Language of document : ECLI:EU:T:2011:345

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Segunda Secção)

12 de Julho de 2011 (*)

«Concorrência – Acordos, decisões e práticas concertadas – Mercado relativo aos projectos de mecanismos de comutação isolados a gás – Decisão que declara uma infracção ao artigo 81.° CE e ao artigo 53.° do Acordo EEE – Repartição do mercado – Direitos de defesa – Prova da infracção – Duração da infracção – Coimas – Montante de partida – Ano de referência – Igualdade de tratamento»

No processo T‑133/07,

Mitsubishi Electric Corp., com sede em Tóquio (Japão), representada por R. Denton, solicitor, e K. Haegeman, advogado,

recorrente,

contra

Comissão Europeia, representada inicialmente por F. Arbault e J. Samnadda, e em seguida por X. Lewis, e em seguida por P. Van Nuffel e J. Bourke, e finalmente por Van Nuffel e N. Khan, na qualidade de agentes,

recorrida,

que tem por objecto, a título principal, um pedido de anulação da Decisão C (2006) 6762 final da Comissão, de 24 de Janeiro de 2007, relativa a um processo de aplicação do artigo 81.° [CE] e do artigo 53.° do Acordo EEE (Processo COMP/F/38.899 – Mecanismos de comutação isolados a gás), na medida em que é relativa à recorrente e à TM T & D, a título subsidiário, um pedido de anulação do artigo 2.°, alínea g), e do artigo 2.°, alínea h), da referida decisão, na medida em que é relativo à recorrente e, a título mais subsidiário, um pedido de alteração do artigo 2.° da mesma decisão com vista à anulação ou, se assim não for, à redução do montante da coima que foi aplicada à recorrente,

O TRIBUNAL GERAL (Segunda Secção),

composto por: I. Pelikánová (relator), presidente, K. Jürimäe e S. Soldevila Fragoso, juízes,

secretário: C. Kantza, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 11 de Dezembro de 2009,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

1.     Recorrente

1        A recorrente, Mitsubishi Electric Corp., é uma sociedade japonesa com actividade em diversos sectores, incluindo no domínio dos mecanismos de comutação isolados a gás (a seguir «MCIG»). Entre Outubro de 2002 e Abril de 2005, a sua actividade em matéria de MCIG era exercida por uma sociedade comum, a saber, a TM T & D Corp., que detinha em partes iguais com a Toshiba Corp. (a seguir «Melco») e foi dissolvida em 2005.

2.     Produtos

2        Os MCIG são utilizados para controlar os fluxos de energia nas redes eléctricas. Trata‑se de equipamentos eléctricos pesados, utilizados como um dos principais componentes de subestações eléctricas. São vendidos no mundo inteiro enquanto parte de subestações eléctricas «chave na mão» ou como produtos isolados destinados a serem integrados nessas subestações.

3.     Procedimento administrativo

3        Em 3 de Março de 2004, a ABB Ltd informou a Comissão da existência de práticas anticoncorrenciais no sector dos MCIG, no âmbito de um pedido verbal de imunidade das coimas, nos termos da Comunicação da Comissão, de 19 de Fevereiro de 2002, relativa à imunidade em matéria de coimas e à redução do seu montante nos processos relativos a cartéis (JO 2002, C 45, p. 3, a seguir «comunicação sobre a cooperação»).

4        O pedido verbal de imunidade das coimas apresentado pela ABB foi completado por observações orais e por provas documentais. Em 25 de Abril de 2004, deu lugar a uma decisão da Comissão que concedeu imunidade condicional à ABB.

5        Com base nas declarações da ABB, a Comissão abriu um inquérito e, em 11 e 12 de Maio de 2004, procedeu a inspecções nas instalações de várias sociedades com actividade no sector dos MCIG.

6        Em 20 de Abril de 2006, a Comissão adoptou uma comunicação de acusações dirigida a 20 sociedades, entre as quais, designadamente, a recorrente. A Comissão procedeu à audição das sociedades às quais a comunicação de acusações era dirigida, em 18 e 19 de Julho de 2006.

4.     Decisão impugnada

7        Em 24 de Janeiro de 2007, a Comissão adoptou a Decisão C (2006) 6762 final, relativa a um processo de aplicação do artigo 81.° [CE] e do artigo 53.° do Acordo EEE (Processo COMP/F/38.899 – Mecanismos de comutação isolados a gás) (a seguir «decisão impugnada»).

8        Nos considerandos 113 a 123 da decisão impugnada, a Comissão indicou que as diversas empresas participantes no cartel coordenaram a atribuição dos projectos de MCIG à escala mundial, com excepção de certos mercados, segundo regras convencionadas, nomeadamente a fim de manter quotas que reflectissem em grande medida as suas quotas de mercado históricas estimadas. Precisou que a atribuição dos projectos de MCIG era efectuada com base numa quota conjunta «japonesa» e numa quota conjunta «europeia» que deveriam seguidamente ser repartidas respectivamente pelos produtores japoneses e pelos produtores europeus entre si. Um acordo assinado em Viena, em 15 de Abril de 1988 (a seguir «acordo GQ») estipulava regras que permitiam atribuir os projectos de MCIG quer aos produtores japoneses quer aos produtores europeus e imputar o seu valor na quota correspondente. Além disso, nos considerandos 124 a 132 da decisão impugnada, a Comissão precisou que as diversas empresas que participaram no cartel tinham feito um acordo não escrito (a seguir «acordo comum»), segundo o qual os projectos de MCIG no Japão, por um lado, e nos países dos membros europeus do cartel, por outro, designados em conjunto como «países construtores» dos projectos de MCIG, estavam reservados, respectivamente, aos membros japoneses e aos membros europeus do cartel. Os projectos de MCIG nos «países construtores» não eram objecto de trocas de informações entre os dois grupos nem eram imputados nas respectivas quotas.

9        O acordo GQ continha igualmente regras relativas à troca das informações necessárias ao funcionamento do cartel entre os dois grupos de produtores, que era nomeadamente assegurado pelos secretários desses grupos, à manipulação dos concursos em causa e à fixação de preços para os projectos de MCIG que não podiam ser atribuídos. Segundo os termos do seu anexo 2, o acordo GQ aplicava‑se a todo o mundo, com excepção dos Estados Unidos, do Canadá, do Japão e de 17 países da Europa Ocidental. Além disso, nos termos do acordo comum, os projectos de MCIG nos países europeus diferentes dos «países construtores» estavam igualmente reservados ao grupo europeu, uma vez que os produtores japoneses se tinham obrigado a não apresentar propostas para os projectos de MCIG na Europa.

10      Segundo a Comissão, a repartição dos projectos de MCIG entre produtores europeus era regulada por um acordo igualmente assinado em Viena, em 15 de Abril de 1988, intitulado «E‑Group Operation Agreement for GQ‑Agreement» (a seguir «acordo EQ»). Indicou que a atribuição dos projectos de MCIG na Europa seguia as mesmas regras e procedimentos da atribuição dos projectos de MCIG noutros países. Em particular, os projectos de MCIG na Europa deviam igualmente ser notificados, repertoriados, atribuídos, convencionados ou ter recebido um nível mínimo de preços.

11      Com base nos factos apurados e nas apreciações jurídicas efectuadas na decisão, a Comissão verificou que as empresas em causa infringiram o artigo 81.° CE e o artigo 53.° do Acordo sobre o Espaço Económico Europeu (a seguir «Acordo EEE») e aplicou‑lhes coimas cujo montante foi calculado de acordo com a metodologia exposta nas Orientações para o cálculo das coimas aplicadas por força do n.° 2 do artigo 15.° do Regulamento n.° 17 e do n.° 5 do artigo 65.° do Tratado CECA (JO 1998, C 9, p. 3, a seguir «orientações para o cálculo das coimas») e na comunicação sobre a cooperação.

12      No artigo 1.° da decisão impugnada, a Comissão declarou que as recorrentes tinham participado na infracção durante o período entre 15 de Abril de 1988 e 11 de Maio de 2004.

13      Pela infracção referida no artigo 1.° da decisão impugnada, foi aplicada à recorrente, no artigo 2.° da mesma decisão, uma coima no montante de 118 575 000 de euros, entre os quais 4 650 000 euros, que são correspondentes à infracção praticada pela TM T & D, a pagar solidariamente com a Toshiba.

 Tramitação do processo e pedidos das partes

14      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 18 de Abril de 2007, a recorrente interpôs o presente recurso. Em 6 de Junho de 2007, a recorrente requereu a adopção de medidas de organização do processo relativas à comunicação, pela Comissão, dos volumes de negócios dos diferentes destinatários da decisão impugnada.

15      A contestação foi apresentada em 21 de Agosto de 2007.

16      Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 1 de Novembro de 2007, a recorrente pediu que fosse dado provimento ao seu recurso, à revelia, nos termos do artigo 122.° do Regulamento de Processo do Tribunal Geral. Apresentou a réplica em 5 de Novembro de 2007.

17      Por decisão da Segunda Secção do Tribunal Geral de 29 de Janeiro de 2008, o pedido de que fosse dado provimento ao recurso à revelia foi indeferido.

18      A fase escrita foi concluída com a apresentação da tréplica em 18 de Março de 2008.

19      Com base no relatório do juiz‑relator, o Tribunal Geral (Segunda Secção), em 22 de Setembro de 2009, decidiu abrir a fase oral do processo. No quadro das medidas de organização do processo previstas no artigo 64.° do Regulamento de Processo, este convidou a Comissão a apresentar determinados documentos e pediu às partes que se pronunciassem sobre a pertinência desses mesmos documentos em relação aos argumentos relativos à violação do direito de acesso ao processo. O Tribunal Geral apresentou também questões escritas às partes, convidando‑as a responder‑lhe na audiência.

20      Em resposta à solicitação do Tribunal, em 26 de Outubro de 2009, a Comissão transmitiu os documentos em causa. A recorrente apresentou as suas observações em 19 de Novembro de 2009. Em 2 de Dezembro de 2009, a Comissão apresentou um documento suplementar e, em 3 de Dezembro de 2009, respondeu às observações da recorrente.

21      Foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às questões escritas e orais do Tribunal na audiência de 11 de Dezembro de 2009.

22      A recorrente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        A título principal, anular a decisão impugnada na medida em que a mesma lhe é aplicável, bem como à TM T & D;

–        a título subsidiário, anular o artigo 2.°, alíneas g) e h), da decisão impugnada, na medida em que lhe é aplicável;

–        a título mais subsidiário, alterar o artigo 2.° da decisão impugnada, na medida em que lhe é aplicável, com vista à anulação ou, se assim não for, à redução do montante da coima que lhe é aplicada;

–        em qualquer caso, condenar a Comissão nas despesas.

23      A Comissão conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar a recorrente nas despesas da instância.

 Questão de direito

24      A título liminar, a recorrente refuta a admissibilidade da contestação, alegando que esta última é incoerente e não responde aos fundamentos apresentados na petição inicial.

25      A este respeito, observe‑se que, por força do artigo 46.°, n.° 1, do Regulamento de Processo, a contestação deve conter os argumentos de facto e de direito invocados pelo recorrido.

26      Ora, a contestação apresentada no presente processo responde a esta exigência, independentemente da questão distinta da relevância ou da procedência dos argumentos aduzidos pela Comissão. Nestas circunstâncias, o argumento da recorrente relativo à alegada inadmissibilidade da contestação deve ser rejeitado.

27      Quanto ao mérito, a recorrente invoca quinze fundamentos. O primeiro é relativo ao facto de a Comissão não ter provado que ela violou o artigo 81.° CE e o artigo 53.° do Acordo EEE, participando num cartel que tinha por objecto ou por efeito restringir a concorrência no Espaço Económico Europeu (a seguir «EEE»). O segundo é relativo ao facto de a Comissão não ter provado a existência de um acordo que viola o artigo 81.° CE e o artigo 53.° do Acordo EEE em que ela tenha participado. O terceiro é relativo ao facto de a Comissão ter cometido um erro ao excluir os elementos que explicam a sua ausência do mercado europeu e a sua impossibilidade de penetrar no mesmo. O quarto é relativo ao facto de a Comissão ter violado as regras que regulam a prova, ao inverter o ónus da prova, violando, assim, a presunção de inocência. O quinto é relativo ao facto de a Comissão ter violado os princípios da igualdade de tratamento e da proporcionalidade ao calcular o montante de partida da sua coima com base no volume de negócios respeitante ao ano 2001. O sexto é relativo ao facto de a Comissão ter violado o dever de fundamentação quanto à decisão de calcular a coima com base no volume de negócios respeitante ao ano 2001. O sétimo é relativo ao facto de a Comissão ter cometido um erro na definição do mercado mundial dos MCIG e da sua parte do referido mercado e, consequentemente, ter violado os princípios da igualdade de tratamento e da proporcionalidade. O oitavo é relativo ao facto de a Comissão ter violado o dever de fundamentação quanto à declaração de que ela controlava entre 15% e 20% do mercado mundial. O nono é relativo ao facto de a Comissão ter violado o princípio da boa administração ao avaliar o valor do mercado mundial. O décimo é relativo ao facto de a Comissão ter violado os princípios da igualdade de tratamento e da proporcionalidade ao calcular o factor de dissuasão que lhe era aplicável. O décimo primeiro é relativo ao facto de a Comissão ter violado o princípio da proporcionalidade ao calcular do mesmo modo o montante da sua coima e o montante da coima dos produtores europeus. O décimo segundo é relativo ao facto de a Comissão não ter tomado em consideração os elementos económicos e técnicos relevantes no cálculo da coima. O décimo terceiro é relativo ao facto de a Comissão ter cometido um erro no cálculo da duração do cartel. O décimo quarto é relativo ao facto de a Comissão ter violado os seus direitos de defesa e o seu direito a um processo equitativo ao não lhe dar acesso aos elementos de acusação e de defesa. O décimo quinto é relativo ao facto de a Comissão ter violado os seus direitos de defesa ao não lhe comunicar as conclusões relativas à teoria de compensação inerente ao acordo comum.

28      A Comissão contesta a procedência dos argumentos apresentados pela recorrente.

29      Cumpre salientar, desde já, que a recorrente não especificou quais dos seus fundamentos eram invocados em apoio dos diferentes pedidos que apresentou. A este respeito, há que considerar, em primeiro lugar, que os primeiro a quarto e os décimo terceiro a décimo quinto fundamentos foram invocados pela recorrente em apoio do seu pedido principal. Com efeito, se um destes fundamentos for acolhido, haverá lugar à anulação, pelo menos parcial, tanto do artigo 1.° como do artigo 2.° da decisão impugnada na medida em que seja respeitante à recorrente. Em seguida, cumpre considerar que os quinto a décimo segundo fundamentos são relativos à determinação da coima aplicada à recorrente e, consequentemente, são invocados por esta última em apoio do seu pedido subsidiário que visa a anulação do artigo 2.°, alíneas g) e h), da decisão impugnada, na medida em que lhe é aplicável. Finalmente, há que observar que não foi invocado qualquer fundamento autónomo pela recorrente em apoio do seu pedido a título mais subsidiário.

1.     Quanto ao pedido principal, relativo à anulação da decisão impugnada, na medida em que é aplicável à recorrente e à TM T & D

30      Na medida em que a anulação da decisão impugnada, em razão de uma violação dos direitos da defesa da recorrente, tornará supérflua a análise da referida decisão quanto ao mérito, há que apreciar, em primeiro lugar, os décimo quarto e décimo quinto fundamentos. Em segundo lugar, dever‑se‑ão tratar conjuntamente os primeiro, terceiro e quarto fundamentos, que estão todos associados à prova do acordo comum. Em terceiro lugar, dever‑se‑á analisar o segundo fundamento, relativo à qualificação do referido acordo enquanto infracção ao artigo 81.° CE e ao artigo 53.° do acordo EEE. Em quarto lugar, apreciar‑se‑á o décimo terceiro fundamento, relativo à duração do alegado cartel.

 Quanto ao décimo quarto fundamento, relativo ao facto de a Comissão ter violado os direitos de defesa da recorrente e o seu direito a um processo equitativo ao não lhe dar acesso aos elementos de acusação e de defesa

 Argumentos das partes

31      A recorrente considera que não teve acesso a certos elementos de acusação e de defesa constantes do processo, com violação do princípio do respeito dos direitos da defesa e do direito a um processo equitativo.

