Language of document : ECLI:EU:T:2022:517

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Quarta Secção)

7 de setembro de 2022 (*)

«Função pública — Funcionários — Teletrabalho — Pedido de reembolso das despesas de telefone e de ligação à Internet — Indeferimento do pedido — Exceção de ilegalidade — Admissibilidade parcial — Artigo 71.o e anexo VII do Estatuto — Dever de solicitude — Princípio da igualdade e da não discriminação — Direito ao respeito pela vida privada»

No processo T‑486/21,

OE, representada por G. Hervet, advogado,

recorrente,

contra

Comissão Europeia, representada por I. Melo Sampaio e L. Vernier, na qualidade de agentes,

recorrida,

apoiada por:

Parlamento Europeu, representado por M. Windisch, S. Bukšek Tomac e J. Van Pottelberge, na qualidade de agentes,

e por:

Conselho da União Europeia, representado por M. Bauer, na qualidade de agente,

intervenientes,

O TRIBUNAL GERAL (Quarta Secção),

composto por: S. Gervasoni, presidente, L. Madise e R. Frendo (relatora), juízes,

secretário: E. Coulon,

vistos os autos, em particular:

—        a petição que deu entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 3 de agosto de 2021,

—        os pedidos de intervenção do Conselho da União Europeia e do Parlamento Europeu de 27 de setembro e de 17 de novembro de 2021, que o presidente da Quarta Secção do Tribunal Geral deferiu, respetivamente, em 12 de novembro e 15 de dezembro de 2021,

visto não terem as partes requerido a marcação de uma audiência de alegações no prazo de três semanas a contar da notificação do encerramento da fase escrita do processo e tendo sido decidido, nos termos do artigo 106.o, n.o 3, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, julgar o recurso sem fase oral do processo,

profere o presente

Acórdão

1        Com o seu recurso baseado no artigo 270.o TFUE, a recorrente, OE, pede, em substância, por um lado, a anulação da Decisão do Serviço de Infraestruturas e Logística em Bruxelas (OIB) da Comissão Europeia, de 18 de dezembro de 2020, que indeferiu o seu pedido de reembolso das despesas profissionais decorrentes do regime de teletrabalho obrigatório e de obtenção de um dispositivo USB 4G, e, por outro, a condenação da Comissão, em primeiro lugar, no reembolso destas despesas, em seguida, na concessão de um acesso à Internet e, por fim, no pagamento de uma indemnização no montante de 10 000 euros pelos danos por si sofridos.

I.      Antecedentes do litígio

2        A recorrente era, à data dos factos, funcionária da Comissão.

3        Em 17 de março de 2020, os residentes na Bélgica foram confinados em razão da pandemia da COVID‑19. À semelhança da quase totalidade dos funcionários da Comissão, a recorrente foi obrigada a exercer as suas funções em regime de teletrabalho a partir dessa data.

4        Para que lhe fossem prestados serviços telefónicos e de acesso à Internet, a recorrente celebrou com a sociedade VOO um contrato de subscrição que cobria, nomeadamente, um volume mensal de dados Internet de 100 gigabytes (GB) por um custo fixo mensal de 37,46 euros. Ultrapassado este limite, ser‑lhe‑ia cobrada uma tarifa adicional.

5        A VOO cobrou à recorrente 1,89 euros pelas chamadas telefónicas efetuadas em setembro de 2020 para o serviço de assistência informática e para a Direção‑Geral (DG) da Informática da Comissão. Em novembro de 2020, a VOO cobrou‑lhe, além disso, 50 euros adicionais pelo consumo, durante o mês de outubro de 2020, de 137,434 GB adicionais ao seu pacote fixo de Internet.

6        Considerando que as despesas mencionadas no n.o 5, supra, se deviam ao regime de teletrabalho instituído pela Comissão, a recorrente submeteu, em 2 de dezembro de 2020, ao abrigo do artigo 90.o, n.o 1, do Estatuto dos Funcionários da União Europeia (a seguir «Estatuto»), um pedido de reembolso no montante de 51,89 euros.

7        Em 7 de dezembro de 2020, a recorrente completou o seu pedido solicitando que a Comissão lhe fornecesse, bem como a todos os funcionários que se encontrassem numa situação de teletrabalho semelhante, um dispositivo USB 4G que lhe permitisse aceder à Internet para fins profissionais fora das instalações da Comissão.

8        Por decisão de 18 de dezembro de 2020, o OIB da Comissão indeferiu o pedido da recorrente relativo ao reembolso das suas despesas «no que respeita aos custos por si suportados e/ou ao equipamento por si adquirido». Indicou nomeadamente à recorrente que podia beneficiar, sob determinadas condições, do reembolso do custo de aquisição, para o seu domicílio, de uma cadeira de escritório e de um ecrã de computador (a seguir «equipamento de escritório»). Indicou‑lhe igualmente que, visto que tinham sido estabelecidas as normas de reembolso das despesas incorridas com a aquisição de equipamento de escritório para o domicílio e que as mesmas não previam as despesas de Internet e chamadas telefónicas, não seria dado seguimento ao seu pedido.

9        Em 8 de janeiro de 2021, a recorrente apresentou uma reclamação que tinha por objeto o reembolso das despesas referidas no n.o 6, supra, bem como a obtenção de um acesso à Internet a título profissional.

10      Em 5 de maio de 2021, a autoridade investida do poder de nomeação (a seguir «AIPN») indeferiu a reclamação da recorrente, essencialmente com base no facto de nenhum fundamento jurídico, nem no artigo 71.o do Estatuto, nem na Decisão da Comissão, de 17 de dezembro de 2015, relativa à implementação do teletrabalho nos seus serviços, nem nas Orientações da Comissão relativas ao teletrabalho durante a pandemia da COVID‑19 (a seguir «Orientações relativas ao teletrabalho»), na sua versão aplicável em 18 de dezembro de 2020, data da Decisão mencionada no n.o 8, supra, permitir deferir os seus pedidos (a seguir «Decisão de indeferimento da reclamação»).

11      A AIPN recordou que, por força, nomeadamente, do artigo 9.o, n.o 3, da Decisão da Comissão, de 17 de dezembro de 2015, relativa à implementação do teletrabalho nos seus serviços, cabe ao teletrabalhador suportar as despesas de subscrição dos serviços de Internet e comunicação que resultam do teletrabalho e que o direito ao reembolso das despesas profissionais, previsto no artigo 71.o do Estatuto, deve ser exercido em conformidade com as condições fixadas no anexo VII do Estatuto, que não menciona essas despesas. Indicou igualmente, por um lado, que alguns funcionários das instituições da União Europeia beneficiavam de apoio financeiro para as despesas em causa, concedido mediante o abatimento do imposto previsto no artigo 3.o, n.o 4, do Regulamento (CEE, Euratom, CECA) n.o 260/68 do Conselho, de 29 de fevereiro de 1968, que fixa as condições e o processo de aplicação do imposto estabelecido em proveito das Comunidades Europeias (JO 1968, L 56, p. 8), que se traduz numa redução de 10 % da matéria coletável para as despesas profissionais, e, por outro, que a recorrente beneficiava deste abatimento. A AIPN considerou que a recusa de reembolso da quantia pedida não era suscetível de pôr em causa a igualdade de tratamento entre funcionários, nem em função da sua posição hierárquica, nem em função das condições de acesso à Internet, e que a mesma não implicava, relativamente à recorrente, uma violação de uma alegada obrigação contratual de utilizar a sua subscrição Internet apenas para fins privados.

