Language of document : ECLI:EU:C:2024:104

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

ANTHONY MICHAEL COLLINS

apresentadas em 1 de fevereiro de 2024 (1)

Processo C53/23

Asociaţia «Forumul Judecătorilor din România»,

Asociaţia «Mişcarea pentru Apărarea Statutului Procurorilor»

contra

Parchetul de pe lângă Înalta Curte de Casaţie şi Justiţie — Procurorul General al României

[pedido de decisão prejudicial apresentado pela Curtea de Apel Piteşti (Tribunal de Recurso de Piteşti, Roménia)]

«Reenvio prejudicial — Estado de direito — Independência dos juízes — Artigo 2.o TUE — Artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE — Artigos 12.o e 47.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia — Despacho que designa procuradores para investigarem alegações penais e de corrupção e instaurarem processos contra juízes e procuradores — Recurso interposto por associações de juízes e procuradores com vista à anulação parcial do despacho — Legitimidade para agir das associações — Exigência, no direito nacional, de um direito substantivo ou de um interesse legítimo privado»






 Introdução

1.        O presente pedido de decisão prejudicial suscita uma questão nova de direito da União. Podem as associações de juízes e procuradores instituídas com o objetivo de promover um sistema judicial independente, imparcial e eficiente (2) invocar o artigo 2.o e o artigo 19.o, n.o 1, TUE, em conjugação com os artigos 12.o e 47.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta»), para determinar a sua legitimidade para interpor um recurso num órgão jurisdicional nacional, com vista à prossecução desses objetivos?

 Quadro jurídico — Legislação nacional

2.        O artigo 8.o, n.o 1, alínea a), da Legea nr. 554/2004 a contenciosului administrativ (Lei n.o 554/2004 relativa ao Processo Administrativo), de 2 de dezembro de 2004 (3), prevê:

«As pessoas singulares e coletivas de direito privado não podem apresentar pedidos através dos quais invoquem a defesa de um interesse legítimo superior apenas a título subsidiário, quando o dano causado ao interesse legítimo superior decorra logicamente de uma violação de um direito subjetivo ou de um interesse legítimo privado.»

3.        Em março de 2022, entrou em vigor (4) a Legea nr. 49/2022 privind desființarea Secției pentru investigarea infracțiunilor din justiție, precum și pentru modificarea Legii nr. 135/2010 privind Codul de procedură penală (Lei n.o 49/2022, relativa à supressão da secção responsável pelos inquéritos respeitantes a infrações cometidas no sistema judiciário e à alteração da Lei n.o 135/2010 que aprova o Código de Processo Penal). Extinguiu a Secția pentru investigarea infracțiunilor din justiție (Secção com competência para investigar as infrações cometidas no âmbito do sistema judicial; a seguir «SIIJ») no âmbito do Parchetul de pe lângă Înalta Curte de Casaţie şi Justiţie (Ministério Público junto do Tribunal Superior de Cassação e Justiça, Roménia; a seguir «PÎCCJ»). A Lei n.o 49/2022 também transferiu a responsabilidade pela investigação e pelo exercício da ação penal relativamente a todas as infrações, incluindo a corrupção, alegadamente cometidas por juízes e procuradores para a secção de investigação penal do PÎCCJ ou para o Ministério Público junto dos tribunais de recurso, consoante a instância em que esses juízes e procuradores exerçam funções.

4.        Por força do artigo 3.o, n.o 3, da Lei n.o 49/2022, o Parchetul de pe lângă Înalta Curte de Casaţie şi Justiţie — Procurorul General al României (Ministério Público junto do Tribunal Superior de Cassação e Justiça — Procurador‑Geral da Roménia; a seguir «recorrido»), sob proposta da assembleia plenária do Consiliul Superior al Magistraturii (Conselho Superior da Magistratura, Roménia; a seguir «CSM»), designa procuradores para instaurar processos penais relativos a estas infrações. O Ministro da Justiça é membro do CSM. O recorrido adotou o Despacho n.o 108/2022, de 3 de junho de 2022, que designa vários procuradores para instaurar processos penais em conformidade com a Lei n.o 49/2022 (a seguir «despacho impugnado»). Esse despacho foi adotado sob proposta da assembleia plenária do CSM (5).

 Litígio no processo principal e questões prejudiciais

5.        As recorrentes são pessoas coletivas de direito privado, sem fins lucrativos, não governamentais e apolíticas. Segundo os seus estatutos, foram instituídas, nomeadamente, para garantir um sistema de justiça independente, imparcial e eficiente e para elaborar, apoiar, coordenar e executar projetos para melhorar, modernizar e reformar o sistema de justiça.

6.        Por petição apresentada na Curtea de Apel Pitești (Tribunal de Recurso de Pitești, Roménia), em 5 de agosto de 2022, as recorrentes interpuseram um recurso de anulação parcial do despacho impugnado. Contestam a nomeação, designadamente para o PÎCCJ, de vários procuradores responsáveis pela investigação e pelo exercício da ação penal relativamente a todas as infrações penais alegadamente cometidas por juízes e procuradores. As recorrentes defendem que a Lei n.o 49/2022, que constitui a base jurídica para o despacho impugnado, é contrária ao artigo 2.o, ao artigo 4.o, n.o 3, e ao artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE, bem como ao anexo IX do Ato relativo às condições de adesão (6) e à Decisão da Comissão 2006/928/CE (7), conforme interpretada pelo Tribunal de Justiça no seu Acórdão Asociaţia Forumul Judecătorilor din România (8).

7.        As recorrentes alegam que, dada a sua natureza específica, as alegações de corrupção contra juízes e procuradores devem ser investigadas e objeto de ação penal por procuradores especializados, que sejam peritos na luta contra a corrupção e que disponham de recursos adequados para desempenhar corretamente essa função. As recorrentes opõem‑se à participação da assembleia plenária do CSM no processo que conduz à designação das pessoas encarregadas de realizar estas tarefas. Sustentam ainda que o processo não garante que os procuradores sejam designados com base no mérito ou que sejam independentes. Alegam, por último, que deveria ser atribuída à Direcția Națională Anticorupție (Direção Nacional Anticorrupção, Roménia; a seguir «DNA») — especializada na luta contra a corrupção na Roménia e estruturalmente autónoma em relação ao PÎCCJ (9) — a responsabilidade para a investigação e o exercício da ação penal relativamente a tais infrações.

