Language of document : ECLI:EU:T:2000:25

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quinta Secção)

1 de Fevereiro de 2000 (1)

«Navegação interior - Saneamento estrutural - Aplicação do Regulamento (CEE) n.° 1101/89 - Exclusão»

No processo T-63/98,

Transpo Maastricht BV, sociedade de direito neerlandês, com sede em Maastricht (Países Baixos),

e

Marco Ooms, residente em Terneuzen (Países Baixos),

representados por Marius Johan van Dam, advogado no foro de Roterdão, com domicílio escolhido no Luxemburgo no escritório do advogado Fernand Entringer, 34 A, rue Philippe II,

recorrentes,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada por Maurits Lugard e Laura Pignataro, membros do Serviço Jurídico, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de Carlos Gómez de la Cruz, membro do Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,

recorrida,

que tem por objecto um pedido de anulação da decisão da Comissão de 13 de Fevereiro de 1998, que não concedeu aos recorrentes, para a embarcação Durance, o benefício do artigo 8.°, n.° 3, alínea c), do Regulamento (CEE) n.° 1101/89 do Conselho, de 27 de Abril de 1989, relativo ao saneamento estrutural da navegação interior (JO L 116, p. 25),

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Quinta Secção),

composto por: J. D. Cooke, presidente, R. García-Valdecasas e P. Lindh, juízes,

secretário: J. Palacio González, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 6 de Julho de 1999,

profere o presente

Acórdão

Matéria de facto na origem do recurso

1.
    O Regulamento (CEE) n.° 1101/89 do Conselho, de 27 de Abril de 1989, relativo ao saneamento estrutural da navegação interior (JO L 116, p. 25, a seguir «Regulamento n.° 1101/89»), pretende reduzir o excesso da capacidade de carga que se manifesta em todos os sectores do mercado de transportes por via navegável. Para tanto, são previstas uma acção de desmantelamento coordenada a nível comunitário e medidas de acompanhamento. A regra «velho por novo» impõe ao proprietário de uma nova embarcação, importada de um país terceiro ou que saia das vias nacionais não ligadas a outras vias navegáveis da Comunidade, para a sua colocação ao serviço, a obrigação de desmantelar, sem prémio de desmantelamento, uma tonelagem equivalente à desta embarcação. Se não proceder ao desmantelamento de qualquer embarcação, deve pagar uma contribuição especial para o fundo criado para este efeito, a que está sujeita a sua nova embarcação (artigo 8.°, n.° 1, do Regulamento n.° 1101/89).

2.
    O artigo 8.°, n.° 3, alínea c), do Regulamento n.° 1101/89 prevê a possibilidade de a Comissão, após consulta aos Estados-Membros, e às organizações da navegação interior a nível comunitário, excluir «embarcações especializadas» do âmbito de aplicação do n.° 1.

3.
    Em 7 de Dezembro de 1990, a Comissão, após consulta aos Estados-Membros em causa, à Suíça, às autoridades dos diversos fundos de desmantelamento e às organizações representativas da navegação interior a nível comunitário, elaborou uma nota respeitante à definição dos critérios gerais da apreciação dos pedidos de exclusão de embarcações especializadas do Regulamento n.° 1101/89 (a seguir «nota interpretativa»).

4.
    A referida nota precisa que a exclusão pode ser concedida se estiverem cumulativamente reunidas as três condições seguintes:

«-    a embarcação deve estar especialmente concebida para o transporte de uma categoria determinada de mercadorias e deve ser tecnicamente inapta, sem modificação da sua construção, para o transporte de outras mercadorias;

-    a mercadoria não pode ser transportada ou não é admitida ao transporte pelas embarcações que não disponham de instalações técnicas especiais;

-    o proprietário da embarcação especializada deve comprometer-se por escrito a que nenhuma outra mercadoria seja transportada na sua embarcação enquanto a regra 'velho por novo‘ se aplicar e deve declarar-se disposto a pagar posteriormente a contribuição especial 'velho por novo‘ se, por quaisquer razões, desejar transportar com a sua embarcação outras mercadorias durante o período de aplicação da regra 'velho por novo‘».

5.
    Em 1 de Outubro de 1996, um dos recorrentes, a sociedade Transpo Maastricht, apresentou à Comissão um pedido de isenção da aplicação do artigo 8.°, n.° 1, do Regulamento n.° 1101/89 nos termos do artigo 8.°, n.° 3, alínea c).

6.
    O referido pedido respeitava à embarcação automotora Venture, rebaptizada Durance (a seguir «Durance»), que entrou ao serviço em 1955. Em 1982, a Durance sofreu as transformações necessárias para o transporte de produtos pulverulentos. Em 1996, foi adquirida pela sociedade Transpo Maastricht e foi adaptada especialmente para o transporte de cinzas secas. Foi vendida em 1997 ao segundo recorrente, Marco Ooms.

7.
    No seu pedido, a Transpo Maastricht afirma, no essencial, que, no caso de a Durance estar sujeita à aplicação do artigo 8.°, n.° 1, do Regulamento n.° 1101/89, deverá ser considerada como inapta para o transporte de outras categorias de mercadorias que não cinzas secas, tendo em conta os equipamentos especiais queo transporte deste produto exige. Refere também que, na hipótese de vir a transportar outro tipo de mercadorias com esta embarcação, está disposta a dar integral aplicação ao regulamento «velho por novo».

8.
    Em 21 de Março de 1997, o grupo de peritos «Saneamento estrutural da navegação interior» (a seguir «grupo de peritos»), na presença dos representantes dos Estados-Membros em causa, da Suíça e dos Fundos de desmantelamento destes países, foi consultado com base na nota interpretativa.

