Language of document : ECLI:EU:T:1999:308

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Primeira Secção Alargada)

7 de Dezembro de 1999 (1)

«Recurso de anulação — Transparência — Acesso aos documentos — Decisão 94/90/CECA, CE, Euratom — Recusa de um pedido de acesso a documentos da Comissão — Alcance, por um lado, da excepção relativa à protecção do interesse público (processos judiciais), por outro, da regra do autor — Fundamentação»

No processo T-92/98,

Interporc Im- und Export GmbH, sociedade de direito alemão, com sede em Hamburgo (Alemanha), representada por Georg M. Berrisch, advogado em Bruxelas e Hamburgo,

recorrente,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada por Ulrich Wölker, membro do Serviço Jurídico, na qualidade de agente, com domicílio escolhido no Luxemburgo, no gabinete de Carlos Gómez de la Cruz, membro do Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,

recorrida,

que tem por objecto um pedido de anulação da decisão da Comissão de 23 de Abril de 1998 que recusou à recorrente o acesso a determinados documentos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Primeira Secção Alargada),

composto por: B. Vesterdorf, presidente, C. W. Bellamy, J. Pirrung, A. W. H. Meij e M. Vilaras, juízes,

secretário: H.Jung,

vistos os autos e após a audiência de 19 de Maio de 1999,

profere o presente

Acórdão

Enquadramento jurídico

1.
    Na sequência, designadamente, da acta final do Tratado da União Europeia, assinado em Maastricht, em 7 de Fevereiro de 1992, que contém uma declaração (n.° 17) relativa ao direito de acesso à informação, e de vários Conselhos europeus que reafirmaram o compromisso de tornar a Comunidade mais aberta (v., a este propósito, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 5 de Março de 1997, WWF UK/Comissão, T-105/95, Colect., p. II-313, n.os 1 a 3), a Comissão e o Conselho aprovaram, em 6 de Dezembro de 1993, um código de conduta respeitante ao acesso do público aos documentos da Comissão e do Conselho (JO L 340, p. 41, a seguir «código de conduta»), que fixa os princípios que regulamentam o acesso aos documentos. O código de conduta estabelece:

«A Comissão e o Conselho adoptarão, no que a cada um diz respeito, as medidas necessárias para pôr em prática os presentes princípios antes de 1 de Janeiro de 1994.»

2.
    Para assegurar a aplicação prática deste compromisso, a Comissão, com base no artigo 162.° do Tratado CE (actual artigo 218.° CE), adoptou o código de conduta pela Decisão 94/90/CECA, CE, Euratom, de 8 de Fevereiro de 1994, relativa ao acesso do público aos documentos da Comissão (JO L 46, p. 58), cujo texto se encontra junto à decisão (a seguir «Decisão 94/90»).

3.
    O código de conduta estabelece o princípio geral seguinte:

«O público terá o acesso mais amplo possível aos documentos da Comissão e do Conselho.

Entende-se por 'documento‘ qualquer escrito, qualquer que seja o respectivo suporte, que contenha dados existentes, detido pela Comissão ou pelo Conselho.»

4.
    As circunstâncias que podem ser invocadas por uma instituição para justificar a recusa dum pedido de acesso a documentos estão enumeradas no código de conduta nos seguintes termos:

«As instituições recusam o acesso a qualquer documento cuja divulgação possa prejudicar:

—    a protecção do interesse público (segurança pública, relações internacionais, estabilidade monetária, processos judiciais, inspecções e inquéritos),

—    a protecção do indivíduo e da vida privada,

—    a protecção do sigilo comercial e industrial,

—    a protecção dos interesses financeiros da Comunidade,

—    a protecção da confidencialidade solicitada pela pessoa singular ou colectiva que forneceu a informação ou exigida pela legislação do Estado-Membro que forneceu a informação.

As instituições podem igualmente recusar o acesso a um documento para salvaguardar o interesse da instituição no que respeita ao sigilo das suas deliberações.»

5.
    Além disso, o código de conduta dispõe, sob a epígrafe «Tratamento dos pedidos iniciais», o seguinte:

«Sempre que o documento na posse de uma instituição tenha como autor uma pessoa singular ou colectiva, um Estado-Membro, outra instituição ou órgão comunitário ou qualquer outra organização nacional ou internacional, o pedido deve ser dirigido directamente ao autor do documento.»

6.
    Em 4 de Março de 1994, a Comissão elaborou uma comunicação sobre a melhoria do acesso aos documentos (JO C 67, p. 5, a seguir «comunicação de 1994») precisando os critérios de aplicação da Decisão 94/90. Nessa comunicação afirma que «qualquer pessoa pode... solicitar o acesso a qualquer documento não publicado da Comissão, incluindo os documentos preparatórios ou outros documentos explicativos». Quanto às excepções previstas no código de conduta, a comunicação informa que «a Comissão pode considerar que o acesso a um determinado documento deve ser recusado, pelo facto de a sua divulgação prejudicar os interesses públicos ou privados, ou o bom funcionamento da instituição...». Quanto a este ponto, a comunicação sublinha que «a aplicação das

excepções não é automática e cada pedido de acesso a um documento será analisado em função dos seus méritos próprios». Quanto ao tratamento dos pedidos de confirmação, a comunicação de 1994 especifica o seguinte:

«Se um demandante viu ser-lhe recusado o acesso a um documento e não aceitar as explicações fornecidas pode requerer ao secretário-geral da Comissão o reexame da questão e a confirmação ou anulação da recusa (...)».

