sobre a estabilidade financeira, nomeadamente evitando o contágio; proteger as finanças públicas, limitando o recurso ao apoio financeiro público extraordinário; proteger os depositantes e os investidores, proteger os fundos e ativos dos clientes.

15      O artigo 20.o, n.o 1, do Regulamento n.o 806/2014 prevê que, antes de adotar uma medida de resolução ou exercer o poder de reduzir ou converter os instrumentos de capital relevantes, o CUR assegura que seja efetuada uma avaliação justa, prudente e realista dos ativos e passivos de uma entidade em causa por uma pessoa independente de qualquer autoridade pública, incluindo o CUR e a autoridade nacional de resolução, bem como da entidade em causa.

16      Segundo o artigo 20.o, n.o 15, do Regulamento n.o 806/2014, a avaliação é parte integrante da decisão de aplicar um instrumento de resolução ou de exercer um poder de resolução ou da decisão relativa ao exercício do poder de redução ou de conversão de instrumentos de capital.

17      Se estiverem preenchidas as condições previstas no artigo 18, n.o 1, do Regulamento n.o 806/2014, o CUR adota um programa de resolução.

18      Quando atuam no âmbito do procedimento de resolução, o CUR, o Conselho e a Comissão devem assegurar que a medida de resolução seja adotada em conformidade com certos princípios enumerados no artigo 15.o do Regulamento n.o 806/2014, entre os quais figuram o princípio de os acionistas da instituição objeto de um procedimento de resolução serem os primeiros a suportar as perdas e o princípio de nenhum credor incorrer em perdas maiores do que teria sofrido se a entidade visada pela medida de resolução tivesse sido liquidada segundo um processo normal de insolvência.

19      No programa de resolução, o CUR determina a aplicação dos instrumentos de resolução. O artigo 22.o, n.o 2, do Regulamento n.o 806/2014 enumera os diferentes instrumentos de resolução disponíveis, a saber, a alienação da atividade, o recurso a uma instituição de transição, a segregação de ativos e a recapitalização interna.

20      No programa de resolução, o CUR pode igualmente exercer o poder de redução ou de conversão dos instrumentos de capital da entidade em causa nas condições previstas no artigo 21.o do Regulamento n.o 806/2014. Segundo o artigo 19.o do Regulamento n.o 806/2014, uma medida de resolução pode igualmente implicar a concessão de um auxílio de Estado ou o recurso ao FUR.

21      Segundo o artigo 18.o, n.o 7, do Regulamento n.o 806/2014, imediatamente após a sua adoção, o CUR transmite o programa de resolução à Comissão. No prazo de vinte e quatro horas a contar da transmissão do programa de resolução pelo CUR, a Comissão aprova o programa de resolução ou apresenta objeções sobre os seus aspetos discricionários diferentes dos previstos no terceiro parágrafo, a saber, a observância do critério do interesse público ou uma alteração significativa do montante do FUR. Quanto a estes últimos aspetos discricionários, no prazo de doze horas a contar da data da transmissão do programa de resolução pelo CUR, a Comissão pode propor ao Conselho que apresente objeções ao programa de resolução adotado pelo CUR com o fundamento de que este não cumpre o critério do interesse público ou que aprove ou recuse uma alteração significativa do montante do FUR prevista no programa de resolução adotado pelo CUR. O programa de resolução só pode entrar em vigor se não tiverem sido formuladas objeções pelo Conselho ou pela Comissão no prazo de 24 horas após a sua transmissão pelo CUR.

22      O artigo 18.o, n.o 9, do Regulamento n.o 806/2014 indica que o CUR assegura que as medidas de resolução necessárias à aplicação do programa de resolução sejam tomadas pelas autoridades nacionais de resolução em causa. Estas últimas são destinatárias do programa de resolução, que lhes dá instruções para tomarem todas as medidas necessárias para o aplicarem, em conformidade com o artigo 29.o do mesmo regulamento, exercendo quaisquer poderes de resolução.

23      Posteriormente à adoção de uma medida de resolução, nos termos do artigo 20.o, n.o 16, do Regulamento n.o 806/2014, o CUR assegurará que seja realizada uma avaliação por uma pessoa independente, a fim de determinar se os acionistas e os credores teriam recebido um tratamento mais favorável se a instituição objeto de um procedimento de resolução tivesse entrado num processo normal de insolvência. Essa avaliação pode levar, nos termos do artigo 76.o, n.o 1, alínea e), do Regulamento n.o 806/2014, a pagar uma compensação aos acionistas ou aos credores se tiverem sofrido perdas maiores na resolução do que teriam sofrido numa liquidação segundo um processo normal de insolvência.

 Antecedentes do litígio e factos posteriores à interposição do recurso

24      As recorrentes, Algebris (UK) Ltd e Anchorage Capital Group LLC, são gestoras de fundos de investimentos que eram detentores de instrumentos de capital adicionais de nível 1 e instrumentos de capital de nível 2, emitidos pelo Banco Popular Español, SA (a seguir «Banco Popular») antes da adoção de um programa de resolução para este último.

 Quanto à situação do Banco Popular antes da adoção do programa de resolução

25      O grupo Banco Popular, de que o Banco Popular era a sociedade‑mãe, era, à data da resolução, o sexto grupo bancário espanhol.

26      Em 2016, o Banco Popular procedeu a um aumento de capital de 2 500 milhões de euros.

27      Em 5 de dezembro de 2016, a sessão executiva do CUR aprovou um plano de resolução do grupo Banco Popular. O instrumento de resolução privilegiado nesse plano de resolução era o instrumento de recapitalização interna previsto no artigo 27.o do Regulamento n.o 806/2014.

28      Em 3 de fevereiro de 2017, o Banco Popular publicou o seu relatório anual de 2016, no qual anunciou uma necessidade de provisões excecionais no montante de 5 700 milhões de euros, conduzindo a uma perda consolidada de 3 485 milhões de euros e à nomeação de um novo presidente.

29      Em 10 de fevereiro de 2017, a DBRS Ratings Limited (DBRS) (atual DBRS Morningstar) baixou a notação do Banco Popular, com perspetiva negativa, em face da situação enfraquecida do capital do Banco Popular na sequência de uma perda líquida mais significativa do que a prevista no seu relatório anual, acima referida no n.o 28, bem como dos esforços do Banco Popular para reduzir as suas existências ainda elevadas de ativos não produtivos.

30      Em 3 de abril de 2017, o Banco Popular anunciou o resultado de auditorias internas, indicando que poderiam ser necessárias correções ao relatório anual de 2016. Esses ajustamentos foram efetuados no relatório financeiro do Banco Popular para o primeiro trimestre de 2017.

31      Em 10 de abril de 2017, na assembleia geral de acionistas do Banco Popular, o presidente do conselho de administração anunciou que o banco previa um aumento de capital ou uma transação de empresa devido à situação do grupo em termos de fundos próprios e ao seu nível de ativos não produtivos. O presidente executivo do Banco Popular foi substituído menos de um ano após a sua entrada em funções.

32      Na sequência do anúncio de 3 de abril de 2017 sobre a necessidade de ajustamento dos resultados financeiros de 2016, a DBRS, em 6 de abril, baixou a notação do Banco Popular, mantendo a sua perspetiva negativa. A Standard & Poor’s, em 7 de abril, e a Moody’s Investors Service (a seguir «Moody’s»), em 21 de abril de 2017, baixaram igualmente a notação do Banco Popular com perspetiva negativa.

33      Em abril de 2017, o Banco Popular iniciou um processo de venda privada com o objetivo de realizar a sua venda a um concorrente forte, visando restabelecer a sua situação financeira. A data‑limite para os eventuais adquirentes interessados na aquisição do Banco Popular apresentarem a sua proposta tinha sido fixada em 10 de junho de 2017, tendo sido depois adiada para o fim de junho de 2017.

34      Em 5 de maio de 2017, o Banco Popular apresentou o seu relatório financeiro para o primeiro trimestre de 2017, anunciando perdas no montante de 137 milhões de euros.

35      Em 12 de maio de 2017, a exigência de cobertura das necessidades de liquidez (Liquidity Coverage Requirement) do Banco Popular passou abaixo do limite mínimo de 80 % fixado pelo artigo 460.o, n.o 2, alínea c), do Regulamento (UE) n.o 575/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativo aos requisitos prudenciais para as instituições de crédito e para as empresas de investimento e que altera o Regulamento (UE) n.o 648/2012 (JO 2013, L 176, p. 1).

36      Por carta de 16 de maio de 2017, o Banco Santander, SA informou o Banco Popular que não estava em condições de apresentar uma proposta formal no âmbito do processo de venda privada.

37      Em 16 de maio de 2017, o Banco Popular, numa comunicação de um facto pertinente à Comisión Nacional del Mercado de Valores (CNMV, Comissão Nacional do Mercado de Valores, Espanha), indicou que havia potenciais adquirentes que tinham manifestado o seu interesse no processo de venda privada, mas que não tinha sido recebida nenhuma proposta formal.

38      Em 19 de maio de 2017, a agência FITCH baixou a notação do Banco Popular a longo prazo.

39      Em 23 de maio de 2017, a presidente do CUR, Elke König deu uma entrevista ao canal de televisão Bloomberg, no qual foi interrogada, nomeadamente, sobre a situação do Banco Popular.

40      Ao longo de maio de 2017, numerosos artigos de imprensa relataram as dificuldades do Banco Popular. A título de exemplo, há que mencionar um artigo de 11 de maio de 2017, publicado no sítio Internet elconfidencial.com, intitulado «Saracho encarrega a JP Morgan e a Lazard da venda urgente do Popular devido a um risco de insolvência» (Saracho encarga la venta urgente del Popular a JP Morgan y Lazard por riesgo de quiebra). Nesse artigo, indica‑se que o presidente do banco tinha mandatado a JP Morgan e a Lazard para organizarem a venda urgente do banco devido a um risco de insolvência, devido à fuga maciça dos depósitos dos clientes particulares e institucionais e que considerava que a única forma de assegurar a viabilidade do banco era a venda completa e iminente de todo o grupo. O artigo relata que, «tendo em conta a persistência das saídas de depósitos e o encerramento de fontes de financiamento externas, o banco correria um sério risco de insolvência e que [o seu presidente] tinha sido obrigado a ativar a medida mais drástica e a abster‑se progressivamente de vender os seus ativos a fim de melhorar os rácios de fundos próprios e satisfazer as exigências do BCE».

41      Em 15 de maio de 2017, um artigo publicado no sítio Internet elconfidencial.com, intitulado «O BCE inspeciona o Banco Popular durante dois meses em pleno processo de venda» (El BCE inspecciona a Banco Popular durante dos meses en pleno proceso de venta), refere que o plano de venda do Banco Popular, executado pelo seu presidente, ocorreu após a inspeção do BCE que tinha confirmado o défice de provisões. Segundo esse artigo, os inspetores do BCE tinham concluído que as dificuldades do Banco Popular estavam relacionadas com o seu défice de provisões para cobrir a sua exposição imobiliária e que era necessário evitar as saídas ocasionais de depósitos. Esses inspetores expressaram igualmente o seu descontentamento relativamente à apresentação das contas de 2016.

42      Em 31 de maio de 2017, a agência Reuters publicou um artigo intitulado «UE, alertada contra o risco de liquidação do Banco Popular» (EU warned of wind‑down risk for Spain’s Banco Popular). Esse artigo menciona, nomeadamente, que, segundo um funcionário da União que permaneceu anónimo, um dos principais supervisores bancários na Europa tinha alertado os funcionários da União de que o Banco Popular poderia ser liquidado se não conseguisse encontrar um adquirente. Segundo este artigo, esse funcionário indicou igualmente que a presidente do CUR tinha emitido recentemente um «alerta rápido» e tinha declarado que o CUR seguia o processo (do Banco Popular) com especial atenção para uma eventual intervenção.

43      No mesmo dia, o CUR publicou um comunicado de imprensa destinado a negar o conteúdo desse artigo.

44      Nos primeiros dias de junho de 2017, o Banco Popular teve de fazer face a levantamentos maciços de liquidez.

45      Em 5 de junho de 2017, o Banco Popular apresentou, de manhã, um primeiro pedido de injeção de liquidez de emergência ao Banco de España (Banco de Espanha), e posteriormente um segundo pedido, à tarde, que continha uma extensão do montante pedido, devido a grandes movimentos de liquidez. Com base num pedido do Banco de Espanha e na sequência da avaliação do mesmo dia da BCE relativa ao pedido injeção de liquidez de emergência do Banco Popular, o Conselho do BCE não levantou objeções à injeção de liquidez de emergência ao Banco Popular para o período até 8 de junho de 2017. O Banco Popular recebeu uma parte dessa injeção de liquidez de emergência. Em seguida, o Banco de Espanha indicou que não estava em condições de fornecer uma injeção adicional de liquidez de emergência ao Banco Popular.

46      Em 6 de junho de 2017, a DBRS e a Moody’s baixaram a notação do Banco Popular.

 Quanto a outros factos anteriores à adoção do programa de resolução

47      Em 23 de maio de 2017, o CUR encarregou a Deloitte, na qualidade de perito independente, de proceder à avaliação do Banco Popular nos termos do artigo 20.o do Regulamento n.o 806/2014.

48      Em 24 de maio de 2017, o CUR pediu ao Banco Popular, com base no artigo 34.o do Regulamento n.o 806/2014, as informações necessárias à realização da sua avaliação. Em 2 de junho de 2017, pediu igualmente ao Banco Popular que fornecesse informações sobre o processo de venda privada e que previsse o acesso à sala de dados virtual securitizada que este último tinha criado no âmbito desse processo.

49      Em 3 de junho de 2017, a sessão executiva do CUR adotou a Decisão SRB/EES/2017/06, dirigida ao Fondo de Reestructuración Ordenada Bancaria (FROB, Fundo de reestruturação ordenada das instituições bancárias, Espanha), relativa à comercialização do Banco Popular. O CUR aprovou o compromisso imediato do processo de venda do Banco Popular pelo FROB e indicou‑lhe as exigências relativas à venda em conformidade com o artigo 39.o da Diretiva 2014/59. O CUR indicava, nomeadamente, que o FROB devia contactar os cinco potenciais adquirentes que tinham sido convidados a apresentar propostas no âmbito do processo de venda privada.

50      Entre os cinco potenciais adquirentes, dois decidiram não participar no processo de venda e um foi excluído pelo BCE por razões prudenciais.

51      Em 4 de junho de 2017, os dois potenciais adquirentes que tinham decidido participar no processo de venda, o Banco Santander e o Banco Bilbao Vizcaya Argentaria, SA (BBVA), assinaram um acordo de não divulgação e, em 5 de junho de 2017, tiveram acesso à sala de dados virtual.

52      Em 5 de junho de 2017, o CUR adotou uma primeira avaliação (a seguir «avaliação 1»), em aplicação do artigo 20.o, n.o 5, alínea a), do Regulamento n.o 806/2014, que tinha por objetivo fornecer elementos que permitissem determinar se estavam preenchidas as condições de abertura de um procedimento de resolução, conforme definidas no artigo 18.o, n.o 1, do Regulamento n.o 806/2014.

53      Em 6 de junho de 2017, o BCE procedeu a uma avaliação da situação ou do risco de insolvência do Banco Popular, após consulta do CUR, em conformidade com o artigo 18.o, n.o 1, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 806/2014.

54      Nessa avaliação, o BCE indicou que, nos meses anteriores, o Banco Popular tinha sofrido uma grande deterioração da sua situação de tesouraria, devida principalmente a um esgotamento significativo da sua base de depósitos. O Banco Popular foi confrontado com grandes saídas de tesouraria em todos os segmentos de clientela. O BCE enumerou os acontecimentos que tinham conduzido aos problemas de liquidez que o Banco Popular teria de enfrentar.

55      A este respeito, referiu que, em fevereiro de 2017, na apresentação das suas contas anuais, o Banco Popular tinha divulgado uma necessidade de provisões excecionais no montante de 5 700 milhões de euros, conduzindo a perdas de 3 485 milhões de euros em 2016 e à substituição do seu presidente de longa data, que tinha iniciado uma revisão da estratégia do banco. O anúncio de provisões adicionais e de perdas de fim de exercício tinha provocado uma descida da notação do Banco Popular pela DBRS em 10 de fevereiro de 2017 e tinha suscitado vivas preocupações na clientela do Banco Popular, que se traduziram em grandes e inesperados levantamentos de depósitos e numa grande afluência de clientes às sucursais do banco.

56      O BCE indicou igualmente que a publicação pelo Banco Popular, em 3 de abril de 2017, de uma declaração pública ad hoc que informava do resultado de várias auditorias internas que podiam ter uma incidência significativa nas demonstrações financeiras da instituição e a confirmação de que o presidente executivo da instituição seria substituído menos de um ano após a sua entrada em funções tinham desencadeado outra vaga de levantamentos de depósitos. O BCE referiu que esta vaga de levantamentos de depósitos também tinha sido alimentada por:

–        uma descida da notação do Banco Popular pela Standard & Poor’s, em 7 de abril de 2017;

–        o anúncio pelo Banco Popular, em 10 de abril de 2017, de que não pagaria dividendos e de que poderia ser necessário um aumento de capital ou uma transação de empresa devido à situação tensa dos fundos próprios e ao alinhamento necessário com os seus pares na cobertura dos ativos não produtivos;

–        uma descida da notação do Banco Popular pela Moody’s, em 21 de abril de 2017;

–        a divulgação dos resultados do primeiro trimestre de 2017 que eram piores do que o previsto;

–        a cobertura mediática negativa e contínua, como os artigos de 11 e 15 de maio de 2017, acima mencionados nos n.os 40 e 41, que sugeriam que o presidente do Banco Popular tinha ordenado uma venda urgente do banco devido a um risco iminente de insolvência ou de falta de liquidez e que o banco estava confrontado com uma grande necessidade suplementar de provisões resultantes de inspeção no local pelo supervisor.

57      O BCE considerou igualmente que os depósitos perdidos desde 31 de maio de 2017 eram particularmente relevantes, após a divulgação nos meios de comunicação do facto de o banco poder ser liquidado se o processo de venda em curso não fosse conseguido num prazo muito curto.

58      Além disso, o BCE salientou que, embora o Banco Popular tivesse desenvolvido diversas medidas geradoras de liquidez suplementares nas semanas anteriores e tivesse começado a aplicá‑las, a amplitude dos fluxos de entrada realizados e ainda esperados era insuficiente para solucionar o esgotamento da posição de liquidez do Banco Popular à data da avaliação. Indicou ainda que, mesmo com o recurso à injeção de liquidez de emergência aprovada, ao qual o Conselho do BCE não tinha apresentado objeções, em 5 de junho de 2017, a situação de tesouraria à data da avaliação não bastava para garantir a capacidade do Banco Popular para fazer face às suas responsabilidades até 7 de junho de 2017.

59      O BCE considerou que as medidas já adotadas pelo Banco Popular não tinham sido suficientemente eficazes para inverter a deterioração da sua situação de tesouraria. Referiu que, como medida alternativa para garantir a sua capacidade de fazer face às suas obrigações no vencimento, o Banco Popular tentava executar uma transação de empresa, a saber, a sua venda a um concorrente mais forte. No entanto, o BCE considerou que, tendo em conta a deterioração da situação de tesouraria do Banco Popular, a falta de provas da sua capacidade para inverter a sua situação de liquidez num futuro próximo e o facto de as negociações não terem até então conduzido a um resultado positivo, a confirmação dessa transação privada não era previsível num prazo que permitisse ao Banco Popular poder pagar as suas dívidas ou outras obrigações no vencimento.

60      O BCE constatou que, ao mesmo tempo, não existiam medidas de supervisão ou de intervenção precoce disponíveis que permitissem restabelecer a situação de tesouraria do Banco Popular de forma imediata e assegurar‑lhe tempo suficiente para executar uma transação de empresa ou outra solução. As medidas à disposição do BCE enquanto autoridade competente, por força da transposição nacional do artigo 104.o da Diretiva 2013/36/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativa ao acesso à atividade das instituições de crédito e à supervisão prudencial das instituições de crédito e empresas de investimento, que altera a Diretiva 2002/87/CE e revoga as Diretivas 2006/48/CE e 2006/49/CE (JO 2013, L 176, p. 338), e dos artigos 27.o a 29.o da Diretiva 2014/59 ou do artigo 16.o do Regulamento n.o 1024/2013, não podiam garantir que o Banco Popular estaria em condições de pagar as suas dívidas ou outras obrigações no vencimento, dada a amplitude e o ritmo da deterioração de liquidez observada.

61      Em conclusão, o BCE, tendo em conta, em especial, as saídas excessivas de depósitos, a rapidez a que a tesouraria tinha sido perdida pelo banco e a incapacidade de este gerar outras fontes de liquidez, considerou que existiam elementos objetivos que indicavam que o Banco Popular provavelmente não estaria em condições, num futuro próximo, de pagar as suas dívidas ou outras obrigações no vencimento. O BCE concluiu que se considerava estar o Banco Popular em situação ou, de qualquer forma, em risco de insolvência num futuro próximo, em conformidade com o artigo 18.o, n.o 1, alínea a), e n.o 4, alínea c), do Regulamento n.o 806/2014.

62      Em 6 de junho de 2017, o conselho de administração do Banco Popular informou o BCE de que tinha chegado à conclusão que o banco se encontrava numa situação de risco de insolvência.

63      No mesmo dia, o FROB elaborou um ofício com as informações sobre o processo de venda (a seguir «ofício de processo») e fixou o prazo para apresentação das propostas à meia‑noite de 6 de junho de 2017.

64      Ainda no mesmo dia, o BBVA, um dos dois potenciais adquirentes do Banco Popular, informou o FROB de que não apresentaria qualquer proposta.

65      Também em 6 de junho de 2017, a Deloitte entregou ao CUR uma segunda avaliação (a seguir «avaliação 2»), redigida nos termos do artigo 20.o, n.o 10, do Regulamento n.o 806/2014. O objetivo da avaliação 2 era estimar o valor dos ativos e passivos do Banco Popular, fornecer uma estimativa do tratamento que os acionistas e os credores teriam recebido se o Banco Popular tivesse sido objeto de um processo normal de insolvência e fornecer os elementos que permitissem tomar uma decisão relativa às ações e títulos de propriedade a transferir e que permitissem ao CUR determinar condições comerciais para efeitos do instrumento de alienação da atividade. Esta avaliação estimou, nomeadamente, o valor económico do Banco Popular em 1 300 milhões de euros, no melhor cenário, em menos de 8 200 milhões de euros no cenário mais desfavorável e em menos 2 000 milhões de euros para a melhor estimativa.

66      Em 7 de junho de 2017, o Banco Santander apresentou uma proposta formal.

67      Por ofício de 7 de junho de 2017, o FROB informou o CUR de que o Banco Santander tinha apresentado uma proposta em 7 de junho às 3h12 e de que o preço oferecido pelo Banco Santander para a venda das ações do Banco Popular era de um euro. O FROB indicou que o seu comité diretor tinha escolhido o Banco Santander como adjudicatário no processo de venda concorrencial do Banco Popular e tinha decidido propor ao CUR que designasse o Banco Santander como adquirente na decisão do CUR relativa à adoção de um programa de resolução relativamente ao Banco Popular.

 Quanto ao programa de resolução do Banco Popular de 7 de junho de 2017

68      Em 7 de junho de 2017, a sessão executiva do CUR adotou a Decisão SRB/EES/2017/08, relativa a um programa de resolução do Banco Popular (a seguir «programa de resolução»), com base no Regulamento n.o 806/2014.