32      Quanto aos elementos de acusação, a recorrente alega que a decisão impugnada revela provas que ela não conhecia e sobre as quais, consequentemente, não pôde pronunciar‑se. Por um lado, a recorrente sustenta que não pôde consultar os elementos apresentados pela Fuji em 21 de Novembro de 2006, dos quais decorre que o acordo GQ não poderia funcionar sem o acordo comum.

33      Por outro lado, a recorrente refere que os elementos apresentados em Novembro de 2006 dos quais resulta que a Alstom e a Areva não contestaram a existência do acordo comum também não foram comunicados.

34      No que respeita aos elementos de defesa, a recorrente alega, em primeiro lugar, que, em 8 de Novembro de 2006, apresentou à Comissão depoimentos de defesa de várias outras empresas, que, no entanto, não foram comunicados às outras partes.

35      Em segundo lugar, não foi comunicada a resposta suplementar da Hitachi à comunicação de acusações, na qual a Hitachi se opôs à interpretação feita pela Comissão das declarações constantes da resposta inicial relativas ao mecanismo de notificação e de contabilização.

36      Em terceiro lugar, a recorrente queixa‑se de não ter tido acesso aos elementos que põem em causa a existência do acordo comum e que evidenciam a existência dos obstáculos à penetração do mercado dos projectos de MCIG no EEE provenientes da Siemens, da empresa pertencente ao grupo de que faz parte a VA TECH Transmission & Distribution GmbH & Co. KEG (a seguir «VA TECH»), da Hitachi e da Toshiba, e designadamente às declarações e relatórios económicos ou técnicos apresentados pela Hitachi e pela Toshiba, aos testemunhos dos empregados da Siemens e da Hitachi e à resposta da VA TECH à comunicação de acusações. Afirma que, ao declarar, no considerando 130 da decisão impugnada, que a VA TECH não contestou abertamente a existência do acordo comum, a Comissão desvirtuou a posição da VA TECH.

37      Em quarto lugar, a recorrente argumenta que não teve acesso às declarações de S., apresentadas em nome da Alstom e relativas à cessação do cartel em 1999.

38      A Comissão contesta a procedência dos argumentos da recorrente.

 Apreciação do Tribunal Geral

39      O respeito dos direitos de defesa exige que a pessoa interessada tenha tido a possibilidade, durante o procedimento administrativo, de dar a conhecer utilmente o seu ponto de vista sobre a realidade e a pertinência dos factos e das circunstâncias alegados, bem como sobre os documentos considerados pela Comissão em apoio da sua alegação de existência de uma infracção ao Tratado (acórdão do Tribunal de Justiça de 7 de Janeiro de 2004, Aalborg Portland e o./Comissão, C‑204/00 P, C‑205/00 P, C‑211/00 P, C‑213/00 P, C‑217/00 P e C‑219/00 P, Colect., p. I‑123, n.° 66).

40      Corolário do princípio do respeito dos direitos de defesa, o direito de acesso ao processo implica que a Comissão deve dar à empresa em causa a possibilidade de proceder a um exame de todos os documentos que figuram no processo de instrução e que possam ser pertinentes para a sua defesa. Estes incluem elementos de prova, tanto de acusação como de defesa, com a ressalva dos segredos comerciais de outras empresas, dos documentos internos da Comissão e de outras informações confidenciais (acórdão Aalborg Portland e o./Comissão, referido no n.° 39, supra, n.° 68).

41      A este propósito, há que recordar que é unicamente no início da fase administrativa contraditória do processo que a empresa interessada é informada, através da comunicação de acusações, de todos os elementos essenciais nos quais a Comissão se baseia nessa fase do processo, e que essa empresa goza do direito de acesso ao processo a fim de garantir o exercício efectivo dos seus direitos de defesa. Por conseguinte, a resposta das outras partes que tenham participado no cartel à comunicação de acusações não está, em princípio, incluída no conjunto dos documentos do processo instrutor que as partes podem consultar (acórdão do Tribunal Geral de 30 de Setembro de 2009, Hoechst/Comissão, T‑161/05, ainda não publicado na Colectânea, n.° 163).

42      Porém, se a Comissão tencionar basear‑se numa passagem de uma resposta à comunicação de acusações ou num documento anexo a essa resposta, para concluir pela existência de uma infracção num processo de aplicação do artigo 81.°, n.° 1, CE, deve ser dada às outras partes no processo a possibilidade de se pronunciarem sobre esse elemento de prova. Nestas circunstâncias, a passagem em questão de uma resposta à comunicação de acusações ou o documento anexo a essa resposta constituem, na verdade, um elemento de acusação contra as diferentes partes que participaram na infracção (v. acórdão Hoechst/Comissão, referido no n.° 32 supra, n.° 41, e jurisprudência aí referida). A jurisprudência referida é aplicável, por analogia, ao artigo 53.°, n.° 1, do acordo EEE.

43      Por analogia, se uma passagem de uma resposta a uma comunicação de acusações ou um documento anexo a essa resposta puder ser pertinente para a defesa de uma empresa na medida em que lhe permite invocar elementos não compatíveis com as deduções efectuadas nessa fase pela Comissão, constitui um elemento de defesa. Nesse caso, a empresa em causa deve ter a possibilidade de proceder a uma análise da passagem ou do documento em questão e de pronunciar‑se sobre o mesmo.

44      No entanto, o simples facto de outras empresas terem invocado os mesmos argumentos que a empresa em causa e de eventualmente terem utilizado mais recursos na sua defesa não é suficiente para considerar esses argumentos como elementos de defesa (v., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 27 de Setembro de 2006, Jungbunzlauer/Comissão, T‑43/02, Colect., p. II‑3435, n.os 353 e 355).

45      Quanto às consequências de um acesso ao processo que não respeite estas regras, a não comunicação de um documento no qual a Comissão se tenha baseado para acusar uma empresa só constitui violação dos direitos de defesa se a empresa demonstrar que o resultado a que a Comissão chegou na sua decisão teria sido diferente o documento não comunicado viesse a ser afastado enquanto meio de prova de acusação (acórdão Aalborg Portland e o./Comissão, n.° 39 supra, n.os 71 e 73).

46      Quanto à falta de comunicação de um documento favorável à defesa, a empresa em causa deve unicamente demonstrar que a sua não divulgação pode ter influenciado, em seu detrimento, o desenrolar do processo e o conteúdo da decisão da Comissão. Basta que a empresa demonstre que poderia ter utilizado o referido documento em sua defesa, no sentido de que, se pudesse tê‑lo invocado no procedimento administrativo, teria podido invocar elementos que não concordavam com as deduções feitas nessa fase pela Comissão e, portanto, poderia ter influenciado, de qualquer maneira, as apreciações feitas por esta na decisão, pelo menos no respeitante à gravidade e à duração do comportamento que lhe era imputado, e, portanto, ao nível da coima (acórdão Aalborg Portland e o./Comissão, n.° 39 supra, n.os 74 e 75).

47      A possibilidade de que um documento não divulgado tenha podido influenciar o desenrolar do processo e o conteúdo da decisão da Comissão só pode ser demonstrada através de um exame provisório de determinados meios do qual resulte que os documentos não divulgados podiam ter tido – em relação a esses meios de prova – uma importância que não deveria ter sido menosprezada (acórdão Aalborg Portland e o./Comissão, n.° 39, supra, n.° 76).

48      No caso em apreço, no que respeita aos elementos de acusação, por um lado, a Comissão admite que não podia apoiar‑se nas observações da Fuji que não foram comunicadas à recorrente, para fundamentar as acusações contra esta última na decisão impugnada, mas contesta que as tenha efectivamente invocado enquanto elementos de acusação. No entanto, refira‑se que, nos considerandos 125 e 255 da decisão impugnada, a Comissão se referiu às observações suplementares da Fuji, em particular, às apresentadas em 21 de Novembro de 2006, para confirmar a existência do acordo comum.

49      Por outro lado, a Comissão alega que não se baseou na posição alegadamente neutra da Alstom e da Areva para concluir pela existência do acordo comum, tendo‑se limitado a verificar a sua existência. Embora esta interpretação seja confirmada pela redacção do considerando 125 da decisão impugnada, em que não é reconhecido qualquer valor de confirmação à posição da Alstom, da Areva e da VA TECH, contrariamente às declarações da Fuji que confirmam a existência do acordo comum, é posta em causa pelo considerando 255 da referida decisão, em que a Comissão se refere ao reconhecimento implícito da existência do acordo comum por certos produtores europeus.

50      Em quaisquer circunstâncias, a posição neutra da Alstom e da Areva não pode ser interpretada como uma prova da existência do acordo comum. Com efeito, atento o ónus da prova que recai sobre a Comissão no âmbito de um procedimento de aplicação do artigo 81.° CE e do artigo 53.° do acordo EEE, a não impugnação de um facto por uma empresa não prova o facto em questão. Por conseguinte, independentemente da questão do respeito dos direitos de defesa, a Comissão não podia invocar a posição da Alstom e da Areva enquanto elemento de acusação.

51      Nestas circunstâncias, o resultado dos argumentos da recorrente relativos aos elementos de acusação depende do resultado da análise do primeiro fundamento, relativo à prova da existência do acordo comum. Com efeito, se se verificar que foi feita prova bastante da existência do referido acordo suficiente mesmo depois de se ter excluído as observações em causa da Fuji e a posição alegadamente neutra da Alstom e da Areva enquanto elementos de acusação, haverá que excluir a presente parte. Em contrapartida, se se verificar que os referidos elementos constituem um apoio necessário para as declarações efectuadas na decisão impugnada quanto à existência do acordo comum, haverá que acolher o argumento da recorrente e, portanto, que anular a decisão impugnada na medida em que ela lhe diz respeito.

52      Quanto aos elementos de defesa, cumpre excluir de imediato o argumento da recorrente relativo ao facto de certos elementos apresentados por ela não terem sido comunicados aos outros destinatários da comunicação de acusações. Com efeito, mesmo supondo que estes elementos não tenham sido comunicados aos outros destinatários, isso poderia afectar, quando muito, a defesa dos referidos destinatários, mas não a da recorrente.

53      De resto, o Tribunal Geral pediu à Comissão que apresentasse os documentos identificados pela recorrente com um mínimo de precisão.

54      Ora, em primeiro lugar, cumpre observar que, contrariamente ao que refere a recorrente, a resposta suplementar da Hitachi à comunicação de acusações não põe em causa o conteúdo factual das declarações desta última relativas ao mecanismo de notificação e de contabilização. Na referida resposta suplementar, a Hitachi limitou‑se a contestar a interpretação feita pela Comissão das referidas declarações, em especial no que respeita à sua pertinência enquanto prova do acordo comum e da existência de uma infracção única que envolvia tanto este último acordo como o acordo GQ. Ora, esta mesma argumentação já tinha sido apresentada pela Hitachi na passagem da sua primeira resposta à comunicação de acusações, comunicada à recorrente pela Comissão. Por conseguinte, a resposta suplementar da Hitachi à comunicação de acusações não pode ser considerada um elemento de acusação cuja comunicação fosse susceptível de influenciar o decurso do processo e o conteúdo da decisão impugnada.

55      Em segundo lugar, como refere a recorrente, a VA TECH impugnou expressamente, na sua resposta à comunicação de acusações, a existência do acordo comum. No entanto, embora deva ser tida em consideração na análise do primeiro fundamento relativo à prova da existência do acordo comum, esta circunstância, em si mesma, não é reveladora de uma violação dos direitos de defesa da recorrente, tendo em conta que esta última não especifica em que medida a interpretação incorrecta da posição VA TECH dificultou a sua defesa.

56      De resto, nas suas declarações, tanto a VA TECH como a Hitachi, a Toshiba e a Siemens contestaram a existência do acordo comum e descreveram a existência de obstáculos à entrada do mercado europeu. Além disso, a Hitachi e a Toshiba apresentaram relatórios de peritos para fundar a sua posição quanto a este último aspecto.

57      Ora, durante o procedimento administrativo, a própria recorrente contestou a existência do acordo comum e das discussões relativas ao mesmo, invocou a existência de obstáculos «elevados» à entrada no mercado europeu e apresentou relatórios de peritos sobre este último aspecto, análogos aos relatórios da Hitachi e da Toshiba. Nestas circunstâncias, as declarações e relatórios provenientes dos outros destinatários da comunicação de acusações não poderiam ser considerados elementos de defesa.

58      Quanto aos depoimentos dos empregados da Hitachi e da Siemens, estes declararam que o acordo GQ não era aplicável aos projectos de MCIG na Europa, contestaram a existência do acordo comum e das discussões relativas ao mesmo e referiram a existência de obstáculos «elevados» à entrada no mercado do EEE. Além disso, as testemunhas da Hitachi descreveram os pormenores de uma proposta da Alstom relativa a um acordo entre os produtores europeus e japoneses, apresentada em Julho de 2002, e da recusa dessa proposta pela Hitachi.

59      A este respeito, cumpre observar, por um lado, que os depoimentos escritos dos empregados de uma sociedade, elaborados sob o controlo da mesma e apresentados por ela para efeitos da sua defesa no âmbito do procedimento administrativo levado a cabo pela Comissão, não podem, em princípio, ser qualificados como elementos diferentes e independentes das declarações dessa mesma sociedade. Com efeito, regra geral, a posição de uma sociedade quanto à realidade dos factos de que é acusada pela Comissão baseia‑se, em primeiro lugar, nos conhecimentos e opiniões dos seus trabalhadores e dos seus dirigentes.

60      Por outro lado, tal como acima observado no n.° 57, durante o procedimento administrativo, a própria recorrente impugnou a existência do acordo comum e das discussões relativas ao mesmo e invocou a existência de obstáculos «elevados» à entrada no mercado europeu. Alegou igualmente que o acordo GQ não abrangia o território do EEE. Por conseguinte, o facto de outras empresas terem invocado estes argumentos não pode ser considerado um elemento de defesa.

61      Do mesmo modo, os pormenores da proposta da Alstom, apresentada em Julho de 2002, foram revelados na comunicação de acusações. Portanto, este elemento não constitui um elemento de defesa.

62      Em terceiro lugar, após ter tido acesso às declarações de S., a recorrente não identificou, nestas últimas, qualquer elemento que pudesse ser útil à sua defesa. Assim sendo, a alegação geral de que as referidas declarações constituem um elemento de defesa deve ser rejeitada como não fundada.

63      À luz de tudo o que precede, há que rejeitar os argumentos da recorrente relativos ao acesso aos elementos de defesa. No entanto, como acima resulta do n.° 51 supra, o resultado do presente fundamento depende do da análise do primeiro fundamento.

 Quanto ao décimo quinto fundamento, relativo ao facto de a Comissão ter violado os direitos de defesa da recorrente ao não lhe comunicar as suas conclusões relativas à teoria de compensação inerente ao acordo comum

 Argumentos das partes

64      A recorrente argumenta que a Comissão, na comunicação de acusações, não indicou que a compensação atribuída aos produtores japoneses pelos produtores europeus no âmbito do acordo comum, graças ao mecanismo de notificação e de contabilização, constituía uma prova da existência do referido acordo. Segundo ela, esta teoria é mencionada pela primeira vez na decisão impugnada. Assim, a Comissão violou a obrigação de dar às partes interessadas a possibilidade de apresentarem a sua opinião sobre os elementos em que se baseou.

65      A Comissão contesta a procedência dos argumentos da recorrente.

 Apreciação do Tribunal Geral

66      Segundo a jurisprudência, a comunicação de acusações deve enunciar, de forma clara, todos os elementos essenciais em que a Comissão se baseia nesta fase do processo. Não obstante, essa indicação pode ser feita sumariamente e a decisão não tem de necessariamente ser uma cópia da comunicação de acusações, já que esta comunicação constitui um documento preparatório, cujas apreciações de facto e de direito têm um carácter puramente provisório (acórdão Aalborg Portland e o./Comissão, n.° 39 supra, n.° 67). Assim, embora a Comissão não possa acusar os interessados de infracções diferentes das referidas na comunicação de acusações e só possa basear‑se factos sobre os quais as interessadas tenham tido a oportunidade de se pronunciar, deve todavia ter em conta os elementos resultantes do procedimento administrativo seja para desistir de acusações que se tenham revelado infundadas, seja para adaptar e completar, tanto de facto como de direito, a sua argumentação em apoio das acusações que mantém (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 15 de Julho de 1970, ACF Chemiefarma/Comissão, 41/69, Colect., 1969‑1979, p. 661, n.os 92 a 94).

