Language of document : ECLI:EU:T:2018:606

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Quarta Secção)

26 de setembro de 2018 (*)

«FEAGA e Feader – Despesas excluídas do financiamento – Ajudas por superfície – Reduções e exclusões em caso de incumprimento das regras de condicionalidade – Regulamento (CE) n.° 73/2009 – Regulamento (CE) n.° 1122/2009 – Regulamento (CE) n.° 885/2006 – Proporcionalidade»

No processo T‑463/16,

República Portuguesa, representada por L. Inez Fernandes, M. Figueiredo, J. Saraiva de Almeida e P. Estêvão, na qualidade de agentes,

recorrente,

contra

Comissão Europeia, representada por A. Sauka, na qualidade de agente, assistido por M. Marques Mendes e A. Dias Henriques, advogados,

recorrida,

que tem por objeto um pedido apresentado nos termos do artigo 263.° TFUE, de anulação da Decisão de Execução (UE) 2016/1059 da Comissão, de 20 de junho de 2016, que exclui do financiamento da União Europeia determinadas despesas efetuadas pelos Estados‑Membros a título do Fundo Europeu Agrícola de Garantia (FEAGA) e do Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural (Feader) (JO 2016, L 173, p. 59), na parte respeitante à República Portuguesa,

O TRIBUNAL GERAL (Quarta Secção),

composto por: H. Kanninen, presidente, J. Schwarcz (relator) e C. Iliopoulos, juízes,

secretário: M. Marescaux, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 11 de dezembro de 2017,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

1        De 15 a 19 de outubro de 2012, a Comissão Europeia efetuou um inquérito, com a referência XC/2011/006/PT, sobre a correta aplicação, pela República Portuguesa, das regras relativas à condicionalidade.

2        Por ofício de 17 de janeiro de 2013, a Comissão comunicou à República Portuguesa as suas observações, nos termos do artigo 11.°, n.° 1, primeiro parágrafo, do Regulamento (CE) n.° 885/2006 da Comissão, de 21 de junho de 2006, que estabelece as regras de execução do Regulamento (CE) n.° 1290/2005 do Conselho no respeitante à acreditação dos organismos pagadores e de outros organismos e ao apuramento das contas do FEAGA e do FEADER (JO 2006, L 171, p. 90, a seguir «Primeira Comunicação»). A Comissão considerava que algumas despesas efetuadas não tinham respeitado o direito da União Europeia.

3        A República Portuguesa respondeu às verificações da Comissão por ofício de 30 de abril de 2013.

4        Por ofício de 14 de novembro de 2013, a Comissão convidou as autoridades portuguesas para uma reunião bilateral, em conformidade com o disposto no artigo 11.°, n.° 1, terceiro parágrafo, do Regulamento n.° 885/2006. Esta reunião bilateral teve lugar em 19 de fevereiro de 2014.

5        Por ofício de 26 de maio de 2014, a Comissão enviou às autoridades portuguesas a ata da reunião bilateral.

6        Em 26 de março de 2015, a Comissão comunicou as suas conclusões à República Portuguesa, nos termos do artigo 11.°, n.° 2, terceiro parágrafo, do Regulamento n.° 885/2006 (a seguir «conclusões de 26 de março de 2015»). Resulta das conclusões de 26 de março de 2015 que a Comissão mantém a sua posição segundo a qual a aplicação do sistema de condicionalidade não era conforme com as normas da União nos exercícios de 2010 a 2012. Por conseguinte, propôs excluir do financiamento da União um montante de 9 533 418,92 euros.

7        Por ofício de 7 de maio de 2015, a República Portuguesa pediu a abertura de um procedimento no órgão de conciliação, nos termos do artigo 16.° do Regulamento n.° 885/2006. Em 14 de outubro de 2015, esse órgão concluiu pela impossibilidade de conciliar os pontos de vista das duas partes.

8        Por ofício de 14 de dezembro de 2015, a Comissão comunicou às autoridades portuguesas a sua posição final.

9        Os fundamentos das correções financeiras efetuadas pela Comissão estão resumidos no relatório de síntese de 20 de maio de 2016, relativo aos resultados das verificações da Comissão no contexto do procedimento de apuramento da conformidade (a seguir «relatório de síntese»).

10      Através da Decisão de Execução (UE) 2016/1059 [C (2016) 3753] da Comissão, de 20 de junho de 2016, que exclui do financiamento da União Europeia determinadas despesas efetuadas pelos Estados‑Membros a título do Fundo Europeu Agrícola de Garantia (FEAGA) e do Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural (Feader) (JO 2016, L 173, p. 59, a seguir «decisão impugnada»), a Comissão excluiu do financiamento da União, no que respeita à República Portuguesa, um montante de 8 984 891,60 euros correspondente a despesas declaradas por esta última relativamente à condicionalidade durante os exercícios financeiros de 2010 a 2012.

 Tramitação do processo e pedidos das partes

11      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 22 de agosto de 2016, a República Portuguesa interpôs o presente recurso.

12      A República Portuguesa conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        anular a decisão impugnada na parte em que lhe aplica uma correção financeira de um montante de 8 984 891,60 euros relativo a despesas efetuadas a título do Fundo Europeu Agrícola de Garantia (FEAGA) e do Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural (Feader) (a seguir «Fundos») no âmbito da condicionalidade relativamente aos exercícios de 2010, 2011 e 2012;

–        condenar a Comissão nas despesas.

13      A Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar a República Portuguesa nas despesas.

14      Por ofício entrado na Secretaria do Tribunal Geral em 17 de fevereiro de 2017, a Comissão pediu, nos termos do artigo 68.° do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a apensação do presente processo ao processo T‑462/16, Portugal/Comissão, para efeitos da fase oral do processo e da decisão que põe termo à instância.

15      Depois de ter recebido as observações da República Portuguesa sobre este pedido de apensação, o Tribunal Geral (Quarta Secção) decidiu, em 10 de março de 2017, não proceder à apensação dos processos.

16      Em 19 de outubro de 2017, sob proposta do juiz‑relator, o Tribunal Geral (Quarta Secção), no âmbito de medidas de organização do processo, previstas no artigo 89.° do Regulamento de Processo, convidou a Comissão a responder a duas questões, o que esta fez por ofício de 3 de novembro de 2017.

 Questão de direito

17      A República Portuguesa invoca seis fundamentos de recurso, relativos:

–        o primeiro, a falta de fundamentação e a violação do artigo 11.° do Regulamento n.° 885/2016;

–        o segundo, relativo a violação do artigo 24.° do Regulamento (CE) n.° 73/2009 do Conselho, de 19 de janeiro de 2009, que estabelece regras comuns para os regimes de apoio direto aos agricultores no âmbito da Política Agrícola Comum e institui determinados regimes de apoio aos agricultores, que altera os Regulamentos (CE) n.° 1290/2005 (CE) n.° 247/2006 e (CE) n.° 378/2007 e revoga o Regulamento (CE) n.° 1782/2003 (JO 2009, L 30, p. 16), e dos artigos 54.°, n.° 1, alínea c), segundo parágrafo, e 71.° do Regulamento (CE) n.° 1122/2009 da Comissão, de 30 de novembro de 2009, que estabelece regras de execução do Regulamento (CE) n.° 73/2009 do Conselho no que respeita à condicionalidade, à modulação e ao sistema integrado de gestão e de controlo, no âmbito dos regimes de apoio direto aos agricultores previstos no referido regulamento, bem como regras de execução do Regulamento (CE) n.° 1234/2007 do Conselho no que respeita à condicionalidade no âmbito do regime de apoio previsto para o setor vitivinícola (JO 2009, L 316, p. 65);

–        o terceiro, a violação dos artigos 26.° e 53.° do Regulamento n.° 1122/2009;

–        o quarto, a falta de fundamentação;

–        o quinto, a violação do princípio ne bis in idem;

–        o sexto a violação do princípio da proporcionalidade e do artigo 31.° do Regulamento (CE) n.° 1290/2005 do Conselho, de 21 de junho de 2005, relativo ao financiamento da política agrícola comum (JO 2005, L 209, p. 1).

 Quanto ao exame do mérito dos fundamentos

18      A título preliminar, há que lembrar que, segundo jurisprudência constante, os Fundos agrícolas europeus apenas financiam as intervenções efetuadas de acordo com as disposições da União no âmbito da organização comum dos mercados agrícolas (v. Acórdão de 27 de fevereiro de 2013, Polónia/Comissão, T‑241/10, não publicado, EU:T:2013:96, n.° 20 e jurisprudência aí referida).

19      Quando a Comissão recusa que certas despesas sejam assumidas pelos Fundos devido a violações das disposições do direito da União imputáveis a um Estado‑Membro, não lhe cabe provar de modo exaustivo a insuficiência dos controlos efetuados pelas administrações nacionais ou a irregularidade dos números por elas transmitidos, mas apresentar um elemento de prova da dúvida séria e razoável que tem quanto a estes controlos ou a estes números. Esta facilitação do ónus da prova da Comissão explica‑se pelo facto de ser o Estado‑Membro quem está melhor colocado para recolher e verificar os dados necessários ao apuramento das contas dos Fundos, e a quem incumbe, consequentemente, apresentar a prova mais detalhada e completa da veracidade dos seus controlos ou dos seus números e, sendo caso disso, da inexatidão das afirmações da Comissão (Acórdãos de 11 de janeiro de 2001, Grécia/Comissão, C‑247/98, EU:C:2001:4, n.os 7 a 9, e de 17 de maio de 2013, Grécia/Comissão, T‑294/11, não publicado, EU:T:2013:261, n.° 21).

20      Assim, o Tribunal deve verificar se o Estado‑Membro em causa demonstrou a inexatidão das apreciações da Comissão ou a inexistência de um risco de perda ou de irregularidade para os Fundos com base na aplicação de um sistema de controlo fiável e eficaz (v. Acórdão de 17 de maio de 2013, Grécia/Comissão, T‑294/11, não publicado, EU:T:2013:261, n.° 22 e jurisprudência aí referida).

21      É à luz destas considerações que devem ser analisados os fundamentos invocados pela República Portuguesa, começando pelo quinto, sexto e primeiro fundamentos.

 Quanto ao quinto fundamento, relativo à violação do princípio ne bis in idem

22      Em substância, a República Portuguesa acusa a Comissão de ter aplicado uma dupla, ou mesmo tripla, correção e, desse modo, de ter violado o princípio ne bis in idem, segundo o qual o Estado‑Membro não pode ser sujeito duas vezes à mesma correção financeira pelo mesmo facto.