69      Segundo o artigo 1.o do programa de resolução, o CUR, considerando estarem preenchidas as condições previstas no artigo 18.o, n.o 1, do Regulamento n.o 806/2014, decidiu submeter o Banco Popular a um procedimento de resolução a partir da data da resolução.

70      Assim, o CUR considerou, em primeiro lugar, que o Banco Popular estava em situação ou risco de insolvência, em segundo lugar, que não existiam outras medidas que pudessem impedir a insolvência do Banco Popular num prazo razoável e, em terceiro lugar, que era necessária uma medida de resolução sob a forma de instrumento de alienação da atividade do Banco Popular para defesa do interesse público. A esse respeito, o CUR indicou que a resolução era necessária e proporcionada à realização de dois objetivos previstos no artigo 14.o, n.o 2, do Regulamento n.o 806/2014, a saber, assegurar a continuidade das funções críticas do banco e evitar efeitos adversos significativos sobre a estabilidade financeira.

71      No artigo 5.1 do programa de resolução, o CUR decidiu o seguinte:

«O instrumento de resolução aplicado ao Banco Popular consistirá numa alienação da atividade ao abrigo do artigo 24.o do Regulamento n.o 806/2014 através da transferência das ações para um adquirente. A redução e a conversão dos instrumentos de capital serão efetuadas imediatamente antes da aplicação do instrumento de alienação da atividade.»

72      O artigo 6. do programa de resolução é relativo à redução dos instrumentos de capital e ao instrumento de alienação da atividade. No artigo 6.1, o CUR indicou as medidas que tinha adotado em aplicação do seu poder de redução previsto no artigo 21.o do Regulamento n.o 806/2014.

73      Assim, no artigo 6.1 do programa de resolução, o CUR decidiu:

–        em primeiro lugar, reduzir o montante nominal do capital social do Banco Popular no montante de 2 098 429 046 euros, o que conduzia à anulação de 100 % das ações do Banco Popular;

–        seguidamente, converter a totalidade do montante principal dos instrumentos de fundos próprios adicionais de nível 1 emitidos pelo Banco Popular e em circulação à data da decisão de resolução em novas ações emitidas do Banco Popular, as «novas ações I»;

–        em seguida, reduzir a zero o valor nominal das «novas ações I» o que conduzia à anulação de 100 % dessas «novas ações I»;

–        por último, converter a totalidade do montante principal dos instrumentos de fundos próprios de nível 2 emitidos pelo Banco Popular e em circulação à data da decisão de resolução em novas ações emitidas do Banco Popular, as «novas ações II».

74      O artigo 6.3 do programa de resolução prevê que essas medidas de redução e de conversão se baseiam na avaliação 2, corroborada pelos resultados de um processo de venda transparente e aberto realizado pela autoridade de resolução espanhola, o FROB.

75      No artigo 6.5 do programa de resolução, o CUR indicou que exercia os poderes que lhe eram conferidos pelo artigo 24.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 806/2014, relativo ao instrumento de alienação da atividade e ordenava que as «novas ações II» fossem transferidas para o Banco Santander, SA, livres e isentas de qualquer direito ou privilégio de terceiro, como contrapartida do pagamento de um preço de compra de 1 euro. Precisava‑se que o adquirente já tinha aceitado a transferência.

76      O CUR indicou igualmente que a transferência das «novas ações II» deveria ser efetuada com base na proposta vinculativa do adquirente de 7 de junho de 2017 e ser implementada pelo FROB em aplicação da Ley 11/2015 de recuperación y resolución de entidades de crédito y empresas de servicios de inversión (Lei 11/2015 de Recuperação e de Resolução das Instituições de Crédito e das Empresas de Serviços de Investimento), de 18 de junho de 2015 (BOE n.o 146, de 19 de junho de 2015, p. 50797).

77      O programa de resolução foi submetido à Comissão para aprovação em 7 de junho de 2017, às 5h13.

78      Em 7 de junho de 2017, às 6h30, a Comissão adotou a Decisão (UE) 2017/1246, que aprova o programa de resolução para o Banco Popular (JO 2017, L 178, p. 15, a seguir a «decisão recorrida»), e notificou‑a ao CUR. Por conseguinte, o programa de resolução entrou em vigor no mesmo dia.

79      Resulta do considerando 4 da decisão recorrida o seguinte:

«A Comissão concorda com o programa de resolução. Em especial, concorda com os motivos, invocados pelo CUR, pelos quais a resolução é necessária para a defesa do interesse público em conformidade com o artigo 5.o do Regulamento (UE) n.o 806/2014.»

80      Nesse mesmo dia, o FROB adotou as medidas necessárias para executar o programa de resolução, em conformidade com o artigo 29.o do Regulamento n.o 806/2014. Neste contexto, o FROB deu o seu acordo à transferência das novas ações do Banco Popular resultantes da conversão dos instrumentos de capital de nível 2 («novas ações II») para o Banco Santander.

 Quanto aos factos posteriores à adoção da decisão de resolução

81      Em 14 de junho de 2018, a Deloitte comunicou ao CUR a avaliação da diferença de tratamento, prevista no artigo 20.o, n.os 16 a 18, do Regulamento n.o 806/2014, realizada para determinar se os acionistas e os credores teriam recebido um tratamento mais favorável se o Banco Popular tivesse entrado num processo normal de insolvência (a seguir «avaliação 3»). Em 31 de julho de 2018, a Deloitte enviou ao CUR uma adenda a essa avaliação, corrigindo certos erros formais.

82      Em 28 de setembro de 2018, na sequência de uma fusão por incorporação, o Banco Santander sucedeu a título universal ao Banco Popular.

83      Em 17 de março de 2020, o CUR adotou a Decisão SRB/EES/2020/52 para determinar se devia ser concedida uma indemnização aos acionistas e credores abrangidos pelas medidas de resolução do Banco Popular. Em 20 de março de 2020 foi publicado no Jornal Oficial da União Europeia (JO 2020, C 91, p. 2) um comunicado relativo a essa decisão. Nessa decisão, o CUR considerou que os acionistas e credores que tinham sido afetados pela resolução do Banco Popular não tinham direito a uma indemnização do FUR, nos termos do artigo 76.o, n.o 1, alínea e), do Regulamento n.o 806/2014.

 Tramitação do processo e pedidos das partes

84      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 17 de agosto de 2017, as recorrentes interpuseram o presente recurso.

85      Por requerimentos apresentados na Secretaria do Tribunal Geral, respetivamente, em 20 de novembro e em 18 de dezembro de 2017, o Banco Santander e o CUR requereram a sua intervenção no presente processo em apoio da Comissão. Por Despacho de 12 de abril de 2019, o presidente da Oitava Secção do Tribunal Geral admitiu a intervenção do CUR e do Banco Santander. Os intervenientes apresentaram os seus articulados e as recorrentes apresentaram as suas observações sobre os mesmos nos prazos fixados.

86      Por ofício de 6 de julho de 2018, o Tribunal Geral, no âmbito das medidas de organização do processo previstas no artigo 89.o do seu Regulamento de Processo, colocou questões escritas às partes principais. As partes principais responderam a esse pedido no prazo fixado.

87      Por carta apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 31 de outubro de 2019, as recorrentes apresentaram um novo oferecimento de prova nos termos do artigo 85.o, n.o 3, do Regulamento de Processo. A Comissão e o CUR apresentaram as suas observações no prazo fixado.

88      Tendo sido alterada a composição das Secções do Tribunal Geral, nos termos do artigo 27.o, n.o 5, do Regulamento de Processo, o juiz relator foi afetado à Terceira Secção, à qual o presente processo foi, por conseguinte, atribuído.

89      Sob proposta da Terceira Secção, o Tribunal Geral decidiu, em aplicação do artigo 28.o do Regulamento de Processo, remeter o processo a uma formação de julgamento alargada.

90      Por carta apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 16 de outubro de 2020, as recorrentes apresentaram um novo oferecimento de prova nos termos do artigo 85.o, n.o 3, do Regulamento de Processo. A Comissão, o CUR e o Banco Santander apresentaram as suas observações no prazo fixado.

91      Em 15 de março de 2021, o Tribunal Geral, no quadro das medidas de organização do processo previstas no artigo 89.o do seu Regulamento de Processo, convidou a Comissão a juntar vários documentos. Por ofício de 30 de março de 2021, a Comissão indicou que não podia dar seguimento ao pedido do Tribunal Geral e que só poderia juntar os documentos pedidos no âmbito de uma diligência de instrução.

92      Em 15 de abril de 2021, o Tribunal Geral, no quadro das medidas de organização do processo previstas no artigo 89.o do Regulamento de Processo, convidou o CUR a juntar determinados documentos. Por ofício de 20 de abril de 2021, o CUR respondeu que os documentos pedidos eram parcialmente confidenciais e que poderiam ser apresentados se o Tribunal Geral ordenasse uma diligência de instrução.

93      Por Despacho de 21 de maio de 2021, o Tribunal Geral ordenou à Comissão, com base, por um lado, no artigo 24.o, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia e, por outro, no artigo 91.o, alínea b), do artigo 92.o, n.o 3, e no artigo 103.o do Regulamento de Processo, que apresentasse as versões integrais do programa de resolução, da avaliação 2 e da avaliação do BCE de 6 de junho de 2017 sobre a situação ou risco de insolvência do Banco Popular. O Tribunal Geral ordenou igualmente ao CUR que juntasse as versões não confidencial e confidencial da carta do Banco Popular ao BCE de 6 de junho de 2017, incluindo o seu anexo, e do ofício do BCE ao Banco Popular de 18 de maio de 2017.

94      Por carta apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 4 de junho de 2021, as recorrentes apresentaram um novo oferecimento de prova nos termos do artigo 85.o, n.o 3, do Regulamento de Processo. As outras partes foram convidadas a apresentar na audiência as suas observações sobre esse pedido.

95      Por Despacho de 16 de junho de 2021, por um lado, o Tribunal Geral desentranhou dos autos as versões confidenciais dos documentos apresentados pela Comissão e pelo CUR em execução do despacho de 21 de maio de 2021 e, por outro lado, transmitiu às outras partes a carta de 6 de junho de 2017 do Banco Popular ao BCE sem o seu anexo.

96      Por impedimento de dois membros da Terceira Secção de participarem na formação, o presidente do Tribunal Geral designou outros dois juízes para completar a Secção.

97      Foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às perguntas orais do Tribunal Geral na audiência de 24 de junho de 2021.

98      As recorrentes concluem pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        anular a decisão recorrida ou, a título subsidiário, o seu artigo 1.o;

–        condenar a Comissão nas despesas.

99      A Comissão conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar as recorrentes nas despesas.

100    O Banco Santander e o CUR concluem pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar as recorrentes nas despesas.

 Questão de direito

101    As recorrentes invocam seis fundamentos de recurso. Com o primeiro fundamento alegam que a Comissão não analisou o programa de resolução antes de o aprovar. O segundo fundamento é relativo à violação do dever de fundamentação. O terceiro fundamento é relativo à violação das obrigações de segredo profissional e de boa administração. O quarto fundamento é relativo a erros manifestos de apreciação na aplicação dos artigos 14.o, 18.o, 20.o a 22.o e 24.o do Regulamento n.o 806/2014. O quinto fundamento é relativo à violação do direito de propriedade. O sexto fundamento é relativo à violação do direito de audiência.

102    A título preliminar, refira‑se que, quanto ao alcance da fiscalização exercida pelo Tribunal Geral, as recorrentes alegam que este deve efetuar uma fiscalização completa e aprofundada do programa de resolução.

103    A Comissão considera que, no âmbito dos recursos de anulação, os órgãos jurisdicionais da União são obrigados, quando surge uma questão técnica complexa, a analisar a exatidão das conclusões de facto e de direito em que se baseia o ato recorrido, a verificar a inexistência de erro manifesto ou a inexistência de desvio de poder e a verificar se a recorrida não ultrapassou claramente os limites do seu poder discricionário.

104    A este respeito, há que referir que a jurisprudência circunscreveu o alcance da fiscalização exercida pelo Tribunal Geral tanto em situações em que o ato recorrido se baseia numa apreciação dos elementos factuais de ordem científica e técnica altamente complexos como quando se trata de apreciações económicas complexas.

105    Por um lado, nos casos em que as autoridades da União dispõem de um amplo poder de apreciação, nomeadamente quanto à apreciação de elementos factuais de ordem científica e técnica altamente complexos para determinar a natureza e o alcance das medidas que adotam, a fiscalização do juiz da União deve limitar‑se a examinar se o exercício desse poder de apreciação não está ferido de erro manifesto ou de desvio de poder, ou ainda se essas autoridades não ultrapassaram manifestamente os limites do seu poder de apreciação. Com efeito, nesse contexto, o juiz da União não pode substituir pela sua a apreciação dos elementos factuais de ordem científica e técnica feita pelas autoridades da União, às quais o TFUE conferiu essa missão em exclusivo (Acórdãos de 21 de julho de 2011, Etimine, C‑15/10, EU:C:2011:504, n.o 60, e de 7 de março de 2013, Bilbaína de Alquitranes e o./ECHA, T‑93/10, EU:T:2013:106, n.o 76; v., também, Acórdão de 11 de maio de 2017, Deza/ECHA, T‑115/15, EU:T:2017:329, n.o 163 e jurisprudência referida).

106    Por outro lado, quanto à fiscalização que os tribunais da União exercem sobre as apreciações económicas complexas feitas pelas autoridades da União, esta é uma fiscalização restrita que se limita necessariamente à verificação do respeito das regras processuais e de fundamentação, da exatidão material dos factos, bem como da inexistência de erro manifesto de apreciação e de desvio de poder. Nessa fiscalização, também não compete ao juiz da União substituir pela sua a apreciação económica da autoridade da União competente (v., neste sentido, Acórdãos de 11 de julho de 1985, Remia e o./Comissão, 42/84, EU:C:1985:327, n.o 34; de 10 de dezembro de 2020, Comune di Milano/Comissão, C‑160/19 P, EU:C:2020:1012, n.o 100 e jurisprudência referida, e de 16 de janeiro de 2020, Iberpotash/Comissão, T‑257/18, EU:T:2020:1, n.o 96 e jurisprudência referida).

107    Uma vez que as decisões que o CUR tem que adotar num procedimento de resolução se baseiam em apreciações económicas e técnicas altamente complexas, há que considerar que os princípios decorrentes da jurisprudência acima referida nos n.os 105 e 106 se aplicam à fiscalização que o juiz é chamado a exercer.

108    Todavia, embora seja reconhecida ao CUR uma margem de apreciação em matéria económica e técnica, isso não implica que o juiz da União se deva abster de fiscalizar a interpretação feita pelo CUR dos dados de natureza económica que fundamentam a sua decisão. Com efeito, como o próprio Tribunal de Justiça decidiu, mesmo nos casos de apreciações complexas, o juiz da União deve não só verificar a exatidão material dos elementos de prova invocados, a sua fiabilidade e a sua coerência, mas também fiscalizar se esses elementos correspondem à totalidade dos dados pertinentes que devem ser tomados em consideração para apreciar uma situação complexa e se são suscetíveis de fundamentar as conclusões que deles são retiradas (v. Acórdãos de 22 de novembro de 2007, Espanha/Lenzing, C‑525/04 P, EU:C:2007:698, n.o 57 e jurisprudência referida, de 26 de março de 2019, Comissão/Itália, C‑621/16 P, EU:C:2019:251, n.o 104 e jurisprudência referida e de 10 de dezembro de 2020, Comune di Milano/Comissão, C‑160/19 P, EU:C:2020:1012, n.o 115 e jurisprudência referida).

109    A este respeito, para demonstrar que o CUR cometeu um erro manifesto na apreciação dos factos suscetível de justificar a anulação do programa de resolução, as provas apresentadas pelas recorrentes devem ser suficientes para retirar plausibilidade às apreciações dos factos considerados nesse programa (v., por analogia, Acórdãos de 14 de junho de 2018, Lubrizol França/Conselho, C‑223/17 P, não publicado, EU:C:2018:442, n.o 39, de 12 de dezembro de 1996, AIUFFASS e AKT/Comissão, T‑380/94, EU:T:1996:195, n.o 59, e de 13 de dezembro de 2018, Comune di Milano/Comissão, T‑167/13, EU:T:2018:940, n.o 108 e jurisprudência referida).

 Quanto ao primeiro fundamento, relativo ao facto de a Comissão não ter analisado o programa de resolução antes de o aprovar

110    As recorrentes alegam, em substância, que, atendendo ao prazo curto de que a Comissão dispôs para aprovar o programa de resolução, não teve condições para proceder a uma avaliação adequada dos aspetos discricionários desse programa, em violação dos princípios em matéria de delegação de poderes formulados pelo Acórdão de 13 de junho de 1958, Meroni/Alta Autoridade (9/56, EU:C:1958:7). Defendem que a Comissão se limitou a aprovar o programa de resolução, delegando ilegalmente o exercício do seu poder discricionário no CUR.

111    A Comissão alega que, a partir de 2 de maio de 2017, data na qual o CUR a informou de que o Banco Popular se deparava com problemas de liquidez e que poderia ser necessária uma medida de resolução, ficou ao corrente dos preparativos para todos os cenários possíveis. Esteve presente nos órgãos de decisão do CUR na qualidade de observador permanente, teve acesso a todos os documentos e os seus peritos auxiliaram o CUR na redação do programa de resolução. Por conseguinte, alega que podia efetuar a avaliação deste que lhe era exigida no prazo de que dispunha.

112    Importa referir que, no n.o 41 do Acórdão de 22 de janeiro de 2014, Reino Unido/Parlamento e Conselho (C‑270/12, EU:C:2014:18), o Tribunal de Justiça indicou que, no Acórdão de 13 de junho de 1958, Meroni/Alta Autoridade (9/56, EU:C:1958:7), tinha salientado, em substância, que as consequências resultantes de uma delegação de poderes eram muito diferentes consoante esta visasse, por um lado, poderes de execução claramente delimitados e cujo exercício, por esse facto, fosse suscetível de fiscalização rigorosa à luz de critérios objetivos fixados pela autoridade delegante ou, por outro, um «poder discricionário, que implica[sse] uma ampla liberdade de apreciação, suscetível de traduzir pela respetiva utilização uma verdadeira política económica».

113    O Tribunal de Justiça acrescentou ter igualmente indicado, no Acórdão de 13 de junho de 1958, Meroni/Alta Autoridade (9/56, EU:C:1958:7), que uma delegação do primeiro tipo não era suscetível de alterar sensivelmente as consequências decorrentes do exercício dos poderes que afetava, ao passo que uma delegação do segundo tipo, ao substituir as escolhas da autoridade delegada pelas da autoridade delegante, operava uma «verdadeira transferência da responsabilidade» (Acórdão de 22 de janeiro de 2014, Reino Unido/Parlamento e Conselho, C‑270/12, EU:C:2014:18, n.o 42).

114    A fim de apreciar o alcance do presente fundamento, é necessário precisar qual o procedimento de adoção das medidas de resolução instituído pelo Regulamento n.o 806/2014 e, em especial, qual o papel atribuído à Comissão.

115    A este respeito, refira‑se que o procedimento de adoção das medidas de resolução instituído pelo legislador no Regulamento n.o 806/2014 dava seguimento às observações formuladas pelo Serviço Jurídico do Conselho num parecer de 7 de outubro de 2013, relativo à proposta de regulamento da Comissão, que visava apreciar a compatibilidade do procedimento inicialmente previsto na proposta de regulamento com os princípios em matéria de delegação de poderes, conforme interpretados no Acórdão de 13 de junho de 1958, Meroni/Alta Autoridade (9/56, EU:C:1958:7).

116    Inicialmente, na proposta de regulamento examinada nesse parecer, a repartição de competências entre a Comissão e o CUR era diferente da que veio a ser adotada no Regulamento n.o 806/2014. Nomeadamente, a Comissão tinha o poder de colocar uma entidade sob resolução, estabelecer um quadro para a utilização dos instrumentos de resolução e decidir se e como deviam ser utilizados os poderes de redução e de conversão dos instrumentos de capital e o CUR, em conformidade com o quadro fixado pela Comissão, era competente para adotar as decisões dirigidas às autoridades nacionais de resolução.

117    No seu parecer, o Serviço Jurídico do Conselho referiu que determinadas medidas que o CUR podia incluir numa decisão de resolução não estavam definidas com suficiente precisão. O Serviço Jurídico do Conselho considerou que a sistemática geral e a estrutura da proposta de regulamento, na qual a Comissão adota a decisão de resolução de base e o CUR é obrigado a agir no âmbito dos critérios estabelecidos pela Comissão, eram conformes com o direito da União tal como interpretado no Acórdão de 13 de junho de 1958, Meroni/Alta Autoridade (9/56, EU:C:1958:7). Considerou, no entanto, que os poderes do CUR para aplicar os instrumentos de resolução e as suas decisões pareciam, em certa medida, de natureza discricionária e ir além do exercício de poderes puramente técnicos. Concluiu que, por conseguinte, poderia ser necessário incluir no regulamento outras disposições com o objetivo de enquadrar corretamente a aplicação pelo CUR dos instrumentos de resolução ou envolver no exercício desses poderes uma instituição da União investida de competências de execução.

118    O legislador da União, tendo em consideração este parecer do Serviço Jurídico do Conselho, alterou o mecanismo de adoção das medidas de resolução. Na medida em que a adoção de uma medida de resolução implica uma margem de apreciação discricionária, o legislador reservou essa competência a uma instituição e não ao CUR.

119    Isso resulta, em especial, dos considerandos 24 e 26 do Regulamento n.o 806/2014, que preveem:

«(24)      Dado que só as instituições da União podem estabelecer a política de resolução da União e que subsiste uma margem de poder discricionário na adoção de cada programa específico de resolução, é necessário prever o envolvimento adequado do Conselho e da Comissão como instituições que podem exercer competências de execução nos termos do artigo 291.o […] TFUE. A Comissão deverá avaliar os aspetos discricionários das decisões de resolução adotadas pelo CUR. Dado o impacto considerável das decisões de resolução sobre a estabilidade financeira dos Estados‑Membros e da União, bem como sobre a soberania orçamental dos Estados‑Membros, é importante que sejam conferidas ao Conselho competências de execução para tomar determinadas decisões relativas à resolução. Deverá, por conseguinte, ser o Conselho a exercer, sob proposta da Comissão, o controlo efetivo sobre a avaliação realizada pelo CUR quanto à existência de um interesse público e a avaliar qualquer alteração significativa do montante do Fundo a ser utilizado numa determinada medida de resolução. […]

(26)      […] Se considerar que estão preenchidos os fatores de desencadeamento das medidas de resolução, o CUR deverá adotar o programa de resolução. O procedimento relativo à adoção do programa de resolução, que envolve a Comissão e o Conselho, reforça a necessária independência operacional do CUR, respeitando simultaneamente o princípio de delegação de poderes nas agências tal como interpretado pelo Tribunal de Justiça da União Europeia […] Por conseguinte, o presente regulamento prevê que o programa de resolução adotado pelo CUR só entra em vigor se, no prazo de 24 horas após a sua adoção pelo CUR, não forem formuladas objeções pelo Conselho ou pela Comissão, ou o programa de resolução for aprovado pela Comissão. As razões com base nas quais o Conselho se pode opor, sob proposta da Comissão, ao programa de resolução do CUR deverão ser estritamente limitadas à existência de um interesse público e à alteração significativa pela Comissão do montante de utilização do Fundo proposto pelo CUR. […] Na qualidade de observador nas reuniões do CUR, a Comissão deverá verificar de forma permanente se o programa de resolução adotado pelo CUR é inteiramente conforme ao presente regulamento, garante o equilíbrio adequado entre os diferentes objetivos e interesses em causa, respeita o interesse público e se é preservada a integridade do mercado interno. Considerando que a medida de resolução requer um processo de tomada de decisão célere, o Conselho e a Comissão deverão cooperar estreitamente, não devendo o Conselho duplicar os trabalhos preparatórios já empreendidos pela Comissão […]»

120    Assim, no que respeita ao procedimento de resolução, o artigo 18.o, n.o 7, do Regulamento n.o 806/2014 prevê que a Comissão ou aprova o programa de resolução ou apresenta objeções sobre os seus aspetos discricionários e que um programa de resolução só pode entrar em vigor se o Conselho ou a Comissão não tiverem formulado objeções no prazo de vinte e quatro horas seguintes à sua transmissão pelo CUR.

