Language of document : ECLI:EU:T:2019:140

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Nona Secção)

7 de março de 2019 (*)

«Função pública — Assistente parlamentar acreditado — Rescisão do contrato — Quebra da relação de confiança — Atividades externas — Erro manifesto de apreciação — Pedido de indemnização»

No processo T‑59/17,

L, representado por I. Coutant Peyre, advogado,

recorrente,

contra

Parlamento Europeu, representado por Í. Ní Riagáin Düro e M. Windisch, na qualidade de agentes,

recorrido,

que tem por objeto, por um lado, um pedido baseado no artigo 270.o TFUE e destinado à anulação da decisão do Parlamento de 24 de junho de 2016, relativa à rescisão do contrato de assistente parlamentar acreditado do recorrente e, por outro, um pedido de indemnização dos danos morais alegadamente sofridos pelo recorrente,

O TRIBUNAL GERAL (Nona Secção),

composto por: S. Gervasoni, presidente, L. Madise (relator) e R. da Silva Passos, juízes,

secretário: E. Coulon,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

1        Em 22 de maio de 2014, o recorrente, L, foi recrutado pelo Parlamento Europeu a pedido de um deputado do Parlamento (a seguir «deputado europeu»). Foi contratado como assistente parlamentar acreditado (a seguir «APA») desse depurado, ao abrigo de um contrato que abrangia os anos de 2014 a 2019.

2        Em 25 de fevereiro de 2016, o deputado europeu enviou à entidade habilitada a celebrar contratos de admissão do Parlamento (a seguir «EHCC») um pedido escrito de rescisão do contrato de APA do recorrente.

3        Em 21 de abril de 2016, a convite da EHCC, o recorrente participou numa reunião durante a qual a EHCC o informou do motivo invocado pelo deputado europeu no pedido de rescisão do seu contrato de APA.

4        Em 9 de maio de 2016, o recorrente enviou uma nota à EHCC (a seguir «nota de 9 de maio de 2016») com as suas observações sobre o pedido de rescisão do seu contrato de APA.

5        Em 25 de maio de 2016 segundo a petição, ou em 26 de maio de 2016 segundo a contestação, o recorrente foi convocado para uma segunda reunião com a EHCC relativa à nota de 9 de maio de 2016.

6        Em 31 de maio de 2016, teve lugar o processo de conciliação previsto no artigo 139.o, n.o 3‑A, do Regime Aplicável aos outros Agentes da União Europeia (a seguir «ROA»).

7        Por carta de 15 de junho de 2016, o conciliador do Parlamento declarou verificada a impossibilidade de as partes prosseguirem a sua colaboração e encerrou o processo de conciliação.

8        Em 24 de junho de 2016, o Parlamento notificou ao recorrente a decisão de rescisão do seu contrato de APA (a seguir «decisão de rescisão»). Nessa decisão, a EHCC indicou que, «[n]a medida em que a confiança [era] a base da relação entre o [deputado europeu] e o [seu] [APA], [tinha] decidido rescindir o [seu] contrato em conformidade com o artigo 139.o, n.o 1, alínea d), do [ROA] dado que essa confiança [tinha sido] posta em causa devido ao incumprimento, por este, das regras que regulam o exercício de atividades externas».

9        Em 19 de setembro de 2016, o recorrente apresentou uma reclamação ao abrigo do artigo 90.o, n.o 2, do Estatuto dos Funcionários da União Europeia (a seguir «Estatuto»), aplicável aos outros agentes por força da remissão para o título VII do Estatuto constante do artigo 117.o do ROA, destinada a contestar a decisão de rescisão.