12      Entretanto, em 21 de abril de 2021, a recorrente submeteu outro pedido ao abrigo do artigo 90.o, n.o 1, do Estatuto, relativo à concessão de um «volume de dados Internet no domicílio para uso profissional». Por Decisão de 14 de julho de 2021, o Serviço de Gestão e Liquidação dos Direitos Individuais (PMO) da Comissão, indeferiu esse pedido com o fundamento de que tinha o mesmo objeto que a reclamação da recorrente, de 8 de janeiro 2021, já indeferida pela decisão de indeferimento da reclamação.

13      Além disso, em 3 de maio de 2021, a recorrente informou o seu chefe de unidade por correio eletrónico de que, «perante a falta de Internet», não lhe era possível aceder ao servidor e às ferramentas informáticas, mas que continuaria disponível para dar cumprimento a quaisquer instruções a partir do seu domicílio, tendo‑o ainda informado de que estava contactável por telefone. Tendo em conta esta mensagem de correio eletrónico, a DG dos Recursos Humanos e da Segurança informou a recorrente, em 19 de maio seguinte, de que, no dia 3 de maio de 2021, a sua ausência tinha sido considerada irregular e que fora descontado um dia das suas férias anuais. Em 16 de julho de 2021, a recorrente apresentou reclamação desta decisão.

II.    Pedidos das partes

14      A recorrente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

—        a título principal, declarar a ilegalidade do artigo 71.o do Estatuto em que se baseia a decisão de indeferimento da reclamação;

—        A título subsidiário, anular a decisão de indeferimento da reclamação;

—        em consequência, condenar a Comissão:

—        no pagamento do montante de 51,89 euros a título de reembolso das despesas profissionais;

—        na concessão, no âmbito do teletrabalho, de um acesso à Internet para uso profissional por qualquer meio;

—        no pagamento do montante de 10 000 euros a título de reparação dos diferentes danos sofridos;

—        condenar a Comissão nas despesas.

15      A Comissão conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

—        negar provimento ao recurso;

—        condenar a recorrente nas despesas.

16      O Parlamento Europeu e o Conselho da União Europeia concluem pedindo que o Tribunal Geral se digne negar provimento ao recurso.

III. Questão de direito

A.      Quanto ao primeiro pedido

17      Com o seu primeiro pedido a recorrente pede, a título principal, que o Tribunal Geral se digne declarar a ilegalidade do artigo 71.o do Estatuto. Para o efeito, deduz uma exceção de ilegalidade deste artigo, que dispõe que o funcionário tem direito ao reembolso das despesas que tiver suportado por ocasião, nomeadamente, do exercício das suas funções, nas condições fixadas no anexo VII do mesmo Estatuto.

18      Ora, enquanto pedido autónomo relativamente aos restantes, este pedido deve ser julgado inadmissível por incompetência, visto que o artigo 270.o TFUE e os artigos 90.o e 91.o do Estatuto não conferem competência ao juiz da União para proferir tais declarações jurídicas (v., neste sentido, Acórdão de 16 de janeiro de 2018, SE/Conselho, T‑231/17, não publicado, EU:T:2018:3, n.o 63 e jurisprudência referida).

B.      Quanto ao segundo pedido

1.      Quanto ao objeto e à admissibilidade do segundo pedido

19      Com o seu segundo pedido, a recorrente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne anular a decisão de indeferimento da reclamação.

20      Todavia, tal como alega a Comissão, segundo jurisprudência constante, um pedido de anulação formalmente apresentado contra uma decisão de indeferimento de uma reclamação tem por efeito, caso essa decisão seja destituída de conteúdo autónomo, submeter à apreciação do Tribunal Geral o ato contra o qual foi apresentada a reclamação (v. Acórdão de 13 de janeiro de 2021, ZR/EUIPO, T‑610/18, não publicado, EU:T:2021:5, n.o 24 e jurisprudência referida).

21      Ora, no caso em apreço, há que constatar que a decisão de indeferimento da reclamação está efetivamente destituída de conteúdo autónomo e que, por conseguinte, não há que proferir decisão sobre a mesma. Com efeito, é certo que nessa decisão a AIPN se pronunciou quanto ao pedido de reembolso das despesas que excediam o pacote fixo da recorrente e quanto ao fornecimento a esta de um meio de acesso à Internet. No entanto, na sua Decisão de 18 de dezembro de 2020, o próprio OIB já tinha adotado uma posição, por um lado, relativamente ao reembolso em questão e, por outro, relativamente à concessão de um equipamento, sob a forma de um dispositivo USB 4G, mencionado pela recorrente na sua mensagem de correio eletrónico de 7 de dezembro de 2020 (v. n.o 8, supra).

22      Assim, há que considerar que, com o seu segundo pedido, a recorrente pretende obter a anulação da Decisão do OIB, de 18 de dezembro de 2020, relativa ao indeferimento do seu pedido destinado, por um lado, ao reembolso do montante de 51,89 euros, apresentado como despesa profissional resultante do regime de teletrabalho obrigatório e, por outro, à obtenção de um dispositivo USB 4G (a seguir «decisão recorrida»).

23      Além disso, a Comissão sustenta que o segundo pedido não é admissível uma vez que visa a anulação da Decisão do PMO, de 14 de julho de 2021, relativa ao indeferimento do pedido da recorrente de 21 de abril de 2021, destinado à obtenção de um volume de acesso à Internet para uso profissional, uma vez que o mesmo não foi precedido de reclamação.

24      Não obstante, como decorre do n.o 21, supra, em substância a recorrente já tinha submetido este pedido de acesso à Internet, sendo que o OIB, na decisão recorrida, e, posteriormente, a AIPN, na decisão de indeferimento da reclamação, já se tinham pronunciado sobre o mesmo. A Decisão do PMO de 14 de julho de 2021 (v. n.o 12, supra) fundamenta‑se aliás no caráter redundante do pedido de 21 de abril de 2021.

25      Nestas condições, há que interpretar o segundo pedido no sentido de que tem por objeto a anulação da decisão recorrida, incluindo na parte em que recusa conceder à recorrente um acesso à Internet para uso profissional. Por conseguinte, este pedido é admissível.

2.      Quanto aos fundamentos invocados em apoio do segundo pedido

26      Em apoio dos seus pedidos de anulação da decisão recorrida, a recorrente invoca cinco fundamentos, relativos, o primeiro, a uma exceção de ilegalidade do artigo 71.o e do anexo VII do Estatuto, o segundo, apresentado a título subsidiário, à violação deste artigo, o terceiro, à violação do dever de solicitude e do direito a uma boa administração, o quarto, à violação do princípio da não discriminação e, o quinto, à violação do artigo 7.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta»).

a)      Quanto ao primeiro fundamento, relativo a uma exceção de ilegalidade do artigo 71.o e do anexo VII do Estatuto

1)      Quanto à admissibilidade do primeiro fundamento

27      O Parlamento invoca dois fundamentos de inadmissibilidade contra a exceção de ilegalidade do artigo 71.o e do anexo VII do Estatuto. O primeiro é relativo à imprecisão do primeiro fundamento e, o segundo, é relativo à inobservância do caráter incidental das exceções de ilegalidade.