121    Por conseguinte, em aplicação do artigo 18.o, n.o 7, do Regulamento n.o 806/2014, é necessário que uma instituição da União, a saber, a Comissão ou o Conselho, aprove o programa de resolução nos seus aspetos discricionários para que este produza efeitos jurídicos. O legislador da União confiou assim a uma instituição a responsabilidade jurídica e política de determinar a política da União em matéria de resolução, evitando assim uma «verdadeira transferência da responsabilidade» na aceção do Acórdão de 13 de junho de 1958, Meroni/Alta Autoridade (9/56, EU:C:1958:7).

122    Assim, a Comissão deve ter efetivamente avaliado aspetos discricionários do programa de resolução antes da sua entrada em vigor. Caso contrário, como alegam as recorrentes, a Comissão teria delegado ilegalmente o seu poder discricionário no CUR violando os princípios em matéria de delegação de poderes que decorrem do Acórdão de 13 de junho de 1958, Meroni/Alta Autoridade (9/56, EU:C:1958:7).

123    Se, como defendem as recorrentes, o programa de resolução entrou em vigor na sequência de uma aprovação da Comissão que não se baseava numa apreciação, mas numa simples validação, tal teria por consequência que o CUR apenas apreciasse os aspetos discricionários que implicam uma escolha de política económica e, portanto, a necessidade de aplicar a resolução, o que não estaria em conformidade com os princípios formulados no Acórdão de 13 de junho de 1958, Meroni/Alta Autoridade (9/56, EU:C:1958:7).

124    A este respeito, no considerando 4 da decisão recorrida, a Comissão indicou que estava de acordo com o programa de resolução, nomeadamente com as razões que o CUR tinha apresentado para justificar a necessidade de uma medida de resolução para defesa do interesse público.

125    Assim, a Comissão aprovou a decisão do CUR de submeter o Banco Popular a uma medida de resolução considerando, nomeadamente, que a escolha do instrumento de alienação da atividade era necessária e proporcionada para atingir os objetivos de assegurar a continuidade das funções críticas e evitar efeitos adversos significativos sobre a estabilidade financeira.

126    Com os seus argumentos, as recorrentes alegam que, atendendo à tramitação do processo, a Comissão se limitou a aprovar o programa de resolução, sem o analisar, delegando ilegalmente o exercício do seu poder discricionário no CUR.

127    Em primeiro lugar, as recorrentes alegam que o programa de resolução foi comunicado à Comissão em 7 de junho de 2017, às 5h13, e entrou em vigor no mesmo dia, às 6h30, e consideram que é impossível que, num prazo tão curto, a Comissão tenha cumprido cabalmente a sua obrigação de proceder a uma avaliação adequada dos aspetos discricionários do programa de resolução.

128    Em segundo lugar, as recorrentes referem que a ata da reunião da Comissão de 7 de junho de 2017 indica que o programa de resolução foi aprovado no termo de um procedimento escrito urgente. Segundo as recorrentes, a Direção‑Geral da Estabilidade Financeira, dos Serviços Financeiros e da União dos Mercados de capitais devia verificar se o CUR tinha chegado a conclusões adequadas a respeito dos aspetos discricionários do programa de resolução e devia, assim, recomendar à Comissão que aprovasse o programa de resolução. Esta recomendação deveria ter sido comunicada aos gabinetes dos Comissários, às direções‑gerais e ao Serviço Jurídico, fixando um prazo no qual as objeções deviam ser formuladas e, não havendo objeções, a decisão deveria ter sido considerada adotada em conformidade com o artigo 12.o do Regulamento Interno da Comissão. Consideram que é impossível que a Comissão, seguindo este processo em 77 minutos, proceda a uma análise adequada dos aspetos discricionários do programa de resolução. O artigo 18.o, n.o 7, do Regulamento n.o 806/2014 concedia‑lhe um prazo de 24 horas.

129    Há que concluir que as recorrentes não contestam que o programa de resolução devia ser adotado com urgência.

130    Resulta do artigo 30.o do Regulamento n.o 806/2014, por um lado, que o CUR informa a Comissão de qualquer ação por si adotada em preparação de um procedimento de resolução e, por outro lado, que, no exercício das respetivas responsabilidades no âmbito do presente regulamento, o CUR e, em especial, a Comissão cooperam estreitamente, nomeadamente no planeamento da resolução, na intervenção precoce e nas diferentes fases da resolução, e que devem fornecer um ao outro todas as informações necessárias para o exercício das suas funções.

131    Além do mais, o artigo 43.o, n.o 3, do Regulamento n.o 806/2014 prevê que a Comissão designa um representante habilitado a participar nas reuniões das sessões plenárias e das sessões executivas, na qualidade observador permanente e que o seu representante tem o direito de participar nos debates e tem acesso a todos os documentos.

132    Como indicam o CUR e a Comissão, esta última foi associada às diversas fases que precedem a adoção do programa de resolução desde maio de 2017, em conformidade com as suas obrigações decorrentes do Regulamento n.o 806/2014.

133    A este respeito, a Comissão especifica, na contestação, as diversas etapas da sua participação nas fases preparatórias da adoção do programa de resolução. Menciona, nomeadamente, diversas reuniões com o CUR a partir de 22 de maio de 2017 e reuniões diárias a partir de 30 de maio de 2017, a receção, em 6 e 7 de junho de 2017 de anteprojetos do programa de resolução transmitido pelo CUR e a atividade dos seus diversos serviços desde 6 de junho de 2017 às 17h30 até 7 de junho do mesmo ano às 5h13.

134    A Comissão também refere que, na qualidade de observador permanente, teve acesso a todos os documentos úteis à preparação do programa de resolução, designadamente aos respeitantes à situação financeira do Banco Popular, e que os seus peritos participaram na preparação do programa de resolução com o CUR, em especial na elaboração de um modelo de programa de resolução. Acrescenta que, desde 6 de junho de 2017, esses peritos se encontravam presentes nas instalações do CUR para o ajudar a redigir o programa de resolução.

135    A este respeito, em resposta a uma medida de organização do processo, em primeiro lugar, a Comissão apresentou uma lista de atas de reuniões do CUR, em sessão executiva, nas quais participou desde 22 de maio de 2017. Esta lista comprova a participação da Comissão em três reuniões, em 24 de maio, em 2 de junho e em 6 e 7 de junho de 2017. Em segundo lugar, a Comissão apresentou uma lista de relatórios internos informais dos seus serviços relacionados com a preparação do programa de resolução, de 22, 24 e 29 de maio e de 2 e 6 de junho de 2017. Em terceiro lugar, a Comissão apresentou várias mensagens de correio eletrónico trocadas entre os seus serviços e o CUR, datadas de 1, 3, 6 e 7 de junho de 2017, relativas à transmissão de modelos de resolução consoante o cenário de alienação da atividade e anteprojetos do programa de resolução. Essas mensagens de correio eletrónico comprovam, nomeadamente, a receção pela Comissão de anteprojetos do programa de resolução em 6 de junho de 2017 às 18h59 e em 7 de junho de 2017 às 0h33.

136    Daí resulta que os serviços da Comissão participaram em várias reuniões com o CUR e que esta teve conhecimento e participou na redação dos anteprojetos de programa de resolução antes de 7 de junho de 2017 às 5h13.

137    Na audiência, as recorrentes admitiram que a Comissão tinha participado nas fases preparatórias da adoção do programa de resolução. No entanto, alegaram que a Comissão não tinha feito prova de que os debates tinham tido por objeto a versão definitiva do programa de resolução.

138    Ora, atendendo à sua participação nas fases preparatórias da adoção do programa de resolução, a Comissão já tinha conhecimento das dificuldades enfrentadas pelo Banco Popular, das medidas previstas pelo CUR para as sanar e do conteúdo essencial do programa de resolução. Por conseguinte, as recorrentes não podem alegar que não tinha tido tempo de proceder à avaliação do programa de resolução. O facto de os debates nas fases preparatórias não terem incidido sobre a redação definitiva do programa de resolução é, a este respeito, indiferente.

139    Daqui resulta que este fundamento assenta numa hipótese errada das recorrentes de a intervenção da Comissão nas fases preparatórias da adoção do programa de resolução se ter limitado ao intervalo que decorreu entre a transmissão pelo CUR do programa de resolução, em 7 de junho de 2017 às 5h13, e a sua aprovação pela Comissão.

140    Por conseguinte, na medida em que se apoia numa hipótese errada, há que rejeitar o argumento das recorrentes de que a Comissão se teria limitado a aprovar o programa de resolução sem proceder a uma avaliação adequada dos aspetos discricionários desse programa, violando os princípios em matéria de delegação de poderes.

141    Esta conclusão não é posta em causa pelos restantes argumentos das recorrentes.

142    Quanto ao argumento das recorrentes de que os pormenores do programa de resolução eram diferentes dos previstos no plano de resolução adotado em aplicação do artigo 8.o do Regulamento n.o 806/2014 e aprovado em dezembro de 2016, basta observar que é inoperante. Com efeito, o programa de resolução adotado pelo CUR e aprovado pela Comissão não se baseia nesse plano, como indicado nos considerandos 44 a 46 do programa de resolução.

143    Quanto ao argumento das recorrentes de que o artigo 18.o, n.o 7, do Regulamento n.o 806/2014 concede um prazo de 24 horas à Comissão para adotar o programa de resolução, basta referir que se trata do prazo máximo. Como salienta a Comissão, um prazo de 24 horas corresponde ao prazo mais longo de que pode dispor quando a resolução ocorre durante um fim de semana. Ora, quando, como no presente caso, a insolvência da instituição de crédito ocorre num dia de semana, deve ser adotada uma medida de resolução durante a noite a fim de assegurar a continuidade das funções críticas dessa instituição. Assim, o programa de resolução tinha que ser adotado com urgência antes de 7 de junho de 2017 às 7 horas, hora da abertura dos mercados.

144    Por conseguinte, o primeiro fundamento deve ser julgado improcedente.

 Quanto ao segundo fundamento, relativo à violação do dever de fundamentação

145    As recorrentes alegam que a fundamentação da decisão recorrida constante do considerando 4 é insuficiente. Em primeiro lugar, alegam que o considerando 4 dessa decisão remete de um modo geral para as razões apresentadas pelo CUR, sem indicar um motivo particular ou disposições específicas do programa de resolução. Em segundo lugar, as «razões» relativas ao critério do interesse público nada revelam sobre a avaliação efetuada pela Comissão, simplesmente aprovam o programa de resolução. Em terceiro lugar, a decisão recorrida não contém nenhuma fundamentação relativa aos aspetos discricionários do programa de resolução que a Comissão era obrigada a avaliar. A Comissão ter‑se‑ia limitado a declarar que aprovava o programa de resolução, sem dar uma explicação ou fundamentação suplementares.

146    Segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, a fundamentação exigida pelo artigo 296.o TFUE deve ser adaptada à natureza do ato em causa e revelar, de forma clara e inequívoca, a argumentação da instituição autora do ato, por forma a permitir aos interessados conhecerem as razões da medida adotada e ao órgão jurisdicional competente exercer a sua fiscalização. Não é necessário que a fundamentação especifique todos os elementos de facto e de direito pertinentes, na medida em que a questão de saber se a fundamentação de um ato cumpre as exigências do artigo 296.o TFUE deve ser apreciada à luz não somente do seu teor literal mas também do seu contexto e do conjunto das normas jurídicas que regem a matéria em causa (v. Acórdãos de 8 de maio de 2019, Landeskreditbank Baden‑Württemberg/BCE, C‑450/17 P, EU:C:2019:372, n.os 85 e 87 e jurisprudência referida, e de 21 de outubro de 2020, BCE/Estate of Espírito Santo Financial Group, C‑396/19 P, não publicado, EU:C:2020:845, n.o 41 e jurisprudência referida).

147    Além disso, o grau de precisão da fundamentação de um ato deve ser proporcionado às possibilidades materiais e às condições técnicas ou de prazo em que este deve ser adotado (v. Acórdãos de 6 de novembro de 2012, Éditions Odile Jacob/Comissão, C‑551/10 P, EU:C:2012:681, n.o 48 e jurisprudência referida, e de 23 de maio de 2019, KPN/Comissão, T‑370/17, EU:T:2019:354, n.o 139 e jurisprudência referida, Acórdão 27 de janeiro de 2021, KPN/Comissão, T‑691/18, não publicado, EU:T:2021:43, n.o 162).

148    Importa referir que resulta do considerando 4 da decisão recorrida que:

«A Comissão concorda com o programa de resolução. Em especial, concorda com os motivos, invocados pelo CUR, pelos quais a resolução é necessária para a defesa do interesse público em conformidade com o artigo 5.o do Regulamento n.o 806/2014.»

149    Além do mais, por um lado, no considerando 2 da decisão recorrida, a Comissão referiu o facto de o CUR ter indicado, no programa de resolução, que todas as condições de abertura de um procedimento de resolução enunciadas no artigo 18.o, n.o 1, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 806/2014 se encontravam preenchidas no que respeitava ao Banco Popular e que tinha avaliado as razões pelas quais era necessária uma medida de resolução para defesa do interesse público. Por outro lado, no considerando 3 da decisão recorrida, a Comissão referiu que o programa de resolução, em conformidade como artigo 18.o, n.o 6, do Regulamento n.o 806/2014, colocava o Banco Popular sob resolução e determinava a aplicação do instrumento de alienação da atividade e que enunciava igualmente as razões pelas quais todos estes elementos eram suficientes.

150    Daqui resulta que a Comissão, na decisão recorrida, referiu expressamente os motivos pelos quais o CUR considerou que as condições para a adoção do programa de resolução se encontravam preenchidas e que era necessário aplicar o instrumento de alienação da atividade. Assim, a aprovação do programa de resolução constante do considerando 4 da decisão recorrida deve ser lida à luz desses outros considerandos e diz respeito a todos esses motivos. Nesse considerando, a Comissão indicou expressamente que estava de acordo com os motivos constantes do programa de resolução que justificavam a adoção de uma medida de resolução relativamente ao Banco Popular, especialmente quanto ao critério do interesse público. Assim, contrariamente ao que alegam as recorrentes, a Comissão referiu expressamente, na decisão recorrida, os aspetos discricionários do programa de resolução, designadamente a observância do critério do interesse público.

151    Assim, há que considerar que o programa de resolução e a respetiva fundamentação fazem parte do contexto em que foi adotada a decisão recorrida.

152    Ora, como salienta a Comissão, as recorrentes não alegam que o programa de resolução não estava suficientemente fundamentado.

153    Além disso, importa recordar que, nos termos do artigo 18.o, n.o 7, do Regulamento n.o 806/2014, a Comissão «aprova» o programa de resolução ou apresenta objeções sobre os aspetos discricionários deste.

154    Daqui resulta que, quando a Comissão, como no presente caso, aprova o programa de resolução, a fundamentação da sua decisão pode limitar‑se a indicar que está de acordo com os motivos constantes do mesmo. Qualquer outra justificação suplementar da sua aprovação só pode consistir numa reprodução dos elementos já constantes do programa de resolução. Ora, segundo o artigo 18.o, n.o 7, do Regulamento n.o 806/2014, a Comissão não tem que repetir a análise do CUR na sua decisão, mas apenas aprová‑la.

155    Por outro lado, em conformidade com a jurisprudência acima referida no n.o 147, importa ter em conta que, a partir da comunicação do programa de resolução pelo CUR, a Comissão dispõe de um prazo muito curto, nos termos do artigo 18.o, n.o 7, do Regulamento n.o 806/2014, para adotar a sua decisão.

156    Daqui resulta que há que considerar suficiente para justificar uma aprovação, uma fundamentação em que a Comissão indique que está de acordo com o conteúdo do programa de resolução e com os motivos apresentados pelo CUR para justificar a sua adoção.

157    Por conseguinte, o segundo fundamento deve ser julgado improcedente.

 Quanto ao terceiro fundamento, relativo à violação das obrigações de segredo profissional e da boa administração

158    As recorrentes invocam uma violação do princípio da confidencialidade e do segredo profissional previsto no artigo 339.o TFUE, bem como do direito a uma boa administração, consagrado no artigo 41.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta»).

159    Segundo as recorrentes, a entrevista concedida em 23 de maio de 2017 pela presidente do CUR ao canal de televisão Bloomberg e o artigo da Reuters de 31 de maio de 2017, acima referido no n.o 42, constituem uma violação do dever de confidencialidade e de segredo profissional, imputável ao CUR ou à Comissão. Alegam que as divulgações de 23 e 31 de maio de 2017 provocaram a grave crise de liquidez do Banco Popular e, por conseguinte, levaram à sua resolução. As recorrentes invocam um cenário contrafactual segundo o qual, se não tivessem existido essas divulgações e, portanto, a crise de liquidez, o programa de resolução não teria sido adotado ou teria tido um conteúdo diferente.

160    A Comissão alega que, para que um programa de resolução seja adotado e aprovado, basta que as condições da resolução estejam preenchidas e que as razões que deram origem a essa situação não afetem a validade da decisão recorrida. O CUR também alega que os acontecimentos invocados pelas recorrentes não podem afetar a legalidade da decisão recorrida, na medida em que a questão de saber o que está na origem da insolvência do Banco Popular não é pertinente.

161    Há que referir que, mesmo que se admita que as recorrentes tivessem demonstrado que o CUR ou a Comissão tinham divulgado à imprensa informações confidenciais, segundo jurisprudência assente, uma irregularidade deste género pode ocasionar a anulação da decisão em causa se se demonstrar que, na ausência desta irregularidade, a referida decisão teria tido um conteúdo diferente (v. Acórdãos de 6 de julho de 2000, Volkswagen/Comissão, T‑62/98, EU:T:2000:180, n.o 283 e jurisprudência referida, de 5 de abril de 2006, Degussa/Comissão, T‑279/02, EU:T:2006:103, n.o 416 e jurisprudência referida, e de 3 de março de 2011, Siemens/Comissão, T‑110/07, EU:T:2011:68, n.o 402 e jurisprudência referida).

162    A este respeito, como alegam a Comissão e o CUR, um programa de resolução é validamente adotado quando as condições previstas pelo Regulamento n.o 806/2014 estão preenchidas, quaisquer que sejam os motivos que levaram a entidade em causa a uma situação ou risco de insolvência.

163    Ora, as recorrentes não contestam que as condições previstas pelo artigo 18.o do Regulamento n.o 806/2014 estivessem preenchidas à data da adoção do programa de resolução.

164    Assim, o CUR, considerando que as condições previstas pelo artigo 18.o, n.o 1, do Regulamento n.o 806/2014 estavam preenchidas, adotou o programa de resolução e a Comissão, considerando que o programa de resolução estava em conformidade com as disposições do Regulamento n.o 806/2014, aprovou‑o. As circunstâncias que levaram a que o que Banco Popular preenchesse as condições que justificam a adoção do programa de resolução, nomeadamente a condição de estar em situação ou risco de insolvência, não são pertinentes.

165    Consequentemente, um pretenso nexo de causalidade, invocado pelas recorrentes, entre as divulgações de 23 e 31 de maio de 2017 e a crise de liquidez do Banco Popular é irrelevante e não pode levar à anulação da decisão recorrida.

166    Daqui resulta que é igualmente inoperante o argumento, invocado pelas recorrentes na audiência, segundo o qual a Comissão violou o princípio da boa administração ao aprovar o programa de resolução enquanto a resolução do Banco Popular resultava do facto de o CUR ter violado os seus deveres de confidencialidade e de segredo profissional.

167    De resto, as recorrentes não podem validamente alegar que as divulgações de 23 e 31 de maio de 2017 provocaram a grave crise de liquidez do Banco Popular e que, caso não tivesse existido divulgação ilegal e, assim, a crise de liquidez no início de junho de 2017, a resolução do Banco Popular não teria sido necessária ou teria sido diferente.

168    Esses argumentos assentam numa apresentação parcial e errada dos factos na origem da crise de liquidez do Banco Popular e das causas que conduziram à sua situação ou risco de insolvência.

169    Assim, recorde‑se que, na sua avaliação sobre a situação ou risco de insolvência do Banco Popular, acima referida nos n.os 53 a 61, o BCE mencionou os diversos acontecimentos que estão na origem da deterioração da situação de liquidez do Banco Popular.

170    No considerando 24 do programa de resolução, o CUR citou outras circunstâncias que levaram à rápida deterioração da situação de liquidez do Banco Popular, a saber:

–        em fevereiro de 2017, o Banco Popular anunciou uma necessidade de provisões excecionais no montante de 5 700 milhões de euros, conducentes a uma perda consolidada de 3 485 milhões de euros, e nomeou um novo presidente;

–        em 10 de fevereiro de 2017, a DBRS baixou a notação do Banco Popular;

–        em 3 de abril de 2017, o Banco Popular fez uma declaração pública ad hoc que informava sobre o resultado de auditorias internas que tinham potencialmente um impacto significativo nas suas demonstrações financeiras e confirmou a substituição do seu diretor‑geral menos de um ano depois da sua entrada em funções;

–        em 7 de abril de 2017 e em 21 de abril, respetivamente, a Standard & Poor’s e a Moody’s baixaram a notação do Banco Popular;

–        em 12 de maio de 2017, o Banco Popular violou a exigência de cobertura das necessidades de liquidez de 80 % e não conseguiu restabelecer a conformidade subsequente com o limite regulamentar;

–        a cobertura mediática negativa e contínua dos resultados financeiros do Banco Popular e sobre o alegado risco iminente de insolvência ou de iliquidez causou um aumento dos levantamentos de depósitos;

–        em 6 de junho de 2017, a DBRS e a Moody’s baixaram a notação do Banco Popular.

171    O CUR salientou que todas essas circunstâncias tinham causado grandes levantamentos de depósitos.

172    Resulta destes factos, não impugnados pela recorrente, que a situação do Banco Popular já se tinha degradado muito antes de 23 de maio de 2017 e que a crise de liquidez do Banco Popular era causada por múltiplos fatores, que tinham origem nos maus resultados do banco anunciados em fevereiro e abril de 2017. Em especial, a exigência de cobertura das necessidades de liquidez do Banco Popular não respeitava as exigências legais desde 12 de maio de 2017.

173    Refira‑se que as recorrentes não podem ignorar todas as circunstâncias objetivas que causaram os problemas de liquidez do Banco Popular, especialmente desde abril de 2017. Não podem validamente alegar que a declaração de 23 de maio de 2017 e o artigo de 31 de maio de 2017, mesmo admitindo que tivessem origem numa violação do princípio da confidencialidade por parte do CUR ou da Comissão, deram origem à crise de liquidez do Banco Popular e que, sem essas declarações, a resolução não teria sido necessária.