10      Por carta de 24 de janeiro de 2017, o Secretário‑Geral do Parlamento indeferiu a reclamação. Observou que resultava do processo do recorrente que, durante o seu contrato de APA, este tinha exercido uma atividade externa que consistia no exercício de uma profissão jurídica sem ter apresentado um pedido prévio de autorização, em violação do artigo 12.o‑B do Estatuto, segundo o qual «[…] o funcionário que deseje exercer uma atividade externa, remunerada ou não, ou exercer funções estranhas à União, deve obter previamente a autorização da entidade competente para proceder a nomeações […]». Recordou, a este respeito, que essa obrigação era certamente do conhecimento do recorrente, atendendo tanto à sua formação de jurista como ao seu emprego anterior no Parlamento entre 2005 e 2007, em que o recorrente tinha enfrentado o mesmo problema. Sublinhou igualmente que, na sua correspondência com os serviços do Parlamento, o recorrente tinha repetidamente reconhecido que, durante o referido contrato tinha, na realidade, exercido outras atividades sem ligação com as suas obrigações contratuais.

 Tramitação processual e pedidos das partes

11      Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 24 de janeiro de 2017, o recorrente solicitou o benefício do apoio judiciário. Esse pedido foi registado com a referência T‑59/17 AJ.

12      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 14 de abril de 2017, o recorrente interpôs o presente recurso.

13      Por despacho do presidente do Tribunal Geral de 5 de setembro de 2017, o pedido de apoio judiciário foi indeferido.

14      Chamado a conhecer de um pedido apresentado pelo recorrente com fundamento no artigo 66.o do Regulamento de Processo, o Tribunal Geral omitiu o nome dessa parte da versão pública do presente acórdão.

15      Não tendo as partes pedido a realização de uma audiência de alegações ao abrigo do artigo 106.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, o Tribunal Geral (Nona Secção), considerando‑se suficientemente esclarecido pelas peças dos autos do processo, decidiu, em aplicação do artigo 106.o, n.o 3, do Regulamento de Processo, decidir sem fase oral do processo.

16      O recorrente pede que o Tribunal Geral se digne:

–        anular a decisão de rescisão;

–        condenar o Parlamento no pagamento de uma indemnização por danos morais no montante de 100 000 euros;

–        condenar o Parlamento nas despesas.

17      O Parlamento pede que o Tribunal Geral se digne:

–        julgar o recurso parcialmente inadmissível e, em todo o caso, improcedente;

–        condenar o recorrente na totalidade das despesas.

 Questão de direito

 Quanto ao pedido de anulação

18      Na petição, o recorrente invoca oito fundamentos, relativos, em primeiro lugar, à violação do artigo 22.o‑B, n.o 1, do Estatuto, sobre a proteção dos denunciantes, em segundo lugar, à falta de fundamentação, em terceiro lugar, a um erro manifesto de apreciação, em quarto lugar, à violação do princípio da proporcionalidade, em quinto lugar, à violação do dever de diligência, em sexto lugar, à falta resposta ao pedido de assistência do recorrente e à violação dos direitos de defesa e do «direito de recorrer à conciliação», em sétimo lugar, à falta de acesso aos documentos e, em oitavo lugar, a um desvio de poder.

19      Na réplica, o recorrente invoca um nono fundamento, relativo à ilicitude do despedimento.

20      Há que examinar, desde logo, o terceiro fundamento, relativo a um erro manifesto de apreciação.

 Quanto ao terceiro fundamento, relativo a um erro manifesto de apreciação

21      O recorrente afirma, em substância, que o Parlamento cometeu um erro manifesto de apreciação ao considerar que a relação de confiança foi posta em causa pela falta de declaração, na aceção do artigo 12.o‑B, n.o 1, do Estatuto, de alegadas «atividades externas» por ele exercidas.

22      O recorrente salienta, a este respeito, que o deputado europeu tinha conhecimento das atividades em causa, as quais eram exercidas a seu pedido, por sua conta e apresentavam um caráter fraudulento. Por conseguinte, em sua opinião, é manifestamente sem razão que o Parlamento considerou que o exercício dessas atividades era suscetível de conduzir a uma perda de confiança do referido deputado a seu respeito.