9.
    Resulta da acta desta reunião o seguinte:

«Durante o debate, as delegações das organizações profissionais levantaram a questão de saber se esta embarcação está efectivamente concebida par ao transporte de uma única categoria de mercadorias e se é inapta, sem alteração da sua construção, para o transporte de outras mercadorias. O Fundo de desmantelamento neerlandês foi convidado a analisar esta questão e a informar a Comissão do resultado da sua análise.

Foi acordado que, se as conclusões do Fundo de desmantelamento neerlandês se revelarem em conformidade com os critérios definidos para a concessão da exclusão de uma embarcação da regra 'velho por novo‘, as delegações são a favor da exclusão da embarcação destinada ao transporte de cinzas; caso contrário, são de parecer que a exclusão deve ser indeferida.»

10.
    Em 1 de Abril de 1997, a Directoraat-Generaal Goederenvervoer (direcção-geral do transporte de mercadorias do Ministério das Comunicações e das Vias Navegáveis neerlandês, a seguir «direcção-geral dos transportes neerlandesa») solicitou à Scheepvaartinspectie (inspecção da navegação neerlandesa, a seguir «inspecção da navegação») que averiguasse se a Durance fôra especialmente concebida para só poder transportar «um único produto».

11.
    Por carta de 11 de Maio de 1997, a inspecção da navegação respondeu:

«A questão colocada é particularmente específica e não dispomos do 'know-how‘ necessário a este respeito. Dirigimo-nos, por isso, a uma firma reputada, à qual solicitámos informações. Estas informações esclarecem-nos o seguinte:

Se uma embarcação está equipada para o transporte em cisternas de substâncias em pó, a instalação é efectuada com base nas propriedades específicas da substância a transportar. A concepção de cisternas de carga não depende, em princípio, da substância. A diferença reside, contudo, na concepção do sistema de ventilação. As diferenças são mínimas. Em caso de transporte de outra substância que não aquela par a qual a instalação foi concebida, o sistema não funciona de maneira óptima.»

12.
    Em 23 de Maio de 1997, o presente pedido de isenção foi novamente referido quando de uma reunião da Comissão, dos representantes dos Estados-Membros em causa, da Suíça, e dos Fundos de desmantelamento destes países.

13.
    Por correspondência de 27 de Maio de 1997, a direcção-geral dos transportes neerlandesa transmitiu à Transpo Maastricht uma acta da reunião de 21 de Março de 1997, em que foi referido o seu pedido de isenção. Esta carta referia também:

«A conclusão (da inspecção da navegação) (v. anexo) não permite que a Comissão adopte uma decisão, designadamente, pelo facto de não indicar se a embarcação visada só pode transportar um único produto.

Como sabem, a concessão de uma derrogação depende directamente da circunstância de só poder ser transportado um único produto.

A conclusão [da inspecção da navegação] poderá, consequentemente, levar a Comissão a indeferir o vosso pedido.

Contudo, enquanto Fundo [de desmantelamento] neerlandês, consideramos que vos deve ser proporcionada a melhor situação possível face à argumentação que apresentam, a fim de que, apesar de tudo, vos possa ser concedida uma isenção.

Tanto a Comissão como os restantes Estados-Membros são desta opinião.

Solicito-vos, assim, que nos demonstrem que a embarcação em causa só pode transportar um único produto.»

14.
    Na sua carta de 18 de Julho de 1997, dirigida à direcção-geral dos transportes neerlandesa, a Transpo Maastricht afirmou que resultava da carta da inspecção da navegação de 14 de Maio de 1997 que a Durance tinha sido especialmente equipada, pelo que só podia transportar um produto e que a este respeito não eram necessárias informações detalhadas quanto à sua concepção.

15.
    Em 5 de Outubro de 1997, o director do departamento da navegação fluvial da direcção-geral dos transportes neerlandesa escreveu à Comissão:

«Por carta de 27 de Maio último, solicitei à Transpo Maastricht BV que demonstrasse em definitivo que [a Durance] só pode transportar uma substância especial.

Tanto a carta da inspecção da navegação como a resposta da Transpo Maastricht BV de 18 de Julho último não fornecem uma explicação clara a este respeito.

Considero, assim, que, com o seu equipamento actual, a embarcação em questão pode transportar várias substâncias sob forma de pó.

Por esta razão aconselho que a Comissão decida em conformidade.»

16.
    A Transpo Maastricht escreveu novamente à direcção-geral dos transportes neerlandesa em 14 de Outubro de 1997 e juntou a carta de 23 de Setembro de 1996 que lhe foi enviada pela International Pneumatic Equipment Consultants (a seguir «IPEC»). Resulta desta carta que a Durance não é adequada, efectivamente, para o transporte de outras substâncias para além de cinzas secas.

17.
    Em 17 de Outubro de 1997, o grupo de peritos foi consultado pela Comissão e pronunciou-se por unanimidade dos seus membros contra a concessão da isenção requerida.

18.
    Por carta de 13 de Fevereiro de 1998, a Comissão comunicou à Transpo Maastricht que lhe não concederia a isenção prevista no artigo 8.°, n.° 3, alínea c), do Regulamento n.° 1101/89 relativamente às embarcações especializadas (a seguir «decisão impugnada»).

19.
    A Comissão, após recordar os critérios definidos na sua nota interpretativa, salientou, por um lado, que a Durance não foi especialmente concebida para o transporte de um determinado tipo de mercadorias e que os recorrentes não demonstraram a realização das alterações e adaptações necessárias para conferir a esta embarcação carácter especializado.

20.
    Por outro lado, afirmou que, aos seus pedidos destinados a obter informações técnicas detalhadas, a Transpo Maastricht opôs a preservação do segredo de negócios. A Comissão deduziu daí que a Durance podia ser utilizada para o transporte de vários tipos de mercadorias. A este respeito, considerou que a possibilidade de a embarcação transportar o que se qualifica como «produto que limita a emissão de gases resultantes da combustão» não é determinante.