174    Daqui resulta que assenta numa premissa errada o cenário contrafactual invocado pelas recorrentes e constante do seu relatório de peritagem junto à petição inicial, destinado a demonstrar que, se não tivesse existido qualquer divulgação ilegal e fuga e, portanto, crise de liquidez no início de junho de 2017, a resolução do Banco Popular não teria sido necessária ou teria sido diferente.

175    Na medida em que as soluções previstas no relatório de peritagem junto à petição inicial se baseiam na hipótese puramente teórica de o Banco Popular não ter tido de enfrentar uma crise de liquidez e encaram a hipótese de que o Banco Popular teria tido de enfrentar uma falta de capitais, há que considerar que esse cenário contrafactual não é pertinente.

176    Daí resulta igualmente que não é pertinente para a decisão da causa o novo oferecimento de prova apresentado pelas recorrentes na Secretaria do Tribunal Geral em 31 de outubro de 2019, nos termos do artigo 85.o, n.o 3, do Regulamento de Processo, que consistia numa carta da Pacific Investment Management Company LLC (PIMCO), de 30 de maio de 2017, dirigida ao Deutsche Bank, e relativo à existência de uma solução alternativa à resolução no âmbito desse cenário contrafactual.

177    De qualquer modo, as recorrentes não demonstraram a existência de uma violação do dever de confidencialidade ou de segredo profissional imputável à Comissão.

178    Numa primeira alegação, as recorrentes alegam que o legislador da União dotou o CUR de significativos poderes de resolução dos bancos e que o mero facto de se deixar transparecer que este estava a examinar uma entidade específica para avaliar da necessidade de aplicar os seus poderes em relação à mesma constitui uma ocorrência importante para o mercado, que leva os investidores, os credores e os depositantes a tomarem medidas de proteção para evitar as perdas. Por conseguinte, a estrita observância pelo CUR do princípio do segredo profissional seria essencial e o artigo 88.o, n.o 1, do Regulamento n.o 806/2014 impõe um dever de segredo profissional ao CUR e aos seus funcionários.

179    A este respeito, alegam que a entrevista concedida em 23 de maio de 2017 pela presidente do CUR ao canal de televisão Bloomberg, segundo a qual o CUR «vigiava» o Banco Popular, constituía uma informação de que examinava o banco, na aceção do considerando 116 do Regulamento n.o 806/2014, e é imputável ao CUR. Entendem, por conseguinte, com essa declaração o CUR violou os deveres de segredo profissional e da boa administração.

180    Refira‑se que, com esta alegação, as recorrentes invocam uma violação dos deveres de segredo profissional e de confidencialidade que teria sido cometida pelo CUR e não pela Comissão. Ora, uma vez que o CUR não é parte no presente litígio, esta alegação deve ser julgada inoperante.

181    A este respeito, por carta apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 4 de junho de 2021, as recorrentes apresentaram um oferecimento de prova respeitante, por um lado, a um Despacho do Juzgado Central de Instruccion n.o 4 da Audiencia Nacional (Tribunal Central de Instrução n.o 4 da Audiência Nacional, Espanha), de 19 de maio de 2021, que prevê a audição da presidente do CUR quanto às suas declarações na entrevista concedida ao Bloomberg e, por outro lado, um artigo de elconfidencial, de 27 de maio de 2021, no qual se referia que o presidente do FROB, no âmbito do mesmo processo na Audiencia Nacional (Audiência Nacional), se queixou das mesmas declarações da presidente do CUR.

182    Basta salientar que esses documentos relativos ao CUR, e não à Comissão, não são pertinentes para a decisão da presente causa.

183    Numa segunda alegação, as recorrentes alegam que um artigo publicado pela Reuters em 31 de maio de 2017 citando um «funcionário da União», segundo o qual o CUR acompanhava o Banco Popular «com vista a uma eventual intervenção», constitui uma violação do dever de segredo profissional imputável ao CUR ou a funcionários de outras instituições da União, como a Comissão, e uma violação do direito a uma boa administração.

184    A este respeito, por idêntico motivo ao constante do n.o 180, supra, os argumentos das recorrentes, que visam imputar ao CUR as afirmações atribuídas a um funcionário da União anónimo, relatadas nesse artigo, e demonstrar que este teria agido em violação do artigo 88.o do Regulamento n.o 806/2014, devem ser julgados inoperantes.

185    O artigo 339.o TFUE prevê:

«Os membros das instituições da União, os membros dos Comités, bem como os funcionários e agentes da União são obrigados, mesmo após a cessação das suas funções, a não divulgar as informações que, por sua natureza, estejam abrangidas pelo segredo profissional, designadamente as respeitantes às empresas e respetivas relações comerciais ou elementos dos seus preços de custo.»

186    Segundo a jurisprudência, embora esta disposição tenha sobretudo em vista as informações recolhidas nas empresas, o advérbio «designadamente» mostra que se trata de um princípio geral que se aplica também a outras informações confidenciais (v., por analogia, Acórdão de 3 de março de 2011, Siemens/Comissão, T‑110/07, EU:T:2011:68, n.o 400 e jurisprudência referida).

187    Por outro lado, do considerando 116 do Regulamento n.o 806/2014 resulta que:

«As medidas de resolução deverão ser devidamente notificadas e, salvas as exceções restritas estabelecidas no presente regulamento, tornadas públicas. No entanto, dado que as informações obtidas pelo CUR, pelas autoridades nacionais de resolução e os seus consultores profissionais durante o procedimento de resolução serão provavelmente sensíveis, essas informações deverão ser sujeitas a requisitos em matéria de segredo profissional até à divulgação da decisão de resolução. É necessário ter em conta que a informação sobre o teor e os pormenores dos planos de resolução e os resultados de qualquer avaliação desses planos podem ter efeitos de grande alcance, nomeadamente nas empresas em causa. Dever‑se‑á presumir que qualquer informação fornecida a propósito de uma decisão antes de esta ser tomada, seja sobre se as condições para a resolução estão reunidas, seja sobre a utilização de um instrumento específico ou de qualquer medida durante o processo, tem efeitos sobre os interesses públicos e privados afetados pela ação. Contudo, a informação de que o CUR e a autoridade nacional de resolução estão a examinar uma entidade específica pode ser suficiente para ter efeitos negativos para essa entidade. Por conseguinte, é necessário assegurar que existam mecanismos adequados para manter a confidencialidade dessa informação, como o teor e os pormenores dos planos de resolução e os resultados de qualquer avaliação realizada nesse contexto.»

188    Importa lembrar o conteúdo do artigo publicado pela Reuters em 31 de maio de 2017, intitulado «UE alertada contra o risco de resolução do Banco Popular» (EU warned of wind‑down risk for Spain’s Banco Popular). Esse artigo refere que, segundo um funcionário da União que permaneceu anónimo, um dos principais supervisores dos bancos na Europa tinha alertado os funcionários da União de que o Banco Popular poderia ser liquidado se não conseguisse encontrar um adquirente e que a presidente do CUR tinha recentemente emitido um «alerta rápido». Segundo o mesmo artigo, esse funcionário indicou igualmente que a presidente do CUR tinha declarado que o CUR acompanhava o processo (Banco Popular) com especial atenção com vista a uma eventual intervenção e acrescentou que a proposta de fusão do banco poderia ser infrutífera.

189    Este artigo da Reuters refere igualmente que, segundo outra fonte, também anónima, estavam em curso preparativos gerais, apesar de ainda não ter sido adotada nenhuma medida concreta. Segundo esse artigo, um porta‑voz do Banco Popular tinha declarado que o banco trabalhava em vários planos, incluindo uma fusão, um aumento de capital e vendas de ativos.

190    Refira‑se igualmente que esse artigo menciona o comunicado de imprensa do CUR do mesmo dia, no qual este indicou que não comentava as dificuldades específicas de um banco, que não podia confirmar as interpretações relativas às alegadas citações feitas pela sua presidente e que nunca emitia qualquer alerta a propósito dos bancos.

191    Há que considerar que as recorrentes não invocam nenhum argumento suscetível de demonstrar que esse artigo tem origem numa violação do segredo profissional imputável à Comissão.

192    Em primeiro lugar, as afirmações desse funcionário da União, relatadas no referido artigo, não eram relativas a informações confidenciais que só pudessem ser do conhecimento de membros da Comissão.

193    Assim, em primeiro lugar, quanto à afirmação desse funcionário que tinha sido informado de que o Banco Popular poderia ser liquidado se não conseguisse encontrar um adquirente, basta observar que essa informação já era pública.

194    Com efeito, como acima se refere nos n.os 40 a 42, vários artigos na imprensa já mencionavam, ao longo do mês de maio, o facto de o Banco Popular estar em dificuldades e de ter dado início a um processo de venda privada.

195    De um artigo de 11 de maio de 2017, publicado no sítio Internet elconfidencial.com, resulta, nomeadamente, que o presidente do Banco Popular tinha ordenado a venda urgente do banco devido a um risco de insolvência. A referência, no artigo de 31 de maio de 2017, ao facto de os funcionários da União terem sido informados por «um dos principais fiscalizadores dos bancos na Europa», parece corresponder à informação dada nesse artigo, segundo a qual, devido a um risco sério de insolvência, nomeadamente, por causa da fuga contínua dos depósitos, o presidente do Banco Popular tinha sido obrigado a levar a cabo o processo de venda para cumprir as exigências do BCE. Além disso, um artigo de 15 de maio de 2017, publicado no sítio Internet elconfidencial.com, indicava que o plano de venda do Banco Popular tinha sido levado a cabo pelo seu presidente após a inspeção do BCE.

196    Em segundo lugar, o funcionário teria mencionado um «alerta rápido» emitido pela presidente do CUR. Ora, basta referir que essa afirmação não corresponde a uma competência do CUR, o que, de resto, este recordou no seu comunicado de imprensa de 31 de maio de 2017.

197    Em terceiro lugar, quanto à afirmação desse funcionário de que «a presidente do CUR tinha declarado que o CUR seguia o procedimento (Banco Popular) com especial atenção para uma possível intervenção», basta observar que essas afirmações reproduzem o que a presidente do CUR tinha afirmado publicamente na sua entrevista ao canal de televisão Bloomberg em 23 de maio de 2017, a saber, que o Banco Popular estava a ser «vigiado». Além do mais, a interpretação dada a estas afirmações foi desmentida pelo CUR no seu comunicado de imprensa.

198    Além disso, o facto de esse artigo referir alegadas palavras da Presidente do CUR não basta para demonstrar a sua autenticidade, tanto mais que a própria pessoa que alegadamente relata essas palavras não é identificada.

199    Em quarto lugar, quanto à afirmação desse funcionário de que a proposta de fusão do banco poderia ser infrutífera, resulta desse mesmo artigo que o próprio Banco Popular tinha indicado que devia adiar a data‑limite inicialmente fixada para 10 de junho de 2017 para apresentar propostas no âmbito do processo de venda privada.

200    Assim, a eventualidade de o processo de venda privada iniciado em abril de 2017 poder ser infrutífero não pode ser considerada uma informação confidencial, mas sim uma simples dedução decorrente das circunstâncias, a saber, que, em 31 de maio de 2017, o Banco Popular ainda não tinha encontrado adquirente no âmbito desse processo e que a data de encerramento desse processo tinha sido adiada.

201    Daí resulta que, contrariamente ao que alegam as recorrentes, as afirmações do funcionário da União que permaneceu anónimo relatadas nesse artigo não contêm informações confidenciais relativas à aplicação de um procedimento de resolução ao Banco Popular, como as referidas no considerando 116 do Regulamento n.o 806/2014, que só pudessem ser do conhecimento de funcionários da Comissão.

202    Em segundo lugar, as recorrentes não demonstraram que o funcionário da União referido nesse artigo seria um funcionário da Comissão.

203    Com efeito, há que considerar que muitas outras pessoas além dos membros do CUR ou dos funcionários da Comissão podiam fazer essas afirmações, tendo em conta, nomeadamente, as possibilidades de troca de informações previstas, nomeadamente, no artigo 88.o, n.o 6, do Regulamento n.o 806/2014.

204    A este respeito, refira‑se que as recorrentes admitem que a fuga de 31 de maio de 2017 deve ser imputável ao CUR ou a funcionários de outras instituições, como a Comissão, que tinham conhecimento das informações recebidas do CUR. Além disso, as recorrentes limitam‑se a afirmar que a imputação das afirmações contidas nesse artigo a um funcionário da União é «plausível». Por conseguinte, as recorrentes não se podem basear na jurisprudência segundo a qual o Tribunal Geral imputa uma fuga a uma instituição ou a uma agência da União se for evidente que só pode provir da mesma.

205    Importa igualmente rejeitar o argumento das recorrentes de que, uma vez que o facto de o Banco Popular ir ser objeto de uma resolução só era do conhecimento de um número restrito de pessoas no CUR e na Comissão, a única conclusão lógica seria a de que essas informações provinham destas instituições. Estas últimas não tinham, aliás, apresentado nenhuma prova para demonstrar o contrário.

206    Com efeito, admitindo‑se que as afirmações relatadas nesse artigo tivessem origem numa fuga por parte de um funcionário da União e que desse artigo se pudesse inferir que estava prevista uma resolução do Banco Popular, na medida em que não está demonstrado que os serviços da Comissão são responsáveis pela fuga de informações reveladas pelo artigo de imprensa a que as recorrentes se referem, resulta da jurisprudência que essa origem da fuga não se pode presumir (v., neste sentido, Acórdão 15 de março de 2006, BASF/Comissão, T‑15/02, EU:T:2006:74, n.o 605).

207    Além disso, mesmo no caso de ser provável que a Comissão possa ter dado origem a essa fuga, essa eventualidade, só por si, não basta, como pretendem as recorrentes, para fazer recair sobre a Comissão o ónus de provar o contrário (v., neste sentido, Acórdão de 5 de abril de 2006, Degussa/Comissão, T‑279/02, EU:T:2006:103, n.o 412).

208    No presente caso, não existe nenhuma presunção de que a Comissão teria dado origem à alegada fuga de informações e não lhe cabe demonstrar que não o fez.

209    Por conseguinte, devem ser julgados inoperantes os argumentos das recorrentes relativos ao facto de a Comissão não ter investigado a origem da fuga de 31 de maio de 2017 nem apresentado prova de que essa fuga não lhe era imputável.

210    Com efeito, por um lado, em caso algum se pode inferir da inexistência de um inquérito interno a prova da violação pela Comissão das suas obrigações de confidencialidade. Por outro lado, o facto de a Comissão não ter procedido a um inquérito interno para determinar a origem de potenciais fugas de informação, posteriormente à adoção da decisão de resolução, não é relevante para a apreciação da legalidade da decisão recorrida.

211    A este respeito, por carta apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 16 de outubro de 2020, as recorrentes apresentaram um novo oferecimento de prova nos termos do artigo 85.o, n.o 3, do Regulamento de Processo. Esse oferecimento de prova refere‑se a duas mensagens de correio eletrónico internas do CUR de 10 e 18 de agosto de 2017 relativas a uma potencial fuga de informações na origem do artigo da Reuters de 31 de maio de 2017. As recorrentes alegam que essas novas provas confirmam que o CUR não procurou investigar corretamente a fuga de 31 de maio, mas limitou‑se, em substância, a resumir as medidas de confidencialidade em vigor no CUR.

212    Na medida em que essas novas provas se referem apenas ao CUR e não são suscetíveis de demonstrar que a alegada fuga de informações que deu origem ao artigo da Reuters de 31 de maio de 2017 é imputável à Comissão, devem ser consideradas irrelevantes para a decisão da causa.

213    Resulta do exposto que os recorrentes não demonstraram a existência de uma violação pela Comissão do princípio da confidencialidade e do segredo profissional.

214    Por conseguinte, improcede o terceiro fundamento.

 Quanto ao quarto fundamento, relativo a erros manifestos de apreciação na aplicação dos artigos 14.o, 18.o, 20.o a 22.o e 24.o do Regulamento n.o 806/2014

215    As recorrentes alegam que a avaliação 2 efetuada pela Deloitte não era «justa, prudente e realista» na aceção do artigo 20.o, n.o 1, do Regulamento n.o 806/2014. Por conseguinte, consideram que a avaliação 2 não podia fundamentar a decisão recorrida e que o CUR e a Comissão cometeram um erro manifesto quando consideraram que o programa de resolução estava em conformidade com as exigências dos artigos 14.o, 18.o, 20.o a 22.o e 24.o do Regulamento n.o 806/2014.

216    Na réplica, as recorrentes explicam que, com este fundamento, alegam que uma vez que a avaliação 2 está manifestamente errada à luz do artigo 20.o do Regulamento n.o 806/2014, o programa de resolução adotado com base nessa avaliação é ilegal.

217    Como refere a Comissão, as recorrentes não invocam nenhum argumento específico relativo a erros manifestos que teria cometido na aplicação dos artigos 14.o, 18.o, 21.o, 22.o e 24.o do Regulamento n.o 806/2014.

218    Por conseguinte, há que considerar que, com este fundamento, as recorrentes limitam‑se a alegar que a avaliação 2 não era «justa, prudente e realista» na aceção do artigo 20.o, n.o 1, do Regulamento n.o 806/2014 e que, por conseguinte, a Comissão cometeu um erro manifesto de apreciação ao aprovar o programa de resolução na parte em que se baseia na avaliação 2.

219    No presente caso, importa lembrar que a avaliação do Banco Popular realizada antes da adoção do programa de resolução, contém dois relatórios anexos ao programa de resolução.

220    A avaliação 1, datada de 5 de junho de 2017, foi redigida pelo CUR em aplicação do artigo 20.o, n.o 5, alínea a), do Regulamento n.o 806/2014 e tinha por objetivo fornecer os elementos que permitissem determinar se estavam preenchidas as condições para acionar um procedimento de resolução, conforme definidas no artigo 18.o, n.o 1, do Regulamento n.o 806/2014.

221    A avaliação 2, datada de 6 de junho de 2017, foi redigida pela Deloitte na qualidade de perito independente em aplicação do artigo 20.o, n.o 10, do Regulamento n.o 806/2014.

222    O programa de resolução indica que, tendo em conta a urgência, a avaliação 2, realizada em conformidade com o artigo 20.o, n.o 10, do Regulamento n.o 806/2014, tinha por objetivo estimar o valor do ativo e do passivo do Banco Popular, fornecer uma estimativa sobre o tratamento de que os acionistas e credores teriam beneficiado se o Banco Popular tivesse sido objeto de um processo normal de insolvência e fornecer elementos que permitissem tomar a decisão relativa às ações e títulos de propriedade a transferir e permitir ao CUR determinar as condições comerciais para efeitos do instrumento de alienação de atividade.

223    Na avaliação 2, a Deloitte indicou ter‑se baseado nas exigências do artigo 36.o da Diretiva 2014/59 (correspondente ao artigo 20.o do Regulamento n.o 806/2014) e no capítulo 3.o do projeto definitivo de normas técnicas de regulamentação da Autoridade Bancária Europeia (ABE) n.os 2017/05 e 2017/06, de 23 de maio de 2017, relativa à avaliação para efeitos da resolução e à avaliação com vista a determinar a diferença de tratamento na sequência da resolução prevista na Diretiva 2014/59.

224    O artigo 36.o, n.o 15, da Diretiva 2014/59 autoriza a ABE a elaborar projetos de normas técnicas de regulamentação com vista a precisar os critérios com base nos quais devem ser efetuadas as avaliações num procedimento de resolução.

225    O capítulo 3 do projeto definitivo de normas técnicas de regulamentação da ABE, acima referido no n.o 223, refere‑se ao projeto de normas técnicas de regulamentação n.o 2017/05 sobre a avaliação para efeitos de resolução (a seguir «normas técnicas de regulamentação») e contém, nomeadamente, em conformidade com o artigo 36.o, n.o 15, da Diretiva 2014/59, um projeto de regulamento delegado da Comissão que completa a Diretiva 2014/59 através de normas técnicas de regulamentação que precisem os critérios do método a utilizar para avaliar o ativo e o passivo das instituições ou entidades.

226    Além disso, refira‑se que, à data da resolução, essas normas técnicas de regulamentação não eram vinculativas, na medida em que o artigo 5.o, n.o 2, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 806/2014 prevê que o CUR, o Conselho e a Comissão estão sujeitos às normas técnicas de regulamentação e de execução vinculativas elaboradas pela ABE quando adotadas pela Comissão. Essas normas técnicas de regulamentação foram integradas no Regulamento Delegado (UE) 2018/345 da Comissão, de 14 de novembro de 2017, que complementa a Diretiva 2014/59 no que diz respeito às normas técnicas de regulamentação que especificam os critérios aplicáveis ao método de avaliação do valor dos ativos e passivos das instituições ou entidades (JO 2018, L 67, p. 8).

227    A este respeito, há que referir que, no artigo 6.3 do programa de resolução, o CUR indicou que, para decidir da redução e da conversão dos instrumentos de capital do Banco Popular, se baseou na avaliação 2, conforme completada e corroborada pelos resultados do processo de venda levado a cabo pelo FROB.

228    Na medida em que a avaliação 2 contém apreciações técnicas e económicas complexas, há que reconhecer ao CUR um amplo poder de apreciação quando considerou que a avaliação 2 constituía uma base válida para decidir das medidas de resolução, bem como à Comissão quando aprovou o programa de resolução.

229    Por conseguinte, em aplicação da jurisprudência acima referida nos n.os 104 a 109, a fiscalização efetuada pelo Tribunal Geral é uma fiscalização restrita que se limita a verificar a inexistência de erro manifesto de apreciação da Comissão quando aprovou o programa de resolução na parte em que se baseava na avaliação 2. Cabe às recorrentes apresentarem prova bastante que retire plausibilidade à avaliação 2.

230    Em apoio da sua argumentação destinada a fazer prova de que a Comissão cometeu um erro manifesto de apreciação, as recorrentes invocam, em substância, três alegações para demonstrar que a avaliação 2 não era «justa, prudente e realista» na aceção do artigo 20.o, n.o 1, do Regulamento n.o 806/2014. Com a primeira alegação, contestam a fiabilidade da avaliação 2 e o seu caráter provisório. Com as segunda e terceira alegações, contestam a avaliação efetuada pela Deloitte, por um lado, pelo facto de os ajustamentos do balanço do Banco Popular efetuados pela Deloitte estarem errados e, por outro lado, pelo facto de o intervalo adotado na avaliação 2 não ser fiável.

 Quanto à primeira alegação, relativa à fiabilidade da avaliação 2 e ao seu caráter provisório

231    Em primeiro lugar, as recorrentes alegam que a Deloitte indicou que a avaliação 2 não era fiável devido ao prazo limitado para a preparar e à falta de informações disponíveis

232    A este respeito, importa referir que, na carta que acompanhava a comunicação da avaliação 2 ao CUR, a Deloitte indicou que, atendendo à difícil posição de liquidez do Banco Popular, tinha sido convidada a realizar a sua avaliação num prazo extremamente curto. O trabalho principal foi limitado a doze dias a contar do dia em que teve acesso à documentação, quando tal projeto deveria normalmente demorar seis semanas. A Deloitte referiu que havia um certo número de lacunas e incoerências entre as informações disponíveis. Referiu que a avaliação devia ser considerada altamente incerta e provisória nos termos do artigo 36.o da Diretiva 2014/59 e que foi incluída na avaliação uma margem para perdas suplementares, em conformidade com o artigo 36.o, n.o 9, da Diretiva 2014/59, que corresponde ao artigo 20.o, n.o 10, do Regulamento n.o 806/2014.