28      Há que salientar, a este respeito, que, segundo o artigo 142.o, n.o 1, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a intervenção só pode ter por objeto apoiar, no todo ou em parte, os pedidos de uma das partes principais. Além disso, segundo o artigo 142.o, n.o 3, do mesmo Regulamento, o interveniente aceita o litígio no estado em que se encontra no momento da sua intervenção.

29      Resulta destas disposições que uma parte que é admitida a intervir num litígio em apoio da parte recorrida não tem legitimidade para suscitar um fundamento de inadmissibilidade que não foi formulado nos pedidos desta última (v. Acórdão de 1 de julho de 2008, Chronopost e La Poste/UFEX e o., C‑341/06 P e C‑342/06 P, EU:C:2008:375, n.o 67 e jurisprudência referida).

30      Daqui resulta que o Parlamento não tem legitimidade para suscitar os dois fundamentos de inadmissibilidade mencionados no n.o 27, supra, pelo que o Tribunal Geral não está obrigado a pronunciar‑se expressamente quanto ao mérito dos mesmos.

31      Não obstante, uma vez que, em conformidade com o artigo 129.o do Regulamento de Processo, o Tribunal Geral pode, a todo o tempo e oficiosamente, ouvidas as partes principais, apreciar os fundamentos de inadmissibilidade de ordem pública, no caso em apreço, por razões de boa administração da justiça, há que examinar os referidos fundamentos de inadmissibilidade de ordem pública [v., neste sentido, Acórdãos de 24 de março de 1993, CIRFS e o./Comissão, C‑313/90, EU:C:1993:111, n.o 23, e de 19 de setembro de 2018, HH Ferries e o./Comissão, T‑68/15, EU:T:2018:563, n.o 41 (não publicado)].

i)      Quanto ao primeiro fundamento de inadmissibilidade, relativo à imprecisão do primeiro fundamento

32      No seu articulado de intervenção, o Parlamento defende que a exceção de ilegalidade suscitada pela recorrente é imprecisa na medida em que a mesma se limita a alegar que, ao não prever nenhuma modalidade de execução das funções em contexto de teletrabalho, para efeitos de um eventual reembolso das despesas, o artigo 71.o do Estatuto, lido em conjugação com o anexo VII do mesmo, é «particularmente problemático». O Parlamento tem dificuldade em determinar em que consiste este problema e a ilegalidade de que se queixa a recorrente.

33      A este respeito, há que recordar que, nos termos do artigo 21.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia e do artigo 76.o, alínea d), do Regulamento de Processo, a petição deve conter o objeto do litígio e uma exposição sumária dos fundamentos invocados.

34      A fim de garantir a segurança jurídica e uma boa administração da justiça, essa exposição sumária dos fundamentos do recorrente deve ser suficientemente clara e precisa para permitir ao recorrido preparar a sua defesa e à jurisdição competente pronunciar‑se sobre o recurso (Acórdão de 11 de setembro de 2014, MasterCard e o./Comissão, C‑382/12 P, EU:C:2014:2201, n.o 41).

35      No caso em apreço, na sua exceção de ilegalidade, a recorrente critica o artigo 71.o e o anexo VII do Estatuto pelo facto de estas disposições não preverem o reembolso das despesas profissionais que os agentes são obrigados a adiantar no contexto do teletrabalho. A recorrente deduz daí, em primeiro lugar, que as referidas disposições não estão adaptadas à situação económica e sanitária que resulta da pandemia da COVID‑19 e, em segundo lugar, que esta lacuna conduz à concessão de uma vantagem financeira a uma determinada categoria de funcionários.

36      Neste contexto, há que recordar que o enunciado dos fundamentos do recurso não está vinculado à terminologia e à enumeração constante do Regulamento de Processo, em particular do artigo 76.o, alínea d), do mesmo. Daqui resulta que, a apresentação desses fundamentos, pela sua substância, em vez da sua qualificação jurídica, pode revelar‑se suficiente desde que os fundamentos em causa se possam extrair da petição com suficiente clareza [v. Acórdão de 29 de setembro de 2021, Enosi Mastichoparagogon Chiou/EUIPO (MASTIHACARE), T‑60/20, não publicado, EU:T:2021:629, n.o 50 e jurisprudência referida].

37      À luz desta jurisprudência, há que declarar que o primeiro fundamento, relativo à ilegalidade do artigo 71.o e do anexo VII do Estatuto, é suficientemente preciso, visto que, no essencial, o mesmo consiste em denunciar, através do primeiro argumento, a inadaptação destas disposições face às circunstâncias relacionadas com a crise da pandemia da COVID‑19. Além disso, a Comissão, o Conselho, e até mesmo o Parlamento, puderam responder quanto ao mérito à exceção de ilegalidade em causa.

38      Em contrapartida, o primeiro fundamento carece de precisão no que se refere ao segundo argumento da recorrente, relativo à violação do princípio da igualdade entre funcionários.

39      Com efeito, a petição deve explicitar em que consiste o fundamento em que o recurso se baseia, pelo que a sua simples enunciação abstrata não cumpre os requisitos do Regulamento de Processo (v. Acórdão de 11 de setembro de 2014, Gold East Paper e Gold Huasheng Paper/Conselho, T‑444/11, EU:T:2014:773, n.o 93 e jurisprudência referida).

40      Do mesmo modo, no que se refere aos fundamentos relativos à violação do princípio da igualdade, resulta de jurisprudência constante que o referido princípio exige que situações comparáveis não sejam tratadas de maneira diferente e que situações diferentes não sejam tratadas de maneira igual, a menos que uma diferenciação seja objetivamente justificada [v. Acórdão de 8 de março de 2022, Bezirkshauptmannschaft Hartberg‑Fürstenfeld (Efeito direto), C‑205/20, EU:C:2022:168, n.os 54 e 55 e jurisprudência referida].

41      Além disso, perante regras estatutárias como as que estão em causa no caso em apreço e tendo em conta o amplo poder de apreciação de que dispõe o legislador da União a este respeito, o princípio da igualdade de tratamento só é violado quando o legislador procede a uma diferenciação arbitrária ou manifestamente inadequada em relação ao objetivo prosseguido pela regulamentação em causa (v. Despacho de 29 de novembro de 2021, Bergallou/Conselho, T‑521/16, não publicado, EU:T:2021:854, n.o 80 e jurisprudência referida).

42      Por conseguinte, no contexto de um fundamento relativo à violação do princípio da igualdade de tratamento, em conformidade com as regras gerais que regem o ónus da prova e a presunção de legalidade dos atos da União, incumbe, em princípio, à recorrente apresentar os elementos suscetíveis de provar que foi tratada de maneira diferente relativamente a outras pessoas que se encontravam numa situação comparável (v., neste sentido, Acórdãos de 30 de maio de 2013, Morte Navarro/Parlamento, T‑280/09, não publicado, EU:T:2013:279, n.o 48, e de 10 de junho de 2020, Spliethoff’s Bevrachtingskantoor/Comissão, T‑564/15 RENV, não publicado, EU:T:2020:252, n.o 97) e, visto que o legislador dispõe de um amplo poder de apreciação, que tal diferenciação é arbitrária ou manifestamente inadequada.