8.        O recorrido contesta a admissibilidade da petição com o fundamento de que as recorrentes não dispõem de legitimidade para pedir a fiscalização jurisdicional do despacho impugnado. Segundo o recorrido, este recurso assenta num interesse legítimo público e não num direito subjetivo ou num interesse legítimo privado, como exige o direito nacional. Uma vez que o despacho impugnado não afeta as recorrentes nem os seus objetivos, mas sim os procuradores designados ao abrigo do mesmo, as recorrentes não têm um direito subjetivo ou um interesse legítimo privado para impugnar a sua validade e, por conseguinte, não podem invocar um interesse legítimo público para o fazer.

9.        As recorrentes sustentam a sua legitimidade com base no facto de a sua atividade principal consistir em defender o estatuto dos juízes e dos procuradores, em promover os direitos e os valores destas profissões e em «defender a independência da justiça num Estado de direito». Os estatutos da Associação Fórum dos Juízes Romenos preveem a instauração de determinados processos judiciais para a prossecução destes objetivos.

10.      O órgão jurisdicional de reenvio salienta que, em conformidade com o artigo 1.o, n.o 1, da Lei n.o 554/2004, qualquer pessoa pode recorrer a um órgão jurisdicional competente para pedir a anulação de um ato administrativo de uma autoridade pública que prejudique os seus interesses legítimos. O artigo 2.o da Lei n.o 554/2004 prevê que um interesse legítimo pode ser de natureza privada ou pública. O artigo 8.o, n.o 1, alínea a), da Lei n.o 554/2004 prevê, no essencial, que as pessoas singulares e coletivas de direito privado só podem invocar um interesse público para instaurar um processo se existir uma ligação direta entre este interesse e um direito subjetivo ou um interesse legítimo privado de que gozem. Observa que, em 2016 e em 2017, os órgãos jurisdicionais romenos reconheceram que as recorrentes tinham legitimidade em ações intentadas com o objetivo de reforçar a independência da justiça e preservar o estatuto das profissões de juízes ou procuradores (10).

11.      No Acórdão n.o 8, a Înalta Curte de Casație şi Justiție (Tribunal Superior de Cassação e Justiça, Roménia) (11) declarou:

«Para efeitos da interpretação e aplicação uniformes do artigo 1.o, do artigo 2.o, n.o 1, alínea a), r), e s) e do artigo 8.o, n.os 1A) e 1B, da Lei n.o 554/2004, conforme alterada e completada posteriormente, decide‑se:

Com vista ao exercício da fiscalização da legalidade dos atos administrativos a pedido das associações, enquanto organismos sociais em causa, o interesse público legítimo só pode ser invocado a titulo subsidiário relativamente ao interesse legítimo privado, decorrendo este último da ligação direta entre, por um lado, o ato administrativo sujeito a fiscalização e, por outro, a finalidade direta e os objetivos da associação, em conformidade com os estatutos.»

12.      No seguimento deste acórdão, a Înalta Curte de Casație şi Justiție (Tribunal Superior de Cassação e Justiça) declarou que as associações de juízes e/ou de procuradores não tinham legitimidade para interpor recursos de anulação das decisões do CSM relativas, nomeadamente, à designação dos juízes, dos juízes auxiliares e do inspetor‑chefe da Inspecţia Judiciară (Inspeção Judicial, Roménia) (12). Chegou a esta conclusão com o fundamento de que, nesses processos, os recorrentes tinham pretendido invocar um interesse legítimo público e não privado.

13.      Com base numa interpretação lata do conceito de interesse legítimo privado definido no Acórdão n.o 8, o órgão jurisdicional de reenvio considera que, uma vez que as recorrentes alegam que o despacho impugnado executa uma legislação que prejudica a luta contra a corrupção e, assim, viola os compromissos assumidos pela Roménia perante a União Europeia, pode existir uma ligação suficiente entre os objetivos das recorrentes, conforme enunciados nos seus estatutos, e o despacho impugnado, de modo a conferir‑lhes o interesse legítimo privado exigido para propor a sua ação. No entanto, com base numa interpretação restritiva do Acórdão n.o 8, as recorrentes apenas teriam um interesse legítimo público e, por conseguinte, não teriam legitimidade para instaurar este processo.

14.      Uma vez que as recorrentes alegam que se verificou uma violação do direito da União, o órgão jurisdicional de reenvio considera que pretendem uma tutela jurisdicional efetiva num domínio abrangido pelo direito da União. Procura determinar se uma interpretação restritiva do conceito de interesse legítimo privado, que limitaria o leque de ações que as associações, como as recorrentes, poderiam propor, viola o artigo 2.o e o artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE, em conjugação com os artigos 12.o e 47.o da Carta. O órgão jurisdicional de reenvio pretende igualmente esclarecer se, na sequência da extinção da SIIJ, o facto de não ter sido reatribuída à DNA a responsabilidade pela investigação e pelo exercício da ação penal relativamente a alegações de corrupção por juízes e procuradores viola o artigo 2.o, o artigo 4.o, n.o 3, e o artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE, bem como o anexo IX do Ato relativo às condições de adesão e a Decisão MCV.

15.      Nestas circunstâncias, a Curtea de Apel Pitești (Tribunal de Recurso de Pitești) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      O artigo 2.o e o artigo 19.o TUE, n.o 1, segundo parágrafo, em conjugação com os artigos 12.o e 47.o [da] [Carta], opõem‑se a que sejam impostos limites à interposição de certos recursos contenciosos pelas associações profissionais dos magistrados — que têm por objeto promover e proteger a independência dos juízes e do Estado de direito e salvaguardar o estatuto da profissão — impondo o requisito de que deve existir um interesse privado legítimo que tenha sido excessivamente limitado, com base numa decisão vinculativa da Înalta Curte de Casație și Justiție (Tribunal Superior de Cassação e Justiça), seguida pela prática nacional em processos semelhantes àquele em que a presente questão é formulada, que exige uma ligação direta entre o ato administrativo objeto de fiscalização da legalidade pelos órgãos jurisdicionais e a finalidade direta e o objeto das associações profissionais dos magistrados, previstos nos respetivos estatutos, nos casos em que as associações pretendem obter a proteção jurisdicional efetiva em matérias regidas pelo direito da União, de acordo com a finalidade e os objetos estatutários gerais?