Factos na origem do litígio

7.
    As importações de carne de bovino na Comunidade estão sujeitas, em princípio, a um direito aduaneiro e a uma imposição suplementar. No quadro do Acordo Geral sobre Pautas Aduaneiras e Comércio (GATT), todos os anos a Comunidade abre o que se entendeu designar como contingente «Hilton». No quadro deste contingente, as quantidades de carne de bovino de alta qualidade («Hilton Beef») provenientes da Argentina podem ser importadas para a Comunidade com isenção de direitos, devendo apenas ser pagos os direitos da pauta aduaneira comum aplicável. A fim de obter esta isenção, é necessária a apresentação de um certificado de autenticidade passado pelas autoridades argentinas.

8.
    Informada da descoberta de falsificações de certificados de autenticidade, a Comissão, em colaboração com as autoridades aduaneiras dos Estados-Membros, iniciou investigações a este propósito nos finais de 1992/inícios de 1993. Quando as autoridades aduaneiras chegaram à conclusão de que lhes haviam sido apresentados certificados de autenticidade falsificados, procederam a cobranças a posteriori de direitos de importação.

9.
    Depois de terem sido descobertas estas falsificações, as autoridades aduaneiras alemãs exigiram à recorrente direitos de importação a posteriori. Esta pediu uma redução dos direitos de importação alegando que tinha apresentado os certificados de autenticidade de boa fé e que algumas lacunas no controlo eram imputáveis às autoridades argentinas competentes e à Comissão.

10.
    Por decisão de 26 de Janeiro de 1996, dirigida à República Federal da Alemanha, a Comissão considerou que o pedido de redução dos direitos de importação apresentado pela recorrente não era justificado.

11.
    Por carta de 23 de Fevereiro de 1996, dirigida ao secretário-geral da Comissão e aos directores-gerais das Direcções-Gerais (a seguir «DG») I, VI e XXI, o advogado da recorrente pediu acesso a certos documentos relativos ao controlo das importações de carne de bovino («Hilton Beef») e às investigações que conduziram às decisões das autoridades alemãs de proceder a cobranças de direitos de importação a posteriori. O pedido referia-se a dez categorias de documentos, a saber: 1) as declarações dos Estados-Membros relativas às quantidades de carne de bovino «Hilton» importadas da Argentina entre 1985 e 1992, 2) as declarações das autoridades argentinas sobre as quantidades de carne de bovino «Hilton» que

foram exportadas para a Comunidade no decurso do mesmo período, 3) os registos internos da Comissão elaborados com base nessas declarações, 4) os documentos relativos à abertura do contingente «Hilton», 5) os documentos relativos à designação dos organismos responsáveis pela emissão dos certificados de autenticidade, 6) os documentos relativos à convenção celebrada entre a Comunidade e a Argentina relativa a uma redução do contingente na sequência da descoberta das falsificações, 7) os eventuais relatórios das investigações respeitantes ao controlo pela Comissão, entre 1991 e 1992, do contingente «Hilton», 8) os documentos relativos às investigações respeitantes a eventuais irregularidades nas importações efectuadas entre 1985 e 1988, 9) os avisos da DG VI e da DG XXI no que respeita às decisões adoptadas noutros processos semelhantes e 10) as actas das reuniões do grupo de peritos dos Estados-Membros que ocorreram em 2 de Outubro e 4 de Dezembro de 1995.

12.
    Por carta de 22 de Março de 1996, o director-geral da DG VI recusou o acesso à correspondência trocada com as autoridades argentinas e às actas dos debates que precederam a concessão e a abertura dos contingentes «Hilton» e ainda à correspondência trocada com as autoridades argentinas após a descoberta dos certificados de autenticidade falsificados. Esta recusa invocava a excepção relativa à protecção do interesse público (relações internacionais). Quanto ao restante, o director-geral recusou também o acesso aos documentos emanados dos Estados-Membros ou das autoridades argentinas, com o fundamento de que a recorrente deveria dirigir o seu pedido directamente aos autores destes documentos.

13.
    Por carta de 25 de Março de 1996, o director-geral da DG XXI recusou o pedido de acesso ao relatório das investigações internas relativas às falsificações elaborado pela Comissão, invocando a excepção da protecção do interesse público (actividades de inspecção e inquérito) e a excepção da protecção do indivíduo e da sua vida privada. No que respeita às tomadas de posição da DG VI e da DG XXI relativamente a outros pedidos de redução de direitos de importação, bem como às actas das sessões do comité de peritos dos Estados-Membros, o director-geral da DG XXI recusou o acesso aos documentos invocando a excepção da protecção do interesse da instituição relativo ao segredo das suas deliberações. Quanto ao restante, recusou o acesso aos documentos emanados dos Estados-Membros com o fundamento de que a recorrente devia dirigir o seu pedido directamente aos autores desses documentos.

