Language of document : ECLI:EU:C:2017:286

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

NILS WAHL

apresentadas em 6 de abril de 2017 (1)

Processo C177/16

Biedrība «Autortiesību un komunicēšanās konsultāciju aģentūra — Latvijas Autoru apvienība»

contra

Konkurences padome

[pedido de decisão prejudicial do Augstākā tiesa (Supremo Tribunal, Letónia)]

«Artigo 102.° TFUE — Abuso de posição dominante — Efeito sobre o comércio entre os Estados‑Membros — Entidade de gestão coletiva — Preços não equitativos — Volume de negócios relevante para efeitos de aplicação de uma coima»






1.        Poder‑se‑á verdadeiramente falar em preços não equitativos?

2.        No domínio do direito da concorrência, as escolhas feitas pelos diferentes ordenamentos jurídicos nessa matéria são variáveis. Por exemplo, em alguns deles, entre os quais os Estados Unidos, as práticas de empresas com poder de mercado que se limitam a explorar os clientes não são, em geral, consideradas ilegais. Contudo, a escolha feita pelos autores dos Tratados da União é evidentemente diferente: a alínea a) do segundo parágrafo do artigo 102.° TFUE refere, como um tipo proibido de exploração abusiva de uma posição dominante, as práticas que consistem em «[i]mpor, de forma direta ou indireta, preços de compra ou de venda ou outras condições de transação não equitativas».

3.        Não obstante, na sua prática, a Comissão tem revelado extrema relutância em invocar essa disposição relativamente a preços (alegadamente) elevados praticados por empresas dominantes. No meu entender, essa relutância é justificada. Em especial, não há simplesmente necessidade de aplicar essa disposição num mercado livre e concorrencial: não existindo obstáculos ao acesso ao mercado, os preços elevados deverão, em regra, atrair novos operadores. Consequentemente, o mercado corrigir‑se‑á por ele mesmo.

4.        Porém, a situação poderá ser diferente nos casos em que existam obstáculos jurídicos ao acesso ou ao alargamento do mercado e, em especial, nos casos em que exista um monopólio legal. Com efeito, poderá haver mercados que, em virtude das suas características específicas, não funcionem eficientemente se estiverem abertos à concorrência. Do mesmo modo, um governo poderá ter razões políticas legítimas para restringir a concorrência num determinado mercado, sacrificando assim a eficiência económica, a fim de prosseguir outros objetivos públicos.

5.        É precisamente o que acontece no processo principal.

6.        O caso em apreço proporciona ao Tribunal de Justiça a oportunidade de clarificar as condições em que a imposição de preços elevados por uma empresa dominante poderá violar o artigo 102.°, segundo parágrafo, alínea a), TFUE. Por outras palavras, o presente caso diz respeito a preços fixados por empresas dominantes que poderão ser considerados abusivos porque, sendo excessivamente elevados, exploram os clientes. Em contrapartida, não diz respeito a preços suscetíveis de serem considerados abusivos em virtude dos efeitos de exclusão que produzem sobre os concorrentes.

I.      Quadro jurídico

A.      Direito letão

7.        O artigo 13.°, n.° 4, da Konkurences likums (Lei da concorrência) tem a mesma redação que o artigo 102.°, segundo parágrafo, alínea a), TFUE.

II.    Matéria de facto, tramitação processual e questões prejudiciais

8.        A recorrente no processo principal, a Autortiesību un komunicēšanās konsultāciju aģentūra — Latvijas Autoru apvienība (a seguir «AKKA/LAA»), na sua qualidade de entidade de gestão coletiva, emite licenças para a execução pública de obras musicais em estabelecimentos comerciais e centros de serviços. As tarifas aplicadas pela emissão de tais licenças baseiam‑se na superfície dos estabelecimentos. A AKKA/LAA goza de um monopólio legal na Letónia.

9.        Em 2008, o Konkurences padome (Conselho da Concorrência, Letónia), aplicou uma coima à AKKA/LAA por abuso de posição dominante, pelo facto de esta ter aplicado tarifas excessivamente elevadas correspondentes à remuneração dos autores. O montante da coima aplicada foi calculado com base no volume de negócios da entidade de gestão coletiva, após dedução das quantias transferidas para os autores a título de remuneração.

10.      Posteriormente, em 2011, a AKKA/LAA adotou novas tarifas para remuneração dos autores, as quais foram objeto de um processo instaurado pelo Conselho da Concorrência em 2012. Para avaliar se as tarifas eram justificadas, o Conselho da Concorrência comparou‑as quer com as tarifas das vizinhas Lituânia e Estónia, que são relativamente idênticas à Letónia no que respeita a hábitos de consumo, economia e produto interno bruto, quer, a título exemplificativo, com as tarifas de outros Estados‑Membros, tendo em conta o índice de paridade do poder de compra baseado no produto interno bruto (a seguir «índice PPC»). Essa entidade constatou que as tarifas da recorrente eram consideravelmente mais elevadas (em alguns setores, chegavam mesmo ao dobro) que as tarifas em vigor em ambos os países vizinhos e se encontravam entre as mais elevadas da União, ultrapassando entre 50% a 100% o nível médio das tarifas na União. O Conselho da Concorrência considerou que as referidas tarifas, na medida em que excediam consideravelmente as estabelecidas nos países vizinhos, não eram justificadas e, além disso, a AKKA/LAA não conseguia justificá‑las objetivamente.

11.      Em consequência, por decisão de 2 de abril de 2013 (a seguir «decisão impugnada»), o Conselho da Concorrência declarou que a conduta da AKKA/LAA constituía uma violação da proibição estabelecida pelo artigo 13.°, n.° 4, da Konkurences likums e pelo artigo 102.° TFUE, segundo parágrafo, alínea a), TFUE, e aplicou‑lhe uma coima. No cálculo da coima, teve em conta o volume de negócios da AKKA/LAA, mas desta vez incluiu também as quantias cobradas a título de remuneração dos autores, que tinham sido pagas a estes últimos. O Conselho da Concorrência referiu que o volume de negócios de entidades como as entidades de gestão coletiva deve, para efeitos do direito da concorrência, ser calculado segundo os mesmos princípios aplicáveis às sociedades de capitais, de modo a assegurar que a determinação da coima não seja efetuada segundo diferentes modalidades consoante a forma jurídica do operador económico.

12.      Por decisão de 9 de fevereiro de 2015, o Administratīvā apgabaltiesa (Tribunal Administrativo de Segunda Instância, Letónia) deu provimento parcial ao recurso: considerou correta a constatação de que tinham sido aplicadas tarifas injustificadamente elevadas, mas anulou a decisão impugnada no que respeita à coima aplicada e, com base nos princípios da legalidade e da igualdade, notificou o Conselho da Concorrência para proceder novamente ao cálculo da coima a aplicar à AKKA/LAA sem incluir no volume de negócios desta as quantias cobradas a título de remuneração dos autores. Ambas as partes interpuseram recurso dessa decisão no Augstākā tiesa (Supremo Tribunal, Letónia).

13.      Por ter dúvidas quanto à interpretação do artigo 102.° TFUE, o órgão jurisdicional de reenvio decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      O artigo 102.°, [segundo parágrafo,] [alínea] a), [TFUE] é aplicável a um litígio relativo às tarifas estabelecidas por uma entidade nacional de gestão de direitos de autor, quando esta entidade também cobra remunerações pelas obras de autores estrangeiros e as tarifas por ela estabelecidas são suscetíveis de dissuadir a utilização dessas obras no Estado‑Membro em causa?

2)       No domínio da gestão dos direitos de autor e direitos conexos e para efeitos da determinação do conceito de preços não equitativos utilizado no artigo 102.°, [segundo parágrafo,] [alínea] a), [TFUE], é procedente e suficiente, e em que casos, efetuar uma comparação entre os preços (tarifas) do mercado em causa e os preços (tarifas) dos mercados dos países limítrofes?

3)      No domínio da gestão dos direitos de autor e direitos conexos e para efeitos da determinação do conceito de preços não equitativos utilizado no artigo 102.°, [segundo parágrafo,] [alínea] a), [TFUE], é procedente e suficiente utilizar o índice [PPP] baseado no produto interno bruto?

4)      Deve a comparação das tarifas ser efetuada em relação a cada um dos diferentes setores a que estas são aplicáveis ou relativamente ao nível médio das mesmas?

5)      Quando deve considerar‑se que a diferença das tarifas analisadas para efeitos do conceito de preços não equitativos utilizado no artigo 102.°, [segundo parágrafo,] [alínea] a), [TFUE], é considerável, ao ponto de caber ao operador económico que goza de uma posição dominante o ónus de provar que as suas tarifas são equitativas?

6)      Que informação pode razoavelmente ser exigida ao operador económico para fazer prova do caráter equitativo das tarifas relativas às obras protegidas pelo direito de autor, no âmbito da aplicação do artigo 102.°, [segundo parágrafo,] [alínea] a), [TFUE], se o custo das referidas obras não puder ser determinado da mesma forma que no caso dos bens de natureza material? Unicamente os custos administrativos da entidade de gestão de direitos de autor?

7)      Em caso de violação do direito da concorrência devem ser excluídas do volume de negócios de uma entidade de gestão de direitos de autor, para efeitos da determinação de uma coima, as remunerações pagas aos autores por esse operador económico?»

14.      Apresentaram observações escritas a AKKA/LAA, os Governos alemão, espanhol, letão e neerlandês e a Comissão. A AKKA/LAA, os Governos espanhol e letão, bem como a Comissão, apresentaram alegações orais na audiência de 8 de fevereiro de 2017.

III. Análise

A.      Introdução

15.      O presente caso centra‑se inteiramente num alegado abuso sob a forma da aplicação de preços não equitativos na aceção do artigo 102.°, segundo parágrafo, alínea a), TFUE. Como tal, afigura‑se útil recordar brevemente a jurisprudência do Tribunal de Justiça sobre essa disposição.