23      A Comissão contesta a procedência deste fundamento.

24      Há que lembrar que a Comissão tem a obrigação de proceder a uma correção financeira caso as despesas cujo financiamento é pedido não tenham sido efetuadas em conformidade com as regras da União. Essa correção financeira destina‑se a evitar a imputação aos Fundos de montantes que não serviram para o financiamento de um objetivo prosseguido pela regulamentação da União em causa e não constitui, portanto, uma sanção (Acórdãos de 11 de janeiro de 2001, Grécia/Comissão, C‑247/98, EU:C:2001:4, n.° 14, e de 16 de setembro de 2013, Países Baixos/Comissão, T‑343/11, não publicado, EU:T:2013:468, n.° 111).

25      Por outro lado, de acordo com jurisprudência constante, embora incumba à Comissão provar a existência de uma violação das regras da União, uma vez provada essa violação, compete ao Estado‑Membro demonstrar, sendo caso disso, que a Comissão cometeu um erro relativamente às consequências financeiras que daí advêm (v. Acórdão de 24 de abril de 2008, Bélgica/Comissão, C‑418/06 P, EU:C:2008:247, n.° 135, e jurisprudência aí referida).

26      No caso, como resulta dos antecedentes do litígio, a Comissão, no termo do inquérito XC/2011/006/PT, detetou várias irregularidades que entendeu deverem dar origem a uma correção financeira.

27      No seguimento de uma troca de correspondência e depois da reunião bilateral de 19 de fevereiro de 2014, a Comissão, antes de mais, comunicou as conclusões de 26 de março de 2015, onde referia a sua proposta de aplicar uma correção financeira no montante líquido de 9 533 418,92 euros.

28      Depois, no seguimento do procedimento de conciliação, a Comissão deu a conhecer às autoridades portuguesas a sua posição final quanto ao montante da correção financeira a aplicar, a saber, a quantia de 9 533 418,92 euros. Conforme resulta tanto das conclusões de 26 de março de 2015 como da sua posição final, a Comissão anexou um quadro detalhado, obtido com a utilização da aplicação Cast/Combo através da qual a correção financeira foi calculada para os exercícios financeiros de 2010 a 2012 (a seguir «quadro detalhado»). Por outro lado, há que salientar que, para além desse quadro detalhado, as conclusões de 26 de março de 2015 continham três quadros que resumiam os números que constavam do quadro detalhado (a seguir «quadros de síntese»). Os quadros de síntese eram imediatamente seguidos desta precisão:

«A correção financeira líquida proposta é ajustada para ter em conta o impacto da correção financeira aplicada no âmbito do inquérito NAC/2011/004/PT. Todavia, se as correções financeiras decididas pela Comissão relativamente a este inquérito vierem a ser total ou parcialmente anuladas pelo Tribunal de Justiça Europeu, a correção financeira proposta no âmbito do presente inquérito (XC/2011/006/PT) realizar‑se‑á numa fase ulterior também no que diz respeito aos montantes anulados.»

29      Por último, a Comissão enviou às autoridades portuguesas o relatório de síntese que resumia todas as fases do processo de apuramento e no qual eram, nomeadamente, reproduzidos os quadros de síntese. Por outro lado, no final desse mesmo relatório, na página 189, mencionava‑se o seguinte:

«O montante bruto total proposto para a exclusão do financiamento pela UE é de 9 567 830,74 EUR. Todavia, a DG [Agricultura e Desenvolvimento Rural] terá em conta o impacto das correções financeiras aplicadas às mesmas despesas no âmbito dos inquéritos NAC/2011/004/PT, AA/2010/015/PT, AA/2011/015/PT, NAC/2012/005/PT, CEB/2013/006/PT, NAC/2013/006/PT e AA/2013/004/PT, reduzindo em conformidade a presente correção. Consequentemente, o montante líquido a excluir […] é de 8 984 891,60 EUR.

Caso venha a ser decidida uma correção das mesmas despesas, a DG [Agricultura e Desenvolvimento Rural] assegurará que a correção então decidida seja reduzida de modo a ter em conta o impacto das correções financeiras anteriores.

Se, porém, as correções financeiras adotadas pela Comissão forem anuladas total ou parcialmente pelo Tribunal de Justiça da União Europeia, o montante da redução aplicada pela correção ulterior pode ser executado posteriormente.»

30      A República Portuguesa, nos articulados e na audiência, alegou que a Comissão tinha violado o princípio ne bis in idem, segundo o qual o Estado‑Membro não podia ser sujeito duas vezes à mesma correção financeira pelo mesmo facto, por a Comissão ter aplicado a cada campanha coberta pela auditoria correções financeiras para três exercícios financeiros diferentes. A esse respeito, baseia‑se nos quadros de síntese dos quais entende resultar que, no exercício 2010, para as rubricas 050301, 050302 e 050405, a Comissão aplicou três correções financeiras de 5% a três exercícios financeiros diferentes, a saber, os exercícios de 2011, 2012 e 2013. O mesmo sucedeu na campanha de 2011.

31      A esse respeito, porém, tal como refere, em substância, a Comissão, não se pode deixar de observar que a alegação da República Portuguesa assenta numa compreensão errada do procedimento de apuramento das contas em matéria de condicionalidade e ainda do quadro detalhado e dos quadros de síntese, que constam das conclusões de 26 de março de 2015, da posição final da Comissão de 14 de dezembro de 2015 e do relatório de síntese.

32      Quanto ao procedimento de apuramento em matéria de condicionalidade, a Comissão alegou nomeadamente na contestação, na sua resposta a uma medida de organização do processo e na audiência, primeiro, que eram as declarações anuais das quantias pagas pelos Estados‑Membros, a título da política agrícola comum, que constituíam a origem das despesas objeto de correções financeiras. Segundo, que era inerente às regras aplicáveis em matéria de condicionalidade que os pedidos de ajuda apresentados ao longo de um exercício controlado «n» dessem origem a pagamentos ao longo do exercício «n + 1» e dos exercícios seguintes. É, nomeadamente, o caso dos pagamentos diretos e das medidas agroambientais no âmbito do desenvolvimento rural. É por isso que, quando um inquérito tem por objeto o exercício «n», a despesa a corrigir será relativa aos exercícios financeiros «n + 1» e seguintes. Quanto às medidas vitivinícolas, relativamente às quais o respeito dos requisitos em matéria de condicionalidade deve ser garantido no ano seguinte ao do pagamento da ajuda, a Comissão mencionou que, quando um inquérito tivesse por objeto o exercício «n», as despesas a corrigir diriam respeito aos exercícios financeiros «n ‑ 1» e «n», mas seriam limitadas aos pagamentos efetuados no ano «n». Por último e terceiro, a Comissão precisou que qualquer sobreposição ou dupla correção estava, em princípio, excluída, graças à aplicação chamada Cast/Combo, pela qual as correções financeiras eram calculadas separadamente para cada uma das três medidas acima referidas, através da introdução dos parâmetros relevantes, tais como os códigos orçamentais ligados à medida em causa, os exercícios a que respeita o pedido, os exercícios financeiros, as datas do pedido e dos pagamentos e ainda a percentagem da taxa fixa a aplicar. Ora, no caso, foi precisamente seguindo esse processo que a Comissão indicou ter calculado o montante da correção financeira que acabou por ser aplicada na decisão impugnada e pôde evitar qualquer sobreposição com correções anteriores.

33      Quanto ao quadro detalhado, a Comissão salienta que resulta da coluna «correção precedente», que consta das suas páginas 5 e 6, que certos montantes de base sujeitos a correções forfetárias tinham sido reduzidos para evitar sobreposições com correções anteriormente aplicadas aos mesmos códigos orçamentais e aos mesmos exercícios financeiros noutros inquéritos. Foi por essa razão que a correção bruta total no montante de 9 567 830,74 euros foi reduzida para o montante de 9 533 418,92 euros, a fim de ter em conta a correção financeira já aplicada no inquérito NAC/2011/004/PT, conforme se esclarece na página 13 das conclusões de 26 de março de 2015. Quanto aos quadros de síntese, reproduzidos nessas conclusões e no relatório de síntese, embora seja verdade, como salienta a República Portuguesa, que, quanto aos exercícios de 2010 e 2011, a Comissão aplicou três correções financeiras de 5% a três exercícios financeiros diferentes relativamente às rubricas 050301, 050302 e 050405, a Comissão referiu que os montantes relativos a cada uma dessas rubricas eram diferentes, uma vez que dependiam dos montantes declarados e pagos pela República Portuguesa no âmbito da política agrícola comum.

34      Assim, ao contrário do que alega, em substância, a República Portuguesa, as trocas havidas no procedimento nos moldes acima descritos nos n.os 26 a 29 e o procedimento seguido pela Comissão para calcular o montante da correção financeira tendem a demonstrar que esta teve o cuidado de evitar qualquer sobreposição e dupla aplicação. De qualquer forma, não se pode deixar de observar que a República Portuguesa não apresenta nenhum argumento capaz de desmentir os factos expostos nesses mesmos números nem de demonstrar que a Comissão cometeu um erro, na aceção da jurisprudência acima referida no n.° 25.

35      Consequentemente, há que considerar que a República Portuguesa não demonstrou qualquer violação do princípio ne bis in idem.

36      Por conseguinte, improcede o primeiro fundamento.

 Quanto ao sexto fundamento, relativo à violação do princípio da proporcionalidade e do artigo 31.° do Regulamento n.° 1290/2005

37      A República Portuguesa recorda que as regras relativas à condicionalidade não constituem regras de elegibilidade para a concessão de uma ajuda, mas um conjunto de obrigações cujo incumprimento é penalizado com a redução ou exclusão da ajuda, nos termos do artigo 23.° do Regulamento n.° 73/2009. Por conseguinte, em seu entender, por um lado, o risco para os Fundos deve ser avaliado com base no risco de prejuízo financeiro resultante da não aplicação de reduções e exclusões e, por outro, a correção financeira não pode ser aplicada à totalidade dos beneficiários de ajudas sujeitas a condicionalidade, mas sim apenas aos que foram objeto de controlo, uma vez que só estes podem ser sujeitos a uma sanção.