67      No caso em apreço, há que admitir que, na comunicação de acusações, a Comissão não indicou expressamente que o mecanismo de notificação e de contabilização constituía uma compensação oferecida pelos produtores europeus aos produtores japoneses, considerados como concorrentes potenciais credíveis, em troca do respeito do acordo comum.

68      No entanto, por um lado, a comunicação de acusações descreve os elementos de facto em que esta teoria se baseia. Com efeito, o acordo comum e o mecanismo de contabilização são sumariamente apresentados nos n.os 100, 106 e 110 da comunicação de acusações e descritos pormenorizadamente no seguimento deste documento. Do mesmo modo, decorre do n.° 120 da comunicação de acusações que, segundo a Comissão, os produtores japoneses eram concorrentes potenciais credíveis no que respeita a projectos de MCIG no EEE.

69      Por outro lado, no n.° 59 da sua resposta à comunicação de acusações, a recorrente observou que a Comissão invocava o mecanismo de notificação e de contabilização enquanto prova da existência do acordo comum. Há, pois, que considerar que, com base na referida comunicação, a recorrente tinha compreendido a importância que a Comissão atribuía ao mecanismo de notificação e de contabilização no contexto da prova da alegada infracção. Igualmente, nos n.os 59 a 64 da sua resposta à comunicação de acusações, a recorrente manifestou pormenorizadamente a sua posição quanto à prova do referido mecanismo e à sua pertinência em relação ao alegado acordo comum.

70      Portanto, há que observar que o conteúdo da comunicação de acusações permitiu à recorrente pronunciar‑se sobre os elementos de facto em que se baseou a alegação invocada pela Comissão na referida comunicação e na decisão impugnada.

71      Por conseguinte, deve julgar‑se improcedente o décimo quinto fundamento.

 Quanto aos primeiro, terceiro e quarto fundamentos, relativos ao facto de a Comissão não ter provado a participação da recorrente no alegado cartel, ter cometido um erro de direito ao excluir os elementos que explicam a ausência da recorrente do mercado europeu e a sua impossibilidade, de nele penetrar e de ter violado as regras que regulam a prova, ao inverter o ónus da prova, violando, assim, a presunção de inocência

72      Segundo a jurisprudência, a Comissão deve fazer provas das infracções por ela declaradas e apresentar os elementos que provem a existência dos factos constitutivos de uma infracção (v. acórdão do Tribunal Geral de 27 de Setembro de 2006, Dresdner Bank e o./Comissão, T‑44/02 OP, T‑54/02 OP, T‑56/02 OP, T‑60/02 OP e T‑61/02 OP, Colect., p. II‑3567, n.° 59, e jurisprudência aí referida).

73      Neste contexto, a existência de uma dúvida no espírito do julgador deve beneficiar a empresa destinatária da decisão que declara a existência de uma infracção. O julgador não pode, portanto, concluir que a Comissão fez prova bastante da existência da infracção em causa se ainda subsistir no seu espírito uma dúvida quanto a essa questão, nomeadamente no âmbito de um recurso de anulação de uma decisão que aplica uma coima (acórdão Dresdner Bank e o./Comissão, n.° 72 supra, n.° 60).

74      Com efeito, nesta última situação, é necessário ter em conta o princípio da presunção de inocência, tal como resulta, nomeadamente, do artigo 6.°, n.° 2, da Convenção para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada em Roma em 4 de Novembro de 1950, o qual faz parte dos direitos fundamentais que constituem princípios gerais do direito comunitário. Atenta a natureza das infracções em causa, bem como a natureza e o grau de severidade das sanções aplicáveis, o princípio da presunção de inocência aplica‑se, nomeadamente, aos processos atinentes a violações das regras de concorrência aplicáveis às empresas susceptíveis de conduzir à aplicação de coimas ou de sanções pecuniárias compulsórias (v., neste sentido, acórdão Dresdner Bank e o./Comissão, n.° 72 supra, n.° 61, e jurisprudência aí referida).

75      Assim, é necessário que a Comissão apresente provas precisas e concordantes para demonstrar a existência da infracção. No entanto, deve salientar‑se que cada uma das provas apresentadas pela Comissão não tem necessariamente de satisfazer esses critérios relativamente a cada elemento da infracção. Basta que o conjunto de indícios invocado pela instituição, apreciado globalmente, satisfaça essa exigência (v. acórdão Dresdner Bank e o./Comissão, n.° 72 supra, n.os 62 e 63, e jurisprudência aí referida).

76      Além disso, tendo em conta o carácter notório da proibição dos acordos anticoncorrenciais, não se pode exigir à Comissão que apresente documentos que comprovem de forma expressa a existência de contactos entre os operadores em causa. Os elementos fragmentários e dispersos de que a Comissão eventualmente dispõe devem, em qualquer caso, poder ser completados por deduções que permitam a reconstituição das circunstâncias pertinentes. Por conseguinte, a existência de uma prática ou de um acordo anticoncorrencial pode ser inferida de um determinado número de coincidências e de indícios que, considerados no seu todo, podem constituir, na falta de outra explicação coerente, a prova de uma violação das regras da concorrência (v. acórdão Dresdner Bank e o./Comissão, n.° 72 supra, n.os 64 e 65, e jurisprudência aí referida).

77      A este respeito, a recorrente alega que já não há que aplicar regras mais flexíveis em matéria de prova, associadas às dificuldades com que a Comissão é confrontada ao tentar provar uma infracção. Afirma, em primeiro lugar, que as coimas aplicadas nos processos de cartéis aumentaram constantemente nos últimos anos, o que deve influenciar a intensidade da fiscalização das decisões da Comissão. Em segundo lugar, tendo em conta a existência da comunicação sobre a cooperação e a cooperação das partes obtida por força desta, deixa de haver lugar ao reconhecimento à Comissão de margem quanto à apreciação das provas. Em terceiro lugar, no presente processo, a Comissão tenta invocar um documento comprovativo da existência de um cartel fora da União Europeia, a saber, o acordo GQ, para declarar uma infracção ao artigo 81.° CE e ao artigo 53.° do acordo EEE.

78      No entanto, estes argumentos da recorrente não podem ser acolhidos. Com efeito, em primeiro lugar, é verdade que o aumento dos montantes das coimas é susceptível de ter consequências mais graves para as partes a que estas mesmas coimas são aplicadas. No entanto, uma vez que a iniciativa da Comissão neste sentido é, em geral, conhecida, a mesma tem por consequência que, se se tornarem responsáveis por uma infracção, as empresas terão maior cuidado para que seja criado um número de provas tão reduzido quanto possível, dificultando assim a tarefa da Comissão. Em segundo lugar, para poderem ser validamente invocados pela Comissão como provas de uma infracção, os elementos recebidos das empresas interessadas no âmbito do programa de clemência devem, em quaisquer circunstâncias, preencher os requisitos jurisprudenciais aplicáveis. Assim, a existência do programa de clemência em si mesma não simplifica necessariamente o papel da Comissão. Em terceiro lugar, o facto de o acordo GQ não abranger o território da União Europeia é pertinente no quadro da apreciação do valor probatório deste elemento. Em contrapartida, não é passível de influenciar a apreciação dos outros elementos avançados pela Comissão.

79      Além disso, quando a Comissão se apoia unicamente na conduta das empresas em causa no mercado para concluir pela existência de uma infracção, basta a estas últimas demonstrar a existência de circunstâncias que dão uma explicação diferente dos factos provados pela Comissão e que deste modo permitem substituir a explicação da Comissão que levou a concluir pela existência de uma violação das regras da concorrência comunitárias por outra explicação plausível dos factos (v., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 8 de Julho de 2004, JFE Engineering e o./Comissão, T‑67/00, T‑68/00, T‑71/00 e T‑78/00, Colect., p. II‑2501, n.° 186, e jurisprudência aí referida).

80      Contrariamente ao que alega a recorrente, esta norma não é aplicável a todos os casos em que a infracção é demonstrada apenas por provas não documentais.

81      Com efeito, no que respeita aos meios de prova que podem ser invocados para demonstrar a violação do artigo 81.° CE, o princípio que prevalece no direito comunitário é o da livre administração da prova (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 8 de Julho de 2004, Dalmine/Comissão, T‑50/00, Colect., p. II‑2395, n.° 72). A jurisprudência referida é aplicável, por analogia, ao artigo 53.° do acordo EEE.

82      Por conseguinte, ainda que a ausência de provas documentais possa mostrar‑se pertinente no quadro da apreciação global do conjunto de indícios invocados pela Comissão, em si mesma, não tem por consequência permitir que a empresa em questão ponha em causa as alegações da Comissão apresentando uma explicação alternativa dos factos. Isso só acontece quando as provas apresentadas pela Comissão não permitem demonstrar a existência da infracção, sem equívocos e sem que seja necessária uma interpretação (v., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 12 de Setembro de 2007, Coats Holding e Coats/Comissão, T‑36/05, não publicado na Colectânea, n.° 74).

83      Além disso, nenhuma disposição nem nenhum princípio geral de direito comunitário proíbe a Comissão de invocar contra uma empresa as declarações de outras empresas acusadas de terem participado no cartel. Se assim não fosse, o ónus da prova dos comportamentos contrários ao artigo 81.° CE, que incumbe à Comissão, seria insustentável e incompatível com a missão de velar pela boa aplicação dessas disposições (acórdão JFE Engineering e o./Comissão, n.° 79 supra, n.° 192). A jurisprudência referida é aplicável, por analogia, ao artigo 53.° do acordo EEE.

84      No entanto, a declaração de uma empresa acusada de ter participado num cartel, cuja exactidão é contestada por várias outras empresas acusadas, não pode ser considerada prova suficiente da existência de uma infracção cometida por estas últimas sem ser sustentada noutros elementos de prova, podendo o grau de confirmação exigido ser menor devido à fiabilidade das declarações em causa (acórdão JFE Engineering e o./Comissão, n.° 79 supra, n.os 219 e 220).

85      Quanto ao valor probatório dos diversos elementos de prova, o único critério pertinente para apreciar as provas apresentadas reside na sua credibilidade (acórdão Dalmine/Comissão, n.° 81 supra, n.° 72).

86      Segundo as regras gerais em matéria de prova, a credibilidade e, portanto, o valor probatório de um documento dependem da sua origem, das circunstâncias da sua elaboração, do seu destinatário e do seu conteúdo (acórdão do Tribunal Geral de 15 de Março de 2000, Cimenteries CBR e o./Comissão, T‑25/95, T‑26/95, T‑30/95 a T‑32/95, T‑34/95 a T‑39/95, T‑42/95 a T‑46/95, T‑48/95, T‑50/95 a T‑65/95, T‑68/95 a T‑71/95, T‑87/95, T‑88/95, T‑103/95 e T‑104/95, Colect., p. II‑491, n.os 1053 e 1838).

87      Quanto às declarações, pode, além disso, ser reconhecido um valor probatório particularmente elevado às que, em primeiro lugar, são fiáveis, em segundo lugar, são feitas em nome de uma sociedade, em terceiro lugar, são provenientes de uma pessoa que tem a obrigação profissional de agir no interesse desta sociedade, em quarto lugar, são contrárias aos interesses do declarante, em quinto lugar, resultam de um testemunho directo das circunstâncias que relatam e, em sexto lugar, foram prestadas por escrito, de forma deliberada e após séria reflexão (v. neste sentido, acórdão JFE Engineering e o./Comissão, n.° 79 supra, n.os 205 e 210).

88      Além disso, embora se devam geralmente encarar com certa desconfiança os depoimentos voluntários dos principais participantes num cartel ilícito, tendo em conta a possibilidade, invocada pela recorrente, de que estes participantes tendam a apresentar, o mais possível, elementos de acusação relativos à actividade dos seus concorrentes, não é menos verdade que o facto de se requerer o benefício da aplicação da comunicação sobre a cooperação a fim de obter uma imunidade ou uma redução da coima não cria necessariamente um incentivo para apresentar elementos de prova deformados em relação aos outros participantes no cartel de que é acusado. Com efeito, qualquer tentativa de induzir a Comissão em erro pode pôr em causa a sinceridade bem como a integridade da cooperação do requerente e, portanto, pôr em risco a possibilidade de este beneficiar plenamente da comunicação sobre a cooperação (V., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 16 de Novembro de 2006, Peróxidos Orgânicos/Comissão, T‑120/04, Colect., p. II‑4441, n.° 70).

89      Cumpre igualmente observar, a este respeito, que as consequências potenciais da comunicação de elementos deformados são tanto mais graves quanto a declaração contestada de uma empresa deva ser corroborada, como resulta do n.° 84, supra. Com efeito, esta circunstância aumenta o risco de que sejam identificadas declarações inexactas tanto pela Comissão como pelas outras empresas envolvidas.

90      No que respeita à aplicação destas normas ao caso vertente, cabe recordar, a título liminar, que, segundo as observações constantes da decisão impugnada, o acordo comum era um acordo não escrito que englobava, em primeiro lugar, o compromisso das empresas japonesas de não penetrarem no mercado dos projectos de MCIG no EEE, em segundo lugar, o compromisso das empresas europeias de não penetrarem no mercado japonês dos projectos de MCIG e, em terceiro lugar, o compromisso das empresas europeias de comunicarem às empresas japonesas os projectos de MCIG nos países que não os países construtores e de contabilizarem esses mesmos projectos na quota conjunta «europeia» prevista pelo acordo GQ. Segundo a Comissão, o objectivo do mecanismo de notificação e de contabilização consistia em oferecer uma compensação às empresas japonesas, consideradas como concorrentes potenciais no mercado do EEE pelas empresas europeias.

91      Entre as diversas componentes do acordo comum acima enumeradas no n.° 90, o alegado compromisso das empresas japonesas de não penetrarem no mercado do EEE é que constitui o fundamento da acusação da Comissão contra a recorrente. Por conseguinte, é a existência desse acordo que deve ser provada. No entanto, as outras componentes do acordo comum, se forem provadas, podem mostrar‑se relevantes enquanto provas indirectas que permitem deduzir a existência do correspondente compromisso das empresas japonesas.

92      No âmbito do primeiro fundamento, a recorrente contesta a existência do acordo comum e a sua participação neste último. Critica o valor probatório dos diversos elementos avançados pela Comissão na decisão impugnada e refere outros elementos que, segundo ela, sugerem que o referido acordo não existiu. A recorrente deduz daí que, ao adoptar a decisão impugnada, a Comissão excedeu a sua competência. Acrescenta, no âmbito do terceiro fundamento, que, nestas circunstâncias, a Comissão tinha a obrigação de aceitar a explicação alternativa da ausência dos produtores japoneses do mercado dos MCIG no EEE, associada à existência dos obstáculos jurídicos, técnicos e comerciais à entrada neste mesmo mercado. No âmbito do quarto fundamento, a recorrente sustenta que, ao não ter demonstrado a existência do acordo comum de forma juridicamente bastante, a Comissão inverteu o ónus da prova e violou o princípio de presunção de inocência.

93      A Comissão argumenta que a existência do acordo comum e, em particular, o compromisso das empresas japonesas de não penetrarem no EEE é suficientemente demonstrada por um conjunto de provas que incluem provas documentais, declarações de empresas, testemunhos e elementos relativos ao funcionamento efectivo do cartel. Assim sendo, a Comissão considera, por um lado, que a explicação alternativa proposta pela recorrente não é pertinente e, por outro, que suportou o ónus da prova que lhe incumbe e, portanto, respeitou o princípio de presunção de inocência.

94      Cabe, pois, apreciar a fiabilidade e o conteúdo dos diferentes elementos em causa a fim de verificar se, globalmente considerados, os elementos invocados pela Comissão sustentam uma convicção firme quanto à existência do acordo comum que não seja susceptível de ser posta em causa pelos elementos aduzidos pela recorrente.