14.
    Por carta de 27 de Março de 1996, o advogado da recorrente apresentou um pedido de confirmação nos termos do código de conduta ao secretário-geral da Comissão. Nessa carta, contestou os fundamentos das razões invocadas pelos directores-gerais das DG VI e da DG XXI para recusar o acesso aos documentos.

15.
    Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 12 de Abril de 1996, a recorrente, agindo conjuntamente com outras duas empresas

alemãs, interpôs recurso de anulação da decisão da Comissão de 26 de Janeiro de 1996 (processo T-50/96).

16.
    Por carta de 29 de Maio de 1996, o secretário-geral da Comissão indeferiu opedido de confirmação. Esta carta (a seguir «decisão impugnada») está redigida nos seguintes termos:

«Após análise do vosso pedido, lamento dever informar que confirmo a decisão da DG VI e da DG XXI pelos motivos seguintes:

Todos os documentos pedidos respeitam a uma decisão da Comissão de 26 de Janeiro de 1996 [Doc. COM C(96) 180 final], que, entretanto, é objecto de um recurso de anulação interposto pelo vosso mandatário (processo T-50/96).

Por conseguinte, e sem prejuízo de outras excepções que poderiam justificar a recusa de acesso aos documentos pedidos, é aplicável a excepção relativa à protecção do interesse público (processos judiciais). O código de conduta não pode obrigar a Comissão, no âmbito de um processo em curso, a transmitir à parte contrária documentos relativos ao litígio.»

17.
    Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 25 de Junho de 1996, a recorrente, no âmbito do processo T-50/96, pediu que este Tribunal ordene, enquanto medidas de organização do processo, a apresentação dos documentos requeridos.

18.
    Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 9 de Agosto de 1996 a recorrente interpôs recurso de anulação da decisão da Comissão de 29 de Maio de 1996 que confirmou a recusa em conceder à recorrente o acesso a alguns desses documentos. No acórdão de 6 de Fevereiro de 1998, Interporc/Comissão (T-124/96, Colect., p. II-231, a seguir «acórdão Interporc I»), o Tribunal declarou que a decisão de 29 de Maio de 1996 estava insuficientemente fundamentada e proferiu a sua anulação.

19.
    Por outro lado, no quadro do processo T-50/96, a Comissão, a pedido do Tribunal de Primeira Instância de 15 de Dezembro de 1997, apresentou determinados documentos, que coincidem em parte com os requeridos pela recorrente no quadro do processo Interpor I. No caso vertente, a recorrente reiterou que o pedido confirmativo ficou sem objecto no que se refere aos documentos que a Comissão apresentou a pedido do Tribunal de Primeira Instância no quadro do processo T-50/96.

20.
    Por execução do acórdão Interporc I, a Comissão comunicou ao advogado da recorrente nova decisão datada de 23 de Abril de 1998 relativa ao pedido confirmativo da recorrente de 27 de Março de 1996 contendo conclusão idêntica à da decisão de 29 de Maio de 1996 anulada mas com uma fundamentação

diferente (a seguir «decisão impugnada»). A decisão impugnada está redigida nos seguintes termos:

«Os documentos solicitados podem ser classificados nas seguintes categorias:

1.    Os documentos dos Estados-Membros e das autoridades argentinas

—    as declarações dos Estados-Membros relativas às quantidades de carne de bovino 'Hilton‘ importadas da Argentina entre 1985 e 1992;

—    as declarações das autoridades argentinas sobre as quantidades de carne de bovino 'Hilton‘ que foram exportadas para a Comunidade no decurso do mesmo período;

—    os documentos das autoridades argentinas relativos à designação dos organismos responsáveis da emissão dos certificados de autenticidade;

—    os documentos das autoridades argentinas relativos à conclusão de um acordo sobre um contingente 'Hilton‘;

—    as tomadas de posição dos Estados-Membros em processos idênticos.

2.    Os documentos da Comissão

—    os relatórios internos da DG VI elaborados com base nas declarações dos Estados-Membros e de países terceiros;

—    os documentos da Comissão relativos aos organismos responsáveis pela emissão de certificados de autenticidade;

—    os documentos relativos à convenção celebrada quanto à autorização de um contingente 'Hilton‘; os pareceres da DG VI, os pareceres inter-serviços, as comunicações remetidas às autoridades argentinas;

—    os documentos relativos à convenção celebrada entre a Comunidade e a Argentina quanto a uma redução do contingente na sequência da descoberta de falsificações; os pareceres internos da DG VI, os pareceres inter-serviços (DG I, DG XXI), as notas dos gabinetes dos comissários responsáveis, as notas remetidas a esses gabinetes, as comunicações enviadas à delegação da Comissão na Argentina, a correspondência remetida ao Embaixador da Argentina junto da União Europeia;

—    o relatório da Comissão sobre os controlos no contingente 'Hilton‘;

—    os pareceres da DG VI e XXI relativamente às decisões proferidas em processos similares;

—    as actas das reuniões do grupo de peritos dos Estados-Membros que tiveram lugar em 2 de Outubro e 4 de Dezembro de 1995.