16.      No acórdão United Brands (2), bem como em várias decisões posteriores (3), o Tribunal de Justiça considerou incompatível com o atual artigo 102.° TFUE a aplicação de um preço que era excessivo porque não tinha qualquer correspondência razoável como valor económico do produto fornecido. Consequentemente, apenas os preços «desproporcionados» ou «exorbitantes» violariam aquela disposição (4). Nesse contexto, o Tribunal de Justiça concebeu uma análise que compreende dois passos.

17.      O primeiro passo da análise consiste em determinar se existe um excesso, ou seja, uma diferença significativa entre o preço efetivamente cobrado pela empresa dominante no mercado relevante e o preço que essa empresa teria hipoteticamente cobrado se tivesse existido uma concorrência efetiva no mercado (a seguir «preço de referência») (5).

18.      O Tribunal de Justiça reconheceu que poderão existir diferentes métodos para determinar se o preço é ou não excessivo (6). Por exemplo, quando tal seja possível e adequado, pode ser feita uma comparação entre o preço de venda e o custo de produção (7). Este método parece ter subjacente a ideia de que existe um preço limiar que garante uma margem satisfatória (8) em relação aos custos e que, a partir desse limiar, o preço cobrado por uma empresa dominante é excessivo (9). Assim, a análise centra‑se nas margens (ou nos lucros) obtidas pela empresa dominante com a venda dos produtos ou serviços em questão.

19.      Noutros casos, o Tribunal de Justiça estabeleceu uma comparação entre, por um lado, o preço cobrado pelo produto em questão pela empresa dominante e, por outro, os preços cobrados no mesmo mercado por empresas não dominantes (comparação entre concorrentes) (10) ou pela mesma empresa dominante em períodos diferentes (comparação ao longo do tempo) (11), ou os preços cobrados noutros mercados geográficos pela mesma empresa dominante (12) ou por outras empresas (comparação geográfica) (13). A ideia subjacente é a de que, se os produtos ou mercados geográficos selecionados forem suficientemente homogéneos, a comparação de preços poderá ser elucidativa (14). Do mesmo modo, a evolução dos preços praticados por uma empresa ao longo do tempo também poderá fornecer indícios úteis.

20.      Uma vez identificada, através de um ou mais desses métodos, uma diferença significativa entre o preço efetivamente cobrado pela empresa dominante e o preço de referência, importa determinar até que ponto foi praticado um preço não equitativo, quer em si mesmo, quer em comparação com produtos concorrentes (15).

21.      O segundo passo da análise consiste em apurar se a diferença de preço resulta meramente de uma utilização abusiva do poder de mercado pela empresa dominante ou se é consequência de outros motivos legítimos.

22.      Um preço só poderá ser considerado «não equitativo» na aceção do artigo 102.°, segundo parágrafo, alínea a), TFUE se não existir uma justificação válida para a diferença entre o preço de referência e o preço efetivamente imposto pela empresa dominante aos seus clientes.

23.      O Tribunal de Justiça também realizou essa análise em dois passos para determinar as situações em que um preço é excessivo, e, consequentemente, não equitativo para efeitos do artigo 102.° TFUE em casos relacionados com o comportamento de entidades de gestão coletiva (como o processo principal). Nesses casos, o Tribunal de Justiça sustentou que «quando uma empresa em posição dominante impõe, pelos serviços que presta, tabelas sensivelmente mais elevadas que as praticadas nos outros Estados‑Membros e quando a comparação dos níveis das tabelas foi efetuada numa base homogénea, essa diferença deve ser considerada indício de um abuso de posição dominante. Cabe, neste caso, à empresa em questão justificar a diferença, baseando‑se nas divergências objetivas entre a situação do Estado‑Membro em causa e a prevalecente em todos os outros Estados‑Membros (16).»

24.      É nesse cenário que analisarei as questões jurídicas suscitadas pelo órgão jurisdicional de reenvio.

B.      Quanto à primeira questão

25.      Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta ao Tribunal de Justiça se o comportamento de uma entidade de gestão coletiva que também está encarregada de cobrar remunerações pelas obras de autores estrangeiros é suscetível de afetar o comércio entre Estados‑Membros para efeitos do artigo 102.° TFUE.

26.      Antes de mais, cumpre recordar que, segundo jurisprudência assente, a interpretação da condição relativa aos efeitos sobre o comércio entre os Estados‑Membros, contida nos artigos 101.° e 102.° TFUE, deve basear‑se no objetivo dessa condição, que é de definir, em matéria de regulamentação da concorrência, o domínio de aplicação do direito da União e o do direito dos Estados‑Membros. Deste modo, o direito da União cobre qualquer acordo e qualquer prática suscetível de pôr em causa a liberdade de comércio entre os Estados‑Membros de uma forma que poderia prejudicar a realização dos objetivos de um mercado único entre os Estados‑Membros, em particular através da compartimentação dos mercados nacionais ou afetando a estrutura da concorrência dentro do mercado único. Para serem suscetíveis de afetar o comércio entre Estados‑Membros, uma decisão, um acordo ou uma prática devem, com base num conjunto de elementos de facto ou de direito, permitir que se encare com um grau suficiente de probabilidade a sua influência direta ou indireta, efetiva ou potencial, sobre as correntes comerciais entre Estados‑Membros, de modo a que se possa temer que entravem a realização de um mercado único entre Estados‑Membros (17).

27.      No entanto, o mero facto de o comportamento de uma empresa em posição dominante ter por objetivo a comercialização de produtos ou serviços num único Estado‑Membro não é suficiente para excluir que o comércio entre os Estado‑Membro possa ser afetado. Com efeito, tal comportamento pode ter como efeito consolidar barreiras de caráter nacional, entravando assim a interpenetração económica pretendida pelo Tratado (18).

28.      No presente caso, como refere o próprio órgão jurisdicional de reenvio, a política de preços adotada pela AKKA/LAA também abrange as obras de autores estrangeiros, pelo que afeta a disseminação dessas obras na Letónia. Uma vez que essa entidade goza de um monopólio legal, a decisão de autorizar ou não a reprodução de obras protegidas, bem como as suas escolhas sobre as condições e o preço a pagar por essa reprodução, têm um impacto inevitável sobre os padrões de comportamento dos consumidores da Letónia e sobre as decisões dos titulares de direitos de autor em relação ao mercado desse país.

29.      Com efeito, o Tribunal de Justiça tem sistematicamente concluído que as regras da UE em matéria de concorrência são aplicáveis às atividades de entidades de gestão coletiva que consistam no licenciamento de obras musicais, não obstante o facto de tais atividades se restringirem a um único Estado‑Membro (19).

30.      O facto,a que alude o despacho de reenvio, de, em 2013, o Tribunal Geral (20) ter anulado parcialmente uma decisão da Comissão (a seguir «decisão CISAC») (21) adotada no contexto de um procedimento de aplicação do artigo 101.° TFUE, que tinha por destinatárias 24 entidades de gestão coletiva (incluindo a AKKA/LAA), não tem qualquer relevância nessa matéria. O Tribunal Geral anulou a decisão CISAC por entender que a Comissão não tinha feito prova suficiente da existência de uma prática concertada entre as entidades de gestão coletiva. O acórdão do Tribunal Geral não aborda a questão de saber se o comportamento das entidades de gestão coletiva era suscetível de afetar o comércio entre os Estados‑Membros.

31.      Por conseguinte, há que concluir que o comportamento de uma entidade de gestão coletiva que também está encarregada de cobrar remunerações pelas obras de autores estrangeiros é suscetível de afetar o comércio entre Estados‑Membros para efeitos do artigo 102.° TFUE, não obstante ocorrer num único Estado‑Membro.

C.      Quanto à segunda questão

32.      Com a sua segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se, numa situação como a do processo principal, era adequado e suficiente que a autoridade nacional da concorrência efetuasse uma comparação entre as tarifas do mercado nacional em causa e as tarifas dos mercados dos países limítrofes.

33.      Esta segunda questão (tal como a terceira, quarta e quinta questões) diz respeito ao primeiro passo da análise referido nos n.os 17 a 19, supra: o apuramento da eventual existência de uma diferença significativa entre o preço efetivamente cobrado pela empresa dominante no mercado relevante e o preço de referência. Recordo que este último é o preço que essa empresa teria hipoteticamente cobrado se tivesse existido concorrência no mercado.

34.      Esta segunda questão incide claramente sobre o cerne das questões suscitadas no processo principal, uma vez que convida o Tribunal de Justiça a clarificar os métodos e critérios que as autoridades da concorrência devem aplicar para determinar o preço de referência. Antes de examinar pormenorizadamente essa questão, recordo mais uma vez que o processo principal diz respeito à imposição de preços alegadamente não equitativos numa situação em que existe um monopólio legal.

1.      Observações gerais

35.      Conforme expliquei nos n.os 18 e 19, supra, o Tribunal de Justiça deixou às autoridades da concorrência da União e às nacionais uma certa margem de manobra no que respeita à metodologia passível de ser utilizada para determinar se um preço é ou não excessivo. Pelas razões que passo a expor, essa é, no meu entender, uma abordagem muito razoável.

a)      Multiplicidade de métodos ou critérios

36.      É inquestionável que, atualmente, a doutrina económica e jurídica não reconhece um método, teste ou conjunto de critérios que seja genericamente aceite pelos economistas ou pelos vários ordenamentos jurídicos para aquele efeito. Diferentes autoridades, bem como juristas e economistas, têm sugerido diversos métodos de análise (bem como vários critérios ou testes) para esse fim. Porém, a verdade é que cada um desses métodos apresenta falhas intrínsecas.

37.      Em primeiro lugar, nenhum deles pode ser utilizado em todas as circunstâncias, uma vez que a sua adequação (e, em certos casos, a própria possibilidade de serem aplicados) depende muito das características específicas de cada caso. Para dar apenas um exemplo, quando está em causa o fornecimento de certos bens intangíveis como as obras musicais protegidas pelo direito de autor (como acontece no processo principal), não faz muito sentido fazer uma comparação entre custo e preço.