2)      Tendo em conta a resposta à primeira questão, o artigo 2.o, o artigo 4.o, n.o 3, e o artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE, o anexo IX do [Ato relativo às condições de adesão] e a [Decisão MCV] opõem‑se a uma regulamentação nacional que limita a competência da [DNA], atribuindo competência exclusiva para investigar os crimes de corrupção (em sentido lato) cometidos por juízes e procuradores a determinados procuradores especialmente designados para o efeito (pelo Procurador‑Geral da Roménia, sob proposta da Assembleia Plenária do [CSM]) no âmbito do Ministério Público junto da Înalta Curte de Casație și Justiție [Tribunal Superior de Cassação e Justiça] e, respetivamente, do Ministério Público junto dos tribunais de recurso, sendo estes últimos igualmente competentes para as outras categorias de crimes cometidos por juízes e procuradores?»

 Tramitação processual no Tribunal de Justiça

16.      A Asociaţia «Forumul Judecătorilor din România», o recorrido, a Roménia e a Comissão Europeia apresentaram observações escritas.

17.      Abordarei as exceções deduzidas à competência do Tribunal de Justiça e à admissibilidade das questões prejudiciais antes de aconselhar o Tribunal de Justiça, com base no seu pedido, sobre a forma como deve responder à primeira questão.

 Apreciação

 Quanto à competência do Tribunal de Justiça e à admissibilidade da primeira questão

 Alegações

18.      O recorrido alega que, uma vez que as recorrentes não invocam qualquer direito protegido pelo direito da União, o Tribunal de Justiça não é competente para se pronunciar sobre o pedido de decisão prejudicial. Tanto o processo no órgão jurisdicional de reenvio como as questões que este submete ao Tribunal de Justiça dizem exclusivamente respeito à interpretação do direito nacional e têm caráter hipotético (13). O recurso interposto no órgão jurisdicional de reenvio é um «processo‑piloto» ou um «veículo» destinado a obter um pedido de decisão prejudicial ao abrigo do artigo 267.o TFUE.

19.      A Roménia sustenta que a primeira questão é inadmissível, uma vez que o órgão jurisdicional de reenvio não explicou claramente os factos do processo que lhe foi submetido e, em especial, não indicou como e com que fundamento o direito de acesso das recorrentes a um órgão jurisdicional é limitado. Não é claro se a fonte dessa potencial limitação se encontra na Lei n.o 554/2004, no Acórdão n.o 8 ou numa interpretação restritiva deste acórdão. Uma vez que o próprio órgão jurisdicional de reenvio considera que existe uma ligação direta entre o despacho impugnado e os objetivos dos recorrentes, parece daqui resultar que o recurso das recorrentes é admissível à luz do direito nacional, pelo que uma resposta à primeira questão seria desprovida de qualquer utilidade (14).

 Análise

20.      Resulta do resumo dos argumentos das recorrentes que constam do pedido de decisão prejudicial que, contrariamente ao que alega o recorrido, o recurso interposto no órgão jurisdicional de reenvio se baseia no direito da União. As recorrentes invocam e solicitam uma interpretação do artigo 2.o e do artigo 19.o, n.o 1, TUE, lidos à luz dos artigos 12.o e 47.o da Carta, do anexo IX do Ato relativo às condições de adesão e da Decisão MCV. As razões que levaram o órgão jurisdicional de reenvio a apresentar o seu pedido de decisão prejudicial e as questões que submeteu ao Tribunal de Justiça refletem a pertinência do direito da União para a resolução do litígio que lhe foi submetido. Por outro lado, não existe nenhum elemento nos autos de que o Tribunal de Justiça dispõe que sugira que o litígio no processo principal seja, de alguma forma, artificial ou hipotético (15).

21.      A alegação do recorrido segundo a qual as recorrentes não invocam qualquer direito protegido pelo direito da União prende‑se com o mérito da primeira questão do órgão jurisdicional de reenvio relativa à legitimidade. Pela sua natureza, esta exceção não é passível de justificar que se conclua pela inadmissibilidade da primeira questão (16). Contrariamente à alegação da Roménia, considero que o órgão jurisdicional de reenvio descreveu pormenorizadamente os factos do litígio que lhe foi submetido e que o levaram a apresentar um pedido de decisão prejudicial, cumprindo assim plenamente os requisitos do artigo 94.o, alínea a), do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça da União Europeia.

22.      Quanto à afirmação da Roménia segundo a qual a resposta à primeira questão é desprovida de utilidade, é verdade que o órgão jurisdicional de reenvio considera que as recorrentes têm legitimidade no presente processo e que outros órgãos jurisdicionais romenos reconheceram igualmente a sua legitimidade em processos instaurados com o objetivo de reforçar a independência dos juízes (17). O órgão jurisdicional de reenvio sublinhou, contudo, que existem igualmente casos em que o Acórdão n.o 8 foi interpretado de forma tão restritiva que privou as recorrentes de legitimidade para apresentar tais pedidos (18). Basta observar que o recorrido invocou o Acórdão n.o 8 perante o órgão jurisdicional de reenvio para sustentar o seu argumento de que as recorrentes não têm legitimidade.

23.      Por conseguinte, proponho que o Tribunal de Justiça julgue improcedentes as várias exceções deduzidas à sua competência e à admissibilidade da primeira questão.

 Quanto ao mérito

24.      A primeira questão diz respeito à relação entre o direito a uma tutela jurisdicional efetiva nos órgãos jurisdicionais nacionais ao abrigo do direito da União e as disposições de direito nacional relativas à legitimidade. O órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 2.o e o artigo 19.o, n.o 1, TUE, lidos à luz dos artigos 12.o e 47.o da Carta, se opõem a disposições de direito nacional relativas à legitimidade que exigem que as associações de juízes demonstrem que têm um interesse legítimo privado (19) em recursos de anulação de atos que alegam ser incompatíveis com a independência do poder judicial e o Estado de direito (20).

25.      Nem o pedido de decisão prejudicial nem as observações das partes esclarecem se, e em caso afirmativo, em que condições as recorrentes têm legitimidade de acordo com o direito interno para instaurar o seu processo de fiscalização jurisdicional nos órgãos jurisdicionais da Roménia. A Asociaţia «Forumul Judecătorilor din România» e a Roménia sustentam que, nos termos do direito romeno, as recorrentes têm legitimidade para instaurar o processo no órgão jurisdicional de reenvio. Em conformidade com o Acórdão n.o 8, as recorrentes têm um interesse privado legítimo no presente recurso contencioso do despacho impugnado, uma vez que existe uma ligação entre este recurso e os objetivos das recorrentes, conforme previstos nos respetivos estatutos. O recorrido alega que a jurisprudência romena impõe a condição adicional de que as associações demonstrem que o ato objeto de fiscalização afeta a sua existência como pessoas coletivas, os seus bens, as suas condições de funcionamento ou a realização dos seus objetivos.