43      Ora, no caso em apreço a recorrente não identificou, no primeiro fundamento, como exposto na petição, nem as vantagens financeiras que menciona, nem as categorias de funcionários a comparar, nem muito menos os elementos dos quais resulta que a alegada diferenciação é arbitrária ou manifestamente inadequada, de forma a preencher os requisitos do artigo 76.o, alínea d), do Regulamento de Processo no contexto de um fundamento relativo à violação do princípio da igualdade de tratamento pelo artigo 71.o e anexo VII do Estatuto.

44      É certo que a recorrente invoca o artigo 1.o‑D, n.o 5, do Estatuto, que prevê uma inversão do ónus da prova no sentido de que incumbe à instituição provar que não violou o princípio da igualdade de tratamento quando um funcionário, considerando‑se lesado pelo desrespeito deste princípio, apresenta factos a partir dos quais seja possível presumir a existência de discriminação direta ou indireta.

45      No entanto, o Conselho observa acertadamente que esta disposição não é aplicável quando está em causa uma alegada violação do princípio da igualdade pelo próprio Estatuto, uma vez que decorre do artigo 1.o‑D, n.o 1, para o qual o n.o 5 remete, que a inobservância do princípio da igualdade visada é a que resulta da «aplicação» do Estatuto.

46      É verdade que, na sua petição, a recorrente invoca outro fundamento, concretamente o quarto, também respeitante à violação do princípio da não discriminação, através do qual critica a diferença de tratamento que resultaria do facto de os funcionários que não podem adiantar as despesas de aquisição do equipamento de escritório, reembolsáveis nos termos das Orientações relativas ao teletrabalho, serem prejudicados em comparação com os restantes, mesmo quando estes últimos também incorrem em despesas de cariz profissional.

47      Todavia, o Tribunal Geral não pode ver‑se obrigado, devido à falta de rigor da recorrente, a reconstituir a articulação jurídica em que o fundamento assenta, reunindo vários elementos dispersos da petição, sob pena de, ao reconstruir este fundamento, lhe conferir um alcance distinto do pretendido pela recorrente. Decidir de outro modo seria simultaneamente contrário a uma boa administração da justiça, ao princípio do dispositivo e aos direitos de defesa do recorrido [Acórdão de 2 de abril de 2019, Fleig/SEAE, T‑492/17, EU:T:2019:211, n.o 44 (não publicado)].

48      Por último, na sua réplica, bem como nas suas observações sobre o articulado de intervenção do Parlamento, a recorrente mencionou as medidas adotadas por esta instituição e pelo Comité Económico e Social Europeu (CESE) a favor dos seus funcionários respetivos, bem como as vantagens de que beneficiam os funcionários da Comissão que dispõem de um telefone de serviço.

49      No entanto, para efeitos do exame da conformidade da petição com os requisitos do artigo 76.o do Regulamento de Processo, é irrelevante o conteúdo da réplica ou de quaisquer articulados subsequentes. Em particular, a admissibilidade dos fundamentos e argumentos aduzidos na réplica a título de ampliação dos fundamentos da petição, a qual é aceite pela jurisprudência, não pode ser invocada para compensar a inobservância dos requisitos do referido artigo aquando da apresentação do recurso, sob pena de o privar de todo o seu alcance (Acórdão de 12 de dezembro de 2018, Deutsche Umwelthilfe/Comissão, T‑498/14, não publicado, EU:T:2018:913, n.o 49). Daqui resulta que os fundamentos e argumentos invocados neste contexto são extemporâneos e, na falta de justificação, como no caso em apreço, inadmissíveis.

50      Por conseguinte, há que declarar que o primeiro fundamento da petição inicial permitiu que a Comissão e os intervenientes em seu apoio se defendessem e que o Tribunal Geral se pronuncie a seu respeito, apesar de apenas na medida em que a recorrente invoca a inadequação do artigo 71.o e do anexo VII do Estatuto face às circunstâncias decorrentes da pandemia da COVID‑19.

ii)    Quanto ao segundo fundamento de inadmissibilidade, relativo à inobservância do caráter incidental das exceções de ilegalidade

51      O Parlamento alega que os fundamentos que não são baseados na exceção de ilegalidade do artigo 71.o e do anexo VII do Estatuto apenas são apresentados a título subsidiário e que tal abordagem viola o caráter incidental de uma exceção de ilegalidade.

52      No entanto, importa recordar que o caráter incidental da exceção de ilegalidade significa que a possibilidade de invocar a inaplicabilidade de um ato de alcance geral ao abrigo do artigo 277.o TFUE não constitui um direito de ação autónomo e que essa possibilidade não pode ser exercida se não existir um direito de ação principal (v. Despacho de 16 de maio de 2019, ITSA/Comissão, T‑396/18, não publicado, EU:T:2019:342, n.o 39 e jurisprudência referida). Em contrapartida, nada neste artigo obsta a que a exceção de ilegalidade seja invocada a título principal, sendo os outros fundamentos apresentados apenas a título subsidiário.

iii) Conclusão quanto à admissibilidade do primeiro fundamento

53      Tendo em conta tudo o que precede, o primeiro fundamento é inadmissível na parte em que a recorrente invoca o caráter alegadamente discriminatório do artigo 71.o e do anexo VII do Estatuto. Em contrapartida, o mesmo é admissível na parte em que a recorrente alega que essas disposições não estão adaptadas às circunstâncias resultantes da pandemia da COVID‑19.

2)      Quanto ao mérito do primeiro fundamento

54      Como exposto no n.o 35, supra, a recorrente alega que o artigo 71.o e o anexo VII do Estatuto não são adaptados à situação económica e sanitária mundial que resulta da pandemia da COVID‑19, na medida em que estas disposições não preveem o reembolso das despesas profissionais que os funcionários são obrigados a adiantar ao abrigo do regime de teletrabalho.

55      Todavia, há que observar que, quando alterou pela última vez o conteúdo do Estatuto através do Regulamento (UE, Euratom) n.o 1023/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de outubro de 2013 (JO 2013, L 287, p. 15), o legislador não podia prever a pandemia da COVID‑19 e a necessidade de organizar um regime de teletrabalho para lhe dar resposta. De resto, a recorrente admite‑o na sua réplica.

56      No entanto, na página 5 da sua Comunicação COM (2010) 543 final, de 8 de outubro de 2010, ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões, intitulada «Regulamentação inteligente na União Europeia», a Comissão sublinhou, nomeadamente, as vantagens de uma avaliação ex post da legislação como parte integrante de uma «regulamentação inteligente». Considerou, assim, que os «balanços de qualidade» permitem avaliar se o quadro normativo num domínio de intervenção serve o objetivo visado e, em caso negativo, quais as alterações a introduzir, tendo como finalidade, nomeadamente, identificar a existência de encargos excessivos, incoerências e medidas obsoletas ou ineficazes.

57      Do mesmo modo, nas páginas 9 e 11 da sua Comunicação COM (2019) 178 final, de 15 de abril de 2019, ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões, intitulada «Legislar melhor: fazer o ponto da situação e honrar os nossos compromissos», a Comissão recordou que a avaliação ex post é um dos pilares fundamentais do programa «Legislar Melhor», na medida em que permite verificar se a legislação continua a ser relevante, adequada à sua finalidade e suscetível de produzir os resultados pretendidos pelo legislador e esperados pelo público.

