Language of document : ECLI:EU:T:1998:59

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quarta Secção)

19 de Março de 1998 (1)

«Acesso à informação — Decisão da Comissão 94/90/CE relativa do acesso do público aos documentos da Comissão — Recusa de acesso — Alcance da excepção relativa à protecção do interesse público — Processos judiciais — Convenção Europeia dos Direitos do Homem, artigo 6.°»

No processo T-83/96,

Gerard van der Wal, advogado no Hoge Raad der Nederlanden, com escritório em Kraainen, Bélgica, representado inicialmente por Caroline P. Bleeker e Laura Y. J. M. Parret, advogados, respectivamente, nos foros da Haia e de Bruxelas, depois por Laura Y. J. M. Parret, com domicílio escolhido no Luxemburgo no escritório de Aloyse May, 31, Grande-Rue,

recorrente,

apoiado por

Reino dos Países Baixos, representado por Marc Fierstra e J. S. van den Oosterkamp, consultores jurídicos, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo na Embaixada dos Países Baixos, 5, rue C.M. Spoo,

interveniente,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada por Wouter Wils e Ulrich Wölker, membros do Serviço Jurídico, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de Carlos Gómez de la Cruz, membro do Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,

recorrida,

que tem por objecto um pedido de anulação da decisão da Comissão, de 29 de Março de 1996, que recusa ao recorrente o acesso a cartas enviadas pela DG IV a órgãos jurisdicionais nacionais, no contexto da comunicação sobre a cooperação entre a Comissão e os tribunais nacionais no que diz respeito à aplicação dos artigos 85.° e 86.° do Tratado CEE,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Quarta Secção),

composto por: K. Lenaerts, presidente, P. Lindh e J. D. Cooke, juízes,

secretário: H. Jung,

vistos os autos e após a audiência de 25 de Setembro de 1997,

profere o presente

Acórdão

Enquadramento jurídico

1.
    Na acta final do Tratado da União Europeia, assinado em Maastricht em 7 de Fevereiro de 1992, os Estados-Membros incorporaram, nos termos seguintes, uma declaração (n.° 17) relativa ao direito de acesso à informação:

«A Conferência considera que a transparência do processo decisório reforça o carácter democrático das instituições e a confiança do público na administração. Por conseguinte, a Conferência recomenda que a Comissão apresente ao Conselho, o mais tardar até 1993, um relatório sobre medidas destinadas a facilitar o acesso do público à informação de que dispõem as instituições.»

2.
    Na sequência desta declaração, a Comissão publicou a comunicação 93/C 156/05, que dirigiu, em 5 de Maio de 1993, ao Conselho, ao Parlamento e ao Comité Económico e Social àcerca do acesso do público aos documentos das instituições

(JO C 156, p. 5). Em 2 de Junho de 1993, a Comissão adoptou a comunicação 93/C 166/04 sobre a transparência na Comunidade (JO C 166, p. 4).

3.
    No quadro destas etapas preliminares, destinadas a pôr em prática o princípio da transparência, o Conselho e a Comissão aprovaram, em 6 de Dezembro de 1993, um Código de Conduta em matéria de acesso do público aos documentos do Conselho e da Comissão (JO 1993, L 340, p. 41, a seguir «código de conduta»), cujo objectivo é estabelecer os princípios que regulam o acesso aos documentos na sua posse.

4.
    Para assegurar a aplicação prática deste compromisso, a Comissão adoptou, em 8 de Fevereiro de 1994, com base no artigo 162.° do Tratado CE, a Decisão 94/90/CECA, CE, Euratom, relativa ao acesso do público aos documentos da Comissão (JO L 46, p. 58, a seguir «Decisão 94/90»). O artigo 1.° desta decisão adopta formalmente o código de conduta cujo texto se encontra junto à decisão.

5.
    O código de conduta, tal como adoptado pela Comissão, enuncia o princípio geral seguinte:

«O público terá o acesso mais amplo possível aos documentos da Comissão e do Conselho.»

6.
    Para este efeito, o código de conduta define o termo «documento» como «todo o documento escrito, seja qual for o suporte, que contenha dados na posse da Comissão e do Conselho».

7.
    Após expor brevemente os princípios que regem a apresentação e o tratamento dos pedidos de acesso a documentos, o código de conduta descreve da seguinte forma o processo a seguir quando haja intenção de indeferir um pedido de acesso a documentos:

«Caso os serviços competentes da instituição em causa tencionem propor a essa instituição que indefira o pedido do interessado, informá-lo-ão da sua intenção, comunicando-lhe que dispõe do prazo de um mês para solicitar um pedido de informação à instituição, tendo em vista a revisão dessa posição, sem o que se considerará que o interessado renunciou ao seu pedido inicial.

Se for apresentado tal pedido de confirmação e no caso de a instituição em causa decidir não facultar o documento, esta decisão, que deverá ser tomada no mês seguinte à apresentação do pedido de confirmação, será comunicada o mais rapidamente possível e por escrito ao requerente. A decisão deverá ser devidamente fundamentada e indicar as vias de recurso possíveis, ou seja, o recurso judicial e a queixa ao provedor de Justiça, nas condições previstas respectivamente nos artigos 173.° e 138.°-E do Tratado que institui a Comunidade Europeia.»