23      O recorrente acrescenta que o Parlamento procede a uma leitura parcial da nota de 9 de maio de 2016. Em seu entender, o Parlamento considera que ele «reconheceu» a existência de atividades externas ao ocultar o contexto dessas «atividades», a saber, o facto de as ditas atividades serem objeto de uma denúncia ao Ministério Público [confidencial (1)] e ao Organismo Europeu de Luta Antifraude (OLAF) e que tinham sido empreendidas por ordem do deputado europeu, que tinha portanto conhecimento das mesmas. Alega que tais atividades, tendo em conta o contexto em que se verificaram, não são suscetíveis de caracterizar a perda de confiança mencionada pelo referido deputado na decisão de rescisão. Assim, ao considerar o exercício das referidas atividades um motivo da perda de confiança, o Parlamento cometeu um erro manifesto de apreciação.

24      O Parlamento responde que um APA tem a obrigação estatutária de seguir um determinado procedimento administrativo, em concreto solicitar a autorização da EHCC, para poder exercer uma atividade externa. Ora, no caso em apreço, a decisão de rescisão foi motivada pela quebra irreparável da relação de confiança entre o recorrente e o deputado europeu em virtude do incumprimento, pelo recorrente, das obrigações de declaração das atividades externas que lhe incumbem por força do artigo 12.o‑B do Estatuto.

25      O Parlamento salienta, a este respeito, que, no Acórdão de 11 de setembro de 2013, L/Parlamento (T‑317/10 P, EU:T:2013:413, n.os 68 a 70), o Tribunal Geral considerou que a existência de uma relação de confiança não se baseava em elementos objetivos e escapava por natureza à fiscalização jurisdicional, uma vez que o Tribunal Geral não podia substituir a apreciação da EHCC, «mas se limita[va] a fiscalizar se os factos na origem da decisão que foram explicitados pela instituição [eram] materialmente exatos». É o que acontece no caso vertente. A relação de confiança entre o deputado europeu e o recorrente foi posta em causa devido ao facto de o recorrente ter exercido atividades externas em violação do artigo 12.o‑B, n.o 1, do Estatuto. O Parlamento sublinha, antes de mais, que é incontestável que o recorrente não solicitou nem obteve nenhuma autorização para exercer uma atividade externa em conformidade com a referida disposição. Em seguida, durante a sua reunião com a EHCC e o conciliador, o recorrente admitiu, por diversas vezes, ter exercido essas atividades. Por último, o recorrente confirma expressamente a existência de atividades externas na nota de 9 de maio de 2016.

26      A este respeito, o Parlamento observa que, em conformidade com a jurisprudência, para verificar se a Administração cometeu um erro manifesto na apreciação dos factos que seja suscetível de justificar a anulação de uma decisão, os elementos de prova que incumbe ao recorrente apresentar devem ser suficientes para retirar plausibilidade às apreciações feitas pela Administração. Por outras palavras, o fundamento relativo a um erro manifesto de apreciação deve ser julgado improcedente se, apesar dos elementos alegados pelo recorrente, a apreciação posta em causa puder ser admitida como verdadeira ou válida (v., neste sentido, Acórdão de 13 de junho de 2012, Mocová/Comissão, F‑41/11, EU:F:2012:82, n.o 44 e jurisprudência referida). Ora, o recorrente não apresentou qualquer elemento de prova que permita retirar plausibilidade às conclusões do Parlamento.

27      Nos termos do artigo 139.o, n.o 1, alínea d), do ROA, «[p]ara além da morte do assistente parlamentar acreditado, o vínculo laboral cessa […] [t]endo em conta que a confiança é a base da relação profissional entre o deputado e o seu assistente parlamentar acreditado, no termo do prazo de pré‑aviso fixado no contrato […]».

28      No caso em apreço, a EHCC indicou, na decisão de rescisão, que a rescisão do contrato de APA do recorrente era motivada pela quebra da relação de confiança entre o recorrente e o deputado europeu, devido ao incumprimento das regras que regulam o exercício de atividades externas.

29      A este respeito, por um lado, embora não incumba à EHCC substituir a apreciação do parlamentar em causa quanto à realidade da quebra da relação de confiança, a EHCC deve, no entanto, assegurar‑se que o motivo invocado assenta em factos suscetíveis de o justificar de forma plausível (v., neste sentido, Acórdão de 10 de janeiro de 2019, RY/Comissão, T‑160/17, EU:T:2019:1, n.o 38 e jurisprudência referida).