233    O artigo 20.o, n.o 10, do Regulamento n.o 806/2014 prevê expressamente a hipótese de, tendo em conta a urgência da situação, não ser possível respeitar os requisitos previstos nos n.os 7 e 9 desse artigo, a saber, nomeadamente, quando não seja possível completar a avaliação através de certas informações constantes dos livros e registos contabilísticos. Além disso, essa disposição reconhece a existência de incertezas inerentes a qualquer avaliação provisória ao prever no seu segundo parágrafo que esta integra uma margem para perdas suplementares.

234    Assim, em conformidade com esta disposição, a Deloitte limitou‑se a indicar que, atendendo ao pouco tempo disponível para efetuar a avaliação, tinha de se basear em informações incompletas e precisou que a avaliação que efetuara devia ser considerada uma avaliação provisória nos termos do artigo 36.o, n.o 9, da Diretiva 2014/59.

235    Além disso, resulta do artigo 20.o, n.o 13, do Regulamento n.o 806/2014 que, tendo em conta a urgência da situação, o CUR se podia basear na avaliação 2, efetuada ao abrigo do artigo 20.o, n.o 10, do Regulamento n.o 806/2014, para adotar o programa de resolução.

236    O facto de a Deloitte ter verificado que, tendo em conta o prazo disponível, determinadas informações eram insuficientes, não basta para pôr em causa a possibilidade de se basear na avaliação 2 para adotar o programa de resolução.

237    Além disso, refira‑se, à semelhança da Comissão, que, em aplicação do artigo 20.o, n.o 10, do Regulamento n.o 806/2014, a avaliação 2 realizada numa situação de emergência só devia respeitar os requisitos previstos nos n.os 1, 7 e 9 «na medida em que tal [fosse] razoavelmente possível tendo em conta as circunstâncias». Contrariamente ao que alegam as recorrentes, com este argumento, a Comissão não afirmou que o CUR e ela própria pudessem basear‑se numa avaliação que não fosse «justa, prudente e realista».

238    Por outro lado, as incertezas inerentes à avaliação 2 são sublinhadas nas normas técnicas de regulamentação, das quais resulta que, quando procede à estimativa e à atualização dos fluxos de tesouraria que a entidade pode esperar dos ativos e passivos existentes, o avaliador deve basear‑se em hipóteses justas, prudentes e realistas e ter em conta diferentes fatores e circunstâncias.

239    Em especial, no que respeita às estimativas relativas ao valor de cessão, o artigo 12.o, n.o 5, das normas técnicas de regulamentação, reproduzido no artigo 12.o, n.o 5, do Regulamento Delegado 2018/345, prevê:

«O valor é determinado pelo avaliador com base nos fluxos de caixa, líquidos dos custos de cessão e líquidos do valor esperado das eventuais garantias prestadas, que a entidade irá previsivelmente receber nas condições de mercado prevalecentes através de uma alienação ou transferência ordenada de ativos ou passivos. Se for caso disso, atendendo às medidas a tomar no âmbito do regime de resolução, o avaliador pode determinar o valor de cessão aplicando, ao preço de mercado da referida alienação ou transferência, uma redução correspondente a um desconto pela eventual alienação acelerada. Para determinar o valor de cessão de ativos que não dispõem de um mercado líquido, o avaliador considera os preços observáveis nos mercados em que sejam negociados ativos semelhantes ou recorre a modelos de cálculo utilizando parâmetros de mercado observáveis, tendo devidamente em conta os descontos para a falta de liquidez.»

240    O artigo 12.o, n.o 6, das normas técnicas de regulamentação, reproduzido no artigo 12.o, n.o 6, do Regulamento Delegado 2018/345, indica diferentes fatores, que o avaliador tem em conta, que podem influir nos valores da cessão e dos prazos de cessão.

241    Daqui resulta que a avaliação 2 assentava em hipóteses e dependia de múltiplos fatores. Assim, em conformidade com as normas técnicas de regulamentação, para determinar o valor da alienação do Banco Popular à data da resolução, a Deloitte, na avaliação 2, baseou‑se em estimativas e em avaliações prospetivas.

242    Por conseguinte, há que considerar que, tendo em conta as limitações de tempo e as informações disponíveis, determinadas incertezas e aproximações são inerentes a qualquer avaliação provisória efetuada em aplicação do artigo 20.o, n.o 10, do Regulamento n.o 806/2014 e que as reservas formuladas pela Deloitte não podem significar que a avaliação 2 não era «justa, prudente e realista» na aceção do artigo 20.o, n.o 1, do Regulamento n.o 806/2014.

243    Daqui resulta que, tendo em conta a urgência da situação, a Comissão considerou com razão que o CUR se podia basear na avaliação 2 efetuada nos termos do artigo 20.o, n.o 10, do Regulamento n.o 806/2014, para adotar o programa de resolução.

244    Em segundo lugar, as recorrentes contestam o facto de a avaliação 2 ser provisória. Esse facto estaria em contradição com a confirmação do CUR de que não haveria uma avaliação definitiva ex post por força do artigo 20.o, n.o 11, do Regulamento n.o 806/2014. Além disso, a Deloitte incluiu uma margem para perdas suplementares que faz parte integrante da avaliação. Ora, se a avaliação 2 fosse considerada definitiva não poderia incluir essa margem.

245    Recorde‑se, por um lado, que o artigo 20.o, n.o 10, do Regulamento n.o 806/2014 prevê expressamente que a avaliação provisória inclui uma margem para perdas suplementares e, por outro lado, que, em aplicação do artigo 20.o, n.o 13, do mesmo regulamento, uma avaliação provisória como a avaliação 2 constitui uma base válida para adotar o programa de resolução.

246    O facto de, posteriormente à adoção da decisão recorrida, o CUR ter indicado que não haveria avaliação definitiva ex post não pode ter por efeito alterar retroativamente os requisitos relativos à realização da avaliação efetuada em aplicação do artigo 20.o, n.o 10, do Regulamento n.o 806/2014.

247    Por último, nas suas observações sobre o articulado de intervenção do CUR, as recorrentes alegam que este estabeleceu os parâmetros do processo de venda no ofício de processo com base na avaliação 2, levando os proponentes a presumir que o valor dos ativos era inferior a 2 000 milhões de euros. A proposta de 1 euro seria na realidade uma proposta negativa de menos 2 000 milhões de euros.

248    A esse respeito, basta observar que este argumento é puramente especulativo e assenta num erro factual na medida em que o ofício de processo para o qual as recorrentes remetem foi redigido pelo FROB.

249    Por conseguinte, a primeira alegação deve ser julgada improcedente.

 Quanto à segunda alegação, relativa aos ajustamentos efetuados pela Deloitte

250    As recorrentes alegam que os ajustamentos em baixa efetuados pela Deloitte no balanço do Banco Popular estavam errados, reduzindo injustificadamente o valor do seu ativo líquido. A Deloitte teria efetuado ajustamentos que ultrapassavam largamente a provisão efetuada pelo Banco Santander após a aquisição do Banco Popular e a avaliação contida na avaliação 2 não poderia assim ser diferente do valor tido em consideração pelo Banco Santander. Na sua opinião, considerar a abordagem do Banco Santander em todos os domínios com exceção dos ativos não produtivos e substituir a sua avaliação dos ativos não produtivos pelo cenário de base da Deloitte tem como resultado uma avaliação positiva do Banco Popular de 1 000 milhões de euros. Consideram que a estimativa do valor económico do Banco Popular realizada no seu relatório de peritagem complementar, compreendida entre 4 500 e 7 300 milhões de euros, constitui uma indicação exata da ordem de grandeza da avaliação. As diferenças entre os valores indicados pelo seu perito e os indicados pelo Banco Santander eram limitadas e refletiam o facto de terem sido realizadas para fins diferentes, visando os peritos das recorrentes determinar o valor económico do Banco Popular ao passo que a avaliação do Banco Santander teria sido elaborada para fins contabilísticos.

251    Contestam, com base no seu relatório de peritagem complementar, a análise dos ajustamentos dos ativos do Banco Popular realizados pela Deloitte no que respeita aos empréstimos produtivos, às provisões para riscos jurídicos, aos ativos fiscais diferidos do Banco Popular e aos ativos não essenciais do Banco Popular sob a forma de empresas comuns, filiais e empresas associadas. Não contestam o ajustamento dos ativos não produtivos do Banco Popular efetuado na avaliação 2, mas sim o nível dos ajustamentos efetuados pelo Banco Santander. Consideram que a Deloitte não atribuiu o valor correto aos ativos incorpóreos do Banco Popular.

252    Quanto à metodologia utilizada, a Deloitte indicou, na avaliação 2, que o cenário utilizado para determinar o valor económico era a venda do banco segundo o instrumento de alienação da atividade. Em conformidade com o artigo 20.o, n.o 5, alínea f), do Regulamento n.o 806/2014, a avaliação visava fornecer os elementos que permitissem tomar a decisão sobre os ativos, os direitos, os compromissos ou os títulos de propriedade a transferir e fornecer os elementos que permitissem ao CUR determinar o que constituía condições comerciais para efeitos do artigo 24.o, n.o 2, alínea b), do mesmo regulamento.

253    A Deloitte explicou que «[a sua] avaliação económica vis[ava] fornecer uma estimativa do valor que podia ser proposto por um potencial adquirente pelo banco no seu conjunto, na sequência de um processo de leilão aberto, justo e competitivo (um “valor de alienação” em conformidade com o artigo 11.o das normas técnicas de regulamentação […])».

254    Resulta do considerando 6 das normas técnicas de regulamentação que a escolha da base de avaliação mais adequada (valor de detenção ou valor de alienação) deve ser efetuada em função das medidas de resolução específicas previstas pela autoridade de resolução.

255    No que respeita à escolha da base de avaliação, o artigo 11.o, n.o 4, das normas técnicas de regulamentação, reproduzido no artigo 11.o, n.o 4, do Regulamento Delegado 2018/345, indica:

«Quando as medidas de resolução a que se refere o artigo 10.o, n.o 1, exigem que os ativos e passivos sejam retidos por uma instituição em atividade, o avaliador utiliza o valor de detenção como base adequada de avaliação. O valor de detenção pode, se for considerado justo, prudente e realista, antecipar uma normalização das condições de mercado.

O valor de detenção não deve ser usado como base de avaliação quando os ativos são transferidos para um veículo de gestão de ativos nos termos do artigo 42.o da Diretiva 2014/59/UE ou para uma instituição de transição, nos termos do artigo 40.o da referida diretiva, ou quando é utilizado o instrumento de alienação da atividade em conformidade com o artigo 38.o da Diretiva 2014/59/UE.»

256    Em conformidade com o artigo 12.o, n.o 4, das normas técnicas de regulamentação, reproduzido no artigo 12.o, n.o 4, do Regulamento Delegado 2018/345, «[q]uando a situação de uma entidade a impede de deter um ativo ou prosseguir uma atividade, ou quando a alienação for considerada necessária por qualquer outra razão pela autoridade de resolução para a consecução dos objetivos da resolução, os fluxos de caixa esperados são indicados em função dos valores de cessão previstos dentro de um determinado período para o efeito».

257    Os fatores a ter em conta para determinar o valor da alienação, para efeitos do instrumento de alienação da atividade, são definidos no artigo 12.o, n.os 5 a 7, das normas técnicas de regulamentação, reproduzido no artigo 12.o, n.os 5 a 7, do Regulamento Delegado 2018/345.

258    A este respeito, refira‑se que as recorrentes não contestam a decisão do CUR de aplicar o instrumento de alienação da atividade ao Banco Popular. Assim, uma vez que a avaliação 2 foi efetuada tendo em conta o facto de o instrumento de alienação da atividade ser aplicado, o valor de alienação utilizado pela Deloitte era a metodologia correta para apreciar o valor do Banco Popular no âmbito da avaliação 2.

259    Há que referir que, para contestar a estimativa dos ativos do Banco Popular efetuada na avaliação 2, as recorrentes baseiam‑se, por um lado, no seu relatório de peritagem complementar anexo à réplica e, por outro lado, no valor tido em consideração pelo Banco Santander.

260    Em primeiro lugar, quanto ao relatório de peritagem complementar anexo à réplica, o Banco Santander alega que se baseia numa metodologia errada.

261    A este respeito, o relatório de peritagem junto à petição, refere que «[n]os casos em que a totalidade da empresa é vendida e esses ativos não sejam objeto de cessão separada, consideramos que o valor de detenção constitui uma base adequada». Além do mais, como salienta o Banco Santander, o relatório de peritagem complementar anexo à réplica, menciona:

«Como acima se referiu, para determinar o valor económico de cada ativo, é necessário verificar se a base adequada é o “valor de detenção” […] ou o “valor de alienação” […]. Consideramos que o cálculo do valor justo descrito pelo Banco Popular é idêntico ao exigido para responder a uma avaliação elaborada com base no “valor de detenção” conforme definido no artigo 1.o das normas técnicas de regulamentação.»

262    As recorrentes alegam que os seus relatórios de peritagem forneceram uma estimativa dos ativos do Banco Popular conforme às orientações definidas nas normas técnicas de regulamentação e que os mesmos estimaram o valor do banco segundo o princípio da continuidade da exploração, calculando os fluxos de tesouraria gerados pelo banco ao conservar ou ceder determinados ativos. Alegam que, atendendo às expectativas do adquirente, devem ser avaliadas categorias de ativos diferentes consoante sejam detidas ou cedidas. A abordagem utilizada no relatório de peritagem complementar das recorrentes estaria em conformidade com o artigo 11.o, n.o 4, das normas técnicas de regulamentação, segundo o qual, para a venda de uma instituição em atividade, como no presente caso, o avaliador deve utilizar o valor de detenção.

263    Assim, como admitem as recorrentes, os seus relatórios de peritagem baseavam‑se no valor de detenção e não no valor de alienação para avaliar as diferentes categorias de ativos do Banco Popular.

264    Ora, basta observar que o artigo 11.o, n.o 4, das normas técnicas de regulamentação, acima referido no n.o 255, prevê expressamente que o valor de detenção não seja utilizado como base de avaliação quando é aplicado o instrumento de alienação da atividade.

265    Além disso, parece resultar dos argumentos das recorrentes que, para justificar o método utilizado no seu relatório de peritagem, têm em conta o valor pelo qual o próprio adquirente estaria disposto a ceder a totalidade ou parte do Banco Popular depois de o adquirir.

266    Assim, nas suas observações sobre o articulado de intervenção do Banco Santander, defendem que os seus relatórios de peritagem permitiram estimar o valor económico do Banco Popular em atividade. Referem que, atendendo às expectativas do adquirente quanto ao que pretende fazer, devem ser avaliadas categorias de ativos diferentes consoante sejam detidas ou cedidas. Acrescentam que, por exemplo, seria possível esperar que um adquirente cedesse os ativos não produtivos num determinado prazo, mas que pretendesse deter empréstimos produtivos que gerassem receitas. Consoante o caso, os ativos deveriam ser avaliados segundo o valor de alienação ou o valor de detenção.

267    Estes argumentos têm origem numa confusão. A avaliação 2 tinha por objeto determinar o valor do Banco Popular no âmbito da utilização do instrumento de alienação da atividade, ou seja, determinar o valor pelo qual um potencial adquirente estaria disposto a adquirir o Banco Popular à data da resolução. A Deloitte indica, no relatório sobre a avaliação 2, que a sua avaliação económica visa fornecer uma estimativa do valor que poderia ser oferecido pela totalidade do banco por um potencial adquirente. Não se trata, como parecem considerar as recorrentes, de estimar o valor do Banco Popular, depois de vendido ao adquirente, em função dos ativos que este último pretenda ceder ou manter.

268    Daí resulta que a metodologia utilizada nos relatórios de peritagem apresentados pelas recorrentes não corresponde à utilizada pela Deloitte na sua avaliação. Além disso, como sublinha a Comissão, o relatório de peritagem complementar baseia‑se em dados posteriores à aquisição do Banco Popular pelo Banco Santander, os quais, portanto, não são pertinentes para apreciar a estimativa efetuada na avaliação 2, que visava determinar o valor de alienação para um potencial adquirente anteriormente à resolução.

269    Por conseguinte, há que considerar que esses relatórios de peritagem não são pertinentes para determinar se a avaliação 2 estimou corretamente o valor dos ativos do Banco Popular. Em particular, a estimativa do valor económico do Banco Popular realizada no seu relatório de peritagem complementar, compreendida entre 4 500 e 7 300 milhões de euros, baseia‑se numa metodologia errada e, portanto, não é pertinente. A comparação, efetuada pelas recorrentes, dos resultados das estimativas das diferentes categorias de ativos contidos, por um lado, no seu relatório de peritagem complementar e, por outro lado, na avaliação 2, deve ser considerada inoperante.

270    Em segundo lugar, as recorrentes fazem referência aos ajustamentos efetuados pelo Banco Santander posteriormente à aquisição do Banco Popular, quando apresentou o balanço deste último. Alegam que uma estimativa do valor económico do Banco Popular na avaliação 2 não pode ser considerada «justa, prudente e realista» por diferir da adotada pelo adquirente.

271    Observe‑se, à semelhança do CUR, que a contabilidade das aquisições do Banco Santander não pode ser comparada aos resultados da avaliação 2, na medida em que não responde à mesma finalidade nem utiliza a mesma metodologia.

272    A este respeito, as recorrentes admitem, na réplica, que a avaliação efetuada pelo Banco Santander respondia a um objetivo diferente do dos seus peritos e que não visava estimar o valor económico do Banco Popular, mas sim o seu valor contabilístico.

273    Além disso, a avaliação 2 tinha por objetivo determinar o valor de alienação do Banco Popular para qualquer potencial adquirente. Ora, como salienta o CUR, a contabilidade do Banco Santander atribui um valor específico aos ativos e passivos do Banco Popular na sequência da integração do Banco Popular nas suas operações segundo as normas contabilísticas.

274    De qualquer modo, há que considerar que o valor económico atribuído ao Banco Popular pelo Banco Santander à data da adoção do programa de resolução é o valor que consta da sua proposta de aquisição, ou seja, um euro.

275    Além disso, há que julgar inoperantes os argumentos das recorrentes que visam impugnar os ajustamentos relativos aos ativos não produtivos efetuados pelo Banco Santander posteriormente à resolução.

276    A título subsidiário, as recorrentes consideram, nas suas observações sobre os articulados de intervenção, que, mesmo que os ativos do Banco Popular devessem ter sido avaliados segundo o valor de alienação relativo aos ativos individuais que o Banco Popular continuava a deter em atividade, o valor deste estaria compreendido entre 1 500 e 4 300 milhões de euros.

277    A este respeito, as recorrentes limitam‑se a fornecer uma tabela de valores que contém uma comparação dos valores do Banco Popular estimados, com e sem ajustamento, pela Deloitte na avaliação 2, pelo Banco Santander e no seu relatório de peritagem. No entanto, a apresentação dos resultados dos cálculos dos seus peritos após o ajustamento, sem outra explicação quanto ao método utilizado e à natureza dos ajustamentos operados, não permite ao Tribunal Geral compreender o alcance deste argumento.

278    Por exemplo, resulta dessa tabela que a linha correspondente ao «ajustamento do valor dos ativos» no relatório de peritagem complementar levaria a um intervalo de 5 200 a 7 900 milhões de euros e que este mesmo valor «após ajustamento» é de 8 200 a 11 000 milhões de euros e as recorrentes não dão nenhuma explicação sobre essas diferenças.

279    Em terceiro lugar, as recorrentes invocam, na réplica, argumentos específicos para contestar o método utilizado pela Deloitte na avaliação de determinadas categorias de ativos.

280    Quanto aos empréstimos produtivos, as recorrentes alegam que a Deloitte reconheceu, na avaliação 2, que não utilizou o método dos fluxos de tesouraria atualizado (Discounting Cash Flows) e que adotou um método que não era adequado, a saber, a norma IFRS 9 [International Financial Reporting Standard (Norma Internacional de Relato Financeiro)], relativa à contabilização de instrumentos financeiros.

281    Na avaliação 2, no que respeita a empréstimos e a créditos, a Deloitte indicou:

«[…] não foi possível aplicar a esta carteira uma abordagem de modelização dos fluxos de tesouraria integrais atualizados suficientemente sólida. Em vez disso, tendo em conta os dados e o tempo disponíveis, foram previstas duas abordagens em matéria de avaliação:

uma abordagem “ascendente”, ajustada em função das perdas previstas, que toma em consideração os dados relativos à exposição subjacente do banco em caso de incumprimento, à probabilidade de incumprimento durante esse tempo (estimada com base na probabilidade de incumprimento num dado momento) e às perdas em caso de incumprimento, e que ajusta os parâmetros com base nos índices de referência do mercado, nos índices de referência do Banco de Espanha em relação às perdas em caso de incumprimento e na análise da Deloitte, sempre com base em pressupostos prudentes. Esta abordagem reflete no essencial o modo como as carteiras seriam geridas, no futuro, por um adquirente bancário […]»

282    A Deloitte referiu que o seu método para calcular o valor económico dos empréstimos e dos créditos consistia em estimar a perda de crédito esperada e explicou os parâmetros escolhidos para determinar a exposição ao risco de incumprimento e as probabilidades de incumprimento.

283    Há que considerar que este método está em conformidade com as normas técnicas de regulamentação.

284    A este respeito, refira‑se que a avaliação dos empréstimos e dos créditos é objeto de incertezas explicadas no artigo 8.o, alínea a), das normas técnicas de regulamentação, reproduzido no artigo 8.o, alínea a), do Regulamento Delegado 2018/345, segundo o qual:

«O avaliador coloca uma tónica particular nos domínios em que prevalece uma incerteza significativa a respeito da avaliação e que tenham um impacto significativo na avaliação global. Em relação a esses domínios, o avaliador fornece os resultados da avaliação sob a forma de melhores estimativas pontuais e, se for caso disso, de intervalos de valores, conforme previsto no artigo 2.o, n.o 3. Esses domínios incluem:

a)      Empréstimos ou carteiras de empréstimos, cujos fluxos de caixa esperados dependem da capacidade da contraparte de cumprir as suas obrigações, da sua vontade de o fazer ou de incentivos nesse sentido, quando essas previsões se baseiam em pressupostos relativos às taxas de incumprimento, probabilidades de incumprimento, perdas em caso de incumprimento ou características dos instrumentos, nomeadamente quando comprovado pela evolução anterior das perdas de uma carteira de empréstimos.»

285    Além do mais, nas páginas 4 a 11 do anexo da Avaliação 2, a Deloitte explicou os ajustamentos que tinha efetuado relativamente à avaliação dos empréstimos e dos créditos, em especial tendo em conta os riscos de falta de pagamento. As recorrentes não invocam nenhum argumento com vista a impugnar esses ajustamentos.

286    Além disso, as recorrentes admitem que, tendo em conta o prazo limitado de que a Deloitte dispunha, esta não podia realizar uma análise completa e sólida dos fluxos de tesouraria atualizados.

287    Quanto aos argumentos de que a norma IFRS 9, que é uma norma contabilística, não era adequada, basta observar que a Deloitte indicou na avaliação 2 que, «embora estejamos cientes de que a nova norma IFRS 9 irá implicar um aumento de provisões, isso não irá alterar os cálculos efetuados no presente caso». Daí resulta que a Deloitte não utilizou este método e que os argumentos das recorrentes são inoperantes.