95      A alegação da recorrente de que a Comissão excedeu a sua competência, bem como os terceiro e quarto fundamentos, baseiam‑se no pressuposto de que a Comissão não fez prova da existência do acordo comum e da participação da recorrente neste último. Por conseguinte, se os argumentos da recorrente relativos à prova da existência da infracção e da participação desta última deverem ser excluídos, isso implicará necessariamente, em primeiro lugar, que a Comissão é competente para punir a infracção verificada, em seguida, que a explicação alternativa invocada pela recorrente não é pertinente, por força do exposto nos n.os 79 a 82 supra e, finalmente, que a Comissão suportou o ónus da prova que lhe incumbe e, portanto, cumpriu o princípio da presunção de inocência. Em contrapartida, se se concluir que a participação da recorrente na infracção alegada não foi demonstrada na decisão impugnada, isso justifica só por si a anulação desta última na medida em que é relativa à recorrente.

 Quanto aos elementos apresentados pela ABB

–       Argumentos das partes

96      A recorrente alega que o depoimento de M. apresentado em nome da ABB não é fiável e não permite concluir pela existência do acordo comum.

97      Em primeiro lugar, enquanto beneficiária da imunidade condicional, a ABB foi incitada a apresentar elementos de acusação. Além disso, M. teve consciência de que a ABB tinha interesse em que ele não contestasse a tese do acordo comum. Em contrapartida, não ignorou que não corria o risco de que fosse intentada uma acção cível devido às suas declarações e teve a certeza de que o seu depoimento não seria objecto de um interrogatório contraditório. Do mesmo modo, era evidente que as declarações de M. não iam produzir efeitos prejudiciais suplementares para a ABB, uma vez que a responsabilidade desta empresa tinha sido demonstrada por outros elementos.

98      A vontade da ABB de apresentar elementos de acusação manifestou‑se, na entrevista com M., pelas intervenções do representante da ABB, que interveio para corrigir e precisar as declarações de Mayr, tendo ele mesmo respondido, num dado momento, às questões da Comissão.

99      Em segundo lugar, o depoimento de M. foi apresentado mais de 18 meses após o pedido de imunidade de coimas da ABB.

100    Em terceiro lugar, o depoimento de M. era um simples depoimento de um ex‑empregado da ABB, mais do que uma declaração apresentada por conta desta última. Segundo a recorrente, no momento da entrevista em causa, esta testemunha estava reformada e não tinha a obrigação de agir no interesse da ABB.

101    Em quarto lugar, o depoimento verbal de M. não era o resultado de uma reflexão profunda. Do mesmo modo, na medida em que M. apresentou várias declarações no procedimento administrativo, os elementos apresentados deviam ser considerados uma série de declarações constantemente desmentidas, e não um testemunho único, revisto após reflexão. Além disso, o facto de as declarações anteriores da referida testemunha não lhe terem sido comunicadas implicava que elas não continham provas do acordo comum, o que enfraquecia a fiabilidade das declarações posteriores desta testemunha.

102    Em quinto lugar, ainda que M. tivesse sido testemunha directa de certos aspectos do alegado cartel, não participou em qualquer discussão relativa ao acordo comum e, designadamente, não participou na sua celebração, o que implicava que não foi testemunha directa quanto a este aspecto.

103    Em sexto lugar, o depoimento de M. é vago no que respeita à formação, conteúdo e execução do acordo comum e não referia qualquer reunião ou discussão. Segundo a recorrente, as declarações de M. relativas ao referido acordo representam mais um sentimento pessoal do que uma exposição completa e coerente dos factos respeitantes a um acordo.

104    Em sétimo lugar, o depoimento de M. não era corroborado por provas escritas contemporâneas, sendo refutado tanto pelo acordo GQ e pelo acordo EQ como por outros depoimentos. Além disso, as declarações desta testemunha não coincidiam com as outras declarações da ABB e estavam em contradição com as provas apresentadas por outros participantes no cartel.

105    Em particular, a recorrente sustenta que o pedido de imunidade de coimas da ABB de 11 de Março de 2004 não incluía qualquer descrição do acordo comum tal como apresentado na decisão impugnada, uma vez que as declarações da ABB não davam a entender que ela se tinha comprometido a não penetrar no mercado europeu. Do mesmo modo, V.‑A., um outro empregado da ABB, declarou que foi informado por M. de que a Europa e a América do Norte estavam excluídas do âmbito de aplicação do cartel.

106    A Comissão contesta a procedência dos argumentos da recorrente.

–       Apreciação do Tribunal Geral

107    Em primeiro lugar, resulta dos n.os 88 e 89 supra que não há que tratar automaticamente com prudência os elementos apresentados por uma empresa que tenha requerido o benefício de uma imunidade de coimas. No que respeita ao caso específico das testemunhas, é certamente possível que os empregados de tal empresa, que têm o dever de actuar no interesse desta, partilhem a vontade de apresentar tantos elementos de acusação quanto possível, considerando igualmente que a sua cooperação no âmbito do processo pode ter uma influência positiva no seu futuro profissional. No entanto, se assim for, os empregados em causa estarão igualmente conscientes das consequências negativas potenciais da apresentação de elementos inexactos, que se tornam mais sensíveis devido à exigência de confirmação.

108    Além disso, não se pode considerar que os elementos apresentados pela ABB não eram susceptíveis de ter efeitos prejudiciais para ela. Com efeito, na medida em que os referidos elementos foram apresentados antes do envio da comunicação de acusações, nem a ABB nem os seus empregados e o seu ex‑empregado podiam ter certezas quanto ao alcance e conteúdo exacto das acusações que iam ser feitas à ABB.

109    Quanto a M., a recorrente sustenta com razão que um ex‑empregado, em princípio, já não tem a obrigação de agir no interesse do seu antigo empregador no que respeita à cooperação voluntária num procedimento administrativo. No entanto, isso implica igualmente que, em princípio, ele não tem interesse em prestar informações inexactas neste contexto, independentemente da questão de saber se se expõe a acções cíveis e se sabia que as suas declarações não seriam objecto de um interrogatório contraditório.

110    É igualmente verdade que o consultor externo da ABB interveio num momento exacto da entrevista de M. para lhe sugerir que podia ser rentável para os produtores japoneses penetrar no mercado europeu, facto de que M. não parecia convencido. Por conseguinte, há que considerar que M. manifestava dúvidas quanto ao interesse comercial dessa diligência, devendo‑se ter isso em conta na apreciação do conteúdo do seu depoimento. No entanto, a recorrente não explica em que medida esta intervenção do consultor externo da ABB afecta a credibilidade do depoimento de M. quanto a outros aspectos.

111    Em segundo lugar, o facto de ter decorrido um certo prazo entre a apresentação do pedido de imunidade de coimas da ABB e a entrevista de M. não põe em causa, enquanto tal, o valor probatório desta última. Com efeito, justifica‑se que a Comissão obtenha provas suplementares no decurso do seu inquérito, com o objectivo de dispor de todos os elementos pertinentes para a apreciação da existência de uma infracção, designadamente à luz das observações das empresas em causa. Em contrapartida, o prazo decorrido entre a prestação do depoimento e os factos sobre os quais incide pode ser pertinente na apreciação da sua credibilidade, dado que, regra geral, as testemunhas podem prestar um depoimento mais pormenorizado e mais fiável quanto a acontecimentos recentes. Ora, no caso em apreço, o prazo de três anos e três meses decorrido entre o fim do envolvimento de M. no cartel e a apresentação do seu testemunho não é suficientemente longo para influenciar a sua credibilidade.

112    Em terceiro lugar, não se observa que M. se tenha manifestado enquanto representante oficial da ABB. Com efeito, antes de mais, esse papel parece ter sido assumido, no essencial, pelos consultores externos da ABB. Em seguida, tal como acima observado no n.° 109, no momento em que prestou o seu depoimento, M. já não tinha, a priori, o dever de agir no interesse do seu antigo empregador e também não há indícios que levem a crer que se tivesse preparado de forma sistemática para a reunião consultando outros empregados da ABB e documentos que estes tivessem. Finalmente, as questões apresentadas pela Comissão nas entrevistas não eram relativas à posição oficial da ABB sobre os assuntos abordados, mas antes aos conhecimentos pessoais de M.

113    Em quarto lugar, a recorrente sustenta acertadamente que o testemunho de M. não parece ser o resultado de uma reflexão especialmente aprofundada e que também não foi revisto após reflexão e verificação suplementares. Com efeito, o depoimento foi prestado verbalmente e não há qualquer indício de que anteriormente tenham sido apresentadas questões escritas pela Comissão a M. nem de que as declarações relativas ao acordo comum e aos obstáculos à entrada no mercado do EEE tenham sido verificadas e revistas posteriormente por ele.

114    Em contrapartida, o facto de M. ter apresentado várias declarações sucessivas que não foram todas evidenciadas pela Comissão não põe em causa a credibilidade do seu depoimento. Com efeito, é normal, por um lado, que uma testemunha se expresse sucessivamente sobre diferentes aspectos e pormenores de um assunto e, por outro, que algumas das suas declarações não sejam pertinentes em relação ao objecto do inquérito da Comissão ou sejam relativas a factos que são demonstrados, de forma mais convincente, por outras provas.

115    Em quinto lugar, a alegação da recorrente segundo a qual M. não foi testemunha directa deve ser rejeitada. Com efeito, M. foi um dos representantes da ABB no consórcio entre 1988 e 2002, ou seja, durante quase todo o tempo de funcionamento do mesmo, quando a própria ABB era um dos principais actores. M. foi, pois, testemunha directa e privilegiada das circunstâncias que apresentou.

116    A este respeito, há que admitir que, no seu testemunho, M. confirmou que não estava presente aquando da celebração do acordo comum. Do mesmo modo, interrogado quanto à questão de saber se o tema do acordo comum foi suscitado nas reuniões a que assistiu, M. respondeu que não era necessário evocá‑lo, dado que o acordo comum era evidente. No entanto, estas circunstâncias não põem em causa o valor probatório do depoimento de M. Com efeito, por um lado, uma testemunha pode provar um fenómeno duradouro mesmo que não tenha assistido ao seu início. Por outro, se M. declarou que a questão do acordo comum não foi discutida expressamente nas reuniões em que participou, resulta do seu depoimento que, em sua opinião, era assim, porque o conteúdo do referido acordo estava compreendido, aceite e posto em prática pelos participantes no cartel sem que fosse necessária uma discussão explícita.

117    Em sexto lugar, quanto ao conteúdo do depoimento de M., este declarou que existia entre os produtores japoneses e europeus um acordo relativo à protecção mútua dos mercados domésticos, anterior ao acordo GQ, que esse acordo era uma condição necessária para a celebração dos acordos relativos a outras regiões e que o respeito das regras do mesmo implicava que os produtores japoneses não penetrassem no mercado doméstico dos produtores europeus, mesmo que fossem capazes de o fazer no plano técnico. M. explicou igualmente, neste contexto, o mecanismo de notificação e de contabilização, bem como o facto de os projectos de MCIG nos países construtores não serem objecto de discussões entre os dois grupos de produtores e não serem imputados nas quotas previstas pelo acordo GQ.

118    Assim, as declarações de M. confirmam a existência do acordo comum invocado pela Comissão e não podem ser qualificadas como elemento vago que traduz sentimentos pessoais, uma vez que dão pormenores quanto à duração do referido acordo, ao seu conteúdo e aos participantes no mesmo. A ausência de especificações sobre a execução desse acordo não é nada surpreendente, dado que o compromisso essencial das partes consistia em não terem actividade em certos mercados. De resto, M. descreveu a parte do acordo comum que exigia medidas de execução, ou seja, o mecanismo de notificação e de contabilização.

119    Em sétimo lugar, a questão de saber se o depoimento de M. é corroborado, de acordo com a jurisprudência acima referida no n.° 84, e se é posto em causa por elementos provenientes de outras empresas ou pelo acordo GQ e pelo acordo EQ, será tratada adiante nos n.os 129 a 195.

120    Quanto às alegadas incoerências entre o depoimento de M. e os outros elementos apresentados pela ABB, esta última evocou expressamente nas suas observações de 11 de Março de 2004 a existência de um acordo comum por força do qual as duas sociedades japonesas não iam apresentar propostas para os projectos europeus e as sociedades europeias não iam apresentar propostas para os projectos japoneses.

121    Neste contexto, é natural que a ABB se tenha referido a duas sociedades japonesas, a saber, a Japan AE Power Systems Corp. e a TM T & D, uma vez que, no momento da apresentação das suas declarações, era no seio destas sociedades comuns que se agrupavam as actividades em matéria de MCIG da Fuji, da Hitachi, da recorrente e da Toshiba. É também certo que a Comissão podia interpretar esta declaração no sentido de que indicava que as referidas empresas participavam elas próprias no acordo comum. Com efeito, no pedido de imunidade de coimas inicial, de 3 de Março de 2004, a ABB já tinha especificado que, segundo o seu conhecimento, o cartel existia há mais de dez anos, o que implica que a sua formação antecedeu claramente a criação da Japan AE Power Systems e a da TM T & D.

122    Quanto aos depoimentos dos empregados da ABB, Wi. declarou que a ausência das empresas japonesas do mercado europeu era o resultado de um sistema de protecção dos mercados japonês e europeu, motivado pelo facto de cada um dos dois grupos de produtores não pretender que o outro grupo interviesse no seu mercado doméstico. Do mesmo modo, P. referiu‑se a um acordo comum com as empresas japonesas nos termos do qual estas últimas não iam participar no mercado europeu e as empresas europeias não iam participar no mercado japonês. Assim, os testemunhos de Wi. E de P. confirmam a existência do acordo comum.

123    A mesma constatação é aplicável ao depoimento de V.‑A. Interrogado sobre a existência de um qualquer acordo entre os produtores europeus e japoneses, este referiu um acordo entre os produtores japoneses e europeus por força do qual as empresas europeias não iam «atacar» as empresas japonesas no mercado japonês e vice‑versa. Além disso, V.‑A. declarou que participou numa discussão explícita entre as empresas europeias e o representante de uma empresa japonesa sobre o cumprimento deste acordo, suscitada por tentativas das empresas japonesas de penetrarem no mercado europeu.

124    No que respeita à alegada exclusão de certos territórios do âmbito de aplicação do cartel mundial, V.‑A., por um lado, declarou que a América do Norte estava excluída por uma razão específica, ou seja, o risco das sanções que a descoberta do cartel criaria. Por outro, explicou que a exclusão dos países da Europa Ocidental significava que os projectos de MCIG em causa não eram discutidos pelos produtores europeus nas reuniões em que esteve presente, que eram as do cartel mundial anteriormente regulado pelo acordo GQ e pelo acordo EQ, mas noutra ocasião. Ora estas declarações são plenamente compatíveis com o depoimento de M.

125    Cumpre, no entanto, admitir que, tal como acima observado no n.° 110, M. não estava convencido do interesse comercial das empresas japonesas em penetrarem no mercado europeu dos projectos de MCIG. No entanto, a posição de M., partilhada por P., não prejudica o facto de, tanto segundo as quatro testemunhas da ABB como segundo a própria ABB, as empresas japonesas se terem comprometido a não penetrar no mercado do EEE apesar de terem sido capazes de o fazer ao nível técnico.

126    Em conclusão, cabe observar que os elementos apresentados pela ABB constituem elementos susceptíveis de provar a existência do acordo comum. São também coerentes no que respeita à existência e conteúdo fundamental do acordo comum.

127    Além disso, as declarações da ABB foram prestadas em nome de uma empresa e decorre do seu conteúdo que se baseiam em investigações internas e em discussões com trabalhadores da empresa. Portanto, há que reconhecer‑lhes um certo nível de valor probatório.

128    As declarações prestadas pelas quatro testemunhas em causa, por sua vez, são credíveis, uma vez que são provenientes de testemunhas directas das circunstâncias relatadas e das circunstâncias do caso não decorre que as referidas testemunhas tenham sido motivadas a apresentar elementos deformados. Assim, cumpre atribuir‑lhes uma força probatória elevada.

 Quanto à confirmação dos elementos apresentados pela ABB

–       Argumentos das partes

129    A recorrente contesta que, no presente caso, tenha tido lugar uma confirmação adequada dos elementos apresentados pela ABB.

130    Em primeiro lugar, as declarações feitas pela Fuji na sua resposta à comunicação de acusações não eram diretamente opostas aos seus interesses e, portanto, não poderiam servir para confirmar a existência do acordo comum. Além disso, a Fuji indicou que a sua ausência do mercado europeu era devida aos obstáculos económicos e técnicos. Do mesmo modo, devido a não ter participado em todas as reuniões do acordo GQ, a Hitachi poderia ter uma percepção diferente da das outras partes que consideram que o acordo comum não existia.