21.
    A Comissão concluiu que a Durance não era suficientemente especializada para satisfazer aos critérios da sua nota interpretativa e salientou que esta conclusão era corroborada pela investigação do Ministério dos Transportes neerlandês.

Tramitação processual e pedidos das partes

22.
    Por petição entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 16 de Abril de 1998, os recorrentes interpuseram o presente recurso.

23.
    Com base no relatório do juiz-relator, o Tribunal (Quinta Secção) decidiu, por um lado, iniciar a fase oral do processo e, por outro, nos termos do artigo 64.°, n.° 3, do Regulamento de Processo, convidar os recorrentes e a Comissão a responderem por escrito, antes da audiência, a determinadas perguntas. Os mesmos responderam por cartas de 16 e 17 de Junho de 1999.

24.
    Foram ouvidas as alegações e as respostas das partes às questões colocadas pelo Tribunal na audiência de 6 de Julho de 1999.

25.
    Os recorrentes concluem pedindo que o Tribunal se digne:

-    anular a decisão impugnada e conceder-lhe a isenção requerida;

-    condenar a recorrida nas despesas.

26.
    A Comissão, recorrida, conclui pedindo que o Tribunal se digne:

-    negar provimento ao recurso;

-    condenar os recorrentes nas despesas.

Quanto ao mérito

27.
    Os recorrentes invocam, no essencial, três fundamentos assentes na violação, em primeiro lugar, dos critérios definidos na nota interpretativa que permitem qualificar as embarcações como especializadas, em segundo lugar, do princípio do contraditório e, em terceiro lugar, do princípio da não discriminação. No âmbito do primeiro fundamento, os recorrentes alegam também que a Comissão ignorou os objectivos da política de saneamento do transporte de mercadorias por via navegável.

Quanto ao primeiro fundamento, assente na violação dos critérios definidos na nota interpretativa que permitem qualificar as embarcações como especializadas

Argumentos das partes

28.
    Os recorrentes consideram, em primeiro lugar, que existe uma contradição entre os dois primeiros critérios definidos na nota interpretativa. Efectivamente, o critério relativo à proibição de transportar a mercadoria em causa em embarcações que não disponham de instalações técnicas especiais é inconciliável com a exigência de que a embarcação em questão deva ter sido especialmente concebida para o transporte de uma categoria determinada de produtos e seja inapta para o transporte de outros produtos sem alteração da sua construção.

29.
    Os recorrentes contestam ainda a aplicação dos critérios da nota interpretativa feita pela Comissão na decisão impugnada.

30.
    Quanto ao primeiro critério, salientam que a afirmação da Comissão de que a Durance não foi especialmente concebida para o transporte de um determinado tipo de mercadorias é irrelevante, uma vez que esta embarcação foi transformadapara assegurar, em primeiro lugar, o transporte de produtos pulverulentos e depois, mais em especial, o de cinzas secas.

31.
    Aliás, na sua contestação (n.° 21), a Comissão considerou que a condição de que uma embarcação deva ser tecnicamente inapta para o transporte de outros produtos não significa que esse transporte tenha de ser impossível. Assim, não se trata de determinar o que a embarcação pode eventualmente transportar, mas de definir para que tipo de transporte é realmente apta. A Direcção-geral dos transportes neerlandesa aplicou, consequentemente, de modo errado o primeiro critério, conforme resulta das suas cartas de 1 de Abril, 27 de Maio, e 5 de Outubro de 1997. Do mesmo modo, a Comissão, quando da adopção da decisão impugnada, considerou erradamente que cabia aos recorrentes demonstrar que a Durance só podia transportar um produto determinado.

32.
    Assim, embora seja exacto que a Durance possa transportar outros tipos de produtos, não é menos certo que, na acepção do primeiro critério acima referido, não é apta para este género de transporte. A Comissão, a este respeito, não teve em conta a carta da inspecção da navegação, de 14 de Maio de 1997, que refere que, em caso de transporte de outra substância, o sistema não funciona de modo óptimo, nem a carta da Transpo Maastricht de 18 de Julho de 1997, que indica que não pode ser transportado de maneira apropriada outro produto nem, por último, a carta da IPEC de 23 de Setembro de 1996, que refere que resulta das alterações efectuadas à embarcação que a mesma é inapta para o transporte de outros produtos que não cinzas.

33.
    A este respeito, é incorrecto o fundamento de que se não mostrou que a Durance foi objecto de modificações que lhe permitam transportar apenas um único tipo de produtos. Assim, resulta do pedido de isenção que a embarcação foi adaptada para esse efeito em 1996 e que «está equipada com instalações especiais para o transbordo, sem libertação de poeiras, de cinzas secas sob forma de pó, a fim de satisfazer as normas ambientais actualmente em vigor». A conformidade da embarcação com este critério resulta também das suas características técnicas específicas, conforme foram enumeradas na carta de 14 de Maio de 1997, da inspecção da navegação, e na de 18 de Julho de 1997, da Transpo Maastricht, das quais a Comissão teve conhecimento. Aliás, a decisão impugnada refere que a inspecção da navegação, na carta de 14 de Maio de 1997, «enumera as adaptações e modificações necessárias para conferir a esta embarcação carácter especializado». Além disso, em conformidade com a posição da Comissão, dado que as características técnicas da instalação dependem das propriedades específicas da substância transportar, há que verificar que a Durance é especializada, uma vez que está encarregada do transporte de cinzas.