Relativamente aos documentos dos Estados-Membros e das autoridades argentinas aconselho que solicitem imediatamente cópia a esses Estados-Membros bem como às autoridades em causa. É certo que o código de conduta estabelece que: 'o público terá o acesso mais amplo possível aos documentos da Comissão e do Conselho‘, no entanto, o quinto parágrafo prevê: 'sempre que um documento na posse de uma instituição tenha como autor uma pessoa singular ou colectiva, um Estado-Membro, outra instituição ou órgão comunitário ou qualquer outra organização nacional ou internacional, o pedido deve ser dirigido directamente ao autor do documento ‘. A Comissão não pode em caso algum ser criticada por abuso de direito; limitou-se a aplicar uma disposição da sua decisão de 8 de Fevereiro de 1994, que regulamenta a aplicação do código de conduta.

Todos os outros documentos respeitam a um processo judicial em curso (processo T-50/96) e são abrangidos pela excepção baseada na protecção do interesse público, e em particular do correcto desenrolar do processo jurisdicional, expressamente previsto no código de conduta. A sua divulgação com base nas disposições relativas ao acesso do público aos documentos da Comissão acabaria por atingir interesses das partes neste processo, em especial os direitos da defesa, e seria contrária às disposições especiais que regem a comunicação de documentos no quadro dos processos jurisdicionais.»

21.
    Por acórdão de 17 de Setembro de 1998, Primex Produkte Import-Export e o./Comissão (T-50/96, Colect., p. II-3773), o Tribunal de Primeira Instância anulou a decisão de 26 de Janeiro de 1996, já referida. A Comissão interpôs recurso deste acórdão (processo C-417/98 P).

Tramitação e pedidos das partes

22.
    O requerimento de interposição do presente recurso foi apresentado na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 9 de Junho de 1998. O processo foi inicialmente atribuído a uma secção constituída por três juízes. Após audição das partes, o Tribunal de Primeira Instância, por decisão de 20 de Abril de 1999, decidiu remeter o processo a uma secção constituída por cinco juízes.

23.
    Com base no relatório do juiz relator, o Tribunal (Primeira Secção Alargada) decidiu iniciar a fase oral sem instrução prévia.

24.
    As partes foram ouvidas nas suas alegações e nas respostas às questões orais do Tribunal de Primeira Instância aquando da audiência pública de 19 de Maio de 1999.

25.
    A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

—    anular a decisão impugnada,

—    a título subsidiário, anular a decisão na medida em que a recorrente não tenha já obtido no âmbito do processo T-50/96, os documentos cujo acesso tinha requerido,

—    em qualquer hipótese, condenar a Comissão nas despesas.

26.
    A Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne:

—    julgar o recurso improcedente;

—    condenar a recorrente nas despesas.

Quanto ao mérito

27.
    Na sua argumentação a recorrente estabelece uma distinção entre, por um lado, os documentos elaborados pela Comissão e, por outro, os elaborados pelos Estados-Membros e pelas autoridades argentinas.

Os documentos da Comissão

28.
    A recorrente invoca três fundamentos no sentido de que a Comissão tinha violado, em primeiro lugar, o código de conduta e a Decisão 94/90, em segundo lugar, o artigo 176.° do Tratado CE (actual artigo 233.° CE) em conjugação com o acórdão Interporc I e, em terceiro lugar, o artigo 190.° do Tratado CE (actual artigo 253.° CE).

Quanto ao fundamento de violação do código de conduta e da Decisão 94/90

Argumentos das partes

29.
    A recorrente invoca, a título liminar, que a excepção baseada na protecção do interesse público, na parte em que visa processos judiciais, concerne exclusivamente os documentos redigidos pela Comissão para efeitos de um processo judicial, e não outros documentos que existem independentemente desse processo, tal como o Tribunal de Primeira Instância declarou no seu acórdão de 19 de Março de 1998, Van der Wal/Comissão (T-83/96, Colect., p. II-545, n.° 50, a seguir «acórdão Van der Wal») proferido mais de um mês antes da adopção da decisão impugnada.

30.
    No caso vertente, não suscita qualquer dúvida que nenhum dos documentos a que a recorrente pediu acesso foi redigido pela Comissão para efeitos de um processo

judicial particular. Daí não se verificar a excepção de protecção do interesse público invocada pela Comissão.

31.
    A título subsidiário, a recorrente sublinha que a Comissão não especifica quais os direitos processuais que seriam ameaçados pela transmissão dos documentos pedidos e de que modo o seriam.

32.
    A Comissão alega que a decisão impugnada é conforme ao acórdão Van der Wal e que, além do mais, o referido acórdão a confortou no seu modo de actuar. Decorreria com efeito do acórdão Van der Wal que a Comissão pode invocar a excepção baseada na protecção do interesse público (processos judiciais) mesmo quando ela não é parte num processo judicial.