8.
    O código de conduta enumera as circunstâncias que podem ser invocadas por uma instituição para justificar o indeferimento de um pedido de acesso a documentos, nos termos seguintes:

«As instituições recusam o acesso a qualquer documento cuja divulgação possa prejudicar:

—    a protecção do interesse público (segurança pública, relações internacionais, estabilidade monetária, processos judiciais, inspecções e inquéritos),

—    a protecção do indivíduo e da vida privada,

—    a protecção do sigilo comercial e industrial,

—    a protecção dos interesses financeiros da Comunidade,

—    a protecção da confidencialidade solicitada pela pessoa singular ou colectiva que forneceu a informação ou exigida pela legislação do Estado-Membro que forneceu a informação.

As instituições podem igualmente recusar o acesso a um documento para salvaguardar o interesse da instituição no que respeita ao sigilo das suas deliberações.»

9.
    Em 1993, a Comissão adoptou a comunicação 93/C 39/05, sobre a cooperação entre a Comissão e os tribunais nacionais no que diz respeito à aplicação dos artigos 85.° e 86.° do Tratado CEE (JO C 39, p. 6, a seguir «comunicação»). Nesta comunicação, a Comissão indica que:

«37. (...) os tribunais nacionais podem, nos limites do direito processual nacional respectivo, dirigir-se à Comissão e nomeadamente à sua direcção-geral de concorrência para solicitar certas informações. Em primeiro lugar, informações de natureza processual para se saber se um determinado processo está a correr perante a Comissão, se um processo já foi objecto de notificação, se a Comissão iniciou formalmente o processo ou já se pronunciou através de uma decisão formal ou de um ofício de arquivamento enviado pelo seu serviço. Caso necessário, os tribunais nacionais podem igualmente solicitar à Comissão um parecer sobre os prazos prováveis de concessão ou de recusa de uma isenção individual em relação aos acordos ou às práticas notificados, a fim de analisar as condições para uma eventual decisão de suspender a deliberação ou a necessidade de adoptar medidas cautelares. A Comissão esforçar-se-á, por seu lado, por dar prioridade aos casos que são objecto de processos nacionais suspensos, nomeadamente no caso de deles depender a resolução de um litígio difícil.

38.    Seguidamente, os tribunais nacionais podem consultar a Comissão sobre questões jurídicas. Se a aplicação do n.° 1 do artigo 85.° ou do artigo 86.° levantar

dificuldades especiais, os tribunais nacionais têm a possibilidade de consultar a Comissão sobre a prática administrativa respeitante ao direito comunitário em causa. Relativamente aos artigos 85.° e 86.° trata-se das condições de aplicação desses artigos sobre a medida em que o comércio entre Estados-Membros é afectado e ao carácter sensível da restrição da concorrência decorrente das práticas enumeradas naquelas disposições. Nas suas respostas, a Comissão não se pronuncia sobre a essência do caso. Por outro lado, se tem dúvidas sobre a possibilidade de um acordo, decisão ou prática concertada litigiosos beneficiarem de uma isenção individual, podem solicitar à Comissão que lhes transmita um parecer provisório. Se a Comissão responde que, nesse caso concreto uma isenção seria improvável, os tribunais nacionais podem renunciar à suspensão da deliberação e apreciar a validade do acordo, decisão ou prática concertada.

39.    Estes pareceres têm um carácter meramente interpretativo e não vinculam os tribunais que os solicitaram. Nestas respostas, a Comissão precisará que a sua posição não é definitiva e que o direito de o órgão jurisidiconal nacional pedir uma decisão prejudicial ao Tribunal de Justiça, ao abrigo do artigo 177.° do Tratado CEE, não é minimamente afectada. No entanto, a Comissão entende que constituem um contributo útil para a sua decisão.

40.    Finalmente, os tribunais nacionais podem informar-se junto da Comissão relativamente a dados factuais: estatísticas, estudos de mercado e análises económicas. A Comissão esforçar-se-á por comunicar estes dados... ou indicará a fonte em que estes dados poderão ser obtidos.»

Matéria de facto

10.
    O XXIV Relatório sobre a Política da Concorrência (1996)(a seguir «XXIV relatório») refere que a Comissão recebeu de tribunais nacionais um certo número de questões, de acordo com o processo descrito no n.° 9 supra.