26.      As recorrentes interpuseram vários recursos nos órgãos jurisdicionais romenos com a finalidade de defender o Estado de direito, alguns dos quais foram objeto de pedidos de decisão prejudicial (21). Não é claro por que razão o recorrido contesta a legitimidade das recorrentes ao abrigo do direito nacional no presente processo, quando foi considerado que as recorrentes têm legitimidade para interpor este tipo de recursos nos órgãos jurisdicionais romenos. A Asociaţia Forumul Judecătorilor din România observa ainda que o Tribunal de Justiça não se opôs à admissibilidade do pedido de decisão prejudicial que deu origem ao Acórdão Asociaţia Forumul Judecătorilor din România.

27.      Basta referir que não cabe, em princípio, ao Tribunal de Justiça opor‑se à admissibilidade de um pedido de decisão prejudicial a partir do momento em que este pedido seja considerado conforme com o artigo 94.o do seu Regulamento de Processo. As questões relativas à interpretação do direito da União submetidas por um órgão jurisdicional nacional gozam de uma presunção de pertinência. Incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio definir o quadro regulamentar e factual, incluindo a admissibilidade da ação que lhe foi submetida, nos termos do direito interno (22).

 Quanto à tutela jurisdicional efetiva dos direitos conferidos aos particulares pelo direito da União e a autonomia processual dos EstadosMembros

28.      O respeito pelo Estado de direito é um dos valores comuns consagrados no artigo 2.o TUE. O artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE, que exige que os Estados‑Membros estabeleçam as vias de recurso necessárias para assegurar uma tutela jurisdicional efetiva nos domínios abrangidos pelo direito da União, é uma manifestação concreta desse valor. A tutela jurisdicional efetiva dos direitos conferidos aos particulares pelo direito da União constitui um princípio geral que decorre das tradições constitucionais comuns aos Estados‑Membros, consagrado nos artigos 6.o e 13.o da CEDH e afirmado no artigo 47.o da Carta. Esta última disposição deve, por conseguinte, ser tida em conta na interpretação do artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE (23). Nos termos do artigo 47.o da Carta, toda a pessoa cujos direitos garantidos pelo direito da União Europeia tenham sido violados tem direito a que a sua causa seja julgada de forma equitativa, publicamente e num prazo razoável, por um tribunal independente e imparcial, previamente estabelecido por lei (24).

29.      Compete aos Estados‑Membros estabelecer um sistema de vias de recurso e de processos que assegure uma tutela jurisdicional efetiva nos domínios abrangidos pelo direito da União. Cabe aos Estados‑Membros designar os órgãos jurisdicionais e/ou instituições a que atribuem competência para apreciar a validade das disposições nacionais, prever as vias de recurso e os processos que permitem contestar a validade dessas disposições, e, quando o recurso é procedente, anular as referidas disposições e determinar os efeitos dessa decisão (25).

30.      Embora os Estados‑Membros devam assegurar uma tutela jurisdicional efetiva nos domínios abrangidos pelo direito da União, na falta de regulamentação da União na matéria, o direito da União não exige que os Estados‑Membros adotem um sistema específico de vias de recurso ou de modalidades processuais das ações judiciais destinadas a garantir a salvaguarda dos direitos conferidos aos cidadãos pelo direito da União (26), desde que as vias de recurso e as modalidades disponíveis para este efeito respeitem os princípios da equivalência e da efetividade. As modalidades processuais das ações judiciais destinadas a garantir a salvaguarda dos direitos dos cidadãos por força do direito da União não devem, por conseguinte, ser menos favoráveis do que as que respeitam a ações similares previstas para a proteção dos direitos conferidos pela ordem jurídica interna (princípio da equivalência) e não devem tornar impossível ou excessivamente difícil, na prática, o exercício dos direitos conferidos pela ordem jurídica da União (princípio da efetividade). Estas exigências baseiam‑se igualmente no princípio da cooperação leal consagrado no artigo 4.o, n.o 3, TUE (27).

31.      Sob reserva de verificação pelo órgão jurisdicional de reenvio, uma vez que a Lei n.o 554/2004 e o Acórdão n.o 8 se aplicam igualmente às ações nacionais e às ações baseadas no direito da União nos órgãos jurisdicionais romenos, afigura‑se que apenas o princípio da efetividade deve ser tomado em consideração no caso em apreço. Por força do artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE e do artigo 47.o da Carta, constitui ponto assente que os Estados‑Membros devem assegurar o respeito pelo direito a uma tutela jurisdicional efetiva dos direitos individuais derivados da ordem jurídica da União (28). Esta exigência reflete e concilia os princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade previstos no artigo 5.o TUE, a autonomia processual dos Estados‑Membros (29) e o direito a uma tutela jurisdicional efetiva (30).

 O direito a uma tutela jurisdicional efetiva deve estar ligado a um direito conferido pelo direito da União

32.      No Acórdão Inuit (31), o Tribunal de Justiça sublinhou que nem o TFUE nem o artigo 19.o TUE exigem a criação, perante os órgãos jurisdicionais nacionais, de vias de recurso diferentes das estabelecidas pelo direito nacional para proteger o direito da União. Isso só não sucede quando a sistemática da ordem jurídica nacional não preveja nenhum meio processual que permita, ainda que a título incidental, assegurar o respeito dos direitos conferidos aos particulares pelo direito da União (32). Nestes casos, os órgãos jurisdicionais nacionais devem declarar‑se competentes para decidir do recurso interposto pela pessoa em causa com vista à defesa dos direitos que lhe são conferidos pelo direito da União (33).

33.      No seu Acórdão Internationale Fruchtimport Gesellschaft Weichert/Comissão (34), o Tribunal de Justiça declarou que o «direito a um tribunal» não é absoluto e está sujeito, por exemplo, a regras que estabelecem os prazos em que um recurso deve ser interposto. Estas regras não podem, contudo, restringir o acesso aberto a um sujeito de direito de forma ou a um ponto tais que o direito que procura fazer valer é infringido na sua própria essência. Tais regras devem ter por objetivo um fim legítimo e a relação entre os meios que utilizam e o fim que visam deve ser razoável e proporcionada (35). Quanto à legitimidade perante os órgãos jurisdicionais nacionais, o Tribunal de Justiça declarou que «embora, em princípio, caiba ao direito nacional determinar a qualidade e o interesse de um litigante em agir judicialmente, o direito da União exige, para além do respeito pelos princípios da equivalência e da efetividade, que a legislação nacional não afete o direito a uma proteção jurisdicional efetiva […]» (36).

