Language of document : ECLI:EU:T:2022:775

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Quarta Secção alargada)

7 de dezembro de 2022 (*)

«Política económica e monetária — Supervisão prudencial das instituições de crédito — Artigo 22.o da Diretiva 2013/36/UE — Oposição do BCE à aquisição de participações qualificadas numa instituição de crédito — Ponto de partida do período de avaliação — Intervenção do BCE na fase inicial do processo — Critérios de estabilidade financeira do candidato adquirente e de cumprimento dos requisitos prudenciais — Existência de um motivo razoável de oposição à aquisição com base num único ou em vários critérios de avaliação — Artigo 106.o do Regulamento de Processo — Pedido de audiência desprovido de fundamentação»

No processo T‑330/19,

PNB Banka AS, com sede em Riga (Letónia), representada por O. Behrends, advogado,

recorrente,

contra

Banco Central Europeu (BCE), representado por C. Hernández Saseta, F. Bonnard e V. Hümpfner, na qualidade de agentes,

recorrido,

apoiado por

Comissão Europeia, representada por D. Triantafyllou, A. Nijenhuis e A. Steiblytė, na qualidade de agentes,

interveniente,


O TRIBUNAL GERAL (Quarta Secção alargada),

composto, durante as deliberações, por: S. Gervasoni (relator), presidente, L. Madise, P. Nihoul, R. Frendo e J. Martín y Pérez de Nanclares, juízes,

secretário: E. Coulon,

vistos os autos,

profere o presente

Acórdão

1        Com o seu recurso baseado no artigo 263.o TFUE, a recorrente, PNB Banka AS, pede a anulação da decisão, notificada por carta de 21 de março de 2019, através da qual o Banco Central Europeu (a seguir «BCE») decidiu opor‑se à operação que consistia na aquisição de participações qualificadas em B (a seguir «decisão recorrida»).

I.      Antecedentes do litígio

2        Na data da decisão recorrida, a recorrente era uma instituição de crédito menos significativa na aceção do artigo 6.o, n.o 4, do Regulamento (UE) n.o 1024/2013 do Conselho, de 15 de outubro de 2013 que confere ao BCE atribuições específicas no que diz respeito às políticas relativas à supervisão prudencial das instituições de crédito (JO 2013, L 287, p. 63), com sede na Letónia. Por conseguinte, encontrava‑se sob a supervisão prudencial direta da Finanšu un kapitāla tirgus komisija (Comissão dos Mercados Financeiros e de Capitais, Letónia, a seguir «CMFC»).

3        Na data da interposição do recurso, CR era o principal acionista da recorrente.

4        Segundo a recorrente, em agosto de 2017, CR apresentou uma queixa junto das autoridades do Reino Unido relativa a atos de corrupção alegadamente praticados por A, governador do Latvijas Banka (Banco Central da Letónia). Os alegados atos de corrupção denunciados consistiam em tentativas deste último de obter, graças à sua influência sobre a CMFC, subornos de CR.

5        Em 12 de dezembro de 2017, a recorrente, bem como CR e outros membros da família deste último, acionistas da recorrente, instauraram um processo de arbitragem contra a República da Letónia no Centro Internacional para a Resolução de Diferendos relativos a Investimentos (a seguir «CIRDI»), com fundamento no Tratado de 24 de janeiro de 1994 para a promoção e a proteção dos investimentos entre o Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte e a República da Letónia.

6        Segundo a recorrente, em dezembro de 2017, CR denunciou às autoridades letãs os atos de corrupção acima referidos no n.o 4.

7        Em 17 de fevereiro de 2018, A foi detido na sequência da abertura, em 15 de fevereiro de 2018, de um inquérito penal preliminar instaurado contra ele pelo Korupcijas novēršanas un apkarošanas birojs (Serviço de Prevenção e Combate à Corrupção, Letónia, a seguir «KNAB»). Este inquérito tinha por objeto acusações de corrupção relacionadas com o procedimento de supervisão prudencial de um banco letão diferente da recorrente. Por Decisão de 19 de fevereiro de 2018, aquando da libertação de A, o KNAB aplicou a este último diversas medidas de segurança, incluindo a proibição de exercício das suas funções de governador do Banco Central da Letónia.

8        Em 28 de junho de 2018, A foi acusado pela procuradora responsável pelo inquérito referido no n.o 7, supra. O despacho de acusação, proferido em 24 de maio de 2019, continha três fundamentos. O primeiro fundamento de acusação dizia respeito à aceitação, em 2010, de uma proposta de suborno apresentada pelo presidente do Conselho de Supervisão de um banco letão diferente da recorrente, e do próprio suborno, em contrapartida do qual A forneceu alegadamente conselhos com vista a permitir que o banco que se subtraísse à supervisão da CMFC e se absteve de participar nas reuniões da CMFC nas quais as questões relativas à supervisão do referido banco foram abordadas. O segundo fundamento de acusação dizia respeito, por um lado, à aceitação, após 23 de agosto de 2012, de uma proposta de suborno apresentada pelo vice‑presidente do conselho de administração do mesmo banco, em troca de conselhos de A com o objetivo de obter o levantamento das restrições das atividades ordenadas pela CMFC e de prevenir outras restrições e, por outro lado, à aceitação por parte de A do pagamento de metade do referido suborno. O terceiro fundamento de acusação dizia respeito ao branqueamento de capitais destinado a camuflar a proveniência, as transferências e a titularidade dos fundos pagos a A correspondentes ao suborno referido no segundo fundamento de acusação.

9        Em 1 de outubro de 2018, a recorrente notificou à CMFC a sua intenção de adquirir diretamente uma participação qualificada noutra instituição de crédito letã, B (a seguir «banco alvo») e de ultrapassar 50 % do capital e dos direitos de voto neste último. Na mesma data, CR notificou à CMFC a sua intenção de adquirir indiretamente, através da sua participação no capital da recorrente, uma participação qualificada no banco alvo.

10      Em 3 de outubro de 2018, a CMFC informou a recorrente de que considerava a sua notificação incompleta e que não iria dar início à avaliação da mesma. No dia seguinte, solicitou à recorrente que fornecesse informações adicionais.

11      Em 19 de outubro de 2018, os propostos adquirentes indiretos diferentes de CR, nomeadamente CT, notificaram à CMFC a sua intenção de adquirir indiretamente uma participação qualificada no banco alvo.

12      Em 19 e 22 de outubro de 2018, a recorrente apresentou informações adicionais à CMFC, nomeadamente um plano de negócios.

13      Em 30 de outubro de 2018, a CMFC notificou à recorrente que os elementos fornecidos estavam incompletos e que não iria dar início ao processo de avaliação. No dia seguinte, solicitou à recorrente que fornecesse informações adicionais.

14      Em 1 e 20 de novembro de 2018, os propostos adquirentes forneceram as informações adicionais, nomeadamente um plano de negócios atualizado.

15      Em 23 de novembro de 2018, a CMFC informou os propostos adquirentes de que acusava a receção das notificações, que essas notificações estavam completas e que as mesmas seriam avaliadas num prazo de 60 dias úteis.

16      Em 15 e 18 de janeiro de 2019, a CMFC solicitou informações adicionais à recorrente e a CR, tendo suspendido o prazo de avaliação até à data da receção das informações em causa e, o mais tardar, até 13 de fevereiro de 2019.

17      Em 12 e 13 de fevereiro de 2019, a recorrente e CR apresentaram informações adicionais.

18      Por carta de 15 de fevereiro de 2019, a CMFC acusou a receção das informações apresentadas e informou os propostos adquirentes de que o prazo de avaliação terminava em 22 de março de 2019.

19      Pelo Acórdão de 26 de fevereiro de 2019, Rimšēvičs e BCE/Letónia (C‑202/18 e C‑238/18, EU:C:2019:139), o Tribunal de Justiça revogou a Decisão do KNAB de 19 de fevereiro de 2018, na parte em que proibia A de exercer as funções de governador do Banco Central da Letónia. O Tribunal de Justiça considerou que a República da Letónia não tinha demonstrado que a demissão de A das suas funções de governador do Banco Central da Letónia assentava na existência de indícios suficientes de que este tinha cometido uma falta grave, na aceção do artigo 14.o, n.o 2, segundo parágrafo, dos Estatutos do Sistema Europeu de Bancos Centrais e do BCE.

20      Na mesma data, a CMFC adotou a Decisão n.o 45/2019, impondo à recorrente que respeitasse, numa base individual e numa base consolidada, um requisito total de capital no quadro do processo de supervisão e de avaliação prudencial (a seguir «requisito total de capital SREP») de 12 %.

21      Em 1 de março de 2019, a CMFC apresentou ao BCE uma proposta de decisão, na aceção do artigo 15.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1024/2013, no sentido de uma oposição à aquisição proposta.

22      Por carta de 7 de março de 2019, o BCE convidou os propostos adquirentes a apresentar observações sobre um projeto de decisão.

23      Por carta de 14 de março de 2019, a recorrente e CR apresentaram observações.

24      Por carta datada de 21 de março de 2019, o BCE notificou aos propostos adquirentes a decisão recorrida, mediante a qual se opunha à aquisição de participações qualificadas e à ultrapassagem de:

–        30 % do capital e dos direitos de voto indiretamente detidos por CR e por outras partes que intervêm em concertação, enquanto propostos adquirentes indiretos, no banco alvo;

–        50 % do capital e dos direitos de voto detidos diretamente pela recorrente, enquanto proposta adquirente direta, no banco alvo.

25      O BCE juntou à decisão recorrida a sua resposta às observações apresentadas pela recorrente e CR na sua carta de 14 de março de 2019 (a seguir «resposta às observações»).

26      Em primeiro lugar, no que diz respeito ao critério da solidez financeira dos propostos adquirentes, o BCE referiu que este critério devia ser considerado preenchido se ficasse assente que o proposto adquirente dispunha não só de capacidade para financiar a aquisição proposta mas também de capacidade para manter, num futuro previsível, uma estrutura financeira sólida relativamente tanto ao proposto adquirente direto como ao banco alvo.

27      Por um lado, o BCE considerou que a recorrente dispunha de fundos que lhe permitiam adquirir as ações do banco alvo. No entanto, concluiu que a recorrente tinha sofrido perdas líquidas significativas. Considerou que a recorrente fazia face a um nível de risco de crédito elevado, nomeadamente um rácio de créditos mal parados de 47 % em meados de 2018, e a um baixo nível de fundos próprios. O BCE sublinhou, particularmente, que os rácios de fundos próprios da recorrente constituíam uma violação do requisito global de capital (a seguir «RGC»), tendo acrescentado que, no final de 2018, a recorrente violava os requisitos aplicáveis aos grandes riscos relativamente a várias contrapartes. Referiu que a recorrente violava os limites aplicáveis às operações com as partes ligadas entre si, no que diz respeito a CR. Considerou que a recorrente não estava em condições de fornecer um apoio financeiro ao banco alvo, em caso de necessidade.

28      Por outro lado, o BCE considerou que os propostos adquirentes indiretos, que controlariam indiretamente o banco alvo e o novo grupo constituído após a aquisição proposta (a seguir «novo grupo»), não seriam capazes de fornecer um suporte financeiro suficiente ao banco alvo e ao novo grupo. Constatou que CR, o principal acionista da recorrente, não tinha declarado outros recursos financeiros para lá da sua participação na recorrente, num valor estimado de 13,6 milhões de euros, do qual se deveriam deduzir os seus compromissos face à recorrente no valor de 11,8 milhões de euros. Considerou que o plano de negócios apresentado pelos propostos adquirentes revelava que o novo grupo tinha um baixo nível de fundos próprios, tendo constatado que o rácio total de fundos próprios do novo grupo não permitia alcançar o RGC atualmente aplicável à recorrente ao nível do grupo. De uma maneira geral, considerou que o nível de fundos próprios do novo grupo não era adequado, tendo em conta que este grupo apresentava um nível de risco elevado e que provavelmente seriam necessárias injeções futuras de capital.

29      Além disso, o BCE considerou existirem sérias dúvidas quanto à vontade real dos propostos adquirentes em apoiar o banco alvo em caso de necessidade. Referiu que não existia um compromisso firme e irrevogável por parte dos propostos adquirentes indiretos em fornecer tal apoio. Teve igualmente em conta a falta substancial de apoio financeiro concedido à recorrente num passado recente.

30      O BCE concluiu que o critério de solidez financeira não se encontrava preenchido.

31      Em segundo lugar, quanto ao critério da capacidade da instituição de crédito para cumprir os requisitos prudenciais, o BCE considerou que esta capacidade devia ser apreciada não apenas ao nível do banco alvo, mas também ao nível do novo grupo. Referiu ainda que era necessário considerar a situação não apenas à data da aquisição proposta, mas também após essa aquisição.