38.      Em segundo lugar, as informações exigidas para efetuar as operações necessárias ao cálculo do preço de referência poderão não estar disponíveis ou completas, ou o seu valor poderá ser controverso. Por exemplo, a identificação dos custos e a sua imputação a um determinado produto é uma operação extremamente complexa na maioria dos setores de atividade e para muitas empresas (22). Assim, o cálculo das margens de lucro é um exercício caracterizado por alguma incerteza. Importa não esquecer que as taxas e normas contabilísticas poderão variar entre diferentes indústrias ou países, devido à existência de disposições legais ou convenções contabilísticas diferentes, e, além disso, poderão nem sempre refletir os conceitos económicos relevantes (23).

39.      Em terceiro lugar, a comparação de preços entre diferentes mercados geográficos, operadores concorrentes e/ou períodos de tempo também apresenta riscos. É raro encontrar mercados tão homogéneos que permitam a realização imediata e automática de uma comparação útil.Poderá ser necessário introduzir alguns «ajustamentos» aos dados relativos ao(s) mercado(s) utilizado(s) como termo de comparação antes de os utilizar para determinar o preço de referência.

40.      Para começar, no que respeita às comparações geográficas, elementos como — para dar apenas alguns exemplos — os impostos nacionais, as características específicas do mercado de trabalho nacional e as preferências dos consumidores locais poderão afetar significativamente o preço final do produto ou serviço relevante (24). Quanto às comparações entre concorrentes, importa não esquecer que as diferenças no preço podem simplesmente refletir diferenças na qualidade: um produto mais caro poderá ser objetivamente de qualidade superior (ou ser meramente visto como tal).

41.      Por último, no que respeita às comparações ao longo do tempo, é preciso ter em conta que os fatores suscetíveis de afetar o preço final de um produto ou serviço podem mudar rapidamente no mercado. Esses fatores poderão dizer respeito a estratégias comerciais legítimas (por ex., uma empresa poderá decidir tentar penetrar num novo mercado e, durante algum tempo, cobrar um preço muito baixo, aceitando assim margens mínimas); a um aumento dos custos (devido a fatores externos, como alterações nos impostos locais ou nos custos da aquisição de crédito, ou a decisões da própria empresa, nomeadamente as suas escolhas em relação a campanhas publicitárias ou a investigação e desenvolvimento); ou até mesmo a preferências dos consumidores (por ex., mudanças na perceção que os clientes têm de um produto em resposta a novas estratégias de marketing). Todos estes fatores poderão resultar em alterações súbitas significativas (e, normalmente, legítimas) nos preços.

42.      Em virtude dessas limitações, tanto as autoridades da concorrência como os economistas consideram, em regra, que o exercício que consiste em determinar o preço de referência num caso de preços possivelmente excessivos acarreta um elevado risco de produzir erros do tipo I (ou falsos positivos: um preço é incorretamente considerado superior ao preço concorrencial) e erros do tipo II (ou falsos negativos: um preço é incorretamente considerado não superior ao preço concorrencial) (25).

b)      Combinação de diferentes métodos

43.      Assim, na falta de um critério universal e dadas as limitações inerentes a todos os métodos existentes, entendo que é crucial, a fim de evitar (ou, mais precisamente, minimizar) o risco de erros, que as autoridades da concorrência se esforcem por examinar cada caso combinando vários métodos de entre os que são aceites pelo pensamento económico convencional e que se afigurem adequados e disponíveis numa situação concreta. Creio que os métodos enunciados na jurisprudência do Tribunal de Justiça (e que foram ilustrados nos n.os 18 e 19, supra) poderão ser utilizados para esse fim (26).

44.      A decisão de combinar vários métodos é, aliás, a abordagem seguida, em todo o mundo, por algumas autoridades da concorrência: por exemplo, no Reino Unido, o Office of Fair Trading (OFT) fê‑lo no processo Napp (27). É igualmente coerente com sugestões apresentadas em fóruns de discussão internacionais dessas autoridades (28), bem como na literatura económica contemporânea (29).

45.      É verdade que essa abordagem tem sido criticada com fundamento no facto de que a aplicação combinada de várias metodologias imprecisas, ainda que produza resultados mutuamente consistentes, poderá não levar a uma conclusão mais fidedigna (30). É certo que as deficiências de um método não se corrigem necessariamente com a aplicação de outro método igualmente deficiente. No entanto, se os métodos forem aplicados independentemente um do outro, uma dada limitação inerente a um deles não afetará os resultados obtidos através da utilização de outros métodos. Nessa conformidade, desde que as metodologias utilizadas não apresentem, elas mesmas, falhas, e que todas sejam aplicadas com rigor e objetividade, a convergência de resultados poderá ser encarada como um indicador de um possível preço de referência num caso concreto.

c)      Indicadores adicionais

46.      No entanto, poderão existir casos em que apenas um desses métodos de determinação do preço de referência esteja disponível ou seja adequado. Nesses casos, considero fundamental que a autoridade tenha em conta outros indicadores que possam corroborar ou, pelo contrário, pôr em causa o resultado da aplicação desse método.

47.      Os indicadores a seguir referidos afiguram‑se‑me relevantes.

48.      Em primeiro lugar, num mercado que não esteja protegido por fortes obstáculos à entrada ou alargamento, não é fácil fixar um preço a um nível significativamente superior ao nível concorrencial. Conforme mencionado anteriormente, se tal acontecer, o mercado deverá, em princípio, estar em condições de se corrigir por ele mesmo a curto ou a médio prazo: os preços elevados deverão normalmente atrair novos operadores ou incentivar a expansão dos operadores existentes. É por esse motivo que (tal como referido no início das presentes conclusões), estou convicto de que apenas é possível falar em preços não equitativos, na aceção do artigo 102.° TFUE, nos mercados regulamentados, onde as autoridades públicas exercem alguma forma de controlo sobre as forças da oferta e, consequentemente, a margem para uma concorrência livre e aberta é mais reduzida. Obviamente, quanto mais fortes e duradouros forem os obstáculos criados pelo legislador, mais fácil será para uma empresa dominante exercer o seu poder de mercado.

49.      Em segundo lugar, é menos provável que seja fixado um preço significativamente superior a um preço concorrencial nos mercados onde existe uma autoridade reguladora setorial, cuja função seja, inter alia, fixar ou controlar os preços cobrados pelas empresas desse setor. As autoridades setoriais estão claramente mais bem posicionadas do que as autoridades da concorrência para supervisionar os preços e, quando necessário, corrigir possíveis abusos (31). Por conseguinte, dir‑se‑ia que, nessas situações, as infrações em matéria de concorrência se restringiriam principalmente a casos de erro ou, de um modo mais geral, a falhas regulamentares, isto é, os casos em que a autoridade setorial deveria ter intervindo, mas não o fez.

50.      Em terceiro lugar, é evidente que, quando negoceia com compradores de peso, uma empresa com poder de mercado terá mais dificuldade em tirar partido da sua posição. Para dar um exemplo: no que respeita às licenças de utilização de obras musicais protegidas por direitos de autor, o poder de negociação dos pequenos operadores será provavelmente diferente do das plataformas internacionais (como o Spotify) e de grupos de empresas sofisticadas de grande dimensão (como os grandes estúdios de Hollywood). A dimensão e o poder financeiro de uma empresa (ou grupo de empresas) poderão ter efetivamente um peso significativo nas negociações. Contudo, a importância (ou até mesmo o caráter imprescindível) dos produtos licenciados para a atividade dos clientes também poderá ser muito relevante naquele contexto.

51.      É evidente que poderão existir outros fatores relevantes, consoante as circunstâncias do caso concreto.

d)      Ressalva

52.      Para concluir este ponto, afigura‑se‑me importante formular duas observações. Primeiro, recordo que compete à autoridade da concorrência provar a violação das regras da UE em matéria de concorrência (32). Segundo, é jurisprudência assente que um princípio como a presunção de inocência se aplica às empresas objeto de um processo de investigação por possíveis violações do direito da concorrência da União (33).

53.      Consequentemente, no meu entender, a inexistência de dados fidedignos ou a complexidade das operações envolvidas no cálculo do preço de referência (ou na sua corroboração) não justificam uma análise incompleta, superficial ou questionável por parte da autoridade da concorrência. Por outras palavras, as dificuldades encontradas por uma autoridade na realização de uma análise não podem prejudicar a empresa sob investigação.

54.      Independentemente da situação específica num caso concreto, o(s) método(s) aplicado(s) e o(s) outro(s) indicador(es) analisados devem fornecer à autoridade um conjunto suficientemente completo e fidedigno de elementos que apontem numa única direção: a existência de uma diferença (34) entre o preço de referência (hipotético) e o preço (real) cobrado pela empresa dominante em questão.

55.      É nesse cenário que examinarei os aspetos específicos do caso em apreço no processo principal.

2.      O caso em apreço

56.      Na decisão impugnada, o Conselho de Concorrência decidiu comparar as tarifas aplicadas pela AKKA/LAA com as tarifas aplicadas por organismos semelhantes noutros mercados geográficos. O órgão jurisdicional de reenvio pergunta se, no caso em apreço, esse método era adequado e suficiente.

a)      Adequação do método

57.      Conforme supramencionado nos n.os 19 e 23, o Tribunal de Justiça já reconheceu que, em princípio, a comparação geográfica é um método válido. Além disso, este método foi validado em casos relacionados precisamente com o comportamento de entidades de gestão coletiva.

58.      Assim, concordo com os Governos alemão, espanhol, letão e neerlandês e com a Comissão, que defendem que a comparação geográfica entre os preços praticados pela prestação do mesmo serviço por entidades diferentes em Estados‑Membros diferentes pode, numa situação como a do processo principal (35), ser um método procedente para determinar o preço de referência para efeitos do artigo 102.° TFUE.

59.      Obviamente, esta conclusão só será válida se a autoridade tiver aplicado o método corretamente.

b)      Aplicação correta do método

60.      Determinar se um dado método foi ou não aplicado corretamente num caso concreto é claramente, por uma questão de princípio, matéria da competência dos órgãos jurisdicionais nacionais. Porém, o Tribunal de Justiça pode, sempre que possível, fornecer orientações a esses órgãos jurisdicionais para que possam interpretar e aplicar o artigo 102.° TFUE de forma correta e coerente.