38      A República Portuguesa salienta que, nos termos do artigo 71.°, n.° 4, do Regulamento n.° 1122/2009, a redução máxima em caso de incumprimento não pode exceder 5%, e que apenas as explorações agrícolas que foram sujeitas a uma ação de controlo podem ser sujeitas a uma redução ou exclusão. Entende que a violação das regras da condicionalidade só dá origem a uma redução ou exclusão do montante das ajudas se for detetada numa ação de controlo, pelo que o prejuízo para os Fundos nunca pode exceder o montante das ajudas pagas aos agricultores sujeitos a controlo. Por último, na réplica, a República Portuguesa afirma que as meras orientações previstas no documento AGRI‑2005‑64043, adotado em 9 de junho de 2006 e intitulado «Comunicação relativa ao tratamento pela Comissão, no contexto do apuramento das contas do FEOGA‑Garantia, das insuficiências verificadas nos sistemas de controlo da condicionalidade (artigo 3.° do Regulamento (CE) n.° 1782/2003) instituídos pelos Estados‑Membros» (a seguir «documento 2005‑64043»), não se podem sobrepor à aplicação da legislação em vigor, pois, no caso contrário, daí resultaria uma violação injustificada dessa legislação. Ora, alega, em substância, que isso é o que se verifica no caso em apreço, dado que, nos termos das disposições do artigo 71.°, n.° 4, do Regulamento n.° 1122/2009, em caso de incumprimento a redução máxima não pode exceder 5% e que o montante proposto pela Comissão de exclusão do financiamento da União é superior ao que resultaria da sanção a todas as explorações controladas com a taxa máxima de redução de 5%.

39      A Comissão contesta a procedência deste fundamento.

40      A título preliminar, há que observar que a argumentação da República Portuguesa traduz‑se, em substância, em afirmar que a Comissão violou o princípio da proporcionalidade e o artigo 31.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1290/2005, que foi substituído, a partir de 1 de janeiro de 2015, pelo artigo 52.° do Regulamento (UE) n.° 1306/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de dezembro de 2013, relativo ao financiamento, à gestão e ao acompanhamento da Política Agrícola Comum e que revoga os Regulamentos (CEE) n.° 352/78 (CE) n.° 165/94 (CE) n.° 2799/98 (CE) n.° 814/2000 (CE) n.° 1290/2005 e (CE) n.° 485/2008 do Conselho (JO 2013, L 347, p. 549), pelo facto de, por um lado, nos termos do artigo 71.°, n.° 4, do Regulamento n.° 1122/2009, a redução máxima em caso de incumprimento não poder exceder 5% e, por outro, só as explorações agrícolas sujeitas a uma ação de controlo poderem ser sujeitas a uma redução ou exclusão.

41      A esse respeito, há que observar que as partes estão de acordo em que, em matéria de condicionalidade, o risco para os Fundos não é avaliado, em princípio, com base no risco resultante de despesas inelegíveis, mas sim com base no risco de prejuízo financeiro resultante da não aplicação de sanções. Do mesmo modo, partilham o ponto de vista de que, em princípio, o incumprimento dos requisitos em matéria de condicionalidade por um agricultor, detetado num controlo, dá origem a sanções individuais. Isso resulta, aliás, claramente dos artigos 22.° a 24.° do Regulamento n.° 73/2009 e dos artigos 70.° a 72.° do Regulamento n.° 1122/2009, de acordo com os quais, em substância, em caso de incumprimento detetado num controlo, será aplicada uma redução ou uma exclusão ao montante total das ajudas concedidas ao agricultor controlado.

42      Em primeiro lugar, quanto ao argumento de que só as explorações agrícolas objeto de uma ação de controlo podem ser sujeitas a uma redução ou exclusão, embora seja verdade, como acertadamente alega a República Portuguesa, que o risco corrido pelos Fundos corresponde, em princípio, às sanções não aplicadas pelo incumprimento dos requisitos em matéria de condicionalidade e que, em princípio, esse risco está limitado à amostra de controlo conforme definida nomeadamente nos artigos 50.° e 51.° do Regulamento n.° 1122/2009, há que considerar que isso só é válido se o sistema de controlo dos requisitos em matéria de condicionalidade instituído pelo Estado‑Membro for eficaz. Com efeito, só um sistema como esse permite controlar o cumprimento dos requisitos por parte dos agricultores incluídos na amostra de controlo no local e ampliar essa amostra, se necessário, no caso de os controlos terem revelado casos significativos de incumprimento.

43      Em contrapartida, como alega a Comissão, no caso de o sistema de controlo ser deficiente, um Estado‑Membro não pode garantir o controlo e o respeito das regras instituídas pelos Regulamentos n.os 73/2009 e 1122/2009, pelo que não lhe é possível assegurar‑se de que o risco para os Fundos é limitado à amostra de controlo.

44      A título de exemplo, um sistema deficiente não permitirá nomeadamente a aplicação do artigo 50.°, n.° 3, do Regulamento n.° 1122/2009, que dispõe que, «[s]e os controlos in loco revelarem um grau significativo de incumprimento de um determinado ato ou norma, o número de controlos in loco relativos a esse ato ou norma a efetuar no período de controlo seguinte deve ser aumentado». Com efeito, no caso de os controlos serem deficientes, nenhum nível significativo de incumprimento será detetado e a amostra de controlo nunca será aumentada, dando origem a menos sanções e reduções do que as que deveriam ter sido aplicadas.

45      Ora, é precisamente para ter em conta essa hipótese que a Comissão previu, no documento 2005‑64043, a possibilidade de o risco para os Fundos se estender para além dos agricultores já controlados.

46      A esse respeito, há que lembrar que esse documento prevê nomeadamente o seguinte:

«Da leitura do artigo 8.° do Regulamento n.° 1258/1999 [do Conselho de 17 de maio de 1999 relativo ao financiamento da política agrícola comum (JO 1999, L 160, p. 103)], que requer que os Estados‑Membros tomem as medidas necessárias para:

‑ se certificarem de que as operações financiadas pelo Fundo são efetivamente realizadas e corretamente executadas,

‑ evitar e processar as irregularidades,

‑ recuperar as importâncias perdidas em consequência de irregularidades ou negligências,

os serviços da Comissão concluem que a disfunção do sistema de controlo do Estado‑Membro comporta um risco para o Fundo, na medida em que as despesas declaradas ao Fundo são sobreavaliadas em 100% das sanções que poderiam ter sido adotadas se as regras tivessem sido aplicadas corretamente.

Além disso, nos termos do n.° 4 do artigo 7.°, os serviços da Comissão excluem do financiamento as despesas que verificam não ter sido efetuadas em conformidade com as regras comunitárias, inclusive no caso de um Estado‑Membro não realizar os controlos especificamente exigidos pela regulamentação em questão.

Os serviços da Comissão consideram, por conseguinte, que a utilização de correções forfetárias estabelecidas com base na definição de controlos‑chave e controlos ancilares deu provas da sua eficácia para avaliar estas despesas não elegíveis. Convém, portanto, utilizá‑las igualmente quando são constatadas deficiências no sistema de condicionalidade.

De acordo com os princípios aplicáveis em matéria de controlos da elegibilidade, a não aplicação de sanções resultante da não realização de controlos no local ou da realização inadequada desses controlos no contexto da condicionalidade (exigências regulamentares em matéria de gestão e boas condições agrícolas e ambientais), bem como a não aplicação ou a aplicação incorreta de sanções regulamentares que implicassem a perda do respetivo efeito dissuasivo seriam designadamente consideradas como uma deficiência no quadro de um controlo‑chave.

Do mesmo modo, as deficiências constatadas numa análise de risco, nomeadamente, seriam consideradas como uma deficiência no quadro de um controlo ancilar.

Tal como previsto atualmente no documento VI/5330/97 [da Comissão, do 23 de dezembro de 1997, intitulado “Diretrizes para o Cálculo das Consequências Financeiras aquando da Preparação da Decisão de Apuramento das Contas do Feoga‑Garantia”], a taxa de correção deve ser aplicada à parte da despesa que constitui um risco. No contexto da condicionalidade, isto significa que, quando são estabelecidos resultados em relação a uma autoridade competente em matéria de controlo (organismo de controlo especializado ou organismo pagador), o montante total da ajuda paga aos agricultores que devem ser controlados por essa autoridade e aos quais incumbe a obrigação relativamente à qual foram constatadas deficiências deve ser alvo de uma correção. A correção será aplicada ao nível de sanções que teria sido aplicado se o controlo tivesse sido realizado de acordo com as normas previstas.»

47      Nestas condições, há que rejeitar o argumento da República Portuguesa de que a violação das regras relativas à condicionalidade só dá origem a uma redução ou a uma exclusão do montante das ajudas se tiver sido detetada no âmbito de um controlo, pelo que o prejuízo para os Fundos nunca pode ser superior ao montante das ajudas pagas aos agricultores sujeitos a um controlo.

48      Em segundo lugar, quanto ao argumento de que, tendo em conta a taxa de 5% prevista no artigo 71.°, n.° 4, do Regulamento n.° 1122/2009, a aplicação da correção financeira impugnada é contrária ao princípio da proporcionalidade e ao artigo 31.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1290/2005, este só pode ser julgado improcedente.

49      Com efeito, embora seja verdade que o artigo 71.°, n.° 4, do Regulamento n.° 1122/2009 menciona que a redução máxima não pode exceder 5%, não se pode deixar de observar que essa disposição diz respeito às reduções que o Estado‑Membro deve aplicar ao agricultor no caso de o incumprimento das regras de condicionalidade resultar de negligência deste, o que não é o caso. Assim, essa disposição não tem incidência numa correção que a Comissão pudesse ser levada a aplicar a um Estado‑Membro pelas deficiências do sistema de controlo dos requisitos em matéria de condicionalidade. Há que salientar, a esse respeito, que as taxas previstas no Regulamento n.° 1122/2009 só se destinam a ser aplicadas no caso de o sistema de controlo do Estado‑Membro ser eficaz e de terem sido detetados casos de incumprimento em controlos, que tenham dado origem a reduções aos agricultores que não cumpriram os requisitos em matéria de condicionalidade. Em contrapartida, quanto à taxa de correção a aplicar aos montantes resultantes do risco corrido pelos Fundos em caso de sistema de controlo deficiente, há que tomar como referência o documento 2005‑64043, que prevê taxas entre 2 e 100%, em função da gravidade da deficiência detetada. Ao contrário do que alega a República Portuguesa na réplica, a aplicação do documento 2005‑64043 pela Comissão não pode, pois, constituir uma violação do artigo 71.°, n.° 4, do Regulamento n.° 1122/2009 (v. n.° 38, supra).

50      Em face destas considerações, é de entender que a República Portuguesa não pode validamente alegar que, tendo em conta a taxa de 5% prevista no artigo 71.°, n.° 4, do Regulamento n.° 1122/2009 e o facto de só as explorações agrícolas sujeitas a uma ação de controlo poderem ser objeto de redução ou de exclusão, a Comissão violou o princípio da proporcionalidade e o artigo 31.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1290/2005.