32      O BCE considerou que, embora a aquisição proposta não tivesse um impacto negativo imediato sobre o cumprimento, por parte do único banco alvo, dos requisitos de fundos próprios e de liquidez ao nível individual, o novo grupo não respeitaria provavelmente os requisitos de fundos próprios tanto no cenário de base como no cenário desfavorável do plano de negócios apresentado pelos propostos adquirentes. Com efeito, supondo que o requisito total de capital SREP aplicável ao novo grupo não seria mais baixo do que o aplicável à recorrente em 2018 e em 2019, o novo grupo violaria o RGC aplicável.

33      O BCE concluiu igualmente que o banco alvo tinha sofrido perdas significativas ao longo dos dois últimos anos. Mencionou que a CMFC tinha instaurado um procedimento administrativo em 26 de fevereiro de 2018, no que respeita às deficiências do banco alvo em matéria de regime de controlo interno e de luta contra o branqueamento de capitais. O BCE considerou que o novo grupo fazia face a um perfil de risco elevado e que se poderia razoavelmente esperar que o requisito total de capital SREP aplicável ao referido grupo fosse mais elevado do que os níveis equacionados no cenário de base do plano de negócios.

34      O BCE considerou que o referido cenário de base era exageradamente otimista, uma vez que previa um regresso muito rápido à rendibilidade e à acumulação de lucros. Sublinhou que o plano de negócios não fornecia nenhuma informação detalhada e convincente sobre os prazos necessários para alcançar o limiar de rendibilidade e chegar a um tal nível de lucros num ano.

35      O BCE salientou que os propostos adquirentes tinham apresentado diversos cenários desfavoráveis. Constatou que, no cenário mais desfavorável, os custos de exploração do banco alvo permaneceriam constantes e que este último sofreria uma coima de 1,5 milhões de euros imposta pela CMFC no quadro do procedimento administrativo relacionado com a luta contra o branqueamento de capitais. Neste cenário, haveria um défice adicional de capital em relação ao RGC de 2019. O BCE considerou que estes cenários desfavoráveis eram mais realistas que o cenário de base e sublinhavam o nível insuficiente de capitais próprios do novo grupo.

36      O BCE entendeu que, por conseguinte, o novo grupo não respeitaria provavelmente os requisitos de fundos próprios aplicáveis.

37      O BCE considerou que o novo grupo se depararia com problemas herdados da recorrente, a saber um elevado nível de risco de crédito e uma violação dos limites para os grandes riscos. Considerou que a persistência do elevado nível de risco de crédito da recorrente tinha um impacto sobre o risco do défice de fundos próprios do novo grupo. Considerou ainda que, de acordo com os cenários desfavoráveis, continuariam a existir violações dos limites aos grandes riscos por parte da recorrente.

38      Por último, o BCE considerou que as fragilidades em termos de governação e de controlo interno da recorrente e do banco alvo, nomeadamente no que diz respeito à prevenção do branqueamento de capitais, não tinham sido abordadas no plano de negócios e que não havia razão para crer que a constituição de um novo grupo permitiria resolver tais fragilidades.

39      De um modo geral, o BCE considerou que a estratégia dos propostos adquirentes relativamente ao banco alvo não era clara. Considerou que os propostos adquirentes tinham apenas fornecido informações muito limitadas sobre a fusão proposta, que se deveria prolongar por um período até 18 meses e sobre a organização do novo grupo até à conclusão da fusão. Referiu que esta falta de clareza se manifestava na má qualidade do plano de negócios em termos de coerência, legibilidade e descrição das ações previstas, o que aumentava as dúvidas sobre a credibilidade global do projeto de aquisição proposta.

40      O BCE entendeu que a aquisição proposta não podia levar à formação de um novo grupo bancário viável, sobretudo porque as medidas suscetíveis de garantir o sucesso de tal operação não se encontravam suficientemente detalhadas nem eram convincentes. Considerou que o novo grupo seria afetado por um modelo de negócios insustentável, um fraco sistema de governação e de controlo interno herdado das duas entidades que se deveriam fundir e por uma estratégia pouco clara para ultrapassar estes problemas e disporia de um baixo nível de capitais próprios, o que representava um elevado risco de violação dos requisitos prudenciais. O BCE estimou que, independentemente da fusão proposta e considerando apenas o banco alvo, a aquisição proposta teria um impacto negativo sobre a capacidade daquele banco para resolver as suas fragilidades atuais.

41      Por conseguinte, o BCE entendeu que o critério do cumprimento dos requisitos prudenciais também não se encontrava preenchido.

42      O BCE concluiu que uma vez que nem o critério da estabilidade financeira do proposto adquirente, nem o do cumprimento dos requisitos prudenciais se encontravam preenchidos, se opunha à aquisição proposta, sem analisar esta aquisição à luz dos outros critérios previstos no artigo 23.o, n.o 1, da Diretiva 2013/36/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativa ao acesso à atividade das instituições de crédito e à supervisão prudencial das instituições de crédito e empresas de investimento, que altera a Diretiva 2002/87/CE e revoga as Diretivas 2006/48/CE e 2006/49/CE (JO 2013, L 176, p. 338), conforme transposto para o direito letão.

43      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 31 de maio de 2019, a recorrente, CR e CT interpuseram o presente recurso.

II.    Factos posteriores à interposição do recurso

44      Em 15 de agosto de 2019, o BCE concluiu que a recorrente se encontrava em situação ou em risco de insolvência, na aceção do artigo 18.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento (UE) n.o 806/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de julho de 2014 que estabelece regras e um procedimento uniformes para a resolução de instituições de crédito e de certas empresas de investimento no quadro de um Mecanismo Único de Resolução e de um Fundo Único de Resolução bancária e que altera o Regulamento (UE) n.o 1093/2010 (JO 2014, L 225, p. 1). Na mesma data, o Conselho Único de Resolução (CUR) decidiu não adotar um programa de resolução na aceção do artigo 18.o, n.o 1, deste regulamento, em relação à recorrente.

45      Em 22 de agosto de 2019, a CMFC requereu ao Rīgas pilsētas Vidzemes priekšpilsētas tiesa (Tribunal da Comarca de Vidzeme da cidade de Riga, Letónia) que declarasse a recorrente insolvente.

46      Em 12 de setembro de 2019, o Rīgas pilsētas Vidzemes priekšpilsētas tiesa (Tribunal da Comarca de Vidzeme da cidade de Riga) declarou a recorrente insolvente, tendo nomeado um administrador judicial responsável pelo processo de insolvência (a seguir «administrador judicial») e tendo transferido para o mesmo o conjunto dos poderes da recorrente e do seu conselho de administração. O tribunal indeferiu o pedido do conselho de administração da recorrente de manter os seus direitos de representação desta última no âmbito do recurso contra a avaliação do BCE, de 15 de agosto de 2019, que declarou que a recorrente se encontrava em situação ou em risco de insolvência, contra a decisão do CUR, da mesma data, de não adotar um programa de resolução a respeito da mesma e contra a decisão da CMFC de instaurar um processo de insolvência. Este tribunal acrescentou que isso não excluía a possibilidade de o conselho de administração da recorrente apresentar um pedido em separado ao administrador judicial no que diz respeito aos direitos de representação nas missões específicas.

47      Igualmente em 12 de setembro de 2019, a CMFC requereu ao BCE que revogasse a autorização da recorrente.

48      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 25 de outubro de 2019 (processo T‑732/19), a recorrente, bem como outros acionistas ou potenciais acionistas da recorrente, pediram a anulação da Decisão do CUR de 15 de agosto de 2019 de não adotar um programa de resolução em relação à recorrente.

49      Em 21 de dezembro de 2019, A cessou as suas funções de governador do Banco Central da Letónia.

50      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 29 de janeiro de 2020 (processo T‑50/20), a recorrente pediu a anulação da Decisão do BCE de 19 de novembro de 2019 que recusou ordenar ao administrador judicial da recorrente que concedesse ao advogado mandatado pelo seu conselho de administração o acesso às suas instalações, às informações em seu poder, bem como ao seu pessoal e aos seus recursos.

51      Em 17 de fevereiro de 2020, o BCE revogou a autorização da recorrente. Esta revogação produziu efeitos no dia seguinte.

52      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 27 de abril de 2020 (processo T‑230/20), a recorrente interpôs recurso desta decisão.

III. Tramitação processual e pedidos das partes

53      Em 10 de setembro de 2019, o BCE apresentou a sua contestação na Secretaria do Tribunal Geral.

54      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 20 de setembro de 2019, a Comissão Europeia pediu para intervir no presente processo em apoio dos pedidos do BCE. Por Decisão de 28 de outubro de 2019, o presidente da Quarta Secção do Tribunal Geral admitiu a intervenção da Comissão.

55      Em 4 de novembro de 2019, a Comissão apresentou um articulado de intervenção na Secretaria do Tribunal Geral.

56      Em 28 de abril de 2020, o presidente da Quarta Secção decidiu, nos termos do artigo 69.o, alínea d), do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, suspender o processo até que o Tribunal Geral proferisse uma decisão no processo T‑50/20. Por Despacho de 12 de março de 2021, PNB Banka/BCE (T‑50/20, EU:T:2021:141), o Tribunal Geral proferiu a sua decisão neste processo e o presente processo foi retomado na mesma data.

57      Em 28 de abril de 2021 e, subsequentemente, em 28 de junho de 2021, a recorrente, CR e CT requereram a suspensão do processo até que o Tribunal de Justiça proferisse uma decisão no processo C‑321/21 P, relativo ao recurso interposto contra o Despacho de 12 de março de 2021, PNB Banka/BCE (T‑50/20, EU:T:2021:141). Em 20 de maio de 2021, e, subsequentemente, em 6 de agosto de 2021, o presidente da Quarta Secção, depois de ouvir o BCE, decidiu não suspender o processo.

58      Por carta de 8 de julho de 2021, o representante da recorrente informou o Tribunal Geral de que já não representava CR e CT. Por Despacho de 21 de dezembro de 2021, o Tribunal Geral (Quarta Secção), com fundamento no artigo 131.o, n.o 2, do Regulamento de Processo, declarou que já não era necessário proferir uma decisão no presente recurso na parte em que tinha sido interposto por CR e CT.

59      O prazo para apresentação da réplica foi fixado pela última vez em 30 de setembro de 2021. A recorrente não apresentou a réplica dentro do prazo previsto.

60      A recorrente conclui pedido que o Tribunal Geral se digne:

–        anular a decisão recorrida;

–        condenar o BCE nas despesas.

61      O BCE, apoiado pela Comissão, conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar a recorrente nas despesas.

IV.    Questão de direito

A.      Quanto à existência de um mandato do representante que interpôs o recurso em nome da recorrente

62      Nos termos do artigo 51.o, n.o 3, do Regulamento de Processo, os advogados devem, quando a parte que representam seja uma pessoa coletiva de direito privado, apresentar na Secretaria do Tribunal Geral um mandato outorgado pela referida parte.

63      Encontra‑se nos autos um mandato outorgado pelo presidente do conselho de administração da recorrente em 5 de março de 2019 (anexo A.2).

64      A recorrente alega que o administrador judicial recusou que o advogado por ela nomeado para a representar tivesse acesso aos seus documentos, às suas instalações, ao seu pessoal e aos seus recursos. A recorrente apresentou, no âmbito da sua resposta de 13 de março de 2020 a uma pergunta do Tribunal Geral, uma carta do administrador judicial de 16 de setembro de 2019 que referia que o seu advogado devia, em primeiro lugar, «submeter ao administrador [judicial] um relatório escrito sobre o estado de desenvolvimento do acordo [relativo à prestação de serviços jurídicos], indicando detalhadamente as instruções recebidas [da recorrente], as tarefas efetuadas pelo [advogado] e se existem efetivamente trabalhos em curso», em segundo lugar, «informar o administrador [judicial] sobre os pagamentos […]», em terceiro lugar, «abster‑se de qualquer atividade em nome [da recorrente] sem consultar previamente o administrador [judicial], em particular, de deixar de prestar os serviços faturáveis [à recorrente]».

65      Apesar da referida carta do administrador judicial de 16 de setembro de 2019, não resulta dos documentos dos autos e não é alegado pela recorrente nem pelo BCE que o administrador judicial tenha revogado o mandato outorgado ao presidente do conselho de administração da recorrente em 5 de março de 2019. A referida carta não refere essa revogação, embora mencione que o advogado nomeado pelo presidente do conselho de administração deve abster‑se de qualquer atividade em nome da recorrente sem consultar previamente o administrador judicial.