61.      Nessa matéria, considero que uma autoridade deve, antes de mais, selecionar os Estados‑Membros de referência com base em critérios objetivos, adequados e passíveis de verificação.

62.      Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, o Conselho da Concorrência escolheu a Lituânia e a Estónia, dois países vizinhos, porque são relativamente semelhantes à Letónia no que respeita a hábitos de consumo, economia e bem‑estar dos cidadãos (produto interno bruto) e também partilham o mesmo património histórico e cultural.

63.      Contrariamente ao que defendeu a AKKA/LAA, considero que esses critérios são objetivos e passíveis de verificação. Além disso, afiguram‑se relevantes, na medida em que visam assegurar a homogeneidade dos mercados tanto do lado da procura como da oferta. Com efeito, é crucial, neste contexto, ter em conta os dois seguintes que, no meu entender, são suscetíveis de afetar o valor económico do serviço prestado pela AKKA/LAA: (i) a capacidade e a disponibilidade dos clientes da AKKA/LAA para pagarem o serviço recebido; e (ii) o benefício económico que os clientes da AKKA/LAA podem retirar desse serviço quando, por seu turno, fornecem produtos ou prestam serviços aos seus próprios clientes.

64.      Porém, compete ao órgão jurisdicional de reenvio verificar se as alegadas semelhanças entre a Letónia, por um lado, e a Lituânia e a Estónia, por outro, são reais e verdadeiramente relevantes para a análise efetuada pelo Conselho da Concorrência.

65.      É também importante que esse órgão jurisdicional se certifique de que nenhum outro Estado‑Membro, apesar de não ser um país vizinho (36), preenche os critérios adotados pelo Conselho da Concorrência. Por outras palavras, conforme sustentou o Governo alemão, o Augstākā tiesa (Supremo Tribunal) deve igualmente certificar‑se de que o Conselho da Concorrência não excluiu países de forma arbitrária ou, pior ainda, pelo facto de os respetivos dados não «encaixarem» na sua tese.

66.      A esse propósito, o órgão jurisdicional de reenvio refere, na sua decisão, que o Conselho da Concorrência também tomou em consideração, a título exemplificativo, as tarifas aplicadas noutros Estados‑Membros (tanto individualmente como para calcular a média da UE), tendo em conta o índice PPP baseado no produto interno bruto. Os resultados dessa análise parecem confirmar as conclusões resultantes do exame dos mercados da Lituânia e da Estónia.

67.      Esse «alargamento» do grupo de países com o qual o mercado letão foi comparado é extremamente importante. A comparação com apenas dois países (por maior que seja a homogeneidade existente entre estes e a Letónia) poderia não produzir resultados fidedignos. Com efeito, tal como salienta a AKKA/LAA, qualquer fator atípico presente em qualquer um destes mercados teria um efeito particularmente significativo sobre os cálculos da autoridade da concorrência. No meu entender, a amostra de países selecionados para efeitos de comparação deve ser tão ampla quanto possível (37).

68.      No entanto, importa ter em conta qualquer diferença relevante entre o Estado‑Membro em causa e os outros Estados‑Membros selecionados para efeitos de comparação. Conforme supramencionado, o Tribunal de Justiça já deixou bem claro que a comparação entre países é admissível se for efetuada numa base homogénea. O órgão jurisdicional de reenvio deve, portanto, verificar se foram introduzidos os ajustamentos necessários para ter em conta as diferenças existentes entre os diferentes países.

c)      Suficiência do método

69.      Por último, a fim de responder ao órgão jurisdicional de reenvio, falta analisar a questão da suficiência do método de comparação geográfica utilizado pelo Conselho da Concorrência para efeitos de determinação do preço de referência.

70.      Mais uma vez, esta é uma questão cuja apreciação compete, em princípio, ao órgão jurisdicional nacional. No entanto, para lhe proporcionar alguma orientação, gostaria de observar o seguinte.

71.      O órgão jurisdicional de reenvio deve verificar, antes de mais, se, juntamente com a comparação geográfica, poderiam ter sido utilizados outros métodos de determinação do preço de referência. Sem prejuízo da verificação a efetuar pelo órgão jurisdicional nacional, tenho a sensação de que, provavelmente, determinados métodos não estavam disponíveis ou não eram adequados.

72.      Primeiro, afigura‑se impossível realizar uma análise custo‑preço na situação objeto da decisão impugnada (qual é o custo da composição de uma obra musical?) (38).

73.      Neste contexto, porém, refira‑se que o Governo neerlandês sugere um tipo diferente de análise, que se centra antes na remuneração que, em virtude das tarifas aplicadas pela AKKA/LAA, os autores das obras licenciadas efetivamente recebem. Na realidade, algumas diretivas da UE contêm disposições que respeitam precisamente à remuneração que os titulares de direitos de autor deverão receber pela exploração das suas obras.

74.      O artigo 8.°, n.° 2, da Diretiva 92/100/CEE (39), por exemplo, dispõe que os utilizadores que usem fonogramas publicados com fins comerciais ou suas reproduções em emissões radiodifundidas por ondas radioelétricas ou em qualquer tipo de comunicações ao público deverão pagar aos titulares dos direitos uma «remuneração equitativa». O Tribunal de Justiça entendeu que o conceito de «remuneração equitativa» deve ser interpretado de modo a permitir atingir «um equilíbrio adequado entre o interesse dos artistas intérpretes ou executantes e dos produtores de fonogramas em receber uma remuneração pela radiodifusão de um fonograma determinado e o interesse de terceiros em poder radiodifundir esse fonograma em condições razoáveis». O Tribunal de Justiça referiu ainda que o caráter equitativo da remuneração deve ser «analisado à luz do valor dessa utilização nas trocas económicas» (40).

75.      Acresce que o artigo 16.°, n.° 2, da Diretiva 2014/26/UE (41), que tem por objeto a concessão de licenças pelas organizações de gestão coletiva, estabelece que «[o]s titulares de direitos devem receber uma remuneração adequada pela utilização dos seus direitos». (42)102.° TFUE.

76.      A abordagem do Governo neerlandês afigura‑se cativante: se preços não equitativos são aqueles que exploram excessivamente os clientes em benefício das empresas dominantes, então, logicamente, as tarifas que não reflitam um equilíbrio equitativo entre os interesses dos titulares dos direitos e os dos clientes poderão ser incompatíveis com o artigo 102.° TFUE. A posição adotada pelo Tribunal de Justiça no acórdão Kanal 5 parece corroborar, em alguma medida, aquela abordagem (43).

77.      Não obstante, tenho dúvidas de que exista uma coincidência exata entre os quadros jurídicos estabelecidos pelas Diretivas 92/100 e 2014/26, por um lado, e o artigo 102.° TFUE, por outro: prosseguem objetivos diferentes e obedecem a uma lógica diferente. As diretivas visam, inter alia, assegurar que autores e intérpretes recebam uma remuneração adequada na perspetiva da continuação do seu trabalho criativo e artístico (44). Em contrapartida, o artigo 102.° TFUE visa assegurar que as empresas em posição dominante (incluindo as entidades de gestão coletiva) não abusem do seu poder de mercado.

78.      De qualquer modo, não estou certo de que conceitos como «remuneração equitativa» ou «remuneração adequada» revistam grande utilidade para uma autoridade da concorrência. Afiguram‑se‑me tão vagos quantos os conceitos de «preços excessivos» ou «preços não equitativos».

79.      Segundo, uma vez que a AKKA/LAA detém um monopólio legal, não existem na Letónia empresas concorrentes que ofereçam serviços semelhantes, suscetíveis de serem utilizados para efeitos de comparação. Acresce que a atividade da AKKA/LAA se circunscreve ao território letão. No que respeita à comparação entre as tarifas praticadas pela AKKA/LAA ao longo do tempo, não é certo que pudesse ter fornecido pontos de referência úteis, uma que o Conselho da Concorrência tinha já concluído que as tarifas anteriormente aplicadas eram excessivamente elevadas.

80.      No entanto, compete ao órgão jurisdicional de reenvio determinar se, em teoria, poderiam ter sido utilizados outros métodos adequados de determinação do preço de referência, em combinação com a comparação entre diferentes Estados‑Membros. Compete igualmente ao órgão jurisdicional de reenvio verificar se os valores das tarifas de referência resultantes dos cálculos efetuados pelo Conselho da Concorrência são corroborados por indicadores adicionais.

3.      Resposta à segunda questão

81.      Pelo exposto, proponho que o Tribunal de Justiça responda à segunda questão nos seguintes termos: numa situação como a do processo principal, é, em princípio, adequado efetuar uma comparação entre as tarifas praticadas no mercado em causa e as tarifas praticadas noutros mercados. Porém, compete ao órgão jurisdicional nacional determinar, à luz de todas as circunstâncias relevantes, se essa comparação foi, por um lado, efetuada corretamente e, por outro, se é suficiente.

D.      Quanto à terceira questão

82.      Com a sua terceira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se é adequado e suficiente utilizar o índice PPC na comparação das tarifas cobradas por diferentes entidades de gestão coletiva.

83.      O órgão jurisdicional de reenvio explica que, na comparação das tarifas aplicadas pela AKKA/LAA na Letónia com as aplicadas em 19 outros Estados‑Membros (ou seja, os outros Estados‑Membros, exceto os países vizinhos), o Conselho da Concorrência utilizou o índice PPC para «corrigir» essas tarifas.

84.      Antes de mais, recordo novamente que, nos acórdãos Tournier e Lucazeau, o Tribunal de Justiça declarou que é possível recorrer a uma comparação geográfica das tarifas, desde que a mesma seja efetuada «numa base homogénea» (45). Para mim, a homogeneidade de uma comparação exige não apenas que os produtos e serviços em questão sejam idênticos ou muito semelhantes, mas também que o contexto económico em que esses produtos são fornecidos e esses serviços prestados seja, de um modo geral, semelhante.