34.
    Acresce que não tem fundamento o argumento da Comissão assente na impossibilidade de obter as informações técnicas necessárias à sua apreciação devido ao segredo de negócios que foi invocado. Efectivamente, foi a firma à qual a inspecção da navegação solicitou informações que invocou o segredo de negóciosperante esta. Em todo o caso, os recorrentes estão dispostos, se tal se justificar, a fornecer toda e qualquer informação que a Comissão exija, como foi indicado à mesma pela Transpo Maastricht na sua correspondência, designadamente na carta de 18 de Julho de 1997, que propunha que se procedesse a uma inspecção da embarcação. A este respeito, salientam que a Comissão não solicitou qualquer informação complementar.

35.
    Os recorrentes denunciam também a apreciação da Comissão segundo a qual a Durance não é suficientemente especializada. Resulta desta apreciação que a Comissão reconhece que a embarcação é especializada, mas não extrai daí as consequências necessárias e não justifica de que modo a mesma é insuficientemente especializada, criando, por esse facto, «níveis de especialização» obscuros.

36.
    Quanto ao segundo critério da nota interpretativa, a Comissão, segundo os recorrentes, indicou, no n.° 21 da contestação, que aquele exige que a própria mercadoria transportada seja específica. Ora, esta condição não está prevista no artigo 8.°, n.° 3, alínea c), do Regulamento n.° 1101/89, o qual se refere apenas a embarcações especializadas e não a mercadorias específicas. Acresce que a Comissão, em decisões anteriores, considerou que o transporte de cinzas deve beneficiar da isenção prevista no artigo 8.°, n.° 3, alínea c), do Regulamento n.° 1101/89 e que, por esse motivo, a cinza constitui uma mercadoria específica e não uma categoria de mercadorias. Assim, ao invocarem em apoio do seu pedido de isenção o facto de a Durance assegurar o transporte de cinzas secas, os recorrentes acrescentaram uma especificação suplementar aos critérios da Comissão.

37.
    Por último, os recorrentes afirmam que a Comissão ignorou os objectivos da política de saneamento do transporte de mercadorias por via navegável.

38.
    A este respeito, afirmam que, na decisão impugnada, a Comissão considerou erradamente que a Durance contribuia «para aumentar a capacidade da frota referida nas regras de saneamento estrutural do Regulamento n.° 1101/89». Efectivamente, a Durance só transporta cinzas e não existe excesso de capacidade neste segmento de mercado. Por último, o referido segmento contribui para o descongestionamento do transporte rodoviário, a quem cabia, até então, o transporte desta substância.

39.
    Assim, a exclusão da embarcação em causa do âmbito de aplicação do artigo 8.°, n.° 1, do Regulamento n.° 1101/89 está em conformidade com os objectivos fixados no mesmo regulamento.

40.
    Os recorrentes propõem-se provar as suas afirmações por todos os meios legais e, em especial, através de testemunhas e peritos.

41.
    A Comissão salienta, em primeiro lugar, que os dois primeiros critérios da sua nota interpretativa não são contraditórios mas, pelo contrário, se reforçam mutuamente. Com efeito, a exigência de que a embarcação em causa deva ser equipada com determinadas instalações específicas não implica que tenha de estar impossibilitada de transportar diferentes tipos de mercadorias. Por outro lado, a Comissão desmente que as instâncias chamadas a dar parecer sobre a isenção solicitada se tenham baseado em critérios diferentes dos definidos na sua nota interpretativa.

42.
    Em segundo lugar, a Comissão afirma que a Durance, apesar das suas características técnicas específicas, não pode ser considerada uma embarcação especializada, tendo em conta a sua capacidade para transportar vários tipos de mercadorias. A este respeito, a Comissão salienta que os recorrentes não demonstraram que a Durance só podia transportar uma única categoria de mercadorias, apesar do pedido feito nesse sentido pela Direcção-geral dos transportes neerlandesa em carta de 27 de Maio de 1997, e apesar do mal-entendido sobre o segredo de negócios.

43.
    A Comissão denuncia também, a este respeito, a interpretação extensiva que os recorrentes fazem do primeiro critério, nos termos da qual o mesmo permitiria a utilização da embarcação em causa para o transporte de outras categorias de mercadorias. Esta interpretação é incompatível com a finalidade do Regulamento n.° 1101/89 e com a jurisprudência do Tribunal de Primeira Instância no acórdão de 1 de Outubro de 1998, Natural van Dam e Danser Container Line/Comissão (T-155/97, Colect., p. II-3921), da qual resulta que, constituindo uma derrogação do regime geral aplicável, o artigo 8.°, n.° 3, alínea c), do Regulamento n.° 1101/89 deve ser interpretado de forma estrita.

44.
    Além disso, a Comissão afirma que os recorrentes não demonstraram que a Durance estava em conformidade com a regulamentação aplicável ao transporte exclusivo de cinzas e destinada à protecção do ambiente.

45.
    Por outro lado, contrariamente ao que os recorrentes afirmam, a carta de 14 de Maio de 1997 da inspecção da navegação para a Direcção-geral dos transportes neerlandesa demonstra que a Durance pode transportar vários tipos de mercadorias. Do mesmo modo, as referências genéricas às características técnicas contidas na carta de 18 de Julho de 1997 da Transpo Maastricht não são susceptíveis de contrariar esta conclusão. A este respeito, a situação em que a Durance se encontra é equiparável à da embarcação VOF Challenger, à qual não foi concedida a exclusão requerida, devido à capacidade da referida embarcação para transportar vários tipos de produtos pulverulentos. Além disso, as adaptações e modificações apresentadas na carta do IPEC de 23 de Setembro de 1996, mesmo que tenham sido realizadas, o que não está demonstrado, não reduziriam a capacidade da embarcação em causa para transportar vários tipos de mercadorias.

