Language of document : ECLI:EU:T:2015:498

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Sexta Secção)

15 de julho de 2015 (*)

«Concorrência — Acordos, decisões e práticas concertadas — Mercado europeu do aço para pré‑esforço — Fixação dos preços, repartição do mercado e troca de informações comerciais sensíveis — Decisão que constata uma infração ao artigo 101.° TFUE — Cooperação durante o procedimento administrativo»

No processo T‑398/10,

Fapricela — Indústria de Trefilaria, SA, com sede em Ançã (Portugal), representada, inicialmente, por M. Gorjão‑Henriques e S. Roux, advogados, em seguida, por T. Guerreiro, R. Lopes e S. Alberto, advogados,

recorrente,

contra

Comissão Europeia, representada por F. Castillo de la Torre, P. Costa de Oliveira e V. Bottka, na qualidade de agentes, assistidos por M. Marques Mendes, advogado,

recorrida,

que tem por objeto um pedido de anulação e de reforma da Decisão C (2010) 4387 final da Comissão, de 30 de junho de 2010, relativa a um processo nos termos do artigo 101.° TFUE e do artigo 53.° do Acordo EEE (Processo COMP/38344 — Aço para pré‑esforço), alterada pela Decisão C (2010) 6676 final da Comissão, de 30 de setembro de 2010, e pela Decisão C (2011) 2269 final da Comissão, de 4 de abril de 2011,

O TRIBUNAL GERAL (Sexta Secção),

composto por: S. Frimodt Nielsen (relator), presidente, F. Dehousse e A. M. Collins, juízes,

secretário: J. Palacio González, administrador principal,

vistos os autos e após a audiência de 16 de outubro de 2014,

profere o presente

Acórdão (1)

[omissis]

 Tramitação processual e pedidos das partes

56      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 8 de setembro de 2010, a Fapricela interpôs o presente recurso.

57      Por requerimento separado, registado na Secretaria do Tribunal Geral no mesmo dia, a recorrente apresentou um pedido de suspensão da execução da decisão impugnada. Este pedido foi indeferido por despacho de 15 de julho de 2011, Fapricela/Comissão (T‑398/10 R, EU:T:2011:395), tendo a decisão sobre as despesas ficado reservada para final. A recorrente interpôs recurso daquele despacho, ao qual foi negado provimento por despacho de 20 de abril de 2012, Fapricela/Comissão [C‑507/11 P(R), EU:C:2012:231].

58      Por requerimento de 12 de dezembro de 2010, a Fapricela adaptou os seus fundamentos e pedidos, na sequência da adoção da primeira decisão modificativa, e apresentou uma petição alterada.

59      Por decisão de 6 de junho de 2011, o Tribunal Geral solicitou à Comissão que lhe fornecesse a segunda decisão modificativa. A Comissão acedeu a esse pedido em 17 de junho de 2011.

60      Na sequência da adoção da segunda decisão modificativa, a Fapricela adaptou novamente os seus fundamentos e pedidos, por requerimento apresentado na Secretaria em 29 de julho de 2011.

61      A fase escrita terminou em 21 de novembro de 2011, com a apresentação, pela Comissão, da tréplica na língua do processo.

62      Tendo a composição das secções do Tribunal Geral sido alterada a partir de 23 de setembro de 2013, o juiz‑relator foi agregado à Sexta Secção, à qual o presente processo foi atribuído em 3 de outubro de 2013.

63      O relatório preliminar referido no artigo 52.°, n.° 2, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral de 2 de maio de 1991 foi comunicado à Sexta Secção em 7 de fevereiro de 2014.

64      Em 14 de março de 2014, a recorrente enviou uma carta ao Tribunal Geral, a respeito do pagamento de um adiantamento da coima aplicada pela Comissão e da existência de conversações relativas a um plano de pagamento faseado.

65      Em 9 de abril de 2014, no âmbito das medidas de organização do processo previstas no artigo 64.° do Regulamento de Processo de 2 de maio de 1991, o Tribunal Geral enviou à recorrente e à Comissão uma lista de dezasseis perguntas escritas.

66      Por cartas, respetivamente, de 8 de maio e 2 de junho de 2014, a Comissão e a recorrente cumpriram aquelas medidas.

67      Em 14 de maio de 2014, com base no relatório do juiz‑relator, o Tribunal Geral decidiu dar início à fase oral do processo.

68      A Fapricela conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        anular os artigos 1.°, 2.° e 3.° da decisão impugnada, na parte respeitante à recorrente;

–        a título subsidiário, reduzir substancialmente o montante da coima que lhe foi aplicada;

–        condenar a Comissão nas despesas.

69      A Comissão conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar a Fapricela nas despesas.

 Questão de direito

70      A recorrente invoca sete fundamentos em apoio do seu recurso.

71      O primeiro fundamento é relativo à violação do artigo 101.° TFUE, dos princípios da responsabilidade pessoal, da individualidade das penas, da presunção de inocência, da igualdade de armas e da igualdade de tratamento, bem como à violação dos direitos de defesa e à falta de fundamentação. A Fapricela sustenta, em substância, que não participou no Clube Europa, que dele não tinha conhecimento (primeira parte) e que, por conseguinte, foi sem razão que a Comissão considerou que ela tinha participado numa infração única e continuada, conforme definida na decisão impugnada (segunda parte). Além disso, alega que foi sem razão que a Comissão a responsabilizou por ter participado no acordo no que respeita ao cordão (terceira parte).

72      O segundo fundamento é relativo à violação dos princípios da proporcionalidade, da igualdade de tratamento e da individualidade das penas. A Fapricela alega, em substância, por um lado, que as orientações de 2006 estão viciadas por um defeito estrutural que, devido à aplicação do nível máximo de 10% do volume de negócios, conduz à aplicação de coimas mais pesadas às pequenas empresas e, por outro lado, que, no presente caso, a Comissão não tomou em consideração, ao abrigo da proporcionalidade, e para além do nível máximo de 10% do volume de negócios, uma série de fatores que deveriam ter determinado a diminuição do montante da coima que lhe foi aplicada.

73      O terceiro fundamento é relativo a um erro no cálculo da duração da participação da Fapricela no Clube España, por a Comissão, em opinião da recorrente, ter tomado erradamente em consideração um período entre outubro de 2000 e março de 2001, período esse em que tinha saído do cartel.

74      O quarto fundamento é relativo à violação das orientações de 2006 e do princípio da igualdade de tratamento, na medida em que foi sem razão que a Comissão não concedeu uma redução do montante da coima ao abrigo da incapacidade de pagamento.

75      Aquando da adaptação dos seus fundamentos e pedidos na sequência da primeira e, em seguida, da segunda decisão modificativa, a Fapricela alegou, sucessivamente, dois fundamentos a título complementar, relativos, por um lado, à violação dos direitos de defesa, das formalidades essenciais e a uma falta de fundamentação e, por outro, à violação do artigo 6.° da Convenção para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada em Roma, em 4 de novembro de 1950, e do artigo 47.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.

76      Na audiência, a recorrente renunciou ao segundo fundamento complementar.

77      Por último, na audiência, a recorrente alegou um novo fundamento e alegou, em substância, que a Comissão violou os seus direitos de defesa por não lhe ter comunicado a primeira decisão modificativa, na qual alterou a decisão inicial relativamente ao valor das vendas considerado para efeitos do cálculo do montante da coima.

78      Há que examinar, sucessivamente, o fundamento apresentado na audiência, relativo à violação dos direitos de defesa da Fapricela (notificação da primeira decisão modificativa), as duas primeiras partes do primeiro fundamento (conhecimento do Clube Europa e infração única e continuada), o terceiro fundamento (distanciamento relativamente ao Clube España, entre outubro de 2000 e 9 de abril de 2001), a terceira parte do primeiro fundamento (não participação no cartel sobre o cordão, no âmbito do Clube España), o segundo fundamento (caráter desproporcionado da coima e da gravidade da infração imputada à recorrente), o quarto fundamento (incapacidade de pagamento da recorrente) e, por último, o primeiro fundamento complementar alegado aquando da adaptação dos seus fundamentos e pedidos.

I –  Quanto ao fundamento apresentado na audiência, relativo à violação, por parte da Comissão, dos direitos de defesa pelo facto de a primeira decisão modificativa não ter sido comunicada à recorrente

79      A recorrente sustenta, em substância, que os seus direitos de defesa foram violados, tanto no âmbito do procedimento administrativo como perante o Tribunal Geral, por a Comissão não lhe ter comunicado a primeira decisão modificativa, na qual alterou a decisão inicial relativamente ao valor das vendas considerado para efeitos do cálculo do montante da coima.

80      Sem prejuízo de a recorrente ter comunicado à Comissão o montante relativo ao valor das vendas, na sequência de um pedido formulado por esta última em 16 de junho de 2009 (v. anexo B1 da contestação), facto que, aliás, a recorrente, reconheceu na audiência, há que referir, por um lado, que a primeira decisão modificativa figura no anexo do articulado de adaptação dos fundamentos e pedidos apresentado pela recorrente em 12 de dezembro de 2010 e, por outro, que a carta datada de 29 de outubro de 2010, pela qual a Comissão notificou aquela decisão à recorrente, também figura em anexo do referido articulado.

81      Por conseguinte, contrariamente ao que a recorrente afirma, a primeira decisão modificativa foi‑lhe efetivamente notificada e ela exerceu os seus direitos de defesa quando adaptou os seus fundamentos e pedidos na sequência dessa notificação.

82      Consequentemente, sem que seja necessário que o Tribunal Geral se pronuncie sobre a admissibilidade deste fundamento cuja primeira apresentação ocorreu na audiência, há que indeferi‑lo por não ser procedente.

II –  Quanto às duas primeiras partes do primeiro fundamento, relativo à violação do artigo 101.° TFUE, dos princípios da responsabilidade pessoal, da individualidade das penas, da presunção de inocência, da igualdade de armas e da igualdade de tratamento, bem como à violação dos direitos de defesa e à falta de fundamentação

A –  Recordatória da decisão impugnada

83      Nos termos do considerando 659 da decisão impugnada:

«A Fapricela esteve presente na reunião em Madrid, realizada em 17.05.2001 (ver Anexo 4) [...]. Em especial, fazendo referência a uma reunião de 06.07.2001 (pretendendo provavelmente dizer a reunião de 17.05.2001), alega que não existe qualquer referência clara a uma comparação com o Clube [Italia]. No entanto, a Comissão salienta que as notas contemporâneas desta reunião referem o seguinte: ‘para os produtores espanhóis e portugueses, esta reunião tinha por objetivo explicar à Tréfileurope que o seu acordo ibérico relativo ao [APE] funcionava perfeitamente (como em Itália: listas de clientes, volumes por cliente e volumes totais)’.»

84      A Comissão conclui daqui que a Fapricela só teve conhecimento da existência do Clube Europa a partir da reunião de 17 de maio de 2001 (considerando 660 da decisão impugnada).

85      A Comissão tomou em consideração este conhecimento tardio do Clube Europa, para determinar a percentagem do valor das vendas considerado a título da gravidade da infração (considerandos 949 e 953 da decisão impugnada).

B –  Apreciação do Tribunal Geral

1.     Recordatória dos princípios no que respeita à prova e à produção da prova, bem como ao dever de fundamentação

86      Segundo jurisprudência constante em matéria de ónus da prova, por um lado, incumbe à parte ou à autoridade que alega uma violação do direito da concorrência apresentar a respetiva prova, demonstrando, de forma juridicamente bastante, os factos constitutivos de uma infração, e, por outro, cabe à empresa que invoca o benefício de um meio de defesa contra uma constatação de uma infração fazer prova de que os requisitos de aplicação desse meio de defesa estão preenchidos, pelo que a referida autoridade deverá assim recorrer a outros elementos de prova (acórdão de 16 de novembro de 2006, Peróxidos Orgánicos/Comissão, T‑120/04, Colet., EU:T:2006:350, n.° 50; v., igualmente, neste sentido, acórdãos de 17 de dezembro de 1998, Baustahlgewebe/Comissão, C‑185/95 P, Colet., EU:C:1998:608, n.° 58; e de 7 de janeiro de 2004, Aalborg Portland e o./Comissão, C‑204/00 P, C‑205/00 P, C‑211/00 P, C‑213/00 P, C‑217/00 P e C‑219/00 P, Colet., EU:C:2004:6, n.° 78). A duração da infração é um elemento constitutivo do conceito de infração nos termos do artigo 101.°, n.° 1, TFUE, elemento cujo ónus da prova incumbe, a título principal, à Comissão (acórdãos de 7 de julho de 1994, Dunlop Slazenger/Comissão, T‑43/92, Colet., EU:T:1994:79, n.° 79, e Peróxidos Orgánicos/Comissão, já referido, EU:T:2006:350, n.° 51).

87      Esta repartição do ónus da prova pode, contudo, variar quando os elementos de facto invocados por uma parte possam ser suscetíveis de obrigar a outra parte a fornecer uma explicação ou uma justificação, sem a qual se poderá concluir que a prova foi feita (v., neste sentido, acórdão Aalborg Portland e o./Comissão, n.° 86, supra, EU:C:2004:6, n.° 79, e Peróxidos Orgánicos/Comissão, n.° 86, supra, EU:T:2006:350, n.° 53).

88      No que respeita aos meios de prova que podem ser considerados pela Comissão, o princípio preponderante no direito da concorrência é o da livre produção da prova (acórdãos de 25 de janeiro de 2007, Dalmine/Comissão, C‑407/04 P, Colet., EU:C:2007:53, n.° 63, e de 8 de julho de 2004, JFE Engineering e o./Comissão, T‑67/00, T‑68/00, T‑71/00 e T‑78/00, Colet., EU:T:2004:221, n.° 273). Uma vez que a proibição de participar em práticas e em acordos anticoncorrenciais bem como as sanções em que os infratores podem incorrer são notórias, é, com efeito, normal que as atividades que estas práticas e esses acordos implicam decorram clandestinamente, que as reuniões se realizem secretamente, a maioria das vezes num país terceiro, e que a documentação que lhes diz respeito seja reduzida ao mínimo. Mesmo que a Comissão descubra documentos que comprovem de maneira explícita a existência de contactos ilegais entre operadores, como as atas de uma reunião, esses documentos são normalmente fragmentários e dispersos, pelo que, muitas vezes, é necessário reconstituir por dedução determinados pormenores. Na maior parte dos casos, a existência de uma prática ou de um acordo anticoncorrencial deve ser inferida de um determinado número de coincidências e de indícios que, considerados no seu todo, podem constituir, na falta de outra explicação coerente, a prova de uma violação do direito da concorrência (acórdão Aalborg Portland e o./Comissão, n.° 86, supra, EU:C:2004:6, n.os 55 a 57). Esses indícios e coincidências não apenas permitem revelar a existência de comportamentos ou de acordos anticoncorrenciais mas também a duração de um comportamento anticoncorrencial continuado e o período de aplicação de um acordo celebrado em violação do direito da concorrência (acórdão de 21 de setembro de 2006, Technische Unie/Comissão, C‑113/04 P, Colet., EU:C:2006:593, n.° 166).