85.      Porém, é indiscutível que, dentro da União, existem diferenças significativas nos níveis dos preços, o que significa que, nos vários países, os cidadãos pagam preços diferentes pelos mesmos bens ou serviços. Até mesmo em países com a mesma moeda poderão existir diferenças no poder de compra dos consumidores.

86.      É por esse motivo que, em conformidade com os argumentos aduzidos pelos Governos alemão, espanhol, letão e neerlandês, também eu considero que o índice PPC pode ser um instrumento útil para assegurar que a comparação das tarifas aplicadas pela prestação do mesmo serviço em países diferentes é efetuada numa base homogénea.

87.      Com efeito, o índice PPC é frequentemente utilizado nos estudos económicos (nomeadamente por organismos como o Eurostat, a OCDE e o Banco Mundial) quando é necessário comparar, por exemplo, o nível de vida entre vários países. Para tal, são aplicadas taxas de conversão cambial PPC com vista a converter indicadores económicos expressos na moeda nacional para uma unidade monetária comum artificial designada «paridade do poder de compra padrão» (Purchasing Power Standard — PPS), que elimina as diferenças no poder de compra de diferentes moedas nacionais e permite que sejam efetuadas comparações úteis entre países. Assim, essas operações permitem o ajustamento dos dados a comparar, em conformidade com os diferentes níveis de preços existentes nos vários países.

88.      A AKKA/LAA e a Comissão, porém, entendem que esse instrumento só poderia ser útil em relação à parte das tarifas que a entidade de gestão coletiva retém, e não em relação à parte das tarifas que corresponde à remuneração dos titulares dos direitos de autor.

89.      Não subscrevo esse entendimento.

90.      Não são apenas os custos da entidade de gestão coletiva que são afetados pela situação económica do país em que esta atua. A capacidade e, em certa medida, a disposição para pagar demonstrada pelos clientes da entidade de gestão coletiva (no presente caso, as lojas) e, por seu turno, pelos clientes destes (no presente caso, os clientes das lojas) também são influenciadas pelo nível de vida e pelo poder de compra dos cidadãos. Dito de uma forma muito simples: se 1 euro num país não corresponder a 1 euro noutro país, essa afirmação é válida independentemente de o dinheiro ser utilizado para financiar os custos da entidade de gestão coletiva ou para remunerar os autores. Em última análise, se o principal objetivo da análise for a identificação do valor económico de uma determinada operação, essa apreciação não pode ser feita in abstracto: tem de tomar necessariamente em consideração o contexto económico e financeiro dessa operação.

91.      O recurso à PPC poderá, assim, revelar‑se um instrumento útil para analisar, na totalidade, as tarifas aplicadas por uma entidade de gestão coletiva. Não há necessidade de distinguir entre as diferentes componentes dessas tarifas.

92.      Nessa conformidade, concluo que, se uma autoridade realizar uma comparação geográfica das tarifas aplicadas por várias entidades de gestão coletiva, importa ter em conta a diferente situação económica dos países em que essas entidades de gestão coletiva atuam. Considero que o recurso ao índice PPC é um instrumento adequado para aquele fim.

93.      Porém, para que esse instrumento seja suficiente, devem ser igualmente tidos em conta os outros fatores suscetíveis de afetar o preço final de um produto ou serviço num determinado país. Com efeito, poderão existir outros fatores (incluindo de natureza não macroeconómica) suscetíveis de afetar a estrutura da procura num país. Em especial, num caso como o do processo principal, creio que é fundamental determinar se e em que medida a atividade comercial dos clientes das entidades de gestão coletiva (por exemplo, lojas) num dado país aumenta em virtude da reprodução pública de obras musicais nos seus estabelecimentos.

94.      Em qualquer caso, esses são fatores que também poderão ser examinados no segundo passo da análise jurídica descrita na jurisprudência do Tribunal de Justiça. Assim, abordarei essa matéria no âmbito da análise da sexta questão prejudicial.

95.      À luz do exposto, a resposta à terceira questão prejudicial deverá ser a de que o recurso ao índice PPC poderá ser adequado no contexto da comparação das tarifas cobradas por diferentes entidades de gestão coletiva. Para que esse instrumento seja suficiente, devem ser igualmente tidos em conta os outros fatores suscetíveis de afetar o preço final de um produto ou serviço num determinado país.

E.      Quanto à quarta questão

96.      Com a sua quarta questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se, numa situação como a do processo principal, a comparação das tarifas cobradas por diferentes entidades de gestão coletiva deve ser efetuada em relação a cada um dos diferentes setores do mercado ou relativamente ao nível médio das mesmas.

97.      A resposta a esta questão é, no meu entender, muito simples.

98.      Para determinar se o comportamento de uma ou mais empresas viola o disposto nos artigos 101.° ou 102.° TFUE, é necessário ter por referência o mercado relevante.

99.      Assim, partindo do princípio de que cada setor do mercado (definido como uma categoria de utilizadores determinada com base na superfície comercial) é um mercado relevante para efeitos do artigo 102.° TFUE — facto que compete ao órgão jurisdicional de reenvio apurar — a comparação das tarifas cobradas pelas diferentes entidades de gestão coletiva deve ser efetuada em relação a cada um dos diferentes setores do mercado.

F.      Quanto à quinta questão

100. Com a sua quinta questão, o órgão jurisdicional de reenvio pede orientações sobre as circunstâncias em que uma diferença no preço pode ser considerada excessiva para efeitos do artigo 102.°, segundo parágrafo, alínea a), TFUE.

101. Comecemos por recordar a justificação económica da figura do abuso de posição dominante através da imposição de preços não equitativos: quando uma empresa em posição dominante impõe preços superiores ao nível concorrencial, verifica‑se uma repartição ineficiente dos recursos e a diminuição do bem‑estar dos consumidores (uma parte do bem‑estar é transferido para a empresa dominante, enquanto outra parte pura e simplesmente se perde). Nestes termos, de um ponto de vista teórico, qualquer desvio ao preço concorrencial num mercado regulamentado poderá justificar a intervenção das autoridades da concorrência. Com efeito, qualquer diferença entre o preço de referência e o preço efetivamente cobrado implica uma certa redução do bem‑estar dos consumidores que não se teria verificado numa situação de concorrência no mercado.

102. Porém, da perspetiva da autoridade da concorrência, essa abordagem não seria nem realista nem aconselhável.

103. Em primeiro lugar, conforme explicado nos n.os 36 a 42, supra, o cálculo de um preço de referência é um exercício bastante complexo e caracterizado por alguma incerteza. Se uma autoridade da concorrência interviesse sempre que existisse uma diferença (por mais pequena que fosse) entre esse dois preços, o risco de falsos positivos seria simplesmente demasiado elevado. O problema não reside apenas na possibilidade de imposição de uma coima avultada à empresa responsável, mas também no risco de proibição de uma conduta neutra (ou possivelmente pró‑concorrencial). A esse propósito, muitos autores defendem que os erros de tipo I nas decisões das autoridades da concorrência sobre uma conduta unilateral implicam um custo muito maior para a sociedade do que os erros de tipo II: «o sistema económico corrige mais facilmente monopólios do que erros judiciais […]. Uma prática que tenha sido condenada, dificilmente será reabilitada, independentemente dos seus benefícios. Em contrapartida, uma prática monopolista acabará por ceder à concorrência, uma vez que os elevados preços monopolistas atrairão rivais (46).»

104. Em segundo lugar, em virtude dessas dificuldades e incertezas, importa também reconhecer que, em muitos casos, poderá ser difícil para uma empresa dominante calcular antecipadamente, com um grau suficiente de probabilidade, onde se situa a linha que separa um preço concorrencial legítimo de um preço excessivo proibido. Assim, por motivos de segurança jurídica, essa linha não se poderá situar demasiadamente próximo do preço de referência.

105. Em terceiro lugar, uma abordagem rigorosa exigiria essencialmente que as autoridades da concorrência assumissem o papel de reguladores de preços, encarregados de vigiar continuamente e intervir em (potencialmente todos os) mercados regulamentados. É evidente que, ao contrário das autoridades setoriais, as autoridades da concorrência não possuem nem os recursos nem os conhecimentos técnicos para desempenhar esse papel (47). Acresce que, em certos casos, a diminuição do bem‑estar dos consumidores poderá ser insignificante e não justificar uma complexa intervenção das autoridades públicas, que consumiria muito tempo e dinheiro. Com efeito, a reação dos consumidores a um aumento dos preços varia consideravelmente de um mercado para o outro, e nem mesmo uma empresa monopolista pode fixar preços independentemente dos seus clientes (48). Consequentemente, a extensão do prejuízo causado ao bem‑estar dos consumidores por preços elevados poderá variar.

106. É por esse motivo que — em conformidade com a abordagem adotada pelos órgãos jurisdicionais e pelas autoridades competentes tanto ao nível da União como dos Estados‑Membros, e tal como sugerido por alguns economistas — considero que um preço só poderá ser qualificado como excessivo à luz do artigo 102.° TFUE se estiverem preenchidas duas condições cumulativas: deve ser significativamente e persistentemente superior ao preço de referência.

107. Quanto ao primeiro aspeto, sublinhe‑se que nem todas as diferenças de preço devem ser consideradas relevantes para efeitos do artigo 102.° TFUE, mas apenas os desvios importantes. Essa abordagem foi expressamente perfilhada pelo Tribunal de Justiça, por exemplo, nos acórdãos Tournier e Lucazeau, nos quais fez referência a tabelas «sensivelmente mais elevadas» do que aquelas com que estavam a ser comparadas. Esse entendimento também é perfilhado por muitos economistas (49).

108. Quanto ao segundo aspeto, o facto de o preço de um dado produto ou serviço ser esporadicamente superior ao preço de referência é, no meu entender, pouco relevante. A existência de períodos de preços elevados a par de períodos de preços baixos é considerada pelos economistas como sendo «consistente com um mercado concorrencial bem oleado» (50). Assim, considero pouco provável que um preço que oscila constantemente e que só ocasionalmente ultrapassa os níveis concorrenciais suscite sérias preocupações em matéria de concorrência. Um preço só será abusivo à luz do artigo 102.° TFUE se permanecer (ou estiver frequentemente) acima do preço de referência por um período de tempo considerável. Essa abordagem encontra apoio no acórdão General Motors (51).