11.
    Por carta de 23 de Janeiro de 1996, o recorrente, na sua qualidade de advogado e membro de uma sociedade se ocupa de processos em que se discutem questões de concorrência a nível comunitário, pediu cópias de determinadas cartas de resposta da Comissão a estas questões, designadamente:

1.    Carta do director-geral da Direcção-Geral da Concorrência (DG VI), de 2 de Agosto de 1993, dirigida ao Oberlandesgericht de Düsseldorf e relativa à compatibilidade de um acordo de distribuição com o Regulamento (CEE) n.° 1983/83 da Comissão, de 22 de Junho de 1983, relativo à aplicação do n.° 3 do artigo 85.° do Tratado a certas categorias de acordos de distribuição exclusiva (JO L 173, p. 1; EE 08 F2 p. 110, a seguir «Regulamento n.° 1983/83»);

2.    Carta de Karel van Miert, membro da Comissão, de 13 de Setembro de 1994, dirigida ao tribunal d'instance de St. Brieuc, relativa à interpretação do Regulamento (CEE) n.° 26/62 do Conselho de 4 de Abril de 1962, relativo à aplicação de determinadas regras de concorrência à produção e ao comércio de produtos agrícolas (JO n.° 30, de 20 de Abril de 1962, p. 993; EE 08 F1 p. 29, a seguir «Regulamento n.° 26/62»);

3.    Carta da Comissão, enviada, no primeiro trimestre de 1995, à cour d'appel de Paris, que a tinha convidado a dar o seu parecer sobre cláusulas contratuais relativas a objectivos de venda de concessionário de veículos automóveis à luz do artigo 85.°, n.° 1, do Tratado e do Regulamento (CEE) n.° 123/85 da Comissão, de 12 de Dezembro de 1984, relativo à aplicação do n.° 3 do artigo 85.° do Tratado CEE a certas categorias de acordos e dedistribuição de serviço de venda e pós venda de veículos automóveis (JO L 15, p. 16; EE 08 F2 p. 150, a seguir «Regulamento n.° 123/85»).

12.
    Por carta de 23 de Fevereiro de 1996, o director-geral da DG VI indeferiu o pedido do recorrente, por considerar que a divulgação das cartas pedidas seria prejudicial à «protecção do interesse público (processos judiciais)». Esclareceu o seguinte:

«... quando a Comissão responde a questões que lhe foram colocadas por tribunais nacionais que se ocupam de um processo, para efeitos de resolução de um litígio, a Comissão intervém a título de 'amicus curiae‘. É suposto que ela actue com uma certa reserva e isto não apenas no que diz respeito à aceitação da maneira como as questões enviadas lhe são dirigidas mas também no que se refere à utilização pela Comissão das respostas a estas questões. Uma vez as respostas enviadas, considero que elas fazem parte integrante do processo e que se encontram nas mãos do tribunal que pôs a questão. Os elementos, tanto jurídicos como objectivos, contidos nas respostas, devem... ser analisados no âmbito do processo em curso, como uma parte dos autos do tribunal nacional. As respostas foram enviadas pela Comissão ao órgão jurisdicional nacional e a questão da publicação e/ou da colocação dessas informações à disposição de terceiros compete, antes de mais ao tribunal nacional a que a resposta é dirigida.

...»

13.
    O director-geral invocou igualmente a necessidade de manter uma relação de confiança entre, por um lado, o poder executivo da comunidade e, por outro, as autoridades judiciais nacionais dos Estados-Membros. Considerações como esta, válidas em todos os casos, deviam aplicar-se, por maioria de razão, no caso em apreço, já que os processos sobre os quais a Comissão fôra interrogada não tinham ainda sido objecto de uma decisão judicial definitiva.

14.
    Por carta de 29 de Fevereiro de 1996, o recorrente dirigiu um pedido de confirmação ao secretariado-geral da Comissão, alegando, nomeadamente, que não

via como é que a tramitação dos processos nacionais poderia ser comprometida se terceiros tomassem conhecimento de informações de natureza não confidencial que a Comissão tinha fornecido ao tribunal nacional no âmbito da aplicação do direito comunitário da concorrência.

15.
    Por carta de 29 de Março de 1996, (a seguir «decisão em litígio»), o secretário-geral da Comissão confirmou a decisão da DG VI «pelo facto de a divulgação das respostas poder prejudicar a protecção do interesse público e mais precisamente a boa administração da justiça». Prosseguiu nos seguintes termos:

«... a divulgação das respostas pedidas, que consistem em análises jurídicas, poderia, com efeito, prejudicar as relações e a necessária cooperação entre a Comissão e os tribunais nacionais. É evidente que um tribunal que apresentou uma questão à Comissão, que, mais ainda, se refere a um processo pendente, não gostaria que a resposta que lhe foi transmitida fosse divulgada.

...»

16.
    O secretário-geral acrescentou que, no caso em apreço, o processo era muito diferente do processo referido no artigo 177.° do Tratado, ao qual o recorrente tinha feito referência no seu pedido de confirmação.

Tramitação processual e pedidos das partes

17.
    Foi nestas circunstâncias que, por petição entrada na Secretaria do Tribunal em 29 de Maio de 1996, o recorrente interpôs o presente recurso.

18.
    Por requerimentos entrados na Secretaria do Tribunal em 4 e 19 de Novembro de 1996, respectivamente, os Governos do Reino dos Países Baixos e do Reino da Suécia pediram para intervir no presente processo em apoio dos pedidos do recorrente.

19.
    Por despacho do presidente da quarta secção do Tribunal, de 9 de Dezembro de 1996, estes dois governos foram admitidos a intervir em apoio dos pedidos do recorrente. A pedido do Governo do Reino da Suécia de 14 de Março de 1997, o presidente da quarta secção do tribunal ordenou, por despacho de 12 de Maio de 1997, o cancelamento do pedido de intervenção deste governo e determinou que ele suporte as suas próprias despesas.