51      Nestas condições, há que julgar improcedente o sexto fundamento.

 Quanto ao primeiro fundamento, relativo a falta de fundamentação e violação do artigo 11.° do Regulamento n.° 885/2006

52      Com este fundamento, que se divide, em substância, em oito partes, a República Portuguesa alega que a Primeira Comunicação, enviada ao abrigo do artigo 11.° do Regulamento n.° 885/2006, não respeita totalmente esta disposição porquanto não indica claramente os exercícios que foram objeto do inquérito, não precisa os resultados das verificações e não fornece indicações sobre as medidas corretivas que devem ser adotadas para pôr termo às alegadas irregularidades apuradas pela Comissão.

53      Nestas condições, a República Portuguesa alega, em substância, que a Primeira Comunicação lhe foi enviada sem que tenha podido pôr termo a eventuais deficiências para garantir no futuro o cumprimento das regras da União, pelo que não beneficiou da garantia processual concedida aos Estados‑Membros pelo artigo 11.° do Regulamento n.° 885/2006. Alega que, uma vez que a Primeira Comunicação não permitiu que se conhecessem perfeitamente as reservas da Comissão, esta comunicação não podia cumprir a sua função de advertência, como impõe a jurisprudência, pelo que a decisão impugnada deve ser anulada na parte em que impõe uma correção financeira em matéria de condicionalidade.

54      A Comissão contesta a procedência deste fundamento.

55      Desde logo, quanto ao argumento de que não resulta claro da Primeira Comunicação quais os exercícios objeto do inquérito, a Comissão alega que, na primeira página da Primeira Comunicação, constava a indicação expressa e clara de que a investigação abrangia os exercícios de 2010 e seguintes, logo, necessariamente, 2010, 2011 e 2012.

56      Em seguida, a Comissão acusa a República Portuguesa de basear a sua argumentação em partes limitadas da Primeira Comunicação em vez de ter presente todo o seu conteúdo.

57      Por último, quanto ao argumento de que a Primeira Comunicação não cumpriu a sua função de advertência, a Comissão salienta que a versão em português da Primeira Comunicação é de janeiro de 2013 e que o período objeto das correções corresponde aos exercícios de 2010 a 2012. Em sua opinião, isto significa que, no caso, este argumento é irrelevante e enganador, pois em 2013 já nada podia ser feito pela República Portuguesa para sanar as situações detetadas referentes aos exercícios de 2010 a 2012.

58      A título preliminar, embora o primeiro fundamento vise expressamente uma violação do dever de fundamentação e uma violação do artigo 11.° do Regulamento n.° 885/2006, não se pode deixar de observar que a argumentação da República Portuguesa em apoio deste fundamento se destina exclusivamente a demonstrar uma violação do artigo 11.° do Regulamento n.° 885/2006. Assim, é na medida em que se destina a demonstrar uma violação dessa disposição que se deve analisar o primeiro fundamento.

59      A esse respeito, há que lembrar que resulta de jurisprudência constante que a decisão final e definitiva relativa ao apuramento das contas deve ser tomada na sequência de um processo contraditório específico no decurso do qual os Estados‑Membros interessados devem dispor de todas as garantias necessárias para defender o seu ponto de vista (Acórdãos de 29 de janeiro de 1998, Grécia/Comissão, C‑61/95, EU:C:1998:27, n.° 39, e de 14 de dezembro de 2000, Alemanha/Comissão, C‑245/97, EU:C:2000:687, n.° 47).

60      Por outro lado, há que lembrar igualmente que, segundo jurisprudência constante, a Comissão é obrigada a respeitar, nas relações com os Estados‑Membros, as condições que a si própria se impôs através dos regulamentos de aplicação. Com efeito, desrespeito dessas condições pode, em função da sua importância, esvaziar da sua substância a garantia processual conferida aos Estados‑Membros pelo artigo 31.° do Regulamento n.° 1290/2005 (v., por analogia, Acórdão de 17 de junho de 2009, Portugal/Comissão, T‑50/07, não publicado, EU:T:2009:206, n.° 27 e jurisprudência aí referida).

61      Além disso, o artigo 31.° do Regulamento n.° 1290/2005, por um lado, e o artigo 11.° do Regulamento n.° 885/2006, por outro, referem‑se à mesma fase do procedimento de apuramento das contas dos Fundos agrícolas europeus, a saber, o envio da comunicação pela Comissão ao Estado‑Membro no final dos controlos a que procedeu (v., por analogia, Acórdãos de 24 de janeiro de 2002, Finlândia/Comissão, C‑170/00, EU:C:2002:51, n.° 27, e de 17 de junho de 2009, Portugal/Comissão, T‑50/07, não publicado, EU:T:2009:206, n.° 28 e jurisprudência aí referida).

62      O artigo 11.° do Regulamento n.° 885/2006 define as diferentes etapas a respeitar no procedimento de apuramento das contas dos Fundos agrícolas europeus. Em particular, o artigo 11.°, n.° 1, primeiro parágrafo, desse regulamento precisa o conteúdo da comunicação escrita em que a Comissão comunica o resultado das suas verificações aos Estados‑Membros, antes da organização da reunião bilateral (v., por analogia, Acórdãos de 24 de fevereiro de 2005, Grécia/Comissão, C‑300/02, EU:C:2005:103, n.° 68, e de 24 de março de 2011, Grécia/Comissão, T‑184/09, não publicado, EU:T:2011:120, n.° 40). Nos termos do artigo 11.°, n.° 1, do Regulamento n.° 885/2006, quando, na sequência de um inquérito, a Comissão considerar que uma despesa não foi efetuada de acordo com a regulamentação da União, comunicará ao Estado‑Membro em causa as suas verificações e indicará as medidas corretivas necessárias para garantir a futura observância dessas regras. Além disso, esse artigo dispõe que a Comissão e o Estado‑Membro em causa participam numa reunião bilateral relativa à base das despesas que a Comissão propõe excluir do financiamento e devem tentar chegar a acordo.

63      Há que lembrar, por outro lado, que já ficou decidido que a comunicação escrita a que se refere o artigo 11.° do Regulamento n.° 885/2006 deve poder dar ao Estado‑Membro um perfeito conhecimento das reservas da Comissão, de modo a poder cumprir então a função de advertência que lhe é conferida por essa disposição (v., por analogia, Acórdãos de 7 de outubro de 2004, Espanha/Comissão, C‑153/01, EU:C:2004:589, n.° 93; de 3 de maio de 2012, Espanha/Comissão, C‑24/11 P, EU:C:2012:266, n.° 27, e de 17 de junho de 2009, Portugal/Comissão, T‑50/07, não publicado, EU:T:2009:206, n.° 39).

64      Daí resulta que, na comunicação escrita, a Comissão deve indicar, de modo suficientemente preciso, o objeto do inquérito levado a cabo pelos seus serviços e as deficiências aí constatadas, uma vez que essas deficiências podem ser posteriormente invocadas como elemento de prova da dúvida séria e razoável da Comissão relativamente aos controlos efetuados pelas administrações nacionais ou aos números por elas transmitidos e, assim, justificar as correções financeiras adotadas na decisão final que exclui do financiamento da União determinadas despesas efetuadas pelo Estado‑Membro em causa a título dos Fundos (v., por analogia, Acórdão de 17 de junho de 2009, Portugal/Comissão, T‑50/07, não publicado, EU:T:2009:206, n.° 40).

65      Além disso, o desrespeito dessa condição imposta no artigo 11.° do Regulamento n.° 885/2006 esvazia da sua substância a garantia processual conferida aos Estados‑Membros pelo artigo 31.° do Regulamento n.° 1290/2005, que limita no tempo as despesas que podem ser objeto de recusa de financiamento pelos Fundos (v., por analogia, Acórdão de 3 de maio de 2012, Espanha/Comissão, C‑24/11 P, EU:C:2012:266, n.° 29 e jurisprudência aí referida).

66      O artigo 11.° do Regulamento n.° 885/2006 deve, pois, ser lido em conjugação com o artigo 31.° do Regulamento n.° 1290/2005. Segundo essa disposição, a Comissão não pode excluir as despesas que tenham sido efetuadas mais de 24 meses antes de ter notificado por escrito o Estado‑Membro em causa dos resultados das verificações. Daí resulta que a comunicação escrita prevista no artigo 11.° do Regulamento n.° 885/2006 tem por objeto avisar o seu destinatário de que as despesas efetuadas durante o período de 24 meses anterior à notificação dessa comunicação podem ser excluídas do financiamento pelos Fundos e de que, portanto, esta constitui o elemento de referência para a contagem do prazo de 24 meses assim previsto (v., por analogia, Acórdão de 3 de maio de 2012, Espanha/Comissão, C‑24/11 P, EU:C:2012:266, n.° 30).

67      Consequentemente, a fim de poder desempenhar a sua função de advertência, a comunicação a que se refere o artigo 11.° do Regulamento n.° 885/2006 deve desde logo identificar de modo suficientemente preciso todas as irregularidades apontadas ao Estado‑Membro em causa, que, em última análise, estão na base da correção financeira efetuada. Só essa comunicação permite garantir um perfeito conhecimento das reservas da Comissão e pode constituir o elemento de referência para o cálculo do prazo de 24 meses previsto no artigo 31.° do Regulamento n.° 1290/2005 (v., por analogia, Acórdão de 3 de maio de 2012, Espanha/Comissão, C‑24/11 P, EU:C:2012:266, n.° 31).

68      De acordo com a jurisprudência acima referida nos n.os 59 a 67, há que analisar, quanto a cada um dos incumprimentos detetados, se a Primeira Comunicação cumpria os requisitos do artigo 11.° do Regulamento n.° 885/2006, conjugado com o artigo 31.° do Regulamento n.° 1290/2005, e se constituía, consequentemente, uma comunicação regular nos termos dessas disposições. Para este efeito, deverá verificar‑se se, na referida comunicação, a Comissão identificou suficientemente o objeto e os resultados do inquérito, a saber, as deficiências constatadas nas quais se funda a correção financeira em detrimento da República Portuguesa relativamente aos exercícios de 2010, 2011 e 2012, e indicou as medidas corretivas que deviam ser adotadas no futuro.

–       Quanto à primeira parte relativa à norma BCAA‑Socalcos

69      A República Portuguesa entende que a observação (3) do anexo I da Primeira Comunicação não cumpre a sua função de advertência relativamente aos exercícios de 2010, 2011 e 2012, na medida em que a Comissão se limitou a solicitar um esclarecimento relativamente à aplicação da legislação nacional, não esclarecendo nem imputando a existência de qualquer constatação nem violação de uma disposição relativa aos requisitos da norma «boas condições agrícolas e ambientais» (a seguir «norma BCAA») relativas aos «Socalcos» (a seguir «norma BCAA‑Socalcos»). Acrescenta que, de qualquer forma, essa norma seria facultativa, na medida em que o Estado‑Membro dispõe de um poder de apreciação quanto à sua implementação, o que é corroborado pelo anexo III do Regulamento n.° 73/2009.