109. Em face de todas estas considerações, impõe‑se a seguinte pergunta: quão significativa e quão persistente deve ser essa diferença para justificar uma intervenção nos termos do artigo 102.° TFUE?

110. Esta não é, de modo algum, uma pergunta de resposta fácil. A jurisprudência do Tribunal de Justiça não fornece orientações muito precisas sobre esta questão. Tão‑pouco é possível identificar padrões claros na prática adotada pelas autoridades nacionais ou na literatura económica (52).

111. Esse facto não é, de modo algum, surpreendente. Efetivamente, como alegam o Governo alemão e a Comissão, é impossível fixar, a priori e in abstracto, limites precisos que sejam aplicáveis a todas as circunstâncias. Uma dada diferença de preço poderá ser mais ou menos significativa à luz do artigo 102.° TFUE, consoante o produto ou serviço em questão e as características do mercado.

112. Sobre este ponto, acrescentaria apenas duas observações. Por um lado, uma autoridade só deverá intervir ao abrigo do artigo 102.° TFUE se tiver a certeza de que, não obstante os limites e as incertezas que rodeiam o cálculo do preço de referência, a diferença entre esse preço e o preço efetivamente cobrado é tal que poucas dúvidas restam quanto ao caráter abusivo deste último. Por outro lado, quanto mais significativa for a diferença entre o preço de referência e o preço efetivamente cobrado, e quanto mais longo for o período durante o qual esse preço elevado é aplicado, mais fácil será para a autoridade cumprir o ónus da prova que sobre ela recai (53).

113. Consequentemente, a resposta à quinta questão deverá ser a seguinte: apenas poderão ser considerados incompatíveis com o disposto no artigo 102.° TFUE os preços que forem significativamente e persistentemente superiores ao preço de referência.

G.      Quanto à sexta questão

114. Com a sua sexta questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta de que modo uma entidade de gestão coletiva pode fazer prova do caráter equitativo das tarifas cobradas.

115. No essencial, esta questão convida o Tribunal de Justiça a explicar melhor o segundo passo da análise jurídica exigida pelo artigo 102.°, segundo parágrafo, alínea a), TFUE.

116. Conforme referido anteriormente, o facto de existir uma diferença (ainda que substancial) entre o preço de referência e o preço efetivamente cobrado não é suficiente para que esse preço seja automaticamente considerado não equitativo à luz do artigo 102.° TFUE ou, em qualquer caso, para justificar uma intervenção ao abrigo dessa disposição.

117. Normalmente, os preços elevados não são per se abusivos. Pelo contrário, desempenham uma função importante no processo concorrencial. Tal como referiu a Supreme Court dos EUA no processo Trinko, «a mera prática de preços monopolistas não só não é ilegal como é também um elemento importante do sistema de mercado livre. É a oportunidade de cobrar preços monopolistas (pelo menos durante um curto espaço de tempo) que atrai, antes de mais, as pessoas com um grande sentido de negócio; conduz a uma assunção de riscos que produz inovação e crescimento económico. Para salvaguardar o incentivo à inovação, a detenção de poder de monopólio só será considerada ilegal se for acompanhada por um elemento de comportamento anticoncorrencial» (54).

118. Assim, o segundo passo da análise deve centrar‑se no comportamento da empresa dominante e na sua motivação económica. Em especial, as razões objetivas subjacentes à sua política de preços são extremamente relevantes.

119. No acórdão United Brands, bem como em jurisprudência posterior, o Tribunal de Justiça precisou que um preço pode ser não equitativo «seja em si mesmo, seja em comparação com os produtos concorrentes» (55).

120. Qual a lógica subjacente a estas condições alternativas (56)?

1.      Preço não equitativo em si mesmo

121. A primeira destas duas condições (preço não equitativo em si mesmo) visa os casos em que é possível determinar o caráter não equitativo de um preço sem necessidade de recorrer a comparações com produtos semelhantes ou concorrentes. O abuso está patente no próprio facto de o preço ser particularmente elevado.

122. É o caso, por exemplo, de preços que são cobrados a clientes que, porém, não recebem um produto ou serviço em troca. Por exemplo, no acórdão Merci Convenzionali Porto di Genova, o Tribunal de Justiça considerou incompatível com o (atual) artigo 102.° TFUE uma regulamentação nacional que induzia uma empresa à qual tinham sido concedidos direitos especiais a, inter alia, exigir o pagamento de serviços não solicitados (57). Do mesmo modo, no acórdão Grüne Punkt, o Tribunal de Justiça confirmou uma decisão da Comissão, na qual esta tinha concluído que o poder de uma empresa dominante de exigir aos seus co‑contratantes o pagamento de serviços que não tinha prestado violava o (atual) artigo 102.° TFUE (58).

123. Outro exemplo são as situações em que uma empresa dominante fixa um preço particularmente elevado porque, na realidade, não está interessada em vender o produto ou serviço em questão, mas sim em prosseguir um objetivo diferente, anticoncorrencial. É essa a situação que está em causa nos processos General Motors e British Leyland (59). Nesses processos, as empresas em posição dominante (fabricantes de veículos automóveis) tinham fixado preços muito elevados pela realização de inspeções técnicas e pela emissão de certificados de conformidade. Conforme explicou o Tribunal de Justiça nos seus acórdãos, essa decisão tinha por objetivo restringir importações paralelas para o Reino Unido, neutralizando os níveis de preços mais favoráveis aplicados noutras regiões da então Comunidade. Era óbvio que não existia qualquer relação razoável entre os preços cobrados pelos fabricantes e a quantidade e qualidade dos serviços prestados aos importadores.

2.      Preço não equitativo quando comparado com produtos concorrentes

124. A segunda destas condições (preço não equitativo quando comparado com produtos concorrentes) é, muitas vezes, uma espécie de «validação» da apreciação efetuada relativamente ao preço de referência: poderão existir fatores relevantes que tenham passado despercebidos naquele contexto ou que tenham sido deliberadamente ignorados por não serem facilmente quantificáveis em termos financeiros.

125. Com efeito, poderão existir várias razões (possivelmente legítimas) para que uma empresa decida cobrar por um produto ou serviço um preço superior ao que foi calculado pela autoridade como sendo o preço concorrencial (hipotético). Isso significa que, mesmo numa situação de concorrência no mercado, o preço praticado pela empresa dominante poderá talvez não corresponder ao preço de referência devido ao facto de os seus produtos ou serviços terem um valor económico mais elevado.

126. As razões subjacentes à imposição de um preço mais elevado podem estar relacionadas, em especial, com a produção e a comercialização do produto ou serviço em questão, mas também podem respeitar à procura desse produto ou serviço por parte dos clientes.

127. Quanto ao primeiro aspeto, devo salientar que os custos suportados por uma empresa dominante com a produção e a comercialização do produto ou serviço em questão poderão ser superiores aos incorridos por outras empresas que não são dominantes ou que atuam noutros mercados de produtos ou noutros mercados geográficos. A autoridade deve ter em consideração não apenas os custos de produção diretos e indiretos do produto ou serviço em questão e o custo do capital, mas também todo o tipo de despesas gerais (incluindo, por exemplo, publicidade, investigação e desenvolvimento, etc.) (60). Embora uma empresa dominante não possa simplesmente invocar uma estrutura de custos pouco eficiente ou rentável para justificar a prática de preços mais elevados (61), os custos efetivamente incorridos por essa empresa assumem obviamente uma importância fundamental naquele contexto. Certos tipos de custos incorridos por uma dada empresa poderão não ser imediatamente evidentes ou facilmente imputáveis ao fornecimento de um determinado produto ou serviço (por exemplo, projetos de investigação e desenvolvimento frustrados) (62), mas, não obstante, não poderão ser ignorados. Qualquer outra abordagem acarretaria um grave risco de desencorajar o investimento e a inovação.

128. Quanto ao segundo aspeto, há que ter em conta que o valor económico dos bens fornecidos ou dos serviços prestados por uma empresa dominante poderá, aos olhos dos clientes, ser superior ao preço de referência. Mais uma vez, poderão existir várias razões para esse facto: por exemplo, os bens ou serviços em questão poderão ser de qualidade superior (ou ser meramente vistos como tal, possivelmente por motivos relacionados com os custos de investimento em publicidade e em promoção da marca). Algumas características do produto ou serviço poderão revestir um valor especial para os clientes (ou para certos grupos de clientes), apesar de não se refletirem no lado dos custos. Nesses casos, os benefícios ou vantagens adicionais proporcionados aos clientes justificam uma majoração superior do preço em relação aos custos (63). Neste contexto, chamo a atenção para o facto de que a prática da Comissão parece seguir essa abordagem (64).

129. No entanto, importa acrescentar que, no que respeita à situação no processo principal, afigura‑se que a questão fundamental é a seguinte: a procura de licenças por parte dos clientes da AKKA/LAA, tais como lojas e outras empresas semelhantes, é uma função direta dos benefícios económicos que estes podem retirar dessas licenças. Consequentemente, as tarifas mais elevadas aplicadas na Letónia poderiam ser consideradas justificadas caso se provasse que os clientes da AKKA/LAA retiram mais benefícios da reprodução de obras musicais do que o mesmo tipo de clientes noutros países. Por exemplo, não é possível excluir a hipótese de que, por força de hábitos de compras e tradições culturais diferentes, a execução pública de obras musicais nas instalações das lojas e de outros estabelecimentos comerciais traga maiores benefícios em termos de vendas em alguns países do que em outros. Nesses casos, o valor económico das licenças concedidas pela entidade de gestão coletiva seria naturalmente mais elevado nos primeiros países.

130. Reconheço que nem sempre será fácil investigar este aspeto. É por esse motivo que, muitas vezes, são utilizados outros indicadores (como o poder de compra dos cidadãos e o produto interno bruto dos países) para determinar se, e em que medida, dois ou mais países são comparáveis do ponto de vista da situação económica.