66      Por conseguinte o Tribunal Geral concluiu que a recorrente apresentou um mandato que habilita o seu advogado a interpor um recurso, em conformidade com o artigo 51.o, n.o 3, do Regulamento de Processo.

B.      Quanto aos pedidos de suspensão do processo apresentados em 28 de abril de 2021 e, subsequentemente, em 28 de junho de 2021

67      Em 28 de abril de 2021 e, subsequentemente, em 28 de junho de 2021, a recorrente requereu a suspensão do processo. Em apoio dos seus pedidos de suspensão, alegou que necessitava de aceder às suas instalações, aos seus processos e aos seus recursos financeiros e que o administrador judicial não cooperava no sentido de garantir a sua representação efetiva, em detrimento do Acórdão de 5 de novembro de 2019, BCE e o./Trasta Komercbanka e o. (C‑663/17 P, C‑665/17 P e C‑669/17 P, EU:C:2019:923).

68      O Tribunal Geral, embora não esteja obrigado a expor os motivos pelos quais decide suspender ou não um processo, em aplicação do artigo 69.o, alíneas c) ou d), do Regulamento de Processo, considera útil, a título excecional, referir o seguinte.

69      A decisão de suspender ou não um processo com base no artigo 69.o, alíneas c) ou d), do Regulamento de Processo é da competência discricionária do Tribunal Geral (v., neste sentido, Despachos de 20 de outubro de 2011, DTL/IHMI, C‑67/11 P, não publicado, EU:C:2011:683, n.os 32 e 33; de 15 de outubro de 2012, Internationaler Hilfsfonds/Comissão, C‑554/11 P, não publicado, EU:C:2012:629, n.o 37, e de 17 de janeiro de 2018, Josel/EUIPO, C‑536/17 P, não publicado, EU:C:2018:14, n.o 5).

70      No caso em apreço, o processo foi suspenso em 28 de abril de 2020 até ser proferida decisão do Tribunal Geral no processo T‑50/20, no qual a recorrente tinha pedido a anulação da Decisão do BCE de 19 de novembro de 2019 que recusou ordenar ao administrador judicial da recorrente que concedesse ao advogado mandatado pelo seu conselho de administração o acesso às respetivas instalações, às informações em seu poder, bem como ao seu pessoal e aos seus recursos.

71      Por Despacho de 12 de março de 2021, PNB Banka/BCE (T‑50/20, EU:T:2021:141), o Tribunal Geral negou provimento ao recurso da recorrente, tendo considerado, particularmente, que o BCE era manifestamente incompetente para deferir o pedido do conselho de administração da recorrente com vista a ordenar que o administrador judicial da recorrente concedesse ao advogado mandatado pela mesma o acesso às respetivas instalações, às informações, ao pessoal e aos recursos da recorrente (n.o 73). O Tribunal Geral declarou igualmente que as decisões tomadas pelas autoridades nacionais no contexto do processo de insolvência, como o que está a correr contra a recorrente, em resposta a um eventual pedido de acesso aos documentos, às instalações, ao pessoal ou aos recursos da instituição de crédito em causa estão, em princípio, sujeitas à fiscalização dos órgãos jurisdicionais nacionais, os quais podem, se for o caso, submeter ao Tribunal de Justiça questões prejudiciais ao abrigo do artigo 267.o TFUE no caso de se depararem com dificuldades na interpretação ou na aplicação do direito da União (n.o 72).

72      Importa igualmente referir que, apesar nomeadamente da suspensão do processo entre 28 de abril de 2020 e 12 de março de 2021, a recorrente não demonstrou nem alegou, incluindo no seu pedido de suspensão do processo de 28 de junho de 2021, ter instaurado um processo judicial contra o administrador judicial, o qual, porém, acusa, perante o Tribunal Geral, de impedir o advogado mandatado pelo seu conselho de administração de aceder às suas instalações, às suas informações, ao seu pessoal e aos seus recursos, desde finais de 2019.

73      Após ter feito prova de uma troca de correspondência e de mensagens de correio eletrónico com o administrador judicial que ocorreu em 12 e 16 de setembro de 2019, bem como durante o mês de novembro de 2019, a recorrente limitou‑se a alegar, no seu pedido de suspensão do processo apresentado na secretaria do Tribunal Geral em 28 de abril de 2021, que «reforçava os seus esforços» perante o administrador judicial e os órgãos jurisdicionais letões, sem fornecer precisões sobre a natureza de tais esforços.

74      Além disso, não resulta da Decisão de 12 de setembro de 2019 do Rīgas pilsētas Vidzemes priekšpilsētas tiesa (Tribunal da Comarca de Vidzeme da cidade de Riga), referida no n.o 46, supra, que a recorrente estivesse impedida de submeter aos órgãos jurisdicionais letões um eventual litígio contra o administrador judicial. Não só esta decisão menciona que a possibilidade de o conselho de administração da recorrente apresentar um pedido em separado ao administrador da insolvência, no que respeita aos direitos de representação em missões específicas, não está excluída, como o Acórdão de 5 de novembro de 2019, BCE e o./Trasta Komercbanka e o. (C‑663/17 P, C‑665/17 P e C‑669/17 P, EU:C:2019:923), invocado pela recorrente para sustentar que o administrador judicial não coopera de forma satisfatória com vista a assegurar a sua representação efetiva, é posterior à referida decisão, de modo que a recorrente podia a priori invocar o referido acórdão como elemento novo perante o órgão jurisdicional nacional.

75      Por conseguinte, o Tribunal Geral não considera necessário suspender novamente o processo.

C.      Quanto à fase oral do processo

76      Nos termos do artigo 106.o, do Regulamento de Processo:

«1.      O processo no Tribunal comporta, na sua fase oral, uma audiência de alegações organizada oficiosamente ou a pedido de uma parte principal.

2. O pedido de audiência de alegações de uma parte principal deve indicar os motivos pelos quais esta pretende ser ouvida. […]

3. Na falta do pedido referido no n.° 2, o Tribunal pode, caso se considere suficientemente esclarecido pelas peças dos autos do processo, decidir julgar o recurso sem fase oral. […]»

77      Resulta, assim, da redação do artigo 106.o do Regulamento de Processo que, na falta de pedido de audiência de alegações que indique os motivos pelos quais uma parte principal pretende ser ouvida, o Tribunal Geral pode, se se considerar suficientemente esclarecido, decidir julgar o recurso sem fase oral.

78      A exposição de motivos do projeto de regulamento de processo de 14 de março de 2014, acessível ao público na página Internet do Tribunal de Justiça da União Europeia, confirma aliás que, tendo em conta, particularmente, as exigências da boa administração da justiça e da economia do processo, «o Tribunal Geral considera poder dispensar a organização de uma audiência se não a considerar necessária, a menos que uma das partes principais apresente um pedido indicando os motivos pelos quais pretende ser ouvida».

79      As Disposições Práticas de Execução do Regulamento de Processo (a seguir «DPE») dispõem, no n.o 142, que a parte principal que pretenda ser ouvida numa audiência de alegações deve apresentar um pedido fundamentado nesse sentido, no prazo de três semanas a contar da notificação às partes do encerramento da fase escrita do processo, especificando que essa fundamentação deve resultar de uma apreciação concreta da utilidade de uma audiência de alegações para a parte em causa e indicar os elementos dos autos do processo «ou» da argumentação que essa parte considere necessário desenvolver «ou» refutar mais amplamente numa audiência de alegações. Indica ainda que para uma melhor orientação dos debates na audiência, é «desejável» que a fundamentação não tenha caráter geral, limitando‑se, por exemplo, a fazer referência à importância do processo. O n.o 143 das DPE prevê que se uma parte principal não apresentar um pedido fundamentado no prazo fixado, o Tribunal Geral pode decidir conhecer do recurso sem fase oral.

80      Resulta, assim, do artigo 106.o, do Regulamento de Processo, bem como dos n.os 142 e 143 das DPE que na falta de um pedido de audiência de alegações ou perante um pedido de audiência de alegações sem fundamentação, o Tribunal Geral pode decidir conhecer do recurso sem fase, se se considerar suficientemente esclarecido pelas peças processuais.

81      No presente caso, a recorrente, por carta de 29 de novembro de 2021, tomou posição sobre a realização de uma audiência, nos seguintes termos:

«1.      Confirmo que, pelas razões que já explicadas em detalhe, que não existe atualmente uma representação efetiva [da recorrente]. Com o único objetivo de cumprir o prazo aplicável, venho por este meio solicitar uma audiência. No entanto, seria necessário que a representação efetiva [da recorrente] fosse previamente restabelecida.

2.      Não é possível preparar nem assistir a uma audiência nas presentes circunstâncias».

82      Resulta da referida carta de 29 de novembro de 2021 que o pedido de audiência apresentado pela recorrente não contém nenhuma fundamentação. Este pedido não indica, com efeito, nenhum motivo pelo qual a recorrente pretende ser ouvida.

83      Além disso, na sua carta de 25 de outubro de 2021, na qual informa as partes principais do encerramento da fase escrita do processo, o secretário do Tribunal Geral recordou as disposições do artigo 106.o, n.o 2, do Regulamento de Processo, bem como as do n.o 142 das DPE e chamou a atenção das partes principais para o facto de, no contexto da crise sanitária, a fundamentação ter de respeitar as exigências do referido número das DPE.

84      É certo que a recorrente alegou, no seu pedido de audiência, que se considerava privada de representação efetiva.

85      Ainda que se entenda que, deste modo, a recorrente tenta justificar implicitamente a falta de motivação do seu pedido de audiência, o que, no entanto, não resulta do referido pedido, há que considerar que a sua argumentação relativa à falta de representação efetiva não pode ser considerada uma justificação da falta de fundamentação deste pedido. Particularmente, a circunstância de a recorrente estar privada de representação efetiva, no sentido que expõe, em nada a impedia de apresentar elementos circunstanciados em apoio de um pedido de audiência.

86      Por conseguinte, uma vez que a recorrente não apresentou nenhuma fundamentação no seu pedido de audiência e tendo, além disso, sido expressamente recordada pelo secretário do Tribunal Geral da sua obrigação de fundamentar tal pedido, há que considerar que o referido pedido de audiência não respeita o artigo 106.o, n.o 2, do Regulamento de Processo.

87      Nestas circunstâncias, o Tribunal Geral, considerando‑se suficientemente esclarecido pelas peças processuais, decide conhecer do recurso sem fase oral, em conformidade com o artigo 106.o, n.o 3, do Regulamento de Processo.

D.      Quanto ao mérito

1.      Quanto ao primeiro fundamento, relativo ao facto de o período de avaliação ter expirado antes da adoção da decisão recorrida

88      A recorrente alega que o período de avaliação previsto no artigo 22.o, n.o 2, da Diretiva 2013/36 expirou antes da adoção da decisão recorrida. Ora, o projeto de aquisição considerar‑se‑ia aprovado se a autoridade de controlo se lhe não opusesse antes do termo deste prazo, nos termos do artigo 22.o, n.o 6, desta diretiva e o BCE já não podia, à data da decisão recorrida, opor‑se ao projeto de aquisição.

89      A recorrente alega que, à data da mensagem de correio eletrónico da CMFC de 25 de outubro de 2018, se encontravam preenchidas todas as condições para o início do período de avaliação. Este último começou o mais tardar em 29 de outubro de 2018, dois dias úteis após a referida mensagem. Com efeito, por esta mensagem e, subsequentemente, pela carta de 30 de outubro de 2018, a CMFC admitiu que tinha recebido a notificação do projeto de aquisição, bem como todos os documentos exigidos. A recorrente acrescenta que, embora seja certo que na sua carta de 25 de outubro de 2018 e, subsequentemente, na sua carta de 30 de outubro de 2019, a CMFC tenha descrito uma abordagem diferente da do procedimento e dos prazos previstos no artigo 22.o da Diretiva 2013/36 e que, segundo a CMFC, lhe teria sido imposta pelo BCE, este argumento é irrelevante.

90      O BCE contesta a argumentação da recorrente.

91      Nos termos do artigo 22.o, n.os 1, 2 e 6, da Diretiva 2013/36:

«1.      Os Estados‑Membros exigem que as pessoas singulares ou coletivas que, individualmente ou em concertação (“proposto adquirente”) decidam adquirir ou aumentar, direta ou indiretamente, uma participação qualificada numa instituição de crédito de modo a que a sua percentagem de direitos de voto ou de participação no capital atinja ou ultrapasse 20 %, 30 % ou 50 % ou que a instituição de crédito se transforme em sua filial (“projeto de aquisição”), comuniquem previamente por escrito às autoridades competentes da instituição de crédito em que pretendem adquirir ou aumentar uma participação qualificada o montante dessa participação e as informações relevantes, especificadas nos termos do artigo 23.o, n.o 4 [desta diretiva]. […]

2.      As autoridades competentes devem confirmar por escrito ao proposto adquirente, com a maior brevidade e impreterivelmente no prazo de dois dias úteis, a receção da comunicação referida no n.o 1 ou das outras informações referidas no n.o 3.