46.
    Por último, a Comissão rejeita a alegação dos recorrentes de que tenham sido criados diferentes graus de especialização. Apenas a aplicação dos critériosdefinidos na nota interpretativa, em especial da exigência de que a embarcação em causa deva ser inapta para o transporte de outras categorias de mercadorias, justifica, no presente caso, a recusa de concessão da isenção requerida.

47.
    Quanto ao segundo critério, a Comissão considera que a designação genérica de «produto pulverulento» abrange uma larga gama de mercadorias. A este respeito, a Comissão precisa que as embarcações, como a VOF Challenger, que transportam produtos pulverulentos foram sistematicamente sujeitas à regra «velho por novo».

48.
    Em terceiro lugar, no que respeita ao alegado desprezo pelos objectivos da política de saneamento dos transportes de mercadorias por via navegável, a Comissão recorda, em primeiro lugar, que os critérios enunciados na nota interpretativa foram definidos a pedido dos Estados-Membros interessados, da Suíça, das autoridades dos diversos Fundos de desmantelamento e das organizações representativas da navegação interior a nível comunitário, os quais os aprovaram e que, desde então, os referidos critérios têm sido aplicados por diversas vezes.

49.
    Em segundo lugar, os objectivos do Regulamento n.° 1101/89 consistem em eliminar a capacidade estrutural no sector da navegação interior através de medidas de desmantelamento e manter a procura e a oferta através da regra «velho por novo». A este respeito, apenas as embarcações que obedeçam cumulativamente aos três critérios da nota interpretativa podem ser excluídas do âmbito de aplicação desta regra.

50.
    Em terceiro lugar, a Comissão observa que a questão de saber se o segmento de mercado em causa está sujeito ou não a uma situação de excesso de capacidade é irrelevante, dado que o Regulamento n.° 1101/89 tem carácter geral, uma vez que se destina a toda a navegação interior. Somente o respeito dos critérios de aplicação do artigo 8.°, n.° 3, alínea c), do referido regulamento permitiria a obtenção da isenção pretendida.

51.
    A Comissão lembra também que o único objectivo pretendido com a regra «velho por novo» é sanear o sector da navegação interior reduzindo o excesso de capacidade existente, de modo nenhum justificando a transferência do transporte de determinados tipos de mercadorias da via rodoviária para a via fluvial a concessão de uma isenção.

52.
    Por último, a Comissão verifica que, na carta de 16 de Dezembro de 1996 que lhe foi enviada pela Transpo Maastricht, esta indica que a Durance não navegava na rede das vias navegáveis ligadas entre si da Bélgica, Alemanha, França, Luxemburgo, Países Baixos e Suíça, quando da entrada em vigor do Regulamento n.° 1101/89, confirmando desse modo que este regulamento, na época, não era aplicável à referida embarcação.

Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

53.
    Ha que verificar, desde logo, que, nos termos do artigo 8.°, n.° 1, alínea a), do Regulamento n.° 1101/89, a regra «velho por novo» é aplicável às embarcações que saem das vias nacionais não ligadas às restantes vias navegáveis da Comunidade. Ora, resulta da carta de 16 de Dezembro de 1996 da Transpo Maastricht à Comissão, que a Durance, quando da entrada em vigor do Regulamento n.° 1101/89, não navegava na rede das vias nacionais ligadas às restantes vias navegáveis da Comunidade. Por outro lado, no âmbito do presente recurso, os recorrentes não contestaram que, quando da entrada em vigor do regulamento em causa, a Durance se não encontrava sujeita à esse regulamento. Consequentemente, há que considerar que a Durance é antes abrangida pelo regime geral previsto no artigo 8.°, n.° 1, alínea a).

54.
    Na decisão impugnada, a Comissão considerou que os recorrentes não demonstraram que tinham sido realizadas as modificações e adaptações necessárias para conferir à embarcação em causa carácter especializado.

55.
    Deve, por isso, analisar-se se, dos elementos apresentados pelos recorrentes à Comissão resulta que as modificações técnicas em questão foram efectuadas. A este respeito, importa recordar que, no quadro de um recurso de anulação nos termos do artigo 173.° do Tratado (que passou, após alteração, a artigo 230.° CE), a legalidade de um acto comunitário deve ser apreciada apenas em função dos elementos de que a Comissão dispunha no momento em que adoptou o acto (v., por exemplo, acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 25 de Junho de 1998, British Airways e o./Comissão, T-371/94 e T-394/94, Colect., p. II-2405, n.° 81, e de 4 de Março de 1999, Assicurazioni Generali e Unicredito/Comissão, T-87/96, ainda não publicado na Colectânea, n.° 70).

56.
    É certo que o pedido de isenção de 1 de Outubro de 1996 refere que «a embarcação está equipada com instalações especiais para o transbordo, sem libertação de poeira, de cinzas sob forma de pó, a fim de satisfazer as normas ambientais actualmente em vigor».

57.
    Contudo, ao contrário do que os recorrentes afirmam, não resulta da carta da inspecção da navegação à Direcção dos transportes neerlandesa de 14 de Maio de 1997, nem da da IPEC à Transpo Maastricht de 23 de Setembro de 1996, que a Durance tivesse sido equipada com as referidas instalações.

58.
    Efectivamente, quanto à carta de 14 de Maio de 1997, a mesma contém uma descrição genérica das características técnicas que devem apresentar as embarcações equipadas para o transporte em cisternas de substâncias em pó e de modo algum indica que a Durance estivesse dotada desse equipamento (v. excerto relevante no n.° 11 supra).

59.
    A carta da IPEC à Transpo Maastricht de 23 de Setembro de 1996 refere, por seu turno, o seguinte:

«Na sequência do vosso pedido, enviamos as nossas observações sobre as adaptações e modificações de que necessita a ['Durance‘], que por vós foi adquirida, para o transporte de cinzas secas, tudo nos termos das especificações e acções que se seguem.