288    Quanto à avaliação dos ajustamentos das provisões para riscos jurídicos, há que observar que a comparação efetuada pelas recorrentes entre a avaliação 2 e a avaliação 3, posteriormente à adoção da decisão recorrida, não é pertinente. Basta referir que a avaliação 3 foi realizada segundo um método e com um objetivo diferentes dos da avaliação 2. Do mesmo modo, a comparação com avaliação efetuada pelo Bankia com base num artigo de imprensa não é pertinente, tanto mais que não se especifica se essa avaliação dizia respeito a todos os riscos jurídicos analisados na avaliação 2, nem se os resultados eram efetivamente suscetíveis de comparação.

289    Quanto à avaliação dos ativos fiscais diferidos, as recorrentes admitem que a mesma é incerta e depende em grande medida do adquirente. Consideram que o intervalo adotado pela Deloitte é demasiado estreito, o que deveria ter mostrado ao CUR e à Comissão que a abordagem da Deloitte não era adequada, e que esse intervalo não corresponde ao ajustamento efetuado pelo Banco Santander.

290    A Deloitte indicou, nomeadamente, na página 32 do anexo da avaliação 2, que a avaliação dos ativos fiscais diferidos não protegidos dependia do adquirente, nomeadamente do facto de se tratar de uma entidade espanhola ou estrangeira e que, no caso de o adquirente ser um banco espanhol, o seu caráter recuperável e a sua contabilização no balanço dependeriam do plano de processo do Banco Popular e do adquirente. O anexo da avaliação 2 menciona que avaliação feita pela Deloitte tem em conta estas diferentes hipóteses.

291    As recorrentes não explicam de que forma as incertezas sublinhadas pela Deloitte teriam justificado proceder a ajustamentos diferentes no melhor e no pior dos cenários. A este respeito, no relatório de peritagem complementar anexo à réplica, o perito limita‑se a referir o caráter «surpreendente» desse intervalo. Além disso, há que observar que a comparação com os ajustamentos efetuados pelo Banco Santander não é pertinente.

292    Quanto à avaliação dos ativos incorpóreos, as recorrentes alegam que a Deloitte não atribuiu nenhum valor económico, por um lado, aos ativos incorpóreos afetos aos depósitos de base (Core Deposit Intangibles), enquanto os levantamentos provavelmente diziam respeito aos depósitos menos estáveis, nem, por outro lado, à marca Banco Popular ao passo que teria reconhecido um valor mínimo à marca Banco Pastor. Segundo as recorrentes, esta abordagem era suficiente para concluir que a avaliação 2 não era fiável.

293    Por um lado, na avaliação 2, a Deloitte estimou, quanto aos ativos incorpóreos afetos aos depósitos de base, que um potencial adquirente não lhe atribuiria nenhum valor devido aos significativos levantamentos de depósitos à data da avaliação.

294    Há que referir que, atendendo à dimensão dos fluxos de saída de liquidez à data em que a avaliação 2 foi efetuada, não há nenhum elemento que permita afirmar, como o fazem as recorrentes, que a maioria dos depósitos estáveis continuaram no banco.

295    Por outro lado, a Deloitte explicou, relativamente ao fundo de comércio do Banco Popular, que um potencial adquirente não atribuiria nenhum valor a um fundo de comércio preexistente na medida em que não se trata de um ativo identificável no contexto de um agrupamento de empresas. Indicou que, dada a forte presença da marca Banco Pastor na Galiza, essa marca teria valor para um terceiro e que tinha estimado o intervalo de valores aplicando o método dos encargos, que é o método mais utilizado para avaliar as marcas.

296    As recorrentes não apresentam nenhum argumento específico capaz de pôr em causa estas explicações.

297    Quanto à avaliação das empresas comuns, filiais e empresas associadas, as recorrentes limitam‑se a afirmar que, com base em relatórios de análise contemporâneos e em alegadas ou reais transações, o montante considerado pela Deloitte constitui uma subavaliação e que uma estimativa razoável seria de 1 500 milhões de euros.

298    Basta observar, por um lado, que as recorrentes não fazem prova da base em que assenta essa estimativa e, por outro, que esses argumentos não permitem identificar os erros cometidos pela Deloitte na avaliação 2.

299    Por outro lado, recorde‑se que, nos termos do artigo 21.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia e do artigo 76.o, alínea d), do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a petição deve conter o objeto do litígio e a exposição sumária dos fundamentos do pedido. Segundo jurisprudência constante, para que uma ação seja admissível, é necessário que os elementos essenciais de facto e de direito em que esta se baseia resultem, pelo menos sumariamente, mas de um modo coerente e compreensível, do texto da própria petição. Ainda que o corpo da petição possa ser escorado e completado, em pontos específicos, por remissões para determinadas passagens de documentos que a ela foram anexados, uma remissão global para outros documentos, mesmo anexos à petição, não pode suprir a ausência dos elementos essenciais da argumentação jurídica, os quais, por força das disposições atrás recordadas, devem constar da petição. [v. Acórdãos de 17 de setembro de 2007, Microsoft/Comissão, T‑201/04, EU:T:2007:289, n.o 94 e jurisprudência referida, e de 5 de outubro de 2020, HeidelbergCement e Schwenk Zement/Comissão, T‑380/17, EU:T:2020:471, n.o 92 (não publicado) e jurisprudência referida]. Além disso, não compete ao Tribunal procurar e identificar, nos anexos, os elementos que possa considerar constituírem o fundamento do recurso, uma vez que os anexos têm uma função puramente probatória e instrumental (v. Acórdãos de 17 de setembro de 2007, Microsoft/Comissão, T‑201/04, EU:T:2007:289, n.o 94 e jurisprudência referida, e de 24 de setembro de 2019, Países Baixos e o./Comissão, T‑760/15 e T‑636/16, EU:T:2019:669, n.o 114 e jurisprudência referida; v., também, neste sentido, Acórdão de 11 de setembro de 2014, MasterCard e o./Comissão, C‑382/12 P, EU:C:2014:2201, n.o 41 e jurisprudência referida).

300    Uma vez que da réplica não consta qualquer argumento, as remissões gerais efetuadas pelas recorrentes para o relatório de peritagem complementar, que figuram no anexo da mesma, não podem ser analisadas.

301    Refira‑se que, na avaliação 2, a Deloitte explicou para cada uma das categorias de ativos o método utilizado para a respetiva avaliação e as incertezas que justificavam os ajustamentos efetuados. Do anteriormente exposto resulta que os argumentos das recorrentes não põem em causa os ajustamentos efetuados pela Deloitte na avaliação 2 relativamente às diferentes categorias de ativos do Banco Popular e não permitem concluir que a avaliação 2 não era «justa, prudente e realista» em conformidade com o artigo 20.o, n.o 1, do Regulamento n.o 806/2014.

302    A título subsidiário, as recorrentes também alegam que a avaliação realizada pela Deloitte, na avaliação 2, atendendo a quatro elementos‑chave, que não seriam afetados pelo método de avaliação aplicável, levou a uma subavaliação de 4 800 a 5 000 milhões de euros do valor do Banco Popular. As recorrentes fazem referência ao ajustamento do ativo fiscal diferido, à falta de tomada em consideração dos ativos incorpóreos, nomeadamente os afetos aos depósitos de base, à sobrestimação de eventualidades de ordem jurídica e à subavaliação das empresas comuns, filiais e empresas associadas constantes da avaliação 2.

303    A este respeito, basta constatar que, por um lado, as recorrentes limitam‑se a proceder a uma comparação entre as estimativas constantes da avaliação 2 e as que constam do seu relatório de peritagem complementar. Por outro lado, não explicam por que motivo seria indiferente o método de avaliação usado para essas quatro categorias de ativos.

304    Por conseguinte, a segunda alegação deve ser julgada improcedente.

 Quanto à terceira alegação, relativa ao intervalo adotado na avaliação 2

305    As recorrentes alegam que a amplitude do intervalo adotado na avaliação 2 e o facto de esta se afastar das avaliações recentes do ativo líquido do Banco Popular deveriam ter alertado o CUR e a Comissão de que essa avaliação não era «justa, prudente e realista» e não proporcionava uma base fiável para adotar o programa de resolução.

306    A este respeito, recorde‑se que, na avaliação 2, a Deloitte referiu que o resultado da sua avaliação se situava num intervalo compreendido entre 1 300 milhões e menos 8 200 milhões de euros, com a melhor estimativa situada dentro desse intervalo em menos 2 000 milhões de euros.

307    Em primeiro lugar, as recorrentes alegam que a amplitude do intervalo indicada na avaliação 2 revela que esta não era fiável.

308    Importa observar que a amplitude do intervalo é justificada pelo método utilizado na avaliação 2.

309    A este respeito, quanto à metodologia utilizada na avaliação 2, a Deloitte indicou que tinha adotado uma abordagem por categoria, ajustando os valores contabilísticos de cada classe de ativos e passivos para estimar as perdas e ganhos e outros ajustamentos que qualquer adquirente aplicaria ao valor. Apresentou um intervalo de avaliação para cada classe de ativos e passivos.

310    Este método está em conformidade com o artigo 2.o, n.o 3, das normas técnicas de regulamentação, reproduzido no artigo 2.o, n.o 3, do Regulamento Delegado 2018/345, segundo o qual:

«O avaliador fornece a melhor estimativa pontual do valor de um determinado ativo, passivo ou de uma combinação de ambos os elementos. Os resultados da avaliação são igualmente fornecidos sob a forma de intervalos de valores, caso necessário.»

311    Assim, a soma dos valores mais baixos para cada classe de ativos e de passivos forneceu a estimativa baixa do intervalo e a soma dos valores mais altos forneceu a estimativa alta do intervalo. Este método explica, portanto, a amplitude do intervalo adotado na avaliação 2. Além disso, recorde‑se que resulta da análise da primeira alegação que a determinação do valor de alienação se baseia em estimativas que implicam algumas incertezas que justificam a escolha da apresentação dos resultados sob a forma de intervalo.

312    Além do mais, como sublinha a Comissão, tendo em conta a amplitude do balanço total do Banco Popular, com um valor superior a 130 000 milhões de euros, a diferença entre os dois valores do intervalo representa apenas cerca de 7 % do balanço.

313    Na réplica, as recorrentes alegam que esta comparação não é pertinente e que a amplitude do intervalo, ou seja, 9 500 milhões de euros, deve ser comparada com o valor dos ativos líquidos do Banco Popular, ou seja 10 780 milhões de euros.

314    A este respeito, importa observar, por um lado, que a referência feita pela Comissão à dimensão do balanço do Banco Popular não se destina a apreciar a exatidão do intervalo, mas apenas a relativizar a sua amplitude. Por outro lado, a diferença entre o melhor e o pior cenário de avaliação considerado pela Deloitte não constitui um dado comparável ao valor contabilístico dos ativos líquidos do Banco Popular.

315    Em segundo lugar, as recorrentes referem que o Banco Popular tinha vencido o teste de esforço de 2016 e que, embora o Banco Popular se tenha visto confrontado com problemas de liquidez, em 31 de março de 2017, os seus ativos líquidos ascendiam a 10 780 milhões de euros e a sua atividade principal relativa às pequenas e médias empresas (PME) em franquia continuava a ser rentável.

316    A este respeito, por um lado, basta observar que o teste de esforço de 2016 do Banco Popular, publicado em julho de 2016, diz, assim, respeito à situação do Banco Popular numa data que antecede em vários meses a data da adoção do programa de resolução e não se pode considerar que dê indicações sobre a evolução financeira do Banco Popular. Por outro lado, a referência aos ativos líquidos não é pertinente, na medida em que apenas refletem o valor contabilístico do Banco Popular e não o valor de alienação à data da resolução.

317    Por conseguinte, a terceira alegação deve ser julgada improcedente.

318    De todas estas considerações resulta que as recorrentes não demonstraram que a avaliação 2 não era «justa, prudente e realista» na aceção do artigo 20.o, n.o 1, do Regulamento n.o 806/2014.

319    Há que concluir que a Comissão não cometeu um erro manifesto de apreciação ao aprovar o programa de resolução na parte em que se baseia na avaliação 2.

320    Por conseguinte, o quarto fundamento deve ser julgado improcedente.

 Quanto ao sexto fundamento, relativo à violação do direito de audiência

321    As recorrentes alegam que a Comissão violou o seu direito de audiência ao adotar a decisão recorrida sem lhes dar a possibilidade de apresentarem observações. Invocam que não foram ouvidas no decurso do procedimento de resolução apesar de os seus interesses terem sido direta e individualmente afetados pela decisão recorrida. A Comissão deveria assegurar que as recorrentes fossem ouvidas, em conformidade com o artigo 41.o da Carta, ainda que o Regulamento n.o 806/2014 não o preveja.

322    Consideram que, se o CUR e a Comissão tivessem respeitado o seu direito de audiência, poderiam ter apresentado observações utilmente mesmo tendo um prazo curto. As recorrentes poderiam ter abordado a questão da avaliação correta do Banco Popular e, tendo em conta os elementos de prova apresentados no quarto fundamento, é provável que o CUR ou a Comissão tivessem formado uma opinião diferente quanto à avaliação do Banco Popular, o que teria conduzido à adoção de um programa de resolução diferente do aprovado pela decisão recorrida.

323    A Comissão alega que o procedimento previsto no artigo 18.o do Regulamento n.o 806/2014 conduz à adoção de uma medida de alcance geral no que respeita aos acionistas e aos credores da instituição sujeita a uma medida de resolução e que o artigo 41.o da Carta não é aplicável. Considera, a título subsidiário, que a impossibilidade de ouvir as recorrentes se justifica nos termos do artigo 52.o, n.o 1, da Carta.

324    Importa recordar que o artigo 41.o, n.o 2, alínea a), da Carta estabelece que o direito a uma boa administração compreende o direito de qualquer pessoa a ser ouvida antes de a seu respeito ser tomada qualquer medida individual que a afete desfavoravelmente.

325    O direito de audiência garante a qualquer pessoa a possibilidade de dar a conhecer, de maneira útil e efetiva, o seu ponto de vista no decurso do procedimento administrativo e antes da adoção de qualquer decisão suscetível de afetar desfavoravelmente os seus interesses. Além disso, importa ainda precisar que o direito de audiência prossegue um duplo objetivo. Por um lado, serve para a instrução do processo e para o apuramento dos factos da forma mais precisa e correta possível e, por outro, permite assegurar a proteção efetiva do interessado. O direito de audiência visa em especial garantir que qualquer decisão lesiva seja adotada com pleno conhecimento de causa e tem, nomeadamente, por objetivo permitir à autoridade competente corrigir um erro ou à pessoa em causa invocar os elementos relativos à sua situação pessoal que militam no sentido de que a decisão seja tomada, não seja tomada ou tenha determinado conteúdo (v. Acórdão de 4 de junho de 2020, SEAE/De Loecker, C‑187/19 P, EU:C:2020:444, n.os 68 e 69 e jurisprudência referida).

326    Importa referir que o Tribunal de Justiça afirmou a importância do direito de audiência e o seu alcance muito lato na ordem jurídica da União, ao considerar que este direito deve ser aplicado em qualquer processo que possa ter como resultado um ato lesivo. Em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, o respeito do direito de audiência impõe‑se mesmo quando a regulamentação aplicável não preveja expressamente tal formalidade (v. Acórdãos de 22 de novembro de 2012, M., C‑277/11, EU:C:2012:744, n.os 85 e 86 e jurisprudência referida, de 18 de junho de 2020, Comissão/RQ, C‑831/18 P, EU:C:2020:481, n.o 67 e jurisprudência referida, e de 7 de novembro de 2019, ADDE/Parlamento, T‑48/17, EU:T:2019:780, n.o 89 e jurisprudência referida).

327    Assim, tendo em conta o seu caráter de princípio fundamental e geral de direito da União, a aplicação do princípio dos direitos de defesa, incluindo o direito de audiência, não pode ser excluída nem restringida por uma disposição regulamentar e o seu respeito deve, portanto, estar assegurado tanto na falta total de uma regulamentação específica como na presença de uma regulamentação que não tenha, por si própria, esse princípio em conta (v. Acórdão de 18 de junho de 2014, Espanha/Comissão, T‑260/11, EU:T:2014:555, n.o 62 e jurisprudência referida).

328    Refira‑se, desde logo, que o programa de resolução adotado pelo CUR tem por objeto a resolução do Banco Popular, que deve, por conseguinte, ser considerado a pessoa contra a qual é adotada uma medida individual e à qual o direito de audiência é garantido pelo artigo 41, n.o 2, alínea a), da Carta.

329    Assim, há que ter em conta o facto de as recorrentes não serem destinatárias do programa de resolução, que não é uma decisão individual tomada contra elas, nem da decisão recorrida que aprova esse programa de resolução.

330    Refira‑se, porém, que, em conformidade com o artigo 21.o, n.o 1, do Regulamento n.o 806/2014, o CUR exerceu o poder de redução ou de conversão dos instrumentos de capital do Banco Popular.

331    Por conseguinte, o procedimento seguido pelo CUR para adotar o programa de resolução, embora não constitua um processo individual instaurado contra as recorrentes, pode levar à adoção de uma medida suscetível de afetar desfavoravelmente os seus interesses na sua qualidade de acionistas ou de detentores de instrumentos de capital do Banco Popular.

332    Ora, a jurisprudência do Tribunal de Justiça, acima referida no n.o 326, adotou uma interpretação ampla do direito de audiência no sentido de este estar garantido a qualquer pessoa no decurso do processo suscetível de culminar num ato lesivo.

333    Além disso, por um lado, segundo o seu considerando 121, o Regulamento n.o 806/2014 respeita os direitos fundamentais e os direitos, liberdades e princípios reconhecidos, em especial, pela Carta, entre os quais os direitos de defesa, e deve ser aplicado em conformidade com esses direitos e esses princípios. Por outro lado, nenhuma disposição do Regulamento n.o 806/2014 exclui ou restringe expressamente o direito de audiência dos acionistas e dos credores da entidade em causa durante o procedimento de resolução.

334    A este respeito, refira‑se que as recorrentes não deduzem uma exceção de ilegalidade contra o Regulamento n.o 806/2014 por não prever a audição prévia dos acionistas ou dos detentores de instrumentos de capital antes da adoção de um programa de resolução. Alegam que o direito de audiência lhes devia ser reconhecido no âmbito do procedimento de resolução do Banco Popular nos termos do artigo 41.o, n.o 2, alínea a), da Carta.

335    No entanto, no caso de os acionistas e credores da entidade visada pela medida de resolução poderem invocar o direito de audiência no procedimento de resolução, o exercício desse direito pode estar sujeito a restrições, em conformidade com o artigo 52.o, n.o 1, da Carta.

336    O artigo 52.o, n.o 1, da Carta prevê:

«Qualquer restrição ao exercício dos direitos e liberdades reconhecidos pela presente Carta deve ser prevista por lei e respeitar o conteúdo essencial desses direitos e liberdades. Na observância do princípio da proporcionalidade, essas restrições só podem ser introduzidas se forem necessárias e corresponderem efetivamente a objetivos de interesse geral reconhecidos pela União, ou à necessidade de proteção dos direitos e liberdades de terceiros.»

337    O Tribunal de Justiça já decidiu no sentido de que os direitos fundamentais, como o respeito dos direitos de defesa, não constituem prerrogativas absolutas, podendo comportar restrições, desde que estas correspondam efetivamente a objetivos de interesse geral prosseguidos pela medida em causa e não constituam, à luz da finalidade prosseguida, uma intervenção desmedida e intolerável que atente contra a própria substância dos direitos assim garantidos (v. Acórdãos de 10 de setembro de 2013, G. e R., C‑383/13 PPU, EU:C:2013:533, n.o 33 e jurisprudência referida, e de 20 de dezembro de 2017, Prequ’Italia, C‑276/16, EU:C:2017:1010, n.o 50 e jurisprudência referida).

338    Daí resulta que a falta de audição dos recorrentes, na sua qualidade de acionistas ou detentores de instrumentos de capital do Banco Popular, no âmbito do procedimento de resolução, quer pelo CUR quer pela Comissão, podia ser justificada.

339    Há que lembrar que, no artigo 4.2 do programa de resolução, o CUR considerou que a resolução do Banco Popular era conforme com o interesse público na medida em que era necessária e proporcionada à realização de dois objetivos previstos no artigo 14.o, n.o 2, do Regulamento n.o 806/2014, a saber, evitar efeitos adversos significativos sobre a estabilidade financeira e assegurar a continuidade das funções críticas do Banco Popular. Indicou que a liquidação do Banco Popular segundo um processo normal de insolvência não teria permitido atingir esses objetivos na mesma medida. Na decisão recorrida, a Comissão aprovou expressamente as razões apresentadas pelo CUR para justificar a necessidade de uma medida de resolução para defesa do interesse público.

340    No presente caso, a restrição do direito de audiência das recorrentes pode ser justificada, por um lado, pelo objetivo de estabilidade dos mercados financeiros e, por outro lado, pela necessidade de assegurar a eficácia da resolução do Banco Popular, que devia ser efetuada com celeridade.

341    Refira‑se, em primeiro lugar, que vários considerandos do Regulamento n.o 806/2014, nomeadamente os seus considerandos 12, 58 e 61, indicam que a estabilidade dos mercados financeiros é um dos objetivos prosseguidos pelos mecanismos de resolução instituídos por esse regulamento.

342    Além do mais, segundo o artigo 18.o, n.o 5, do Regulamento n.o 806/2014, uma medida de resolução é de interesse público se for proporcionada e necessária para a prossecução de um ou mais dos objetivos da resolução referidos artigo 14.o do mesmo regulamento, que um processo de liquidação da entidade no quadro dos processos normais de insolvência não permita atingir na mesma medida. Entre os objetivos da resolução referidos no artigo 14.o do Regulamento n.o 806/2014 figuram, nomeadamente, o de «evitar efeitos adversos significativos sobre a estabilidade financeira, nomeadamente evitando o contágio, inclusive das infraestruturas de mercado, e mantendo a disciplina do mercado» e o de «proteger as finanças públicas, limitando o recurso ao apoio financeiro público extraordinário».

343    A este respeito, o Tribunal de Justiça salientou que os serviços financeiros desempenham um papel central na economia da União. Os bancos e as instituições de crédito são uma fonte essencial de financiamento para as empresas com atividade nos diversos mercados. Além disso, frequentemente os bancos estão estreitamente interligados e muitos deles exercem as suas atividades a nível internacional. É por esta razão que existe o risco de a insolvência que afeta um ou mais bancos se propagar aos outros bancos, quer no Estado‑Membro em causa, quer noutros Estados‑Membros. Isso pode, por sua vez, produzir efeitos negativos noutros setores da economia. (Acórdãos de 19 de julho de 2016, Kotnik e o., C‑526/14, EU:C:2016:570, n.o 50, de 20 de setembro de 2016, Ledra Advertising e o./Comissão e BCE, C‑8/15 P a C‑10/15 P, EU:C:2016:701, n.o 72, e de 25 de março de 2021, Balgarska Narodna Banka, C‑501/18, EU:C:2021:249, n.o 108).

344    O Tribunal de Justiça já declarou que o objetivo de garantir a estabilidade do sistema financeiro evitando ao mesmo tempo despesas públicas excessivas e minimizando as distorções da concorrência constitui um interesse público superior (Acórdão de 19 de julho de 2016, Kotnik e o., C‑526/14, EU:C:2016:570, n.o 69).