131. Em conclusão, um preço elevado aplicado por uma empresa dominante só poderá ser qualificado como abusivo à luz do artigo 102.° TFUE nos casos em que não seja possível identificar qualquer explicação económica racional (além da mera capacidade e disposição para explorar o poder de mercado, ainda que de forma abusiva) para esse preço.

3.      Ónus da prova

132. Antes de concluir a minha apreciação sobre esta matéria, há um último ponto que merece alguma atenção. A análise em dois passos descrita na jurisprudência do Tribunal de Justiça no que respeita a violações do artigo 102.°, segundo parágrafo, alínea a), TFUE também comporta um aspeto processual.

133. Com efeito, conforme mencionado no n.° 23, supra, o Tribunal de Justiça tem declarado reiteradamente que, uma vez determinado que um preço é superior ao preço de referência, «[c]abe […] à empresa em questão justificar a diferença, baseando‑se nas divergências objetivas» entre os produtos ou serviços comparados (65).

134. Essa declaração do Tribunal de Justiça deve, no meu entender, ser lida no contexto de uma linha jurisprudencial bem consolidada, segundo a qual, embora recaia sobre a autoridade o ónus de provar o preenchimento de todas as condições necessárias à constatação de uma violação do artigo 102.° TFUE (66), deve ser dada às empresas dominantes a possibilidade de demonstrarem que existe uma justificação objetiva para o seu comportamento (67).

135. Assim, se uma autoridade tiver registado uma diferença significativa entre o preço efetivamente cobrado e o preço de referência, cabe à empresa dominante em questão fornecer a essa autoridade possíveis justificações para o preço (efetiva ou aparentemente) mais elevado.

136. Esta abordagem afigura‑se razoável: a autoridade responsável pela investigação nem sempre dispõe das informações necessárias para determinar se, na realidade, um preço aparentemente superior ao preço concorrencial não reflete meramente o valor mais elevado da operação subjacente. Essas informações poderão respeitar, inter alia, à estrutura de custos da empresa dominante, às suas políticas de preços, à estrutura da procura no mercado relevante, etc.

137. Antes de tomar uma decisão sobre o caráter equitativo ou não equitativo do preço, a autoridade deve realizar um exame minucioso e imparcial dos fatores indicados pela empresa em questão.

138. No presente caso, isso significa que, antes de mais, competia ao Conselho da Concorrência fazer a prova do preenchimento dos requisitos legais, no sentido de que as tarifas aplicadas pela AKKA/LAA eram significativamente superiores ao preço concorrencial. Para tal, essa autoridade estava obrigada a ter em conta, durante uma investigação objetiva e exaustiva, todos os factos relevantes para determinar o preço de referência correto.

139. Caberia então à AKKA/LAA demonstrar o caráter equitativo das tarifas aplicadas, apesar de serem superiores ao preço de referência calculado pelo Conselho da Concorrência. A AKKA/LAA poderia, por exemplo, invocar fatores relevantes que o Conselho da Concorrência tivesse erroneamente ignorado ao calcular o preço de referência; ou, em qualquer caso, demonstrar que o valor económico do serviço prestado aos seus clientes era superior ao do serviço prestado por organismos semelhantes noutros Estados‑Membros.

140. Em conclusão, proponho responder à sexta questão no sentido de que uma empresa dominante pode fazer prova do caráter equitativo dos preços praticados com fundamento, em especial, em custos de produção e de comercialização mais elevados ou, em termos mais gerais, no valor económico mais elevado do produto fornecido ou do serviço prestado.

H.      Quanto à sétima questão

141. Com a sua sétima questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se, para efeitos de determinação da coima a aplicar a uma entidade de gestão coletiva por violação das regras de concorrência da UE, a remuneração paga aos autores deve ser excluída do volume de negócios dessa entidade.

142. Nesta matéria, concordo com o Governo espanhol e a Comissão: não vislumbro qualquer motivo para excluir a remuneração paga aos autores do volume de negócios que é utilizado como base do cálculo da coima imposta por uma entidade de gestão coletiva.

143. Em vários acórdãos, e mais recentemente no acórdão OSA (68), o Tribunal de Justiça afirmou que as entidades de gestão coletiva devem ser consideradas empresas para efeitos das regras da concorrência da UE. Para essas empresas, o «volume de negócios total» — que é referido, inter alia, no artigo 23.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1/2003 e nas Orientações da Comissão (69) — inclui a parte das tarifas que corresponde à remuneração dos autores. É irrelevante que essa parte seja subsequentemente paga aos autores. Nesse sentido, a remuneração paga aos autores poderia ser considerada um «custo» para a entidade de gestão coletiva.

144. Com efeito, caso se considerasse que o volume de negócios relevante se restringia à parte das receitas que a entidade de gestão coletiva está autorizada a reter, o montante da coima seria relativamente baixo. Isso poderia suscitar dúvidas quanto ao caráter dissuasor da coima, à sua proporcionalidade à luz do prejuízo causado aos consumidores e ao seu caráter equitativo quando comparada com as coimas impostas a outras empresas que tivessem cometido violações semelhantes das regras de concorrência da UE.

IV.    Conclusão

145. Concluindo, proponho que o Tribunal de Justiça responda às questões submetidas, a título prejudicial, pelo Augstākā tiesa nos seguintes termos:

–        o comportamento de uma entidade de gestão coletiva que também está encarregada de cobrar remunerações pelas obras de autores estrangeiros é suscetível de afetar o comércio entre Estados‑Membros para efeitos do artigo 102.° TFUE;

–        numa situação como a do processo principal, é, em princípio, adequado efetuar uma comparação entre as tarifas praticadas no mercado em causa e as tarifas praticadas noutros mercados; porém, compete ao órgão jurisdicional nacional determinar, à luz de todas as circunstâncias relevantes, se a comparação foi, por um lado, efetuada corretamente e, por outro, se é suficiente;

–        na comparação das tarifas cobradas por diferentes entidades de gestão coletiva, poderá ser adequado utilizar o índice da paridade do poder de compra baseado no produto interno bruto; para que esse instrumento seja suficiente, devem ser igualmente tidos em conta os outros fatores suscetíveis de afetar o preço final de um produto ou serviço num determinado país;

–        deve ser efetuada a comparação das tarifas cobradas por diferentes entidades de gestão coletiva para cada mercado relevante;

–        apenas poderão ser considerados excessivos os preços que forem significativamente e persistentemente superiores ao preço de referência;

–        uma empresa dominante pode fazer prova do caráter equitativo dos preços praticados com fundamento, em especial, em custos de produção e de comercialização mais elevados ou, em termos mais gerais, no valor económico mais elevado do produto fornecido ou do serviço prestado;

–        para efeitos de determinação da coima a aplicar a uma entidade de gestão coletiva por violação das regras de concorrência da UE, a remuneração paga aos autores não deve ser excluída do volume de negócios dessa entidade.


1      Língua original: inglês.


2      Acórdão de 14 de fevereiro de 1978, United Brands e United Brands Continentaal/Comissão, 27/76, EU:C:1978:22 (a seguir «acórdão United Brands»).


3      V., por exemplo, acórdão de 17 de julho de 1997, GT‑Link, C‑242/95, EU:C:1997:376, n.° 39.


4      V., por exemplo, acórdão de 5 de outubro de 1994, Centre d'insémination de la Crespelle, C‑323/93, EU:C:1994:368, n.os 19 e 21.


5      V., nesse sentido, acórdão United Brands, n.° 249.


6      Acórdão United Brands, n.° 253.


7      V., em especial, acórdão United Brands, n.° 251.


8      V., nesse sentido, acórdão de 11 de abril de 1989, Saeed Flugreisen e Silver Line Reisebüro, 66/86, EU:C:1989:140, n.° 43.


9      V., por exemplo, Motta, M., de Streel, A., «Excessive Pricing in Competition Law: Never say Never?», The Pros and Cons of High Prices, Konkurrensverket (Autoridade da Concorrência sueca), Kalmar, 2007, p. 33.


10      V., inter alia, acórdãos de 29 de fevereiro de 1968, Parke, Davis and Co., 24/67, EU:C:1968:11, e de 5 de outubro de 1988, CIRCA e Maxicar, 53/87, EU:C:1988:472.


11      V. acórdãos de 13 de novembro de 1975, General Motors Continental/Comissão, 26/75, EU:C:1975:150, e de 11 de novembro de 1986, British Leyland/Comissão, 226/84, EU:C:1986:421.


12      Ibid.


13      V. acórdãos de 8 de junho de 1971, Deutsche Grammophon Gesellschaft, 78/70, EU:C:1971:59, e de 4 de maio de 1988, Bodson, 30/87, EU:C:1988:225.


14      V., nesse sentido, Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico, Mesas redondas sobre a política da concorrência, «Excessive Prices», 2012 (DAF/COMP(2011)18) (a seguir «relatório da OCDE»), p. 70.


15      Acórdão United Brands, n.os 249 a 253. V., também, despacho de 25 de março de 2009, Scippacercola e Terezakis/Comissão, C‑159/08 P, não publicado, EU:C:2009:188, n.° 47.


16      V. acórdãos de 13 de julho de 1989, Tournier, 395/87, EU:C:1989:319 (a seguir «acórdão Tournier»), n.° 38, e de 13 de julho de 1989, Lucazeau e o., 110/88, 241/88 e 242/88, EU:C:1989:326 (a seguir «acórdão Lucazeau»), n.° 25.


17      V. acórdão de 25 de janeiro de 2007, Dalmine/Comissão, C‑407/04 P, EU:C:2007:53, n.os 89 e 90 e jurisprudência aí referida.


18      V. acórdão de 1 de julho de 2008, MOTOE, C‑49/07, EU:C:2008:376, n.° 42.


19      V., por exemplo, acórdãos Tournier e Lucazeau. V. também acórdãos de 25 de outubro de 1979, Greenwich Film Production, 22/79, EU:C:1979:245, n.os 11 a 13, e de 2 de março de 1983, GVL/Comissão, 7/82, EU:C:1983:52, n.os 37 a 39.