...

Estas adaptações têm como consequência que a embarcação não servirá para o transporte de outro carregamento senão de cinzas secas.

Esperando assim termos sido úteis, consideramos que os pontos acima referidos serão postos em execução através de concertação.»

60.
    Também não resulta desta correspondência que as modificações técnicas referidas tenham sido realizadas.

61.
    A este respeito, a interpretação dos recorrentes, nas suas respostas às questões do Tribunal e reiterada na audiência, segundo a qual o último período da carta de 23 de Setembro de 1996 se refere a outra embarcação que não à Durance, não pode ser admitida. Efectivamente, embora os recorrentes tenham apresentado, em apoio da sua tese, uma carta da IPEC de 16 de Junho de 1999 que indica que o período controvertido se referia a outra embarcação do mesmo proprietário, de modo algum resulta da carta de 23 de Setembro de 1996, na qual só a Durance é mencionada, que o mesmo pudesse dizer respeito a outra embarcação para além desta.

62.
    Consequentemente, a Comissão considerou correctamente que os recorrentes não demonstraram que tinham sido realizadas as instalações técnicas que, no entender daqueles, permitiriam qualificar a Durance como embarcação especializada na acepção do artigo 8.°, n.° 3, alínea c), do Regulamento n.° 1101/89.

63.
    Além disso, os recorrentes não demonstraram, nem sequer alegaram, que as transformações de que a Durance foi objecto em 1982 lhe conferiram o carácter de embarcação especializada, na acepção do artigo 8.°, n.° 3, alínea c), do Regulamento n.° 1101/89. Sobre este ponto, na petição inicial, afirmaram, para efeitos do presente recurso, que «esta embarcação deve ser apreciada à luz do seu estado actual, ou seja transformada e preparada para receber cinzas secas».

64.
    Daqui decorre que são ineficazes os argumentos dos recorrentes relativos à existência de uma contradição entre os dois primeiros critérios da nota interpretativa e à má aplicação dos mesmos no caso concreto.

65.
    Por último, a afirmação de que os serviços competentes da Comissão foram convidados a inspeccionar a Durance, nomeadamente por carta da Transpo Maastricht de 18 de Julho de 1997, é contrariada pelo próprio conteúdo dacorrespondência em causa e pelas declarações dos recorrentes na audiência, que afirmaram nunca ter feito esse convite.

66.
    Quanto à alegada inadequação dos critérios aplicados pela Comissão na decisão impugnada aos objectivos da política comunitária de saneamento estrutural, deve recordar-se que, na decisão impugnada, a Comissão considerou legitimamente que os recorrentes não tinham demonstrado que foram realizadas as alterações técnicas que, segundo aqueles, confeririam carácter especializado à embarcação em causa.

67.
    Nestas circunstâncias, não há que analisar a questão de saber se, como afirmam os recorrentes, os critérios aplicados pela Comissão não estão em conformidade com os objectivos da política de saneamento estrutural da navegação prosseguidos pelo regulamento.

68.
    Deve, assim, ser julgado improcedente o primeiro fundamento.

Quanto ao segundo fundamento, assente na violação do princípio do contraditório

Argumentos das partes

69.
    Os recorrentes afirmam, em primeiro lugar, que ignoravam a existência da nota interpretativa.

70.
    Criticam também a Comissão por ter invocado uma decisão do grupo de peritos «Saneamento estrutural da navegação interior» na qual o mesmo se pronunciou por unanimidade dos seus membros contra a concessão da isenção solicitada. Os recorrentes interrogam-se sobre a oportunidade da intervenção do referido grupo de peritos uma vez que, nos termos do artigo 8.°, n.° 3, alínea c), do Regulamento n.° 1101/89, devem ser consultados os Estados-Membros e as organizações representativas da navegação interior a nível comunitário.

71.
    Por outro lado, os recorrentes afirmam não ter tido conhecimento da carta de 5 de Outubro de 1997, dirigida à Comissão pela Direcção-geral dos transportes neerlandesa, que referia que, segundo a carta da inspecção da navegação de 14 de Maio de 1997 e a resposta da Transpo Maastricht de 18 de Julho de 1997, a Durance podia transportar várias categorias de mercadorias. Os recorrentes requerem a apresentação da referida carta de 5 de Outubro de 1997, cuja conclusão está errada. Além disso, resulta da acta da reunião do grupo de peritos «Saneamento estrutural da navegação interior» de 17 de Outubro de 1997 que não somente a carta da Direcção-geral dos transportes neerlandesa de 5 de Outubro de 1997 foi utilizada no mau sentido, mas também que a referida Direcção aplicou um critério diferente do adoptado pela Comissão.

72.
    A Comissão responde que os critérios definidos na sua nota interpretativa foram elaborados em estreita concertação com os Estados-Membros, com os fundos e as organizações profissionais nacionais (entre os quais o Fundo de desmantelamentoneerlandês). Considera que os mesmos são conhecidos pelos profissionais do sector da navegação interior, consequentemente pela Transpo Maastricht, desde 1990. Acresce que o teor da correspondência trocada entre os diferentes intervenientes no processo de análise do pedido de isenção em causa realça os referidos critérios e a sua importância para a concessão da mesma isenção.

73.
    A Comissão lembra também que não está vinculada ao parecer dos Estados-Membros e das organizações representativas da navegação interior, nem, por outro lado, é obrigada a enviar a acta das reuniões destes intervenientes à empresa requerente antes de decidir sobre o pedido desta.

74.
    Em todo o caso, resulta das actas sucintas das reuniões dos representantes dos Estados-Membros e das organizações representativas em causa, de 21 de Março e 23 de Maio de 1997, que, se não fossem satisfeitos os critérios, a isenção requerida não podia ser concedida. Ora, o grupo de peritos «Saneamento estrutural da navegação interior», na sua reunião de 17 de Outubro de 1997, considerou que a Durance era apta para o transporte de outras mercadorias para além de cinzas.