33.
    Por outro lado, resulta da expressão «a este respeito», no n.° 50 do acórdão Van der Wal, que é apenas quando a Comissão não é ela própria parte num processo que haveria que distinguir os documentos redigidos unicamente para efeitos de um processo judicial particular dos que existem independentemente desse processo e limitar a aplicação da excepção baseada na protecção do interesse público à primeira categoria de documentos.

34.
    Em situações diversas das invocadas no acórdão Van der Wal, seria justificado reservar outro tratamento aos documentos que não foram redigidos para efeitos de um processo judicial particular, mas estão contudo «ligados» a um tal processo.

35.
    Se a Comissão fosse obrigada a assegurar ao seu adversário o acesso a documentos relativos ao objecto do litígio num processo em curso, seriam atingidos os seus direitos de defesa, cuja garantia constitui um princípio fundamental da ordem jurídica comunitária (acórdão de 18 de Outubro de 1989, Oekem/Comissão, 374/87, Colect., p. 3283, n.° 32).

36.
    Na audiência a Comissão especificou entretanto que a excepção em causa apenas seria aplicável durante o processo que pretende salvaguardar.

37.
    Por fim, a Comissão alega que saber se a recorrente ou qualquer outra pessoa pode obter o acesso aos documentos pedidos só pode ser examinada no quadro das disposições do Regulamento de Processo do órgão jurisdicional comunitário, aplicáveis enquanto lex specialis e não com base no código de conduta que regula o direito de acesso do público em geral.

Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

38.
    Importa recordar que, em conformidade com as disposições do código de conduta,o direito de acesso aos documentos está sujeito a duas categorias de excepções, a primeira redigida em termos imperativos, a segunda em termos facultativos. Estas excepções devem ser interpretadas e aplicadas restritivamente, de forma que a aplicação do princípio geral que consiste em conferir ao público «o acesso mais

amplo possível aos documentos da Comissão» não seja frustrado (acórdão Interporc I, n.° 49, e acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 17 de Junho de 1998, Svenska Journalistförbundet/Conselho, T-174/95, Colect., p. II-2289, n.° 110).

39.
    Antes de proceder à interpretação da excepção em causa, é de sublinhar que a Decisão 94/90 foi adoptada com o objectivo de tornar a Comunidade mais transparente, sendo a transferência do processo decisório um meio de reforçar o carácter democrático das instituições bem como a confiança do público face à administração (declaração n.° 17). Também a transparência desejada pelos Conselhos europeus, visando conferir ao público, como enunciado no princípio geral do código de conduta, «o acesso mais amplo possível aos documentos», é essencial a fim de permitir aos cidadãos exercerem um controlo efectivo e eficaz quanto ao exercício do poder de que estão investidas as instituições comunitárias e, assim, aumentar a confiança na administração.

40.
    À luz destas considerações e tendo em conta a obrigação de proceder a uma interpretação restrita da excepção, a expressão «processos judiciais» deve ser entendida no sentido de que a protecção do interesse público se opõe à divulgação do conteúdo de documentos redigidos pela Comissão unicamente para fins de um processo judicial particular.

41.
    Na expressão «documentos redigidos apenas para efeitos de um processo judicial particular» devem ser abrangidas não apenas as alegações ou requerimentos apresentados, os documentos internos respeitantes à instrução do processo em curso, mas também as comunicações relativas ao processo entre a Direcção-Geral em causa e o Serviço Jurídico ou um gabinete de advogados. Esta delimitação do âmbito de aplicação da excepção tem por objectivo garantir, por outro lado, a protecção do trabalho interno da Comissão e, por outro, a confidencialidade e a salvaguarda do princípio do segredo profissional dos advogados.

42.
    Em contrapartida, a excepção baseada na protecção do interesse público (processos judiciais) constante do código de conduta não pode permitir à Comissão subtrair-se à obrigação de comunicar documentos que foram elaborados no quadro de um processo meramente administrativo. Este princípio deve ser respeitado mesmo se a produção destes documentos num processo perante o tribunal comunitário possa ser prejudicial à Comissão. O facto de um recurso de anulação ter sido interposto da decisão adoptada no termo do processo administrativo, não releva a este propósito.

43.
    Com efeito, a interpretação proposta pela Comissão vai contra um dos objectivos essenciais prosseguidos com a Decisão 94/90, o de dar aos cidadãos a possibilidade de controlar de forma mais efectiva a legalidade do exercício do poder público.

44.
    Quanto aos argumentos da Comissão relativamente ao âmbito de aplicação da Decisão 94/90, importa lembrar que resulta da economia desta decisão que a

mesma se aplica de um modo geral aos pedidos de acesso aos documentos vindos do público. Se a empresa Interporc, no quadro do processo T-50/96, na sua qualidade de recorrente, invocou disposições do Regulamento de Processo relativas às medidas de organização do processo ou aos seus direitos de defesa para obter uma parte dos documentos que tinha solicitado no quadro do seu pedido inicial de 23 de Fevereiro de 1996, não deixa de ter, a faculdade de solicitar paralelamente o acesso a esses mesmos documentos por aplicação da Decisão 94/90. Aliás a Comissão, na comunicação de 1994, fez saber que, na sequência da adopção do código de conduta com a Decisão 94/90 «qualquer pessoa pode agora solicitar o acesso a qualquer documento não publicado da Comissão, incluindo os documentos preparatórios ou outros documentos explicativos».