20.
    A fase escrita do processo terminou em 24 de Abril de 1997.

21.
    As partes fizeram as suas alegações e responderam às perguntas orais do Tribunal na audiência pública de 25 de Setembro de 1997.

22.
    O recorrente, apoiado pelo Reino dos Países Baixos, conclui pedindo que o Tribunal se digne:

—    anular a decisão de 29 de Março de 1996 da Comissão e

—    condenar a Comissão nas despesas;

23.
    A Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne:

—    negar provimento ao recurso

—    condenar o recorrente nas despesas.

Questão de direito

24.
    O recorrente invoca dois fundamentos em apoio do seu recurso, baseados, respectivamente, na violação da decisão 94/90 e na violação do artigo 190.° do Tratado.

Quanto ao primeiro fundamento, baseado em violação da decisão 94/90

Argumentos das partes

25.
    O recorrente alega, em primeiro lugar, que a excepção dos «processos judiciais» prevista no código de conduta só diz respeito aos processos em que a Comissão seja parte. A excepção não pode, portanto, ser invocada no presente caso.

26.
    Caso o Tribunal considere que a excepção dos «processos judiciais» diz igualmente respeito aos processos em que a Comissão não é parte, o recorrente alega, a título alternativo, que a divulgação dos documentos em questão não é susceptível de prejudicar a cooperação entre a Comissão e os órgãos jurisdicionais nacionais nem de atentar contra o interesse público. A afirmação da Comissão de que a divulgação desses documentos não seria do agrado do juiz nacional é desprovida de fundamento e, em todo o caso, o sentimento do juiz nacional não pode prevalecer sobre a regra principal da publicidade.

27.
    Segundo o recorrente, a Comissão pretende erradamente que, em certas circunstâncias, é obrigada a recusar o acesso aos documentos. Ela tem, em todo o caso, a obrigação de indicar em que medida os seus interesses legítimos e o interesse de um desenrolar incorrecto dos processos judiciais exigem que a excepção à regra da publicidade seja aplicada (acórdão do Tribunal de Justiça de 18 de Fevereiro de 1992, C-54/90, Weddel, Colect., p. I-871).

28.
    O recorrente considera que os elementos que a Comissão pode fornecer no âmbito da cooperação com os tribunais nacionais não têm qualquer carácter confidencial

e recorda que ela confirmou, no caso em apreço, que nenhuma das cartas pedidas tinha carácter confidencial.

29.
    É contrário à tradição de publicidade e de controlo da administração e da clássica separação dos poderes que essas comunicações da administração dirigidas ao poder judicial não sejam transparentes.

30.
    O Governo neerlandês considera que a Comissão interpretou de modo extensivo as excepções ao princípio fundamental de que o público terá um acesso tão amplo quanto possível aos documentos na posse da Comissão. A interpretação que a mesma fez da Decisão 94/90 tem por consequência excluir do regime de publicidade uma categoria de documentos, sem que seja feito um exame para determinar se o conteúdo dos documentos justifica um recurso aos fundamentos do regime de excepção. As cartas enviadas pela Comissão ao tribunal nacional entram no campo de aplicação do código de conduta e a tese da Comissão de que compete exclusivamente ao órgão jurisdicional nacional decidir se e em que condições essas cartas podem ser divulgadas a terceiros está errada.

31.
    A tramitação regular do processo perante o juiz nacional não é prejudicada se terceiros tomarem conhecimento de informações que a Comissão forneceu ao juiz no âmbito de um processo entre particulares. O juiz nacional não terá menos tendência para pedir informações à Comissão se a resposta for susceptível de ser divulgada e, mesmo que este argumento se mostrasse exacto, não constitui uma razão suficiente para considerar que a divulgação seria incompatível com o interesse público. O Governo neerlandês reconhece que a divulgação dos documentos pode pôr em perigo a boa administração da justiça se, por poderem tomar conhecimento de dados constantes desses documentos, os particulares puderem escapar aos procedimentos judiciais, afectando assim a execução efectiva e uniforme do direito comunitário.

32.
    As relações entre a Comissão e o juiz nacional regem-se pelo princípio da cooperação leal, em virtude do artigo 5.° do Tratado. A Comissão não actua como perito no âmbito da comunicação.

33.
    Finalmente, o Governo neerlandês alega que a Comissão não procedeu a uma apreciação concreta de cada caso particular.

34.
    Em resposta ao primeiro argumento do recorrente, a Comissão salienta que parte do princípio de que a decisão em litígio entra no âmbito da Decisão 94/90. Recusa a interpretação de que a excepção relativa aos «processos judiciais» só diz respeito aos processos em que a Comissão seja parte. A regra enunciada no código de conduta é suficientemente ampla para incluir comunicações da Comissão feitas no âmbito da cooperação com os tribunais nacionais.