89      É necessário que a Comissão apresente provas precisas e concordantes que sustentem a firme convicção de que a infração foi cometida (v. acórdãos de 6 de julho de 2000, Volkswagen/Comissão, T‑62/98, Colet., EU:T:2000:180, n.os 43 e 72 e jurisprudência referida, e de 25 de outubro de 2005, Groupe Danone/Comissão, T‑38/02, Colet., EU:T:2005:367, n.° 217 e jurisprudência referida). Contudo, não é necessário que cada uma das provas apresentadas pela Comissão respeite esses critérios relativamente a cada elemento da infração. Com efeito, basta que o conjunto de indícios invocado pela instituição, apreciado globalmente, respeite esta exigência (acórdãos JFE Engineering e o./Comissão, n.° 88, supra, EU:T:2004:221, n.° 180, e Groupe Danone/Comissão, já referido, EU:T:2005:367, n.° 218; v., igualmente, neste sentido, acórdão de 20 de abril de 1999, Limburgse Vinyl Maatschappij e o./Comissão, T‑305/94 a T‑307/94, T‑313/94 a T‑316/94, T‑318/94, T‑325/94, T‑328/94, T‑329/94 e T‑335/94, Colet., EU:T:1999:80, n.os 768 a 778 e, em especial, n.° 777). No que respeita à duração da infração, a jurisprudência exige que, na falta de elementos de prova que permitam determinar diretamente a duração de uma infração, a Comissão se baseie, pelo menos, em elementos de prova relativos a factos suficientemente próximos no tempo, de modo a poder‑se razoavelmente admitir que esta infração perdurou ininterruptamente entre duas datas precisas (acórdãos Technische Unie/Comissão, n.° 88, supra, EU:C:2006:593, n.° 169; Dunlop Slazenger/Comissão, n.° 86, supra, EU:T:1994:79, n.° 79; e Peróxidos Orgánicos/Comissão, n.° 86, supra, EU:T:2006:350, n.° 51).

90      No que respeita ao valor probatório que deve ser conferido aos diferentes elementos de prova, há que sublinhar que o único critério pertinente para apreciar as provas livremente apresentadas consiste na respetiva credibilidade (acórdão Dalmine/Comissão, n.° 88, supra, EU:C:2007:53, n.° 63; v. acórdão de 8 de julho de 2004, Mannesmannröhren‑Werke/Comissão, T‑44/00, Colet., EU:T:2004:218, n.° 84 e jurisprudência referida; acórdão JFE Engineering e o./Comissão, n.° 88, supra, EU:T:2004:221, n.° 273). De acordo com as regras geralmente aplicáveis em matéria de prova, a credibilidade e, por conseguinte, o valor probatório de um documento, depende da sua origem, das circunstâncias da sua elaboração, do seu destinatário e do seu conteúdo (acórdão de 15 de março de 2000, Cimenteries CBR e o./Comissão, T‑25/95, T‑26/95, T‑30/95 a T‑32/95, T‑34/95 a T‑39/95, T‑42/95 a T‑46/95, T‑48/95, T‑50/95 a T‑65/95, T‑68/95 a T‑71/95, T‑87/95, T‑88/95, T‑103/95 e T‑104/95, Colet., EU:T:2000:77, n.° 1053; conclusões do juiz B. Vesterdorf, exercendo funções de advogado‑geral no processo Rhône‑Poulenc/Comissão, T‑1/89, EU:T:1991:38). Há, nomeadamente, que dar grande importância à circunstância de um documento ser elaborado imediatamente após os factos (acórdão de 11 de março de 1999, Ensidesa/Comissão, T‑157/94, Colet., EU:T:1999:54, n.° 312) ou por uma testemunha direta desses factos (v., neste sentido, acórdão JFE Engineering e o./Comissão, n.° 88, supra, EU:T:2004:221, n.° 207). Os documentos dos quais resulte que houve contactos entre várias empresas e que estas prosseguiram precisamente o objetivo de eliminar antecipadamente a incerteza relativa ao comportamento futuro dos seus concorrentes devem provar, de forma juridicamente bastante, a existência de uma prática concertada (v., neste sentido, acórdão de 16 de dezembro de 1975, Suiker Unie e o./Comissão, 40/73 a 48/73, 50/73, 54/73 a 56/73, 111/73, 113/73 e 114/73, Colet., EU:C:1975:174, n.os 175 e 179). Além disso, as declarações contrárias aos interesses do declarante devem, em princípio, ser consideradas elementos de prova especialmente fiáveis (v., neste sentido, acórdão JFE Engineering e o./Comissão, n.° 88, supra, EU:T:2004:221, n.os 207, 211 e 212).

91      Por outro lado, já foi declarado de forma constante que o facto de comunicar informações aos seus concorrentes com o intuito de preparar um acordo anticoncorrencial basta para provar a existência de uma prática concertada na aceção do artigo 101.° TFUE (v. acórdão de 8 de julho de 2008, BPB/Comissão, T‑53/03, Colet., EU:T:2008:254, n.° 178 e jurisprudência referida).

92      A existência de uma dúvida no espírito do juiz deve aproveitar aos destinatários da decisão, pelo que o juiz não pode concluir que a Comissão fez prova bastante da existência da infração em causa se ainda subsistir uma dúvida sobre esta questão no seu espírito (acórdãos JFE Engineering e o./Comissão, n.° 88, supra, EU:T:2004:221, n.° 177, e Groupe Danone/Comissão, n.° 89, supra, EU:T:2005:367, n.° 215). Com efeito, nesta última situação, há que tomar em consideração o princípio da presunção da inocência, conforme resulta nomeadamente do artigo 6.°, n.° 2, da Convenção para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, o qual faz parte dos direitos fundamentais que, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, por outro lado reafirmada pela Carta dos Direitos Fundamentais, são protegidos na ordem jurídica da União. Atendendo à natureza das infrações em causa, bem como à natureza e ao grau de severidade das respetivas sanções, o princípio da presunção da inocência aplica‑se, nomeadamente, aos processos relativos a violações do direito da concorrência que possam conduzir à aplicação de coimas ou de sanções pecuniárias compulsórias (acórdãos de 8 de julho de 1999, Hüls/Comissão, C‑199/92 P, Colet., EU:C:1999:358, n.os 149 e 150; Montecatini/Comissão, C‑235/92 P, Colet., EU:C:1999:362, n.os 175 e 176; e Groupe Danone/Comissão, n.° 89, supra, EU:T:2005:367, n.° 216).

93      Por outro lado, a existência de uma infração deve ser apreciada unicamente em função dos elementos de prova reunidos pela Comissão na decisão que constata a referida infração, e a única questão relevante é portanto a de saber se, em substância, foi ou não feita prova da infração à luz desses elementos de prova (acórdão Cimenteries CBR e o./Comissão, n.° 90, supra, EU:T:2000:77, n.° 726).

94      Por último, a fundamentação exigida pelo artigo 296.° TFUE deve ser adaptada à natureza do ato em causa e deixar transparecer, de forma clara e inequívoca, o raciocínio da instituição, autora do ato, por forma a permitir aos interessados conhecerem as razões da medida adotada e ao tribunal competente exercer a sua fiscalização. A exigência de fundamentação deve ser apreciada em função das circunstâncias do caso concreto, designadamente do conteúdo do ato, da natureza dos fundamentos invocados e do interesse que os destinatários ou outras pessoas direta e individualmente afetadas pelo ato podem ter em obter explicações. Não é exigido que a fundamentação especifique todos os elementos de facto e de direito pertinentes, na medida em que a questão de saber se a fundamentação de um ato satisfaz as exigências do artigo 296.° TFUE deve ser apreciada à luz não somente do seu teor mas também do seu contexto e do conjunto das normas jurídicas que regem a matéria em causa (acórdãos de 2 de abril de 1998, Comissão/Sytraval e Brink’s France, C‑367/95 P, Colet., EU:C:1998:154, n.° 63; de 30 de setembro de 2003, Alemanha/Comissão, C‑301/96, Colet., EU:C:2003:509, n.° 87; e de 22 de junho de 2004, Portugal/Comissão, C‑42/01, Colet., EU:C:2004:379, n.° 66).

2.     Quanto à procedência da primeira parte do primeiro fundamento, relativa ao não conhecimento da vertente pan‑europeia do cartel

95      A recorrente contesta, em substância, os elementos considerados pela Comissão tanto no que respeita ao período de infração anterior a 17 de maio de 2001 como no que respeita ao período de infração entre 17 de maio de 2001 e 19 de setembro de 2002.

a)     Quanto ao período de infração anterior a 17 de maio de 2001

96      A Fapricela contesta, em substância, a pertinência dos elementos considerados pela Comissão relativamente a duas reuniões realizadas em 25 de novembro de 1999 e 18 de outubro de 2000, por os elementos de prova deixarem pensar que a recorrente, naquela época, já tinha conhecimento da dimensão europeia do cartel.

97      No entanto, há que constatar que a Comissão não tomou esses elementos de prova em consideração, nem essas duas reuniões, que, com efeito, não lhe pareceram ser suficientemente determinantes para considerar que a Fapricela teve conhecimento da dimensão europeia do cartel antes de 17 de maio de 2001.

98      Por conseguinte, a argumentação apresentada pela recorrente relativamente a estas duas reuniões é inoperante e deve ser afastada.

b)     Quanto ao período entre 17 de maio de 2001 e 19 de setembro de 2002

99      A recorrente contesta, em substância, a pertinência dos elementos de prova recolhidos pela Comissão, que comprovariam o seu conhecimento da dimensão europeia do cartel a partir de 17 de maio de 2001.

100    Segundo a Comissão, há duas reuniões que provam que a Fapricela tinha conhecimento da existência do Clube Europa. Trata‑se das reuniões de 17 de maio e 6 de julho de 2001.

101    Há que precisar que, nas suas alegações escritas, a Comissão menciona que a recorrente participou «noutras reuniões» nas quais foi discutida a dimensão pan‑europeia do cartel, sem precisar que reuniões foram essas. O exame da decisão impugnada e, em especial, do anexo 4 não permite no entanto provar que reuniões foram essas, e há que constatar que a decisão impugnada se limita a fazer uma referência às reuniões de 17 de maio e 6 de julho de 2001.

102    Por conseguinte, há que examinar os elementos de prova considerados pela Comissão no que respeita a cada uma dessas duas reuniões.

 Quanto à reunião de 17 de maio de 2001

103    Resulta da tabela que figura no anexo 4 da decisão impugnada que a Fapricela assistiu a esta reunião, facto que esta não contesta.

104    Em contrapartida, alega, em substância, uma série de argumentos de natureza geral, que são igualmente válidos para a reunião de 6 de julho de 2001. Em primeiro lugar, não participou nem foi convidada para participar nas reuniões do Clube Europa na Península Ibérica, nem em nenhuma reunião internacional realizada fora da Península Ibérica. Tal é confirmado, primeiro, pelo facto de a decisão impugnada não conter nenhuma referência à sua participação em reuniões do Clube Europa ou da Eurostress Information Service (a seguir «ESIS»), que é a principal associação de APE, ou à margem desta associação, segundo, pelo facto de o seu nome não ser mencionado na secção 9.1.5.1.7, que se refere às negociações que envolvem Espanha e Portugal, e, terceiro, pelo facto de não estar prevista a sua participação no Clube Europa alargado em 2002 (v. n.° 48, supra). Em segundo lugar, não operava fora do mercado ibérico. Em terceiro lugar, entrou no cartel numa fase muito tardia. Em quarto lugar, os outros membros não consideravam que a recorrente fazia parte do acordo pan‑europeu. Em quinto lugar, tudo, e em especial o modelo de coordenação atribuído à Tycsa, demonstra que os outros membros a tentaram pôr fora desse acordo europeu.

105    A recorrente apresenta, além disso, uma série de argumentos relativos especificamente à reunião de 17 de maio de 2001. Em primeiro lugar, não se recorda de a Tréfileurope ter participado nessa reunião e sublinha que essa participação não é referida nas notas redigidas nessa ocasião (página 30044 do dossiê administrativo). Em segundo lugar, a recorrente alega que essas notas apenas revelam uma discussão bilateral entre a Emesa e a Tréfileurope, que não envolvia a Fapricela. Em terceiro lugar, a participação da Tréfileurope, quando muito, apenas podia ser considerada uma tentativa de entrada no Clube España e dela não se pode deduzir que foi discutida outra coisa para além do acordo ibérico com essa empresa. Em quarto lugar, nenhum elemento de prova permite provar que o Clube Italia foi discutido nessa reunião, incluindo o documento que figura na página 34552 do dossiê. Em quinto lugar, a recorrente alega que, ainda que tivesse sido trocada informação a este respeito, tal é irrelevante para demonstrar que a Fapricela tinha conhecimento da dimensão extraibérica do cartel. Em sexto lugar, a recorrente contesta a pertinência dos elementos de prova que figuram nas páginas 30044, 30045, 20008 a 20011, 20063, 11690, 11691, 11697, 11698 e 34612 do dossiê. Em sétimo lugar, a recorrente alega que, seja como for, esses documentos não lhe foram comunicados no âmbito do procedimento administrativo, o que constitui uma violação dos seus direitos de defesa e do princípio do contraditório. Em oitavo lugar, a recorrente contesta que as suas quotas de mercado na União tenham sido discutidas nessa reunião e, em especial, a interpretação que a Comissão deu a este respeito aos elementos que figuram na página 30666 do dossiê.

–       Quanto à comunicação dos elementos de prova à Fapricela

106    A Fapricela, questionada por escrito pelo Tribunal Geral, reconheceu que recebeu um DVD que lhe foi enviado pela Comissão em 8 de outubro de 2008.

107    Reconheceu igualmente que, nessa ocasião, a Comissão a advertiu de que os documentos confidenciais relativos ao pedido de clemência, conforme repertoriados no DVD que lhe foi enviado em 8 de outubro de 2008, só podiam ser consultados nas instalações da Comissão.

108    Em seguida, na audiência de 16 de outubro de 2014, a Fapricela reconheceu que todos os elementos de prova considerados pela Comissão, aos quais, conforme afirmou nas suas alegações escritas, não tinha tido acesso, se encontravam ou na sua posse e estavam apensos à sua petição, ou estavam disponíveis no DVD que a Comissão lhe enviou, ou podiam ser consultados nas instalações desta.

109    Por conseguinte, a Fapricela retirou a sua alegação relativa à violação dos seus direitos de defesa.

–       Quanto à presença da Tréfileurope na reunião de 17 de maio de 2001

110    Há que salientar que a Comissão alega, sem ser contradita pela Fapricela, que a presença da Tréfileurope na reunião de 17 de maio de 2001 é confirmada pela própria Tréfileurope nas suas declarações de 11 de junho de 2003 (que figuram na página 34552 do dossiê), bem como pelas notas da Emesa e as informações fornecidas pela Tycsa (v. anexo 4 da decisão impugnada, número relativo à reunião de 17 de maio de 2001).

111    À luz destes elementos de prova, o Tribunal Geral considera, por conseguinte, que está provado de forma juridicamente bastante que esta empresa esteve presente nessa reunião, havendo assim que afastar as negações da recorrente a este respeito.

–       Quanto ao teor da discussão ocorrida com a Tréfileurope na reunião de 17 de maio de 2001

112    A Fapricela e a Comissão divergem tanto sobre o teor da reunião de 17 de maio de 2001, conforme foi relatada pela Comissão no anexo 4 da decisão impugnada, como sobre a interpretação que lhe deve ser dada.

113    É certo que ambas estão de acordo quanto a ter sido dito que o Clube España «funcionava perfeitamente bem», mas a recorrente considera, em substância, que foi sem razão que a Comissão concluiu daqui que se discutiu a vertente pan‑europeia do cartel com a Tréfileurope. Além disso, segundo a recorrente, nenhum elemento de prova permite afirmar que nessa reunião foi feita referência ao Clube Italia.

114    Há que salientar, desde já, que a Comissão não considerou, na decisão impugnada, que o Clube Europa ou o cartel considerado no seu conjunto tivessem sido objeto de discussão. A única discussão que é referida no anexo 4 da decisão impugnada diz respeito ao Clube Italia, o que leva a Comissão a considerar que os participantes nessa reunião têm de ter tido, a partir desse momento, conhecimento da dimensão pan‑europeia do cartel.