45.
    Esta apreciação é corroborada pelo preâmbulo do código de conduta nos termos do qual «os referidos princípios (isto é o direito de acesso aos documentos) não prejudicam as disposições aplicáveis em matéria de acesso aos dossiers directamente relacionados com pessoas que por eles tenham um interesse específico». Esta consideração limita-se a afirmar que as disposições que regulam o direito de acesso à informação que adoptaria a Comissão não afectam a aplicação das disposições específicas relativas ao acesso aos processos. Além disso, não exclui que algumas pessoas possam invocar o código de conduta ao mesmo tempo que estão abrangidas igualmente por outras disposições.

46.
    Depois, o facto de a recorrente ter obtido o acesso a uma parte dos documentos considerados no seu pedido inicial de 23 de Fevereiro de 1996 no quadro do processo T-50/96 não a poderá privar do direito de solicitar a divulgação dos documentos que não lhe foram comunicados com base na decisão 94/90.

47.
    Esta restrição do âmbito de aplicação da Decisão 94/90, como solicitada pela Comissão, não pode resultar senão da própria decisão. Ora esta não contém qualquer disposição neste sentido.

48.
    Daí que a Comissão aplicou erradamente a excepção baseada na protecção do interesse público (processos judiciais) e que o código de conduta pode ser invocado pela recorrente em apoio do seu pedido de acesso aos documentos no presente recurso.

49.
    Em consequência, a decisão impugnada deve ser anulada na parte em que recusa a autorização de acesso aos documentos elaborados pela Comissão, sem necessidade de examinar outros fundamentos invocados pela recorrente para este efeito.

Quanto aos documentos elaborados pelos Estados-Membros ou pelas autoridades argentinas

50.
    A recorrente invoca três fundamentos baseados, primeiramente, em ilegalidade da decisão impugnada uma vez que se baseia na regra do autor, em segundo lugar, na

violação da Decisão 94/90 e do código de conduta e, em terceiro lugar, na violação do artigo 190.° do Tratado.

O fundamento baseado na ilegalidade da decisão impugnada na parte em que se baseia na regra do autor

Argumentos das partes

51.
    A recorrente alega que, por aplicação do artigo 2.°, n.° 2, da Decisão 94/90, incumbe ao secretário-geral, na sequência do pedido confirmativo de 27 de Março de 1996, proceder a um reexame completo do pedido de acesso e verificar, por conseguinte, se os fundamentos invocados pelos directores-gerais da DG VI e XXI em apoio da sua recusa eram ou não procedentes.

52.
    Não tendo o secretário-geral tomado posição quanto ao fundamento baseado na regra do autor na decisão de 29 de Maio de 1996, já não a podia invocar. Por conseguinte, a decisão impugnada, na parte em que se apoia de novo neste fundamento, deve ser anulada.

53.
    A Comissão alega que o carácter completo do controlo deve ser efectuado no quadro de um exame de um pedido confirmativo que deve versar sobre os documentos solicitados. Contudo, o secretário-geral está em condições de basear a sua decisão num único motivo determinante. Por conseguinte, a decisão impugnada pode apoiar-se em fundamentos que não fora examinados na decisão de 29 de Maio de 1996 anulada pelo acórdão Interporc I.

Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

54.
    A título liminar, importa lembrar a tramitação do processo administrativo. Por carta de 23 de Fevereiro de 1996, a recorrente pediu o acesso a determinados documentos relativos ao controlo das importações de carne «Hilton Beef», entre os quais constavam os documentos em causa. Por cartas de 22 e 25 de Março de 1996, os directores-gerais da DG VI e XXI indeferiram os pedidos de acesso invocando a excepção baseada na protecção do interesse público (relações internacionais), a regra do autor, a excepção baseada na protecção do interesse público (actividades de inspecção e de inquérito) e a baseada na protecção do indivíduo e da sua vida privada. Por carta de 27 de Março de 1996 remetida ao secretário-geral da Comissão, o advogado da recorrente contestou esta recusa e apresentou um pedido confirmativo. Por carta de 29 de Maio de 1996, o secretário-geral indeferiu o pedido confirmativo invocando a excepção de protecção do interesse público (processos judiciais). No acórdão Interporc I, o Tribunal de Primeira Instância declarou que a decisão de 29 de Maio de 1996 era insuficientemente fundamentada e anulou-a. Por aplicação do acórdão Interporc I, o secretário-geral, indeferiu novamente o pedido confirmativo invocando não

apenas a excepção baseada na protecção do interesse público (processos judiciais), mas também a da regra do autor.