30      Por outro lado, se uma instituição que decide rescindir um contrato de APA se refere, em particular, a uma perda de confiança na origem da decisão de rescisão, o juiz deve verificar se esse motivo é plausível. Ao fazê‑lo, o juiz não substitui a apreciação da autoridade competente, segundo a qual ficou provada a perda de confiança, limitando‑se a verificar se o motivo na origem da decisão explicitado pela instituição não está ferido de qualquer erro manifesto de apreciação (v., neste sentido e por analogia, Acórdão de 11 de setembro de 2013, L/Parlamento, T‑317/10 P, EU:T:2013:413, n.o 70).

31      No que respeita, no caso em apreço, ao motivo relativo à perda de confiança que está na origem da decisão de rescisão, o Parlamento baseia‑se em factos que consistem no exercício de atividades externas não declaradas. Por conseguinte, há que verificar se o Parlamento cometeu um erro manifesto de apreciação ao considerar que esses factos eram suscetíveis de causar a perda de confiança invocada pelo deputado europeu (v., neste sentido e por analogia, Acórdão de 11 de setembro de 2013, L/Parlamento, T‑317/10 P, EU:T:2013:413, n.o 76).

32      A este título, importa desde logo salientar que o Parlamento não contesta, enquanto tal, o exercício das atividades descritas pelo recorrente na nota de 9 de maio de 2016 que consistiam no exercício de uma profissão jurídica em paralelo com as suas funções de APA, a saber:

–        em primeiro lugar, a apresentação de pedidos de asilo político às autoridades russas, francesas, suíças e de Andorra, para permitir ao deputado europeu evitar uma pena de quatro anos de prisão aplicada em [confidencial], destacando‑se um recurso de uma decisão de recusa de asilo político relativa a este último para o qual o recorrente afirma, nomeadamente, ter sido mandatado pelo referido deputado;

–        em segundo lugar, a intermediação e a representação como advogado de nacionais [confidencial] na reforma ou a receber [confidencial] na reforma ou a receber o salário mínimo, no âmbito de litígios instaurados perante os órgãos jurisdicionais [confidencial], a fim de apresentar este deputado como um «defensor dos direitos humanos» e tornar assim mais difícil a sua prisão;

–        em terceiro lugar, a representação do mesmo deputado perante o Provedor de Justiça Europeu, o Comité dos Direitos do Homem das Nações Unidas e o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, nos processos respeitantes a esse deputado, relativos, em primeiro lugar, nomeadamente, à contestação do pedido de levantamento de imunidade parlamentar apresentado pelas autoridades [confidencial], na sequência da pena de prisão aplicada ao deputado em questão em [confidencial] e, em segundo lugar, à contestação de uma prisão domiciliária decretada pelas autoridades judiciais [confidencial] na sequência de um processo penal por corrupção instaurado contra o deputado em questão.

33      Pelo contrário, no quadro da sua resposta ao fundamento relativo a uma fundamentação insuficiente, o Parlamento apoia‑se na nota de 9 de maio de 2016 para afirmar que o recorrente conhecia a natureza das atividades externas na origem da quebra da relação de confiança. A este respeito, não resulta dos autos que a quebra da referida relação visada na decisão de rescisão tenha sido ocasionada por atividades diferentes das invocadas pelo Parlamento para justificar o caráter suficiente da fundamentação.

34      Neste contexto, importa determinar se, em conformidade com a jurisprudência (v. n.os 29 e 31 supra), o exercício pelo recorrente das atividades externas em causa podia provocar a perda da relação de confiança invocada pelo deputado europeu e acolhida pela EHCC na decisão de rescisão.

35      A este respeito, em primeiro lugar, resulta dos elementos dos autos que o deputado europeu não só tinha conhecimento das atividades externas em causa, como, além disso, estas ocorreram por sua iniciativa direta.

36      No que respeita, desde logo, aos litígios instaurados perante os órgãos jurisdicionais [confidencial], resulta da correspondência citada na nota de 9 de maio de 2016 apresentada pelo recorrente (anexos A.3.3 e A.3.4 da referida nota), que o deputado europeu supervisionava pessoalmente a organização da intermediação e da representação dos nacionais [confidencial] em causa no âmbito desses litígios e, portanto, tinha necessariamente «conhecimento» dos mesmos.