34.      O direito a uma tutela jurisdicional efetiva por força do artigo 47.o da Carta não existe no vácuo e deve estar ligado a um direito conferido pelo direito da União ou a uma liberdade que este garanta. Qualquer pessoa pode invocar o artigo 47.o da Carta para contestar perante um órgão jurisdicional nacional um ato lesivo adotado por um Estado‑Membro para aplicar o direito da União (37). É neste contexto que os Estados‑Membros dispõem de uma margem de manobra considerável para determinar o que constitui a violação de um direito ou liberdade, os requisitos de admissibilidade dos recursos e os órgãos jurisdicionais para os quais estes devem ser interpostos (38).

35.      No seu recurso interposto no órgão jurisdicional de reenvio, as recorrentes invocam três argumentos para demonstrar a sua legitimidade nos termos do direito da União. Em primeiro lugar, invocam, por analogia, o direito de agir judicialmente que o direito derivado da União confere às associações ambientais ou a outras associações. Em segundo lugar, invocam a jurisprudência do Tribunal de Justiça que o direito nacional deve prever uma via de recurso para proteger o Estado de direito e a independência dos juízes. Em terceiro lugar, as recorrentes afirmam que gozam de um direito de ação com base no artigo 12.o da Carta.

36.      Em certos casos, o direito derivado da União confere especificamente às associações a legitimidade para agir nos órgãos jurisdicionais nacionais para promover os objetivos que essa legislação prossegue. Em matéria de ambiente, o artigo 9.o, n.o 2, da Convenção de Aarhus concede às organizações ambientais o acesso a um processo de revisão de certos atos ou omissões especificados (39). Nestes casos, considera‑se que as organizações ambientais têm um interesse suficiente ou têm direitos suscetíveis de serem violados, de modo a permitir‑lhes propor essas ações. O artigo 9.o, n.o 3, da Convenção de Aarhus prevê a possibilidade de os Estados‑Membros adotarem legislação que confira uma legitimidade mais ampla, ou mesmo ilimitada, para propor certo tipo de recursos no domínio do ambiente: contudo, não impõe qualquer obrigação de adotar tais regras (40).

37.      Por força do artigo 9.o, n.o 2, da Diretiva 2000/78/CE (41), os Estados‑Membros devem tomar as medidas necessárias para que as associações que, de acordo com os critérios estabelecidos na legislação nacional, possuam um interesse legítimo em assegurar o cumprimento do disposto nesta diretiva, possam intervir em processos judiciais e/ou administrativos disponíveis para promover o cumprimento das obrigações impostas pela referida diretiva, em nome ou em apoio da parte demandante, e com a aprovação desta. Esta disposição não obriga os Estados‑Membros a conceder às associações legitimidade para instaurar um processo judicial destinado a impor as obrigações quando não seja identificável uma pessoa lesada. No entanto, os Estados‑Membros podem introduzir ou manter disposições relativas à proteção do princípio da igualdade de tratamento mais favoráveis do que as estabelecidas na Diretiva 2000/78. Por conseguinte, um Estado‑Membro pode conceder às associações o direito de instaurar processos destinados a fazer respeitar o cumprimento das obrigações decorrentes da Diretiva 2000/78 sem que exista uma parte demandante identificável (42).

38.      O direito derivado da União não confere legitimidade às associações de juízes e procuradores em ações que possam intentar nos órgãos jurisdicionais nacionais com o objetivo de defender o Estado de direito no interesse público. O direito da União não exige nem proíbe que os Estados‑Membros introduzam regras em matéria de legitimidade para permitir que essas associações proponham ações de interesse público ou que introduzam uma ação popular no interesse do Estado de direito e/ou da independência dos juízes (43). Na falta de legislação da União (44), estas associações devem, em princípio, invocar as disposições de direito nacional em matéria de legitimidade e qualquer direito que estas lhes possam conferir para intentar tais ações.

39.      As recorrentes consideram que, em conformidade com o Acórdão A.B., têm legitimidade para defender o Estado de direito e a independência dos juízes, interpondo o recurso que submeteram ao órgão jurisdicional de reenvio. No referido acórdão, o Tribunal de Justiça declarou, nomeadamente, que o artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE opõe‑se a alterações do direito nacional que privam os órgãos jurisdicionais nacionais da competência para conhecer de recursos apresentados por candidatos a lugares de juízes não selecionados, quando essas alterações possam dar origem a dúvidas legítimas, no espírito dos particulares, quanto à impermeabilidade dos juízes nomeados (45).

40.      Contrariamente às circunstâncias que deram origem ao Acórdão A.B., o processo pendente no órgão jurisdicional de reenvio diz respeito à nomeação de procuradores encarregados da investigação e do exercício da ação penal contra juízes e não à nomeação de juízes. As garantias de independência e de imparcialidade que o direito da União exige aos juízes opõem‑se a disposições de direito nacional suscetíveis de influenciar direta ou indiretamente as decisões dos juízes, dando assim origem a «uma falta de aparência de independência ou de imparcialidade desses juízes que possa pôr em causa a confiança que a justiça deve inspirar aos particulares numa sociedade democrática e num Estado de direito» (46). As decisões que autorizam a abertura de um processo penal contra os juízes devem, por conseguinte, ser adotadas ou fiscalizadas por uma instância que satisfaça ela própria as garantias inerentes a uma tutela jurisdicional efetiva, incluindo a da independência. A simples perspetiva de que possa ser pedida uma autorização para dar início a um processo penal contra os juízes e obtida numa instância cuja independência não está garantida é suscetível de afetar a sua própria independência (47).

41.      Não consta dos autos de que dispõe o Tribunal de Justiça nenhuma indicação no sentido de que os candidatos não selecionados para o cargo de procurador, nomeadamente na secção de investigação penal do PÎCCJ, não tenham um interesse legítimo privado e, portanto, legitimidade ao abrigo do direito nacional para contestar o despacho impugnado e a Lei n.o 49/2022 em que este despacho se baseia. Talvez revista maior importância o facto de que, embora o Acórdão A.B. confirme que, em certos casos (limitados), os candidatos não selecionados para lugares de juiz cujos interesses tenham sido prejudicados possam ter o direito, ao abrigo do direito da União, de interpor recurso nos órgãos jurisdicionais nacionais para defender o Estado de direito e a independência dos juízes, não concede esse direito às associações de juízes ou de procuradores como as recorrentes.