131    Em segundo lugar, a recusa, pela Hitachi, da proposta da Alstom, apresentada em Julho de 2002, de celebrar um acordo comum relativo aos projectos de MCIG na Europa e englobando a Europa Central e Oriental não constituía uma prova da existência do acordo comum. Segundo a recorrente, a Comissão não tomou em consideração a evocação, pela Hitachi, dos obstáculos comerciais que limitavam a presença dos produtores japoneses no mercado europeu. Além disso, supondo que o acordo comum foi essencial para o funcionamento do acordo GQ, a recusa de encerrar o mercado europeu deveria ter conduzido ao desmoronamento do acordo. Ora, tal não teria sido o caso.

132    Em terceiro lugar, a falta de contestação do acordo comum pela Areva e pela Alstom não era pertinente para o caso em apreço.

133    A Comissão contesta a procedência dos argumentos da recorrente.

–       Apreciação do Tribunal Geral

134    Em primeiro lugar, na sua resposta à comunicação de acusações, a Fuji declarou que tinha conhecimento do acordo comum por força do qual os produtores japoneses não tentariam penetrar no mercado europeu, não deixando de especificar que a principal razão da ausência da Fuji do mercado do EEE era não se tratar de um fornecedor significativo credível de MCIG na Europa.

135    Na medida em que admitiu, pelo menos indirectamente, que a sua ausência do mercado europeu era, em parte, devida ao acordo comum, a Fuji reconheceu um facto que podia ser invocado contra ela pela Comissão. Por conseguinte, contrariamente ao que alega a recorrente, a declaração da Fuji é contrária aos seus interesses, uma vez que reconhece implicitamente que participou numa infracção.

136    É certo que a declaração da Fuji é relativamente vaga, uma vez que se limita a evocar o compromisso dos produtores japoneses de não penetrarem no mercado europeu. No entanto, fazendo‑o, a Fuji corroborou o elemento essencial decorrente dos elementos apresentados pela ABB e de que a Comissão acusou os produtores japoneses. Assim, a declaração em causa não deixa de ser pertinente no presente caso.

137    Cabe igualmente salientar que a Fuji desempenhava um papel secundário no interior do cartel, tal como substancialmente alega a recorrente. Em particular, como decorre do considerando 150 da decisão impugnada, a Fuji era a única empresa japonesa que não era membro do comité do grupo dos produtores japoneses, responsável designadamente pela concertação entre os dois grupos de produtores no âmbito do acordo GQ. Ora, cumpre considerar que, em princípio, uma empresa que desempenhe um papel secundário no seio de um cartel está ao corrente do conteúdo essencial dos acordos que o referido cartel engloba, mesmo que não conheça os pormenores de funcionamento deste cartel e de todas as trocas de informações ocorridas no seu interior.

138    Além disso, é certo que, na sua declaração, a Fuji se referiu à existência dos obstáculos técnicos e comerciais à penetração do mercado do EEE. No entanto, esses obstáculos não foram invocados como razão única da ausência da Fuji do referido mercado, mas apenas como razão principal. De resto, quando a Fuji evocou os diversos obstáculos em questão, referiu‑se à sua pequena quota do mercado mundial que a prejudicava em relação aos seus concorrentes mais importantes, tanto europeus como japoneses. Assim sendo, não se observa que a sua argumentação quanto a este aspecto possa ser transposta para a dos outros produtores japoneses.

139    À luz do exposto, há que concluir que a declaração feita pela Fuji na sua resposta à comunicação de acusações tende a confirmar os elementos apresentados pela ABB, apesar de o seu valor probatório ser limitado.

140    Resulta do considerando 127 da decisão impugnada que, na reunião de 10 de Julho de 2002 em que foi discutida a evolução dos métodos de funcionamento do cartel depois de a Siemens e a Hitachi terem retomado a sua participação no mesmo, a Alstom apresentou uma proposta segundo a qual os produtores europeus deviam permanecer na Europa e os produtores japoneses deviam permanecer no Japão e não tentar penetrar no mercado europeu. Além disso, especifica‑se nesse considerando que, na reunião subsequente de 15 de Julho de 2002, o representante da Hitachi indicou que esta recusava essa proposta, que os produtores europeus reagiram declarando que a Europa, incluindo a Europa Central e Oriental, era o seu mercado e que pretendiam manter os preços praticados na Europa Ocidental e anunciaram que a questão ia ser novamente discutida se assim não fosse.

141    À primeira vista, este resumo das reuniões de 10 e 15 de Julho de 2002, baseado em elementos fornecidos pela Hitachi, leva a crer que a Alstom propôs a celebração de um novo acordo que foi recusado pela Hitachi e não foi discutido posteriormente, o que implicava que, pelo menos a partir de Julho de 2002, não existiu qualquer acordo relativo ao comportamento dos produtores japoneses no mercado do EEE.

142    No entanto, o resumo da reunião de 15 de Julho de 2002 revela, por um lado, que a Hitachi não rejeitou a própria ideia de uma repartição de mercados mas apenas a proposta concreta da Alstom. Por outro lado, indica‑se nesse resumo que a Hitachi salientou que as reivindicações dos produtores europeus incluíam a Europa Central e Ocidental, o que dá a entender que a sua oposição se prendia com este aspecto específico, mas não com a situação na Europa Ocidental.

143    Cumpre igualmente observar que a apresentação da proposta em apreço, pela Alstom, põe em causa a argumentação da recorrente e da Hitachi no que respeita à situação concorrencial no mercado do EEE. Com efeito, supondo que, tal como referem a recorrente e a Hitachi, os produtores japoneses não tivessem sido considerados concorrentes credíveis no mercado do EEE devido à existência de obstáculos intransponíveis à entrada, um acordo relativo a esse mesmo mercado teria efectivamente sido inútil. Nesta hipótese, os produtores europeus, conscientes desta circunstância graças à sua posição privilegiada na Europa, não teriam qualquer motivação para propor tal acordo. Ora, resulta do resumo apresentado pela Hitachi que a proposta da Alstom efectivamente abrangia tanto o mercado do EEE como o da Europa Central e Oriental.

144    Nestas circunstâncias, há que acolher a interpretação segundo a qual, na reunião de 10 de Julho de 2002, a Alstom propôs o alargamento do acordo comum, tal como invocado pela Comissão, aos países da Europa Central e Oriental.

145    Por um lado, esta interpretação implica que a proposta da Alstom constitui uma prova de que o acordo comum existia no momento em que foi feita. Por outro lado, a rejeição da referida proposta pela Hitachi não equivale a uma rejeição do acordo comum enquanto tal, representando unicamente uma recusa do alargamento deste. Por conseguinte, a alegação da recorrente segundo a qual o acordo GQ deveria ter‑se «desmoronado» na sequência da reunião de 15 de julho de 2002 assenta numa premissa errada.

146    Em face do exposto, há que considerar que a proposta feita pela Alstom na reunião de 10 de Julho de 2002 confirma os elementos apresentados pela ABB.

147    Em terceiro lugar, tal como acima observado no n.° 50, a posição alegadamente neutra da Alstom e da Areva não pode ser interpretada como uma prova da existência do acordo comum. Portanto, esta circunstância não é susceptível de confirmar os elementos apresentados pela ABB.

 Quanto ao mecanismo de notificação e de contabilização

–       Argumentos das partes

148    A recorrente argumenta que a existência do mecanismo de notificação e de contabilização é improvável e não foi provada.

149    Em primeiro lugar, os produtores japoneses não eram considerados uma ameaça concorrencial no mercado europeu, de modo que não era necessário oferecer‑lhes uma compensação através do referido mecanismo. Segundo a recorrente, se a notificação tinha por objectivo permitir a contabilização, os produtores europeus não estavam motivados para a realizar.

150    Em segundo lugar, atenta a natureza exacta do acordo GQ, seria improvável que o próprio acordo ou documentos posteriores não referissem o mecanismo de notificação e de contabilização.

151    Em terceiro lugar, a tese da Comissão assentava numa notificação obrigatória e sistemática, uma vez que só um mecanismo abrangendo, pelo menos, uma parte significativa dos projectos de MCIG em causa podia permitir que os produtores japoneses acompanhassem e verificassem o processo de contabilização. Ora, no caso em apreço, a Comissão não fez prova bastante nem da existência do mecanismo de notificação e de contabilização nem do seu carácter sistemático.

152    Quanto a este aspecto, nos seus depoimentos, M. e P. indicaram que a lista dos projectos de MCIG na Europa e a atribuição destes últimos não eram discutidas com as empresas japonesas. Além disso, as listas em causa não permitem demonstrar a existência de uma notificação sistemática.

153    As declarações prestadas pela Hitachi no seu pedido de clemência e na sua resposta à comunicação de acusações, por sua vez, são apenas uma interpretação dos factos por esta última empresa. Em quaisquer circunstâncias, essas declarações não são relativas ao período posterior à interrupção pela Hitachi da sua participação no cartel em 1999. Além disso, a Hitachi apresentou uma resposta suplementar à comunicação de acusações, que visava reduzir o valor das declarações prestadas na resposta inicial. Do mesmo modo, tendo em conta o nível de precisão do pedido de clemência da Hitachi, as declarações em causa, que foram apresentadas posteriormente, são desprovidas de qualquer credibilidade.

154    Além disso, a própria Comissão, nos considerandos 148 e 162 da decisão impugnada, reconheceu que a notificação não podia ser efectuada de forma regular. A Fuji confirmou este aspecto na sua resposta à comunicação de acusações e a Hitachi não o impugnou nas suas declarações relativas à notificação e à contabilização. No que respeita ao conteúdo do acordo EQ, a recorrente alega, por um lado, que ignorava a existência deste documento que, consequentemente, é irrelevante no que lhe diz respeito. Por outro, segundo o anexo 2 do referido acordo, a notificação dos projectos de MCIG na Europa aos produtores japoneses era voluntária e não obrigatória.

155    A Comissão contesta a procedência dos argumentos da recorrente.

–       Apreciação do Tribunal Geral

156    Em primeiro lugar, cumpre observar que as alegações da Comissão quanto ao mecanismo de notificação e de contabilização não se baseiam exclusivamente na tese segundo a qual os produtores japoneses eram vistos como concorrentes credíveis no mercado do EEE. Com efeito, a Comissão considera que recolheu provas positivas da existência do referido mecanismo. Nestas circunstâncias, há que analisar o valor probatório dos elementos evidenciados pela Comissão para verificar se constituem prova bastante da existência do mecanismo de notificação e de contabilização.

157    Neste contexto, o argumento da recorrente segundo o qual, se a notificação tivesse tido por objectivo permitir a contabilização, os produtores europeus não estariam motivados para a efectuar, não tem qualquer fundamento. Baseia‑se unicamente numa apreciação do mecanismo de notificação e de contabilização enquanto elemento isolado. Ora, esta perspectiva não corresponde à posição da Comissão, tal como acima resumida no n.° 90, segundo a qual o referido mecanismo se inscrevia no âmbito mais geral do acordo comum.

158    Em segundo lugar, embora o mecanismo de notificação e de contabilização carecesse de algumas medidas de execução, estas não eram especialmente complicadas, uma vez que consistiam essencialmente na comunicação de alguns dados pelo grupo europeu ao grupo japonês, a qual, além disso, era paralela à estabelecida nos termos do acordo GQ no que respeita aos projectos de MCIG fora do EEE. Por conseguinte, não se verifica que estas medidas ou o próprio mecanismo de notificação e de contabilização tivessem necessariamente que ser expressos num documento escrito, tendo igualmente em conta a vontade das partes no cartel, atestada pelos cuidados de organização e técnicos referidos nos considerandos 170 a 176 da decisão impugnada, de reduzir o risco de este ser descoberto.

159    Em terceiro lugar, no seu depoimento, M. afirmou expressamente que existia o mecanismo de notificação e de contabilização. Declarou igualmente que este mecanismo não era relativo aos projectos de MCIG nos países construtores, ou seja, no Japão e em certos países europeus.

160    A existência de um mecanismo que consistia em imputar o valor dos projectos de MCIG no EEE na quota mundial estipulada no acordo GQ foi igualmente afirmada nas declarações da ABB.

161    Em contrapartida, como argumenta a recorrente, não resulta das listas dos projectos apresentadas pela ABB que tenham sido regularmente notificados aos produtores japoneses projectos de MCIG na Europa. Assim sendo, as listas em causa não constituem uma prova do mecanismo de notificação e de contabilização.

162    Quanto aos elementos provenientes da Hitachi, cabe observar que, lida no contexto das frases imediatamente anteriores, a declaração segundo a qual a Siemens fazia circular regularmente os quadros que esquematizavam uma parte dos projectos de MCIG atribuídos aos diversos membros do cartel, remete para projectos de MCIG fora do EEE. Por conseguinte, esta declaração também não é pertinente no que respeita à prova do mecanismo de notificação e de contabilização, tal como alegado pela Comissão, que abrangia projectos de MCIG no EEE.

163    Em contrapartida, na sua resposta à comunicação de acusações, a Hitachi declarou que, antes de ter interrompido a sua participação no cartel em 1999, os produtores europeus comunicavam aos produtores japoneses os pormenores dos projectos de MCIG que iam fornecer na Europa, a fim de permitir que esses projectos fossem tidos em consideração na determinação da quota dos projectos de MCIG fora do EEE atribuídos aos dois grupos de produtores, nos termos do acordo GQ.

164    Esta declaração confirma expressamente a existência do mecanismo de notificação e de contabilização invocado pela Comissão até 1999. Além disso, a sua força probatória é elevada por duas razões. Por um lado, a referida declaração vai ao encontro dos interesses da Hitachi, uma vez que implica a existência de um nexo entre as actividades de conluio no EEE e os produtores japoneses, e, devido a esse facto, constitui um elemento de acusação. Por outro lado, verifica‑se, lendo a passagem em questão da resposta à comunicação de acusações, que a Hitachi não estava consciente das deduções que se podiam fazer a partir desta declaração.

165    Além disso, tal como acima observado no n.° 54, a Hitachi não negou o conteúdo factual das suas declarações relativas ao mecanismo de notificação e de contabilização na sua resposta suplementar à comunicação de acusações.

166    Além disso, o facto de o mecanismo de notificação e de contabilização não ter sido referido no pedido de clemência da Hitachi, anterior à resposta à comunicação de acusações, não tende a reduzir o valor probatório das declarações desta empresa relativas ao referido mecanismo. Com efeito, é normal que, durante o processo, uma empresa especifique a sua posição quanto a certas circunstâncias do caso em apreço, em particular na sequência do envio da comunicação de acusações, que formaliza as alegações e elementos tidos em consideração pela Comissão.

167    Por sua vez, a Fuji, na sua resposta à comunicação de acusações, declarou que as informações relativas à repartição dos projectos de MCIG nos países europeus excluídos do âmbito de aplicação do acordo GQ não eram sistematicamente comunicadas aos produtores japoneses e que, consequentemente, a Fuji não estava a par do funcionamento do acordo EQ.

168    Cumpre, no entanto, observar, por um lado, que a tomada de posição da Fuji não é contrária aos seus interesses, uma vez que tem por objectivo contestar a existência de qualquer infracção ao artigo 81.° CE e ao artigo 53.° do acordo EEE. É, pois, dotada de força probatória inferior à dos elementos pertinentes apresentados pela ABB e pela Hitachi. Por outro lado, importa salientar que o papel secundário da Fuji no cartel, recordado no n.° 137, supra, pode explicar o facto de esta não participar em todas as trocas de informações oriundas do grupo dos produtores europeus. Esta circunstância põe igualmente em causa a fiabilidade das declarações da Fuji quanto a este aspecto em relação à dos elementos facultados pela ABB e pela Hitachi, que eram membros dos comités dos respectivos grupos e, por esta razão, estavam mais estreitamente associados ao funcionamento pormenorizado do alegado cartel.

169    No que respeita ao acordo EQ, em conformidade com o n.° 4 da parte «E (E‑Members)» do seu anexo 2, os produtores europeus «decidem sobre a notificação dos projectos ao [grupo dos produtores japoneses]». Decorre do contexto do anexo 2 que a comunicação das informações devia ter lugar antes da atribuição dos projectos de MCIG em causa.