As autoridades competentes dispõem de um prazo máximo de sessenta dias úteis a contar da data da confirmação da receção da comunicação e de todos os documentos a anexar à mesma exigidos pelo Estado‑Membro com base na lista a que se refere o artigo 23.o, n.o 4, [desta diretiva] (“prazo de apreciação”) para efetuar a apreciação prevista no artigo 23.o, n.o 1, [desta diretiva] (“apreciação”).

As autoridades competentes informam o proposto adquirente do termo do prazo de apreciação no momento do envio da confirmação da receção.

[…]

6.      Se, durante o prazo de apreciação, as autoridades competentes não se opuserem por escrito ao projeto de aquisição, este considera‑se aprovado.»

92      Nos termos do artigo 23.o, n.o 4, da Diretiva 2013/36: «Os Estados‑Membros publicam uma lista especificando as informações necessárias à apreciação que devem ser transmitidas às autoridades competentes aquando da comunicação a que se refere o artigo 22.o, n.o 1 [desta diretiva]. […]»

93      Os artigos 22.o e 23.o da Diretiva 2013/36 foram transpostos pelos artigos 28.o e 29.o, da Lei letã relativa às Instituições de Crédito, conforme precisados pelo Regulamento 192 da CMFC, de 28 de novembro de 2017, intitulado «Listagem das informações necessárias para a notificação da aquisição ou do aumento de uma participação qualificada e princípios gerais e processo de apreciação de uma notificação» (a seguir «Regulamento 192»).

94      O artigo 28.o do Regulamento 192 prevê que o aviso de receção da notificação do projeto de aquisição deve mencionar, nomeadamente, que esta notificação é considerada completa.

95      As Orientações Comuns da Autoridade Bancária Europeia (a seguir «ABE»), da Autoridade Europeia dos Seguros e Pensões Complementares de Reforma (a seguir «EIOPA») e da Autoridade Europeia dos Mercados Financeiros (a seguir «AEMF») relativas à avaliação prudencial das aquisições e dos aumentos de participações qualificadas nas entidades do setor financeiro, publicadas em 20 de dezembro de 2016 (JC/GL/2016/01, a seguir «Orientações Comuns»), também contêm precisões relativas à notificação. Tanto o BCE como a CMFC indicaram cumprir essas orientações, em conformidade com o artigo 16.o, n.o 3, do Regulamento (UE) n.o 1093/2010 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 24 de novembro de 2010, que cria uma Autoridade Europeia de Supervisão (Autoridade Bancária Europeia), altera a Decisão n.o 716/2009/CE e revoga a Decisão 2009/78/CE da Comissão (JO 2010, L 331, p. 12). Nos termos do n.o 9.1, segundo período, das referidas Orientações, a notificação devia ser considerada completa quando incluísse todas as informações necessárias enunciadas na lista a publicar em conformidade com a legislação aplicável, para efeitos de avaliação prudencial pela autoridade de supervisão prudencial. O terceiro período do n.o 9.1 refere que o aviso de receção devia constituir exclusivamente uma etapa processual relacionada com a exaustividade formal da notificação, tendo por efeito dar início ao prazo de 60 dias úteis durante o qual deve ser realizada a avaliação e não implica o conhecimento de mérito dos documentos por parte da autoridade de supervisão do banco alvo.

96      No caso em apreço, a CMFC acusou receção da notificação do projeto de aquisição, nos termos do artigo 22.o, n.o 2, da Diretiva 2013/36, tal como transposto para o direito letão, por carta datada de 23 de novembro de 2018. Esta carta menciona, particularmente, nos termos do artigo 28.o do Regulamento 192, que a notificação está completa.

97      Não assiste nenhuma razão à recorrente quando afirma que, antes de 23 de novembro de 2018, o CMFC admitiu, pela sua mensagem de correio eletrónico de 25 de outubro de 2018 e pela sua carta de 30 de outubro de 2018, que tinha recebido a notificação e toda a documentação exigida.

98      Pelo contrário, por um lado, pela referida mensagem de correio eletrónico de 25 de outubro de 2018, mencionada na referida carta de 30 de outubro de 2018, a CMFC informou a recorrente de que o BCE estava a verificar se a notificação estava completa. Por outro lado, por esta carta de 30 de outubro de 2018, informou a recorrente de que os relatórios apresentados estavam incompletos e que o processo de avaliação ainda não se tinha iniciado, tendo acrescentado que informaria a recorrente por carta separada das informações em falta. Em 31 de outubro de 2018, comunicou à recorrente a lista das referidas informações.

99      Por conseguinte, nem a mensagem de correio eletrónico de 25 de outubro de 2018 nem a carta de 30 de outubro de 2018 da CMFC, constituíram a confirmação da receção da notificação, na aceção do artigo 22.o, n.o 2, da Diretiva 2013/36, tal como transposto para o direito letão.

100    Além disso, a recorrente não alega que as informações solicitadas pela CMFC na sua carta de 31 de outubro de 2018 não eram necessárias para a avaliação e não deviam ser comunicadas à CMFC no momento da notificação, em conformidade com o artigo 22.o, n.o 1, e o artigo 23.o, n.o 4, da Diretiva 2013/36, tal como transpostos para o direito letão. Particularmente, a recorrente não afirma que tais informações não são mencionadas no Regulamento 192 que estabelece a lista das informações necessárias para proceder à avaliação e que devem ser comunicadas às autoridades competentes no momento da notificação referida no artigo 22.o, n.o 1, da Diretiva 2013/36 e nos anexos desse regulamento.

101    Para ser exaustivo, importa salientar que o BCE alega, sem que tal seja contestado, que faltavam no plano de negócios apresentado em 19 de outubro de 2018 certas informações exigidas em conformidade com o anexo 9 do Regulamento 192, nomeadamente, em primeiro lugar, um plano de implementação do objetivo prosseguido pelo projeto de aquisição, em segundo lugar, os resultados financeiros previstos para os três anos seguintes (ao nível individual e ao nível consolidado), em terceiro lugar, a composição do conselho de administração, a composição do conselho de supervisão e as suas obrigações, bem como a composição dos principais comités da instituição financeira instituídos pelo conselho de administração ou pelo conselho de supervisão, incluindo as informações relativas às pessoas que dirigem ou dirigirão a instituição financeira e os seus comités.

102    Por conseguinte, não assiste razão à recorrente quando sustenta que as condições para o início do período de avaliação se encontravam preenchidas desde 25 de outubro de 2018.

103    O primeiro fundamento deve, pois, ser julgado improcedente.

2.      Quanto ao segundo fundamento, relativo à violação do procedimento estabelecido no artigo 15.o do Regulamento n.o 1024/2013 e nos artigos 85.o a 87.o do Regulamento n.o 468/2014 

104    A recorrente alega que a CMFC e o BCE não respeitaram as regras processuais aplicáveis ao presente caso, prescritas no artigo 15.o do Regulamento n.o 1024/2013 e nos artigos 85.o a 87.o do Regulamento (UE) n.o 468/2014 do BCE, de 16 de abril de 2014 que estabelece o quadro de cooperação, no âmbito do Mecanismo Único de Supervisão, entre o Banco Central Europeu e as autoridades nacionais competentes e com as autoridades nacionais designadas (JO 2014, L 141, p. 1), uma vez que a CMFC não apresentou nenhuma proposta de decisão.

105    A recorrente afirma igualmente que a decisão recorrida está ferida de vício processual, uma vez que os requisitos de fundos próprios regulamentares nos quais a mesma se baseia só foram definidos numa carta recebida em 1 de março de 2019, muito tempo após a notificação da proposta de aquisição, num momento em que a recorrente já não podia alterar essa notificação. Além disso, o BCE não tinha tido em conta o facto de os requisitos específicos fixados pela CMFC terem sido contestados pela recorrente e serem objeto de revisão.

106    O BCE contesta a argumentação da recorrente.

107    Nos termos do artigo 15.o do Regulamento n.o 1024/2013:

«1.      Sem prejuízo das isenções previstas no artigo 4.o, n.o 1, alínea c), [deste regulamento], a notificação da aquisição de uma participação qualificada numa instituição de crédito estabelecida num Estado‑Membro participante, ou as informações com ela relacionadas, são apresentadas às autoridades nacionais competentes do Estado‑Membro em que a instituição de crédito está estabelecida, nos termos dos requisitos estabelecidos na legislação nacional aplicável baseada nos atos a que se refere o artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, [deste regulamento].

2.      A autoridade nacional competente avalia a aquisição proposta e envia ao BCE, pelo menos dez dias úteis antes do termo do prazo de avaliação relevante tal como definido na legislação aplicável da União, a notificação acompanhada de uma proposta de decisão de oposição ou de não oposição à aquisição, baseada nos critérios estabelecidos nos atos a que se refere o artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo [deste regulamento]; a autoridade nacional competente coadjuva ainda o BCE nos termos do artigo 6.o [deste regulamento].

3.      O BCE toma uma decisão de oposição ou de não oposição à aquisição com base nos critérios de avaliação estabelecidos na legislação aplicável da União e pelo procedimento e dentro dos prazos de avaliação nela previstos.»

108    Em primeiro lugar, na parte em que a recorrente alega que a decisão recorrida viola o artigo 15.o do Regulamento n.o 1024/2013 e os artigos 85.o a 87.o do Regulamento n.o 468/2014, uma vez que a CMFC não apresentou uma proposta de decisão ao BCE, importa referir que este argumento improcede. Tal como resulta dos n.os 1.3 e 2.1 da decisão recorrida, a CMFC apresentou uma proposta de decisão ao BCE em 1 de março de 2019, a qual foi facultada ao Tribunal Geral.

109    Em segundo lugar, a recorrente invoca a existência de um vício processual, visto que o BCE se baseou em requisitos de fundos próprios regulamentares que só foram fixados pela CMFC numa carta que a recorrente afirma ter recebido em 1 de março de 2019, já após a notificação do projeto de aquisição.

110    A este respeito, importa referir que nem o artigo 15.o do Regulamento n.o 1024/2013, nem os artigos 85.o a 87.o do Regulamento n.o 468/2014, invocados pela recorrente, se opõem a que o BCE se baseie num facto posterior à notificação do projeto de aquisição. A recorrente não invoca mais nenhuma disposição ou princípio em apoio desta linha de argumentação.

111    Por conseguinte, uma vez que o BCE se baseou em requisitos de fundos próprios regulamentares fixados pela CMFC posteriormente à notificação, o procedimento não se encontra ferido de vício à luz das disposições invocadas pela recorrente.

112    Por outro lado, conforme refere o BCE, com razão, resulta do disposto no artigo 23.o, n.o 1, alínea d), da Diretiva 2013/36, tal como transposto para o direito letão antes da notificação do projeto de aquisição, que as autoridades competentes devem avaliar se a instituição de crédito terá capacidade para cumprir de forma continuada os requisitos prudenciais.

113    O n.o 13.4 das Orientações Comuns indica, aliás, que a autoridade de supervisão do banco alvo deve avaliar a capacidade deste último para cumprir, na data da aquisição pretendida, e continuar a cumprir «após a aquisição», todos os requisitos prudenciais.

114    Resulta do artigo 23.o, n.o 1, alínea d), da Diretiva 2013/36 que, tal como afirma corretamente o BCE, as autoridades competentes devem proceder a uma avaliação prospetiva do cumprimento dos requisitos prudenciais pela instituição de crédito em causa.

115    Por conseguinte, o BCE podia ter em conta, no n.o 2.3.1 da decisão recorrida, o requisito total de capital SREP para 2019, o qual foi fixado pela CMFC numa carta que a recorrente refere ter recebido em 1 de março de 2019, quando avaliou se o novo grupo poderia não cumprir os requisitos de fundos próprios regulamentares aos quais iria estar sujeito.

116    Importa ainda precisar que o BCE, a fim de avaliar a capacidade do novo grupo para cumprir os requisitos prudenciais, se baseou, no n.o 2.3.1 da decisão recorrida, não apenas no requisito total de capital SREP para 2019, mas também no requisito total de capital SREP aplicável à recorrente em 2018. Assim, sem ter em conta o requisito total de capital SREP para 2019, segundo o cenário de base, o rácio total dos fundos próprios do novo grupo previsto para o final de 2019 ascendia apenas a 12,91 %, ou seja, a um nível inferior ao RGC que devia ser cumprido pela recorrente em relação a 2018 (13,55 %).