75.
    Quanto à regularidade do processo, a Comissão salienta que consultou o grupo de peritos «Saneamento estrutural da navegação interior», que é composto por representantes dos Estados-Membros e das organizações da navegação interior representativas a nível comunitário.

76.
    Por último, a Comissão alega que, ao contrário do que afirmam os recorrentes, o ponto de vista destes, bem como as cartas de 14 de Maio, 18 de Julho e 14 de Outubro de 1997, foram levados ao conhecimento dos participantes na reunião de 17 de Outubro de 1997. Os mesmos, com pleno conhecimento de causa, propuseram, assim, de modo unânime à Comissão que não concedesse a isenção requerida.

Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

77.
    Em primeiro lugar, é de notar que o argumento dos recorrentes assente na sua ignorância quanto à existência da nota interpretativa não pode ser aceite.

78.
    Efectivamente, resulta claramente do pedido de isenção de 1 de Outubro de 1996 que a Transpo Maastricht conhecia os três critérios definidos pela Comissão na referida nota em colaboração com os Estados-Membros e as organizações profissionais dos mesmos Estados.

79.
    O pedido de isenção refere, a este respeito, o seguinte:

«Este tipo de carga não pode ser transportado por embarcações que não tenham equipamentos especiais, atendendo à natureza poeirenta do carregamento...

Tendo em conta os equipamentos instalados, a embarcação é inapta para o transporte de outros tipos de carregamento.

Subsidiariamente, declaramos que, se o artigo 8.°, n.° 1, for aplicável à embarcação, estamos dispostos a dar integral cumprimento ao regulamento 'velho por novo‘ na hipótese de, por qualquer razão, transportarmos, apesar de tudo, outro tipo de carregamento por meio da [Durance].»

80.
    Quanto, mais em especial, ao último período acima referido, os recorrentes, em resposta a uma questão do Tribunal, afirmaram que o mesmo tinha como objectivo satisfazer o exigido pelo terceiro critério da nota interpretativa.

81.
    Além disso, deve observar-se que o argumento dos recorrentes assente na violação do artigo 8.°, n.° 3, alínea c), do Regulamento n.° 1101/89, na medida em que não foram consultados os Estados-Membros e as organizações representativas da navegação interior, também não tem fundamento.

82.
    Efectivamente, a Comissão apresentou as conclusões da reunião do grupo de peritos de 21 de Março de 1997 e da reunião que teve em 23 de Maio de 1997 com os representantes dos Estados-Membros em causa, da Suíça e dos Fundos de desmantelamento destes países, nas quais foi analisado o pedido de isenção em causa e pedida a intervenção do Fundo de desmantelamento neerlandês.

83.
    Por outro lado, resulta da acta da reunião do referido grupo de peritos de 17 de Outubro de 1997 o seguinte:

«Os pedidos de exclusão de três embarcações especializadas são analisados com base numa nota dos serviços da Comissão. Foi apresentado na sessão um pedido de exclusão relativo a uma quarta embarcação:

As delegações dos Estados-Membros e das organizações profissionais são de opinião que os quatro pedidos de exclusão devem ser indeferidos:

...

c)    Embarcação-cisterna destinada ao transporte de cinzas: este pedido foi analisado nas reuniões de 21 de Maio de 1997 e 23 de Maio de 1997; nesta última reunião, o Fundo [de desmantelamento] neerlandês foi convidado a verificar se a embarcação podia ser utilizada no transporte de outros produtos pulverulentos. Em carta de 5 de Outubro de 1997 dirigida à Comissão Europeia, o Fundo [de desmantelamento] neerlandês indica que ainda não dispõe de uma resposta clara da parte do proprietário da embarcação, mas que conclui daí que a embarcação, tal como actualmente está equipada, se presta ao transporte de outros tipos de produtos. As delegações são de parecer que o pedido de exclusão não deve, por isso, ser aceite.»

84.
    Está assim demonstrado que, nos termos do exigido pelo artigo 8.°, n.° 3, alínea c), do Regulamento n.° 1101/89, a Comissão consultou, para efeitos da decisão impugnada, os Estados-Membros e as organizações profissionais em questão.

85.
    Por último, os recorrentes criticam a Comissão por não lhes ter enviado a carta da Direcção-geral dos transportes neerlandesa de 5 de Outubro de 1997.

86.
    Contudo, a Comissão não é obrigada a informar os requerentes da isenção do ponto de vista detalhado dos Estados-Membros e das organizações representativas da navegação interior que, nos termos do artigo 8.°, n.° 3, alínea c), do Regulamento n.° 1101/89, têm papel consultivo (v. acórdão Natural van Dam e Danser Container Line/Comissão, já referido, n.° 51).

87.
    Ora, é de notar que foi no âmbito do referido parecer consultivo que, na reunião de 21 de Março de 1997 do grupo de peritos «Saneamento estrutural da navegação interior», foi decidido solicitar ao Fundo de desmantelamento neerlandês que verificasse se a Durance apresentava as características técnicas de uma embarcação especializada e informasse a Comissão do resultado da sua análise. Em conformidade com este pedido, a Direcção-geral dos transportes neerlandesa procedeu a uma averiguação junto da requerente e da inspecção da navegação. Na carta controvertida de 5 de Outubro de 1997, a Direcção-geral dos transportes neerlandesa comunicou à Comissão as conclusões da sua averiguação.

88.
    Esta carta não pode, assim, ter um valor superior ao de um mero parecer consultivo, e esta análise não pode ser contrariada pelo facto de a Comissão, na decisão impugnada, ter considerado que a carta de 5 de Outubro de 1997 corroborava a sua apreciação.