42.      No que respeita ao artigo 12.o da Carta e à liberdade de associação, o Tribunal de Justiça declarou, no Acórdão Comissão/Hungria (Transparência das associações) (48), que as associações devem poder prosseguir as suas atividades e funcionar sem ingerência estatal injustificada. Não resulta dos autos de que dispõe o Tribunal de Justiça que as recorrentes ou qualquer outra associação estejam sujeitas a regras diferentes ou mais rigorosas em matéria de legitimidade do que outras pessoas singulares ou coletivas. Como indica o n.o 33 das presentes conclusões, o direito a um tribunal não é absoluto. Sem prejuízo da verificação pelo órgão jurisdicional de reenvio, não parece existir qualquer prova de que as regras relativas à legitimidade na Roménia prejudiquem o conteúdo essencial do direito das recorrentes a um tribunal, nem de que o objetivo prosseguido pela legislação nacional seja ilegítimo ou que os meios utilizados para prosseguir esse objetivo sejam desproporcionados. O facto de os estatutos da Asociaţia «Forumul Judecătorilor din România» preverem a instauração de determinados processos judiciais para a prossecução dos seus objetivos não altera esta apreciação. As atividades de uma associação devem, em princípio, ser exercidas em conformidade com a lei, incluindo as regras relativas à legitimidade para agir.

 Conclusão

43.      Tendo em conta as considerações expostas, proponho que o Tribunal de Justiça responda à primeira questão submetida pela Curtea de Apel Pitești (Tribunal de Recurso de Pitești, Roménia) da seguinte forma:

O artigo 2.o e o artigo 19.o, n.o 1, TUE, lidos à luz dos artigos 12.o e 47.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, o anexo IX do Ato relativo às condições de adesão da República da Bulgária e da Roménia e às adaptações dos tratados em que se funda a União Europeia e a Decisão 2006/928/CE da Comissão, de 13 de dezembro de 2006, que estabelece um mecanismo de cooperação e de verificação dos progressos realizados na Roménia relativamente a objetivos de referência específicos nos domínios da reforma judiciária e da luta contra a corrupção e a criminalidade organizada, não se opõem a disposições de direito nacional relativas à legitimidade para agir que exigem que as associações de juízes e procuradores demonstrem um interesse legítimo privado, conforme definido pelo direito nacional, num recurso de anulação de atos alegadamente incompatíveis com a independência dos juízes e o Estado de direito.


1      Língua original: inglês.


2      As associações são a Asociaţia «Forumul Judecătorilor din România» (Associação «Fórum dos Juízes Romenos») e a Asociația «Mișcarea pentru Apărarea Statutului Procurorilor» (Associação «Movimento de Defesa do Estatuto dos Procuradores») (a seguir «recorrentes»).


3      Monitorul Oficial al României, parte I, n.o 1154, de 7 de dezembro de 2004 (a seguir «Lei n.o 554/2004»).


4      Monitorul Oficial al României n.o 244, de 11 de março de 2022 (a seguir «Lei n.o 49/2022»).


5      Hotârărea nr 63/3 mai 2022 (Decisão n.o 63, de 3 de maio de 2022).


6      Ato relativo às condições de adesão da República da Bulgária e da Roménia e às adaptações dos tratados em que se funda a União Europeia (JO 2005, L 157, p. 203; a seguir «Ato relativo às condições de adesão»).


7      Decisão da Comissão 2006/928/CE, de 13 de dezembro de 2006, que estabelece um mecanismo de cooperação e de verificação dos progressos realizados na Roménia relativamente a objetivos de referência específicos nos domínios da reforma judiciária e da luta contra a corrupção e a criminalidade organizada, JO 2006, L 354, p. 56 (a seguir «Decisão MCV»). A Decisão (UE) 2023/1786 da Comissão, de 15 de setembro de 2023, que revoga a Decisão 2006/928/CE, que estabelece um mecanismo de cooperação e de verificação dos progressos realizados na Roménia relativamente a objetivos de referência específicos nos domínios da reforma judiciária e da luta contra a corrupção e a criminalidade organizada (JO 2023, L 229, p. 94), revogou a Decisão MCV com efeitos a partir de 8 de outubro de 2023. A decisão MCV aplicou‑se rationae temporis ao litígio no órgão jurisdicional de reenvio.


8      Acórdão de 18 de maio de 2021, Asociaţia «Forumul Judecătorilor din România» e o. (C‑83/19, C‑127/19, C‑195/19, C‑291/19, C‑355/19 e C‑397/19, EU:C:2021:393; a seguir «Acórdão Asociaţia Forumul Judecătorilor din România»).


9      V. artigo 93.o, n.o 1, da Legea nr. 304/2022 privind organizarea judiciară (Lei n.o 304/2022 relativa à Organização do Sistema Judicial), publicada no Monitorul Oficial al României n.o 1104, de 16 de novembro de 2022.


10      V., por exemplo, Acórdãos cíveis n.o 1475, de 29 de abril de 2016, n.o 2949, de 14 de julho de 2017, e n.o 3192, de 24 de outubro de 2016, da Curtea de Apel București — Secția a VIII‑a contencios administrativ și fiscal (Tribunal de Recurso de Bucareste, Roménia — Oitava secção do contencioso administrativo e fiscal; a seguir «Acórdãos n.o 1475, n.o 2949 e n.o 3192»). Nas suas Conclusões no processo Societatea Civilă Profesională de Avocaţi AB & CD (C‑252/22, EU:C:2023:592, n.o 16), a advogada‑geral Laila Medina examinou o artigo 8.o, n.o 1, alínea a), da Lei n.o 554/2004 no contexto da legitimidade de uma sociedade de advogados para interpor um recurso de anulação de uma decisão de aprovação de um plano de ordenamento e de uma licença de construção de um aterro. Contrariamente ao presente processo, que diz respeito ao Estado de direito e à independência dos juízes, no processo C‑252/22 está principalmente em causa a Convenção sobre o acesso à informação, participação do público no processo de tomada de decisão e acesso à justiça em matéria de ambiente, assinada em Aarhus em 25 de junho de 1998 e aprovada em nome da Comunidade Europeia pela Decisão 2005/370/CE do Conselho, de 17 de fevereiro de 2005 (JO 2005, L 124, p. 1; a seguir «Convenção de Aarhus»).