115    Antes de apreciar se uma discussão sobre o Clube Italia é suscetível de permitir que a Comissão responsabilize todos os participantes da reunião no que respeita à totalidade do cartel e, em especial, à sua vertente pan‑europeia, há contudo que verificar em que medida a Comissão faz prova de forma juridicamente bastante do teor da discussão ocorrida.

116    Resulta das alegações da Comissão que a prova documental em que se baseia no que respeita ao teor da discussão ocorrida entre os membros do Clube España e a Tréfileurope é a declaração feita por esta última no âmbito da clemência (página 34552 do dossiê administrativo, anexo E2).

117    Resulta desta declaração que:

«Para os produtores espanhóis e portugueses, esta reunião tinha por objetivo explicar à Tréfileurope que o seu acordo ibérico relativo ao aço para pré‑esforço funcionava perfeitamente (como em Itália: listas de clientes, volumes por cliente e volumes totais). [Também anunciaram à Tréfileurope os aumentos de preços acordados.]»

118    A referência «como em Itália» poderá sugerir que a Tréfileurope indicou na reunião que o modo de funcionamento do Clube España era igual ao do Clube Italia. Esta é a tese da Comissão.

119    No entanto, não se pode excluir que esta indicação seja uma simples referência a uma comparação entre o Clube España e o Clube Italia, redigida pelo representante da Tréfileurope aquando da redação deste parágrafo, ainda que esta comparação entre os dois clubes não tivesse sido evocada na reunião.

120    Por conseguinte, o Tribunal Geral considera que este elemento de prova não é suficiente, por si só, para provar que os participantes na reunião de 17 de maio de 2001 discutiram efetivamente, nessa ocasião, a questão do Clube Italia.

121    Por outro lado, a Comissão identifica, em notas de pé de página no anexo 4 da decisão impugnada, elementos de prova provenientes da Emesa e da Tycsa, que apresentou em resposta a uma questão escrita do Tribunal (anexo E3).

122    Ora, há que constatar que esses outros elementos de prova, incluindo a mensagem de correio eletrónico do Sr. P., se limitam a confirmar a realização de uma reunião em 17 de maio de 2001, na qual a Tréfileurope participou, mas não permitem provar de forma juridicamente bastante o teor de uma discussão a respeito do Clube Italia, que teria ocorrido nessa ocasião.

123    Além disso, há que afastar a argumentação da Comissão apresentada na audiência, segundo a qual resulta destas notas que nessa reunião ocorreu uma alteração dos preços em Itália, facto que não resulta de modo nenhum dos elementos de prova apresentados.

124    Subsiste assim uma dúvida sobre o teor da reunião, que deve aproveitar à recorrente.

125    Por conseguinte, há que considerar que a Comissão não provou de forma juridicamente bastante que a recorrente teve necessariamente de ter conhecimento da existência do Clube Europa a partir da reunião de 17 de maio de 2001.

 Quanto à reunião de 6 de julho de 2001

126    Há que recordar que, no anexo 4 da decisão impugnada, se precisa nomeadamente o seguinte a respeito desta reunião:

«As notas resta reunião incluem ainda um quadro com os volumes de cordão e a repartição das quotas de mercado em Espanha, Portugal e no resto da União Europeia, referentes à GSW, à Aceralia e à Fapricela (sendo o total das suas quotas de 100% e indicando que, pelo menos neste período, apenas a GSW e a Aceralia exportavam para o resto da Europa, enquanto a Fapricela só vendia cordão nos países ibéricos).»

127    A Comissão considera que as informações constantes das notas encontradas na Tycsa (página 30066 do dossiê administrativo, em anexo VII à petição, página 895) não deixam dúvidas no que respeita ao âmbito desta reunião.

128    No entanto, os elementos considerados pela Comissão dizem respeito às quotas de mercado, em Espanha, Portugal e no resto da União, da GSW, da Aceralia e da Fapricela e figuram na tabela situada em baixo, à esquerda do documento.

129    Ora, na realidade, estes elementos limitam‑se a provar que certos membros do Clube España efetuavam vendas fora de Espanha, o que não demonstra, em contrapartida, que nessa reunião tenha havido uma discussão a respeito do Clube Europa, sendo estes dois aspetos do cartel claramente distintos.

130    Por conseguinte, há que considerar que a Comissão não fez prova de que, desde 6 de julho de 2001, a recorrente teve necessariamente conhecimento da vertente pan‑europeia do cartel.

131    Há assim que deferir a primeira parte do primeiro fundamento.

3.     Quanto à procedência da segunda parte do primeiro fundamento, relativa à errada qualificação, por parte da Comissão, da infração única e continuada

132    A Fapricela considera, em substância, no âmbito da segunda parte do seu primeiro fundamento, que, na medida em que não tinha conhecimento da vertente pan‑europeia do cartel, não pode ser acusada de ter participado num infração única e continuada entre 2 de dezembro de 1998 e 19 de setembro de 2002.

133    Há que recordar que resulta de jurisprudência constante que os acordos, decisões e práticas concertadas apenas podem ser considerados elementos constitutivos de um acordo único anticoncorrencial se ficar demonstrado que se inscrevem num plano global que prossegue um objetivo comum. Além disso, só se a empresa, ao participar naqueles acordos, decisões e práticas concertadas, soubesse ou devesse saber que, ao proceder desse modo, se integrava no acordo único, poderá a sua participação naqueles constituir a expressão da sua adesão a este acordo (acórdãos Cimenteries CBR e o./Comissão, n.° 90, supra, EU:T:2000:77, n.os 4027 e 4112, e de 16 de junho de 2011, Putters International/Comissão, T‑211/08, Colet., EU:T:2011:289, n.os 31 e segs.).

134    Assim, resulta desta jurisprudência que devem preencher‑se três requisitos para provar a participação numa infração única e continuada, a saber, a existência de um plano global que prossegue um objetivo comum, o contributo intencional da empresa para esse plano e o facto de ter conhecimento (provado ou presumido) dos comportamentos infratores dos restantes participantes (acórdão Putters International/Comissão, n.° 133, supra, EU:T:2011:289, n.° 35).

135    Em contrapartida, se uma empresa participou diretamente num ou em vários comportamentos anticoncorrenciais que compõem uma infração única e continuada, mas não foi provado que, com o seu próprio comportamento, pretendia contribuir para todos os objetivos comuns prosseguidos pelos outros participantes no cartel e tinha conhecimento de todos os outros comportamentos infratores perspetivados ou aplicados pelos referidos participantes na prossecução dos mesmos objetivos, ou podia razoavelmente prevê‑los e estava pronta a aceitar o risco, a Comissão só tem o direito de lhe imputar a responsabilidade dos comportamentos em que participou diretamente e dos comportamentos perspetivados ou aplicados por outros participantes na prossecução dos mesmos objetivos que ela prosseguia, de que está provado que tinha conhecimento ou que podia razoavelmente prevê‑los e estava pronta a aceitar o risco (acórdão de 6 de dezembro de 2012, Comissão/Verhuizingen Coppens, C‑441/11 P, Colet., EU:C:2012:778, n.° 44).

136    No entanto, isso não pode ter como consequência exonerar essa empresa da sua responsabilidade pelos comportamentos em que está provado que participou ou em relação aos quais está provado que pode efetivamente ser considerada responsável. Com efeito, o facto de uma empresa não ter participado em todos os elementos constitutivos de um acordo ou ter desempenhado um papel secundário nas partes em que participou não é relevante para efeitos da determinação da existência de uma infração que lhe é imputável, dado que esses elementos apenas devem ser tomados em consideração aquando da apreciação da gravidade da infração e, eventualmente, da determinação da coima (acórdão Comissão/Verhuizingen Coppens, n.° 135, supra, EU:C:2012:778, n.° 45).

137    No entanto, só se pode dividir assim uma decisão da Comissão que qualifica um cartel global de infração única e continuada se, por um lado, a referida empresa tiver podido, durante o procedimento administrativo, compreender que lhe era também imputado cada um dos comportamentos que compõem a infração, e, portanto, defender‑se quanto a esse aspeto, e se, por outro, a referida decisão for suficientemente clara a esse respeito (acórdão Comissão/Verhuizingen Coppens, n.° 135, supra, EU:C:2012:778, n.° 46).

138    Conclui‑se que, quando os requisitos acima enunciados estiverem preenchidos, se o juiz da União declarar que a Comissão não provou totalmente que uma empresa, ao participar num dos comportamentos anticoncorrenciais que compõem uma infração única e continuada, tinha conhecimento dos outros comportamentos anticoncorrenciais adotados pelos outros participantes no cartel na prossecução dos mesmos objetivos, ou podia razoavelmente prevê‑los e estava pronta a aceitar o risco, deve daí tirar como única consequência que não se pode imputar a essa empresa a responsabilidade desses outros comportamentos e, portanto, da infração única e continuada, no seu conjunto, e que a decisão impugnada deve ser considerada não fundamentada exclusivamente nessa medida (acórdão Comissão/Verhuizingen Coppens, n.° 135, supra, EU:C:2012:778, n.° 47).

139    No presente caso, não foi provado de forma juridicamente bastante que a Fapricela teve conhecimento da dimensão extraibérica e pan‑europeia do cartel e do plano de conjunto que o caracterizava, nem desde 17 de maio de 2001 (v. n.° 125, supra) nem desde 6 de julho de 2001 (v. n.° 130, supra).

140    Por outro lado, há que constatar que, na decisão impugnada, a Comissão não apresenta nenhum outro elemento de prova posterior a 6 de julho de 2001 que permita provar que a Fapricela teve conhecimento do Clube Europa antes de 19 de setembro de 2002, data em que a infração cessou.

141    Por conseguinte, não ficou demonstrado que a Fapricela teve conhecimento do Clube Europa durante o período de infração que lhe foi imputado.

142    Foi, assim, sem razão que a Comissão considerou que a recorrente cometeu uma infração única e continuada entre 2 de dezembro de 1998 e 19 de setembro de 2002, que se caracteriza, por um lado, por uma participação no Clube España, durante esse período, e, por outro lado, por um conhecimento, é certo, tardio, do Clube Europa, desde maio de 2001, não estando com efeito provada esta segunda componente da infração única.

4.     Conclusão intermédia

143    Na medida em que há que julgar procedentes a primeira e segunda partes do primeiro fundamento, há que anular parcialmente o artigo 1.° da decisão impugnada, quando constata que a recorrente violou as disposições do artigo 101.°, n.° 1, TFUE, por ter participado não só numa infração às referidas disposições no mercado ibérico mas também num cartel que abrangeu o mercado interno e, posteriormente, o [Espaço Económico Europeu (EEE)].

III –  Quanto ao terceiro fundamento, relativo a um erro na duração da infração imputada à Fapricela no que respeita à sua participação no Clube España

144    A Fapricela alega, em substância, que foi sem razão que a Comissão considerou a sua participação contínua no Clube España, entre 2 de dezembro de 1998 e 19 de setembro de 2002. Sustenta que se distanciou deste, entre outubro de 2000 e 9 de abril de 2001, e que teve um comportamento concorrencial durante este período.

A –  Recordatória da decisão impugnada

145    De acordo com os considerandos 529 e 530 da decisão impugnada:

«(529)      A Fapricela alega [...] que apenas terá participado na infração nos períodos compreendidos entre 1999 e fevereiro de 2000, abril e julho de 2001 (embora admita que, em 18.04.2001 retomou as suas atividades no cartel, não se considera um membro do cartel e alega que os outros membros tinham conhecimento deste facto) e (apenas formalmente) agosto de 2001 e setembro de 2002. A Fapricela faz igualmente referência à sua alegada recusa expressa de participar na reunião de 28.03.2001 e alega que não pagou a quotização de membro da ESIS em 2000. A Fapricela conclui que a sua responsabilidade deveria ser anulada a partir de março de 2001 e que a Comissão deveria igualmente considerar que não participou de forma efetiva no cartel no período decorrido entre agosto de 2001 e setembro de 2002.

(530)      Dos elementos probatórios descritos no Anexo 4 e nas secções 9.2.2.1 a 9.2.2.5 decorre que a Fapricela participou regular e continuamente nas reuniões do Clube [España] entre 2 de dezembro de 1998 e a data das inspeções da Comissão e que, na sua ausência, o seu caso foi discutido. A alegada recusa da Fapricela em participar na reunião de 28.03.2001 não pode ser interpretada como um distanciamento do cartel (ver ponto (589)). Pelo contrário, a Fapricela voltou a participar nas reuniões do cartel menos de um mês após essa data (ou seja, em 18.04.2001, ver ponto (529) e Anexo 4). Por outro lado, a alegada ausência da Fapricela das reuniões realizadas entre outubro de 2000 e abril de 2001 é contrariada pelos elementos probatórios enumerados no Anexo 4, que mostram que a Fapricela participou nas reuniões de 18.10.2000, 23.03.2001, 09.04.2001 e 18.04.2001. A Fapricela não apresentou quaisquer outros elementos que provassem o seu distanciamento público, em qualquer momento, do que tinha sido acordado nas reuniões e, por conseguinte, do cartel (ver ponto (588)). Além disso, a Fapricela admite [...] ter participado na reunião de 09.04.2001, na qual se chegou a um acordo sobre o aumento dos preços, por segmentos de clientes, a partir de junho de 2001 e que até setembro de 2002 participou continuamente em reuniões do Clube [España] [...]. Por conseguinte, a Comissão conclui que a Fapricela participou ininterruptamente no Clube [España] entre 02.12.1998 e 19.09.2002.»

B –  Apreciação do Tribunal Geral

1.     Recordatória dos princípios respeitantes ao distanciamento

146    Segundo jurisprudência constante, a partir do momento em que fique provado que uma empresa participou em reuniões entre empresas concorrentes, com caráter anticoncorrencial, incumbe a essa empresa apresentar indícios suscetíveis de demonstrar que a sua participação não tinha uma intenção anticoncorrencial, demonstrando que tinha indicado aos seus concorrentes que participava nessas reuniões numa ótica diferente da deles. Para que a participação de uma empresa numa reunião deste tipo não possa ser considerada como uma aprovação tácita de uma iniciativa ilícita nem como uma aceitação do seu resultado, é necessário que essa empresa se distancie publicamente dessa iniciativa, de maneira a que os outros participantes considerem que aquela pôs termo à sua participação, ou então que a denuncie às entidades administrativas (v. acórdãos de 3 de maio de 2012, Comap/Comissão, C‑290/11 P, EU:C:2012:271, n.os 74 e 75 e jurisprudência referida, e de 7 de fevereiro de 2013, Slovenská sporiteľňa, C‑68/12, Colet., EU:C:2013:71, n.° 27 e jurisprudência referida).

2.     Quanto à procedência do terceiro fundamento

a)     Recordatória dos elementos de prova considerados pela Comissão na decisão impugnada

147    Há que recordar os elementos de prova considerados pela Comissão na decisão impugnada, relativos à participação da Fapricela no Clube España entre 18 de outubro de 2000 e 9 de abril de 2001.

148    A Comissão começa por tomar em consideração a participação da Fapricela na reunião de 18 de outubro de 2000 e precisa:

«Tycsa [...]. Debate sobre a estratégia a seguir em relação ao cordão. Uma das várias reuniões não oficiais com produtores portugueses e espanhóis, em que, segundo a Emesa [...] foram discutidos preços, restrições de vendas e clientes. Também Arcelor España nomeadamente: Repartição de quotas: Fapricela 20%, Tycsa 40%, Emesa 40%. Também discussão sobre toneladas atribuídas: ‘Tréfilunion 3000 toneladas Portugal... Global, cordão = 88000 toneladas... Fapricela declara 300T/... em Espanha’ (original em espanhol).»