35.
    Quanto ao segundo argumento, relativo à protecção do interesse público, a Comissão considera que não há que proceder a uma avaliação dos interesses em causa, sendo essa avaliação apenas necessária no caso de a Comissão recusar o acesso a um documento no interesse da protecção do sigilo das suas deliberações (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 5 de Março de 1997, WWF UK/Comissão, T-105/95, Colect., p. II-313, n.° 59). O pedido do recorrente foi, no entanto, examinado de acordo com o seu próprio mérito, tal como resulta das duas cartas de resposta que lhe foram enviadas. Neste caso, basta que a divulgação seja susceptível de prejudicar a protecção do interesse público, nomeadamente no caso de processos judiciais, para que a Comissão seja obrigada a recusar o acesso ao documento em questão.

36.
    A divulgação das respostas que a Comissão dá no âmbito da comunicação pode efectivamente prejudicar a protecção do interesse público (processos judiciais) e não apenas no caso invocado pelo Governo neerlandês. Quando um tribunal nacional aplica os artigos 85.°, n.° 1, e 86.° do Tratado, fá-lo com base numa competência autónoma e segundo modalidades determinadas em princípio pelas regras processuais nacionais (acórdão do Tribunal de Justiça de 10 de Novembro de 1993, Otto, C-60/92, Colect., p. I-5683, n.° 14, e de 28 de Fevereiro de 1991, Delimitis, Colect., p. i-935, n.° 53). Resulta destes princípios que, quando um tribunal nacional dirige um pedido à Comissão, compete-lhe em exclusivo determinar, com base no seu direito processual nacional, se, em que momento e em que condições, a resposta da Comissão pode ser divulgada a terceiros. Isto aplica-se, em todo o caso, enquanto o litígio em questão estiver pendente.

37.
    O papel desempenhado pela Comissão no âmbito da sua cooperação com o tribunal nacional difere fundamentalmente do papel reservado ao Tribunal de Justiça no âmbito de aplicação do artigo 177.° do Tratado, mencionado pelo recorrente no seu pedido de confirmação. Quando responde a uma questãoprejudicial, o Tribunal de Justiça declara o direito e o seu acórdão vincula o juiz a quo. Pelo contrário, a Comissão desempenha um papel secundário em relação ao tribunal nacional, que é inteiramente livre de se dirigir ou não à Comissão. O papel da Comissão pode ser comparado ao de um perito a que um tribunal confia uma missão de informação ou de estudo. A Comissão transmite a sua resposta e o tribunal nacional dispõe dela como entende.

38.
    A Comissão acrescenta que a razão pela qual recusou o acesso aos documentos é totalmente independente da questão de saber se esses documentos contêm segredos profissionais ou outros dados confidenciais que a Comissão não está autorizada a divulgar no âmbito de um processo iniciado em aplicação do Regulamento n.° 17/62 do Conselho, de 6 de Fevereiro de 1962, Primeiro Regulamento de execução dos artigos 85.° e 86.° do Tratado (JO 13, de 21 de Fevereiro de 1962; EE 08 F1 p. 22, p. 204). Recorda, no entanto, que, quanto aos processos de concorrência perante si pendentes, é obrigada a respeitar as regras da confidencialidade. Dentro destes limites, esforça-se por fazer prova da maior abertura possível.

39.
    A Comissão contesta igualmente a afirmação do Governo neerlandês de que o princípio de que o público terá um acesso mais amplo possível aos documentos na posse das instituições europeias seja um princípio fundamental do direito comunitário.

40.
    Quanto à transparência das relações entre os poderes executivo e judicial, a Comissão considera que as relações entre si e os tribunais nacionais não se podem comparar pura e simplesmente às relações entre os poderes executivo e judicial no modelo tradicional de Estado.

Apreciação do Tribunal

41.
    O Tribunal recorda que a Decisão 94/90 é um acto que confere aos cidadãos um direito de acesso aos documentos na posse da Comissão (acórdão WWF UK/Comissão, já referido, n.° 55). Resulta da economia desta decisão que ela se aplica de um modo geral aos pedidos de acesso aos documentos e que toda e qualquer pessoa pode pedir o acesso a não importa que documento da Comissão sem que seja necessário fundamentar o pedido (v., a este respeito, a comunicação 93/C 156/5 citada supra no n.° 2). As excepções a este direito de acesso devem ser interpretadas e aplicadas restritivamente, de modo a não pôr em cheque a aplicação do princípio geral consagrado nesta decisão (acórdão WWF UK/Comissão, já referido, n.° 56).

42.
    Duas categorias de excepções foram instituídas pela Decisão 94/90. A redacção da primeira, feita em termos imperativos, prevê que «as instituições recusam o acesso a qualquer documento cuja divulgação possa prejudicar (... nomeadamente) a protecção do interesse público (... processos judiciais)» (v., supra, n.° 8). Segue-se que a Comissão é obrigada a recusar o acesso aos documentos abrangidos por esta excepção, quando seja feita prova desta última circunstância (acórdão WWF UK/Comissão, já referido, n.° 58).