11      Acórdão n.o 8 d Înalta Curte de Casație şi Justiție (Tribunal Superior de Cassação e Justiça), de 2 de março de 2020, publicado no Monitorul Oficial al României em 2 de julho de 2020 (a seguir «Acórdão n.o 8»). O órgão jurisdicional de reenvio indicou que o Acórdão n.o 8 foi proferido na sequência de um recurso no interesse da lei, ao abrigo do artigo 517.o do Codul de procedură civilă (Código de Processo Civil). Sob reserva de verificação pelo órgão jurisdicional de reenvio, afigura‑se que o Acórdão n.o 8 vincula tanto os órgãos jurisdicionais de grau inferior como a Înalta Curte de Casație şi Justiție (Tribunal Superior de Cassação e Justiça).


12      V., por exemplo, Acórdãos n.o 4524, de 7 de outubro de 2021, e n.o 4462, de 6 de outubro de 2021, da secção administrativa e fiscal do Înalta Curte de Casație şi Justiție (Tribunal Superior de Cassação e Justiça; a seguir «Acórdãos n.o 4524 e n.o 4462»).


13      Acórdão de 11 de março de 1980, Foglia (104/79, EU:C:1980:73, n.o 11).


14      A Roménia refere‑se aos n.os 47 e 51 do pedido de decisão prejudicial, nos quais o órgão jurisdicional de reenvio parece considerar que está preenchida a exigência de uma ligação direta entre o despacho impugnado e os objetivos das recorrentes, conforme enunciados nos seus estatutos.


15      V., por exemplo, Acórdão de 11 de março de 1980, Foglia (104/79, EU:C:1980:73).


16      Acórdão de 20 de abril de 2021, Repubblika (C‑896/19, EU:C:2021:311, n.o 33 e jurisprudência referida).


17      V., por exemplo, Acórdãos n.o 1475, n.o 2949 e n.o 3192.


18      V., por exemplo, Acórdãos n.o 4524 e n.o 4462.


19      Pode também ser invocado um interesse legítimo público se existir uma ligação direta entre este e um direito subjetivo ou um interesse legítimo privado.


20      A primeira questão refere o requisito de um interesse privado legítimo que «tenha sido excessivamente limitado».


21      V., por exemplo, os processos que deram origem ao Acórdão Asociaţia Forumul Judecătorilor din România e ao Acórdão de 7 de setembro de 2023, Asociaţia «Forumul Judecătorilor din România» (C‑216/21, EU:C:2023:628).


22      V., por analogia, Acórdão de 6 de outubro de 2015, Târșia (C‑69/14, EU:C:2015:662, n.os 12 e 13 e jurisprudência referida).


23      Acórdãos de 6 de outubro de 2021, W.Ż. (Secção de Fiscalização Extraordinária e dos Processos de Direito Público do Supremo Tribunal — Nomeação) (C‑487/19, EU:C:2021:798, n.o 102 e jurisprudência referida), e de 29 de março de 2022, Getin Noble Bank (C‑132/20, EU:C:2022:235, n.o 89).


24      Acórdão de 6 de outubro de 2021, W.Ż. (Secção de Fiscalização Extraordinária e dos Processos de Direito Público do Supremo Tribunal — Nomeação) (C‑487/19, EU:C:2021:798, n.o 122). Enquanto o artigo 47.o da Carta contribui para o respeito do direito à tutela jurisdicional efetiva de qualquer litigante que, num determinado caso concreto, beneficie de um direito que lhe é conferido pelo direito da União, o artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE visa assegurar que o sistema de vias de recurso existente em cada Estado‑Membro garanta a tutela jurisdicional efetiva nos domínios abrangidos pelo direito da União, independentemente da situação em que o Estado‑Membro aplique esse direito, na aceção do artigo 51.o, n.o 1, da Carta: Acórdão de 20 de abril de 2021, Repubblika (C‑896/19, EU:C:2021:311, n.os 36, 45 e 52). Tanto o artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE como o artigo 47.o da Carta têm efeito direto e conferem direitos aos particulares que estes podem invocar perante os órgãos jurisdicionais nacionais: Acórdão de 2 de março de 2021, A.B. e o. (Nomeação de juízes para o Supremo Tribunal — Recursos) (C‑824/18, EU:C:2021:153, n.os 145 e 146) (a seguir «Acórdão A.B.»).


25      V., neste sentido, Acórdão de 4 de dezembro de 2018, Minister for Justice and Equality e Commissioner of An Garda Síochána (C‑378/17, EU:C:2018:979, n.o 34).


26      Acórdão de 6 de maio de 2010, Club Hotel Loutraki e o. (C‑145/08 e C‑149/08, EU:C:2010:247, n.o 74 e jurisprudência referida).


27      Salvo disposição em contrário, o direito da União não impõe aos Estados‑Membros um determinado modelo judicial: Acórdão de 19 de novembro de 2019, A. K. e o. (Independência da Secção Disciplinar do Supremo Tribunal) (C‑585/18, C‑624/18 e C‑625/18, EU:C:2019:982, n.o 130).


28      V. Acórdão de 19 de novembro de 2019, A. K. e o. (Independência da Secção Disciplinar do Supremo Tribunal) (C‑585/18, C‑624/18 e C‑625/18, EU:C:2019:982, n.o 115 e jurisprudência referida). V. também Acórdão de 22 de outubro de 1998, ICO. N. GE.’90 e o. (C‑10/97 a C‑22/97, EU:C:1998:498, n.o 14). Apesar de existir uma considerável sobreposição na aplicação prática do princípio da efetividade e do direito à ação consagrado no artigo 47.o da Carta, trata‑se de matérias distintas cujo pleno cumprimento deve ser garantido pelos Estados‑Membros. V. Conclusões do advogado‑geral M. Bobek no processo An tAire Talmhaíochta Bia agus Mara, Éire agus an tArd‑Aighne (C‑64/20, EU:C:2021:14, n.o 42). V. também Acórdãos de 15 de abril de 2008, Impact (C‑268/06, EU:C:2008:223, n.os 46 a 48); de 3 de outubro de 2013, Inuit Tapiriit Kanatami e o./Parlamento e Conselho (C‑583/11 P, EU:C:2013:625, n.os 103 e 104); a seguir «Acórdão Inuit»; e de 13 de dezembro de 2017, El Hassani (C‑403/16, EU:C:2017:960, n.os 26 a 30).