55.
    Decorre do acórdão Interporc I, primeiramente, que o secretário-geral era obrigado, por força do artigo 176.° do Tratado, a proferir nova decisão em execução do referido acórdão e, em segundo lugar, que a decisão de 29 de Maio de 1996 é considerada como nunca tendo existido.

56.
    Por conseguinte, não se pode deduzir do artigo 2.°, n.° 2, da Decisão 94/90 e da comunicação de 1994 que o secretário-geral não podia invocar fundamentos diversos daqueles sobre os quais tomou posição na sua decisão inicial. Podia portanto proceder a um reexame completo dos pedidos de acesso e basear a decisão impugnada na regra do autor.

57.
    Este fundamento deve, por isso, ser afastado.

Quanto ao fundamento de violação da Decisão 94/90 e do código de conduta

Argumentos das partes

58.
    No entendimento da recorrente, resulta do código de conduta, em especial da definição do termo «documento» que pode ser facultado o acesso a qualquer documento detido pela Comissão, independentemente do autor deste. Neste sentido, invoca igualmente a declaração n.° 17, que se refere a «informações de que dispõem as instituições».

59.
    Sustenta que a regra do autor, segundo a qual os documentos de que a Comissão não é autora estão excluídos do âmbito do código de conduta, não é admissível. Uma regra de processo não pode limitar o âmbito do referido código, excluindo deste determinados documentos. Esta regra seria portanto nula, porque violaria o princípio deste código adoptado com a Decisão 94/90.

60.
    De todo o modo, a fundamentação da decisão impugnada por referência a esta regra é contrária ao princípio geral do código de conduta. Constituiria igualmente um abuso de direito pois teria por efeito excluir os respectivos documentos do âmbito de aplicação do referido código.

61.
    A título subsidiário, a recorrente alega que esta regra deve ser interpretada em termos restritos, de modo a permanecer compatível com o princípio de acesso o mais amplo possível aos documentos.

62.
    A Comissão alega que, no código de conduta, o princípio de «o acesso mais amplo possível aos documentos »é seguido pela regra do autor, que restringe, portanto, o âmbito de aplicação do referido código. Além disso, o código de conduta apenas se referiria à declaração n.° 17, já referida, em termos vagos e, esta declaração, no essencial, recomenda simplesmente à Comissão a apresentação de um relatório.

Contudo, na audiência, a Comissão indicou que a regra do autor não tem por efeito proibir o acesso aos documentos em causa, mas simplesmente tornar a suadivulgação não obrigatória. A Comissão contestou igualmente que exista um princípio de direito de nível superior em que a recorrente se possa basear para invocar uma eventual nulidade da regra do autor.

63.
    Além disso, a recorrente não demonstrou de modo algum a existência de um alegado abuso de direito em seu prejuízo.

64.
    Por fim, a Comissão alega, a título subsidiário, que a questão de uma interpretação ampla ou restrita da regra do autor não se coloca no caso vertente. No entender da Comissão, a recorrente tenta afastar pura e simplesmente a aplicação desta regra.

Apreciação do Tribunal

65.
    A título preliminar, quanto a saber se a aplicação da regra do autor deve ser afastada, há que recordar que o Tribunal de Justiça, no acórdão de 30 de Abril de 1996, Países Baixos/Conselho (58/94, Colect., p. I-2169, n.° 37), relativamente ao direito de acesso do público aos documentos, observou o seguinte:

«Há que admitir que, enquanto o legislador comunitário não adoptar uma regulamentação geral sobre o direito de acesso do público aos documentos na posse das instituições comunitárias, estas devem tomar as medidas que tenham por objecto o tratamento desses pedidos ao abrigo do seu poder de organização interna, que as habilita a tomar as medidas apropriadas para assegurar o seu funcionamento interno no interesse de uma boa administração.»

66.
    À luz deste acórdão, há que declarar que, enquanto não existir o princípio do direito de âmbito superior prevendo que a Comissão não está habilitada, na Decisão 94/90, a excluir do âmbito de aplicação do código de conduta os documentos de que não é autora, a referida regra pode ser aplicada. O facto de a Decisão 94/90 se referir a declarações de política geral, a saber, a declaração n.° 17 e às conclusões de vários Conselhos europeus, em nada modifica esta constatação, não tendo essas declarações o valor de princípio de direito de grau superior.

67.
    Quanto à interpretação da regra do autor, importa recordar que, por um lado, a declaração n.° 17 e o código de conduta consagram o princípio geral segundo o qual o público terá o mais amplo acesso possível aos documentos em poder da Comissão e do Conselho e, por outro, a Decisão 94/90 é um acto que confere aos cidadãos um direito de acesso aos documentos em poder da Comissão (acórdão WWF UK/Comissão, já referido, n.° 55).

68.
    Seguidamente, deve recordar-se que, quando um princípio geral é estabelecido e são previstas limitações a esse princípio, estas últimas devem ser interpretadas e aplicadas restritivamente, de modo a não pôr em causa a aplicação do princípio geral (v. acórdãos WWF UK/Comissão, já referido, n.° 56, e Interporc I, já referido, n.° 49).