149    No que respeita aos meses de janeiro e fevereiro de 2001, sem dispor de uma lista dos participantes, a Comissão menciona:

«Anotação, nos blocos de notas da Emesa, das vendas totais de fio no mercado ibérico no 1.° trimestre 2001, que enumera: ‘Proderac, GSW (Tycsa + TQ), Aceralia (Emesa + Galycas), Socitrel e Fapricela’ com cálculo das diferenças entre as vendas efetivas e as quotas acordadas (‘% efetivo e % ac.’, original em espanhol).»

150    No que respeita à reunião de 15 de março de 2001, a Comissão não tomou em consideração a participação da Fapricela, mas indica, no entanto:

«Na reunião, foram distribuíd[o]s quatro documentos sobre vendas (1) no ‘mercado ibérico’, em janeiro e fevereiro de 2001, que incluem Proderac, GSW (Tycsa + Quijano), Aceralia (Emesa + Galycas), Socitrel e Fapricela [...]»

151    No que se refere à reunião de 23 de março de 2001, a Comissão menciona a presença da Socitrel, «também em representação da Fapricela)»; observa, quanto a esta reunião, que, «[d]epois de resolvido um conflito entre a Fapricela, a Tycsa e a Emesa sobre qual a empresa que iria fornecer um determinado cliente, a Fapricela ‘comprometeu‑se a manter o acordo, que tinha dado tão bons resultados’ (original em espanhol) [...]», e que, «[p]or último, também foram debatidos os fornecimentos e os preços do cordão da Fapricela, Emesa e Tycsa em relação a um cliente específico».

152    Relativamente ao mês de abril de 2001, a Comissão indica que «[u]m documento encontrado na Tycsa [...] regista as vendas em Espanha/Portugal e os desvios em relação às quotas acordadas no que se refere à Emesa, Galycas, GSW, Socitrel, Fapricela e Proderac, em janeiro, fevereiro e março + o total do primeiro trimestre de 2001 [...]».

153    Por último, é facto assente que a Fapricela participou na reunião de 9 de abril de 2001.

b)     Argumentos das partes

154    A Fapricela sustenta, em substância:

–        que, a partir de outubro de 2000, se distanciou progressivamente do acordo e que, a partir desse momento, recusou publicamente participar em mais reuniões até março de 2001;

–        que teve um comportamento autónomo e concorrencial durante esse período, facto que é demonstrado pelo aumento das suas vendas em 400%, em março de 2001;

–        que voltou a participar em reuniões a partir de 9 de abril de 2001, por força da pressão exercida pelos membros do cartel.

155    Além disso, contesta, em substância:

–        que a Socitrel a tenha representado na reunião de 23 de março de 2001;

–        as provas apresentadas pela Comissão:

–        relativas ao facto de os seus preços terem sido discutidos em janeiro e fevereiro de 2001;

–        relativas ao teor das discussões ocorridas nas reuniões de 15 e 23 de março de 2001;

–        e alega que a Comissão não lhe comunicou alguns desses elementos de prova.

156    A recorrente considera que apresentou provas contrárias suficientes para inverter o ónus da prova que recai sobre a Comissão.

157    Por último, acusa a Comissão de não ter respondido, na decisão impugnada, aos argumentos que apresentou no âmbito do procedimento administrativo e contesta, a título incidental, o ano de referência considerado pela Comissão no que respeita ao valor das vendas a tomar em consideração, atendendo à sua alegada saída do cartel entre outubro de 2000 e abril de 2001.

158    A Comissão contesta esta argumentação.

c)     Quanto à violação dos direitos de defesa da recorrente

159    No que se refere à alegada violação dos direitos de defesa da Fapricela por a Comissão não lhe ter comunicado alguns elementos de prova, há que remeter para os n.os 106 a 109, supra, e recordar que, na audiência, a recorrente renunciou a invocar esta alegação.

d)     Quanto à reunião de 18 de outubro de 2000

160    No que se refere à reunião de 18 de outubro de 2000, a Fapricela reconheceu, na sequência das questões escritas colocadas pelo Tribunal Geral, e novamente na audiência, que participou nesta reunião.

161    Por outro lado, há que constatar que a Fapricela não apresentou nenhuma prova do seu distanciamento público na reunião de 18 de outubro de 2000.

162    Com efeito, invoca apenas em seu favor elementos posteriores a essa reunião (as páginas 20058 a 20060 do dossiê administrativo, às quais se refere no n.° 172 da petição, dizem efetivamente respeito à «disputa» que ocorreu na reunião de 23 de março de 2001), para daí concluir que a sua «falta de participação» nas reuniões após a reunião de 18 de outubro de 2000 e até à reunião de 9 de abril de 2001 significa que se distanciou logo a partir da reunião de 18 de outubro de 2000.

163    Para mais, resulta do anexo 4 da decisão impugnada que, nessa reunião, se discutiu a estratégia a seguir para o cordão e a atribuição de quotas, nomeadamente à Fapricela, bem como as tonelagens atribuídas nomeadamente a esta (v. n.° 148, supra), sem que a recorrente tenha apresentado elementos de prova que desmentissem as constatações da Comissão.

164    A argumentação da recorrente deve, por conseguinte, ser rejeitada.

e)     Quanto às reuniões que se terão realizado em janeiro e fevereiro de 2001

165    Quanto às reuniões que se terão realizado nos meses de janeiro e fevereiro de 2001, há que constatar que resulta do anexo 4 da decisão impugnada que a Emesa estava na posse de dados relativos tanto às «vendas totais de fio no mercado ibérico no 1.° trimestre» como às «diferenças entre as vendas efetivas e as quotas acordadas» de diversas empresas, entre as quais a Fapricela. O anexo 4 remete para as páginas 27946, 28544 a 28549 e 33622 do dossiê administrativo.

166    Primeiro, a Fapricela sustenta que a página 27946 é uma mera folha de rosto sem conteúdo e que nunca lhe foi facultado acesso à página 33622. Segundo, a página 28544 contém uma tabela com dados de vendas de janeiro, fevereiro e março de 2001, que, no entanto, não podia ter sido elaborada em janeiro ou fevereiro de 2001, mas apenas a posteriori, e é possível que essa tabela inclua dados fornecidos pela Fapricela após o seu regresso ao Clube España. Terceiro, as páginas 28546 e 28547 contêm dados sobre o mesmo período, sem indicação da data da sua elaboração, mas que aparecem a seguir à anterior tabela que já tinha dados sobre o mês de março. Quarto, quanto à tabela de previsões de vendas de março (página 28548), alegadamente elaborada em 15 de março de 2001, atribui à Fapricela vendas menos significativas do que as indicadas na tabela constante da página 28544 do processo. Esta diferença entre o valor da previsão realizada em 15 de março de 2001 e o valor de vendas efetivas reforça a conclusão de que, durante este período, a recorrente se distanciou do Clube España. Com efeito, os participantes do Clube España não tiveram acesso a dados reais sobre as vendas da Fapricela e alegaram que estes valores sofreram decréscimos significativos, o que só se pode compreender num contexto de tentativa de exclusão do mercado de uma empresa que recusou participar no Clube España.

167    Em primeiro lugar, há que constatar que as páginas 27946 e 33622 não são pertinentes para o período entre janeiro e fevereiro de 2001, uma vez que se trata, respetivamente, de uma página em branco que tem apenas a menção «notebook» e da primeira página do pedido de clemência apresentado pela Arcelor España, SA, pela Mittal Steel Company NV e pelas suas filiais, bem como pela Tréfileurope e pelas suas filiais, que não comporta nenhuma menção relativamente ao período entre janeiro e fevereiro de 2001.

168    Em segundo lugar, resulta da resposta às questões escritas colocadas pelo Tribunal Geral à Comissão que as páginas 28544 a 28549 do dossiê administrativo são, na realidade, pertinentes no que respeita à reunião de 15 de março de 2001 (n.° 15 da resposta da Comissão). Por conseguinte, há que constatar que as referências feitas no anexo 4 da decisão impugnada a essas páginas do dossiê estão erradas.

169    Em terceiro lugar, as páginas 28544 a 28549 do dossiê administrativo comportam diferentes tabelas relativas às vendas dos diferentes membros do Clube España para os meses de janeiro, fevereiro e março de 2001, com a sua evolução positiva ou negativa, bem como uma tabela (página 28548) sobre as previsões de vendas em 15 de março de 2001.

170    A Fapricela indica que há uma diferença entre a tabela relativa às previsões de vendas em 15 de março de 2001 e a tabela (página 28544) relativa às vendas de março de 2001.

171    Contudo, há que constatar que nada permite deduzir das páginas 28544 a 28549 que se realizaram reuniões nos meses de janeiro e fevereiro de 2001.

172    Quando muito, pode constatar‑se que estavam à disposição da Emesa dados sensíveis relativos às vendas da Fapricela para os meses janeiro, fevereiro e março de 2001, sem que seja possível identificar o momento em que esses dados lhe foram comunicados. A existência simultânea de tabelas previsionais mas também de tabelas não previsionais relativas ao mês de março de 2001 deixa, além disso, pressupor que esses dados foram recolhidos depois de janeiro e fevereiro de 2001.

173    No entanto, a recorrente alega que esses dados podem ter sido fornecidos por si, eventualmente depois do seu regresso ao Clube España.

174    Por conseguinte, há que constatar que os elementos de prova apresentados pela Comissão não permitem provar que aqueles dados foram comunicados à Emesa durante os meses de janeiro e fevereiro de 2001, embora seja muito provável que tenha sido a própria recorrente a comunicá‑los aos outros membros do cartel num momento indeterminado, mas que, para alguns desses dados, se pode situar em meados de março, uma vez que a Emesa tinha na sua posse dados «previsionais» relativos às vendas da Fapricela para 15 de março de 2001, porquanto o caráter previsional destes dados pressupõe que foram comunicados antes desta data.

f)     Quanto à reunião de 15 de março de 2001

175    Em primeiro lugar, a Fapricela contesta ter participado nesta reunião. Ora, há que constatar que a Comissão não considerou na decisão impugnada que a recorrente participou nesta reunião, mas apenas que nessa ocasião foram discutidos dados sensíveis da Fapricela. Por conseguinte, há que afastar as alegações da Fapricela por serem inoperantes.

176    Em segundo lugar, a Fapricela contesta, em substância, a pertinência de um certo número das páginas do dossiê administrativo (33622, 11690 e 11691, 11485, 11492 e 11493, 20061), para as quais se remete no anexo 4 da decisão impugnada, respeitante a esta reunião, uma vez que não dizem especificamente respeito à reunião de 15 de março de 2001.

177    Com efeito, há que salientar que as páginas 33622, 11690 e 11691, 11485, 11492 e 11493 e 20061 não dizem especificamente respeito à reunião de 15 de março de 2001 e não são suscetíveis de provar o teor das discussões que tiveram lugar nessa ocasião.

178    Em terceiro lugar, a Fapricela contesta, em substância, estar na origem dos dados sensíveis que lhe dizem respeito, que foram discutidos na reunião de 15 de março de 2001 (páginas 20062, 30035 e 30036 do dossiê administrativo), e alega que esses dados não são corretos.

179    Em primeiro lugar, há que salientar que é com razão que a Fapricela alega que a referência aos dados respeitantes às suas vendas indicadas na página 20062 do dossiê administrativo — que provém das notas da Emesa — é antecedida das palavras «sabe‑se que».

180    No entanto, tal referência não exclui que a Fapricela esteja na origem destas informações (v. n.os 173 e 174, supra).

181    Em segundo lugar, há que salientar que as páginas 30035 e 30036 do dossiê administrativo — provenientes da Tycsa — mencionam as vendas da Fapricela (nomeadamente as vendas de janeiro e fevereiro de 2001 e as vendas previsionais de março de 2001: página 30036), bem como a quota de que dispunha (página 30035).

182    Em terceiro lugar, há igualmente que ter em consideração as páginas 28544 a 28549 do dossiê administrativo — documentos que estavam na posse da Emesa —, que figuram também em referência à reunião de 15 de março de 2001 no anexo 4 da decisão impugnada.

183    Importa referir algumas diferenças de números entre os que figuram nas tabelas de que a Emesa dispunha e os mencionados nas notas contemporâneas da Tycsa:

–        janeiro Espanha: Emesa: tabela página 28544: 157; tabela página 28547: 157; Tycsa página 30066: 157;

–        janeiro Portugal: Emesa: tabela página 28544: 582; tabela página 28547: 582; Tycsa página 30066: 582;

–        fevereiro Espanha: Emesa: tabela página 28544: 168; tabela página 28547: 168; Tycsa página 30066: 166;

–        fevereiro Portugal: Emesa: tabela página 28544: 628; tabela página 28547: 628; Tycsa página 30066: 686;

–        Emesa: previsão março — em 15 de março de 2001 Espanha: tabela página 28548: 100; Tycsa: previsão março: página 30066: 200;

–        Emesa: previsão março — em 15 de março de 2001 Portugal: tabela página 28548: 200; Tycsa: previsão março página 30066: 600;

–        março Espanha: Emesa: tabela página 28544: 636; Tycsa página 30066: nenhuma menção;

–        março Portugal: tabela página 28544: 1709; Tycsa página 30066: nenhuma menção.

184    No entanto, por um lado, há que constatar que os dados relativos aos meses de janeiro e fevereiro são semelhantes ou muito próximos e que podem eventualmente ter sido corrigidos em função dos últimos dados disponíveis, uma vez que as tabelas foram verosimilmente preparadas de antemão e que os dados que figuram nas notas da Tycsa eram os dados atualizados.

185    Por outro lado, no que se refere a uma reunião realizada em 15 de março de 2001, as diferenças surgidas entre os números previsionais para as vendas do mês de março constantes das tabelas que estavam à disposição da Emesa e das notas contemporâneas de Tycsa não permitem chegar a uma conclusão, uma vez que, seja como for, a Fapricela não participou nessa reunião.

186    Além disso, não se pode tirar nenhuma consequência do facto de haver diferenças — indicadas pela recorrente — entre as previsões de vendas em 15 de março de 2001, para Espanha e Portugal (que figuram na página 28548 do dossiê administrativo), e as vendas contabilizadas para Espanha e Portugal, para o mês de março de 2001 (que figuram na página 28544 do dossiê administrativo), que figuram numa tabela que, quando muito, foi necessariamente elaborada no final de março de 2001.

187    A título de conclusão, há que constatar que, na reunião de 15 de março de 2001, foram discutidos dados sensíveis e precisos da Fapricela, cuja natureza inexata esta não logrou demonstrar.

188    Nestas circunstâncias, uma vez que há que constatar que a recorrente não apresentou nenhuma explicação alternativa verosímil para o facto de os outros membros do Clube España disporem de dados tão precisos a seu respeito, a explicação mais plausível, como a Comissão alega, é a de que esses dados podem ter sido comunicados pela própria recorrente.

189    A recorrente não logrou assim provar que não pode ser conferido valor probatório — ainda que limitado — aos elementos considerados pela Comissão, respeitantes à reunião de 15 de março de 2001.

g)     Quanto à reunião de 23 de março de 2001

190    No que se refere à reunião de 23 de março de 2001, em relação à qual a Comissão menciona a presença da Socitrel, «também em representação da Fapricela», há que salientar que, de acordo com a decisão impugnada, «[d]epois de resolvido um conflito entre a Fapricela, a Tycsa e a Emesa sobre qual a empresa que iria fornecer um determinado cliente, a Fapricela ‘comprometeu‑se a manter o acordo, que tinha dado tão bons resultados’ (original em espanhol) [...]», e que, «[p]or último, também foram debatidos os fornecimentos e os preços do cordão da Fapricela, Emesa e Tycsa em relação a um cliente específico».