29      Acórdão de 2 de março de 2021, Prokuratuur (Condições de acesso aos dados relativos às comunicações eletrónicas) (C‑746/18, EU:C:2021:152, n.o 42).


30      O Acórdão de 15 de maio de 1986, Johnston (222/84, EU:C:1986:206, n.os 13 a 21) é um dos primeiros exemplos da reivindicação do direito a uma tutela jurisdicional efetiva, não obstante a existência de normas processuais nacionais que impediam essa tutela.


31       N.os103 e 104.


32      Acórdão de 14 de maio de 2020, Országos Idegenrendészeti Főigazgatóság Dél‑alföldi Regionális Igazgatóság (C‑924/19 PPU e C‑925/19 PPU, EU:C:2020:367, n.o 143 e jurisprudência referida). V. também Acórdão de 2 de junho de 2022, Skeyes (C‑353/20, EU:C:2022:423, n.o 54 e jurisprudência referida).


33      O recorrido considera que as regras romenas relativas à legitimidade no presente processo, conforme interpretadas pela jurisprudência nacional, são semelhantes às regras em matéria de legitimidade por força do artigo 263.o TFUE. Na minha opinião, esta comparação não tem qualquer relevância especial para o caso em apreço. As regras em matéria de legitimidade e as exigências, entre outras, de que os atos digam direta e individualmente respeito [às pessoas em causa] previstas no artigo 263.o TFUE são específicas dos recursos de anulação dos atos das instituições da União no Tribunal Geral da União Europeia. As ações intentadas nos órgãos jurisdicionais nacionais em domínios abrangidos pelo direito da União estão, em princípio, sujeitas ao princípio da autonomia processual. Neste contexto, remeto para os processos T‑530/22, T‑531/22, T‑532/22 e T‑533/22 (JO 2022, C 418, pp. 40‑44), pendentes no Tribunal Geral da União Europeia.


34      Despacho de 16 de novembro de 2010, Internationale Fruchtimport Gesellschaft Weichert/Comissão (C‑73/10 P, EU:C:2010:684, n.o 53). V., igualmente, Acórdão de 28 de fevereiro de 2013, Reapreciação Arango Jaramillo e o./BEI (C‑334/12 RX‑II, EU:C:2013:134, n.o 43), e Acórdão TEDH, de 23 de junho de 2016, Baka c. Hungria, Pedido n.o 20261/12, CEDH 2016, § 120.


35      V. Acórdão TEDH, de 28 de outubro de 1998, Pérez de Rada Cavanilles c. Espanha (CE:ECHR:1998:1028JUD002809095, § 44).


36      Acórdão de 19 de março de 2015, E.ON Földgáz Trade (C‑510/13, EU:C:2015:189, n.o 50). V. também Acórdãos de 13 de janeiro de 2005, Streekgewest (C‑174/02, EU:C:2005:10, n.os 18 a 21); de 13 de março de 2007, Unibet (C‑432/05, EU:C:2007:163, n.os 36 e seguintes); e de 6 de maio de 2010, Club Hotel Loutraki e o. (C‑145/08 e C‑149/08, EU:C:2010:247, n.os 74 a 80).


37      Acórdão de 11 de novembro de 2021, Gavanozov II (C‑852/19, EU:C:2021:902, n.os 45 e 46 e jurisprudência referida).


38      V., por analogia, Acórdãos de 12 de maio de 2011, Bund für Umwelt und Naturschutz Deutschland, Landesverband Nordrhein‑Westfalen (C‑115/09, EU:C:2011:289, n.o 55), e de 23 de abril de 2020, Associazione Avvocatura per i diritti LGBTI (C‑507/18, EU:C:2020:289, n.os 60 a 65).


39      Desde que cumpram os requisitos estabelecidos no artigo 2.o, n.o 5, da Convenção de Aarhus e façam parte do «público interessado» a que esta disposição se refere: Acórdão de 8 de novembro de 2016, Lesoochranárske zoskupenie VLK (C‑243/15, EU:C:2016:838, n.o 55).


40      Acórdão de 8 de novembro de 2022, Deutsche Umwelthilfe (Homologação dos veículos a motor) (C‑873/19, EU:C:2022:857, n.o 49).


41      Diretiva do Conselho, de 27 de novembro de 2000, que estabelece um quadro geral de igualdade de tratamento no emprego e na atividade profissional (JO 2000, L 303, p. 16).


42      Acórdão de 23 de abril de 2020, Associazione Avvocatura per i diritti LGBTI (C‑507/18, EU:C:2020:289, n.os 61 a 63). Isto pode ser descrito no sentido de que permite que os Estados‑Membros introduzam uma forma de ação popular nas suas ordens jurídicas nacionais. V. também artigo 9.o, n.o 3, da Convenção de Aarhus.


43      V., por analogia, Acórdão de 20 de abril de 2021, Repubblika (C‑896/19, EU:C:2021:311). A Repubblika, uma associação registada como pessoa jurídica em Malta para promover a proteção da justiça e do Estado de direito, intentou uma ação popular contra o primeiro‑ministro de Malta relativa, nomeadamente, à conformidade com o direito da União das disposições da Constituição de Malta que regem a nomeação dos juízes. V., por analogia, Acórdão de 6 de outubro de 2015, Orizzonte Salute (C‑61/14, EU:C:2015:655, n.os 29 a 41). O Tribunal de Justiça confirmou que, num reenvio ao abrigo do artigo 267.o TFUE, incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio determinar as partes, incluindo os eventuais intervenientes, no processo que lhe foi submetido por referência às regras processuais nacionais.


44      Nem o Ato relativo às condições de adesão nem a Decisão MCV preveem a concessão de tal legitimidade. V., nomeadamente, artigo 39.o do referido ato e anexo IX do mesmo.


45      N.o 150.


46      Acórdão Asociaţia «Forumul Judecătorilor din România» n.o 197.


47      Acórdão de 5 de junho de 2023, Comissão/Polónia (Independência e vida privada dos juízes) (C‑204/21, EU:C:2023:442, n.os 100 e 101).


48      Acórdão de 18 de junho de 2020 (C‑78/18, EU:C:2020:476, n.os 112 e 113).