89.
    Consequentemente, deve considerar-se que a Comissão não era obrigada a comunicar aos recorrentes a carta de 5 de Outubro de 1997.

90.
    Resulta do que antecede que o segundo fundamento deve ser julgado improcedente.

Quanto ao terceiro fundamento, assente na violação do princípio da não discriminação

Argumentos das partes

91.
    Os recorrentes lembram que a Comissão concedeu anteriormente isenções nos termos do artigo 8.°, n.° 3, alínea c), do Regulamento n.° 1101/89 a embarcações do mesmo tipo, que apresentavam as mesmas especificações técnicas. Assim, há que concluir que a Durance, tal como as referidas embarcações, não contribui para o aumento do excesso de capacidade existente e que apresenta as características de uma embarcação especializada.

92.
    Os recorrentes requerem, por isso, a apresentação pela Comissão das decisões que concederam as referidas isenções e afirmam que foram vítimas de discriminação.

93.
    Acrescentam que o seu pedido de isenção não é comparável ao relativo à embarcação VOF Challenger, indeferido pela Comissão, dado que esta embarcação está apta ao transporte de vários tipos de mercadorias (cimento, cinzas, calcário em pó, cal viva). Lembram também que a Comissão excluiu do âmbito de aplicação da regra «velho por novo» várias embarcações encarregadas do transporte de cinzas.

94.
    Por último, os recorrentes propõem-se provar as suas alegações por todos os meios legais e, em especial, através de testemunhas e peritos.

95.
    A Comissão responde que rejeitou anteriormente pedidos de isenção equiparáveis ao dos recorrentes e, para este fim, juntou uma decisão recente de indeferimento relativa à embarcação VOF Challenger. Contudo, salienta que o número de pedidos de derrogação da regra «velho por novo» continua limitado e considera que este estado de coisas se justifica pela opinião dos proprietários das embarcações, segundo a qual não podem beneficiar da isenção.

96.
    A Comissão salienta que treze embarcações registadas na Bélgica foram sujeitas à aplicação do Regulamento n.° 1101/89 e que os seus proprietários pagaram, por esse facto, a contribuição especial «velho por novo». Acrescenta que, em duas decisões de 23 de Maio de 1990 e 3 de Maio de 1991, considerou que a isenção nos termos do artigo 8.°, n.° 3, alínea c), devia ser concedida relativamente a duas embarcações, dado que os requerentes demonstraram que estavam preenchidos os critérios da nota interpretativa.

Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

97.
    Os recorrentes, no âmbito deste fundamento, invocam a violação do princípio da não discriminação, na medida em que a Comissão teria concedido a proprietários de embarcações que apresentam as mesmas especificações técnicas que a Durance a isenção prevista no artigo 8.°, n.° 3, alínea c), do Regulamento n.° 1101/89. Para este efeito, requerem a comunicação pela Comissão das decisões correspondentes.

98.
    Ora, há que notar que, quando uma embarcação não apresente as características de uma embarcação especializada na acepção do artigo 8.°, n.° 3, alínea c), do Regulamento n.° 1101/89, a isenção referida no mesmo artigo não poderá ser aplicada com base no facto de ter sido concedida relativamente a outra embarcação que apresentava as mesmas especificações técnicas, em circunstâncias em que o Tribunal não foi chamado a pronunciar-se sobre a respectiva situação (v., por analogia, acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 11 de Dezembro de 1996, Van Megen/Comissão, T-49/95, Colect., p. II-1799, n.° 56, e do Tribunal de Justiça de 31 de Março de 1993, Ahlström Osakeyhtiö e o./Comissão, C-89/85,C-104/85, C-114/85, C-116/85, C-117/85 e C-125/85 a C-129/85, Colect., p. I-1307, n.° 197).

99.
    Assim, o Tribunal não tem que exigir à Comissão a apresentação das decisões que adoptou anteriormente no mesmo quadro jurídico e relativas a outras embarcações.

100.
    Em todo o caso, a circunstância de a Comissão, nos processos anteriores, ter podido considerar que a isenção do artigo 8.°, n.° 3, alínea c), do Regulamento n.° 1101/89 era aplicável, não pode, a priori, privá-la do poder de decidir de modo diferente num novo processo quando não seja satisfeita a exigência do artigo acima referido.

101.
    Dado que a Comissão considerou correctamente que os recorrentes não demonstraram que tinham sido efectivamente realizadas as alterações técnicas que, no entender daqueles, confeririam carácter especializado à embarcação em causa, deve ser julgado improcedente o fundamento assente na violação do princípio da não discriminação.

102.
    Por último, não é necessário permitir que os recorrentes provem as suas alegações por todos os meios legais. Efectivamente, resulta claramente do processo que lhes foi dada possibilidade de fazer prova da veracidade das suas afirmações quando do procedimento de análise do pedido de isenção pela Comissão e isto, nomeadamente, pela Direcção-geral dos transportes neerlandesa na carta de 27 de Maio de 1997 enviada à Transpo Maastricht (v. excerto relevante mencionado no n.° 13 supra).

103.
    Resulta de tudo o que antecede que o recurso deve ser julgado improcedente na totalidade.

Quanto às despesas

104.
    Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo os recorrentes sido vencidos, há que condená-los nas despesas, em conformidade com o pedido feito nesse sentido pela Comissão.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quinta Secção),

decide:

1.
    É negado provimento ao recurso.

2.
    Os recorrentes suportarão as suas despesas bem como, solidariamente, as da Comissão.

Cooke
García-Valdecasas
Lindh

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 1 de Fevereiro de 2000.

O secretário

O presidente

H. Jung

R. García-Valdecasas


1: Língua do processo: neerlandês.