191    A recorrente contesta que a Socitrel a tenha representado e considera, em substância, que a ata desta reunião comprova um desacordo entre si e os outros membros do Clube España e, por conseguinte, o seu distanciamento relativamente ao clube.

192    Há, no entanto, que rejeitar esta argumentação.

193    Com efeito, de acordo com as notas da Emesa que figuram na página 20060 do dossiê administrativo:

«Início da reunião. O Sr. S. sugere que pode atuar como ‘representante’ do Sr. T. [da Fapricela], que recusou assistir à reunião. O Sr. S. decide telefonar‑lhe para lhe apresentar as mais sinceras desculpas da Tycsa e da Emesa, cuja atitude ofendeu particularmente o diretor da Fapricela; parece ter aceite as desculpas e promete prosseguir o pacto que tão bons resultados deu. Garante que [J. C.] assistirá às próximas reuniões.»

194    Esta ata da reunião leva o Tribunal Geral a considerar que, na sequência de uma disputa entre a Fapricela, por um lado, e a Emesa e a Tycsa, por outro, a Fapricela decidiu não assistir à reunião. Contudo, o Sr. S. intercedeu com vista a resolver o diferendo entre estas sociedades. Tendo o Sr. T., da Fapricela, aceitado as desculpas da Emesa e da Tycsa, indicou que a Fapricela pretendia prosseguir o acordo existente entre os membros do Clube España e que a Fapricela assistiria às seguintes reuniões, o que fez duas semanas mais tarde, a partir de 9 de abril de 2001.

195    Por conseguinte, embora nada permita considerar que a Fapricela foi formalmente representada pela Socitrel nessa reunião, há que rejeitar a argumentação da Fapricela segundo a qual a sua atitude nesta reunião comprova um distanciamento relativamente ao Clube España.

h)     Quanto à reunião de 9 de abril de 2001

196    É facto assente que a recorrente participou na reunião de 9 de abril de 2001 e que não contesta ter participado de forma ativa nas discussões ocorridas nessa reunião.

197    Com efeito, a Fapricela limita‑se a alegar que, embora seja certo que nessa ocasião se juntou ao Clube España, só o fez devido à pressão exercida pelos outros membros do Clube, facto que a seguir se examinará nos n.os 204 e seguintes.

i)     Conclusão intermédia sobre as reuniões realizadas entre 18 de outubro de 2000 e 9 de abril de 2001

198    A título de conclusão, o Tribunal Geral considera, à luz dos elementos de prova recolhidos pela Comissão:

–        que a Fapricela participou na reunião de 18 de outubro de 2000 e que nenhum indício comprova um qualquer distanciamento da sua parte nessa ocasião;

–        que a Fapricela não assistiu às reuniões do Clube España realizadas em novembro e dezembro de 2000;

–        que, entre janeiro e 15 de março de 2001, se verificou uma troca de informações sensíveis respeitantes à Fapricela e que, no mínimo, essas informações foram discutidas pelos outros membros do Clube España, na reunião de 15 de março de 2001, e que é verosímil que essas informações tenham sido comunicadas pela própria Fapricela;

–        que uma crise que havia ocorrido entre a Fapricela e outros dois membros do Clube España foi solucionada na reunião de 23 de março de 2001, durante a qual a Fapricela informou que iria participar nas reuniões seguintes;

–        que a Fapricela voltou a participar plenamente nas reuniões do Clube España a partir de 9 de abril de 2001.

j)     Quanto ao comportamento autónomo e concorrencial da recorrente, entre 18 de outubro de 2000 e 9 de abril de 2001

199    No que se refere à argumentação da recorrente segundo a qual teve um comportamento autónomo e concorrencial entre 18 de outubro de 2000 e 9 de abril de 2001, há que constatar que a Fapricela não apresenta nenhum elemento de prova suscetível de provar a justeza desta afirmação.

200    É certo que as suas vendas aumentaram em março de 2001 relativamente a janeiro e fevereiro de 2001 (v. anexo VII da petição, página 33900) e que ultrapassaram as previsões (v. anexo VII da petição inicial, página 33903).

201    No entanto, este elemento não é suficiente, por si só, para provar que a Fapricela tinha saído do cartel e, em especial, durante um período de cerca de seis meses, entre outubro de 2000 e 9 de abril de 2001.

202    Com efeito, este elemento deve ser apreciado no seu contexto — a Fapricela esteve presente na reunião de 18 de outubro de 2000, no primeiro trimestre de 2001 foram trocadas informações a seu respeito, aceitou pôr termo a um diferendo que a opunha a outros dois membros do Clube España na reunião de 23 de março de 2001 e passou a participar novamente nas reuniões seguintes, o que fez a partir da reunião de 9 de abril de 2001 —, e a tese da Comissão segundo a qual se podia tratar de um meio de pressão para negociar um aumento da sua quota constitui uma explicação mais plausível para estes factos do que aquela que a recorrente apresentou, atendendo ao teor real da reunião de 23 de março de 2001 (v. n.os 190 a 195, supra).

203    Há igualmente que afastar a argumentação apresentada a título subsidiário pela recorrente, segundo a qual esta pretensa vontade de ter uma posição autónoma e concorrencial no mercado durou pelo menos um mês, o que parece ainda menos credível, mas tende, pelo contrário, a confirmar a tese da Comissão segundo a qual este aumento das vendas traduz uma postura da Fapricela destinada a obter uma renegociação da sua quota.

k)     Quanto aos argumentos respeitantes à pressão exercida sobre a recorrente para se juntar ao cartel

204    Há igualmente que afastar a argumentação da recorrente segundo a qual só se juntou ao cartel em abril de 2001 devido à pressão exercida pelos seus concorrentes.

205    Com efeito, por um lado, a recorrente não apresentou o menor elemento de prova em apoio da sua tese.

206    Por outro lado, e seja como for, ainda que se admitisse que a recorrente apresentou elementos neste sentido, há que recordar que resulta de jurisprudência constante que as pressões exercidas por empresas com vista a induzir outras empresas a participar numa infração ao direito da concorrência não liberam, independentemente da sua dimensão, a empresa em causa da sua responsabilidade pela infração praticada, em nada alteram a gravidade do cartel e não constituem uma circunstância atenuante para efeitos do cálculo dos montantes das coimas, dado que a referida empresa poderia ter denunciado as eventuais pressões às autoridades competentes e apresentar‑lhes uma queixa (v. acórdão de 19 de maio de 2010, Chalkor/Comissão, T‑21/05, Colet., EU:T:2010:205, n.° 72 e jurisprudência referida).

l)     Conclusão quanto à procedência do terceiro fundamento

207    Em conclusão, com base nos elementos de prova de que dispõe, o Tribunal Geral considera que a Fapricela não se distanciou do Clube España, entre 18 de outubro de 2000 e 9 de abril de 2001.

208    Quando muito, ficou demonstrado que, durante este período, se verificou um desacordo que envolveu a Fapricela, o qual foi ultrapassado em 23 de março de 2001, o que conduziu a que a recorrente voltasse a participar regularmente nas reuniões seguintes do Clube España.

209    Ora, o mero facto de uma empresa atravessar um período de desacordo ou de crise dentro de um cartel não é suficiente para caracterizar um distanciamento da sua parte relativamente ao cartel (v., neste sentido, acórdãos de 5 de abril de 2006, Degussa/Comissão, T‑279/02, Colet., EU:T:2006:103, n.os 127 a 137, e de 27 de setembro de 2006, Archer Daniels Midland/Comissão, T‑329/01, Colet., EU:T:2006:268, n.os 246 a 248).

210    Deve, assim, ser afastada a argumentação da Fapricela segundo a qual se distanciou do Clube España, entre 18 de outubro de 2000 e 9 de abril de 2001.

211    Consequentemente, também não pode prosperar a argumentação da recorrente relativa ao ano de referência que a Comissão devia ter considerado no que respeita ao valor das vendas a ter em conta para efeitos do cálculo do montante da coima.

212    Além disso, há que constatar que a decisão impugnada comporta uma fundamentação que permite compreender as razões por que a Comissão afastou a tese avançada pela recorrente sobre um alegado distanciamento da sua parte.

213    Quanto ao demais, há que recordar que, segundo jurisprudência constante, a Comissão não é obrigada, na decisão impugnada, a verificar e a responder a tudo o que é alegado pelas partes no procedimento administrativo, antes lhe competindo, em conformidade com o disposto no artigo 296.° TFUE, expor de forma clara e inequívoca o seu raciocínio, por forma a permitir aos interessados conhecer as razões da medida adotada e à jurisdição competente exercer a sua fiscalização (v. acórdão de 27 de setembro de 2012, Koninklijke Wegenbouw Stevin/Comissão, T‑357/06, Colet., EU:T:2012:488, n.° 32 e jurisprudência referida).

214    Por conseguinte, o terceiro fundamento deve ser julgado improcedente na totalidade.

IV –  Quanto à terceira parte do primeiro fundamento, respeitante à extensão do mercado de produtos abrangidos pelo acordo em que a Fapricela participou no âmbito do Clube España

215    A Fapricela alega, em substância, que a Comissão não logrou fazer prova da sua participação no Clube España, entre 2 de dezembro de 1998 e 19 de setembro de 2002, no que se refere ao mercado do cordão, e contesta as provas reunidas pela Comissão respeitantes às reuniões de 23 de março e 7 de junho de 2001.

A –  Quanto à admissibilidade da terceira parte do primeiro fundamento, segundo a qual não há provas da participação da recorrente no cartel, no que respeita ao cordão, entre, por um lado, 2 de dezembro de 1998 e 7 de junho de 2001 ou, alternativamente, entre 2 de dezembro de 1998 e 23 de março de 2001 e, por outro, entre 7 de junho de 2001 e 19 de setembro de 2002

216    A Comissão alega, em substância, que a argumentação da recorrente relativa à sua não participação no cartel ibérico do cordão é inadmissível por só ter sido apresentada na réplica.

217    Há que salientar que resulta de forma incidental do n.° 15 da petição, que figura na parte introdutiva, e do n.° 54 da mesma, que diz respeito à questão da participação ou do conhecimento que a Fapricela tem do Clube Europa, que a recorrente pretende também questionar os produtos que foram objeto do acordo ibérico, na parte que lhe diz respeito.

218    Há que sublinhar que esta argumentação também foi avançada, no âmbito do segundo fundamento, no que respeita à determinação do grau de gravidade da infração e à violação do princípio da proporcionalidade (n.os 133 e 145 da petição).

219    Só à luz da resposta mais estruturada da Comissão a este respeito é que a recorrente apresentou a sua argumentação, pelo que esta surge como uma parte distinta do primeiro fundamento (v. n.os 49 a 54 da réplica).

220    Há que recordar, é certo, que, segundo jurisprudência constante, nos termos do artigo 48.°, n.° 2, primeiro parágrafo, do Regulamento de Processo de 2 de maio de 1991, é proibido deduzir novos fundamentos no decurso da instância, a menos que tenham origem em elementos de direito e de facto que se tenham revelado durante o processo. No entanto, é de admitir um fundamento que seja uma ampliação de um fundamento já apresentado, direta ou indiretamente, na petição inicial e que apresente uma estreita ligação com ele (acórdão de 28 de abril de 2010, Gütermann e Zwicky/Comissão, T‑456/05 e T‑457/05, Colet., EU:T:2010:168, n.° 199).

221    Por outro lado, os argumentos cuja substância apresente uma relação estreita com um fundamento enunciado na petição inicial não podem ser considerados fundamentos novos, sendo admitida a sua apresentação na fase da réplica ou da audiência (v., neste sentido, acórdão de 12 de junho de 1958, Compagnie des hauts fourneaux de Chasse/Alta Autoridade, 2/57, Colet., EU:C:1958:5).

222    Há que considerar que, no presente caso, e à luz da petição, a argumentação mais estruturada apresentada pela Fapricela na fase da sua réplica, a respeito da sua não participação no Clube España, no que se refere ao cordão, não constitui um fundamento novo, mas corresponde ao conceito de ampliação de uma alegação existente.

223    Por conseguinte, a terceira parte do primeiro fundamento deve ser julgada admissível.

B –  Recordatória dos elementos de prova considerados pela Comissão na decisão impugnada

224    Em primeiro lugar, a Comissão baseia‑se nas discussões ocorridas na reunião de 23 de março de 2001. Refere:

«[R]egistou‑se uma polémica entre a Tycsa e a Emesa sobre vendas e preços de cordão, tendo sido observado que a Fapricela se queixara de que era difícil vender cordão em Espanha. Foi salientado que o preço tinha sido fixado em 98 escudos, até junho, e em 102 escudos, a partir de então (nota de pé de página 784). Notas manuscritas independentes encontradas na Tycsa corroboram os principais temas abordados (sobretudo encomendas firmes — volume/preço — cliente a cliente, em Portugal) durante esta reunião [...]» (considerando 512 da decisão impugnada).

225    Em segundo lugar, resulta da decisão impugnada que, na reunião de 7 de junho de 2001, a primeira parte desta reunião, ocorrida de manhã e à qual a Fapricela assistiu, foi inteiramente dedicada à renegociação do mercado ibérico do cordão [considerando 515 da decisão impugnada e anexo 4 da decisão impugnada; a Comissão remete, em especial, para as páginas 19997 e 19998 (informações prestadas pela Emesa) e para as páginas 30046 e 30047 (notas manuscritas da Tycsa) do dossiê administrativo].

226    Em terceiro lugar, resulta dos considerandos 484 e 491 da decisão impugnada e do anexo 4 desta, nomeadamente dos elementos relativos às reuniões de 1 de junho de 1993, 20 de abril de 1995, setembro, outubro e novembro de 1995, 3 e 9 de setembro de 1996, 22 de janeiro e 18 de novembro de 1997, finais de dezembro de 1997 e 28 de janeiro de 1998, que, desde o início, as empresas que participaram no Clube España trocaram informações e acordaram a repartição das quotas de mercado e a fixação dos preços relativos ao cordão.

227    Por último, em quarto lugar, resulta do anexo 4 da decisão impugnada, nomeadamente dos elementos relativos às reuniões de 14 de abril e 21 de setembro de 1999, de 8 de setembro, 18 de outubro, 15, 20 e 22 de dezembro de 2000, de 23 de março, 17 de maio, 18 de junho e 6 de julho de 2001 e de 31 de maio de 2002, bem como dos considerandos 502, 504, 506, 508, 510, 512, 515 a 517 e 521 da decisão impugnada, que, durante o período em que a Fapricela participou no Clube España, prosseguiram as negociações e as trocas de informações sensíveis relativas ao cordão. Resulta, nomeadamente, do anexo 4 que a Fapricela esteve presente na reunião de 8 de setembro de 2000, em que foi fixado um preço mínimo para o cordão, para o ano de 2001, e na reunião de 18 de outubro de 2000, em que foram repartidas as quotas de mercado para o cordão.

C –  Quanto à procedência da terceira parte do primeiro fundamento

228    Em primeiro lugar, há que constatar que a Fapricela se limita a contestar os elementos de prova considerados pela Comissão, no que se refere unicamente a duas reuniões que se realizaram, respetivamente, em 23 de março e 7 de junho de 2001.

229    No entanto, a recorrente não põe em causa a decisão impugnada, no que respeita ao teor das discussões relativas ao cordão que tiveram lugar nas reuniões de 14 de abril e 21 de setembro de 1999, 8 de setembro, 18 de outubro, 15, 20 e 22 de dezembro de 2000, 17 de maio, 18 de junho e 6 de julho de 2001 e 31 de maio de 2002.