170    Em contrapartida, a referida cláusula não abrangia o acompanhamento dos projectos já atribuídos. Por conseguinte, se o seu conteúdo constitui um indício que leva a crer que os produtores japoneses eram considerados como concorrentes credíveis para o fornecimento de certos projectos de MCIG no EEE (v. n.os 184 a 191 infra), as medidas que estabelecia não fazem parte do mecanismo de notificação e de contabilização tal como alegado pela Comissão. Portanto, nem o anexo 2 do acordo EQ nem as referências ao conteúdo deste anexo efectuadas nos considerandos 148 e 162 da decisão impugnada são relevantes no que respeita à prova deste mesmo mecanismo.

171    Em face do exposto, há que concluir que a existência do mecanismo de notificação e de contabilização foi suficientemente demonstrada pelos elementos apresentados pela ABB, tais como confirmados pelas declarações da Hitachi na sua resposta à comunicação de acusações.

172    Contrariamente ao que refere a recorrente, não resulta dos elementos indicados no número anterior que o mecanismo de notificação e de contabilização tenha sido aplicado ocasionalmente e de maneira discricionária. Com efeito, embora as declarações da ABB e da Hitachi e o depoimento de M. não abordem expressamente este assunto, resulta claramente das formulações utilizadas nos documentos em causa que a notificação era um procedimento efectuado regularmente e aplicável à totalidade dos participantes e dos projectos em causa. Tal como acima se explica no n.° 168, as declarações da Fuji, por sua vez, são menos fiáveis quanto a este aspecto do que os elementos fornecidos pela ABB e pela Hitachi.

173    Quanto ao período de execução do mecanismo de notificação e de contabilização, as declarações da ABB não visam um período específico e, portanto, a priori, podem ser interpretadas no sentido de que se reportam à totalidade da infracção. As declarações de M., por sua vez, são relativas ao período durante o qual participou nas actividades do cartel, ou seja, entre 1988 e Junho de 2002. No entanto, na medida em que acima se observou, no n.° 84, que os elementos apresentados pela ABB deviam ser confirmados por outros elementos, cabe salientar que as declarações da Hitachi são relativas ao período anterior ao momento em que esta última interrompeu a sua participação no cartel em 1999. Assim sendo, há que considerar que a existência do mecanismo de notificação e de contabilização foi demonstrada quanto a este último período.

174    No que respeita à relevância do referido mecanismo, há que considerar que constitui um indício sério de que os produtores japoneses eram considerados pelos produtores europeus como potenciais concorrentes credíveis no mercado do EEE. Com efeito, admitindo que o mercado europeu fosse efectivamente impenetrável para os produtores japoneses, devido a existirem obstáculos à entrada, os produtores europeus não tinham razão para notificar os resultados da atribuição de certos projectos de MCIG no EEE nem, a fortiori, para contabilizar esses mesmos projectos na quota conjunta «europeia» prevista no acordo GQ, pois essa contabilização equivalia a privá‑los de uma parte dos projectos de MCIG nas regiões abrangidas pelo acordo GQ. Portanto, a existência de tal mecanismo de notificação e contabilização implica que as empresas japonesas podiam penetrar no mercado europeu. Se não o fizeram, é porque se comprometeram a não o fazer, em troca de uma parte mais importante de projectos de MCIG fora do EEE. Assim, o mecanismo em causa constitui um nexo entre as actividades colusórias no EEE e os produtores japoneses e, por isso, uma prova indirecta da existência do acordo comum.

175    Em face do exposto, há que concluir que foi provada a existência da notificação regular, ao grupo de produtores japoneses, de determinados projectos de MCIG no EEE, depois da atribuição desses mesmos projectos e da sua contabilização na quota conjunta «europeia» prevista pelo acordo GQ, no que respeita ao período entre 1988 e a interrupção pela Hitachi da sua participação no cartel em 1999, pelas declarações da ABB, pelas da Hitachi e pelo depoimento de M.. Além disso, o mecanismo em causa constitui uma prova indirecta da existência do acordo comum invocado pela Comissão.

 Quanto aos elementos que alegadamente contradizem a existência do acordo comum

–       Argumentos das partes

176    Em primeiro lugar, a recorrente argumenta que os documentos da época dos factos não remetem para o acordo comum. Segundo ela, apesar de estipularem regras pormenorizadas de funcionamento do cartel, o acordo GQ e o acordo EQ excluem a Europa do seu âmbito de aplicação. Ora, não seria plausível que os acordos em causa abstraíssem totalmente de um dos elementos essenciais do cartel. Considera que, se os produtores dos MCIG tivessem tido a intenção de criar um cartel mundial reservando para si os mercados dos países construtores, teriam estabelecido cláusulas de salvaguarda no quadro do seu acordo escrito em vez de excluírem os territórios em causa do seu âmbito de aplicação, baseando‑se num acordo não escrito.

177    Assim, segundo a recorrente, o acordo GQ e o acordo EQ não podem ser considerados provas documentais da existência do acordo comum. Isso é tanto mais verdade quanto os produtores japoneses não participavam no acordo EQ e não tinham conhecimento dele.

178    Além disso, o acordo EQ confirmava o facto de os produtores japoneses não representarem uma ameaça credível no mercado europeu, uma vez que previa que, quanto aos projectos europeus, só os produtores europeus apresentavam propostas de apoio. Isso implicava que os clientes europeus não considerassem credível uma proposta proveniente de um produtor japonês.

179    Em segundo lugar, a recorrente acrescenta que os seus empregados não tinham conhecimento do acordo comum e que nenhum deles participou nas actividades relativas ao mesmo.

180    Do mesmo modo, a Comissão não teve em conta elementos de prova, incluindo testemunhos, apresentados pela recorrente, pela Hitachi, pela Siemens, pela Toshiba e pela VA TECH, que indicavam que o acordo comum nunca tinha existido.

181    Neste contexto, o valor probatório dos elementos provenientes da Siemens e da VA TECH era tanto mais importante quanto estas duas empresas não tinham interesse em contestar a existência do acordo comum, na medida em que a sua participação numa infracção era demonstrada por outras provas.

182    A Comissão contesta a procedência dos argumentos da recorrente.

–       Apreciação do Tribunal Geral

183    Em primeiro lugar, as partes não contestam que o acordo GQ prevê a organização de um cartel relativo aos projectos de MCIG ao nível mundial. No entanto, por um lado, tal como alega a recorrente, este acordo não refere o acordo comum e, por outro, nos termos do seu anexo 2, o referido acordo exclui do seu âmbito de aplicação o Japão, os doze Estados‑Membros da Comunidade Europeia de então e cinco outros países da Europa Ocidental.

184    O acordo EQ, por sua vez, é um acordo de execução do acordo GQ, relativo designadamente à repartição da quota conjunta «europeia» prevista neste último acordo. Foi celebrado unicamente pelas empresas europeias. A recorrente não participava nele. Além disso, o acordo EQ não refere expressamente o acordo comum.

185    Nestas circunstâncias, não se deve considerar que o acordo GQ e o acordo EQ constituem provas documentais da existência do acordo comum.

186    No entanto, a ausência de uma referência expressa a este acordo no texto do acordo GQ e do acordo EQ não implica que esse acordo não tenha existido. Com efeito, o compromisso de um grupo de produtores de não penetrarem num mercado reservado a outro grupo, como o compromisso de que a Comissão acusa os produtores japoneses, baseia‑se num conceito simples que pode ser executado facilmente. Do mesmo modo, esta execução, em princípio, não exige interacção entre as empresas em causa. Por conseguinte, este compromisso pode perfeitamente existir enquanto acordo não escrito, o que permite, além disso, reduzir o risco de ser descoberto.

187    Do mesmo modo, na medida em que os produtores japoneses não eram parte no acordo EQ, a obrigação de apresentar propostas em apoio, prevista no seu artigo 6.°, n.° 4, não podia abrangê‑los. Portanto, a referida cláusula não implica que os produtores japoneses não fossem considerados concorrentes potenciais no mercado do EEE.

188    Cabe ainda salientar que, tal como acima observado no n.° 169, em conformidade com o n.° 4 da parte «E (E‑Members)» do anexo 2 do acordo EQ, os produtores europeus podiam decidir sobre a notificação de certos projectos de MCIG europeus ao grupo dos produtores japoneses, antes da atribuição dos projectos de MCIG em causa.

189    Este elemento permite excluir, em certa medida, a argumentação da recorrente, uma vez que sugere que os produtores europeus consideravam que os produtores japoneses podiam estar interessados, pelo menos, pelo processo de atribuição de certos projectos de MCIG no EEE, e que eram, pois, concorrentes potenciais para esses projectos.

190    No entanto, nada no acordo EQ nem nos outros elementos avançados pela Comissão prova que o mecanismo em questão tivesse sido aplicado pelos produtores europeus ou que os produtores japoneses soubessem da sua existência.

191    Assim sendo, o acordo EQ constitui apenas um indício que leva a crer que os produtores japoneses eram considerados concorrentes credíveis para o fornecimento de determinados projectos de MCIG no EEE, tal como alega a Comissão.

192    Em segundo lugar, a Comissão não cometeu qualquer erro ao considerar que as declarações e testemunhos da ABB, as declarações da Fuji relativas à existência do acordo comum e as declarações da Hitachi relativas à notificação e à contabilização deviam ser consideradas dotadas de uma força probatória mais relevante do que as impugnações da existência do acordo comum pela recorrente, pela Hitachi, pela Siemens, pela Toshiba e pela VA TECH e do que os elementos apresentados por estas empresas.

193    Com efeito, diversamente do primeiro grupo de elementos, as impugnações em apreço não são contrárias aos interesses das empresas em causa, uma vez que visam questionar a existência de qualquer infracção ao artigo 81.° CE e ao artigo 53.° do acordo EEE. Esta afirmação é igualmente aplicável aos testemunhos dos empregados e ex‑empregados, tendo em conta, por um lado, que, em princípio, não se trata de elementos independentes, tal como referido no n.° 59 supra. Por outro lado, no que respeita ao acordo comum, os depoimentos apresentados não fornecem elementos novos em relação aos avançados pelos destinatários da comunicação de acusações.

194    Além disso, não se pode considerar que as empresas europeias, incluindo a Siemens e a VA TECH, não tinham interesse em negar a existência do acordo comum, dado que este último era interpretado pela Comissão na comunicação de acusações como um acordo colusório entre os produtores europeus e os produtores japoneses relativo ao mercado do EEE e, consequentemente, constituía uma violação do artigo 81.° CE e do artigo 53.° do acordo EEE. Ora, essa constatação, pelo menos potencialmente, era prejudicial aos interesses dos produtores europeus, no caso de as outras acusações que lhe eram feitas pela Comissão não terem podido ser suficientemente provadas.

195    À luz do que precede, há que concluir que os elementos avançados pela recorrente não põem em causa o valor dos elementos invocados pela Comissão para demonstrar a existência do acordo comum.

 Quanto à atribuição dos projectos de MCIG no EEE

–       Argumentos das partes

196    A recorrente alega que os elementos invocados não constituem uma prova de que ela participava na repartição dos projectos de MCIG no EEE.

197    A recorrente admite que participou em reuniões com os produtores europeus, mas sustenta que essas reuniões eram unicamente relativas ao acordo GQ e, portanto, não eram constitutivas de uma infracção ao artigo 81.° CE ou ao artigo 53.° do acordo EEE.

198    A recorrente contesta igualmente a alegação de que os produtores japoneses, por vezes, pretendiam responder aos concursos para projectos de MCIG no EEE. Especifica que, salvo uma única excepção, nunca recebeu propostas de concurso da parte de sociedades europeias durante a vigência do cartel.

199    Quanto aos diferentes elementos evocados na decisão impugnada, a recorrente declara que nunca tomou conhecimento das listas dos projectos apresentadas pela ABB e pela Fuji. Nega expressamente ter tido conhecimento do projecto espanhol «MSP via GC», de 1997, pelo qual terá manifestado interesse, segundo uma das listas dos projectos apresentadas pela ABB.

200    Os elementos de prova provenientes da VA TECH referidos no considerando 204 da decisão impugnada também não permitiam estabelecer uma conexão entre projectos de MCIG no EEE e a recorrente ou outro produtor japonês.

201    A Comissão contesta os argumentos da recorrente.

–       Apreciação do Tribunal Geral

202    O processo não contém elementos que levem a crer que, nas reuniões do acordo GQ em que participavam os membros japoneses do cartel, tenham sido discutidos projectos de MCIG no EEE.

203    Também não resulta das listas de projectos fornecidas pela ABB e pela Fuji que, com excepção do alegado interesse da recorrente pelo projecto «MSP via GC» em Espanha, tenham sido discutidos com os produtores japoneses projectos de MCIG no EEE. Ora, não se pode excluir que o interesse referido da recorrente por este último projecto na lista de projectos apresentada pela ABB corresponda a um erro, dada a dimensão da lista dos projectos em causa e o facto de a Comissão não ter identificado outros casos em que um produtor japonês tivesse manifestado o seu interesse por um projecto de MCIG no EEE. De qualquer forma, o conteúdo da lista de projectos da ABB não é confirmado por outros elementos, designadamente pela lista dos projectos Fuji, no que respeita ao projecto «MSP via GC» e, portanto, não podia ser tomado em consideração a este respeito.

204    Além disso, quando, no considerando 125 da decisão impugnada, a Comissão indica que os produtores japoneses, por vezes, pretendiam responder aos concursos europeus, mas, em geral, recusavam essas propostas e notificavam os projectos em causa aos produtores europeus, baseia‑se unicamente nas declarações da ABB e nos depoimentos apresentados pelos seus funcionários. Portanto, não sendo confirmada por outros elementos, esta afirmação não pode ser tomada em consideração.

205    Finalmente, as notas manuscritas de um representante da VA TECH, referidas no considerando 204 da decisão impugnada, incluem, por um lado, uma referência a um projecto de MCIG no EEE e, por outro, a indicação de que convinha discutir um «pacote» de projectos de MCIG com os produtores europeus. No entanto, as duas passagens em apreço estão separadas por várias páginas contendo notas relativas a outros assuntos. Acresce que a referência às empresas japonesas é imediatamente antecedida por notas relativas a um projecto de MCIG fora do EEE. Nestas circunstâncias, as referidas notas não permitem retirar conclusões quanto ao interesse das empresas japonesas por projectos de MCIG na Europa.

206    Em face do exposto, há que concluir que não se provou que as empresas japonesas participaram na atribuição dos projectos de MCIG no EEE.

 Apreciação global

–       Argumentos das partes

207    A título liminar, a recorrente argumenta que, contrariamente ao que refere a Comissão, não era necessário proteger os mercados domésticos dos dois grupos de produtores. Em seu entender, não havia risco ou perigo de os produtores japoneses se tornarem concorrentes no mercado europeu, ou o inverso. A recorrente sustenta igualmente que apenas foi convidada excepcionalmente a apresentar uma proposta para um projecto de MCIG no EEE durante a alegada duração do cartel.

208    A recorrente acrescenta que o objecto e o conteúdo do acordo comum não foram demonstrados. Segundo ela, os elementos invocados pela Comissão não identificavam nem os membros nem a data da celebração do acordo comum, nem o seu destino após a interrupção, pela Siemens e pela Hitachi, da sua participação no cartel, em 1999. Assim, as provas apresentadas pela ABB não evidenciavam, um acordo colusório, representando antes uma «expressão inconsciente» de que os produtores japoneses não estavam em condições de penetrar no mercado europeu e vice‑versa.

209    Além disso, a Comissão não teve em conta as consequências da interrupção, pela Siemens e pela Hitachi, da sua participação no cartel. Segundo a recorrente, supondo que as partes representavam mutuamente uma ameaça concorrencial credível no mercado dos respectivos países construtores, o acordo comum teria sido posto em causa na sequência da saída de dois participantes essenciais no acordo GQ. Além disso, durante os dois anos em que a Siemens e a Hitachi não participaram no acordo, a Hitachi efectuou vendas na Europa e a Siemens efectuou vendas no Japão.