345    Por outro lado, o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (a seguir «CEDH») considerou, na sua Decisão de 1 de abril de 2004, Camberrow MM5 AD c. Bulgária (CE:ECHR:2004:0401DEC005035799, n.o 6), que, nos domínios economicamente sensíveis como a estabilidade do sistema bancário, os Estados dispunham de uma ampla margem de apreciação e que, portanto, a impossibilidade de um acionista participar no processo que levou à venda do banco não era desproporcionada à luz dos objetivos legítimos de proteger os direitos dos credores e de preservar o estado da boa administração do banco.

346    Há que mencionar igualmente o Acórdão de 8 de novembro de 2016, Dowling e o. (C‑41/15, EU:C:2016:836), proferido por ocasião de um pedido de decisão prejudicial que tinha por objeto a interpretação dos artigos 8.o, 25.o e 29.o da Segunda Diretiva 77/91/CEE do Conselho, de 13 de dezembro de 1976, tendente a coordenar as garantias que, para proteção dos interesses dos sócios e de terceiros, são exigidas nos Estados‑Membros às sociedades, na aceção do artigo [54.o, segundo parágrafo, TFUE], no que respeita à constituição da sociedade anónima, bem como à conservação e às modificações do seu capital social, a fim de tornar equivalentes essas garantias em toda a Comunidade (JO 1977, L 26, p. 1). Esse processo dizia respeito a uma medida excecional das autoridades nacionais destinada a evitar, através de um aumento de capital, a insolvência de uma sociedade que, segundo o órgão jurisdicional de reenvio, ameaçava a estabilidade financeira da União. O Tribunal de Justiça considerou que a proteção que a Segunda Diretiva 77/91 conferia aos acionistas e aos credores de uma sociedade anónima, no respeitante ao seu capital social, não abrangia uma medida nacional como essa, adotada numa situação de perturbação grave da economia e do sistema financeiro de um Estado‑Membro, que se destinava a solucionar uma ameaça sistémica para a estabilidade financeira da União, resultante da insuficiência dos fundos próprios da sociedade em causa (Acórdão de 8 de novembro de 2016, Dowling e o., C‑41/15, EU:C:2016:836, n.o 50). O Tribunal de Justiça acrescentou que as disposições da Segunda Diretiva não se opunham, portanto, a uma medida excecional relativa ao capital social de uma sociedade anónima, que as autoridades nacionais tinham tomado, numa situação de perturbação grave da economia e do sistema financeiro de um Estado‑Membro, sem a aprovação da assembleia geral dessa sociedade e com o objetivo de assegurar a estabilidade do sistema financeiro da União (v. Acórdão de 8 de novembro de 2016, Dowling e o., C‑41/15, EU:C:2016:836, n.o 51 e jurisprudência referida).

347    Estas considerações aplicam‑se, por analogia, à situação de antigos acionistas ou detentores de instrumentos de capital de um banco que foi objeto de um procedimento de resolução nos termos do Regulamento n.o 806/2014, como as recorrentes.

348    Resulta do exposto que o procedimento de resolução, instituído pelo Regulamento n.o 806/2014 e descrito no seu artigo 18.o, prossegue um objetivo de interesse geral na aceção do artigo 52.o, n.o 1, da Carta, a saber, o objetivo de garantir a estabilidade dos mercados financeiros, suscetível de justificar uma restrição ao direito de audiência.

349    No presente caso, há que referir que as recorrentes não contestam que o procedimento de resolução do Banco Popular estava em conformidade com o objetivo de garantir a estabilidade financeira a que se refere o artigo 14.o do Regulamento n.o 806/2014.

350    A esse respeito, no artigo 4.4.2 do programa de resolução, o CUR explicou que tinha concluído que a situação do Banco Popular gerava um risco crescente de efeitos negativos significativos sobre a estabilidade financeira em Espanha, baseando‑se em diferentes elementos. Entre esses elementos figuram, em primeiro lugar, a dimensão e a importância do Banco Popular, que constitui a sociedade‑mãe do sexto grupo bancário de Espanha, com um montante total de ativos de 147 000 milhões de euros, e que foi designada em 2017 pelo Banco de Espanha como uma instituição de importância sistémica. O CUR referiu, nomeadamente, que o Banco Popular era um dos principais intervenientes no mercado em Espanha, com uma quota de mercado significativa no segmento das PME e que detinha uma quota de mercado relativamente alta dos depósitos (cerca de 6 %) e um grande número de clientes retalhistas (cerca de 1,4 milhões) em toda a Espanha. Em segundo lugar, o CUR tomou em consideração a natureza da atividade do Banco Popular que se articulava em torno das atividades de banco comercial e concentrou‑se principalmente na oferta de financiamento, na gestão de poupança e nos serviços aos particulares, às famílias e às empresas (nomeadamente as PME). Segundo o CUR, a semelhança do modelo de empresa do Banco Popular com o de outros bancos comerciais espanhóis podia contribuir para o potencial de contágio indireto desses bancos, que poderiam ser considerados confrontados com as mesmas dificuldades.

351    Além disso, há que observar que o segundo objetivo prosseguido pelo programa de resolução, a saber, assegurar a continuidade das funções críticas do Banco Popular, faz igualmente parte do objetivo de interesse geral de proteção da estabilidade dos mercados financeiros.

352    Nos termos do artigo 2.o, n.o 1, ponto 35, da Diretiva 2014/59, as funções críticas de uma instituição são definidas como «atividades, serviços ou operações cuja interrupção pode dar origem, num ou em vários Estados‑Membros, à perturbação de serviços essenciais para a economia real ou perturbar a estabilidade financeira devido à dimensão ou à quota de mercado de uma instituição ou de um grupo, ao seu grau de interligação externa e interna, à sua complexidade ou às suas atividades transfronteiriças, com especial destaque para a substituibilidade dessas atividades, serviços ou operações».

353    A este respeito, o artigo 6, n.o 1, do Regulamento Delegado (UE) 2016/778 da Comissão, de 2 de fevereiro de 2016, que complementa a Diretiva 2014/59 no que diz respeito às circunstâncias e às condições em que o pagamento de contribuições extraordinárias ex post pode ser total ou parcialmente suspenso, bem como aos critérios para a determinação das atividades, serviços e operações ligados às funções críticas e das linhas de negócio e serviços associados ligados às linhas de negócio críticas (JO 2016, L 131, p. 41), prevê os critérios de determinação das funções críticas. Trata‑se de uma função assegurada por uma instituição a terceiros não associados à instituição ou grupo e cuja perturbação súbita poderia ter um efeito negativo significativo sobre esses terceiros, um efeito de contágio ou constituir uma ameaça para a confiança geral dos participantes no mercado, devido à importância sistémica das funções para os terceiros e à importância sistémica da instituição ou grupo para assegurar essa função.

354    Assim, o objetivo de assegurar a continuidade das funções críticas da entidade afetada por uma medida de resolução, previsto no artigo 14.o, n.o 2, alínea a), do Regulamento n.o 806/2014, visa evitar uma interrupção dessas funções suscetível de causar perturbações, não só no mercado em causa, mas também para toda a estabilidade financeira da União.

355    Assim, uma medida de resolução, uma vez que se dirige a preservar ou a restabelecer a situação financeira de uma instituição de crédito, nomeadamente na medida em que constitui uma alternativa à liquidação, deve ser encarada como algo que responde efetivamente a um objetivo de interesse geral reconhecido pela União (v., por analogia, Acórdão de 25 de março de 2021, Balgarska Narodna Banka, C‑501/18, EU:C:2021:249, n.o 108).

356    A esse respeito, no artigo 4.2 do programa de resolução, o CUR indicou que a resolução do Banco Popular era necessária e proporcionada à realização, nomeadamente, do objetivo de assegurar a continuidade das funções críticas do Banco Popular. No artigo 4.4 do programa de resolução, o CUR identificou três funções críticas do Banco Popular, na aceção do artigo 6.o do Regulamento Delegado 2016/778, a saber, a aceitação de depósitos das famílias e das sociedades não financeiras, os empréstimos às PME e os serviços de pagamento em numerário.

357    As recorrentes não apresentam nenhum argumento destinado a contestar estas apreciações.

358    Resulta do exposto que o procedimento de resolução do Banco Popular prosseguia um objetivo de interesse geral, na aceção do artigo 52.o, n.o 1, da Carta, a saber, o objetivo de garantir a estabilidade dos mercados financeiros, suscetível de justificar uma restrição ao direito de audiência.

359    Em segundo lugar, o interesse geral da União, nomeadamente a prossecução dos objetivos de preservação da estabilidade dos mercados financeiros e assegurar a continuidade das funções críticas do Banco Popular, exige que, uma vez preenchidas as condições previstas no artigo 18.o, n.o 1, do Regulamento n.o 806/2014, seja adotada uma medida de resolução o mais rapidamente possível.

360    A este respeito, vários considerandos do Regulamento n.o 806/2014 implicam que, quando uma medida de resolução se torne necessária, deva ser adotada rapidamente. São eles, nomeadamente, os considerandos 26, 31 e 53 e, em particular, o considerando 56 desse regulamento que prevê que, a fim de minimizar perturbações nos mercados financeiros e na economia, o procedimento de resolução deverá ser realizado num curto espaço de tempo.

361    O Tribunal de Justiça considerou que o Regulamento n.o 806/2014 tem por objetivo instituir, em conformidade com o seu considerando 8, mecanismos de resolução mais eficazes, que devem constituir um instrumento essencial para evitar as consequências danosas das insolvências dos bancos ocorridas no passado e que esse objetivo pressupõe uma decisão rápida, como ilustram os curtos prazos previstos no artigo 18.o do referido regulamento, para que a estabilidade financeira não seja posta em perigo (Acórdão de 6 de maio de 2021, ABLV Bank e o./BCE, C‑551/19 P e C‑552/19 P, EU:C:2021:369, n.o 55).

362    Assim, o artigo 18.o, n.o 1, do Regulamento n.o 806/2014 prevê, nomeadamente, que, se o BCE considerar que uma entidade se encontra em situação ou risco de insolvência, comunicará sem demora a sua avaliação à Comissão e ao CUR. Segundo o n.o 2 desse mesmo artigo, se o CUR realizar uma avaliação por si próprio, esta deve ser comunicada sem demora ao BCE. Se estiverem preenchidas as condições previstas no seu n.o 1, o CUR adota um programa de resolução, que, nos termos do artigo 18.o, n.o 7, do Regulamento n.o 806/2014, é transmitido à Comissão imediatamente após a sua adoção. A Comissão dispõe então de um prazo de 24 horas para aprovar um programa de resolução ou apresentar objeções.

363    Daí resulta que, uma vez preenchidas as condições para a adoção de uma medida de resolução, a saber, em primeiro lugar, uma situação ou risco de insolvência, em segundo lugar, que não existe qualquer outra perspetiva razoável de outras medidas de natureza privada ou medidas prudenciais impedirem a sua insolvência num prazo razoável e, em terceiro lugar, que a sua resolução seja necessária para atingir um ou mais dos objetivos previstos no artigo 14.o do Regulamento n.o 806/2014, o artigo 18.o do mesmo regulamento prevê que deve ser adotada uma decisão num prazo muito curto.

364    Assim, no presente caso, a partir do momento em que o BCE concluiu que o Banco Popular se encontrava em situação ou risco de insolvência e o CUR considerou que estavam preenchidas as condições previstas no artigo 18.o do Regulamento n.o 806/2014, o programa de resolução devia ser adotado o mais rapidamente possível.

365    Esta decisão rápida justificava‑se pela necessidade de assegurar a continuidade das funções críticas do Banco Popular e evitar os efeitos adversos significativos da sua situação nos mercados financeiros, prevenindo nomeadamente os riscos de contágio. No presente caso, uma vez que a insolvência do Banco Popular ocorreu num dia de semana, era necessário concluir o procedimento e adotar a decisão antes da abertura dos mercados na manhã de 7 de junho de 2017.

366    Como salientou o advogado‑geral M. Campos Sánchez‑Bordona, no n.o 80 das suas Conclusões nos processos apensos ABLV Bank e o./BCE (C‑551/19 P e C‑552/19 P, EU:C:2021:16), a celeridade com que essas instituições e agências da União devem tomar as suas decisões é necessária para evitar o impacto negativo da resolução da instituição bancária nos mercados financeiros e essa celeridade obriga‑as de facto a terem «preparado» a decisão antes de lançarem o procedimento, para aproveitarem o fecho dos mercados de valores mobiliários.

367    A rapidez da decisão constituía, portanto, uma condição da sua eficácia.

368    Assim, o Tribunal de Justiça já declarou que a urgência que impõe uma ação imediata da autoridade competente justificava uma limitação do direito de audiência das pessoas afetadas por medidas adotadas no domínio da responsabilidade ambiental (v., neste sentido, Acórdão de 9 de março de 2010, ERG e o., C‑379/08 e C‑380/08, EU:C:2010:127, n.o 67) e no domínio da agricultura (v., neste sentido, Acórdão de 15 de junho de 2006, Dokter e o., C‑28/05, EU:C:2006:408, n.o 76).

369    Além disso, no domínio das medidas de congelamento de fundos, o Tribunal de Justiça já declarou que a comunicação dos fundamentos da inclusão inicial do nome de uma pessoa ou de uma entidade na lista das pessoas objeto de medidas restritivas antes dessa inclusão seria suscetível de comprometer a eficácia das medidas de congelamento de fundos e de recursos económicos impostas pelo direito da União. A fim de atingir o objetivo prosseguido pelo regulamento aplicável, essas medidas devem, pela sua própria natureza, ter um efeito de surpresa e ser aplicadas com efeito imediato (v., neste sentido, Acórdãos de 3 de setembro de 2008, Kadi e Al Barakaat International Foundation/Conselho e Comissão, C‑402/05 P e C‑415/05 P, EU:C:2008:461, n.os 338 a 340, de 21 de dezembro de 2011, França/People’s Mojahedin Organization of Iran, C‑27/09 P, EU:C:2011:853, n.o 61, e de 12 de fevereiro de 2020, Amisi Kumba/Conselho, T‑163/18, EU:T:2020:57, n.o 51).

370    Por razões ligadas igualmente ao objetivo prosseguido pelo direito da União e à eficácia das medidas nele previstas, as autoridades da União também não têm que proceder a uma audição dos recorrentes antes da inscrição dos seus nomes na lista das pessoas sujeitas a medidas restritivas (v., neste sentido, Acórdãos de 3 de setembro de 2008, Kadi e Al Barakaat International Foundation/Conselho e Comissão, C‑402/05 P e C‑415/05 P, EU:C:2008:461, n.o 341, e de 25 de abril de 2013, Gbagbo/Conselho, T‑119/11, não publicado, EU:T:2013:216, n.o 103).

371    Isto é tanto mais assim quanto, como no caso presente, a limitação do direito de audiência não diz respeito à entidade visada pelo procedimento de resolução, a saber, o Banco Popular, mas sim às recorrentes na sua qualidade de seus acionistas ou detentores de instrumentos de capital.

372    Refira‑se igualmente que, na sua decisão de 1 de abril de 2004, Camberrow MM5 AD c. Bulgária (CE:ECHR:2004:0401DEC005035799), o TEDH declarou que a venda do banco insolvente enquanto empresa em atividade tinha sido realizada a fim de obter a satisfação rápida e mais segura dos seus credores, que desde há anos esperavam receber o que lhes era devido, e a conclusão rápida do processo de insolvência. Por conseguinte, a necessidade de simplicidade e de rapidez no procedimento de venda do banco tinha uma importância capital. Se a lei tivesse previsto que o tribunal da insolvência fosse obrigado a consultar todos os acionistas e credores do banco, isso teria provocado um significativo abrandamento do processo e, por conseguinte, um atraso suplementar no pagamento das quantias devidas aos credores e na conclusão do processo de insolvência.

373    No Acórdão de 24 de novembro de 2005, Capital Bank AD c. Bulgária (CE:ECHR:2005:1124JUD004942999, n.o 136), o TEDH declarou que, num domínio economicamente sensível como a estabilidade do sistema bancário e em determinadas situações, podia existir uma necessidade imperiosa de agir com a maior diligência e sem aviso prévio, com o objetivo de evitar danos irreparáveis para o banco, os seus depositantes e os seus outros credores, ou para o sistema bancário e financeiro no seu conjunto.

374    Além disso, o facto de o programa de resolução ser suscetível de conduzir a uma ingerência no direito de propriedade dos recorrentes não pode justificar uma obrigação de lhes ser concedido um direito de audiência antes da sua adoção.

375    A esse respeito, o Tribunal Geral já salientou, no n.o 282 do Acórdão de 13 de julho de 2018, K. Chrysostomides & Co. e o./Conselho e o. (T‑680/13, EU:T:2018:486), que os processos aplicáveis devem proporcionar à pessoa em causa uma ocasião adequada de expor a sua causa às autoridades competentes. Para garantir o respeito dessa exigência, que é inerente ao artigo 1.o do Protocolo n.o 1 da Convenção Europeia para a Salvaguarda dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada em Roma em 4 de novembro de 1950, há que considerar os processos aplicáveis de um ponto de vista geral (v., neste sentido, Acórdãos de 3 de setembro de 2008, Kadi e Al Barakaat International Foundation/Conselho e Comissão, C‑402/05 P e C‑415/05 P, EU:C:2008:461, n.o 368 e jurisprudência referida, de 25 de abril de 2013, Gbagbo/Conselho, T‑119/11, não publicado, EU:T:2013:216, n.o 119, e TEDH, 20 de julho de 2004, Bäck c. Finlândia, CE:ECHR:2004:0720JUD003759897, n.o 56). Assim, essa exigência não pode ser interpretada no sentido de que a pessoa interessada deve, em todas as circunstâncias, poder fazer valer o seu ponto de vista junto das autoridades competentes previamente à adoção das medidas lesivas do seu direito de propriedade (v., neste sentido, TEDH, 19 de setembro de 2006, Maupas e o. c. França, CE:ECHR:2006:0919JUD001384402, n.os 20 e 21).

376    O Tribunal Geral considerou ser isso o que acontecia, nomeadamente, quando, como no caso presente, as medidas em causa não constituíam uma sanção e se integravam num contexto de emergência específico. A este respeito, o Tribunal Geral referiu que se tratava de prevenir um risco iminente de colapso dos bancos visados para preservar a estabilidade do sistema financeiro de um Estado‑Membro e, assim, evitar um contágio a outros Estados‑Membros da zona euro. Ora, a execução de um processo de consulta prévia em que os milhares de depositantes e acionistas dos bancos visados pudessem fazer valer utilmente o seu ponto de vista antes da adoção das disposições lesivas teria inevitavelmente atrasado a aplicação das medidas destinadas a evitar esse colapso. A realização do objetivo de preservar a estabilidade do sistema financeiro desse Estado‑Membro e, desse modo, evitar um contágio a outros Estados‑Membros da zona euro teria ficado exposta a grandes riscos (v. Acórdão de 13 de julho de 2018, K. Chrysostomides & Co. e o./Conselho e o., T‑680/13, EU:T:2018:486, n.o 282 e jurisprudência referida).

377    Esta apreciação foi confirmada pelo Tribunal de Justiça, que considerou que o Tribunal Geral tinha baseado acertadamente o seu raciocínio no Acórdão do TEDH de 21 de julho de 2016, Mamatas e o. c. Grécia (CE:ECHR:2016:0721JUD006306614), do qual resulta que a exigência de qualquer restrição do direito de propriedade estar prevista na lei não pode ser interpretada no sentido de as pessoas em causa terem de ser consultadas antes da adoção dessa lei, nomeadamente quando essa consulta prévia inevitavelmente atrase a aplicação das medidas destinadas a evitar o colapso dos bancos em causa (Acórdão de 16 de dezembro de 2020, Conselho e o./K. Chrysostomides & Co. e o., C‑597/18 P, C‑598/18 P, C‑603/18 P e C‑604/18 P, EU:C:2020:1028, n.o 159).

378    Por outro lado, há que considerar que a necessidade de agir rapidamente sem informar os acionistas e os credores de uma entidade da iminência de um procedimento de resolução que lhe diga respeito visa evitar o agravamento da situação dessa entidade que prejudicaria a eficácia da medida de resolução. Com efeito, informar os acionistas ou os titulares de obrigações do banco de que este poderia ser objeto de um procedimento de resolução e, portanto, que foi considerado em situação ou risco de insolvência, poderia levá‑los a vender os seus títulos nos mercados e igualmente conduzir a uma retirada massiva dos depósitos, o que teria como consequência agravar a situação financeira do banco e dificultar ou mesmo impossibilitar a adoção de uma solução suscetível de impedir a sua liquidação.

379    A este respeito, como resulta do considerando 116 do Regulamento n.o 806/2014, acima referido no n.o 187, a comunicação de todas as informações sobre uma decisão antes da sua adoção, quer se refira ao facto de estarem preenchidas as condições da resolução quer ao recurso a um instrumento específico ou a uma medida adotada no decurso do processo, é suscetível de ter consequências para os interesses públicos e privados afetados pela ação.

380    Importa referir que, na petição, as recorrentes admitem que o simples facto de dar a entender que o CUR estava a avaliar a necessidade de aplicar os seus poderes em relação a uma entidade específica constituiria uma ocorrência importante para o mercado, que levaria os investidores, os credores e os depositantes a tomar medidas de proteção para evitar as perdas.

381    Assim, há que considerar que a audição das recorrentes, antes da adoção do programa de resolução ou antes da adoção da decisão recorrida, teria provocado um significativo abrandamento do processo e, por conseguinte, teria comprometido tanto a consecução dos objetivos da medida como a sua eficácia.

382    A esse respeito, as recorrentes alegam que a Comissão e o CUR examinaram a eventual necessidade de uma medida de resolução durante várias semanas antes da adoção da decisão recorrida, o que assegurou à Comissão tempo suficiente para ouvir as recorrentes.

383    Basta constatar que, antes de 6 de junho de 2017, data em que o BCE concluiu que o Banco Popular estava em situação ou risco de insolvência, e antes da decisão do CUR de levar a cabo o procedimento de resolução, a resolução do Banco Popular não passava de uma eventualidade. Além disso, as recorrentes não explicam a partir de que momento a Comissão deveria ter consultado os detentores de instrumentos de capital do Banco Popular e importa ter em conta o facto de que a sua identidade podia mudar, dado que os instrumentos de capital são negociáveis nos mercados.

384    Daqui resulta, por um lado, que uma audição prévia das recorrentes, informando‑as da existência de uma potencial medida de resolução, teria levado a um risco de adotarem comportamentos no mercado que agravassem a situação financeira do Banco Popular. Essa audição poderia, assim, prejudicar a eficácia da medida de resolução prevista.

385    Por outro lado, tendo em conta a urgência da adoção do programa de resolução, não era possível consultar previamente as recorrentes, da mesma forma que os outros acionistas ou detentores de instrumentos de capital do Banco Popular, não só devido às dificuldades ligadas à sua identificação mas também devido à impossibilidade de analisar eficazmente as suas observações antes da adoção do programa de resolução ou da decisão recorrida.

386    Resulta do exposto que uma audição das recorrentes, antes da adoção do programa de resolução, teria comprometido os objetivos de proteção da estabilidade dos mercados financeiros e de continuidade das funções críticas da entidade, bem como as exigências de rapidez e de eficácia do procedimento de resolução.