230    É certo que há que salientar que a Comissão, no anexo 4 da decisão impugnada, não indica quem foram os participantes nas reuniões que se realizaram em 14 de abril e 21 de setembro de 1999, 15, 20 e 22 de dezembro de 2000 e 31 de maio de 2002, tendo‑se limitado a mencionar que, nessas ocasiões, ocorreram discussões relativas ao cordão.

231    Em contrapartida, a Comissão considerou na decisão impugnada que a Fapricela participou nas reuniões de 8 de setembro e 18 de outubro de 2000 (além disso, a Fapricela confirmou na audiência que participou nesta última reunião), 17 de maio, 18 de junho e 6 de julho de 2001. Por outro lado, a Comissão apresenta diversos elementos de prova, mencionados no anexo 4 da decisão impugnada, que comprovam que o cordão foi objeto de discussões nessas reuniões.

232    Ora, a Fapricela não apresenta argumentos que visem contestar a sua participação nessas reuniões ou o teor das discussões que aí ocorreram.

233    Em segundo lugar, no que se refere à reunião de 23 de março de 2001, a Fapricela reitera a sua argumentação segundo a qual não participou nela e contesta que a Socitrel a tenha representado nessa ocasião.

234    Ora, embora nada permita considerar que a Socitrel representou a Fapricela nessa reunião, há contudo que afastar esta argumentação pelas razões acima expostas nos n.os 194 e 195.

235    Em seguida, resulta do anexo 4 da decisão impugnada e dos elementos de prova recolhidos pela Comissão e mencionados neste anexo que, na reunião de 23 de março de 2001:

«As partes discutiram também, cliente a cliente, as propostas apresentadas ou a apresentar, incluindo para cordão. [...] Por último, também foram debatidos os fornecimentos e os preços do cordão da Fapricela, Emesa e Tycsa em relação a um cliente específico.»

236    Além disso, a Comissão acrescentou o seguinte, no considerando 512 da decisão impugnada:

«[R]egistou‑se uma polémica entre a Tycsa e a Emesa sobre vendas e preços de cordão, tendo sido observado que a Fapricela se queixara de que era difícil vender cordão em Espanha. Foi salientado que o preço tinha sido fixado em 98 escudos, até junho, e em 102 escudos, a partir de então [...] Notas manuscritas independentes encontradas na Tycsa corroboram os principais temas abordados (sobretudo encomendas firmes — volume/preço — cliente a cliente, em Portugal) durante esta reunião [...]»

237    Deste modo, contrariamente ao que a Fapricela afirma, estas indicações não conduzem de modo nenhum a provar que não participou no cartel, no que respeita ao cordão, antes levando a concluir que ocorreram trocas de informações a respeito do cordão, provenientes nomeadamente da Fapricela, conforme atestam duas fontes diferentes, a saber, a Tycsa e a Emesa.

238    Em terceiro lugar, no que se refere à reunião de 7 de junho de 2001, há que começar por recordar que o teor da reunião se encontra descrito da seguinte forma no anexo 4 da decisão impugnada:

«Reunião de manhã sobre cordão e de tarde sobre fio. Foram discutidas quotas e preços relativos à Aceralia, Tycsa e Fapricela (‘Acer, Tyc, Fabr’) e também os clientes atribuídos à Tycsa, Fapricela, Aceralia e Trefilerías Quijano (‘Tyc, Fab, Acer, TQ’). Foi ainda debatida a repartição de clientes no domínio das obras públicas.

Manhã [...]: as três empresas participantes renegociaram o acordo sobre divisão do mercado ibérico do cordão. A quota da Fapricela aumentaria [de 20%, ver 18.10.2000] para 25%, em prejuízo dos outros dois grupos (decréscimo [de 40%, ver 18.10.2000] para 37,5%). Debate exaustivo sobre repartição de clientes, incluindo a elaboração de uma lista dos principais produtores de componentes pré‑fabricados em Portugal e Espanha, em função do seu consumo de cordão (por ordem decrescente), identificando o(s) fornecedor(es) da altura desses produtores (/consumidores), com o objetivo de distribuir esses clientes entre a Tycsa, a Emesa e a Fapricela. Aplicação de uma forma especial de repartição de clientes em relação aos projetos que envolvessem grandes quantidades de cordão e que fossem executados por um consórcio de várias empresas (original em espanhol: UTES (‘Unión Temporal de Empresas’): a primeira obra posta a concurso por uma UTES seria ganha pela Fapricela, com um preço determinado por tonelada, visto que os outros propunham preços mais altos; a segunda obra seria artificialmente atribuída à Tycsa, a terceira à Emesa, repetindo‑se sucessivamente esta sequência. Foi afirmado que a ‘Proderac deve comunicar a sua lista de clientes ou não serão partilhadas informações com esta empresa’ (original em espanhol).»

239    Em primeiro lugar, há que constatar que a Fapricela não nega ter participado nesta reunião.

240    Em segundo lugar, os elementos de prova recolhidos pela Comissão (provas documentais provenientes da GSW, da Tycsa/Celsa, da Emesa e da Galycas) permitem provar que a reunião incidiu sobre o cordão, de manhã, e sobre o fio, à tarde, e que a Fapricela assistiu à parte da reunião destinada a discutir o cordão.

241    Em terceiro lugar, há que constatar que a recorrente, em resposta aos argumentos da Comissão, se limita a sustentar que a sua participação nessa reunião não é suficiente para provar que participou no cartel nesse mercado, antes dessa data e depois dessa data.

242    Ora, há que constatar que a Fapricela não nega que nessa reunião ocorreu uma troca de informações sensíveis a seu respeito.

243    Em quarto lugar, é com razão que a Comissão alega que, durante o período em que a Fapricela participou no Clube España, mantiveram‑se de forma contínua acordos ou práticas concertadas e trocas de informação sensível relativamente ao cordão (remete, a este respeito, para o anexo 4 da decisão impugnada e, mais concretamente, para os elementos respeitantes às reuniões de 14 de abril de 1999 e 21 de setembro de 1999, 15, 20 e 22 de dezembro de 2000 e 31 de maio de 2002, bem como para os considerandos 502, 504, 506, 508, 510, 512, 515 a 517, 521 e 530 da decisão impugnada).

244    Atendendo a tudo quanto precede, o Tribunal Geral considera que há um conjunto de provas que são suficientemente precisas e concordantes para provar que, no âmbito da sua participação no Clube España, a Fapricela, contrariamente ao que alega, também participou no acordo ou na prática concertada no seu todo, incluindo no que diz respeito ao cordão.

245    Consequentemente, a terceira parte do primeiro fundamento deve ser afastada.

V –  Quanto ao segundo fundamento, relativo à violação dos princípios da proporcionalidade, da igualdade de tratamento e da individualidade das penas

A –  Recordatória da decisão impugnada

246    De acordo com o considerando 949 da decisão impugnada:

«(949) [...] no que se refere à Socitrel, Proderac, Fapricela e Fundia, empresas que participaram exclusivamente no Clube [España] (que abrangia apenas Espanha e Portugal) ou — no que se refere à última empresa — na coordenação relativa à Addtek, e relativamente às quais o conhecimento da infração única e contínua só pôde ser estabelecido numa fase muito avançada da infração (17.05.2001 e 14.05.2001 respetivamente, ver secção 12.2.2.4), a Comissão toma em consideração o âmbito geográfico mais limitado ao determinar a proporção do valor das vendas. A situação é diferente para os outros participantes no Clube [España] (Emesa/Galycas, Tycsa/Trefilerías Quijano) que participaram simultaneamente a diversos níveis do cartel e/ou relativamente aos quais o conhecimento da infração única e contínua é estabelecido numa fase muito inicial. No que se refere aos participantes no Clube [Italia], a situação é também diferente da da Socitrel, Proderac e Fapricela uma vez que o âmbito geográfico do Clube [Italia] se sobrepõe em larga medida com o dos acordos pan‑europeus, sendo por conseguinte muito mais amplo do que o âmbito geográfico do Clube [España] (Espanha e Portugal).»

247    De acordo com o considerando 953 da decisão impugnada:

«(953) Dadas as circunstâncias específicas do presente caso e tomando em consideração os critérios acima descritos relacionados com a natureza da infração (ver secção 19.1.3.1) e o âmbito geográfico (ver secção 19.1.3.3), a proporção do valor das vendas a tomar em consideração será de 16% para a Fundia, 18% para a Socitrel, Fapricela e Proderac e 19% para todas as outras empresas.»

248    Além disso, de acordo com os considerandos 987 e 988 da decisão impugnada:

«(987) Também [a empresa Fapricela invoca] a sua participação limitada no cartel e [refere] a participação num número limitado de reuniões e/ou interrupções da sua participação nas reuniões do cartel durante vários períodos. A Fapricela afirma igualmente que nunca exerceu quaisquer atividades de coordenação.

(988) A Comissão observa que a Fapricela participou sistematicamente e contribuiu para mais de 30 reuniões do Clube [España] entre 1998 e 2002, tendo estado plenamente envolvida nos acordos de repartição de quotas e de clientes e na fixação de preços e trocado informações comerciais sensíveis com outros participantes no Clube [España], como ela própria admite [...]. Em 2001, a Fapricela também ‘prometeu [explicitamente] continuar o acordo que tão bons resultados dera’, demonstrando a sua satisfação com o cartel após a resolução de um litígio (ver ponto (510)). Consequentemente, o seu papel não pode ser qualificado [de] ‘substancialmente reduzido’ nos termos das Orientações para o cálculo das coimas de 2006, nem [de] passivo ou seguidista, mesmo nos termos das Orientações para o cálculo das coimas de 1998, apesar de não ter agido como coordenadora. Por último, tal como já explicado nos pontos (527) e seguintes e em especial no ponto (530), o argumento da Fapricela de que interrompeu a sua participação no cartel durante vários períodos está em contradição com os elementos de prova.»

249    Por último, no que se refere ao papel substancialmente reduzido da Fapricela, resulta da decisão impugnada:

«(1016) [...] A Fapricela afirma que pelo menos numa ocasião conseguiu ganhar um cliente da Emesa aplicando um preço inferior. Além disso, [...] e a Fapricela mencionam conflitos com outros membros do cartel. [...]

[...]

(1018) A Comissão observa em primeiro lugar que a maior parte dos elementos probatórios apresentados consiste essencialmente em dados certificados apenas pela própria empresa que os apresentou. De qualquer forma, a deslealdade ocasional em relação aos preços fixados e/ou à repartição de quotas ou clientes não prova, por si só, que uma parte não implementou os acordos do cartel. Os conflitos internos, as rivalidades e a ‘batota’ são comuns em qualquer cartel, em especial nos de longa duração (ver pontos (604) e (680)). O facto de uma empresa não ter respeitado certos acordos não significa, por conseguinte, que tal empresa não tenha implementado nenhum dos acordos do cartel e que tenha adotado um comportamento plenamente concorrencial no mercado.

(1019) A implementação dos acordos do cartel foi assegurada através de um sistema de controlo (ver secções 9.1.6.1, 9.2.1.7 e 9.2.2.5) e da realização de reuniões do cartel muito frequentes entre concorrentes em que eram trocadas regularmente informações confidenciais, permitindo que as partes comparassem os seus dados e acordassem e/ou revissem quotas, preços e a repartição dos clientes [...]). Ficou estabelecido que [...] a Fapricela [...] — assim como, na sua totalidade, os restantes destinatários da presente decisão — particip[ou] regularmente em reuniões em que eram discutidos e controlados preços, quotas e clientes (ver igualmente secção 9, secção 14 e Anexos 2, 3 e 4) [...].

[...]

(1022) Em conclusão, é evidente que nenhuma das partes demonstrou que se subtraiu de facto à implementação dos acordos ilícitos, adotando um comportamento concorrencial no mercado ou que, claramente e de modo considerável, infringiu as obrigações relacionadas com a implementação do acordo de cartel, a ponto de ter perturbado o seu funcionamento. Consequentemente, não podem ser consideradas quaisquer circunstâncias atenuantes com base na não implementação ou no papel substancialmente reduzido.

(1023) Todavia, a Comissão está disposta a aceitar que a Proderac e a Trame tiveram uma participação reduzida na infração. Tal deve‑se ao facto de estes participantes terem desenvolvido atividades na periferia do cartel, terem realizado um número mais limitado de contactos com outros membros do cartel e terem participado na infração apenas de forma limitada.»

B –  Considerações preliminares

250    Nas suas alegações escritas, a Fapricela consagra extensos desenvolvimentos ao alegado defeito estrutural que vicia as orientações de 2006, que conduzem, em substância, a que sejam aplicadas sanções mais gravosas às pequenas empresas (monoprodutos) do que às grandes empresas (multiprodutos).

251    No entanto, questionada na audiência sobre o sentido do n.° 57 da réplica, a Fapricela confirmou que não pretendia contestar a legalidade das orientações de 2006, mas apenas a sua aplicação pela Comissão ao caso concreto.

252    O segundo fundamento subdivide‑se, por conseguinte, em duas partes, relativas, a primeira, ao caráter desproporcionado da coima e à não consideração de diferentes elementos aquando da avaliação do grau de gravidade da infração e do montante adicional aplicado a título da dissuasão e, a segunda, à violação do princípio da igualdade de tratamento.

C –  Quanto à primeira parte do segundo fundamento, relativa ao caráter desproporcionado da coima e à não consideração de diferentes elementos aquando da avaliação do grau de gravidade da infração e do montante adicional aplicado a título da dissuasão

1.     Recordatória dos princípios

253    Há que recordar que, em conformidade com as orientações de 2006:

«13. Para determinar o montante de base da coima a aplicar, a Comissão utilizará o valor das vendas de bens ou serviços, realizadas pela empresa, relacionadas direta ou indiretamente com a infração, na área geográfica em causa no território do [EEE]. A Comissão utilizará em princípio as vendas realizadas pela empresa durante o último ano completo da sua participação na infração.

[...]

19. O montante de base da coima estará ligado a uma proporção do valor das vendas, determinado em função do grau de gravidade da infração, multiplicado pelo número de anos de infração.

20. A apreciação da gravidade será feita numa base casuística para cada tipo de infração, tendo em conta todas as circunstâncias relevantes do caso.

21. Regra geral, a proporção do valor das vendas tomada em conta será fixada num nível que pode ir até 30%.

22. A fim de decidir se a proporção do valor das vendas a tomar em consideração num determinado caso se deverá situar num nível inferior ou superior desta escala, a Comissão terá em conta certos fatores, como a natureza da infração, a quota de mercado agregada de todas as partes em causa, o âmbito geográfico da infração e se a infração foi ou não posta em prática.

23. Os acordos horizontais de fixação de preços, de repartição de mercado e de limitação de produção, que são geralmente secretos, são pela sua natureza considerados as restrições de concorrência mais graves. No âmbito da política da concorrência serão [punidos] severamente. Por conseguinte, a proporção das vendas tida em conta para tais infrações situar‑se‑á geralmente num nível superior da escala.»

254    Segundo jurisprudência constante, aquando da determinação do montante das coimas, há que tomar em consideração todos os elementos suscetíveis de entrar na apreciação da gravidade das infrações, tais como, nomeadamente, o papel desempenhado por cada uma das partes na infração e o risco que infrações deste tipo representam para os objetivos da União. Quando uma infração seja cometida por diversas empresas, há que examinar a gravidade relativa da participação de cada uma (v. acórdãos de 8 de julho de 1999, Hercules Chemicals/Comissão, C‑51/92 P, Colet., EU:C:1999:357, n.° 110 e jurisprudência referida, e Cimenteries CBR e o./Comissão, n.° 90, supra, EU:T:2000:77, n.° 4949 e jurisprudência referida).