117    Por último, dado que a recorrente refere que os requisitos fixados pela CMFC em matéria de fundos próprios foram contestados, importa considerar, como indica corretamente o BCE, que o processo judicial perante os órgãos jurisdicionais letões não tem efeito suspensivo e não impedia que o BCE se baseasse em parte no requisito total de capital SREP para 2019.

118    Em terceiro lugar, ainda que se entendesse, como o BCE pretende, que se poderia considerar que a recorrente invocou, em apoio do segundo fundamento, um argumento segundo o qual o BCE interveio erradamente no procedimento antes da transmissão pela CMFC de uma proposta de decisão, o que não é o caso, este argumento deveria ser rejeitado.

119    Com efeito, quando o legislador da União opta por um procedimento administrativo que prevê a adoção, pelas autoridades nacionais, de atos instrutórios de uma decisão final de uma instituição da União que produz efeitos jurídicos e é suscetível de causar prejuízo, pretende estabelecer, entre esta instituição e essas autoridades nacionais, um mecanismo específico de cooperação que assenta na competência decisória exclusiva da instituição da União (Acórdão de 19 de dezembro de 2018, Berlusconi e Fininvest, C‑219/17, EU:C:2018:1023, n.o 48).

120    Nos termos do artigo 4.o, n.o 1, alínea c), do Regulamento n.o 1024/2013, conjugado com o artigo 15.o, n.o 3, deste mesmo regulamento e com o artigo 87.o do Regulamento n.o 468/2014, o BCE tem competência exclusiva para autorizar ou não o projeto de aquisição no final do procedimento previsto, entre outros, no artigo 15.o do Regulamento n.o 1024/2013 e nos artigos 85.o e 86.o do Regulamento n.o 468/2014 (Acórdão de 19 de dezembro de 2018, Berlusconi e Fininvest, C‑219/17, EU:C:2018:1023, n.o 54).

121    No âmbito de relações regidas pelo princípio da cooperação leal ao abrigo do artigo 6.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1024/2013, o papel das autoridades nacionais consiste, conforme resulta desta disposição, do artigo 15.o, n.os 1 e 2, do mesmo regulamento e dos artigos 85.o e 86.o do Regulamento n.o 468/2014, em registar os pedidos de autorização, em prestar assistência ao BCE, único titular do poder de decisão, nomeadamente fornecendo‑lhe todas as informações necessárias ao exercício das suas atribuições, instruindo esses pedidos e transmitindo depois ao BCE uma proposta de decisão que não vincula este último e cuja notificação ao requerente não está, aliás, prevista pelo direito da União (Acórdão de 19 de dezembro de 2018, Berlusconi e Fininvest, C‑219/17, EU:C:2018:1023, n.o 55).

122    Tendo em conta o mecanismo específico de cooperação que o legislador da União entendeu instituir entre o BCE e a autoridade nacional competente para a avaliação dos pedidos de autorização prévia de todas as aquisições ou aumentos de participações qualificadas em instituições de crédito, o BCE pode intervir no procedimento antes da transmissão por esta última autoridade da proposta de decisão prevista no artigo 15.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1024/2013 e mesmo desde o início do procedimento (v., neste sentido, Conclusões do advogado‑geral M. Campos Sánchez‑Bordona no processo Berlusconi e Fininvest, C‑219/17, EU:C:2018:502, n.os 91, 95, 98 e 101).

123    O artigo 85.o, n.o 1, do Regulamento n.o 468/2014 prevê, aliás, que a autoridade nacional competente à qual é enviada uma notificação de uma intenção de adquirir uma participação qualificada numa instituição de crédito estabelecida no respetivo Estado‑Membro participante deve comunicar ao BCE essa notificação «o mais tardar» cinco dias úteis após a confirmação da sua receção de acordo com o previsto no artigo 22.o, n.o 2, da Diretiva 2013/36.

124    Por conseguinte, o segundo fundamento deve ser julgado improcedente.

3.      Quanto ao sexto fundamento, relativo à desvirtuação dos factos relevantes

125    No presente caso, importa analisar o sexto fundamento, relativo à desvirtuação dos factos relevantes, imediatamente a seguir ao primeiro e segundo fundamentos, relativos à violação das regras processuais, e antes do terceiro fundamento, relativo à violação do artigo 23.o da Diretiva 2013/36.

126    No âmbito do sexto fundamento, a recorrente alega que a decisão recorrida se baseia numa apreciação de facto errada. Afirma que a decisão recorrida não teve em conta o facto de o projeto de aquisição implicar uma contribuição significativa de CR para o capital da recorrente embora este fosse um facto essencial.

127    O BCE contesta a argumentação da recorrente.

128    Com o seu sexto fundamento, deve‑se considerar que a recorrente invocou que o BCE incorreu em erro de facto no que respeita à contribuição para o capital da recorrente em consequência da aquisição proposta.

129    Este fundamento é desprovido de base factual.

130    Contrariamente ao que defende a recorrente, o BCE teve efetivamente em conta o facto de o projeto de aquisição implicar uma «injeção de capital» a favor da recorrente. O mesmo precisou que tal «injeção de capital» resultava de um contrato de permuta de ações entre CR e determinados acionistas do banco alvo. O BCE considerou que tal «injeção de capital» não permitia concluir pela vontade de CR em prestar apoio adicional no futuro e que, sobretudo, tal não punha em causa a necessidade de apreciar a solidez financeira de todos os propostos adquirentes. Entendeu que esta «injeção de capital» tinha um efeito positivo sobre os rácios de fundos próprios da recorrente segundo o seu perímetro atual. Não obstante, o BCE considerou que, apesar deste efeito, a recorrente não podia ser considerada como financeiramente sólida, devido às suas fragilidades financeiras, nomeadamente à sua rentabilidade negativa, ao elevado nível do seu crédito mal parado e à ultrapassagem dos limites de exposição aos grandes riscos. O BCE entendeu igualmente que, apesar daquele efeito positivo, não tinha ficado demonstrada a capacidade do novo grupo para cumprir os requisitos prudenciais (resposta às observações, páginas 5 a 7).

131    O facto de a referência a esta «injeção de capital» surgir na resposta às observações é irrelevante, uma vez que esta última foi apensada à decisão recorrida e deve ser considerada como fazendo parte integrante da referida decisão.

132    Por conseguinte, contrariamente ao que defende a recorrente, o BCE teve em conta o facto de o projeto de aquisição implicar uma «injeção de capital» a favor da recorrente, por motivos que, além do mais, não estão feridos de imprecisão.

133    Consequentemente, o sexto fundamento deve ser julgado improcedente.

4.      Quanto ao terceiro fundamento, relativo a uma interpretação e a uma aplicação erradas dos critérios de avaliação do artigo 23.o da Diretiva 2013/36

134    Em primeiro lugar, a recorrente alega que o BCE não respeitou a exigência de motivos razoáveis prevista no artigo 23.o da Diretiva 2013/36, considerando que uma aquisição só pode ser objeto de oposição se tiver um efeito negativo relevante em comparação com a situação em que o projeto de aquisição não tivesse sido realizado. As Orientações Comuns indicam que «o projeto de aquisição não deve pôr em causa o cumprimento dos requisitos prudenciais por parte do banco alvo». Ora, o BCE opôs‑se ao projeto de aquisição, no presente caso, alegando que as melhorias que resultariam desta aquisição seriam insuficientes. O entendimento do BCE levava a que o projeto de aquisição não pudesse ser realizado, ainda que os seus efeitos fossem positivos no plano regulamentar.

135    Em segundo lugar, quanto ao critério da solidez financeira, a recorrente alega que, no que respeita à capacidade do proposto adquirente para manter uma estrutura financeira sólida num futuro previsível, o BCE não conclui que o projeto de aquisição teria um efeito negativo significativo. O mesmo precisa que, do ponto de vista dos requisitos em matéria de fundos próprios, esta aquisição implicaria uma melhoria mesmo no cenário mais desfavorável. O BCE não comparou o projeto de aquisição com o cenário em que os dois bancos não fossem autorizados a formar um novo grupo.

136    Quanto às sérias dúvidas em relação à vontade real dos propostos adquirentes indiretos para, se necessário, apoiarem o banco alvo, a recorrente considera que não assiste nenhuma razão ao BCE quando critica os propostos adquirentes indiretos por se terem comprometido a apoiar o novo grupo em caso de crise. O BCE criticou injustificadamente, na resposta às observações, o facto de CR esperar que seja posto fim ao tratamento arbitrário e discriminatório por parte das autoridades letãs. O BCE não logrou demonstrar que os factos denunciados por CR, nomeadamente que A o convidou a pagar subornos e exerceu pressão para obter o pagamento dos mesmos para evitar um tratamento discriminatório, eram incorretos. O BCE criticou injustificadamente o facto de determinadas declarações relativas à vontade de apoiar o banco serem acompanhadas da menção «se adequado».

137    A recorrente alega que existe uma contradição entre as dúvidas expressas quanto à vontade de CR de apoiar o banco alvo e o facto de a aquisição pretendida constituir, do ponto de vista da recorrente, uma injeção de capital de pelo menos dez milhões de euros. Cerca de 40 % desta aquisição seriam financiados por CR.

138    A recorrente acrescenta que a decisão recorrida se baseia numa interpretação errónea do critério da solidez financeira. O BCE baseou‑se erradamente na existência de uma obrigação geral de financiamento, no sentido de que o adquirente deve ser capaz de atender, com os seus fundos próprios, a todas as necessidades de financiamento com as quais a instituição de crédito em causa se possa vir a deparar no futuro, e estar disposto a fazê‑lo. Uma interpretação adequada do critério da solidez financeira seria aquela, mais restritiva, de uma situação financeira sólida que não seja suscetível de dar origem a uma conduta problemática.

139    Em terceiro lugar, quanto ao critério do cumprimento dos requisitos prudenciais, a recorrente entende que a decisão recorrida resulta de uma interpretação e de uma aplicação erradas deste segundo critério. O BCE não concluiu que o projeto de aquisição teria um efeito negativo, quer para o banco alvo, quer para à recorrente. Ele opõe‑se a uma medida cujos efeitos são positivos.

140    Em quarto e último lugar, a recorrente considera que a decisão recorrida se baseia num erro de interpretação do artigo 23.o da Diretiva 2013/36, uma vez que os critérios de avaliação foram considerados requisitos de fundo cujas condições devem ser preenchidas cumulativamente. O BCE deveria ter apreciado, no quadro de uma avaliação global que tivesse em conta todos os critérios de avaliação no seu conjunto, se existia um risco significativo de não ser garantida a gestão sã e prudente da instituição de crédito.

141    O BCE, apoiado pela Comissão, contesta a argumentação da recorrente.

142    Nos termos do artigo 23.o, n.os 1 e 2, da Diretiva 2013/36:

«Na apreciação da comunicação prevista no artigo 22.o, n.o 1, e das informações a que se refere o artigo 22.o, n.o 3, [desta diretiva] as autoridades competentes devem, a fim de garantir uma gestão sã e prudente da instituição de crédito objeto do projeto de aquisição e tendo em conta a influência provável do proposto adquirente na referida instituição de crédito, avaliar a idoneidade deste último e a solidez financeira do projeto de aquisição de acordo com o seguinte conjunto de critérios:

a)      Idoneidade do adquirente potencial;

b)      Idoneidade, conhecimentos, competências e experiência, nos termos previstos no artigo 91.o, n.o 1, do membro do órgão de administração e do membro da direção de topo que dirigirão a atividade da instituição de crédito em resultado da aquisição proposta;

c)      Solidez financeira do proposto adquirente, designadamente em função do tipo de atividade exercida ou a exercer na instituição de crédito objeto do projeto de aquisição;

d)      Capacidade da instituição de crédito para cumprir de forma continuada os requisitos prudenciais baseados na presente diretiva e no Regulamento (UE) n.o 575/2013 [do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativo aos requisitos prudenciais para as instituições de crédito e para as empresas de investimento e que altera o Regulamento (UE) n.o 648/2012 (JO 2013, L 176, p. 1)] e, se for caso disso, noutra legislação da União, nomeadamente as Diretivas 2002/87/CE [do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de Dezembro de 2002, relativa à supervisão complementar de instituições de crédito, empresas de seguros e empresas de investimento de um conglomerado financeiro e que altera as Diretivas 73/239/CEE, 79/267/CEE, 92/49/CEE, 92/96/CEE, 93/6/CEE e 93/22/CEE do Conselho e as Diretivas 98/78/CE e 2000/12/CE do Parlamento Europeu e do Conselho (JO 2003, L 35, p. 1)] e 2009/110/CE [do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de setembro de 2009, relativa ao acesso à atividade das instituições de moeda eletrónica, ao seu exercício e à sua supervisão prudencial, que altera as Diretivas 2005/60/CE e 2006/48/CE e revoga a Diretiva 2000/46/CE (JO 2009, L 267, p. 7)], incluindo a existência, no grupo que a instituição vai integrar, de uma estrutura que lhes permita exercer uma supervisão efetiva, proceder eficazmente ao intercâmbio de informações entre as autoridades competentes e determinar a repartição de responsabilidades entre as autoridades competentes;

e)      Existência de motivos razoáveis para suspeitar que, em ligação com o projeto de aquisição, estão a ser ou foram cometidos ou tentados atos de branqueamento de capitais ou de financiamento do terrorismo, na aceção do artigo 1.o da Diretiva 2005/60/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de outubro de 2005, relativa à prevenção da utilização do sistema financeiro para efeitos de branqueamento de capitais e de financiamento do terrorismo [(JO 2005, L 309, p. 15),], ou de que a aquisição proposta poderá aumentar esse risco.