37      Esta apreciação é corroborada pela declaração sob compromisso de honra de uma pessoa representada no âmbito dos litígios em causa (anexo A.3.5 da nota de 9 de maio de 2016), nos termos da qual «[o deputado] [explicava], sem qualquer dúvida, que o contencioso seria gratuito e que o [APA] seria pago por esta missão pela [sua] dotação parlamentar […]» e segundo a qual, nos termos do acordo «verbal» celebrado com o referido deputado «em vez de pagar o contencioso proposto por [esse deputado] [a pessoa representada] dev[ia] apoiar publicamente o partido […] nas eleições legislativas, participar em programas de televisão, bem como noutras atividades nos meios de comunicação».

38      Em seguida, no que respeita à representação do deputado europeu perante órgãos jurisdicionais ou organismos europeus ou internacionais, o recorrente apresenta procurações supostamente assinadas pelo referido deputado (anexos A.3.6 e A.3.7 da nota de 9 de maio de 2016), o que o Parlamento não contesta.

39      Por último, no que respeita à apresentação de pedidos de asilo por conta do deputado europeu, o recorrente refere que, em 24 de fevereiro de 2013, o referido deputado proferiu uma declaração pública na televisão [confidencial] indicando que, embora o tribunal de recurso tivesse confirmado a pena de prisão que lhe tinha sido aplicada, iria solicitar asilo político nos Estados‑Membros da União Europeia. Junta, a esse respeito, um artigo de jornal a corroborar esta declaração (anexo A.3.19 da nota de 9 de maio de 2016). Por outro lado, procede a uma descrição das diligências efetuadas para obter o asilo político para este deputado, em Andorra, na Suíça, na Rússia e em França e junta bilhetes de avião que correspondem a esses destinos (anexos A.3.15 a A.3.18 da referida nota). Nenhum desses documentos e declarações é contestado pelo Parlamento.

40      Resulta do que precede que o deputado europeu não podia ignorar que o recorrente exercia uma profissão jurídica em paralelo com as suas funções de APA, uma vez que, como resulta dos elementos dos autos, o exercício dessa função tinha origem em instruções suas.

41      Em segundo lugar, o artigo 6.o, n.o 2, das Medidas de Execução do Título VII do ROA, adotadas por decisão da Mesa do Parlamento de 9 de março de 2009 e alteradas pela última vez pela decisão da Mesa do Parlamento de 14 de abril de 2014, prevê que o deputado de referência será «ouvido», em caso de declaração de uma atividade externa. Ora, nada indica que o deputado europeu tenha sido ouvido pela EHCC sobre as «atividades externas» em causa. Nestas condições, há que considerar que o mesmo deputado não podia certamente ignorar que essas atividades que consistiam no exercício de uma profissão jurídica no âmbito da defesa dos seus próprios interesses não tinham sido declaradas pelo recorrente à EHCC, nos termos do artigo 12.o‑B, n.o 1, do Estatuto.

42      Por conseguinte, é manifestamente sem razão que o Parlamento considerou que a não declaração pelo recorrente das atividades externas em causa podia levar a uma perda de confiança do deputado europeu na aceção do artigo 139.o, n.o 1, alínea d), do ROA, quando o referido deputado não podia alegar ignorar que essas atividades não tinham sido objeto de qualquer pedido de autorização ao Parlamento, nos termos do artigo 12.o‑B, n.o 1, do Estatuto.

43      De resto, resulta da nota de 9 de maio de 2016 e da declaração citada no n.o 37 supra que o deputado europeu não podia razoavelmente esperar que as atividades externas em causa, atendendo à sua natureza, fossem levadas ao conhecimento do Parlamento, através de um pedido formal de autorização de atividades externas ao abrigo do artigo 12.o‑B, n.o 1, do Estatuto.