255    O facto de uma empresa não ter participado em todos os elementos constitutivos de um cartel ou de ter desempenhado um papel secundário nas partes em que participou deve ser tomado em consideração aquando da apreciação da gravidade da infração e, eventualmente, da determinação da coima (acórdãos de 8 de julho de 1999, Comissão/Anic Partecipazioni, C‑49/92 P, Colet., EU:C:1999:356, n.° 90; Aalborg Portland e o./Comissão, n.° 86, supra, EU:C:2004:6, n.° 86; e Comissão/Verhuizingen Coppens, n.° 135, supra, EU:C:2012:778, n.° 45).

256    Há igualmente que recordar que, para efetuar o cálculo do montante das coimas aplicadas às empresas que participaram num cartel, é inerente ao exercício dos poderes que cabem à Comissão na matéria proceder a um tratamento diferenciado entre as empresas em causa. Com efeito, no âmbito da sua margem de apreciação, a Comissão é chamada a individualizar a sanção em função dos comportamentos e das características próprias dessas empresas, para garantir, em cada caso concreto, a plena eficácia das regras do direito da concorrência da União (v. acórdãos de 12 de novembro de 2009, SGL Carbon/Comissão, C‑564/08 P, EU:C:2009:703, n.° 43 e jurisprudência referida, e de 5 de dezembro de 2013, Caffaro/Comissão, C‑447/11 P, EU:C:2013:797, n.° 50 e jurisprudência referida).

257    Por outro lado, o princípio da proporcionalidade exige que os atos das instituições não excedam os limites do que é adequado e necessário para atingir o objetivo pretendido. No contexto do cálculo do montante das coimas, a gravidade das infrações deve ser determinada em função de muitos elementos, não se devendo atribuir a nenhum deles uma importância desproporcionada face aos outros elementos de apreciação. O princípio da proporcionalidade exige, nesse contexto, que a Comissão fixe a coima proporcionalmente aos elementos tomados em conta na apreciação da gravidade da infração e que aplique esses elementos de forma coerente e objetivamente justificada (v. acórdãos de 27 de setembro de 2006, Jungbunzlauer/Comissão, T‑43/02, Colet., EU:T:2006:270, n.os 226 a 228 e jurisprudência referida, e Gütermann e Zwicky/Comissão, n.° 220, supra, EU:T:2010:168, n.° 264 e jurisprudência referida).

2.     Quanto à procedência da primeira parte do segundo fundamento

258    A Fapricela apresenta vários argumentos em apoio da primeira parte do seu segundo fundamento, relativa ao caráter desproporcionado da coima e à não tomada em consideração de diferentes elementos aquando da avaliação do grau de gravidade da infração e do montante adicional aplicado a título de dissuasão.

259    Em primeiro lugar, a Fapricela sustenta que é a empresa cuja duração de participação no cartel foi a mais curta.

260    Ora, por um lado, a duração da infração não pode ser confundida com a sua gravidade (artigo 23.°, n.° 3, do Regulamento n.° 1/2003) e, por outro, há que constatar que a Comissão não errou quando determinou a duração da participação da recorrente no Clube España, no período entre 2 de dezembro de 1998 e 19 de setembro de 2002.

261    Em segundo lugar, a recorrente alega que a sua participação se limitou à Península Ibérica.

262    Ora, há que constatar que a Comissão tomou este elemento em devida consideração, porquanto apenas considerou, a título do valor das vendas, o valor das vendas realizadas pela Fapricela na Península Ibérica (v. n.° 246, supra).

263    Em terceiro lugar, a recorrente afirma que o seu papel de menor importância não foi tomado em consideração. Alega igualmente que teve um comportamento que foi apenas passivo no cartel e que não desempenhou um papel essencial, ao contrário das outras empresas ibéricas, como a Tycsa e a Emesa. Desta forma, nunca teve um papel de coordenação, ao contrário, por exemplo, da Tycsa, e manteve um comportamento concorrencial no mercado.

264    Contudo, nos considerandos 988 e 1019 a 1022 da decisão impugnada, a Comissão rejeitou as alegações da recorrente a este respeito, havendo que constatar que, no âmbito da sua petição, a Fapricela não demonstrou minimamente que estas últimas apreciações estavam erradas.

265    Esta argumentação não pode assim proceder.

266    Em quarto lugar, a recorrente alega que, em 2001, tinha o terceiro menor volume de negócios de entre as destinatárias da decisão impugnada, embora lhe tenha sido aplicada a sétima sanção mais elevada.

267    No entanto, esta circunstância não tem incidência no montante da coima, uma vez que não é o volume de negócios da empresa, mas efetivamente apenas o valor das vendas de bens, realizadas pela empresa, relacionadas direta ou indiretamente com a infração, na área geográfica em causa no território do EEE, que é tomado em consideração pela Comissão para determinar o montante de base da coima.

268    Em quinto lugar, a Fapricela sustenta que só entrou tardiamente no Clube España.

269    Ora, há que constatar que a Comissão tomou este elemento em consideração a título da duração da infração que foi imputada à recorrente.

270    Em sexto lugar, a Fapricela entende que não foi tomado em consideração o facto de ter participado em menos reuniões do que os outros membros do cartel.

271    No entanto, esta argumentação confunde‑se, em substância, com a relativa ao alegado papel passivo que a Fapricela teria desempenhado no Clube España, argumentação que não pode prosperar pelas razões acima indicadas nos n.os 263 a 265.

272    Além disso, há que constatar que a Fapricela participou em mais de trinta reuniões durante o período em que fez parte do Clube España.

273    O facto de não ter assistido a todas as reuniões do cartel durante o período de infração que lhe foi imputado é irrelevante a este respeito, uma vez que já se verificou que a Fapricela participou de forma continuada na infração, entre 2 de dezembro de 1998 e 19 de setembro de 2002.

274    Em sétimo lugar, no que se refere à argumentação da Fapricela segundo a qual não participou no cartel do cordão durante um determinado período, a mesma constitui o objeto da terceira parte do primeiro fundamento, que deve ser rejeitada por ser improcedente (n.° 244, supra).

275    Em oitavo lugar, no que se refere à argumentação da recorrente segundo a qual não participou na reunião de 23 de março de 2001 e se distanciou do cartel entre outubro de 2000 e abril de 2001, há que recordar que a mesma deve ser considerada improcedente (v. n.° 210, supra).

276    Em nono lugar, a Fapricela alega a não implementação dos acordos, a guerras de preços verificada entre os membros do cartel e a existência de uma situação de acesa concorrência no mercado, de que as margens de lucro extremamente reduzidas durante o período de infração constituem uma indicação.

277    No entanto, esta argumentação não pode prosperar.

278    Com efeito, há que recordar que, por natureza, os cartéis secretos ocorrem frequentemente num clima de suspeição. No entanto, a existência de tal clima não afeta necessariamente o impacto concreto do cartel (acórdão de 27 de setembro de 2006, Roquette Frères/Comissão, T‑322/01, Colet., EU:T:2006:267, n.os 172 e 174).

279    A este respeito, a Comissão recorda que conflitos internos, rivalidades e «batota» são comuns em qualquer cartel, em especial nos de longa duração.

280    Ora, há que constatar que a recorrente não apresenta o menor indício de prova em apoio das suas alegações relativas à não implementação dos acordos — através dos membros do Clube España ou através dela própria — e a uma guerra de preços que se terá verificado dentro do Clube España durante o período da infração, entre 1998 e 2002, que lhe foi imputado.

281    Os elementos de prova, em especial o teor das discussões que ocorreram durante este período, conforme resulta da decisão impugnada, nomeadamente do anexo 4 desta, comprovam, pelo contrário, uma coordenação que foi incessantemente renovada e que incluía a Fapricela.

282    Além disso, o facto de os membros de um cartel terem ocasionalmente decidido afastar‑se dos acordos não significa que não implementaram os acordos colusórios. Com efeito, uma empresa que prossegue, apesar da concertação com os seus concorrentes, uma política mais ou menos independente no mercado pode simplesmente tentar utilizar o cartel em seu benefício (acórdão de 14 de maio de 1998, Cascades/Comissão, T‑308/94, Colet., EU:T:1998:90, n.° 230).

283    Por último, os elementos numéricos apresentados pela Fapricela no n.° 147 da petição consolidada, relativos às suas margens de lucro, não se baseiam de modo nenhum em documentos contabilísticos certificados e com valor probatório e não demonstram que a Fapricela não participou nos acordos de que é acusada ou que não os implementou.

284    Em décimo lugar, a Fapricela alega, em substância, que nunca participou nem teve conhecimento da dimensão pan‑europeia do cartel, o que tem incidência na gravidade da infração que lhe foi imputada.

285    Importa recordar que há que julgar procedentes as duas primeiras partes do primeiro fundamento, uma vez que não ficou provado que a recorrente tinha tido conhecimento do Clube Europa.

286    Ora, para fixar em 18% o grau de gravidade da infração cometida nomeadamente pela Fapricela, pela Proderac e pela Socitrel, a Comissão tomou precisamente em consideração o facto de estas três empresas membros do Clube España só tardiamente terem tido conhecimento da dimensão pan‑europeia do cartel.

287    Por conseguinte, há que constatar que, deste modo, a Comissão cometeu um erro no que respeita à Fapricela.

288    O mesmo se diga do montante adicional a título da dissuasão, cujo grau foi determinado, na decisão impugnada, por referência e ao abrigo da fundamentação considerada no que respeita ao grau de gravidade da infração (v. considerando 962 da decisão impugnada).

D –  Quanto à segunda parte do segundo fundamento, relativa à violação do princípio da igualdade de tratamento

289    Por um lado, a recorrente sustenta, em substância, que o princípio da igualdade de tratamento foi violado por a Comissão não lhe ter concedido uma redução comparável àquela que concedeu à Arcelor e à Ori Martin, aquando da adoção da segunda decisão modificativa.

290    Por outro lado, a Fapricela alega que este princípio também foi violado porquanto, primeiro, lhe foi conferido um tratamento semelhante ao da Socitrel e ao da Proderac, embora a sua situação se distinga da destas duas empresas, segundo, só lhe foi concedida uma redução de 1% a título da gravidade relativamente às empresas — nomeadamente a Emesa e a Tycsa — às quais foi fixado um grau de gravidade da infração de 19%, ao passo que as empresas que fazem parte desta categoria cometeram todas uma infração muito mais grave do que a que ela cometeu, e, terceiro, lhe devia ter sido conferido um tratamento mais favorável do que aquele que foi conferido à Fundia, a qual participou num acordo relativo a um cliente muito mais importante — a Addtek — do que aqueles que foram abrangidos pelo acordo em que ela própria participou.

291    Há que recordar que, segundo jurisprudência constante, o princípio da igualdade de tratamento exige que situações comparáveis não sejam tratadas de modo diferente e que situações diferentes não sejam tratadas de modo igual, exceto se esse tratamento for objetivamente justificado (v. acórdão de 3 de maio de 2007, Advocaten voor de Wereld, C‑303/05, Colet., EU:C:2007:261, n.° 56 e jurisprudência referida).

292    Quanto à primeira alegação, há que constatar que as razões que conduziram à adoção da segunda decisão modificativa — a saber, a tomada em consideração, para a aplicação do nível máximo de 10%, do volume de negócios da filial envolvida no cartel, em vez do volume de negócios do grupo — não podem conduzir a uma redução do montante da coima aplicada à Fapricela, que, com efeito, não se encontra numa situação semelhante à da Arcelor, da SLM ou da Ori Martin, uma vez que, depois de terminado o período de infração, não foi adquirida por outra empresa.

293    Perante estas circunstâncias, não procede assim a alegação da recorrente segundo a qual foi violado o princípio da igualdade de tratamento.

294    Quanto à segunda alegação, há que começar por recordar que, na decisão impugnada (considerando 953), a Comissão estabeleceu três categorias para efeitos da determinação do grau de gravidade, baseando‑se na natureza da infração cometida (considerandos 939 a 945), na quota de mercado conjunta (considerando 946) e no âmbito geográfico do cartel (considerandos 947 a 949):

–        uma categoria de 16%, que só se aplica à Fundia e que é justificada pelo facto de esta empresa só ter participado na «coordenação» da Addtek (considerando 939);

–        uma categoria de 18%, justificando‑se esta percentagem com base em dois critérios: a participação apenas no Clube España e o conhecimento tardio da dimensão pan‑europeia do cartel; a Socitrel, a Proderac e a recorrente fazem parte desta categoria (considerando 949);

–        uma categoria de 19%, na qual estão incluídas as outras empresas que participaram no cartel (considerando 953).

295    Em primeiro lugar, há que constatar que não se pode comparar a situação da Fapricela com a da Fundia, uma vez que esta só foi responsabilizada, em substância, devido à «coordenação» das vendas de um único cliente, a saber, a Addtek, ao passo que a Fapricela participou numa infração caracterizada pela repartição do mercado (fixação de quotas), pela repartição de clientela e pela fixação horizontal de preços no âmbito do mercado ibérico.

296    Em segundo lugar, a Emesa e a Tycsa participaram ativamente no Clube Zurich (uma, desde 1992, e a outra, desde 1993) e no Clube Europa, ao passo que a Fapricela não participou em nenhum destes clubes.

297    É certo que a diferença entre as percentagens das categorias a que pertencem, respetivamente, a Emesa e a Tycsa, por um lado, e a recorrente, por outro, é reduzida, mas há que recordar que, de acordo com o ponto 21 das orientações de 2006, a proporção do valor das vendas tomada em conta será fixada num nível que pode ir até 30% e que, de acordo com o ponto 23 destas orientações, se considera que os acordos horizontais de fixação de preços, de repartição de mercado e de limitação de produção, que são geralmente secretos, são, pela sua natureza, as restrições de concorrência mais graves e, no âmbito da política da concorrência, serão punidos severamente. Por conseguinte, a proporção das vendas tida em conta para tais infrações situar‑se‑á geralmente num nível superior da escala.

298    Ora, há que constatar, no presente caso, que, tendo em consideração a natureza da infração recordada no considerando 939 da decisão impugnada (repartição do mercado/avaliação de quotas, repartição de clientela e fixação horizontal de preços), o grau de gravidade considerado pela Comissão para a categoria que cometeu a infração se situa na parte inferior do intervalo (de 15% a 30%), o que conduz a que seja pequena a diferença relativamente a outra categoria que cometeu uma infração também caracterizada por acordos horizontais de fixação de preços, de repartição de mercado e de limitação de produção.

299    Além do mais, há igualmente que constatar que a distinção efetuada pela Comissão entre a categoria a que pertencem nomeadamente a Emesa e a Tycsa, por um lado, e aquela a que pertencem a Socitrel, a Fapricela e a Proderac, por outro, assenta em elementos objetivos.

300    A recorrente não pode, assim, apenas ao abrigo desta pequena diferença entre os dois graus de gravidade considerados pela Comissão, invocar uma violação da igualdade de tratamento.

301    Em terceiro lugar, foi, contudo, aplicada à Fapricela, à Socitrel e à Proderac uma percentagem de gravidade de 18%, em vez de 19%, pelo facto de só terem participado no Clube España e de o seu conhecimento da dimensão pan‑europeia do cartel ter sido tardio.

302    Ora, há que recordar que não ficou provado que a Fapricela teve conhecimento da dimensão pan‑europeia do cartel (v., supra, a primeira e a segunda parte do primeiro fundamento).