2.      As autoridades competentes só podem opor‑se ao projeto de aquisição se existirem motivos razoáveis para tal, com base nos critérios enunciados no n.o 1, ou se as informações prestadas pelo proposto adquirente forem incompletas.»

143    As disposições do artigo 23.o, n.os 1 e 2, da Diretiva 2013/36 foram transpostas para o direito letão pelo artigo 29.o da Lei letã relativa às Instituições de Crédito e pelo Regulamento 192.

144    As partes concordam que o BCE dispõe de uma ampla margem de apreciação ao adotar, tal como no presente caso, um ato relativo à supervisão prudencial de uma instituição de crédito (v., neste sentido, Acórdão de 8 de maio de 2019, Landeskreditbank Baden‑Württemberg/BCE, C‑450/17 P, EU:C:2019:372, n.o 86).

145    A este respeito, o juiz da União exerce, pois, um controlo do erro manifesto de apreciação (v., neste sentido, e por analogia, Acórdão de 11 de dezembro de 2018, Weiss e o., C‑493/17, EU:C:2018:1000, n.o 24 e jurisprudência referida).

a)      Quanto ao critério da solidez financeira do proposto adquirente

146    A recorrente alega, em primeiro lugar, que para se opor ao projeto de aquisição com base no critério da solidez financeira, o BCE deveria ter‑se baseado na existência de um efeito negativo importante do projeto de aquisição por comparação com a situação em que esta aquisição não se tivesse realizado.

147    No entanto, não resulta nem do artigo 23.o, n.os 1 e 2, da Diretiva 2013/36, tal como transposta para o direito letão, nem, aliás, das Orientações Comuns, que o BCE seja obrigado a demonstrar um tal efeito para se opor a um projeto de aquisição com base no critério da solidez financeira. Por maioria de razão, não resulta destas disposições que o BCE seja obrigado a proceder à análise contrafactual da situação no caso de essa aquisição não ocorrer.

148    Pelo contrário, o artigo 51.o do Regulamento 192 define a solidez financeira do proposto adquirente como a capacidade do mesmo para financiar o projeto de aquisição e para manter, num futuro previsível, uma estrutura financeira sólida para si próprio e para a empresa alvo, sem se referir a um motivo de oposição relacionado com o efeito negativo importante do projeto de aquisição nem exigir a análise da situação existente no caso de essa aquisição não ocorrer.

149    Embora a recorrente se prevaleça do n.o 13.1 das Orientações Comuns, importa constatar que este último diz respeito ao critério do cumprimento dos requisitos prudenciais por parte do banco alvo, e não ao da solidez financeira do proposto adquirente.

150    Em consequência, a recorrente não pode invocar que o BCE violou o artigo 23.o, n.o 1, da Diretiva 2013/36 ao opor‑se ao projeto de aquisição com base no critério da solidez financeira do proposto adquirente sem demonstrar a existência de um efeito negativo significativo dessa aquisição.

151    Em segundo lugar, a recorrente alega que o BCE se baseou erradamente na existência de uma obrigação geral de financiamento, ao entender que, para que o projeto de aquisição pudesse ser autorizado à luz do critério da solidez financeira, o proposto adquirente devia ter capacidade e vontade de atender, com o seu próprio capital e de forma ilimitada, a todas as necessidades de financiamento com que a instituição de crédito em causa possa vir a deparar‑se no futuro.

152    Este argumento resulta de uma leitura errada da decisão recorrida.

153    Com efeito, o BCE considerou nos n.os 2.2.1 e 2.2.2 desta decisão que, tendo em conta a sua situação financeira, os propostos adquirentes não estavam em condições de dar apoio financeiro ao banco alvo num contexto em que, tendo em consideração o plano de negócios apresentado ao BCE, esse apoio seria provavelmente necessário.

154    Ao fazê‑lo, o BCE não impôs aos propostos adquirentes uma obrigação de financiamento ilimitada, mas limitou‑se a apreciar se os propostos adquirentes possuíam solidez financeira suficiente para fazer face às necessidades de capital do novo grupo, tal como as mesmas poderiam ser avaliadas à luz das informações que eles próprios tinham fornecido.

155    Por conseguinte, improcede o argumento da recorrente de que o BCE se baseou erradamente na existência de uma obrigação geral de financiamento dos propostos adquirentes.

156    Em terceiro lugar, há que notar que a recorrente não contesta as dificuldades financeiras com que depara, tal como apreciadas pelo BCE no número 2.2.1 da decisão recorrida. Sobretudo, não contesta, primeiramente, que tenha sofrido perdas líquidas significativas ao longo dos dois anos precedentes, em segundo lugar, que se deparava com um risco de crédito elevado, tendo em conta nomeadamente o rácio de crédito malparado de 47 % em meados de 2018, em terceiro lugar, que os seus rácios de fundos próprios eram de tal ordem, que constituíam uma violação do RGC para 2018, em quarto lugar, que violava os limites de grande exposição em relação a uma série de contrapartes a nível do grupo e, em quinto lugar, que violava os limites aplicáveis às operações com as partes ligadas entre si, no que respeita a CR.

157    Além disso, a recorrente também não contesta a situação financeira dos propostos adquirentes, tal como apreciada pelo BCE no n.o 2.2.2, da decisão recorrida. Particularmente, não contesta que os propostos adquirentes indiretos, sobretudo, CR, tivessem declarado um baixo valor de recursos financeiros, tal como avaliado pelo BCE. Embora a recorrente saliente que o projeto de aquisição acarretaria uma melhoria da sua situação em matéria de fundos próprios, não contesta que os níveis de fundos próprios do novo grupo não fossem adequados tendo em conta o perfil de risco esperado do referido grupo e que fosse provável que no futuro fossem provavelmente necessárias injeções de capital.

158    Em consequência, tendo em conta as dificuldades financeiras com que a recorrente se deparava, o baixo nível de recursos dos propostos adquirentes indiretos e as necessidades prováveis de injeções de capital do novo grupo, o BCE não cometeu nenhum erro manifesto de apreciação ao considerar que nem a recorrente nem os propostos adquirentes indiretos teriam capacidade para fornecer o apoio financeiro necessário ao banco alvo e ao novo grupo.

159    Em quarto e último lugar, a recorrente contesta a apreciação do BCE, constante do n.o 2.2.3 da decisão recorrida, segundo a qual existiam sérias dúvidas quanto à vontade dos propostos adquirentes indiretos de apoiarem o banco alvo em caso de necessidade.

160    A este respeito, há que constatar, como sublinha a Comissão, que os motivos expostos nos n.os 2.2.1 e 2.2.2 da decisão recorrida, relativos à solidez financeira da recorrente e dos propostos adquirentes indiretos são em si mesmos suscetíveis de justificar a conclusão do BCE, referida no n.o 2.2.4 desta decisão, segundo a qual os propostos adquirentes não tinham capacidade para manter uma estrutura financeira suficientemente sólida em relação ao banco alvo e ao novo grupo.

161    Por conseguinte, o argumento da recorrente para contestar o fundamento adicional que figura no n.o 2.2.3 da decisão recorrida, deve ser julgado inoperante.

162    Além disso, importa referir que para concluir pela existência de sérias dúvidas quanto à vontade dos propostos adquirentes indiretos de apoiar o banco alvo em caso de necessidade, o BCE se baseou na falta de um compromisso firme e irrevogável de prestar esse apoio. A este respeito, resulta da resposta às observações que o BCE se baseou numa declaração de CR de 17 de outubro de 2018 e numa carta deste último de 12 de fevereiro de 2019, tendo igualmente tido em conta a falta substancial de apoio financeiro à recorrente no passado recente.

163    Ora, em primeiro lugar, não resulta da decisão recorrida que o BCE tenha acusado os propostos adquirentes de se terem comprometido a apoiar o novo grupo apenas em caso de crise.

164    Em segundo lugar, na declaração de 17 de outubro de 2018, CR referiu que a sua vontade e a da sua família de continuar a apoiar a recorrente e o seu grupo no futuro estavam «integralmente condicionadas» pela vontade da República da Letónia de concluir um acordo amigável com ele para resolver todos os problemas arbitrários e discriminatórios com que CR e a sua família afirmavam ter‑se deparado e que este imputava à CMFC e a outras instituições.

165    Contrariamente ao que defende a recorrente, o BCE, baseando‑se na declaração referida no número 164, supra, não acusou CR de ter solicitado que se pusesse termo ao alegado tratamento regulamentar arbitrário e discriminatório, tendo‑se limitado a constatar que, de acordo com a referida declaração, o apoio de CR e da sua família à recorrente e ao grupo a que a mesma pertencia era condicional. A este respeito, o BCE alega, com razão, que a celebração de um acordo amigável desejada por CR apresentava um elevado grau de incerteza.

166    Por outro lado, o BCE constatou que, segundo uma carta de CR de 12 de fevereiro de 2019, este último e a sua família estavam dispostos a prestar apoio financeiro ao banco alvo, «se tal [fosse] adequado». A utilização desta expressão pôde ser validamente considerada pelo BCE, à luz da declaração referida no n.o 164, supra, como uma reserva expressa por CR e pela sua família quanto à sua vontade de apoiar o banco alvo em caso de crise.

167    Em terceiro lugar, a recorrente sublinha que CR pretendia financiar uma parte significativa do projeto de aquisição através de um contrato de permuta de ações celebrado entre o próprio e determinados acionistas do banco alvo, o que se assemelha a uma injeção de capital.

168    No entanto, esta circunstância não é suficiente para considerar que CR estava necessariamente disposto a apoiar o banco alvo e o novo grupo no futuro.

169    Com efeito, há que notar que a recorrente não contesta a consideração que figura no número 2.2.3 da decisão recorrida que reveste, no entanto, particular importância para a linha de raciocínio seguida pelo BCE, segundo a qual os propostos candidatos indiretos tinham feito prova de uma substancial falta de apoio financeiro em relação à recorrente num passado recente. A este respeito, resulta da resposta às observações que os acionistas da recorrente, particularmente CR, não contribuíram com capital para fazer face à ultrapassagem dos limites de exposição aos grandes riscos, a qual se mantém desde março de 2016. Além disso, conforme alega o BCE na contestação, a resolução da ultrapassagem pela recorrente dos limites aplicáveis às operações com as partes ligadas entre si, que se deveu à concessão de um diferimento de pagamento a CR para a aquisição de uma antiga subsidiária russa da recorrente, dependia sobretudo da vontade de CR em antecipar a data desse pagamento diferido.

170    Por conseguinte, o BCE não incorreu em erro manifesto de apreciação ao considerar que existiam sérias dúvidas quanto à vontade dos propostos adquirentes indiretos em apoiar o banco alvo em caso de necessidade.

171    Resulta do acima exposto que a recorrente não pode alegar que o BCE violou o artigo 23.o da Diretiva 2013/36, ao considerar que o critério de estabilidade financeira dos propostos adquirentes não estava preenchido.

b)      Quanto ao critério do cumprimento dos requisitos prudenciais

172    Resulta do artigo 56.o do Regulamento 192, que a CMFC deve apreciar se o banco em causa preenche o critério do cumprimento dos requisitos prudenciais, tendo em conta, nomeadamente, a sua capacidade para cumprir os requisitos em matéria de fundos próprios, de liquidez, de limites relativos aos grandes riscos, de controlo interno, de gestão dos riscos e de conformidade, à data da apreciação da notificação e após a aquisição de uma participação qualificada.