44      Em conclusão, contrariamente ao que afirma o Parlamento (v. n.o 26 supra), resulta dos documentos dos autos que o motivo apresentado pelo deputado europeu para justificar a decisão de rescisão, a saber a perda de confiança, não parece plausível. Por conseguinte, ao dar seguimento ao pedido de rescisão do contrato de APA do recorrente formulado pelo referido deputado com esse motivo, a EHCC cometeu um erro manifesto de apreciação.

45      Há, portanto, que declarar fundado o terceiro fundamento e julgar procedente o pedido de anulação da decisão de rescisão, sem que seja necessário examinar os outros fundamentos, designadamente, o nono fundamento cuja admissibilidade é contestada.

 Quanto ao pedido de indemnização

46      Na petição, o recorrente pede que o Parlamento seja condenado a pagar‑lhe o montante de 100 000 euros a título de reparação dos danos morais que considera ter sofrido.

47      Na contestação, o Parlamento alega a inadmissibilidade do pedido de indemnização, na medida em que este não respeita os requisitos referidos no artigo 76.o, alínea d), do Regulamento de Processo. Em seu entender, embora a petição contenha um pedido de indemnização, nenhum argumento foi apresentado em apoio desse pedido.

48      Na réplica, o recorrente sublinha, nomeadamente, ter sido objeto de atos de assédio por parte do deputado europeu. A esse respeito, junta uma ata do seu depoimento perante a polícia belga em que relata o sequestro, nas instalações do Parlamento (anexo A.3.14 da nota de 9 de maio de 2016), de que afirma ter sido vítima.

49      Na tréplica, o Parlamento reitera que, em conformidade com a jurisprudência, uma petição que vise a reparação dos danos causados por uma instituição da União deve conter os elementos que permitam identificar o comportamento que o recorrente imputa à instituição, as razões pelas quais considera que existe um nexo de causalidade entre o comportamento e os danos que alega ter sofrido, bem como a natureza e a extensão desses danos. Ora, na petição, o recorrente não indicou as razões pelas quais considera que existe um nexo de causalidade entre o comportamento invocado e os danos que alega ter sofrido. A petição é totalmente omissa quanto a natureza e extensão desses danos.

 Quanto à admissibilidade do pedido de indemnização dos danos morais

50      Há que observar, por um lado, que resulta da petição de forma suficientemente clara que, segundo o recorrente, a decisão de rescisão lhe causou danos morais e, por outro, que o pedido de indemnização desses danos foi quantificado.

51      Nestas condições, o Parlamento não pode arguir a inadmissibilidade do pedido de indemnização com fundamento no facto de o recorrente não ter indicado com precisão a natureza e a extensão dos danos que considera ter sofrido e as razões pelas quais considera que existe um nexo de causalidade entre o comportamento do Parlamento e os referidos danos.

52      Em contrapartida, há que observar que os factos de assédio invocados na réplica, alegadamente imputáveis ao deputado europeu, são destacáveis do comportamento ilegal censurado ao Parlamento nos pedidos de anulação.

53      Ora, se os pedidos de indemnização são admissíveis, mesmo na falta de pedido prévio dirigido nesse sentido à Administração, quando exista um nexo direto entre os referidos pedidos e o recurso de anulação, o mesmo não sucede quando o prejuízo alegado resulta de faltas ou de omissões cometidas pela Administração destacáveis do comportamento referido no recurso de anulação. Neste último caso, quando o dano alegado não resulta do ato cuja anulação é pedida, mas de outras faltas ou omissões pretensamente cometidas, o procedimento pré‑contencioso deve imperativamente iniciar‑se por um pedido de indemnização desse dano dirigido à Administração (v., neste sentido, Acórdão de 22 de setembro de 2015, Gioria/Comissão, F‑82/14, EU:F:2015:108, n.o 74 e jurisprudência referida).

54      No caso em apreço, é forçoso constatar que nenhum pedido de indemnização foi apresentado para os factos de assédio referidos pelo recorrente no procedimento pré‑contencioso, de modo que, mesmo admitindo que o recorrente também solicita reparação para os referidos factos de assédio, este pedido deve ser julgado inadmissível por não respeitar as regras que enquadram o procedimento pré‑contencioso.