70      A Comissão contesta a procedência desta parte alegando que as constatações feitas na observação (3) do anexo I da Primeira Comunicação levantam sérias dúvidas relativamente à definição da norma BCAA Socalcos que não permite alcançar os objetivos regulatórios. A Comissão acrescenta que tais dúvidas constituíam apenas o prolongamento das preocupações que já tinham sido transmitidas numa carta datada de 27 de junho de 2012, enviada às autoridades portuguesas e que foi junta com a contestação no presente processo. Segundo a Comissão, esta carta, que a República Portuguesa contesta que possa ser submetida ao Tribunal Geral por não corresponder a comunicação trocada no âmbito do procedimento de apuramento, demonstra que a República Portuguesa conhecia bem as questões aqui em causa, mesmo antes de receber a Primeira Comunicação. Com efeito, a Comissão indica que esta carta continha a sua apreciação segundo a qual a norma em questão tinha sido considerada em falta, nomeadamente em 2010. Por último, a Comissão acrescenta que, de forma a clarificar a situação, tinha solicitado informação adicional, a qual foi discutida na reunião bilateral de 19 de fevereiro de 2014.

71      No que se refere ao argumento retirado do caráter facultativo da implementação da norma BCAA Socalcos, a Comissão alega que, nos termos do artigo 6.°, n.° 1, do Regulamento n.° 73/2009, se o Estado‑Membro opta por definir, como foi o caso no presente processo, uma norma desse tipo, deve cumpri‑la independentemente de a mesma ser ou não opcional. A Comissão observa que este ponto de vista foi, aliás, refletido na carta de 27 de junho de 2012, enviada às autoridades portuguesas.

72      A esse respeito, quanto à norma BCAA‑Socalcos, resulta do anexo I da Primeira Comunicação que a Comissão precisou, na observação (3), o seguinte:

«De acordo com o artigo 6.°, n.° 1, do Regulamento (CE) n.° 73/2009, do anexo III do mesmo regulamento consta o quadro com base no qual os Estados‑Membros devem definir, a nível nacional ou regional, os requisitos mínimos para as boas condições agrícolas e ambientais. O artigo 4.° do citado regulamento dispõe que qualquer agricultor que beneficie de pagamentos diretos deve respeitar as boas condições agrícolas e ambientais definidas, a que se refere o artigo 6.°

O artigo 149.°, alínea c), do mesmo regulamento, dispõe que a norma “Estabelecimento de faixas de proteção ao longo dos cursos de água” devia ser aplicada de 1 de janeiro de 2010 a 1 de janeiro de 2012.

As autoridades portuguesas confirmaram que, embora a norma tenha sido definida na legislação nacional, não foi ainda aplicada, pelo que tão‑pouco foi controlado o seu cumprimento no âmbito da condicionalidade. Daí resultou um risco para os fundos no período abrangido pela auditoria.

Pede‑se às autoridades portuguesas que tomem medidas corretivas para garantir a aplicação e o controlo do cumprimento da norma “Estabelecimento de faixas de proteção ao longo dos cursos de água”.

Além disso, a norma definida para “Socalcos” em 2010, 2011 e 2012, no âmbito da questão “Erosão do solo”, impõe que as parcelas armadas em terraços apresentem uma vegetação de cobertura no talude no período compreendido entre 15 de novembro e 1 de março, e que o controlo desta vegetação possa ser realizado sem reviramento do solo fora deste período. Pede‑se às autoridades portuguesas que expliquem de que modo cumpre o requisito, tal como definido, os objetivos da norma “Socalcos”.»

73      No caso, embora a Primeira Comunicação teça expressamente críticas quanto à norma BCAA «Estabelecimento de faixas de proteção ao longo dos cursos de água», ao entender que essa norma não foi aplicada nem controlada, o que apresentaria um risco para os Fundos, não se pode deixar de observar que essa comunicação não contém qualquer reserva nem medida corretiva quanto à norma BCAA‑Socalcos. Ao contrário da norma BCAA «Estabelecimento de faixas de proteção ao longo dos cursos de água», referida na observação (3) do anexo I da Primeira Comunicação, a Comissão não afirma expressamente que as autoridades portuguesas não aplicaram ou controlaram a norma BCAA‑Socalcos, antes se limita a pedir explicações.

74      Por outro lado, refira‑se que, ao contrário da norma BCAA «Estabelecimento de faixas de proteção ao longo dos cursos de água», a Primeira Comunicação não contém nenhuma medida corretiva a tomar quanto à norma BCAA‑Socalcos.

75      Nestas circunstâncias, há que considerar que, no que respeita à norma BCAA‑Socalcos relativamente aos exercícios 2010, 2011 e 2012, nos quais assentam as alegações da República Portuguesa, a Primeira Comunicação não identifica de modo suficientemente preciso, na aceção da jurisprudência acima referida nos n.os 62 a 67, as irregularidades imputadas ao Estado‑Membro que serviram de base à presente correção financeira.

76      Tem razão, portanto, a República Portuguesa quando alega, no âmbito da primeira parte do primeiro fundamento, que, no que respeita à norma BCAA‑Socalcos, a Primeira Comunicação não cumpre os requisitos do artigo 11.° do Regulamento n.° 885/2006.

–       Quanto à segunda parte, relativa aos RLG 2, 6, 11 e 12, previstos no Anexo II do Regulamento n.° 73/2009

77      A República Portuguesa considera que, no que respeita aos requisitos legais de gestão (a seguir: «RLG») 2, 6, 11 e 12, a observação (4) do anexo I da Primeira Comunicação não identifica as campanhas concretas nem o período de tempo que abrangem as verificações. Em sua opinião, da utilização dos termos «durante o período abrangido pela auditoria» resta supor que as verificações respeitam apenas à data da auditoria, ou seja, outubro de 2012 e não a campanhas ou períodos temporais anteriores. Face à inexistência de constatações relativamente aos anos de 2010 e 2011, a Comissão não podia, por conseguinte, concluir pela existência de risco para os Fundos. A República Portuguesa acrescenta que, relativamente às constatações identificadas como RLG (2, 6, 11 e 12), no que respeita ao ano de 2012, a Comissão se limita a solicitar um esclarecimento relativamente à aplicação das normas nacionais. Daí resulta que também relativamente a esse exercício não poderia a Comissão concluir pela existência de risco para os Fundos.

78      A Comissão contesta o mérito desta parte.

79      A esse respeito, há que lembrar que, por um lado, a Comissão informou as autoridades portuguesas de que seria levada a cabo uma missão de controlo relativa à condicionalidade entre 15 e 19 de outubro de 2012 e, por outro, que os resultados dessa missão de controlo foram comunicados à República Portuguesa pela Primeira Comunicação, baseada no artigo 11.° do Regulamento n.° 885/2006 (v. n.os 1 e 2, supra).

80      Na folha de rosto da Primeira Comunicação, a Comissão precisou que «[o] anexo do presente ofício cont[inha] as observações e os pedidos de informações complementares na sequência da investigação em epígrafe, relativamente aos exercícios de 2010 e seguintes».

81      Seguidamente, no anexo I da Primeira Comunicação, intitulado «Observações e Pedidos de Informação», a Comissão, quanto a cada um dos incumprimentos detetados, referiu‑se aos três exercícios 2010, 2011 e 2012 ou unicamente a alguns deles ou ainda a nenhum deles.

82      Quanto às constatações relativas aos RLG 2, 6, 11 e 12, como alega a República Portuguesa, a Comissão limitou‑se a utilizar os termos «no período abrangido pela auditoria» ou «durante o período de auditoria». Em resposta a uma questão do Tribunal Geral, a Comissão indicou, na audiência, que só tinha precisado no anexo I da Primeira Comunicação o ou os exercícios em causa quando uma constatação dizia respeito a um ou mais exercícios em particular. Acrescentou que, quando uma constatação era relativa aos três exercícios de 2010, 2011 e 2012 objeto do inquérito, bastava sublinhar que era válida para o período abrangido pela auditoria.

83      O Tribunal Geral considera que não se pode considerar que a indicação «no período abrangido pela auditoria» ou «durante o período de auditoria» não respeita os requisitos de precisão indicados na jurisprudência acima referida nos n.os59 a 67.

84      Com efeito, essa indicação dificilmente podia dar origem a confusão nas circunstâncias do caso, uma vez que, por um lado, a República Portuguesa sabia que a auditoria tinha por finalidade verificar a boa aplicação das regras relativas à condicionalidade nos três exercícios de 2010, 2011 e 2012 e que, por outro, a Comissão precisou na primeira página da Primeira Comunicação que «[o] anexo do presente ofício cont[inha] as observações e os pedidos de informações complementares na sequência da investigação em epígrafe, relativamente aos exercícios de 2010 e seguintes».

85      Deste modo, a República Portuguesa não pode validamente alegar que a utilização, na observação (4) do anexo I da Primeira Comunicação, dos termos «no período abrangido pela auditoria», dava a entender que as constatações respeitavam unicamente ao período em que decorreu a auditoria, a saber, o mês de outubro de 2012.

86      Nestas circunstâncias, há que considerar que, no que respeita aos RLG 2, 6, 11 e 12 relativos aos exercícios de 2010, 2011 e 2012, objeto das alegações da República Portuguesa, a Primeira Comunicação identifica de forma suficientemente precisa, na aceção da jurisprudência acima referida nos n.os 59 a 67, as irregularidades imputadas à República Portuguesa na base da correção financeira no caso presente.

87      Por conseguinte, a segunda parte do primeiro fundamento deve ser julgada improcedente.

–       Quanto à terceira parte, relativa ao calendário dos controlos in loco

88      A República Portuguesa lembra que a Comissão a acusou, na observação (5) da Primeira Comunicação, de ter efetuado controlos em 2010 e 2011 desprovidos de efeito dissuasor dado que estes últimos foram sistematicamente realizados após o mês de julho. No entanto, salienta que a Primeira Comunicação não cumpre a sua função de advertência relativamente ao ano de 2012, dado que não há nesta nenhuma constatação relativamente a esse ano.