210    Finalmente, a recorrente sustenta que as alegações da Comissão relativas aos «países construtores» e à pertinência do mecanismo de notificação e de contabilização não devem ser tidas em conta. Em sua opinião, estas alegações, designadamente a de que as empresas japonesas tinham conhecimento dos ‘países construtores’, não encontravam apoio em provas distintas do testemunho de M.. Ora, as declarações deste último segundo as quais a identidade e a pertença dos países construtores estavam bem determinadas, não necessitavam de ser discutidas e eram anteriores ao acordo GQ, eram refutadas por outras provas invocadas pela Comissão, segundo as quais estes elementos evoluíram ao longo do tempo. Por conseguinte, o testemunho de M. não era credível quanto a este aspecto.

211    A Comissão contesta os argumentos da recorrente.

–       Apreciação do Tribunal Geral

212    Decorre da análise acima efectuada nos n.os 107 a 175, em primeiro lugar, que as declarações da ABB e os depoimentos dos seus empregados e do seu ex‑empregado referem a existência de um acordo por força do qual os produtores europeus e japoneses se comprometeram reciprocamente a não penetrar nos mercados domésticos do outro grupo. Os referidos elementos permitem igualmente identificar as partes no acordo, entre as quais a recorrente, e concluir que, embora provavelmente seja anterior ao acordo GQ, foi celebrado, o mais tardar, no momento da celebração deste último acordo.

213    Em segundo lugar, a existência do acordo comum referido é corroborada pela proposta apresentada pela Alstom na reunião de 10 de Julho de 2002. A existência do compromisso das empresas japonesas de não penetrarem no mercado europeu é igualmente confirmada pelas declarações da Fuji.

214    Em terceiro lugar, resulta das declarações e do depoimento da ABB, corroborados pelas declarações da Hitachi, que os produtores japoneses aceitaram, pelo menos no que respeita ao período de 1988 a 1999, a notificação regular dos resultados da atribuição de certos projectos de MCIG no EEE e a sua contabilização na quota conjunta «europeia» prevista pelo acordo GQ. Do mesmo modo, por força do n.° 4 da parte «E (E‑Members)» do anexo 2 do acordo EQ, os produtores europeus previram a possibilidade de comunicar aos produtores japoneses os pormenores de certos projectos de MCIG no EEE antes da sua atribuição. Estas duas circunstâncias sugerem que, contrariamente ao que refere a recorrente, os produtores japoneses eram considerados concorrentes credíveis para o fornecimento de certos projectos de MCIG no EEE, mas que se comprometeram a não penetrar no mercado europeu em troca de uma parte maior de projectos de MCIG noutras regiões. Constituem, portanto, provas indirectas da existência do acordo comum entre os produtores europeus e os produtores japoneses.

215    Assim, os elementos referidos pela Comissão sustentam as suas alegações quanto à existência do acordo comum, acima resumidas no n.° 90. Em contrapartida, os elementos invocados pela recorrente e apreciados nos n.os 183 a 195 supra não são susceptíveis de pôr em causa as referidas afirmações.

216    A este respeito, não se provou que as empresas japonesas tenham participado, com os produtores europeus, na atribuição de projectos de MCIG no EEE. No entanto, refira‑se, atenta a natureza do seu compromisso alegado por força do acordo comum, a sua participação neste comportamento não teria sido útil. Com efeito, os produtores japoneses não teriam tido qualquer interesse em intervir na própria atribuição dos projectos de MCIG no EEE, que se tinham comprometido a não ganhar. O seu único interesse seria conhecer o valor dos projectos em causa e a identidade dos seus adjudicatários, para poderem acompanhar a contabilização na quota conjunta «europeia» prevista pelo acordo GQ. Ora, pelo menos no que respeita ao período compreendido entre 1988 e 1999, estas informações eram comunicadas aos produtores japoneses pelo mecanismo de notificação.

217    Quanto às consequências da interrupção, pela Siemens e pela Hitachi, da sua participação no cartel, importa observar, por um lado, que decorre do considerando 187 da decisão impugnada, bem como do testemunho de M. que este acontecimento afectou negativamente a eficácia do cartel, sem que, no entanto, este se tenha «desmoronado». Por outro lado, o período da ausência das duas empresas é insuficiente para que pudesse ter lugar uma penetração significativa do mercado do EEE, tendo em conta, primeiro, a existência de certos obstáculos técnicos e comerciais que não é impugnada pela Comissão, em seguida, o facto de a posição privilegiada dos diferentes produtores nos seus mercados domésticos ter sido artificialmente reforçada devido ao cartel, entre 1988 e 1999, e, finalmente, o facto de os outros produtores terem pretendido adoptar medidas de retaliação contra a Siemens e a Hitachi, como resulta do testemunho de M.

218    Finalmente, não é necessário demonstrar, por um lado, que o mecanismo de notificação e de contabilização não abrangia os projectos de MCIG nos países construtores europeus e, por outro, que o Japão constituía um país construtor, para que o referido mecanismo possa ser considerado um indício relevante da existência do acordo comum, devido ao raciocínio exposto nos n.os 174 e 214 supra. Por conseguinte, a eventual falta de confirmação do testemunho de M. quanto a este aspecto não tem consequências.

219    Refira‑se igualmente que não se verifica qualquer incoerência entre o depoimento de M. e os outros elementos invocados pela Comissão no que respeita ao conceito de países construtores. Com efeito, segundo M., o próprio conceito do acordo comum, enquanto acordo mútuo de não penetrar nos mercados domésticos do outro grupo, estava efectivamente bem determinado, não necessitava de ser discutido e era anterior ao acordo GQ. Assim sendo, na sequência do seu testemunho, o próprio M. declara que, em certos casos, a pertença a um país construtor evoluiu devido a fusões entre os diferentes operadores em causa.

220    Atento tudo o que antecede, há que concluir que foi feita prova bastante da existência do acordo comum e que a Comissão não excedeu a sua competência ao punir a participação da recorrente nesse mesmo acordo.

221    Assim sendo, há que julgar improcedente o primeiro fundamento.

222    Além disso, tal como acima explicado no n.° 95, dado que a Comissão não se apoiou unicamente na conduta das empresas em causa no mercado para concluir pela existência da infracção, não basta à recorrente substituir a explicação da Comissão por uma outra explicação plausível dos factos. Por conseguinte, o terceiro fundamento não merece acolhimento.

223    De igual modo, a conclusão de que a existência do acordo comum foi suficientemente demonstrada, implica que recaiu sobre a Comissão o ónus da prova que lhe incumbe e que, consequentemente, esta respeitou o princípio da presunção de inocência. Por conseguinte, há que rejeitar o quarto fundamento.

224    Finalmente, resulta do exposto que a Comissão podia concluir pela existência do acordo comum sem tomar em consideração, enquanto elementos de acusação, as observações da Fuji que não foram comunicadas à recorrente e a posição alegadamente neutra da Alstom e da Areva. Por conseguinte, em conformidade com o exposto no n.° 51 supra, há que rejeitar, de forma definitiva, o décimo quarto fundamento, relativo a uma alegada violação do direito ao acesso ao processo.

 Quanto ao segundo fundamento, relativo ao facto de a Comissão não ter provado a existência de um acordo que viola o artigo 81.° CE e o artigo 53.° do Acordo EEE

–       Argumentos das partes

225    A recorrente sustenta que a Comissão não identificou qualquer acordo que justifique a aplicação do artigo 81.° CE e do artigo 53.° do Acordo EEE. Em seu entender, a Comissão não indicou o momento em que as partes tinham expresso a sua vontade comum de se comportarem de determinada maneira no mercado e não apresentou provas quanto aos contactos, discussões ou acordos entre elas. Ora, na ausência de prova, as disposições referidas não permitiam que se proibissem várias pessoas de chegarem a uma mesma conclusão quanto a certos aspectos.

226    A Comissão contesta os argumentos da recorrente.

–       Apreciação do Tribunal Geral

227    Segundo a jurisprudência, cabe à Comissão reunir elementos de prova suficientemente precisos e concordantes para basear a firme convicção de que a alegada infracção constitui um acordo ou uma prática concertada na acepção do artigo 81.°, n.° 1, CE (acórdão do Tribunal Geral de 21 de Janeiro de 1999, Riviera Auto Service e o./Comissão, T‑185/96, T‑189/96 e T‑190/96, Colect., p. II‑93, n.° 47). A jurisprudência referida é aplicável, por analogia, ao artigo 53.°, n.° 1, do acordo EEE.

228    No caso em apreço, na decisão impugnada, a Comissão não se manifestou expressamente quanto à questão de saber se o comportamento de que as empresas japonesas são acusadas constituía um acordo ou uma prática concertada. No considerando 248 da decisão impugnada, limitou‑se a observar que a infracção era composta por diversas acções que podiam ser qualificadas como acordos ou práticas concertadas.

229    Portanto, num primeiro momento, há que verificar se o acordo comum constitui um acordo entre empresas na acepção do artigo 81.°, n.° 1, CE, e do artigo 53.°, n.° 1, do acordo EEE.

230    A este respeito, para que exista acordo na acepção do artigo 81.°, n.° 1, CE, basta que as empresas em causa tenham manifestado a sua vontade comum de se comportarem no mercado de modo determinado (v., por analogia, acórdão Cimenteries CBR e o./Comissão, n.° 86 supra, n.° 958, e jurisprudência aí referida). A tomada em consideração dos efeitos concretos de um acordo é supérflua, a partir do momento em que se verificar que esse acordo tem por objectivo restringir, impedir ou falsear a concorrência (v. acórdão Cimenteries CBR e o./Comissão, n.° 86, supra, n.° 837, e jurisprudência aí referida).

231    Ora, no caso em apreço, resulta dos diferentes elementos avançados pela Comissão, designadamente das declarações de ABB e da Fuji, e dos depoimentos de M. e de V.‑A., que, o mais tardar no momento da celebração do acordo GQ, os produtores europeus e japoneses se comprometeram mutuamente a não penetrar nos mercados domésticos do outro grupo. A existência de um compromisso mútuo implica necessariamente a existência de uma vontade comum, mesmo na falta de elementos que permitam determinar com exactidão o momento em que essa vontade foi expressa ou formalizou a sua expressão. Além disso, decorre do n.° 116 supra que M. considerava que não era necessário evocar o acordo comum nas discussões em que participou, pois o conteúdo do referido acordo era compreendido, aceite e aplicado por todos os participantes no cartel sem que houvesse necessidade de uma discussão expressa. Acresce que, tal como acima referido no n.° 123, V.‑A. declarou que participou em discussões explícitas entre as empresas europeias e o representante de uma empresa japonesa sobre o respeito do acordo comum.

232    Do mesmo modo, o facto, comprovado pelas declarações e pelo depoimento da ABB e pelas declarações da Hitachi, de os produtores japoneses terem aceite, durante muitos anos, a notificação dos resultados da atribuição de determinados projectos de MCIG no EEE e o acompanhamento da sua contabilização na quota conjunta «europeia» prevista pelo acordo GQ é incompatível com um simples comportamento paralelo dos concorrentes fora de qualquer concurso de vontades.

233    Aliás, o acordo comum tinha por objecto determinar o comportamento das empresas japonesas face ao mercado do EEE, uma vez que estas se comprometiam a não penetrar nesse mercado. Assim, o referido acordo constituía efectivamente uma reserva do mercado do EEE em benefício dos produtores europeus.

234    Por conseguinte, foi acertadamente que a Comissão considerou que o acordo comum constituía um acordo entre empresas na acepção do artigo 81.°, n.° 1, CE, e do artigo 53.°, n.° 1, do acordo EEE.

235    Nestas circunstâncias, não é necessário continuar a analisar se o acordo comum constituía uma prática concertada por força das mesmas disposições.

236    Face a tudo o que precede, o segundo fundamento deve ser julgado improcedente.

 Quanto ao décimo terceiro fundamento, relativo ao facto de a Comissão ter cometido um erro no cálculo da duração do cartel

–       Argumentos das partes

237    A recorrente sustenta, por um lado, que, na sequência da interrupção, pela Siemens, da sua participação no cartel em Setembro de 1999, o grupo restrito das outras empresas se transformou num fórum de discussão mais flexível sem qualquer objecto ou efeito anticoncorrencial no respeitante à União Europeia.

238    Por outro lado, o facto de a Siemens ter retomado a sua posição no cartel, em 2002, não conduziu a acordos que tivessem por objecto ou por efeito restringir a concorrência na Europa, uma vez que a Hitachi rejeitou a proposta da Alstom no sentido de os mercados europeus e japonês serem reservados, respectivamente, aos produtores europeus e japoneses.

239    Por conseguinte, a recorrente considera que foi erradamente que lhe foi aplicada uma coima correspondente ao período entre 1 de Setembro de 1999 e 11 de Maio de 2004 ou, pelo menos, entre 10 de Julho de 2002 e 11 de Maio de 2004.

240    A Comissão contesta os argumentos da recorrente.

–       Apreciação do Tribunal Geral

241    Segundo a jurisprudência, quando é discutida a existência da infracção, a necessidade de segurança jurídica, de que devem beneficiar os operadores económicos, implica que a Comissão, que tem o ónus da prova das infracções, apresente elementos adequados a fazer prova bastante da existência dos factos constitutivos da infracção. No que respeita à alegada duração de uma infracção, o mesmo princípio da segurança jurídica impõe que, na falta de elementos de prova que permitam determinar directamente a duração da infracção, a Comissão invoque, pelo menos, elementos de prova relativos a factos suficientemente próximos no tempo, de modo a poder‑se razoavelmente admitir que essa infracção perdurou ininterruptamente entre duas datas precisas (acórdãos do Tribunal Geral de 7 de Julho de 1994, Dunlop Slazenger/Comissão, T‑43/92, Colect., p. II‑441, n.° 79; de 6 de Julho de 2000, Volkswagen/Comissão, T‑62/98, Colect., p. II‑2707, n.° 188; e de 5 de Abril de 2006, Degussa/Comissão, T‑279/02, Colect., p. II‑897, n.os 114 e 153).

242    Além disso, o facto de a prova da existência de uma infracção continuada não ter sido feita relativamente a determinados períodos não obsta a que a infracção seja considerada praticada durante um período global mais extenso do que estes, desde que tal conclusão assente em indícios objectivos e concordantes. No âmbito de uma infracção que se estende por vários anos, o facto de as manifestações do acordo ocorrerem em períodos diferentes, podendo ser separados por lapsos de tempo mais ou menos longos, não tem incidência quanto à existência desse acordo, desde que as diferentes acções que fazem parte dessa infracção prossigam uma única finalidade e se inscrevam no âmbito de uma infracção com carácter único e continuado (acórdão do Tribunal de Justiça de 21 de Setembro de 2006, Technische Unie/Comissão, C‑113/04 P, Colect., p. I‑8831, n.° 169).

243    No presente caso, observe‑se, a título liminar, que, na medida em que o compromisso das empresas japonesas por força do acordo comum não consistia numa acção positiva mas sim numa omissão, é intrinsecamente difícil provar que este acordo foi respeitado de forma continuada.

244    No entanto, em primeiro lugar, decorre do depoimento de M. que, até ao final do seu envolvimento no cartel, em Junho de 2002, tanto o acordo GQ como o acordo comum continuaram a ser aplicados com a participação das empresas japonesas distintas da Hitachi, apesar de a ausência desta última e da Siemens tornar a operação menos eficaz. Os outros depoimentos dos empregados da ABB confirmam que o acordo comum prosseguiu entre Julho de 2002 e Maio de 2004. O conteúdo dos depoimentos em causa está igualmente reflectido nas declarações da ABB.

245    Em segundo lugar, na sua resposta à comunicação de acusações, a Fuji confirma que as empresas japonesas participaram na infracção, incluindo no acordo comum, até Setembro de 2000, data em que alega ter abandonado o cartel.

246    Em terceiro lugar, já acima se concluiu no n.° 144 que, na reunião de 10 de Julho de 2002, a Alstom propôs o alargamento do acordo comum aos países da Europa Central e Oriental. Contrariamente ao que refere a recorrente, esta circunstância implica que o referido acordo existia, tanto na data da reunião como durante um certo período que a antecedeu e no período subsequente.

247    Em quarto lugar, a ausência duradoura dos produtores japoneses do mercado europeu dos projectos de MCIG durante o período em causa constitui igualmente um indício que leva a crer que o acordo comum continuou a ser aplicado.