303    Por conseguinte, a Comissão não podia incluir a Fapricela na mesma categoria da Socitrel e da Proderac.

304    Deste modo, há que julgar procedente a segunda parte do segundo fundamento.

305    No entanto, há que rejeitar, quanto ao demais, a argumentação da recorrente segundo a qual a duração da participação da Socitrel no cartel foi superior à sua, uma vez que este fator deve ser tomado em consideração no cálculo da duração da infração e não na apreciação da gravidade desta.

306    O mesmo se diga do número de reuniões a que a Socitrel assistiu, uma vez que, da mesma maneira que para a Fapricela, este fator não tem incidência no caráter contínuo da infração que cometeram (v. n.° 273, supra).

E –  Conclusão intermédia

307    Em conclusão, há que julgar procedente o segundo fundamento e, por conseguinte, constatar que a fixação do montante de base da coima está ferida de erro.

308    Deste modo, há que anular parcialmente o artigo 2.° da decisão impugnada, na parte em que aplica uma coima à Fapricela.

[omissis]

VII –  Quanto ao primeiro fundamento complementar, relativo à violação dos direitos de defesa da Fapricela, à violação das formalidades essenciais e à falta de fundamentação

A –  Recordatória da decisão impugnada

400    Na primeira decisão modificativa, a Comissão completou o considerando 935 da decisão impugnada, inserindo‑lhe uma tabela com os valores das vendas considerados para as diferentes empresas. No que respeita à Fapricela, indica‑se, no n.° 6 dessa tabela: «Fapricela: resposta de 16.06.2009: 2.12.1998‑19.9.2002: [valor das vendas consideradas para a Fapricela]».

B –  Apreciação do Tribunal Geral

401    Em primeiro lugar, uma vez que este fundamento se confunde parcialmente com o fundamento invocado na audiência, relativo ao facto de a recorrente não ter sido notificada da primeira decisão modificativa, o que conduziu a uma violação dos seus direitos de defesa, há que remeter para as apreciações do Tribunal Geral que figuram nos n.os 79 a 82 do presente acórdão.

402    Em segundo lugar, há que sublinhar que, com a primeira decisão modificativa, a Comissão corrigiu erros materiais que escaparam na decisão inicial, mas não alterou o montante da coima aplicada à Fapricela.

403    Para mais, a correção a que a Comissão procedeu no que respeita à recorrente tinha por objetivo precisar, na decisão impugnada, o valor das vendas conforme tinha sido comunicado pela Fapricela à Comissão na sua resposta de 16 de junho de 2009.

404    Além disso, a recorrente reconheceu, na audiência, que a Comissão calculou corretamente o montante de base da coima na decisão inicial, ao tomar em consideração o montante do valor das vendas consideradas para a Fapricela, que incluía o valor das vendas de cordão efetuadas pela Fapricela.

405    A recorrente não pode, assim, alegar que, antes da primeira decisão modificativa, não podia compreender que o valor das vendas de cordão estava incluído no valor das vendas considerado para efeitos do cálculo do montante da coima.

406    Por conseguinte, deve ser afastada a alegação relativa à falta de fundamentação da decisão inicial quanto a esta questão.

407    Em terceiro lugar, a primeira decisão modificativa comporta uma fundamentação que permite compreender os erros que a Comissão pretendeu corrigir e indica claramente as alterações introduzidas à decisão inicial. Por conseguinte, a alegação relativa à falta de fundamentação da primeira decisão modificativa também é desprovida de fundamento a este respeito.

408    Em quarto lugar, ainda que se admita que, com a sua argumentação, a Fapricela pretende alegar que não foi ouvida antes da adoção das duas decisões modificativas, o que constituiria uma violação dos seus direitos de defesa durante o procedimento administrativo, há que constatar, primeiro, que a recorrente foi ouvida antes da adoção da decisão inicial, de acordo com as disposições do Regulamento n.° 1/2003; segundo, que a primeira decisão modificativa só introduziu correções materiais na decisão inicial; terceiro, que a recorrente não indica em que é que o facto de ser ouvida sobre os elementos corrigidos pela Comissão com base nas informações que lhe foram comunicadas por ela própria durante o procedimento administrativo teria de alguma forma alterado o teor da decisão impugnada ou lhe teria permitido assegurar melhor a sua defesa (acórdão de 18 de junho de 2013, Fluorsid e Minmet/Comissão, T‑404/08, Colet., EU:T:2013:321, n.° 110); e, quarto e último, que o montante da coima aplicada à Fapricela não foi alterado nem na primeira decisão modificativa nem na segunda.

409    É certo que a segunda decisão modificativa procedeu à alteração do montante da coima aplicada a duas empresas, a Arcelor e a Ori Martin.

410    Há que constatar que as razões que conduziram à adoção da segunda decisão modificativa — a saber, a tomada em consideração, para a aplicação do nível máximo de 10%, do volume de negócios da filial envolvida no cartel, em vez do volume de negócios do grupo — não diziam minimamente respeito à Fapricela, cuja situação era totalmente diferente.

411    A recorrente não pode assim alegar a violação do princípio da igualdade de tratamento nestas circunstâncias, do mesmo modo que não pode reivindicar o direito a ser ouvida previamente.

412    Há também que afastar, pelas mesmas razões, as suas alegações relativas à violação do princípio do contraditório ou do princípio da boa administração, uma vez que as alterações introduzidas pela segunda decisão modificativa não lhe diziam respeito.

413    Em quinto lugar, seja como for, a recorrente teve possibilidade de adaptar os seus fundamentos e pedidos após a adoção de cada uma das duas decisões modificativas, possibilidade de que fez uso por duas vezes, pelo que não pode assim alegar que a adoção dessas decisões deu origem a uma qualquer violação dos seus direitos de defesa.

414    O primeiro fundamento complementar deve, por conseguinte, ser afastado no seu conjunto.

VIII –  Quanto ao pedido de anulação do artigo 3.° da decisão impugnada

415    A recorrente pede a anulação do artigo 3.° da decisão impugnada.

416    No entanto, há que rejeitar este pedido, na medida em que o artigo 3.° da decisão impugnada se destinava, no seu primeiro parágrafo, a impor às empresas que pusessem termo à infração, caso ainda não o tivessem feito. Ora, a recorrente afirma que pôs termo à infração em setembro de 2002. À data em que interpôs o recurso, a recorrente não tinha assim interesse em obter a anulação desta disposição da decisão impugnada.

417    O artigo 3.°, segundo parágrafo, destinava‑se, além disso, a impor às empresas destinatárias que não repetissem os seus atos e comportamentos. Ora, resulta do que precede que a Fapricela cometeu uma infração e deve ser condenada a esse título, o que justifica que lhe fosse imposto que não voltasse a repetir os seus atos e comportamentos.

418    O seu pedido de anulação do artigo 3.° da decisão impugnada deve, por conseguinte, ser totalmente rejeitado, por ser em parte inadmissível e em parte improcedente.

IX –  Quanto ao exercício pelo Tribunal Geral da sua competência de plena jurisdição

A –  Recordatória do cálculo do montante da coima efetuado pela Comissão

419    Há que recordar os elementos do cálculo efetuado pela Comissão para determinar o montante da coima aplicada à Fapricela:

–        valor das vendas de aço para pré‑esforço, incluindo sob a forma de fios e de cordões, realizadas em 2001 (a);

–        quota do valor das vendas (b): 18%;

–        número de anos (coeficiente de duração) (c): 3,75;

–        percentagem aplicada ao montante adicional (d): 18%;

–        montante de base total: [(a) x (b) x (c)] + [(a) x (d)];

–        majoração por circunstâncias agravantes: não;

–        redução por circunstâncias atenuantes: não;

–        montante de base total (inalterado);

–        aplicação do nível máximo de 10% do volume de negócios: 8 874 000 euros;

–        redução a título da aplicação do regime de clemência: não;

–        redução a título da incapacidade de a empresa pagar a coima, devido a circunstâncias socioeconómicas específicas: não;

–        montante final da coima: 8 874 000 euros.

B –  Recordatória dos princípios

420    A competência de plena jurisdição conferida, nos termos do artigo 261.° TFUE, ao Tribunal Geral pelo artigo 31.° do Regulamento n.° 1/2003 habilita‑o, para além da simples fiscalização da legalidade da sanção, que só permite negar provimento ao recurso de anulação ou anular o ato impugnado, a substituir a apreciação da Comissão pela sua própria apreciação e, por conseguinte, a reformar o ato impugnado, ainda que este não seja anulado, tendo em conta todas as circunstâncias de facto, alterando nomeadamente a coima aplicada, quando a questão do montante desta seja submetida à sua apreciação (v., neste sentido, acórdãos de 8 de fevereiro de 2007, Groupe Danone/Comissão, C‑3/06 P, Colet., EU:C:2007:88, n.os 61 e 62, e de 3 de setembro de 2009, Prym e Prym Consumer/Comissão, C‑534/07 P, Colet., EU:C:2009:505, n.° 86 e jurisprudência referida).

421    Por outro lado, nos termos do artigo 23.°, n.° 3, do Regulamento n.° 1/2003, quando se determinar o montante da coima, deve tomar‑se em consideração a gravidade e a duração da infração.

422    O Tribunal de Justiça já declarou que, para a determinação dos montantes das coimas, há que ter em conta a duração das infrações e todos os elementos que podem entrar na apreciação da gravidade destas, tais como o comportamento de cada uma das empresas, o papel desempenhado por cada uma delas no estabelecimento das práticas concertadas, o benefício que retiraram dessas práticas, a sua dimensão e o valor das mercadorias em causa, bem como o risco que as infrações deste tipo representam para a União (v. acórdão de 8 de dezembro de 2011, Chalkor/Comissão, C‑386/10 P, Colet., EU:C:2011:815, n.° 56 e jurisprudência referida).

423    O Tribunal de Justiça indicou igualmente que devem ser tidos em conta elementos objetivos, como o conteúdo e a duração dos comportamentos anticoncorrenciais, o seu número e a sua intensidade, a extensão do mercado afetado e a deterioração sofrida pela ordem pública económica. A análise deve igualmente tomar em consideração a importância relativa e a quota de mercado das empresas responsáveis, bem como uma eventual reincidência (acórdão Chalkor/Comissão, n.° 422, supra, EU:C:2011:815, n.° 57).

424    A este respeito, importa salientar que, por natureza, a fixação de uma coima pelo Tribunal Geral não é um exercício aritmético preciso. Por outro lado, o Tribunal Geral não está vinculado pelos cálculos da Comissão, nem pelas suas orientações, quando se pronuncia ao abrigo da sua competência de plena jurisdição, devendo efetuar a sua própria apreciação tomando em consideração todas as circunstâncias do caso concreto (v. acórdão de 12 de dezembro de 2007, BASF e UCB/Comissão, T‑101/05 e T‑111/05, Colet., EU:T:2007:380, n.° 213 e jurisprudência referida).

C –  Apreciação do Tribunal Geral no presente caso

425    No presente caso, para determinar o montante da coima destinada a punir a participação da Fapricela na infração, resulta do artigo 23.°, n.° 3, do Regulamento n.° 1/2003 que se deve tomar em consideração a gravidade e a duração da infração, e decorre do princípio da individualidade das penas que a sanção deve ter em conta a situação de cada infrator relativamente à infração.

426    A infração que deve ser imputada à Fapricela é apenas a sua participação ininterrupta no Clube España, uma vez que não ficou provado que a Fapricela tinha tido conhecimento da existência do Clube Europa (v. primeira e segunda partes do primeiro fundamento, n.os 130 e 142, supra).

427    Quanto à duração da infração cometida pela Fapricela, decorreu entre 2 de dezembro de 1998 e 19 de setembro de 2002, uma vez que não ficou provado que a Fapricela se distanciou do Clube España entre 18 de outubro de 2000 e 9 de abril de 2001 (v. n.° 207, supra).

428    No que se refere à gravidade da infração cometida pela Fapricela, há que recordar, em primeiro lugar, que foi sem razão que a Comissão considerou que a Fapricela teve conhecimento, ainda que tardio, da dimensão pan‑europeia do cartel (v. n.° 130, supra).

429    Para apreciar a gravidade objetiva da infração cometida pela Fapricela, este critério não pode assim ser tomado em consideração.

430    A infração cometida pela Fapricela reveste menor gravidade do que a que foi cometida pela Socitrel e pela Proderac, às quais a Fapricela foi equiparada pela Comissão (considerando 953 da decisão impugnada).

431    A infração cometida pela Fapricela é, contudo, mais grave do que a que foi cometida pela Fundia. Com efeito, resulta da decisão impugnada que a Fundia participou apenas na «coordenação» das vendas a um único cliente, a Addtek (considerandos 935 e 953 da decisão impugnada), ao passo que resulta da decisão impugnada que a Fapricela participou numa «coordenação» que incidiu sobre vários clientes.

432    Quanto ao valor das vendas a tomar em consideração, o Tribunal Geral tem de se reportar ao valor considerado pela Comissão na decisão impugnada, que inclui o cordão, uma vez que ficou provado que a Fapricela também participou no acordo relativo ao cordão, no Clube España (v. n.° 244, supra). Além disso, foi com razão que a Comissão considerou apenas as vendas que a Fapricela realizou em Espanha e Portugal (considerando 949 da decisão impugnada).

433    O Tribunal Geral não tem de tomar em consideração nenhuma circunstância atenuante ou agravante, nem nenhuma outra circunstância específica. O facto de a recorrente só ter participado no Clube España já se reflete, com efeito, na mera tomada em consideração das suas vendas em Espanha e Portugal.

434    Atendendo a tudo quanto precede, há que constatar que o montante da coima em que a Fapricela incorre não pode ser inferior a 17 000 000 euros.

435    Contudo, em aplicação do nível máximo de 10% previsto no artigo 23.°, n.° 2, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1/2003, o montante da coima aplicada à Fapricela não pode exceder 8 874 000 euros.

436    Nestas circunstâncias, o Tribunal Geral decide que há que fixar o montante da coima que deve ser aplicada à Fapricela em 8 874 000 euros, o qual constitui um montante adequado à luz da natureza, da duração e da gravidade da infração cometida pela recorrente.

 Quanto às despesas

437    Nos termos do artigo 134.°, n.° 3, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, se as partes obtiverem vencimento parcial, cada uma das partes suporta as suas próprias despesas. No entanto, se tal se afigurar justificado tendo em conta as circunstâncias do caso, o Tribunal pode decidir que, além das suas próprias despesas, uma parte suporte uma fração das despesas da outra parte.

438    Atendendo às circunstâncias do presente caso, há que decidir que cada parte suportará as suas próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Sexta Secção)

decide:

1)      A Decisão C (2010) 4387 final da Comissão, de 30 de junho de 2010, relativa a um processo nos termos do artigo 101.° TFUE e do artigo 53.° do Acordo EEE (Processo COMP/38344 — Aço para pré‑esforço), alterada pela Decisão C (2010) 6676 final da Comissão, de 30 de setembro de 2010, e pela Decisão C (2011) 2269 final da Comissão, de 4 de abril de 2011, é anulada na parte em que constata que a Fapricela — Indústria de Trefilaria, SA, violou as disposições do artigo 101.°, n.° 1, TFUE, por ter participado não só numa infração às referidas disposições no mercado ibérico mas também num cartel que abrangeu o mercado interno e, posteriormente, o Espaço Económico Europeu (EEE), e em que lhe aplicou uma coima de 8 874 000 euros.

2)      O montante da coima aplicada à Fapricela — Indústria de Trefilaria é fixado em 8 874 000 euros.

3)      É negado provimento ao recurso quanto ao restante.

4)      Cada parte suportará as suas próprias despesas.

Frimodt Nielsen

Dehousse

Collins

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 15 de julho de 2015.

Assinaturas


* Língua do processo: português.


1 Apenas são reproduzidos os números do presente acórdão cuja publicação o Tribunal considera útil.