43.
    Resulta da utilização do verbo poder no presente do conjuntivo que, para fazer a prova de que a divulgação dos documentos ligados a um processo judicial poderia prejudicar a protecção do interesse público, tal como exige a jurisprudência (v. supra, número anterior), a Comissão é obrigada, antes de se pronunciar sobre um pedido de acesso a esses documentos, a examinar, em relação a cada documento solicitado, se, à luz das informações de que dispõe, a divulgação é efectivamente susceptível de atentar contra um dos interesses públicos protegidos pela primeira categoria de excepções. Se assim for, a Comissão é obrigada a recusar o acesso aos documentos em questão (v. supra n.° 42).

44.
    É, portanto, conveniente examinar se a Comissão tem o direito de invocar a excepção baseada na protecção do interesse público, e eventualmente em que medida, para recusar o acesso a documentos que dirigiu a um órgão jurisdicional nacional em resposta a um pedido deste no âmbito da cooperação baseada na

comunicação, mesmo quando a Comissão não seja parte no processo judicial pendente no tribunal nacional que dá origem ao pedido.

45.
    A este respeito, convém recordar que o artigo 6.° da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (a seguir «CEDH») consagra o direito de toda e qualquer pessoa a um processo justo. A fim de garantir este direito, a sua causa deve ser examinada, nomeadamente, «... por um tribunal independente e imparcial...» (artigo 6.° DEDH).

46.
    Segundo uma jurisprudência constante, os direitos fundamentais fazem parte integrante dos princípios gerais do direito cujo respeito é assegurado pelo tribunal comunitário (v., nomeadamente, o parecer do Tribunal de Justiça de 28 de Março de 1996, 2/94, Colect., p. I-1759, n.° 33; acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 22 de Outubro de 1997, SCK e FNK/Comissão, T-213/95 e T-18/96, ainda não publicado na Colectânea, n.° 53). Para este efeito, o Tribunal de Justiça e o Tribunal de Primeira Instância inspiram-se nas tradições constitucionais comuns aos Estados-Membros, bem como nas indicações fornecidas pelos instrumentos internacionais para a protecção dos direitos do homem, na elaboração dos quais os Estados-Membros cooperaram ou a que aderiram. A CEDH, reveste-se, a este respeito, de um significado especial (v., nomeadamente, acórdão do Tribunal de Justiça de 15 de Maio de 1986, Johnston, 222/84, Colect., p. 1651, n.° 18). Por outro lado, nos termos do artigo F, n.° 2, do Tratado da União Europeia, entrado em vigor em 1 de Novembro de 1993, «a União respeitará os direitos fundamentais tal como os garante a [CEDH]... e tal como resultam das tradições constitucionais comuns dos Estados-Membros, enquanto princípios gerais do direito comunitário».

47.
    O direito de qualquer pessoa a ser ouvida com equidade por um tribunal independente implica, nomeadamente, que os tribunais tanto nacionais como comunitários devem ser livres de aplicar as suas próprias regras processuais no que diz respeito aos poderes do juiz, ao decurso do processo em geral e à confidencialidade das peças processuais em especial.

48.
    A excepção ao princípio geral do acesso aos documentos da Comissão baseada na protecção do interesse público, quando os documentos em questão estejam ligados a um processo judicial, consagrada pela Decisão 94/90, visa assegurar o respeito geral desse direito fundamental. O alcance desta excepção não pode, portanto, ser limitado apenas à protecção dos interesses das partes no âmbito de um processo judicial específico, antes abrange também a autonomia processual dos tribunais nacionais e comunitários acima referidos (v. supra, número anterior).

49.
    O alcance desta excepção deve, portanto, permitir à Comissão invocá-la mesmo quando ela própria não seja parte num processo judicial que justifique, nesse caso, a protecção do interesse público.

50.
    A este respeito, há que distinguir entre os documentos protegidos pela Comissão apenas para efeitos de um processo judicial particular, como no caso das cartas do caso em apreço, e outros documentos que existem independentemente desse processo. A aplicação da excepção baseada na protecção do interesse público só pode justificar-se em relação à primeira categoria de documentos, competindo a decisão de dar ou não o acesso a esses documentos apenas ao órgão jurisdicional nacional em causa, em conformidade com a justificação intrínseca da excepção

baseada na protecção do interesse público no âmbito de um processo judicial (v. supra, n.° 48).

51.
    Ora, quando, no âmbito de um processo judicial nele pendente, um tribunal nacional pede determinadas informações à Comissão, com base na cooperação prevista pela comunicação, a resposta da Comissão é expressamente dada para efeitos do processo judicial em questão. Nestas circunstâncias, deve considerar-se que a protecção do interesse público exige que a Comissão recuse o acesso a essas informações, e portanto aos documentos que as contêm, competindo unicamente ao órgão jurisdicional nacional em causa a decisão relativa ao acesso a essas informações, com base no seu direito processual nacional, enquanto o processo judicial que deu lugar à sua incorporação num documento da Comissão estiver pendente.

52.
    No caso em apreço, o recorrente pediu a apresentação de três cartas, todas elas relativas a processos judiciais pendentes, em relação às quais o recorrente não alegou que o conteúdo se limitava a reproduzir informações doutro modo acessíveis com base nas disposições da Decisão 94/90. A este respeito, é, de resto, conveniente salientar que a primeira carta se referia à compatibilidade de um acordo de distribuição com o Regulamento n.° 1983/83, a segunda dizia respeito à aplicação do Regulamento n.° 26/62 e a terceira à interpretação do Regulamento n.° 123/85 (v., supra, n.° 11). Estas cartas referiam-se, portanto, a questões jurídicas suscitadas no âmbito de processos específicos pendentes.