58      Segundo a jurisprudência, o dever de qualquer legislador é sobretudo, por um lado, verificar, se não permanentemente, pelo menos periodicamente, que as normas que estabeleceu ainda respondem às necessidades para as quais foram concebidas e, por outro, modificar ou mesmo revogar as normas que já não se justificam e que já não são adequadas ao novo contexto no qual devem produzir os seus efeitos (v. Acórdão de 5 de dezembro de 2012, Lebedef e o./Comissão, F‑110/11, EU:F:2012:174, n.o 40 e conclusões referidas; v., igualmente, neste sentido, Acórdão de 6 de outubro de 2015, Schrems, C‑362/14, EU:C:2015:650, n.o 76).

59      O legislador dispõe, no entanto, de uma ampla margem de manobra no âmbito da verificação da adequação das normas às necessidades, bem como, se necessário, para adaptar o Estatuto e para modificar os direitos e as obrigações dos funcionários (v., neste sentido, Acórdão de 11 de julho de 2007, Wils/Parlamento, F‑105/05, EU:F:2007:128, n.o126).

60      Ora, a recorrente não apresenta nenhum argumento, e muito menos elementos de prova suficientes, suscetíveis de, tendo em conta esta ampla margem de apreciação do legislador, demonstrar manifestamente a alegada inadaptação do artigo 71.o e do anexo VII do Estatuto e a obrigação que, por definição, recaía sobre o legislador de modificar estas disposições.

61      Além disso, mesmo admitindo que o reembolso das despesas de cariz profissional resultantes de um regime de teletrabalho se impõe, há que ter em conta que, por força do artigo 336.o TFUE, a modificação do Estatuto implica a adoção de um regulamento pelo Parlamento e pelo Conselho de acordo com o processo legislativo ordinário, descrito no artigo 294.o desse Tratado, após consulta das outras instituições interessadas. Além disso, o artigo 294.o, n.o 2, TFUE dispõe que o processo legislativo se inicia com a apresentação de uma proposta da Comissão. Ora, a elaboração de tal proposta requer, por si só, várias etapas, independentemente das referidas consultas.

62      Tendo em conta a complexidade deste processo, os longos prazos de aplicação dos subsequentes procedimentos de melhoria da legislação e o contexto das restrições de emergência necessárias para dar resposta à pandemia da COVID‑19 à data da adoção da decisão recorrida, que importa ter em conta na apreciação da legalidade da referida decisão, as instituições da União não podem ser criticadas por não terem modificado o Estatuto durante a referida pandemia.

63      Tal crítica ainda menos poderia ser dirigida ao legislador, uma vez que há que considerar as medidas de emergência adotadas pelas instituições e demais organismos da União. Assim, a Comissão adotou rapidamente as Orientações relativas ao teletrabalho, que previam o reembolso das despesas associadas à aquisição de equipamento de escritório ao seu pessoal.

64      É verdade que a recorrente sustenta, no âmbito do seu quarto fundamento, que estas orientações são discriminatórias. Todavia, como resulta dos n.os 99 a 108, infra, este fundamento deve ser julgado improcedente.

65      Nestas condições, o primeiro fundamento, relativo a uma exceção de ilegalidade do artigo 71.o e do anexo VII do Estatuto, deve ser julgado improcedente.

b)      Quanto ao segundo fundamento, relativo, a título subsidiário, à violação do artigo 71.o do Estatuto

66      A recorrente sustenta que, ao fundamentar a decisão de indeferimento da reclamação no facto de o artigo 71.o e o anexo VII do Estatuto não preverem o reembolso das despesas de Internet e das chamadas telefónicas, a AIPN, por um lado, desrespeitou a finalidade destas disposições, que é a de evitar que os funcionários suportem sozinhos as despesas a título profissional, e, por outro, não teve em conta que as referidas disposições não têm caráter taxativo, como prova a Decisão de 9 de junho de 2021 do Secretário‑Geral do CESE que atribui ao pessoal do referido comité uma indemnização mensal a fim de cobrir as despesas geradas com teletrabalho (a seguir «Decisão do CESE de 9 de junho de 2021»).

67      Todavia, embora o artigo 71.o do Estatuto tenha efetivamente por objetivo evitar que os funcionários suportem sozinhos as despesas efetuadas por ocasião do exercício das suas funções (Acórdão de 18 de novembro de 2015, FH/Parlamento, F‑26/15, EU:F:2015:137, n.o 32), em conformidade com a sua letra, o reembolso das despesas é devido nas condições fixadas no anexo VII do Estatuto. Ora, este anexo enumera de forma exaustiva as prestações financeiras reembolsáveis. Por conseguinte, a decisão de indeferimento da reclamação podia validamente ter por base o facto, nomeadamente, de o artigo 71.o do Estatuto não permitir deferir os pedidos da recorrente.

68      Além disso, o artigo 71.o e o anexo VII do Estatuto, como qualquer disposição do direito da União que confere o direito a prestações financeiras, devem ser interpretados de forma restrita (v. Acórdão de 18 de julho de 2017, Comissão/RN, T‑695/16 P, não publicado, EU:T:2017:520, n.o 54 e jurisprudência referida).

69      Em particular, a alegada «interpretação teleológica», de que, segundo a recorrente, o artigo 71.o deveria ser objeto, contraria a vontade do legislador. Com efeito, através do Regulamento (CE, Euratom) n.o 723/2004 do Conselho, de 22 de março de 2004, que altera o Estatuto dos Funcionários das Comunidades Europeias e o Regime aplicável aos outros agentes das Comunidades Europeias (JO 2004, L 124, p. 1), o legislador pretendeu, como salienta o seu considerando 26 e como observa o Conselho, racionalizar os diversos subsídios existentes à época.

70      Além disso, contrariamente ao que sustenta a recorrente, nem a Decisão do CESE, de 9 de junho de 2021, nem, além do mais, as Orientações relativas ao teletrabalho adotadas pela Comissão, são contrárias ao caráter taxativo do artigo 71.o e do anexo VII do Estatuto.

71      Com efeito, o princípio da unicidade da função pública, tal como enunciado no artigo 9.o, n.o 3, do Tratado de Amesterdão, implica que todos os funcionários de todas as instituições da União estejam sujeitos a um Estatuto único. No entanto, este princípio não implica que as instituições devam utilizar da mesma forma o poder de apreciação que lhes é reconhecido pelo Estatuto. Pelo contrário, na gestão do seu pessoal, estas últimas gozam, enquanto empregadores, de um princípio de autonomia (Acórdãos de 18 de setembro de 2013, Scheidemann/Comissão, F‑76/12, EU:F:2013:132, n.o 26, e de 21 de janeiro de 2014, Van Asbroeck/Parlamento, F‑102/12, EU:F:2014:4, n.o 29).

72      Daqui resulta que, embora o artigo 71.o e o anexo VII do Estatuto devam ser aplicados da mesma forma aos funcionários e agentes da União, o princípio da autonomia pode servir validamente para justificar as diferenças entre as medidas limitadas adotadas pelas instituições, órgãos e organismos da União com vista a evitar que os membros do seu pessoal suportem sozinhos as despesas efetuadas no exercício das suas funções em regime de teletrabalho. Esta consideração impõe‑se tanto mais quanto as referidas medidas tiveram de ser adotadas com urgência em circunstâncias excecionais associadas ao sistema de teletrabalho generalizado e obrigatório imposto pelos Estados‑Membros em resposta à pandemia da COVID‑19.