20      V., em especial, acórdão do Tribunal Geral de 12 de abril de 2013, Autortiesību un komunicēšanās konsultāciju aģentūra/Latvijas Autoru apvienība/Comissão, T‑414/08, não publicado, EU:T:2013:174.


21      Decisão da Comissão C(2008) 3435 final, de 16 de julho de 2008, relativa a um procedimento de aplicação do artigo 81.° [CE] e do artigo 53.° do Acordo EEE (processo COMP/C2/38.698 — CISAC).


22      Abordei algumas dessas questões em Wahl, N., «Exploitative high prices and European competition law — a personal reflection», Konkurrensverket, nota 9, supra, pp. 71 e 72.


23      V. Edwards, J., Kay, J., Mayer, C., The Economic Analysis of Accounting Profitability, Clarendon Press, 1987.


24      V., por exemplo, O’Donoghue, R., Padilla, A. J., The Law and Economics of Article 82 EC, 2.a ed., Hart Publishing, 2013, p. 617.


25      V. relatório da OCDE, pp. 10 e 26 a 28.


26      Obviamente, poderão existir outros, mas não foram discutidos no presente processo e, como tal, não os analisarei nas presentes conclusões.


27      Essa abordagem foi também validada pelo Competition Appeal Tribunal do Reino Unido em sede de recurso; v. acórdão de 15 de janeiro de 2002, Napp Pharmaceutical Holdings Limited and Subsidiaries c. Director General of Fair Trading [2002] CAT 1, n.os 56 a 69 e 390 a 405.


28      V. relatório da OCDE, p. 12.


29      V. Röller, L.H., «Exploitative Abuses», in Ehlermann, Marquis (EE.), European Competition Law Annual 2007: A Reformed approach to Article 82, Hart Publishing, Oxford, 2008, pp. 525 a 532; e Motta, M., de Streel, A., nota9, supra, p. 367 e seg.


30      V., por exemplo, Evans, D.S., Padilla, J. A., «Excessive Prices: Using Economics to Define Administrable Legal Rules», Journal of Competition Law and Economics, 2005, p. 109.


31      V., por exemplo, Geradin, D., Layne‑Farrar, A., Petit, N., EU Competition Law and Economics, Oxford University Press, Oxford, 2012, p. 270 e referências adicionais.


32      V. artigo 2.° do Regulamento (CE) n.° 1/2003 do Conselho, de 16 de dezembro de 2002, relativo à execução das regras de concorrência estabelecidas nos artigos 81.° e 82.° do Tratado (JO 2003, L 1, p. 1), e acórdão United Brands, n.° 264. Voltarei a esta questão nos n.os 132 a 139 das presentes conclusões.


33      V., nesse sentido, acórdão de 21 de janeiro de 2016, Eturas e o., C‑74/14, EU:C:2016:42, n.° 38 e jurisprudência aí referida.


34      Mais precisamente, a existência de uma diferença significativa e persistente, conforme explicarei na análise da quinta questão prejudicial (n.os 101 a 113).


35      Parto do princípio de que os repertórios a que os titulares das licenças dos diferentes países têm acesso são semelhantes. Esta é uma questão cuja apreciação incumbe ao órgão jurisdicional nacional.


36      Não creio que a proximidade geográfica de um país revista, em si mesma, grande utilidade. Esse fator só será útil se afetar elementos que sejam relevantes para a análise, como, por exemplo, os hábitos ou preferências dos consumidores ou a estrutura dos mercados.


37      Se bem entendi, em todos (ou quase todos) os países selecionados para a comparação efetuada na decisão impugnada existe um monopólio legal semelhante ao da Letónia. Consequentemente, não é possível excluir a possibilidade de que, também nesses países, as tarifas aplicadas pelas entidades de gestão coletiva sejam superiores ao preço concorrencial. Isso afetaria obviamente o preço de referência calculado pela autoridade. Porém, quando muito, esta imperfeição dos dados utilizados pela autoridade favoreceria a empresa sob investigação: o preço de referência seria superior ao preço concorrencial.


38      V. n.° 37, supra. V. também conclusões do advogado‑geral F. G. Jacobs no processo Tournier, 395/87, não publicadas, EU:C:1989:215, n.° 53.


39      Diretiva do Conselho, de 19 de novembro de 1992, relativa ao direito de aluguer, ao direito de comodato e a certos direitos conexos aos direitos de autor em matéria de propriedade intelectual (JO 1992, L 346, p. 61).


40      Acórdão de 6 de fevereiro de 2003, SENA, C‑245/00, EU:C:2003:68, n.os 36 e 37.


41 —      Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de fevereiro de 2014, relativa à gestão coletiva dos direitos de autor e direitos conexos e à concessão de licenças multiterritoriais de direitos sobre obras musicais para utilização em linha no mercado interno (JO 2014, L 84, p. 72).


42      Essa disposição também reflete a jurisprudência do Tribunal de Justiça sobre o artigo 102.° TFUE, acrescentando que «[a]s tarifas de direitos exclusivos e os direitos à remuneração devem ser razoáveis em relação, entre outros aspetos, ao valor económico da utilização comercial dos direitos, tendo em conta a natureza e o âmbito da utilização da obra e outras prestações, bem como em relação ao valor económico do serviço prestado pela organização de gestão coletiva. As organizações de gestão coletiva devem informar o usuário em causa dos critérios utilizados para o estabelecimento destas tarifas.» (O sublinhado é meu.)


43      Acórdão de 11 de dezembro de 2008, Kanal 5 e TV 4, C‑52/07, EU:C:2008:703.


44 —      V. considerando 7 da Diretiva 92/100 e considerandos 1 e 31 da Diretiva 2014/26.


45      V. acórdãos de 13 de julho de 1989, Tournier (395/87, EU:C:1989:319, n.° 38), e de 13 de julho de 1989, Lucazeau e o. (110/88, 241/88 e 242/88, EU:C:1989:326, n.° 25).


46      Easterbrook, F.H., «The limits of antitrust», Texas Law Review, 1984, p. 15.


47      Na verdade, muitos autores defendem que a criação de uma autoridade setorial ou a adoção de um sistema de preços regulamentados poderão ser formas mais eficazes de evitar preços excessivos num mercado. Em termos mais gerais, consideram que o instrumento mais eficaz contra os preços excessivos poderá consistir na intervenção ex ante do legislador com vista a eliminar os obstáculos jurídicos a uma concorrência normal, ao invés de uma intervenção ex post para assegurar o cumprimento.


48      V. Fletcher A., Jardine, A., «Toward an Appropriate Policy for Excessive Pricing», in Ehlermann, C. D., Marquis, M. (EE.), European Competition Law Annual 2007: A Reformed Approach to Article 82, Hart Publishing, 2007, p. 536.


49      V., por exemplo, Paulis, E., «Article 82 EC and Exploitative Conduct?», in Ehlermann, C. D., Marquis, M. (EE.), nota 48, supra.


50      V. Lyons B., «The Paradox of the Exclusion of Exploitative Abuse», in Konkurrensverket, nota 9, supra, p. 74.


51      Acórdão de 13 de novembro de 1975, General Motors Continental/Comissão, 26/75, EU:C:1975:150, n.os 16 a 20.


52      Para referências a processos nos Estados‑Membros da UE, v. Williams, M., «Excessive Pricing», in Konkurrensverket, nota 9, supra, pp. 152 e 153; e O’Donoghue, R., Padilla, A. J., nota 24, supra, pp. 619‑621.


53      V. Paulis, E., nota 49, supra.


54      Acórdão da Supreme Court dos EUA no processo Verizon Communications Inc. c. Law Offices of Curtis V. Trinko, LLP (02‑682) 540 U.S. 398 (2004). Embora essas declarações tenham sido proferidas num contexto diferente do do processo principal, considero que, de um modo geral, permanecem válidas.


55      N.° 20, supra.


56      Relativamente ao caráter alternativo dessas condições, v. despacho de 25 de março de 2009, Scippacercola e Terezakis/Comissão, C‑159/08 P, não publicado, EU:C:2009:188, n.° 47.


57      Acórdão de 10 de dezembro de 1991, Merci convenzionali Porto di Genova, C‑179/90, EU:C:1991:464, n.° 19.


58      Acórdão de 16 de julho de 2009, Der Grüne Punkt — Duales System Deutschland/Comissão, C‑385/07 P, EU:C:2009:456, n.os 141 a 147.


59      Acórdãos de 13 de novembro de 1975, General Motors Continental/Comissão, 26/75, EU:C:1975:150, e de 11 de novembro de 1986, British Leyland/Comissão, 226/84, EU:C:1986:421.


60      V., nesse sentido, acórdão de 11 de abril de 1989, Saeed Flugreisen e Silver Line Reisebüro, 66/86, EU:C:1989:140, n.° 43, e conclusões do advogado‑geral J. Mischo no processo CIRCA e Maxicar, 53/87, não publicadas, EU:C:1988:330, n.° 62.


61 —      V., nesse sentido, acórdão Lucazeau, n.os 28 e 29.


62      V. Korah, V., An Introductory Guide to EC Competition Law and Practice, 6.a ed., Hart Publishing, 1999, p. 114; e Bishop, S., Walker, M., The Economics of EC Competition Law, 3.a ed., Sweet & Maxwell, 2010, p. 238.


63      V. relatório da OCDE, p. 57.


64      V., em especial, decisão da Comissão no processo COMP/A.36.568/D3, Scandlines Sverige AB c. Porto de Helsingborg.


65      N.° 23, supra.


66      N.° 52, supra.


67      V., inter alia, acórdão United Brands, n.° 184; acórdãos de 3 de outubro de 1985, CBEM, 311/84, EU:C:1985:394, n.° 27, e de 15 de março de 2007, British Airways/Comissão, C‑95/04 P, EU:C:2007:166, n.os 69 e 86.


68      V. acórdão de 27 de fevereiro de 2014, OSA, C‑351/12, EU:C:2014:110, n.° 80 e jurisprudência aí referida.


69      Orientações para o cálculo das coimas aplicadas por força do n.° 2, alínea a), do artigo 23.° do Regulamento (CE) n.° 1/2003 (JO 2006, C 210, p. 2).