89      A Comissão contesta a procedência desta parte.

90      A esse respeito, refira‑se que, quanto ao incumprimento do calendário dos controlos in loco, a Comissão observou, com base em informações transmitidas pela República Portuguesa, que «os controlos in loco [se tinham iniciado] tardiamente em 2010 e 2011». Tendo entendido que isso constituía uma irregularidade por enfraquecer o efeito dissuasor dos controlos relativos a esses dois anos, a Comissão considerou necessário obter informações junto das autoridades portuguesas relativas à repartição dos controlos in loco em 2012, a fim de verificar se essa irregularidade persistia. Na Primeira Comunicação, sublinhou o seguinte:

«Por conseguinte, estando os agricultores cientes da possibilidade de não serem controlados durante o primeiro semestre do ano civil (exceto [identificações eletrónicas] de animais a partir de 2011), o efeito dissuasor dos controlos in loco é significativamente enfraquecido, não podendo ser garantida a sua verificação, conforme disposto no artigo 26.° do Regulamento (CE) n.° 1122/2009. Pede‑se às autoridades portuguesas que informem sobre a situação respeitante à amostra de controlo da condicionalidade de 2012.»

91      Nestas condições, a República Portuguesa não pode validamente alegar que a Primeira Comunicação não cumpria a sua função de advertência quanto ao exercício de 2012 por não conter nenhuma constatação relativa a esse exercício. De resto, esta conclusão é plenamente corroborada pela resposta dada pela República Portuguesa a esse respeito no seu ofício de 30 de abril de 2013. Com efeito, no n.° 5 desse ofício, que a República Portuguesa intitulou «Amostra de controlo da condicionalidade de 2012», indicou que, «relativamente à amostra de controlo da condicionalidade de 2012 […], as primeiras datas de controlo [eram] todas mais recentes do que as referentes às campanhas de 2010 e 2011». Daí resulta, portanto, sem ambiguidade que a República Portuguesa tinha claramente compreendido que, tendo em conta os incumprimentos relativos aos exercícios de 2010 e 2011 mencionados na Primeira Comunicação, a Comissão pretendia verificar se esses incumprimentos persistiam quanto ao exercício de 2012.

92      Por conseguinte, a terceira parte do primeiro fundamento deve ser julgada improcedente.

–       Quanto à quarta parte, relativa às deficiências na aplicação da identificação eletrónica – RLG 8 – e no processo de comunicação de movimentos dos animais – RLG n.° 7

93      A República Portuguesa considera que embora seja certo que a Comissão faz, na observação (6) do anexo I da Primeira Comunicação, constatações sobre a identificação eletrónica de ovinos e caprinos, as referidas constatações limitavam‑se apenas ao período de janeiro a novembro de 2010. Quanto às constatações relativas, por um lado, à comunicação à base de dados central das informações sobre a circulação de ovinos e caprinos (observação (7) da Primeira Comunicação) e, por outro, ao prazo de comunicação a essa mesma base de dados das informações pertinentes, pelos detentores de bovinos [observação (8) do anexo I da Primeira Comunicação], a República Portuguesa acusa a Comissão de não ter indicado o período temporal a que se referiam essas verificações. Daqui conclui que as referidas constatações dizem unicamente respeito ao período da auditoria, isto é, outubro de 2012 e não aos exercícios ou períodos anteriores.

94      A Comissão contesta a procedência desta parte.

95      Antes de mais, a alegação relativa à identificação eletrónica dos ovinos e caprinos só pode improceder. Com efeito, embora seja verdade que a Comissão indicou, na observação (6) do anexo I da Primeira Comunicação, que, «no período de janeiro a novembro de 2010, não [tinham sido] cumpridos os requisitos de condicionalidade estabelecidos […] relativamente a todos os animais nascidos após 31 de dezembro de 2009», acrescentou imediatamente que, «[n]ão obstante o facto de ter sido aplicada a identificação eletrónica (quando aplicável) nas explorações visitadas pelos auditores responsáveis pela condicionalidade (outubro de 2012), subsist[iam] sérias dúvidas no que diz respeito à sua plena aplicação durante a integralidade dos exercícios de 2011 e 2012».

96      Uma vez que os três exercícios são expressamente referidos na observação (6) do anexo I da Primeira Comunicação, a República Portuguesa não pode validamente alegar que, no que respeita à identificação eletrónica dos ovinos e caprinos, as constatações da Comissão se limitaram ao período compreendido entre janeiro e novembro de 2010.

97      Seguidamente, no que respeita às constatações relativas à circulação de ovinos e caprinos, embora seja certo que, na observação (7) do anexo I da Primeira Comunicação, a Comissão teceu críticas fazendo referência ao período abrangido pela auditoria sem mencionar o ou os exercícios a que fazia referência, à semelhança das constatações relativas aos RLG 2, 6, 11 e 12, não se pode deixar de observar que essa ambiguidade foi expressamente removida tendo em conta a formulação do pedido de informações que se lhe seguiu. Com efeito, a Comissão, depois de ter tecido as suas críticas, indicou que «[se pedia] às autoridades portuguesas que esclare[cessem] o procedimento de comunicação dos movimentos dos animais no âmbito do RLG 8 (ovinos/caprinos), aplicável em 2010, 2011 e 2012».

98      Por último, pelas mesmas razões acima referidas no n.° 97, há que julgar improcedente a alegação relativa ao prazo de comunicação das informações relevantes pelos detentores de bovinos à base de dados central.

99      Com efeito, embora seja certo que, na observação (8) do anexo I da Primeira Comunicação, a irregularidade mencionada não está associada a nenhum exercício em particular, ao indicar que «[se pede] às autoridades portuguesas que esclareçam o procedimento de comunicação dos movimentos de animais no âmbito do RLG 7 (Bovinos) aplicável em 2010, 2011 e 2012», o pedido formulado pela Comissão dá a entender de forma manifesta que essa irregularidade era relativa aos exercícios de 2010 a 2012.

100    Consequentemente, a República Portuguesa não pode validamente alegar que, por um lado, quanto à circulação dos ovinos e dos caprinos e, por outro, quanto ao prazo de comunicação das informações relevantes pelos detentores de bovinos à base de dados central, as constatações da Comissão se limitavam ao período da auditoria, a saber, o mês de outubro de 2012.

101    Deve, portanto, a quarta parte do primeiro fundamento ser julgada improcedente.

–       Quanto à quinta parte, relativa às marcas auriculares em falta – RLG 7 e RLG 8

102    A República Portuguesa alega que a observação (9) do anexo I da Primeira Comunicação não faz referência a nenhum exercício e não contém um incumprimento de regras explícitas da União, pelo que a Comissão não poderia concluir pela existência de risco para os Fundos.

103    A Comissão contesta a procedência desta parte.

104    A esse respeito, há que lembrar que, na observação (9) do anexo I da Primeira Comunicação, a Comissão referiu o seguinte:

«Em relação aos controlos de [identificação eletrónica] de Bovinos (RLG 7) e ovinos/caprinos (RLG 8), só se verifica uma infração das normas da condicionalidade se faltarem ambas as marcas auriculares. Consequentemente, os animais a que for detetada a falta de uma marca auricular (com o código individual), embora registados como tal no relatório de controlo, não são considerados em situação irregular. A DG [Agricultura e Desenvolvimento Rural] recorda às autoridades portuguesas que, em conformidade com o documento de trabalho da Comissão DS/2009/31, a não aplicação de sanções por falta de uma marca auricular deve ter igualmente em conta a situação da taxa de perdas relativamente aos “limites normais”. Todavia, segundo informações recebidas, esses limites não foram definidos em Portugal, do que resultou um risco para os fundos no período abrangido pela auditoria.»

105    No seu ofício de 30 de abril de 2013, a República Portuguesa respondeu a essas constatações, no n.° 9 intitulado «Aplicação do documento de trabalho da Comissão DS/200[9]/31», sublinhando o seguinte:

«Pese embora a dificuldade […] em estabelecer um limite normal para as quedas de brincos, as autoridades portuguesas, com base num estudo estatístico a levar a efeito a partir dos registos da base de dados [central], irão fixar, para vigorar em 2014, o limite a partir do qual os bovinos com apenas uma marca auricular e sem pedido de brinco de substituição passarão a ser objeto de sanção.

O ano de 2013 será o ano de realização do estudo e o de sensibilização dos produtores para a alteração na grelha de pontuação relativamente às tolerâncias até agora consideradas.»

106    A esse respeito, quanto ao argumento da República Portuguesa de que a observação (9) do anexo I da Primeira Comunicação não faz referência a nenhum exercício, não se pode deixar de observar que a situação é idêntica à que é posta em causa na segunda parte do primeiro fundamento (v. n.os 77 a 87, supra), na medida em que a Comissão indica que existiu um risco para os Fundos no período abrangido pela auditoria. Assim, há que considerar que a República Portuguesa não pode alegar que a formulação desse ponto não respeita os requisitos de precisão indicados na jurisprudência acima referida nos n.os 59 a 67. Com efeito, não existe qualquer dúvida de que, com a expressão «no período abrangido pela auditoria», a Comissão visava os três exercícios de 2010, 2011 e 2012 (v. n.° 84, supra).

107    Quanto ao argumento de que a observação (9) do anexo I da Primeira Comunicação não contém a menção a qualquer violação de regras explícitas da União, não se pode considerar que a Comissão não mencionou nenhuma dessas regras, uma vez que acusa expressamente a República Portuguesa de não ter respeitado o documento de trabalho DS/2009/31 e que lhe pediu que tomasse medidas corretivas para o efeito, conforme acima resulta do n.° 105.

108    Em face destas considerações, a República Portuguesa não pode validamente alegar que, quanto às marcas auriculares em falta – RLG 7 e RLG 8 – a Primeira Comunicação não cumpre os requisitos do artigo 11.° do Regulamento n.° 885/2006.

109    Por conseguinte, a quinta parte do primeiro fundamento deve ser julgada improcedente.

–       Quanto à sexta parte, relativa à omissão do controlo no local do cumprimento dos requisitos mínimos aplicáveis aos produtos fitofarmacêuticos

110    A República Portuguesa salienta que a Comissão a acusa, no ponto 13.7.1.6 do relatório de síntese, de não ter respeitado o artigo 39.°, n.° 3, do Regulamento (CE) n.° 1698/2005 do Conselho, de 20 de setembro de 2005, relativo ao apoio ao desenvolvimento rural pelo Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural (Feader) (JO 2005, L 277, p. 1), com o fundamento de que o respeito do requisito de «as pessoas que aplicam produtos fitossanitários deve[rem] ter formação adequada (quer em termos de habilitações ou de frequência, com aprovação, em ações de formação) ou atuar sob a orientação de um técnico responsável», previsto na legislação nacional e indicado no programa de desenvolvimento rural (PDR), não foi objeto de controlos no local em 2010, em 2011 e em 2012. Ora, a República Portuguesa considera que a observação (12) do anexo I da Primeira Comunicação não contém nenhuma verificação quanto a esta alegada violação.