53.
    A este respeito, pouco importa, como a Comissão já salientou, saber se os três documentos em causa continham segredos profissionais, estando a recusa da Comissão de divulgar essas respostas justificada pelas razões acima mencionadas (v. supra, n.os 45 a 52);

54.
    O Tribunal considera também que o papel desempenhado pela Comissão no âmbito da cooperação organizada pela comunicação difere do papel do Tribunal de Justiça no âmbito do processo previsto no artigo 177.° do Tratado. Trata-se, com efeito, de um processo especial instituído entre duas ordens jurisdicionais. O papel do Tribunal de Justiça a este respeito é o de decidir quanto às questões suscitadas pelos órgãos jurisdicionais nacionais. O órgão jurisdicional nacional formula as suas questões prejudiciais no âmbito das suas próprias regras processuais, que garantem a confidencialidade de informações sensíveis, se necessário. Do mesmo modo, as instruções ao secretário do Tribunal de Justiça prevêem que nomes ou dados confidenciais possam ser omitidos nas publicações relativas ao processo, em circunstâncias adequadas. Em contrapartida, a cooperação visada pela comunicação não é regida por essas regras processuais. Não há, por conseguinte, qualquer razão para aplicar as regras quanto à publicidade dos acórdãos proferidos no âmbito do processo previsto no artigo 177.° às respostas dadas pela Comissão no âmbito da comunicação.

55.
    Finalmente, o Tribunal verifica que o recorrente não indicou em que é que os princípios da separação dos poderes e do «controlo da administração» não seriam respeitados se as respostas que a Comissão fornece aos tribunais nacionais no âmbito da comunicação não forem tornadas acessíveis ao público na sequência de simples pedido dirigido à Comissão. É, portanto, necessário rejeitar este argumento por improcedente.

56.
    Por todas as razões acima expostas, este fundamento não pode ser acolhido.

Quanto ao segundo fundamento, baseado em violação do artigo 190.° do Tratado CE

Argumentos das partes

57.
    O recorrente alega que a fundamentação da Comissão é insuficiente.

58.
    O Governo neerlandês alega que a fundamentação deve ser adaptada à natureza do acto em causa. Considera que a fundamentação é incompreensível por terem sido avançadas pela Comissão razões diferentes nas duas cartas. Na primeira, a Comissão refere-se a «processos judiciais», ao passo que da segundo invoca a «boa administração da justiça». O destinatário não vê, portanto, claramente quais são os motivos que levaram a instituição a decidir como finalmente fez.

59.
    Segundo o Governo neerlandês, a Comissão deu de novo, essencialmente, uma outra justificação à decisão em litígio, ao referir-se à natureza da cooperação entre a Comissão e os tribunais nacionais, no âmbito da qual a Comissão deve ser comparada a um perito a quem o tribunal confia uma missão de informação. Mesmo abstraindo do carácter errado desta comparação, esta argumentação obscurece totalmente os motivos em que a Comissão na realidade se baseou para recusar o acesso aos documentos pedidos.

60.
    O Governo neerlandês considera igualmente que as duas cartas não indicam porquê, nem como, a alegada relação de confiança entre a Comissão e os tribunais nacionais pode ser posta em perigo se for dado ao recorrente acesso aos documentos. O tribunal não fundamentou a sua tese de que o juiz nacional não ficaria satisfeito com a divulgação dos documentos em questão. Além disso, a fundamentação não mostra de forma alguma de que modo a necessidade eventual de salvaguardar esta relação de confiança teria outras consequências se o processo em causa já tivesse findado.

61.
    A Comissão considera que a decisão em litígio tem uma fundamentação suficiente, exposta não somente na própria decisão, mas também na carta de 23 de Fevereiro de 1996 do director-geral da DG VI. Estas duas cartas indicam claramente as razões pelas quais o pedido de acesso foi recusado. Além disso, o secretário-geral da Comissão respondeu também a alguns dos argumentos desenvolvidos pelo recorrente no seu pedido de confirmação de 29 de Fevereiro de 1996.

62.
    Nas suas observações sobre o memorando de intervenção do Governo neerlandês, a Comissão insiste no facto de a fundamentação da decisão em litígio se encontrar não apenas na carta de 29 de Março de 1996, mas também na carta de 23 de Fevereiro de 1996. Não há qualquer contradição nem diferença material entre a utilização dos termos «processos judiciais» numa carta e «boa administração da justiça» na outra. No que concerne à relação de confiança que refere, trata-se evidentemente da relação que resulta da obrigação de cooperação leal enunciada no artigo 5.° do Tratado.