173    A recorrente alega que o BCE não concluiu que o projeto de aquisição teria um efeito negativo, quer para ela quer para o banco alvo. Invoca o n.o 13.1 das Orientações Comuns, segundo o qual o projeto de aquisição não devia pôr em causa o cumprimento dos requisitos prudenciais pela empresa alvo. Refere ainda que o projeto de aquisição tem efeitos positivos.

174    No entanto, a conformidade com o critério do cumprimento dos requisitos prudenciais deve ser apreciada não do ponto de vista do proposto adquirente, mas do ponto de vista da instituição de crédito visada pelo projeto de aquisição, tal como resulta do disposto no artigo 23.o, n.o 1, alínea d), da Diretiva 2013/36, conforme transposto para o direito letão pelo artigo 29.o, n.o 5, ponto 4, da Lei letã relativa às Instituições de Crédito. Aliás, a recorrente não o contesta.

175    Por conseguinte, ainda que resulte da decisão recorrida que o projeto de aquisição tem efeitos positivos sobre os fundos próprios da recorrente, tal não permite concluir que o banco alvo cumprirá os requisitos prudenciais.

176    Além disso, resulta da decisão recorrida que o respeito do critério do cumprimento dos requisitos prudenciais deve ser apreciado não apenas do ponto de vista do banco alvo, mas também do ponto de vista do novo grupo. A recorrente também não o contesta.

177    De resto, o n.o 13.7 das Orientações Comuns prevê que o grupo a que pertence a empresa alvo deve dispor de uma capitalização suficiente.

178    Ora, contrariamente ao que alega a recorrente, resulta da decisão recorrida que, ainda que o projeto de aquisição não tivesse um impacto negativo imediato sobre o cumprimento dos requisitos de fundos próprios e de liquidez do único banco alvo, esta aquisição teria um impacto negativo sobre a capacidade do banco alvo para solucionar as suas fragilidades no que diz respeito ao cumprimento dos requisitos prudenciais.

179    A este respeito, a recorrente não contesta que, tendo em conta o facto de o plano de negócios não corrigir as fragilidades da recorrente em matéria de governação e de controlo interno, existiam dúvidas sérias quanto à sua capacidade para pôr em prática um sistema são de governação e de controlo interno ao nível do banco alvo.

180    Acima de tudo, a recorrente não contesta certos fundamentos da decisão recorrida. Segundo estes fundamentos, em primeiro lugar, o novo grupo violaria provavelmente os requisitos de capital, independentemente do cenário traçado pelo plano de negócios, tendo sido precisado, o que aliás também não é contestado, que os cenários desfavoráveis eram mais realistas que o cenário de base. Em segundo lugar, tendo em conta as perdas líquidas significativas do banco alvo em 2017 e em 2018 e as deficiências identificadas no controlo interno e no sistema de prevenção do branqueamento de capitais do banco, o novo grupo teria um perfil de risco elevado. Em terceiro lugar, o novo grupo seria exposto a um elevado nível de risco de crédito e violaria os limites dos grandes riscos. Em quarto lugar, tendo em conta o facto de o plano de negócios não corrigir as fragilidades de governação da recorrente e do banco alvo, existiam sérias dúvidas quanto à capacidade do novo grupo para garantir um sistema são de governação e de controlo interno. Por último, em quinto lugar, a estratégia dos propostos adquirentes não era clara, nomeadamente no que diz respeito à organização do novo grupo durante o período que se podia estender até dezoito meses, entre a finalização da aquisição e a da fusão, uma vez que o plano de negócios apresentava deficiências significativas em termos de coerência interna, de legibilidade e de descrição das ações planeadas, o que contribuía para um acréscimo de dúvidas quanto à credibilidade global da aquisição.

181    Por conseguinte, a recorrente não demonstra que o projeto de aquisição tem efeitos positivos para o banco alvo nem, em todo o caso, para o novo grupo. A recorrente nem sequer alega que o novo grupo dispõe de capitalização suficiente, conforme referido no n.o 13.7 das Orientações Comuns.

182    Assim, tendo em conta, particularmente, as sérias dúvidas quanto à capacidade do novo grupo para cumprir os requisitos prudenciais aplicáveis, o BCE não incorreu num erro manifesto de apreciação ao concluir que o critério do cumprimento dos requisitos prudenciais não se encontrava preenchido e, por conseguinte, não violou o artigo 23.o da Diretiva 2013/36, tal como transposto para o direito letão.

c)      Quanto à não consideração dos outros critérios de avaliação e à existência de motivos razoáveis para se opor ao projeto de aquisição

183    Em primeiro lugar, resulta do artigo 23.o, n.o 2, da Diretiva 2013/36 que as autoridades competentes se podem opor ao projeto de aquisição se existirem motivos razoáveis para tal, com base nos critérios enunciados no n.o 1 do mesmo artigo.

184    Esta disposição não exige que a autoridade competente, quando se oponha à aquisição de uma instituição de crédito, analise, na sua decisão, todos os critérios enunciados no artigo 23.o, n.o 1, da Diretiva 2013/36.

185    Pelo contrário, a autoridade competente pode opor‑se ao projeto de aquisição se existirem motivos razoáveis para tal, com base num ou mais critérios enunciados no artigo 23.o, n.o 1, da Diretiva 2013/36.

186    Esta interpretação está em conformidade com o objetivo do artigo 23.o da Diretiva 2013/36, que consiste em garantir uma gestão sã e prudente da instituição de crédito visada pelo projeto de aquisição.

187    Com efeito, como sublinha o BCE, à luz do teor dos critérios enunciados no artigo 23.o, n.o 1, da Diretiva 2013/36, a apreciação segundo a qual existe uma violação do objetivo de gestão sã e prudente da instituição de crédito visada pelo projeto de aquisição pode ser realizada à luz de apenas um dos referidos critérios.

188    A referida interpretação é, aliás, corroborada pelos n.os 11.3, 12.3, 14.2, 14.4 e 14.7, das Orientações Comuns, segundo os quais a autoridade competente se deve opor ao projeto de aquisição com base em determinados elementos relativos a apenas um dos critérios mencionados no artigo 23.o, n.o 1, da Diretiva 2013/36.

189    Por conseguinte, no caso em apreço, ao opor‑se ao projeto de aquisição à luz dos critérios de estabilidade financeira e de cumprimento dos requisitos prudenciais, sem analisar os outros critérios referidos no artigo 23.o, n.o 1, da Diretiva 2013/36, o BCE não violou os n.os 1 e 2 do referido artigo 23.o

190    Em segundo lugar, ainda que se entendesse que o projeto de aquisição teria por efeito melhorar a situação da recorrente em matéria de fundos próprios e que não surtiria efeitos negativos imediatos sobre o cumprimento dos requisitos prudenciais aplicáveis ao único banco alvo em matéria de solvabilidade e de liquidez, a verdade é que, por um lado, os propostos adquirentes não tinham capacidade para manter, num futuro previsível, uma estrutura financeira sã relativamente ao banco alvo e ao novo grupo e, por outro lado, existiam sérias dúvidas quanto à capacidade do banco alvo e do novo grupo para cumprir os requisitos prudenciais.

191    Consequentemente, os elementos nos quais se baseou a decisão recorrida no que diz respeito ao critério da estabilidade financeira e ao critério do cumprimento dos requisitos prudenciais constituíam motivos razoáveis para se opor ao projeto de aquisição.

192    O terceiro fundamento deve, portanto, ser julgado improcedente.

5.      Quanto ao quarto fundamento, relativo à violação do princípio da proporcionalidade

193    A recorrente alega que a decisão recorrida viola o princípio da proporcionalidade. A referida decisão não contém nenhuma análise da proporcionalidade. Uma abordagem menos intrusiva permitindo alcançar o objetivo de garantir o pleno cumprimento dos requisitos prudenciais consistiria em autorizar o projeto de aquisição e em adotar, em seguida, medidas de supervisão adequadas. Esta abordagem reduziria o alegado incumprimento dos requisitos prudenciais.

194    O BCE contesta esta argumentação.

195    O princípio da proporcionalidade que exige que os atos das instituições da União sejam adequados a realizar os objetivos legítimos prosseguidos pela regulamentação em causa e não vão além do necessário à realização desses objetivos, sendo que, quando existe uma escolha entre várias medidas adequadas, há que recorrer à menos restritiva e que os inconvenientes causados não devem ser desmedidos face aos objetivos (Acórdãos de 22 de janeiro de 2013, Sky Österreich, C‑283/11, EU:C:2013:28, n.o 50, e de 6 de setembro de 2017, Eslováquia e Hungria/Conselho, C‑643/15 e C‑647/15, EU:C:2017:631, n.o 206).

196    A apreciação da proporcionalidade de uma medida deve ser conciliada com o respeito da margem de apreciação eventualmente reconhecida às instituições da União quando da sua adoção (v. Acórdão de 8 de maio de 2019, Landeskreditbank Baden‑Württemberg/BCE, C‑450/17 P, EU:C:2019:372, n.o 53 e jurisprudência referida).

197    A recorrente entende que teria sido preferível que o BCE não se tivesse oposto ao projeto de aquisição e tivesse adotado medidas de supervisão adequadas na sequência da referida aquisição.

198    No entanto, a recorrente não fornece precisões sobre a natureza das medidas de supervisão que teriam sido adequadas para solucionar as carências sublinhas pelo BCE no que diz respeito à solidez financeira dos propostos adquirentes e à capacidade do banco alvo para cumprir de forma continuada os requisitos prudenciais, a fim de garantir uma gestão sã e prudente do banco alvo. O Tribunal Geral constata, além disso, que resulta dos documentos dos autos que, precisamente, a recorrente já não cumpria os requisitos prudenciais aplicáveis.

199    Por conseguinte, não resulta dos autos que existissem medidas adequadas menos restritivas do que a decisão recorrida e que fossem suscetíveis de garantir o objetivo previsto no artigo 23.o, n.o 1, da Diretiva n.o 2013/36, a saber garantir a gestão sã e prudente do banco alvo.

200    Nestas circunstâncias, uma vez que, como foi salientado no n.o 191, supra, existiam motivos razoáveis para se opor ao projeto de aquisição e tendo igualmente em conta a ampla margem de apreciação de que dispõe o BCE, a recorrente não tem fundamento para alegar que a decisão recorrida viola o princípio da proporcionalidade.

201    O quarto fundamento deve, pois, ser julgado improcedente.

6.      Quanto ao quinto fundamento, relativo à não consideração da natureza discricionária de uma decisão adotada nos termos do artigo 15.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1024/2013

202    A recorrente alega que a decisão recorrida não tem em conta a natureza discricionária de uma decisão de oposição a uma aquisição. Afirma que o BCE presumiu que era obrigado a opor‑se ao projeto de aquisição se não estivessem preenchidos «determinados» critérios enunciados no artigo 23.o, n.o 1, da Diretiva 2013/36, interpretando esses critérios como requisitos e não no âmbito de uma avaliação global. A recorrente foi privada do exercício imparcial do poder discricionário da autoridade competente, ao qual tem direito por força do artigo 41.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta»).

203    O BCE, apoiado pela Comissão, contesta a argumentação da recorrente.

204    Assim, como salientado no n.o 185, supra, a autoridade competente pode opor‑se ao projeto de aquisição se existirem motivos razoáveis para tal, com base num ou mais critérios enunciados no artigo 23.o, n.o 1, da Diretiva 2013/36.

205    Tal como foi salientado no n.o 144, supra, o BCE dispõe de uma ampla margem de apreciação ao adotar, como no caso em apreço, um ato relativo à supervisão prudencial de uma instituição de crédito.

206    Ora, não resulta da decisão recorrida que o BCE tenha entendido que não dispunha de uma ampla margem de apreciação.

207    Particularmente, embora o BCE tenha considerado, nos n.os 2.4 e 2.5 da decisão recorrida, que nem o critério de estabilidade financeira nem o do cumprimento dos requisitos prudenciais se encontravam preenchidos, tal não significa que se tenha considerado privado de um amplo poder de apreciação do respeito de cada um destes critérios.

208    Quanto ao argumento de que a recorrente teria ficado privada do exercício imparcial do poder discricionário da autoridade competente, nos termos do artigo 41.o da Carta, todas as pessoas têm direito a que os seus assuntos sejam tratados pelas instituições, órgãos e organismos da União de forma imparcial, equitativa e num prazo razoável.

209    A este respeito, a recorrente não invoca, no âmbito do quinto fundamento, nenhum elemento suscetível de demonstrar que a decisão recorrida enferma de vício de imparcialidade.

210    Por conseguinte, a recorrente não pode sustentar que o BCE violou a ampla margem de apreciação de que dispunha ao adotar a decisão recorrida ou que, ao fazê‑lo, violou o direito a uma boa administração, garantido pelo artigo 41.o da Carta.