55      Resulta do que precede que o pedido de indemnização só é admissível na parte em que diga respeito aos danos associados à decisão de rescisão.

 Quanto à procedência do pedido do pedido de indemnização dos danos morais associados à decisão de rescisão

56      Segundo jurisprudência constante, a responsabilidade da Administração pressupõe a reunião de um conjunto de requisitos no que diz respeito à ilegalidade do comportamento censurado às instituições, à realidade do dano e à existência de um nexo de causalidade entre o comportamento e o dano invocado (v. Acórdão de 1 de junho de 1994, Comissão/Brazzelli Lualdi e o., C‑136/92 P, EU:C:1994:211, n.o 42 e jurisprudência referida).

57      No caso em apreço, em primeiro lugar, foi constatada a ilegalidade do comportamento do Parlamento. Em seguida, o motivo invocado para a decisão de rescisão assenta num fundamento artificial que pode ter causado um sentimento de injustiça ao recorrente e, por esse facto, um dano moral. Por último, existe um nexo entre o comportamento do Parlamento e o dano invocado, que resulta da referida decisão.

58      No entanto, no que respeita aos danos morais, importa recordar que segundo jurisprudência assente do Tribunal de Justiça, a anulação de um ato da Administração impugnado por um funcionário constitui, por si só, uma reparação adequada e, em princípio, suficiente dos danos morais que este possa ter sofrido e o pedido de indemnização fica sem objeto (v., neste sentido, Acórdãos de 7 de fevereiro de 1990, Culin/Comissão, C‑343/87, EU:C:1990:49, n.o 26, e de 21 de janeiro de 2004, Robinson/Parlamento, T‑328/01, EU:T:2004:13, n.o 79).

59      É certo que o juiz da União admitiu algumas exceções a esta regra e, nomeadamente, as seguintes exceções. Em primeiro lugar, a anulação do ato ilegal da Administração pode não constituir uma plena indemnização do dano moral se esse ato inclui uma apreciação das capacidades ou do comportamento do interessado suscetível de o ferir. Em segundo lugar, a anulação do ato impugnado não pode constituir uma plena indemnização do dano moral sofrido quando a ilegalidade cometida tem particular gravidade. Em terceiro lugar, foi declarado que a anulação de um ato ilegal, quando desprovida de todo o efeito útil, não pode constituir, em si mesma, uma reparação adequada e suficiente dos danos morais causados pelo ato anulado (v. Acórdãos de 9 de março de 2010, N/Parlamento, F‑26/09, EU:F:2010:17, n.os 103, 105 e 107 e jurisprudência referida, e de 5 de julho de 2011, V/Parlamento, F‑46/09, EU:F:2011:101, n.os 169, 171 e 173 e jurisprudência aí referida).

60      Todavia, no caso em apreço, não se afigura que o recorrente se encontre numa das situações referidas no n.o 59 supra. Com efeito, em primeiro lugar, a decisão de rescisão baseada na não comunicação de atividades externas não inclui uma apreciação das capacidades ou do comportamento do recorrente suscetível de o ferir, em segundo lugar, a ilegalidade cometida pelo Parlamento não reveste particular gravidade na aceção da jurisprudência e, em terceiro lugar, a anulação da decisão de rescisão não está de modo algum privada de todo o efeito útil.

61      Resulta do tudo o que precede que, no caso em apreço, há que julgar improcedente o pedido de indemnização.

 Quanto às despesas

62      Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

63      Tendo a Comissão sido vencida no essencial, há que condená‑la nas despesas, em conformidade com o pedido do recorrente.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Nona Secção)

decide:

1)      A decisão do Parlamento de 24 de junho de 2016 relativa à rescisão do contrato de assistente parlamentar acreditado de L é anulada.

2)      É negado provimento ao recurso quanto ao restante.

3)      O Parlamento Europeu é condenado nas despesas.

Gervasoni

Madise

Da Silva Passos

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 7 de março de 2019.

Assinaturas


*      Língua do processo: inglês.


1 Dados confidenciais ocultados.