111    A Comissão alega que a sexta parte do primeiro fundamento não tem qualquer suporte, uma vez que a observação (12) do anexo I da Primeira Comunicação faz expressamente referência a essa violação.

112    A esse respeito, há que lembrar que, na observação (12) do anexo I da Primeira Comunicação, a Comissão refere nomeadamente o seguinte:

«O artigo 51.°, n.° 1, do Regulamento (CE) n.° 1698/2005 prevê uma redução ou o cancelamento dos pagamentos do pilar II se os beneficiários de ajuda ao abrigo do artigo 36.°, alínea a), subalínea iv), do Regulamento (CE) n.° 1698/2005 não cumprirem, em toda a exploração, os requisitos mínimos relativos à utilização de adubos e produtos fitossanitários, a que se refere o artigo 39.°, n.° 3, do mesmo regulamento. Durante a missão, os auditores não puderam determinar inequivocamente os requisitos mínimos relativos à utilização de adubos e produtos fitossanitários definidos e controlados em Portugal nem a sua aplicação aos beneficiários situados fora das zonas vulneráveis aos nitratos. Pede‑se às autoridades portuguesas que apresentem uma descrição clara desses requisitos definidos em Portugal relativamente a 2010, 2011 e 2012. Pede‑se ainda às mesmas autoridades que confirmem o órgão de controlo competente e que descrevam os controlos efetuados dentro e fora da amostra de controlo da condicionalidade nesses anos.»

113    No seu ofício de 30 de abril de 2013, a República Portuguesa respondeu a essas constatações, no n.° 12, intitulado «Pagamentos do Pilar II – Requisitos mínimos relativos à utilização de adubos e produtos fitossanitários definidos em Portugal relativamente a 2010, 2011 e 2012», salientando, quanto aos requisitos mínimos relativos à utilização de produtos fitofarmacêuticos, o seguinte:

«Os requisitos mínimos referentes aos produtos fitossanitários são assegurados pela aplicação do decreto‑lei n.° 173/2005 que regula no seu Cap[ítulo] III a segurança na aplicação de produtos fitofarmacêuticos. Algumas disposições foram aliás incorporadas nas BCAA. Assim, de acordo com essa legislação:

–      O utilizador deve ter formação adequada (formação académica ou frequência de ações de formação com aproveitamento) ou atuar sob orientação de técnico responsável».

114    Por último, o relatório de síntese menciona, nomeadamente no n.° 13.7.1.6, o seguinte:

«Aplicam‑se as seguintes disposições gerais: artigo 39.°, n.° 3, do Regulamento (CE) n.° 1698/2005.

O requisito de que “as pessoas que aplicam produtos fitossanitários devem ter formação adequada (quer em termos de habilitações ou de frequência, com aprovação, em ações de formação) ou atuar sob a orientação de um técnico responsável”, estabelecido pela legislação nacional e indicado no programa de desenvolvimento rural (PDR) não foi objeto de controlos no local em 2010, 2011 e 2012. Embora tenha sido controlado em anos anteriores, as autoridades portuguesas esclareceram que o artigo 5.°, n.° 2, da Diretiva 2009/128/CE (relativa à utilização sustentável dos pesticidas) estabeleceu o prazo de 26 de novembro de 2013 para que os profissionais que utilizassem produtos fitofarmacêuticos adquirissem a formação adequada. Contudo, uma vez que o prazo (31 de dezembro de 2010) já estabelecido para esta formação pela legislação nacional (Decreto n.° 173/2005) era anterior ao estabelecido pela Diretiva 2009/128/CE (26 de novembro de 2013), as mesmas autoridades informaram que não procuraram verificar a conformidade, porque consideraram a data anterior desfavorável para os agricultores. Assim, embora tenha sido considerada uma proposta para alterar o decreto nacional, foi decidido, em vez disso, suspender os controlos relativos a esta obrigação.

A DG [Agricultura e Desenvolvimento Rural] regista a explicação das autoridades portuguesas. Porém, nos termos do artigo 39.°, n.° 3, do Regulamento (CE) n.° 1698/2005, os requisitos mínimos no âmbito do segundo pilar são os estabelecidos pela legislação nacional e indicados no programa de desenvolvimento rural (PDR). Por conseguinte, a DG AGRI mantém que existiu um risco para os Fundos no período abrangido pela auditoria, uma vez que não foram realizados os controlos de verificação pertinentes.»

115    Há que observar desde logo que efetivamente não resulta expressamente da observação (12) do anexo I da Primeira Comunicação que a Comissão acuse em particular a República Portuguesa de ter violado o artigo 39.°, n.° 3, do Regulamento n.° 1698/2005 com base no facto de o requisito mínimo de «as pessoas que aplicam produtos fitossanitários deve[rem] ter formação adequada (quer em termos de habilitações ou de frequência, com aprovação, em ações de formação) ou atuar sob a orientação de um técnico responsável» não ter sido sujeito a nenhum controlo no local em 2010, em 2011 e em 2012.

116    Não é menos verdade que a alegação feita no relatório de síntese está necessariamente, pelo menos de forma implícita, englobada na afirmação feita pela Comissão na observação (12) do anexo I da Primeira Comunicação. Com efeito, ao indicar que, durante a missão, os auditores não puderam determinar inequivocamente os requisitos mínimos relativos à utilização de adubos e produtos fitossanitários definidos e controlados em Portugal nem a sua aplicação aos beneficiários situados fora das zonas vulneráveis aos nitratos, a Comissão se referia a todos os requisitos mínimos sem exceção, incluindo aquele que acabou por ser tido em conta no relatório de síntese.

117    Refira‑se, a esse respeito, que, em resposta à Primeira Comunicação, a República Portuguesa descreveu os requisitos mínimos definidos e aplicados em Portugal. A Comissão entendeu que, entre todos os requisitos descritos, o da formação adequada das pessoas que utilizam produtos fitossanitários não era satisfatório.

118    Por conseguinte, a sexta parte do primeiro fundamento deve ser julgada improcedente.

–       Quanto à sétima parte, relativa à aplicação de reduções e exclusões

119    A República Portuguesa refere que a Comissão baseia o incumprimento relativo à aplicação de reduções e exclusões em estatísticas de 2010 e de 2011 e alega que não foi apresentada nenhuma verificação quanto ao exercício de 2012.

120    A Comissão contesta a procedência desta parte.

121    Há que lembrar que, na observação (14) do anexo I da Primeira Comunicação, a Comissão referiu nomeadamente o seguinte:

«[A] avaliação do incumprimento determinado é ponderada, sendo o total de pontos atribuídos por infrações ‑ por ato, área, ou norma BCAA ‑ dividido pelo total de pontos disponíveis. Esta “ponderação” reduz, efetivamente, a probabilidade de aplicação de uma taxa de sanção mais elevada, particularmente no caso em que o ato ou a área contém muitos requisitos. Tal reflete‑se ainda nas estatísticas de controlo anuais de 2010 e 2011, tendo as taxas de sanção inferiores a 3% sido aplicadas mais frequentemente, como se indica no quadro infra

122    Ora, em face da redação da observação (14) do anexo I da Primeira Comunicação, a República Portuguesa não pode validamente alegar que a Comissão não invocou nenhuma verificação quanto ao exercício 2012. Com efeito, resulta dessa observação que a Comissão entendeu que o sistema de avaliação em geral era deficiente nos exercícios de 2010 a 2012, primeiro, com base nas verificações efetuadas em 2012, para entender, por outro lado, que esse era igualmente o caso em 2010 e 2011, conforme demonstravam as estatísticas de controlos relativas a esses dois exercícios.

123    Portanto, há que julgar improcedente a sétima parte do primeiro fundamento.

–       Quanto à oitava parte, relativa aos controlos de qualidade

124    A República Portuguesa considera que, quanto ao incumprimento relativo aos controlos de qualidade, a observação (20) do anexo I da Primeira Comunicação não podia desempenhar a sua função de advertência quanto aos exercícios de 2010 e 2012, pois não existia nenhuma constatação quanto a esses dois exercícios.

125    Segundo a Comissão, embora seja certo que as anomalias apuradas se referem apenas a 2011, não é menos certo que aquelas foram apenas as que foi possível encontrar durante a auditoria e que cabia ao Estado Português demonstrar que as mesmas resultavam de uma situação contida e pontual. Por outro lado, a Comissão observa, mais uma vez, que atendendo à redação da primeira página da Primeira Comunicação, a República Portuguesa não podia ter dúvidas quanto ao período abrangido pelas verificações.

126    Quanto a esse incumprimento, a Comissão indicou, na observação (20) do anexo I da Primeira Comunicação, o seguinte:

«As informações obtidas pelo inspetor durante o controlo in loco são registadas pela autoridade de controlo competente no sistema informático (iDigital), que é seguidamente carregado e disponibilizado ao organismo pagador através da aplicação informática central (iSinga). Consequentemente, qualquer elemento de controlo registado e carregado como não conforme é automaticamente avaliado pelo sistema informático, sendo aplicada a taxa sanção correspondente. No entanto, a análise de processos, efetuada durante a missão, suscita dúvidas sobre a fiabilidade do sistema informático e a aplicação da correspondente sanção por incumprimento das normas de condicionalidade em todos os casos, conforme dispõe o artigo 71.° do Regulamento (CE) n.° 1122/2009. Na análise de processos, foram detetadas as seguintes anomalias:

[…]

As autoridades portuguesas explicaram que esta deficiência decorria de uma alteração introduzida no sistema informático para a aplicação de sanções e que os seus efeitos se limitavam ao exercício de 2011. Pede‑se às mesmas autoridades que confirmem o número desses casos e que prestem informações pormenorizadas sobre as medidas de acompanhamento tomadas em cada caso, em termos de recuperações dos beneficiários.»

127    No seu ofício de 30 de abril de 2013, a República Portuguesa respondeu a essas constatações, no n.° 20, intitulado «Fiabilidade do sistema informático», salientando o seguinte:

«Alteração do sistema informático – Foram detetados 6 beneficiários com alteração de taxa em que o valor final de penalização apurado foi de 4 766,16 [EUR], conforme consta do quadro em anexo (anexo IV). Estas situações apenas se verificaram relativamente ao ano 2011.»