73      Conclui‑se que o segundo fundamento relativo à violação do artigo 71.o do Estatuto deve ser julgado improcedente.

c)      Quanto ao terceiro fundamento, relativo à violação do dever de solicitude e do direito a uma boa administração

74      A recorrente alega que, ao adotar a decisão de indeferimento da reclamação, a AIPN violou o seu dever de solicitude e o seu direito a uma boa administração uma vez que o aumento no seu consumo de dados Internet é imputável à instalação de diversos programas de computador para uso profissional, bem como à frequência de formações em linha, e que a Comissão não reconheceu o impacto económico que o teletrabalho teria na sua situação pessoal, tendo assim desequilibrado as suas relações com a União.

75      O dever de solicitude implica nomeadamente que, quando decide sobre a situação de um membro do seu pessoal, a autoridade tome em consideração todos os elementos suscetíveis de influenciar a sua decisão e que, ao fazê‑lo, tenha em conta, não apenas o interesse do serviço, mas também o do interessado (Acórdãos de 28 de maio de 1980, Kuhner/Comissão, 33/79 e 75/79, EU:C:1980:139, n.o 22, e de 7 de novembro de 2019, WN/Parlamento, T‑431/18, não publicado, EU:T:2019:781, n.o 105). O dever de solicitude é, assim, uma expressão particular do princípio da boa administração e, especialmente, da obrigação que recai sobre a autoridade de proceder, em todo caso, a um exame completo e circunstanciado da situação antes de adotar uma decisão (v., neste sentido, Acórdão de 25 de maio de 2016, GW/Comissão, F‑111/15, EU:F:2016:122, n.o 40).

76      Como sugere a recorrente, o dever de solicitude reflete, assim, o equilíbrio dos direitos e obrigações recíprocos que o Estatuto criou nas relações entre a autoridade pública e os agentes do serviço público (Acórdão de 17 de janeiro de 2017, LP/Europol, T‑719/15 P, não publicado, EU:T:2017:7, n.o 60). Todavia, enquanto expressão desse equilíbrio, o dever de solicitude não pode, em caso algum, obrigar a administração a agir contra as disposições aplicáveis e, em particular, não pode levá‑la a conferir a uma disposição da União um efeito contrário aos seus termos claros e precisos (v., neste sentido, Acórdãos de 2 de março de 2004, Di Marzio/Comissão, T‑14/03, EU:T:2004:59, n.o 100, e de 29 de abril de 2020, CV e o./Comissão, T‑496/19, não publicado, EU:T:2020:163, n.o 50).

77      Por conseguinte, uma vez que a obrigação de reembolsar as despesas associadas ao consumo de dados Internet imputáveis ao teletrabalho viola o caráter taxativo do artigo 71.o e do anexo VII do Estatuto (v. n.o 67, supra), a recorrente não pode invocar o dever de solicitude a fim de obter esse reembolso.

78      De resto, o legislador da União já teve em conta a situação de alguns funcionários, entre os quais a recorrente, ao permitir que beneficiassem de um abatimento fiscal de 10 % de forma a cobrir as despesas profissionais, previsto no artigo 3.o, n.o 4, do Regulamento n.o 260/68.

79      Além disso, a própria Comissão fez prova de solicitude ao prever, nas Orientações relativas ao teletrabalho, o reembolso, em determinadas condições, das despesas associadas à aquisição de equipamento de escritório.

80      Sem prejuízo da questão do respeito do princípio da igualdade, que será apreciada no âmbito do quarto fundamento, o facto de esta forma de intervenção não ser, segundo a recorrente, adequada, não basta para concluir pela violação do dever de solicitude.

81      Com efeito, tendo em conta o amplo poder de apreciação de que goza a administração na gestão do seu pessoal, o juiz da União só pode, ao abrigo do dever de solicitude, apreciar se esta se manteve dentro dos limites razoáveis e se não utilizou o seu poder de apreciação de forma manifestamente errada (v., por analogia, Acórdão de 4 de dezembro de 2013, ETF/Schuerings, T‑107/11 P, EU:T:2013:624, n.os 102 e 103).

82      Ora, há que observar que resulta das Orientações relativas ao teletrabalho que a Comissão optou por reembolsar o equipamento de escritório para que os seus funcionários e agentes beneficiassem de condições de trabalho conformes às normas de saúde e segurança adequadas e equivalentes às de um escritório, o que constitui manifestamente uma expressão de solicitude.

83      A título exaustivo, importa recordar que, tratando‑se do reembolso de alegadas despesas, foi decidido que, em conformidade com os princípios que regem o ónus da prova, na falta de uma disposição da qual resulte uma presunção de que se incorreu em despesas, cabe ao funcionário apresentar provas de que suportou efetivamente os custos diretamente relacionados com as suas funções (v., por analogia, Acórdão de 11 de julho de 2000, Skrzypek/Comissão, T‑134/99, EU:T:2000:184, n.o 81).

84      Ora, a recorrente limita‑se a sustentar que o aumento do seu consumo de dados Internet durante o mês de outubro de 2020 e o facto de ter ultrapassado em 137,434 GB o limite máximo de 100 GB, circunstância que teria resultado numa cobrança adicional, decorreram da instalação e utilização para fins profissionais de programas de computador como o Skype for business, Webex ou Teams, bem como da frequência de formações em linha.

85      Todavia, o facto de a maior parte do consumo de dados Internet da recorrente durante o mês de outubro de 2020 se concentrar em quatro dias úteis não basta, por si só, para provar que a parte desse consumo que ultrapassava o seu pacote mensal se devia a uma utilização profissional. O caráter profissional das despesas em questão revela‑se ainda menos demonstrado porquanto resulta dos documentos fornecidos pela própria recorrente que, em nenhum outro momento em que o teletrabalho era obrigatório, esta consumiu dados Internet num montante superior ao limite máximo de 100 GB correspondente ao seu pacote fixo.

86      Por conseguinte, as informações fornecidas pela recorrente não permitem dar por assente que o facto de ter ultrapassado o seu pacote fixo de consumo de Internet se devia ao teletrabalho, nem muito menos que, ao recusar ter essa circunstância em conta, a Comissão tenha violado o seu dever de solicitude e o princípio da boa administração.

87      Por último, embora seja pacífico que o operador da recorrente lhe cobrou o montante de 1,89 euros por duas chamadas telefónicas em setembro de 2020 para o serviço de assistência informática e para a DG Informática da Comissão, a recusa de reembolso desta quantia também não pode ser tida como uma violação do dever de solicitude, tendo em conta o caráter módico da quantia e as medidas descritas nos n.os 78 e 79, supra.