211    O quinto fundamento deve, portanto, ser julgado improcedente.

7.      Quanto ao sétimo fundamento, relativo à violação dos princípios da proteção da confiança legítima e da segurança jurídica

212    A recorrente alega que o BCE não enuncia um critério claro quanto ao tipo de consolidação que autoriza no setor bancário. Não define as condições precisas a preencher tendo em conta a sua interpretação dos critérios da solidez financeira e do cumprimento dos requisitos prudenciais. Estas condições não podem significar que montantes ilimitados possam ser deduzidos dos fundos do proposto adquirente para cumprir as potenciais necessidades de financiamento do banco alvo ou que lacunas regulamentadas continuadas impeçam uma aquisição, mesmo que essa aquisição tenha efeitos positivos importantes. O BCE deveria ter informado a recorrente das suas expectativas, por exemplo no que diz respeito ao montante dos fundos necessários para cumprir os requisitos de solidez financeira.

213    O BCE contesta esta argumentação.

214    O princípio da segurança jurídica exige, nomeadamente, que as normas de direito sejam claras, precisas e previsíveis nos seus efeitos, sobretudo quando podem ter consequências desfavoráveis sobre os indivíduos e sobre as empresas [v. Acórdão de 30 de abril de 2019, Itália/Conselho (Quota de pesca do espadarte mediterrânico), C‑611/17, EU:C:2019:332, n.o 111 e jurisprudência referida].

215    Corolário do princípio da segurança jurídica, o direito de exigir a proteção da confiança legítima estende‑se a qualquer particular que se encontre numa situação da qual resulte que a administração da União fez nascer na sua esfera jurídica expectativas fundadas. Constituem garantias suscetíveis de fazer surgir tais expectativas, qualquer que seja a forma como são comunicadas, as informações precisas, incondicionais e concordantes que emanam de fontes autorizadas e fiáveis. Em contrapartida, ninguém pode invocar uma violação deste princípio quando a Administração não tenha fornecido garantias precisas [Acórdão de 30 de abril de 2019, Itália/Conselho (Quota de pesca do espadarte do Mediterrâneo), C‑611/17, EU:C:2019:332, n.o 112].

216    No caso em apreço, a decisão recorrida baseia‑se nos critérios da solidez financeira e do cumprimento dos requisitos prudenciais previstos na Diretiva 2013/36, tal como transposta para o direito letão, e clarificados pelas Orientações Comuns.

217    Estes critérios devem ser considerados claros, precisos e previsíveis, na aceção da jurisprudência referida no n.o 214, supra.

218    Contrariamente ao que defende a recorrente, conforme já foi acima exposto no n.o 154, o BCE não exigiu, no quadro da sua análise do critério da solidez financeira, que montantes «ilimitados» pudessem ser deduzidos dos fundos dos propostos adquirentes para atender às potenciais necessidades de financiamento do banco alvo. Além disso, conforme referido no n.o 130, supra, o BCE expôs as razões pelas quais, apesar dos efeitos positivos do projeto de aquisição para os rácios de fundos próprios da recorrente, o critério do cumprimento dos requisitos prudenciais não se encontrava preenchido. Por outro lado, o BCE não é obrigado, antes de adotar uma decisão relativa à aquisição de uma participação qualificada, a indicar ao proposto candidato o montante de fundos necessários para que o mesmo autorize a referida aquisição à luz do critério da solidez financeira.

219    No que respeita ao princípio da proteção da confiança legítima, basta referir que, como afirma o BCE, a recorrente não alega que o BCE lhe forneceu garantias suscetíveis de darem origem a expectativas legítimas da sua parte.

220    Por conseguinte, em conformidade com a jurisprudência referida no n.o 215, supra, a recorrente não pode alegar que o BCE violou o princípio da proteção da confiança legítima.

221    O sétimo fundamento deve, assim, ser julgado improcedente.

8.      Quanto ao oitavo fundamento, relativo ao não reconhecimento da responsabilidade do BCE e da CMFC

222    A recorrente alega que a decisão recorrida é errada porque o BCE não teve em conta a sua própria responsabilidade e a da CMFC na perda de confiança no processo de regulamentação e as consequências que tal acarretou para o seu financiamento e para o financiamento do novo grupo.

223    A recorrente considera que sérias preocupações relativamente à corrupção conduziram à perda de confiança no processo de supervisão na Letónia e no âmbito do Mecanismo Único de Supervisão (a seguir «MUS»). Estas preocupações estão relacionadas com as tentativas de A de obter subornos da recorrente e dos propostos adquirentes indiretos, bem como com o tratamento regulatório injusto associado a essas tentativas. CR tinha denunciado estes atos de corrupção desde 2017 às autoridades do Reino Unido e, posteriormente, às autoridades letãs. A recorrente refere igualmente o processo de arbitragem referido no n.o 5, supra. Os observadores externos [entre os quais, a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) e a Comissão] coincidiram em reconhecer que a supervisão bancária na Letónia é falseada em razão de práticas de corrupção generalizadas. As alegações relativas a A foram corroboradas por condutas semelhantes denunciadas por outras pessoas. Quanto ao litígio entre o BCE e a República da Letónia, bem como entre A e a República da Letónia, submetido ao Tribunal de Justiça, há que presumir que o BCE já recebeu os elementos de prova relativos à má conduta de A. As irregularidades imputadas a este último são suficientemente graves para que o mesmo seja exonerado das suas funções antes de uma condenação penal definitiva.

224    A recorrente alega que embora o BCE defenda a sua independência contra qualquer ingerência das autoridades letãs, não desempenha o seu papel de garantir que o MUS não seja distorcido pela corrupção, embora esse papel seja tanto mais essencial quanto o BCE e os seus funcionários beneficiam de proteções e de privilégios especiais perante os serviços nacionais responsáveis pela aplicação da lei. A recorrente afirma ainda que o BCE tem a obrigação de proceder a investigações em caso de corrupção ou de outra forma de má conduta potencial.

225    A recorrente considera que ela própria e os propostos adquirentes indiretos estão sujeitos a um tratamento regulamentar severo por terem denunciado problemas de corrupção e exigido uma abordagem proativa. Tal resulta da crítica formulada pelo BCE quanto ao facto de o compromisso de CR de financiar a recorrente ser acompanhado da exigência de que o processo regulamentar não seja distorcido pela corrupção.

226    A recorrente entende que a abordagem do BCE, que exige investimentos adicionais a seu favor, mas desencoraja qualquer investimento ao adotar uma atitude hostil e se recusa a reconhecer a legitimidade dos pedidos de respeito pelo Estado de Direito, não é a de uma administração imparcial. Esta abordagem viola o  adágio nemo auditur propriam turpitudinem allegans, o artigo 23.o da Diretiva n.o 2013/36 e o artigo 41.o da Carta.

227    O BCE contesta a linha de argumentação da recorrente.

228    A recorrente alega que, ao não reconhecer a responsabilidade do BCE e da CMFC pela perda de confiança no processo regulatório, a decisão recorrida viola o adágio nemo auditur propriam turpitudinem allegans, o artigo 23.o da Diretiva n.o 2013/36 e o artigo 41.o da Carta.

229    Em primeiro lugar, no que diz respeito à natureza dos atos de corrupção em causa, importa precisar que a alegação segundo a qual a supervisão bancária na Letónia é falseada por práticas de corrupção «generalizadas» não assenta em precisões que permitam apreciar o seu âmbito.

230    Importa igualmente notar que, por um lado, a investigação penal que deu origem à condenação de A não diz respeito à recorrente, mas a um banco letão terceiro e, por outro lado, no que respeita aos atos de corrupção denunciados por CR, a recorrente refere, sem apresentar mais precisões, que a investigação está em curso.

231    Em segundo lugar, de acordo com o adágio nemo auditur propriam turpitudinem allegans, ninguém pode aproveitar‑se da sua própria torpeza.

232    Para se invocar o adágio nemo auditur propriam turpitudinem allegans é necessário demonstrar que existiu um comportamento culposo imputável ao BCE (v., por analogia, Acórdão de 20 de janeiro de 2021, ABLV Bank/CUR, T‑758/18, EU:T:2021:28, n.o 170).

233    Embora a recorrente entenda que o BCE tinha a obrigação de conduzir um inquérito sobre os atos de corrupção denunciados por CR, também é certo que o BCE tem todo o direito de alegar que não tem competência para proceder, por si próprio, a uma investigação a tais atos e que coopera nesse sentido com as autoridades nacionais competentes.

234    Nem o facto de o BCE ser responsável por garantir o funcionamento eficaz e coerente do MUS nem o facto de os funcionários do BCE beneficiarem de privilégios e de imunidades perante os serviços nacionais competentes em matéria criminal têm por efeito conferir ao BCE competência para realizar uma investigação aos atos de corrupção alegadamente imputados ao governador de um banco central nacional.

235    A este respeito, o Tribunal de Justiça declarou que a imunidade de jurisdição prevista no artigo 11.o, alínea a), do Protocolo (n.o 7) relativo aos Privilégios e Imunidades não se aplica quando o beneficiário dessa imunidade é posto em causa num processo penal por atos que não foram praticados no âmbito das funções que exerce por conta de uma instituição da União (v., neste sentido, Acórdão de 30 de novembro de 2021, LR Ģenerālprokuratūra, C‑3/20, EU:C:2021:969, n.o 97). O Tribunal de Justiça precisou que os atos de corrupção estão, por definição, fora do âmbito das funções de um funcionário ou outro agente da União, bem como das funções de um governador de um banco central de um Estado‑Membro que integre um órgão do BCE (Acórdão de 30 de novembro de 2021, LR Ģenerālprokuratūra, C‑3/20, EU:C:2021:969, n.o 67).

236    Além disso, ainda que o BCE tenha cometido um erro ao não realizar uma investigação sobre os atos de corrupção denunciados por CR ou sobre as declarações proferidas por A a respeito da recorrente, não ficou demonstrado que este erro fosse suscetível de viciar de ilegalidade a decisão recorrida, a qual não se pronuncia sobre a oportunidade da realização de tal investigação, mas diz respeito ao pedido de aquisição de uma participação qualificada.

237    Por conseguinte, a recorrente não pode pedir a anulação da decisão recorrida com o fundamento de que o BCE não realizou uma investigação sobre os atos de corrupção denunciados por CR.

238    Em terceiro lugar, quanto ao alegado tratamento regulatório injusto associado aos atos de corrupção denunciados pela recorrente, a mesma não expõe com precisão os atos administrativos que, em seu entender, estão viciados de ilegalidade nem, em todo o caso, de que forma a ilegalidade de tais atos, a supô‑la demonstrada, é suscetível de viciar de ilegalidade a própria decisão recorrida.

239    Embora a recorrente tenha referido, no âmbito do segundo fundamento, que tinha contestado o requisito total de capital SREP fixado para 2019, esta circunstância não põe em causa a consideração que o rácio total dos fundos próprios do novo grupo previsto para o final de 2019 era apenas de 12,91 %, ou seja, inferior ao RGC que deveria ter sido respeitado pela recorrente para 2018, conforme acima exposto no n.o 116.

240    Em quarto e último lugar, a decisão recorrida não foi adotada pelo facto de a recorrente ter denunciado os atos de corrupção ou requerido um inquérito sobre estes atos.

241    Particularmente, ao contrário do que alega a recorrente, como referido no n.o 165, supra, o BCE não criticou CR por ter solicitado que fosse posto termo ao alegado tratamento regulatório arbitrário e discriminatório.

242    Por conseguinte, a recorrente não pode alegar que, na falta de reconhecimento da responsabilidade do BCE e da CMFC, a decisão recorrida viola o adágio nemo auditur propriam turpitudinem allegans, o artigo 23.o da Diretiva 2013/36 e o artigo 41.o da Carta.

243    O oitavo fundamento deve ser julgado improcedente.

244    Resulta de todo o acima exposto que deve ser negado provimento ao recurso.

V.      Quanto às despesas

245    Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a recorrente sido vencida, há que condená‑la a suportar as despesas apresentadas pelo BCE, em conformidade com o pedido deste último.

246    A Comissão suportará as suas próprias despesas, nos termos do artigo 138.o, n.o 1, do Regulamento de Processo.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Quarta Secção alargada)

decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      A PNB Banka AS suportará as suas próprias despesas bem como as despesas apresentadas pelo Banco Central Europeu (BCE).

3)      A Comissão Europeia suportará as suas próprias despesas.

Gervasoni

Madise

Nihoul

Frendo

 

      Martín y Pérez de Nanclares

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 7 de dezembro de 2022.

Assinaturas


*      Língua do processo: inglês.