69.
    A este propósito, importa declarar que, qualquer que seja a sua qualificação, a regra do autor estabelece uma limitação ao princípio geral de transparência da Decisão 94/90. Daqui resulta que a referida regra deve ser interpretada e aplicada restritivamente, de forma a não pôr em causa a aplicação do princípio geral de transparência (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 19 de Julho de 1999, Rothmans International/Comissão, T-188/97, Colect., p. I-0000, n.os 53 a 55).

70.
    Na audiência, a Comissão reconheceu que a aplicação da regra do autor pode suscitar dificuldades nos casos em que há dúvidas quanto ao autor do documento. É precisamente nesses casos que importa proceder a uma interpretação e aplicação restritas da regra do autor.

71.
    À luz destas observações, importa apreciar se a regra do autor é aplicável aos cinco tipos de documentos elaborados pelos Estados-Membros ou autoridades argentinas considerados na decisão impugnada.

72.
    Os cinco tipos de documentos em causa compreendem, em primeiro lugar, as declarações dos Estados-Membros relativas às quantidades de carne de bovino «Hilton» importadas da Argentina entre 1985 e 1992, em segundo lugar, as declarações das autoridades argentinas relativas às quantidades de carne de bovino «Hilton» exportadas para a Comunidade no decurso do mesmo período, em terceiro lugar, os documentos das autoridades argentinas relativos à designação dos organismos responsáveis pela emissão dos certificados de autenticidade, e, em quarto lugar, os documentos das autoridades argentinas relativos à conclusão de um acórdão quanto à autorização de um contingente «Hilton» e, em quinto lugar, as tomadas de posição dos Estados-Membros em processos idênticos.

73.
    Resulta da análise destes cinco tipos de documentos que os seus autores são ou os Estados-Membros ou as autoridades argentinas.

74.
    Daí decorre que a Comissão fez uma correcta aplicação da regra do autor ao considerar que não estava obrigada a autorizar o acesso a esses documentos. Não pode, por conseguinte, ter cometido abuso de direito. O fundamento da recorrente de violação da Decisão 94/90 e do código de conduta deve por isso ser desatendido.

Quanto ao fundamento de violação do artigo 190.° do Tratado

Argumentos das partes

75.
    A recorrente alega, relativamente aos documentos que emanam dos Estados-Membros ou das autoridades argentinas, que, na decisão impugnada, a Comissão deveria ter explicado por que razão a regra do autor justifica a recusa de acesso aos documentos. A Comissão teria portanto, violado as disposições do artigo 190.° do Tratado.

76.
    A Comissão sustenta que a indicação, na decisão impugnada, de que não é autora dos documentos requeridos constitui fundamentação largamente suficiente da aplicação da regra do autor.

Apreciação do Tribunal

77.
    Resulta de jurisprudência firmada que a fundamentação exigida pelo artigo 190.° do Tratado deve evidenciar, em termos claros e inequívocos, o raciocínio da autoridade comunitária, autora do acto criticado, de modo a permitir, por um lado, aos interessados conhecer as justificações da medida adoptada para defenderem os seus direitos e, por outro, ao juiz comunitário, exercer a sua fiscalização da legalidade das decisões (acórdão WWF UK/Comissão, já referido, n.° 66).

78.
    No caso vertente, a Comissão, na decisão impugnada (v. n.° 20, supra    ), mencionou a regra do autor e indicou à recorrente que lhe cabia pedir uma cópia dos documentos em causa aos Estados-Membros respectivos ou às autoridades argentinas. Uma tal fundamentação evidencia claramente o raciocínio da Comissão. A recorrente estava, por conseguinte, em condições de conhecer as justificações da decisão impugnada e o Tribunal de exercer a sua fiscalização da legalidade das mesmas. Por conseguinte, a recorrente não pode sustentar a necessidade de uma fundamentação mais específica (v., neste sentido, acórdão Rothmans International/Comissão, já referido, n.° 37).

79.
    Daí resulta que este fundamento deve ser afastado. Em consequência, não há que anular a decisão impugnada no que concerne aos documentos que emanam dos Estados-Membros ou das autoridades argentinas.

Quanto às despesas

80.
    Nos termos do n.° 2 do artigo 87.° do Regulamento de Processo a parte vencida deve ser condenada nas despesas, se tal tiver sido pedido. Contudo, de acordo com o n.° 3 do mesmo artigo, o Tribunal pode determinar que as despesas sejam repartidas entre as partes ou que cada uma das partes suporte as suas despesas se cada parte obtiver vencimento parcial. Tendo cada uma das partes obtido vencimento parcial, cada uma delas suportará as suas próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Primeira Secção Alargada),

decide:

1)    É anulada a decisão da Comissão de 23 de Abril de 1998 na parte em que recusa o acesso a documentos que emanam da Comissão.

2)    É negado provimento ao recurso quanto ao mais.

3)    Cada uma das partes suportará as suas despesas.

Vesterdorf
Bellamy
Pirrung

            Meij                            Vilaras

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 7 de Dezembro de 1999.

O secretário

O presidente

H. Jung

B. Vesterdorf


1: Língua do processo: alemão.