88      Por conseguinte, o terceiro fundamento deve ser julgado improcedente.

d)      Quanto ao quarto fundamento, relativo à violação do princípio da não discriminação

89      A recorrente alega que a AIPN fundamentou a decisão de indeferimento da reclamação nas Orientações relativas ao teletrabalho. Ora, estas teriam alegadamente criado uma primeira situação de discriminação entre os funcionários da Comissão que dispõem de meios financeiros suficientes para adiantar o pagamento do equipamento de escritório e os que não possuem tais meios e que não podem obter o reembolso de outras despesas profissionais. Do mesmo modo, as referidas Orientações teriam dado origem a uma segunda situação de discriminação tendo em conta a vantagem de que os funcionários e agentes do CESE usufruem com base na Decisão do CESE de 9 de junho de 2021.

1)      Quanto à admissibilidade do quarto fundamento

90      A Comissão sustenta que o quarto fundamento é inadmissível por não ter sido suscitado na reclamação.

91      Há que recordar, a este respeito, que os artigos 90.o e 91.o do Estatuto sujeitam a admissibilidade de um recurso interposto por um funcionário, ou agente temporário, contra a instituição a que pertence à tramitação regular do procedimento administrativo prévio.

92      Neste contexto, a regra da concordância entre a reclamação e a subsequente petição, à qual a Comissão alude, exige, sob pena de inadmissibilidade, que um fundamento invocado perante o juiz da União já tenha sido invocado no âmbito do procedimento pré‑contencioso, para que a AIPN tenha tido a possibilidade de conhecer, de modo suficientemente preciso, as críticas que o interessado dirige à decisão recorrida (v. Acórdão de 25 de outubro de 2013, Comissão/Moschonaki, T‑476/11 P, EU:T:2013:557, n.o 71 e jurisprudência referida).

93      No caso em apreço, na sua reclamação, a recorrente invocou uma violação do princípio da igualdade. Aí comparava, por um lado, quanto às comunicações telefónicas, a «alta hierarquia», que dispõe de telefones de serviço, com os restantes funcionários, que pagam as suas comunicações profissionais e, por outro, quanto aos dados Internet, aqueles que, em função dos seus contratos com os seus prestadores de serviços de acesso, dispõem de um volume de dados elevado e de uma alta velocidade de tratamento com aqueles que não beneficiam dessas vantagens.

94      Assim, a violação do princípio da igualdade foi efetivamente invocada na reclamação, ainda que numa perspetiva distinta daquela em que se baseia o quarto fundamento da petição.

95      Todavia, há que recordar que o artigo 91.o do Estatuto não visa vincular, de forma rigorosa e definitiva, uma eventual fase contenciosa, desde que o recurso contencioso não altere a causa de pedir nem o objeto da reclamação. Nesta medida, os motivos de impugnação podem ser desenvolvidos, perante o juiz da União, mediante a apresentação de fundamentos e argumentos que não constam necessariamente da reclamação, mas que com ela estão estreitamente relacionados (v., neste sentido, Acórdãos de 25 de outubro de 2013, Comissão/Moschonaki, T‑476/11 P, EU:T:2013:557, n.os 73 e 76, e de 2 de março de 2017, DI/EASO, T‑730/15 P, EU:T:2017:138, n.os 65 e 66).

96      Nestas condições, há que considerar que o facto de, na sua petição, a recorrente ter começado por mencionar expressamente uma diferença de tratamento entre os funcionários que têm meios financeiros para adiantar o pagamento dos custos em equipamento de escritório e os que não têm esses meios, não altera nem a causa de pedir nem o objeto da reclamação.

97      Além disso, uma vez que a decisão do CESE de 9 de junho de 2021 foi adotada após o termo da fase pré‑contenciosa, a recorrente não pode ser acusada de não ter invocado na sua reclamação a discriminação entre si própria, enquanto funcionária da Comissão, e os agentes do CESE.

98      Daqui resulta que o quarto fundamento é admissível.

2)      Quanto ao mérito do quarto fundamento

99      Tal como exposto no n.o 40, supra, o princípio da igualdade de tratamento exige que situações comparáveis não sejam tratadas de maneira diferente e que situações diferentes não sejam tratadas de maneira igual, a menos que essa diferenciação seja objetivamente justificada.

100    No caso em apreço, em primeiro lugar, a recorrente acusa a Comissão de não ter tratado de maneira diferente os funcionários que não dispõem de meios para adquirir o equipamento de escritório, concedendo‑lhes a possibilidade de obter o reembolso das suas despesas telefónicas e de consumo de dados Internet.

101    A recorrente, que não pode agir em representação de outros funcionários, que tem grau AST 4 e que beneficiava do abatimento fiscal mencionado no n.o 78, supra, não apresenta, no entanto, nenhum elemento suscetível de provar que lhe era materialmente impossível adiantar o pagamento das despesas associadas à aquisição de equipamento de escritório e que, por conseguinte, se encontrava na situação desfavorável que invoca. Assim, não prova que foi tratada como os funcionários capazes de proceder a esse adiantamento, apesar de se encontrar numa situação financeira distinta.

102    Além disso, admitindo que tal diferença de tratamento foi provada, a recorrente não demonstra, em todo o caso, que a diferenciação em causa é arbitrária ou manifestamente inadequada, na aceção da jurisprudência acima referida no n.o 41.

103    Pelo contrário, como exposto nas Orientações relativas ao teletrabalho, a medida que permite o reembolso das despesas associadas à aquisição do equipamento de escritório era justificada pela necessidade, surgida no seguimento do artigo 1.o‑E, n.o 2, do Estatuto, de ajudar os teletrabalhadores a desempenhar as suas tarefas em condições de trabalho conformes com as normas de saúde e de segurança adequadas. Além disso, como sugere a Comissão, era igualmente justificada pela preocupação de reembolsar unicamente despesas cuja relação com o exercício de funções tivesse uma expressão objetiva.

104    Em segundo lugar, a recorrente alega ter sido alvo de discriminação devido ao tratamento mais favorável reservado aos funcionários e agentes do CESE.

105    No entanto, há que recordar (v. n.o 71, supra) que o facto de todos os funcionários estarem sujeitos a um estatuto único não implica que as instituições devam exercer de forma idêntica o poder de apreciação que lhes foi reconhecido pelo Estatuto, quando, pelo contrário, estas últimas gozam de um princípio de autonomia enquanto empregadores (v., neste sentido, Acórdãos de 16 de setembro de 1997, Gimenez/Comité das Regiões, T‑220/95, EU:T:1997:130, n.o 72, e de 21 de janeiro de 2014, Van Asbroeck/Parlamento, F‑102/12, EU:F:2014:4, n.o 29).

106    Ora, no caso em apreço, as Orientações relativa ao teletrabalho adotadas pela Comissão e a Decisão do CESE de 9 de junho de 2021 constituem uma expressão do princípio da autonomia em matéria do tratamento dos seus funcionários perante a situação excecional ligada à pandemia de COVID‑19 (v. n.o 72, supra).

107    Por conseguinte, e em todo o caso, estas diferenças entre as medidas adotadas pelas instituições, órgãos e organismos da União não podem ser invocadas em apoio de um fundamento relativo à violação do princípio da igualdade de tratamento (v., neste sentido, Acórdão de 14 de fevereiro de 2017, Schönberger/Tribunal de Contas, T‑688/15 P, não publicado, EU:T:2017:76, n.o 187).