387    Assim, a falta de audição das recorrentes no âmbito do procedimento de resolução do Banco Popular constitui uma restrição ao direito de audiência justificada e necessária para responder a um objetivo de interesse geral e respeita o princípio da proporcionalidade, em conformidade com o artigo 52.o, n.o 1, da Carta.

388    Por conseguinte, o sexto fundamento deve ser julgado improcedente.

 Quanto ao quinto fundamento, relativo à violação do direito de propriedade

389    As recorrentes alegam que o programa de resolução aprovado pela decisão recorrida viola o seu direito de propriedade consagrado no artigo 17.o, n.o 1, da Carta e lhes expropriou os seus instrumentos de capital. Entendem que a redução dos instrumentos de capital decidida no programa de resolução constitui uma expropriação ilegal, que não respeita as exigências do artigo 17.o, n.o 1, da Carta, na medida em que não respeita as condições «previstas por lei» e não prevê uma justa indemnização.

390    O artigo 17.o, n.o 1, da Carta prevê:

«Todas as pessoas têm o direito de fruir da propriedade dos seus bens legalmente adquiridos, de os utilizar, de dispor deles e de os transmitir em vida ou por morte. Ninguém pode ser privado da sua propriedade, exceto por razões de utilidade pública, nos casos e condições previstos por lei e mediante justa indemnização pela respetiva perda, em tempo útil. A utilização dos bens pode ser regulamentada por lei na medida do necessário ao interesse geral.»

391    Segundo jurisprudência constante, o direito de propriedade garantido pelo artigo 17.o, n.o 1, da Carta não é uma prerrogativa absoluta e o seu exercício pode ser objeto de restrições justificadas por objetivos de interesse geral prosseguidos pela União. Por conseguinte, como resulta do artigo 52.o, n.o 1, da Carta, podem ser impostas restrições ao uso do direito de propriedade, na condição de essas restrições corresponderem efetivamente a objetivos de interesse geral e não constituírem, tendo em conta o objetivo prosseguido, uma intervenção desmedida e intolerável que atente contra a própria substância do direito assim garantido (v. Acórdão de 20 de setembro de 2016, Ledra Advertising e o./Comissão e BCE, C‑8/15 P a C‑10/15 P, EU:C:2016:701, n.os 69 e 70 e jurisprudência referida; Acórdãos de 16 de julho de 2020, Adusbef e o., C‑686/18, EU:C:2020:567, n.o 85, e de 23 de maio de 2019, Steinhoff e o./BCE, T‑107/17, EU:T:2019:353, n.o 100).

392    Daqui resulta que o direito de propriedade não é um direito absoluto, e que, em conformidade com o artigo 52.o, n.o 1, da Carta, acima referido no n.o 336, pode sofrer limitações se estiverem previstas nos diplomas aplicáveis, se forem necessárias à prossecução de um objetivo geral e se forem proporcionadas a esse objetivo.

393    Recorde‑se que, no artigo 6.o do programa de resolução, o CUR decidiu, nos termos do artigo 21.o do Regulamento n.o 806/2014, reduzir e converter os instrumentos de capital do Banco Popular segundo as regras acima especificadas no n.o 73.

394    Além disso, resulta, por um lado, do considerando 61 do Regulamento n.o 806/2014, que as limitações aos direitos dos acionistas e credores deverão respeitar o artigo 52.o, n.o 1, da Carta e, por outro, do considerando 62 do mesmo regulamento, que a interferência com os direitos de propriedade não deverá ser desproporcionada.

395    Nos termos do artigo 15.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 806/2014, relativo aos princípios gerais que regem a resolução, os acionistas da instituição objeto de resolução são os primeiros a suportar perdas.

396    A este respeito, o Tribunal de Justiça já decidiu no sentido de que, no que respeita aos acionistas dos bancos, que, segundo o regime geral aplicável ao estatuto dos acionistas das sociedades anónimas, estes assumem plenamente o risco dos seus investimentos (Acórdão de 19 de julho de 2016, Kotnik e o., C‑526/14, EU:C:2016:570, n.o 73).

397    O Tribunal de Justiça considerou, no domínio dos auxílios de Estado, que, uma vez que os acionistas são responsáveis pelas dívidas do banco até ao montante do capital social deste, não se pode considerar que afeta o seu direito de propriedade o facto de os pontos 40 a 46 da Comunicação da Comissão sobre a aplicação, a partir de 1 de agosto de 2013, das regras em matéria de auxílios estatais às medidas de apoio aos bancos no contexto da crise financeira («comunicação sobre o setor bancário») (JO 2013, C 216, p. 1) exigirem que, para superar o défice de capital de um banco, esses acionistas, previamente à concessão de um auxílio estatal, contribuam para absorver as perdas sofridas por esse banco na mesma medida que se não tivesse sido concedido esse auxílio de Estado (Acórdão de 19 de julho de 2016, Kotnik e o., C‑526/14, EU:C:2016:570, n.o 74).

398    Há que considerar, por analogia, que, no programa de resolução, a decisão de reduzir e converter os instrumentos de capital do Banco Popular de que eram titulares as recorrentes é consequência do facto de os acionistas de uma entidade deverem suportar os riscos inerentes aos seus investimentos e do facto de, uma vez que essa entidade é objeto de resolução por causa da sua insolvência, deverem suportar as suas consequências económicas.

399    A este respeito, o Tribunal Geral já declarou que uma medida que consistiu na redução do valor nominal das ações de um banco cipriota era proporcionada face ao objetivo prosseguido por essa medida. Antes de mais, referiu que essa medida visava contribuir para a recapitalização do banco e que era adequada para contribuir para o objetivo de assegurar a estabilidade do sistema financeiro cipriota e da zona euro no seu todo. Em seguida, declarou que essa medida não excedia os limites do adequado e necessário à realização desse objetivo, dado que as alternativas menos restritivas não eram realizáveis ou não teriam permitido alcançar os resultados esperados. Por último, considerou que, tendo igualmente em conta a importância do objetivo prosseguido, a medida em causa não gerava inconvenientes desmedidos. Recordou, a esse respeito, que os acionistas dos bancos assumem plenamente o risco dos seus investimentos (Acórdão de 13 de julho de 2018, K. Chrysostomides & Co. e o./Conselho e o., T‑680/13, EU:T:2018:486, n.o 330).

400    Nestas circunstâncias, o Tribunal Geral concluiu que não se pode considerar que a redução do valor nominal das ações desse banco constituía uma intervenção desmedida e intolerável violadora da própria substância do direito de propriedade dos acionistas (Acórdão de 13 de julho de 2018, K. Chrysostomides & Co. e o./Conselho e o., T‑680/13, EU:T:2018:486, n.o 331).

401    Além disso, importa lembrar que resulta da jurisprudência acima referida no n.o 343 que os serviços financeiros desempenham um papel central na economia da União e que existe o risco de a insolvência que afete um ou mais bancos se propagar aos outros bancos, quer no Estado‑Membro em causa, quer noutros Estados‑Membros.

402    O Tribunal de Justiça já decidiu no sentido de que, tendo em conta o objetivo de assegurar a estabilidade do sistema bancário na zona euro e tendo em conta o risco iminente de perdas financeiras a que os depositantes dos bancos em causa teriam sido expostos em caso de insolvência, podiam justificar‑se certas restrições ao direito de propriedade (v., neste sentido, Acórdão de 20 de setembro de 2016, Ledra Advertising e o./Comissão e BCE, C‑8/15 P a C‑10/15 P, EU:C:2016:701, n.o 74).

403    O Tribunal de Justiça considerou igualmente que, embora exista um claro interesse geral em garantir em toda a União uma proteção forte e coerente dos investidores, não se pode considerar que esse interesse prevaleça, em todas as circunstâncias, sobre o interesse geral em garantir a estabilidade do sistema financeiro (Acórdãos de 19 de julho de 2016, Kotnik e o., C‑526/14, EU:C:2016:570, n.o 91, e de 8 de novembro de 2016, Dowling e o., C‑41/15, EU:C:2016:836, n.o 54).

404    Ora, recorde‑se que, no artigo 4.2 do programa de resolução, o CUR considerou que a resolução era necessária e proporcionada aos objetivos, previstos no artigo 14.o, n.o 2, alínea a) e b), do Regulamento n.o 806/2014, de assegurar a continuidade das funções críticas e evitar efeitos adversos significativos sobre a estabilidade financeira, nomeadamente evitando o contágio, inclusive das infraestruturas de mercado, e mantendo a disciplina do mercado. Indicou que a liquidação do Banco Popular segundo um processo normal de insolvência não teria permitido atingir esses objetivos na mesma medida. Na decisão recorrida, a Comissão aprovou expressamente as razões apresentadas pelo CUR para justificar a medida de resolução para defesa do interesse público.

405    Assim, o programa de resolução, na medida em que visa preservar ou restabelecer a situação financeira do Banco Popular e, nomeadamente, na medida em que constitui uma alternativa à liquidação respondia a um objetivo de interesse geral na aceção do artigo 52.o, n.o 1, da Carta, a saber, garantir a estabilidade dos mercados financeiros.

406    As recorrentes referem que não põem em causa a compatibilidade do mecanismo único de resolução, conforme previsto pelo Regulamento n.o 806/2014, com a Carta e que admitem que a resolução de um banco em insolvência, em conformidade com as disposições desse regulamento, destinadas a proteger a estabilidade do sistema bancário, prossegue legalmente um interesse público.

407    Em primeiro lugar, as recorrentes alegam que a decisão de reduzir e converter os instrumentos de capital do Banco Popular que detinham é contrária às exigências de artigo 17.o, n.o 1, da Carta na medida em que não respeitava as condições previstas por lei. O programa de resolução e a decisão recorrida não respeitam os princípios gerais do direito da União, nem as disposições do Regulamento n.o 806/2014 pelos motivos expostos nos outros fundamentos.

408    A este respeito, basta observar que resulta da análise dos outros fundamentos que a Comissão não cometeu nenhum erro manifesto de apreciação na aplicação das disposições do Regulamento n.o 806/2014, nem violou os princípios gerais do direito.

409    Além disso, por um lado, observe‑se que, nos outros fundamentos, as recorrentes não contestam que as condições previstas no artigo 18.o do Regulamento n.o 806/2014 que justificam a adoção do programa de resolução se encontravam preenchidas. Por outro lado, as recorrentes não apresentam argumentos específicos para demonstrar que a redução e conversão dos instrumentos de capital decididas pelo CUR, a medida que podia lesar o respetivo direito de propriedade, não estava em conformidade com as disposições do artigo 21.o do Regulamento n.o 806/2014 e que, por conseguinte, a Comissão não a deveria ter aprovado.

410    Daí resulta que as recorrentes não invocaram nenhum argumento suscetível de pôr em causa, por um lado, o facto de a decisão do CUR de reduzir e converter os instrumentos de capital do Banco Popular estar em conformidade com as condições previstas pelo Regulamento n.o 806/2014 e, por outro lado, o facto de essa decisão ser necessária à prossecução de um objetivo geral suscetível de justificar uma restrição ao direito de propriedade.

411    Em segundo lugar, as recorrentes alegam que o programa de resolução e a decisão recorrida violam o artigo 17.o, n.o 1, da Carta na medida em que não preveem que lhes seja atribuída uma indemnização.

412    Há que referir que o artigo 15.o, n.o 1, alínea g), do Regulamento n.o 806/2014 dispõe que nenhum credor deve suportar perdas mais elevadas do que teria tido de incorrer se a entidade objeto de um procedimento de resolução tivesse sido liquidada segundo um processo normal de insolvência.

413    Para determinar se os acionistas e os credores teriam recebido um tratamento mais favorável se a entidade em causa tivesse entrado num processo normal de insolvência, o artigo 20.o, n.o 16, do Regulamento n.o 806/2014 prevê que seja realizada uma avaliação posteriormente à resolução. Nos termos do artigo 20.o, n.o 17, do Regulamento n.o 806/2014, essa avaliação determina se existe uma diferença entre o tratamento que teriam recebido os acionistas e os credores no caso de a instituição ter entrado num processo normal de insolvência aquando da tomada da decisão relativa à medida de resolução e o tratamento efetivo que receberam na resolução.

414    Se, na sequência dessa avaliação, se determinar que os acionistas ou os credores suportaram perdas mais elevadas na resolução do que teriam suportado numa liquidação segundo um processo normal de insolvência, o artigo 76.o, n.o 1, do Regulamento n.o 806/2014 prevê que o CUR pode recorrer ao FUR para lhes pagar uma compensação.

415    Daí resulta que o Regulamento n.o 806/2014 institui um mecanismo que garante aos acionistas ou aos credores da entidade objeto de uma resolução uma justa indemnização em conformidade com as exigências do artigo 17.o, n.o 1, da Carta.

416    Além disso, contrariamente ao que alegam as recorrentes, o facto de não terem obtido qualquer compensação à data do programa de resolução não é suficiente para demonstrar uma violação do seu direito de propriedade na medida em que o artigo 17.o, n.o 1, da Carta não prevê o pagamento de uma indemnização concomitante com a restrição do direito de propriedade, mas sim um pagamento em tempo útil.

417    Por outro lado, quanto aos argumentos das recorrentes apresentados na réplica, destinados a impugnar a avaliação 3, relativos à falta de independência da Deloitte e à violação de seu direito de acesso ao processo, basta observar que são inoperantes. Com efeito, esses argumentos dizem respeito à avaliação 3 efetuada posteriormente à adoção da decisão recorrida e a um procedimento diferente, pelo que não são suscetíveis de pôr em causa a legalidade da decisão recorrida.

418    Em terceiro lugar, na réplica, as recorrentes alegam que uma compensação determinada com base na diferença de tratamento dos credores no âmbito de uma medida de resolução e no âmbito de um processo normal de insolvência não constitui uma justa indemnização na aceção do artigo 17.o, n.o 1, da Carta. Alegam que, se a Comissão tivesse respeitado o direito da União, a decisão recorrida não teria sido adotada ou o programa de resolução teria sido diferente e, por conseguinte, o pagamento de uma indemnização com base no artigo 76.o, n.o 1, do Regulamento n.o 806/2014 não constitui uma justa indemnização. A real indemnização das recorrentes deve ser determinada com base no cenário contrafactual correto que seria a inexistência de resolução seguida de uma solução privada ou, a título subsidiário, uma resolução baseada numa avaliação correta do Banco Popular.

419    Recorde‑se que o princípio, previsto no artigo 15.o, n.o 1, alínea g), do Regulamento n.o 806/2014, segundo o qual nenhum credor pode ser desfavorecido, tem por objetivo garantir que as recorrentes podem beneficiar de uma indemnização se a violação do seu direito de propriedade resultante do programa de resolução for mais significativa do que a que teriam sofrido se o Banco Popular tivesse sido liquidado segundo um processo normal de insolvência.

420    Assim, no presente caso, no programa de resolução, o CUR constatou estarem preenchidas as condições previstas no artigo 18.o, n.o 1, do Regulamento n.o 806/2014, a saber, que o Banco Popular estava em situação ou risco de insolvência, que nenhuma medida prudencial ou do setor privado era suscetível de impedir a sua insolvência num prazo razoável e que a medida de resolução era necessária para defesa do interesse público. Recorde‑se que as recorrentes não impugnam o facto de essas condições se encontrarem preenchidas no presente caso.

421    Daqui resulta que, caso o programa de resolução não tivesse sido adotado, a alternativa consistia na liquidação do Banco Popular segundo um processo normal de insolvência, o que as recorrentes admitiram na audiência.

422    Além do mais, da análise do terceiro fundamento resulta que o cenário contrafactual invocado pelas recorrentes e constante do seu relatório de peritagem complementar, que consiste na inexistência de resolução do Banco Popular seguida de uma solução privada, não é pertinente.

423    Além disso, contrariamente ao que alegam as recorrentes, o valor do seu investimento não deve ser calculado atendendo à situação que precede a adoção do programa de resolução, mas sim à hipótese de o programa de resolução não ter sido adotado, o que corresponde a uma situação de liquidação do Banco Popular segundo um processo normal de insolvência.

424    A este respeito, no domínio dos auxílios estatais, o Tribunal de Justiça declarou que as perdas dos acionistas dos bancos em dificuldades teriam, em todo o caso, a mesma dimensão, independentemente da questão de saber se a sua causa assenta numa sentença de declaração de insolvência em razão da falta de concessão de um auxílio estatal ou num procedimento de concessão desse auxílio sujeito à condição prévia de repartição dos encargos (Acórdão de 19 de julho de 2016, Kotnik e o., C‑526/14, EU:C:2016:570, n.o 75).

425    O Tribunal de Justiça já referiu que o ponto 46 da comunicação sobre o setor bancário prevê que «é conveniente respeitar o princípio segundo o qual nenhum credor pode ser mais desfavorecido» e que «[o]s credores subordinados não devem receber menos em termos económicos do que aquilo que o seu instrumento teria valido se não tivesse sido concedido o auxílio estatal» (Acórdão de 19 de julho de 2016, Kotnik e o., C‑526/14, EU:C:2016:570, n.o 77).

426    Segundo o Tribunal de Justiça, resulta deste ponto que as medidas de repartição dos encargos a que está subordinada a concessão de um auxílio estatal a favor de um banco deficitário não podem causar ao direito de propriedade dos credores subordinados um prejuízo que estes não teriam sofrido no âmbito de um processo de falência decorrente da falta de concessão de tal auxílio. Nestas condições, não se pode validamente sustentar que as medidas de repartição dos encargos, como as previstas na comunicação sobre o setor bancário, constituem uma ingerência no direito de propriedade dos acionistas e dos credores subordinados (Acórdão de 19 de julho de 2016, Kotnik e o., C‑526/14, EU:C:2016:570, n.os 78 e 79).

427    Além do mais, quanto aos títulos, o montante da indemnização devida deve ser apreciado face ao verdadeiro valor comercial desses títulos no momento da adoção da regulamentação controvertida, e não face ao seu valor nominal ou ao montante que o seu detentor esperaria receber no momento da sua aquisição (v. Acórdão de 13 de julho de 2018, K. Chrysostomides & Co. e o./Conselho e o., T‑680/13, EU:T:2018:486, n.o 314 e jurisprudência referida).

428    Por conseguinte, há que considerar, por analogia, que a aplicação no presente caso do princípio de nenhum credor poder ser desfavorecido, previsto no artigo 15.o, n.o 1, alínea g), do Regulamento n.o 806/2014, garante às recorrentes uma justa indemnização em conformidade com as exigências do artigo 17.o, n.o 1, da Carta.

429    Do exposto resulta que, em primeiro lugar, o Banco Popular estava em situação ou risco de insolvência e que não existiam medidas alternativas suscetíveis de impedir essa situação, em segundo lugar, sem a resolução, o Banco Popular teria entrado num processo normal de insolvência e, em terceiro lugar, os acionistas do Banco Popular deviam assumir o risco dos seus investimentos e o Regulamento n.o 806/2014 prevê o eventual pagamento de uma compensação em aplicação do princípio segundo o qual nenhum credor pode ser desfavorecido. Por conseguinte, há que concluir que a decisão de reduzir e converter os instrumentos de capital do Banco Popular no programa de resolução não constitui uma intervenção desmedida e intolerável que viole a própria substância do seu direito de propriedade, antes devendo ser considerada uma restrição proporcionada ao seu direito de propriedade, de acordo com o disposto no artigo 17.o, n.o 1, e no artigo 52.o, n.o 1, da Carta.

430    Por outro lado, importa referir que as recorrentes alegam que o tratamento no âmbito de um processo normal de insolvência é o critério adequado para determinar a indemnização quando a resolução de um banco foi legalmente efetuada. Alegam também que, no presente caso, uma vez que o programa de resolução não estava em conformidade com o disposto no Regulamento n.o 806/2014, a indemnização que lhes é devida deve basear‑se na situação em que se encontrariam sem os atos ilegais.

431    Observe‑se que essa argumentação não visa demonstrar a existência de uma violação do direito de propriedade, constituindo, na realidade, a reivindicação de uma indemnização de um dano sofrido devido a um ilícito cometido por uma instituição da União, suscetível de ser atribuída no contexto de uma ação de indemnização.

432    Por conseguinte, o quinto fundamento deve ser julgado improcedente.

 Quanto aos pedidos de medidas de organização do processo

433    Na petição, as recorrentes submetem pedidos de medidas de organização do processo no sentido de o Tribunal Geral ordenar à Comissão, ao CUR e ao BCE a apresentação de determinados documentos.

434    Refira‑se que, por Despacho de diligências de instrução, de 21 de maio de 2021, nos termos do artigo 91.o, alínea b), do artigo 92.o, n.o 3, e do artigo 103.o do Regulamento de Processo, o Tribunal Geral ordenou à Comissão e ao CUR a apresentação de determinados documentos acima referidos no n.o 93. Por Despacho de 16 de junho de 2021, o Tribunal Geral considerou que os documentos apresentados pela Comissão e pelo CUR na sua versão confidencial não eram pertinentes para a decisão da causa. Em contrapartida, a carta do Banco Popular ao BCE, de 6 de junho de 2017, sem o respetivo anexo, foi comunicada às outras partes.

435    No que respeita aos pedidos de medidas de organização do processo ou de diligências de instrução apresentados por uma parte num litígio, há que lembrar que cabe exclusivamente ao Tribunal Geral decidir da eventual necessidade de completar os elementos de informação de que dispõe sobre os processos que lhe são submetidos (v. Acórdão de 26 de janeiro de 2017, Mamoli Robinetteria/Comissão, C‑619/13 P, EU:C:2017:50, n.o 117 e jurisprudência referida, Acórdão de 12 de novembro de 2020, Fleig/SEAE, C‑446/19 P, não publicado, EU:C:2020:918, n.o 53).

436    No presente caso, refira‑se que os autos e as explicações dadas na audiência são suficientes para permitir ao Tribunal Geral pronunciar‑se, podendo decidir utilmente com base nas conclusões, nos fundamentos e nos argumentos desenvolvidos durante a instância e atendendo aos documentos apresentados pelas partes.

437    Daqui resulta que os pedidos de medidas de organização do processo submetidos pelas recorrentes devem ser indeferidos.

438    Resulta de todas estas considerações que deve ser integralmente negado provimento ao recurso, sem que seja necessário conhecer da admissibilidade do pedido de anulação do artigo 1.o da decisão recorrida, apresentado pelas recorrentes a título subsidiário,

 Quanto às despesas

439    Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo as recorrentes sido vencidas, há que condená‑las a suportar, além das suas próprias despesas, as despesas efetuadas pela Comissão e pelo Banco Santander, em conformidade com os pedidos destes últimos.

440    Nos termos do artigo 138.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, os Estados‑Membros e as instituições que intervenham no litígio devem suportar as suas próprias despesas. Segundo o artigo 1.o, n.o 2, alínea f), do Regulamento de Processo, o termo «instituições» designa quer as instituições da União referidas no artigo 13.o, n.o 1, TUE quer os órgãos ou organismos criados pelos Tratados ou por um ato adotado em sua execução, que podem ser partes perante o Tribunal Geral. Segundo o artigo 42.o, n.o 1, do Regulamento n.o 806/2014, o CUR é uma agência da União. Por conseguinte, o CUR suporta as suas próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Terceira Secção alargada)

decide:

É negado provimento ao recurso.A Algebris (UK) Ltd e a Anchorage Capital Group LLC suportarão as suas próprias despesas e as despesas efetuadas pela Comissão Europeia e pelo Banco Santander, SA.O Conselho Único de Resolução (CUR) suportará as suas próprias despesas.

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 1 de junho de 2022.


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*      Língua do processo: inglês.