Apreciação do Tribunal

63.
    Importa recordar, em primeiro lugar, que a obrigação de fundamentar as decisões individuais tem o duplo objectivo de permitir, por um lado, aos interessados conhecerem as justificações da medida adoptada para defenderem os seus direitos e, por outro lado, ao juiz comunitário exercer a sua fiscalização da legalidade das decisões (v., nomeadamente, acórdão do Tribunal de Justiça de 14 de Fevereiro de 1990, Delacre e o./Comissão, C-350/88, Colect., p. I-395, n.° 15, e acórdão do Tribunal de Primeira Instância WWF UK/Comissão já referido, n.° 56). A questão de saber se a fundamentação de uma decisão satisfaz estas exigências deve ser analisada à luz não apenas do seu teor, mas também do seu contexto, bem como do conjunto das regras jurídicas que regem a matéria em causa (acórdão do Tribunal de Justiça de 29 de Fevereiro de 1996, Comissão/Conselho, C-122/94, Colect., p. I-881, n.° 29).

64.
    O código de conduta prevê que, em caso de indeferimento de pedido de acesso inicial, o requerente tem o direito de solicitar à instituição que reveja essa recusa, sem ser necessário adiantar argumentos contra a validade da primeira decisão. Este processo não constitui um recurso da recusa mas sim a oportunidade de obter da instituição uma segunda apreciação do pedido de acesso.

65.
    Segue-se que, quando uma resposta confirma a recusa de um pedido com os mesmos fundamentos, é conveniente examinar a suficiência da fundamentação à luz de toda a correspondência trocada entre a instituição e o requerente, tendo em conta as informações que o requerente tinha à sua disposição quanto à natureza e ao conteúdo dos documentos solicitados.

66.
    No caso em apreço, resulta da carta do recorrente de 23 de Janeiro de 1996 e dos números do XXIV relatório nela citados que o recorrente sabia desde o início que as cartas da Comissão constituíam respostas enviadas no âmbito da comunicação a três tribunais nacionais, dizendo cada uma delas respeito a um processo pendente nestes tribunais. O objecto destas cartas é igualmente descrito em termos gerais.

67.
    Na sua resposta de 23 de Fevereiro de 1996, o director-geral da DG VI invocou a excepção baseada na protecção do interesse público (processos judiciais) e explicou que as cartas pedidas continham elementos jurídicos e de facto que

deviam ser considerados como fazendo parte dos autos nos tribunais nacionais, tanto mais que os processos em questão continuavam pendentes.

68.
    A decisão em litígio constitui uma confirmação explícita da primeira decisão de indeferimento. Embora faça referência à «protecção do interesse público e mais precisamente à boa administração da justiça», o recorrente não podia ter dúvidas de que o secretário-geral tinha a intenção de indeferir o pedido com base na mesma excepção do código. Não há qualquer contradição entre a utilização dos termos «processos judiciais» na primeira carta e «boa administração da justiça» na segunda, dado que a excepção em questão tem por fim garantir o respeito da boa administração da justiça. Segue-se que a Comissão deu, essencialmente, as mesmas explicações nas duas cartas.

69.
    O facto de a Comissão se referir à cooperação entre a Comissão e os tribunais nacionais durante a audiência também não constitui uma nova fundamentação, contrariamente ao que sustenta o Governo neerlandês, tendo esta cooperação já sido invocada na primeira carta, que fala de uma «relação de confiança» entre a Comissão e as autoridades judiciais nacionais dos Estados-Membros, depois recordada na segunda carta, que evoca a necessária cooperação entre a Comissão e os «tribunais nacionais» e o facto de a divulgação das respostas pedidas poder prejudicar essa cooperação.

70.
    Também não se pode censurar a Comissão por só ter feito referência ao processo visado no artigo 177.° na segunda carta, constituindo os seus reparos uma resposta à comparação que o recorrente tinha procurado fazer no seu pedido de confirmação entre este processo e o processo visado na comunicação.

71.
    Resulta do que precede que a Comissão indicou claramente as razões pelas quais aplicou a excepção baseada na necessidade de proteger o interesse público (processos judiciais), relativamente às três respostas pedidas, sem deixar de ter em conta a natureza das informações contidas nessas respostas. O recorrente foi, portanto, colocado em condições de conhecer as justificações da decisão em litígio e o Tribunal em condições de exercer o seu controlo sobre a legalidade dessa decisão.

72.
    Segue-se que o segundo fundamento não pode ser acolhido e, portanto, que deve ser negado provimento ao recurso no seu conjunto.

Quanto às despesas

73.
    Por força do disposto no n.° 2 do artigo 87.° do Regulamento de Processo, a parte vencida deve ser condenada nas despesas, se tal for requerido. Tendo o recorrente sido vencido e tendo a Comissão feito um pedido nesse sentido, há que condená-lo nas despesas. Todavia, nos termos do n.° 4 do artigo 87.° do regulamento de Processo, o interveniente suportará as suas próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quarta Secção),

decide:

1.
    É negado provimento ao recurso.

2.
    O recorrente é condenado nas despesas da recorrida.

3.
    O Reino dos Países Baixos suportará as suas próprias despesas.

Lenaerts
Lindh
Cooke

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 19 de Março de 1998.

O secretário

O presidente

H. Jung

P. Lindh


1: Língua do processo: neerlandês.