248    Em quinto lugar, na medida em que, por um lado, a recorrente não critica expressamente o facto de a Comissão ter concluído pela existência de uma infracção única que englobava designadamente o acordo comum e o acordo GQ, e, por outro lado, a análise dos primeiro a quarto fundamentos não levou o Tribunal Geral a considerar que a Comissão cometeu qualquer erro a este respeito, há que considerar que uma prova do funcionamento continuado do acordo GQ constitui um indício relevante de que o acordo comum era igualmente aplicado durante o referido período. Com efeito, tendo em conta o carácter único da infracção, é plausível que o desaparecimento do acordo comum tivesse comprometido o funcionamento do acordo GQ.

249    Ora, a recorrente não contesta as afirmações feitas nos considerandos 191 a 198 da decisão impugnada, relativos a uma troca de uma série de telecópias respeitantes à atribuição dos projectos nos termos do acordo GQ e, Dezembro de 2000 e em Janeiro de 2001, a reuniões do acordo GQ que deviam realizar‑se em 2000 e em 2001, bem como a acordos relativos a certos projectos de MCIG, celebrados em 1998 e em 1999 e efectivos até Outubro de 2001.

250    Do mesmo modo, a recorrente não invoca argumentos que ponham em causa especificamente as declarações da Comissão efectuadas nos considerandos 199 a 216 da decisão impugnada e relativos ao facto de a Hitachi, a Siemens e a VA TECH terem retomado a sua participação no cartel e à continuação deste último, entre Julho de 2002 e 2004.

251    Face a estes elementos, a argumentação da recorrente segundo a qual, durante o período em causa, as reuniões do acordo GQ se tornaram um fórum de discussão sem objecto ou efeito anticoncorrencial, não pode ser acolhida. Isso é tanto mais verdade quanto esta argumentação não é confirmada por elementos distintos das declarações não fundamentadas da Toshiba.

252    Assim sendo, há que considerar que os elementos de prova invocados pela Comissão quanto à execução do acordo comum e do acordo GQ, entre Setembro de 1999 e Maio de 2004, são relativos a factos suficientemente próximos no tempo, o que implica que foi apresentada a prova de uma infracção continuada quanto ao período em causa.

253    Por conseguinte, o décimo terceiro fundamento deve ser julgado improcedente.

254    Dado que nenhum dos fundamentos invocados em apoio do pedido principal pode ser acolhido, há que negar‑lhe provimento.

2.     Quanto ao pedido subsidiário, relativo à anulação do artigo 2.°, alínea g), e do artigo 2.°, alínea h), da decisão impugnada, na medida em que é aplicável à recorrente

255    Há que tratar, em primeiro lugar, o quinto fundamento, relativo ao facto de a Comissão ter violado os princípios da igualdade de tratamento e da proporcionalidade ao calcular o montante de partida da sua coima com base no volume de negócios respeitante ao ano 2001.

 Argumentos das partes

256    A recorrente sustenta que a Comissão violou os princípios da igualdade de tratamento e da proporcionalidade ao calcular os montantes de partida da coima dos produtores japoneses com base nas suas vendas mundiais de MCIG relativas ao ano 2001, enquanto se baseou no ano 2003 no que respeita aos produtores europeus.

257    Por um lado, a Comissão não invocou uma justificação objectiva para o tratamento desigual reservado aos produtores japoneses. Segundo a recorrente, o facto de, no quadro de uma estratégia comercial legítima, ter optado por exercer as suas actividades no domínio dos MCIG através da TM T & D, não era relevante a este propósito, dado que as flutuações apresentadas no mercado a partir de 2003 teriam afectado a sua situação, mesmo que a sua escolha tivesse sido diferente. No caso vertente, a Comissão devia ter considerado, como montante de partida, uma parte do volume de negócios da TM T & D correspondente à parte do seu capital detida pela recorrente. Além disso, este mesmo método foi aplicado à Schneider no que respeita à sua participação na sociedade comum com a VA TECH.

258    Por outro lado, segundo a recorrente, a posição da Comissão teve a consequência de o montante de partida que lhe foi aplicado ter sido calculado em relação a um ano durante o qual a situação no mercado tinha sido substancialmente diferente do ano considerado para as empresas europeias, sobreavaliando, assim, o peso da sua participação na infracção. A este respeito, a recorrente argumenta que, entre 2001 e 2003, tanto os mercados europeus e japonês dos MCIG, em geral, como o seu volume de negócios, neste domínio, tiveram um decréscimo significativo.

259    A Comissão recorda o seu poder de apreciação no que respeita à escolha dos elementos a tomar em consideração para efeitos da determinação do montante da coima, circunstância que tem influência sobre a intensidade da fiscalização jurisdicional na matéria. Deduz daí que os argumentos baseados em princípios gerais do direito só podem limitar o referido poder de apreciação quando este tiver sido exercido com desrespeito notório das circunstâncias em apreço.

260    A Comissão acrescenta que, desde que, como no presente caso, a infracção deva ser qualificada como muito grave, tem o direito de aplicar um tratamento diferenciado que reflicta a capacidade efectiva de as empresas causarem um prejuízo significativo à concorrência e que assegure um efeito dissuasivo suficiente.

261    Ora, no caso em apreço, o montante de partida atribuído à recorrente foi determinado em função dos factores referidos. O ano 2001 foi escolhido porque se tratava do último ano antes da transferência da actividade em matéria de MCIG da recorrente para a TM T & D. Segundo a Comissão, esta diferença de tratamento é justificada pelo facto de, durante a maior parte da vigência do cartel, a recorrente ter participado no mesmo como empresa individual, o que implica que as vendas de 2003 não reflectissem fielmente a capacidade efectiva da recorrente de causar um prejuízo à concorrência.

262    Além disso, segundo a Comissão, o simples facto de 2001 ter sido um ano melhor do que 2003 para a recorrente não é suficiente para sustentar que o montante de partida é desproporcionado.

263    Em último lugar, a Comissão observa que não fixou qualquer montante de partida distinto para a TM T & D para não impor um ónus indevido à recorrente.

 Apreciação do Tribunal Geral

264    A título liminar, há que recordar que a Comissão dispõe de uma margem de apreciação na fixação do montante das coimas, a fim de orientar o comportamento das empresas no sentido do respeito das regras de concorrência (v. acórdão do Tribunal Geral de 29 de Abril de 2004, Tokai Carbon e o./Comissão, T‑236/01, T‑239/01, T‑244/01 a T‑246/01, T‑251/01 e T‑252/01, Colect., p. II‑1181, n.° 216, e jurisprudência aí referida).

265    O montante da coima é fixado em função da gravidade da infracção e, se for o caso, da sua duração. A gravidade da infracção deve ser determinada em função de critérios tais como as circunstâncias específicas do caso, o seu contexto e o carácter dissuasivo das coimas. Elementos objectivos como o conteúdo e a duração dos comportamentos anticoncorrenciais, o seu número e a sua intensidade, a extensão do mercado afectado e a deterioração sofrida pela ordem pública económica devem ser tomados em conta. A análise deve igualmente atender à importância relativa e à quota de mercado das empresas responsáveis, bem como a uma eventual reincidência (acórdão Aalborg Portland e o./Comissão, n.° 39 supra, n.os 89 a 91).

266    No entanto, cada vez que decide aplicar coimas nos termos do direito da concorrência, a Comissão tem de respeitar os princípios gerais de direito, entre os quais constam os princípios da igualdade de tratamento e da proporcionalidade, tal como interpretados pelos tribunais comunitários (acórdão do Tribunal Geral de 27 de Setembro de 2006, Archer Daniels Midland/Comissão, T‑59/02, Colect., p. II‑3627, n.° 315).

267    Segundo jurisprudência assente, o princípio da igualdade de tratamento ou de não discriminação exige que situações comparáveis não sejam tratadas de modo diferente e que situações diferentes não sejam tratadas de igual maneira, salvo se esse tratamento se justificar por razões objectivas (v. acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 14 de Maio de 1998, BPB de Eendracht/Comissão, T‑311/94, Colect., p. II‑1129, n.° 309, e jurisprudência aí referida).

268    Na medida em que se justifique basear‑se no volume de negócios das empresas envolvidas numa mesma infracção para determinar as relações entre as coimas a aplicar, convém delimitar o período a ter em conta para que os números obtidos sejam tão comparáveis quanto possível (acórdão do Tribunal de Justiça de 7 de Junho de 1983, Musique diffusion française e o./Comissão, 100/80 a 103/80, Recueil, p. 1825, n.° 122).

269    O princípio da proporcionalidade, por seu turno, exige que os actos das instituições comunitárias não vão além do adequado e necessário à realização dos objectivos legítimos prosseguidos pela regulamentação em causa, devendo‑se recorrer, havendo escolha entre várias medidas adequadas, à menos restritiva, não devendo os inconvenientes causados ser desmesurados relativamente aos objectivos pretendidos (acórdãos do Tribunal de Justiça de 13 de Novembro de 1990, Fedesa e o., C‑331/88, Colect., p. I‑4023, n.° 13, e de 5 de Maio de 1998, Reino Unido/Comissão, C‑180/96, Colect., p. I‑2265, n.° 96).

270    No caso em apreço, decorre dos considerandos 480 a 490 da decisão impugnada que, na determinação dos montantes de partida, a Comissão, em conformidade como o ponto 1 A das orientações para o cálculo das coimas, tiver decidido aplicar um tratamento diferenciado aos participantes no cartel em função da sua capacidade de prejudicar a concorrência. Para este efeito, classificou as diferentes empresas em cinco grupos em função da importância relativa dos seus volumes de negócios mundiais obtidos com as vendas dos MCIG. Neste contexto, a Comissão considerou que os volumes de negócios relativos apenas ao mercado do EEE não constituíam um critério de apreciação fiável na medida em que o acordo comum tinha por objectivo assegurar a ausência dos produtores japoneses deste mesmo mercado.

271    Quanto à escolha do ano de referência, resulta dos considerandos 481, 482 e 484 da decisão impugnada que, na determinação do valor das vendas mundial, a Comissão se baseou no ano 2001 no que respeita à recorrente, à Fuji, à Hitachi e à Toshiba, enquanto se baseou no ano 2003, a saber, o último ano completo da infracção, no que respeita aos produtores europeus. Também o cálculo do montante de partida das coimas da recorrente, da Fuji, da Hitachi e da Toshiba relativas ao período da participação das mesmas no cartel como empresas individuais foi efectuado com base nos seus volumes de negócios em 2001, enquanto o cálculo do montante de partida das coimas dos produtores europeus foi efectuado com base nos seus volumes de negócios em 2003.

272    Consequentemente, cabe observar que a Comissão não tratou de igual modo os produtores japoneses, entre os quais a recorrente, e os produtores europeus, no que respeita à escolha do ano de referência. Portanto, por força da jurisprudência acima referida no n.° 267, importa verificar se existe uma justificação objectiva para este tratamento diferenciado.

273    A este propósito, no considerando 482 da decisão impugnada, a Comissão indicou que a utilização do ano 2001 no que respeita à recorrente era justificada pelo facto de, durante a maior parte do período da infracção, esta ter participado no cartel enquanto empresa individual, e não através da sociedade comum TM T & D que assumiu as actividades em matéria de MCIG da recorrente e da Toshiba em 2002.

274    Na audiência, a Comissão especificou que o seu objectivo era tomar em consideração a posição concorrencial desigual dos dois accionistas da TM T & D no momento da criação desta última, devido ao facto de a recorrente deter uma parte consideravelmente maior do mercado dos MCIG do que a Toshiba. Segundo a Comissão, o facto de ter por referência o último ano completo da participação da recorrente e da Toshiba no cartel, enquanto empresas individuais, ou seja, o ano 2001, permitia repercutir esta disparidade no momento da determinação dos montantes das coimas, contrariamente ao método que consiste em dividir o volume de negócios da TM T & D em 2003 entre as duas sociedades accionistas em função das respectivas participações na sociedade comum.

275    O objectivo invocado pela Comissão é legítimo, uma vez que permite comparar a capacidade de os accionistas de uma sociedade comum prejudicarem a concorrência durante o período anterior à sua criação. Decorre ainda do considerando 489 da decisão impugnada que esse mesmo objectivo foi prosseguido no caso da Schneider, tendo, no entanto, a ausência de volumes de negócios pertinentes desta última em 2001 ou em 2003 levado a Comissão a considerar a participação da Schneider no capital da sociedade comum como montante de partida. Em contrapartida, quanto à recorrente, estão disponíveis volumes de negócios pertinentes tanto no que respeita a 2001 como a 2003.

276    No entanto, observa‑se que, no presente caso, a Comissão podia ter utilizado outros métodos para alcançar o objectivo que prosseguia sem tratar os produtores japoneses, por um lado, e os produtores europeus, por outro, de modo desigual no que respeita à escolha do ano de referência. A título exemplificativo, na determinação das coimas da recorrente e da Toshiba quanto ao período anterior à criação da TM T & D, a Comissão poderia ter‑se baseado no montante de partida da coima desta última, calculado a partir dos volumes de negócios correspondentes ao ano 2003 e dividido entre a recorrente e a Toshiba segundo a proporção das vendas dos MCIG que elas realizaram durante o último ano antes da criação da sociedade comum, ou seja, em 2001.

277    Cumpre, portanto, observar que, no caso em apreço, a vontade da Comissão de, no âmbito da determinação das coimas, reproduzir fielmente a posição relativa da recorrente e da Toshiba não justifica o tratamento desigual de que a recorrente foi objecto.

278    Em face do exposto, há que concluir que, ao escolher o ano 2001 como ano de referência para a determinação do valor das vendas mundiais dos produtores japoneses e para o cálculo da coima aplicada à recorrente pela sua participação individual no cartel, a Comissão violou o princípio da igualdade de tratamento.

279    Esta violação afecta directamente o cálculo da coima aplicada à recorrente no artigo 2.°, alínea g), da decisão impugnada pela sua participação no cartel, como empresa individual. Afecta indirectamente, através da determinação do valor das vendas mundiais e das quotas de mercado, o cálculo da coima aplicada à recorrente no artigo 2.°, alínea h), da decisão impugnada, relativa ao período da existência da TM T & D.

280    Assim sendo, há que julgar procedente o quinto fundamento e, consequentemente, anular o artigo 2.°, alíneas g) e h), da decisão impugnada.

281    Além disso, não há que analisar os sexto a décimo segundo fundamentos invocados pela recorrente. Com efeito, mesmo que fosse esses fundamentos fossem acolhidos, tal não poderia conduzir a uma anulação mais ampla da decisão impugnada do que a obtida no número anterior.

282    Em último lugar, tendo em conta que foi dado provimento ao pedido da recorrente, a título subsidiário, não há que decidir nem quanto ao pedido a título mais subsidiário nem quanto às medidas de organização do processo apresentados por ela.

 Quanto às despesas

283    Nos termos do artigo 87.°, n.° 3, do Regulamento de Processo, se cada parte obtiver vencimento parcial, o Tribunal Geral pode determinar que as despesas sejam repartidas entre as partes ou que cada uma das partes suporte as suas próprias despesas.

284    Na medida em que o pedido de anulação do artigo 1.° da decisão impugnada foi julgado improcedente, a recorrente foi vencida numa parte significativa do seu pedido, ainda que tenha obtido vencimento noutra parte do mesmo.

285    Nestas circunstâncias, há que decidir que a recorrente suportará três quartos das despesas apresentadas pelas partes ao Tribunal Geral e que a Comissão suportará um quarto destas mesmas despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Segunda Secção)

decide:

1)      O artigo 2.°, alíneas g) e h), da Decisão C (2006) 6762 final da Comissão, de 24 de Janeiro de 2007, relativa a um processo de aplicação do artigo 81.° CE e do artigo 53.° do Acordo EEE (Processo COMP/F/38.899 – Mecanismos de comutação isolados a gás), é anulado na medida em que é relativo à Mitsubishi Electric Corp.

2)      È negado provimento ao recurso quanto ao restante.

3)      A Mitsubishi Electric suportará três quartos das despesas apresentadas pelas partes ao Tribunal Geral.

4)      A Comissão Europeia suportará um quarto das despesas apresentadas pelas partes ao Tribunal Geral.

Pelikánová

Jürimäe

Soldevila Fragoso

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 12 de Julho de 2011.

Assinaturas


* Língua do processo: inglês.