128    No n.° 20 da ata da reunião bilateral, indica‑se nomeadamente que «[a]s autoridades portuguesas confirmaram que a taxa de sanção aplicável em 2011 aos seis processos em causa ascend[ia] a um total de 4 766,16 EUR [e que lhes era pedido] que confirm[assem] a execução da redução correta do pagamento (no valor total de 4 766,16 EUR) nos seis casos em causa».

129    Como acertadamente alega a República Portuguesa e sem impugnação da Comissão, não se pode deixar de observar que tanto as constatações efetuadas pela Comissão como o pedido de informações complementares se concentram no exercício de 2011. Nada dá a entender, pela forma como são formuladas essas constatações, que a Comissão tivesse detetado anomalias que dissessem necessariamente respeito aos três exercícios de 2010, 2011 e 2012. Ao contrário dos incumprimentos formulados nas observações (4) e (9) do anexo I da Primeira Comunicação, a Comissão não indicou que esses incumprimentos tivessem sido apurados relativamente ao período abrangido pela auditoria, o que teria deixado claramente subentendido que as constatações valiam para os três exercícios referidos. Por outro lado, refira‑se que, desde o início do procedimento administrativo, a República Portuguesa alega que a irregularidade detetada pela Comissão nos processos de 2011 se devia a uma alteração introduzida no sistema informático para a aplicação de sanções, mas que se limitava ao exercício de 2011, e que seguidamente esta se limitou a pedir unicamente informações sobre esse exercício.

130    Nestas condições, há que considerar que as constatações sobre os controlos de qualidade só estão regularmente formuladas quanto ao exercício de 2011. Na falta de constatações e de medidas corretivas relativas aos exercícios de 2010 e 2012 formuladas no termo de um procedimento regular, a Comissão não podia concluir pela existência de um risco para os Fundos quanto a esses exercícios, mesmo apesar de se indicar, na primeira página da Primeira Comunicação, que o inquérito abrangia os exercícios de 2010 e seguintes. Com efeito, só por si, essa indicação não basta para considerar que a República Portuguesa deveria ter compreendido que eram visados os exercícios de 2010 e 2012, quando só o exercício de 2011 tinha sido mencionado e tinha sido objeto de trocas no procedimento de apuramento.

131    Tem razão, pois, a República Portuguesa ao alegar, no âmbito da oitava parte do primeiro fundamento, que, quanto aos controlos de qualidade, a Primeira Comunicação não cumpre os requisitos do artigo 11.° do Regulamento n.° 885/2006 no respeitante aos exercícios de 2010 e 2012.

 Quanto às consequências a extrair do exame do mérito do quinto, sexto e primeiro fundamentos

132    Conforme acima resulta dos n.os 76 e 131, verificou‑se que a Comissão tinha cometido erros na adoção da decisão impugnada. Contudo, há que determinar se, nas circunstâncias específicas do caso, esses erros podem levar à anulação da decisão impugnada.

133    A esse respeito, embora seja certo que a existência de uma irregularidade relativa ao princípio dos direitos de defesa só pode dar origem a uma anulação na medida em que o procedimento em causa pudesse ter levado a um resultado diferente, no caso de a parte ter podido assegurar melhor a sua defesa se não existisse essa irregularidade (v., neste sentido, Acórdão de 12 de julho de 2017, Estónia/Comissão, T‑157/15, não publicado, EU:T:2017:483, n.° 151), no caso presente, não é necessário analisar se esse pressuposto está preenchido. Com efeito, resulta da jurisprudência que, mesmo que um dos fundamentos em que se baseia um ato controvertido esteja ferido de erro, esse vício pode, ainda assim, não levar à anulação desse ato se os outros fundamentos da decisão impugnada forem suficientes para demonstrar a sua correção (v. Acórdão de 29 de março de 2017, Países Baixos/Comissão, T‑501/15, não publicado, EU:T:2017:230, n.° 70 e jurisprudência aí referida).

134    Neste contexto, conforme salientou no relatório de síntese e na audiência em resposta a uma questão do Tribunal Geral, a Comissão podia aplicar um coeficiente de correção financeira de 5% a título de cada uma das deficiências identificadas no sistema de controlos instituído pela República Portuguesa. No n.° 13.7.3 do relatório de síntese, a Comissão resumiu o conjunto das deficiências detetadas quanto aos exercícios de 2010, 2011 e 2012, indicando as correções forfetárias propostas, em aplicação das orientações previstas no documento 2005‑64043.

135    Essas deficiências são relativas respetivamente à norma BCAA‑Socalcos (primeira parte do primeiro fundamento); à norma BCAA «Estabelecimento de faixas de proteção ao longo dos cursos de água», aos RLG 2, 6, 11 e 12 (segunda parte do primeiro fundamento); às limitações no âmbito dos controlos no local do «RLG 9»; ao calendário dos controlos no local (terceira parte do primeiro fundamento e terceiro fundamento); à não aplicação, ao pagamento correto, de sanções por controlos tardios efetuados após o ano «n»; à aplicação deficiente da identificação eletrónica – RLG 8 (quarta parte do primeiro fundamento); às marcas auriculares em falta – RLG 7 e RLG 8 (quinta parte do primeiro fundamento e quarto fundamento); à omissão do controlo no local do cumprimento dos requisitos mínimos aplicáveis aos produtos fitofarmacêuticos (sexta parte do primeiro fundamento); à aplicação de reduções e exclusões (sétima parte do primeiro fundamento e segundo fundamento) e, por último, aos controlos de qualidade (oitava parte do primeiro fundamento).

136    Na audiência, em resposta a uma questão do Tribunal Geral, as partes afirmaram que todas essas deficiências tinham sido impugnadas nas oito partes do primeiro fundamento e ainda no segundo, terceiro e quarto fundamentos.

137    Ora, por um lado, apesar do que as partes possam ter dito na audiência, não se pode deixar de observar que as deficiências relativas à norma BCAA «Estabelecimento de faixas de proteção ao longo dos cursos de água», às limitações no âmbito dos controlos no local do «RLG 9» e à não aplicação, ao pagamento correto, de sanções por controlos tardios efetuados após o ano «n» não foram objeto de impugnação no presente recurso. Por outro lado, embora resulte da análise do primeiro fundamento que a República Portuguesa conseguiu demonstrar que a Comissão tinha cometido erros na adoção da decisão impugnada quanto à norma BCAA‑Socalcos (n.° 76, supra) e aos controlos de qualidade (n.° 131, supra), não se pode deixar de observar que isso não aconteceu quanto às outras deficiências imputadas pela Comissão no relatório de síntese.

138    Assim, não obstante os erros que afetam dois fundamentos em que a Comissão baseou a correção, há que observar que o dispositivo da decisão impugnada assenta em seis fundamentos, cujo mérito não foi validamente posto em causa no âmbito do primeiro, quinto e sexto fundamentos de recurso e que não foram objeto do segundo, terceiro e quarto fundamentos de recurso. Esses seis fundamentos são os relativos à norma BCAA «Estabelecimento de faixas de proteção ao longo dos cursos de água»; aos RLG 2, 6, 11 e 12; às limitações no âmbito dos controlos no local do «RLG 9»; à não aplicação, ao pagamento correto, de sanções por controlos tardios efetuados após o ano «n»; às deficiências na aplicação da identificação eletrónica – RLG 8 e à omissão do controlo no local do cumprimento dos requisitos mínimos aplicáveis aos produtos fitofarmacêuticos.

139    Uma vez que cada um desses seis fundamentos basta, só por si, para servir de base ao raciocínio da Comissão e para justificar a aplicação de uma correção forfetária de 5%, há que julgar improcedentes, por inoperantes, a primeira e a oitava partes do primeiro fundamento, na medida em que não são aptas, mesmo apesar de fundadas, a levar à anulação da decisão impugnada. São igualmente inoperantes o segundo, terceiro e quarto fundamentos, respetivamente relativos a erros alegadamente cometidos pela Comissão no respeitante às deficiências relativas à aplicação de reduções e exclusões, ao calendário dos controlos no local e às marcas auriculares em falta – RLG 7 e RLG 8. Com efeito, mesmo admitindo‑os fundados, esses fundamentos não podem levar à anulação parcial da decisão impugnada, visto não ter a República Portuguesa demonstrado que todos os fundamentos com base nos quais foi fixada a correção forfetária de 5% estavam feridos de ilegalidade.

140    Em face do exposto, há que negar integralmente provimento ao recurso.

 Quanto às despesas

141    Nos termos do artigo 134.°, n.° 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

142    De acordo com o artigo 135.°, n.° 1, do Regulamento de Processo, quando a equidade o exija, o Tribunal Geral pode decidir que uma parte vencida suporte, para além das suas próprias despesas, unicamente uma fração das despesas da outra parte.

143    Em face das circunstâncias do caso, o Tribunal Geral entende que se deve condenar a República Portuguesa a suportar, para além das suas próprias despesas, três quartos das despesas da Comissão.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Quarta Secção)

decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      A República Portuguesa suportará, para além das suas próprias despesas, três quartos das despesas da Comissão Europeia.

3)      A Comissão suportará um quarto das suas despesas.

Kanninen

Schwarcz

Iliopoulos

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 26 de setembro de 2018.

O secretário

 

O presidente

E. Coulon

 

      H. Kanninen


Índice


Antecedentes do litígio

Tramitação do processo e pedidos das partes

Questão de direito

Quanto ao exame do mérito dos fundamentos

Quanto ao quinto fundamento, relativo à violação do princípio ne bis in idem

Quanto ao sexto fundamento, relativo à violação do princípio da proporcionalidade e do artigo 31.° do Regulamento n.° 1290/2005

Quanto ao primeiro fundamento, relativo a falta de fundamentação e violação do artigo 11.° do Regulamento n.° 885/2006

– Quanto à primeira parte relativa à norma BCAA Socalcos

– Quanto à segunda parte, relativa aos RLG 2, 6, 11 e 12, previstos no Anexo II do Regulamento n.° 73/2009

– Quanto à terceira parte, relativa ao calendário dos controlos in loco

– Quanto à quarta parte, relativa às deficiências na aplicação da identificação eletrónica – RLG 8 – e no processo de comunicação de movimentos dos animais – RLG n.° 7

– Quanto à quinta parte, relativa às marcas auriculares em falta – RLG 7 e RLG 8

– Quanto à sexta parte, relativa à omissão do controlo no local do cumprimento dos requisitos mínimos aplicáveis aos produtos fitofarmacêuticos

– Quanto à sétima parte, relativa à aplicação de reduções e exclusões

– Quanto à oitava parte, relativa aos controlos de qualidade

Quanto às consequências a extrair do exame do mérito do quinto, sexto e primeiro fundamentos

Quanto às despesas


*      Língua do processo: português.