108    Decorre de tudo o que precede que o quarto fundamento deve ser julgado improcedente.

e)      Quanto ao quinto fundamento, relativo à violação do artigo 7.o da Carta

109    A recorrente alega, por um lado, ter sido obrigada a pedir à Comissão a concessão de um acesso à Internet a fim de atenuar as despesas decorrentes da instituição do teletrabalho obrigatório e, por outro, que a Decisão do PMO de 14 de julho de 2021 que indeferiu o seu pedido de acesso à Internet constitui uma ingerência no seu direito ao respeito pela vida privada e pelo seu domicílio.

110    Nos termos do artigo 7.o da Carta, todas as pessoas têm direito ao respeito pela sua vida privada e familiar, pelo seu domicílio e pelas suas comunicações. No entanto, o direito consagrado neste artigo não é uma prorrogativa absoluta. Nos termos do artigo 52.o, n.o 1, da Carta, o mesmo pode ser objeto de restrições (v., neste sentido, Acórdão de 16 de julho de 2020, Facebook Ireland e Schrems, C‑311/18, EU:C:2020:559, n.os172 e 174 e jurisprudência referida).

111    A este respeito, há que observar que, quando está em causa uma medida individual, como no caso em apreço, a existência de uma restrição na aceção do artigo 52.o, n.o 1, da Carta deve ser apreciada tendo em conta o seu impacto real na pessoa em causa (v., neste sentido, Acórdão de 25 de janeiro de 2018, F, C‑473/16, EU:C:2018:36, n.os 52 a 54). Além disso, não pode haver uma ingerência no exercício de um direito quando a relação entre este e a medida em causa é demasiado indireta ou aleatória para que possa ser tida em consideração (v., neste sentido, Acórdão de 4 de dezembro de 2018, Janoha e o./Comissão, T‑517/16, não publicado, EU:T:2018:874, n.os 72 e 73).

112    Ora, no caso em apreço, a recorrente alega apenas que, para a exercer as suas funções em regime de teletrabalho utilizando a sua própria ligação à Internet, se viu forçada a violar o contrato que celebrou a título privado com a VOO e nos termos do qual o seu acesso à Internet estava limitado a uso privado e pessoal.

113    No entanto, a recorrente não apresenta nenhum elemento do qual se possa deduzir que a VOO interpreta o referido contrato no sentido de que a proíbe de utilizar pessoalmente a sua ligação à Internet no exercício das suas funções e que tal proibição teria inevitavelmente repercussões no seu direito ao respeito pela sua vida privada e pelo seu domicílio. A Comissão observa, a este respeito, que não teve conhecimento de nenhuma queixa, apresentada pelos prestadores de serviços de acesso, relativa ao uso da conexão à Internet pelos seus clientes no contexto do teletrabalho, sendo que a recorrente não apresenta nenhuma prova contrária a esta afirmação.

114    É certo que a recorrente alega que outro prestador de serviços de acesso à Internet implementou um programa que permitia aos empregadores intervir financeiramente nas despesas de Internet dos seus trabalhadores a fim de cobrir os períodos de teletrabalho destes.

115    Todavia, a Comissão salienta corretamente que este programa é apenas apresentado como um «presente» oferecido pelas entidades patronais aos seus empregados. Assim, trata‑se de uma mera opção e não de um mecanismo que, segundo esse prestador de serviços, seja indispensável para que os seus clientes cumpram as suas obrigações contratuais.

116    Nestas condições, não é possível considerar que a decisão recorrida constitua uma limitação do direito da recorrente ao respeito da sua vida privada e do seu domicílio.

117    O quinto fundamento deve, portanto, ser julgado improcedente, bem como, por conseguinte, o segundo pedido na sua totalidade.

C.      Quanto ao terceiro pedido

118    Com o seu terceiro pedido, a recorrente pede que o Tribunal Geral se digne condenar a Comissão no pagamento do montante de 51,89 euros a título de reembolso das suas despesas profissionais, na concessão de um acesso à Internet para uso profissional no âmbito do teletrabalho, e no pagamento do montante de 10 000 euros a título de reparação dos diferentes danos sofridos.

119    Uma vez que a recorrente formula estes pedidos «em consequência» da anulação da decisão recorrida, basta observar que, uma vez que o segundo pedido foi julgado improcedente, o terceiro também o deve ser.

120    Além disso, há igualmente que julgar improcedente o pedido de reparação dos danos morais sofridos pela recorrente em razão das repetidas recusas de lhe conceder um acesso à Internet, do seu receio de ter de suportar sozinha novamente as suas despesas profissionais e do facto de se ter visto forçada a abandonar a Comissão para não ser penalizada na sua notação e progressão.

121    Importa recordar, a este respeito, que, segundo a jurisprudência, todo o dano deve ser real e certo e que um dano simplesmente hipotético e indeterminado não confere direito a reparação (Acórdão de 3 de dezembro de 2015, CN/Parlamento, T‑343/13, EU:T:2015:926, n.o 118). É à parte que pretende responsabilizar a União que incumbe apresentar provas da existência ou da dimensão do dano que alega. Esta obrigação impõe‑se mesmo no que respeita ao dano moral. Uma simples alegação não sustentada por qualquer elemento de prova é pois insuficiente (v., neste sentido, Acórdão de 3 de dezembro de 2015, CN/Parlamento, T‑343/13, EU:T:2015:926, n.os 119 e 121).

122    No caso em apreço, a fim de provar a realidade do seu dano moral, a recorrente apresenta um atestado médico, de 22 de dezembro de 2020, que declara a sua incapacidade para trabalhar a partir das 14h30 de 24 de dezembro seguinte.

123    Todavia, este atestado médico surge isolado, é sucinto e, em especial, está desprovido de qualquer anamnese. Além disso, não é corroborado por nenhum outro documento que permita imputar a curta paragem de trabalho da recorrente ao alegado «choque psicológico e físico provocado pela recusa da Comissão em fornecer o volume de dados Internet necessário à execução da sua prestação laboral».

124    A recorrente também não apresenta provas em apoio da sua afirmação de que se viu forçada a abandonar a Comissão de modo a não ser penalizada na sua notação e progressão. A este respeito, o simples facto de a Comissão ter considerado que a recorrente estava situação de ausência injustificada no dia 3 de maio de 2021 e de, por este motivo, ter deduzido um dia do saldo das suas férias anuais (v. n.o 13, supra) não constitui sequer, a este respeito, uma prova prima facie.

125    Por último, a recorrente pede de forma vã a reparação do dano moral que sofreu devido à perda do referido dia de férias por ausência irregular quando recusou utilizar o seu acesso privado à Internet para fins profissionais.

126    Como alega a Comissão, este pedido é inadmissível. Com efeito, foi apresentado pela primeira vez na petição e não foi objeto de um procedimento pré‑contencioso completo e conforme com os artigos 90.o e 91.o do Estatuto, num contexto em que a causa direta do dano alegado não resulta da decisão recorrida, mas sim da Decisão da DG dos Recursos Humanos e da Segurança de 19 de maio de 2021.

127    Por conseguinte, o terceiro pedido deve ser julgado improcedente.

128    Resulta de tudo o que precede que deve ser negado provimento ao recurso na íntegra.

IV.    Quanto às despesas

129    Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

130    No caso em apreço, tendo a recorrente sido vencida, há que condená‑la a suportar as suas próprias despesas, bem como as efetuadas pela Comissão, de acordo com o pedido por esta formulado.

131    Segundo o artigo 138.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, as instituições que intervenham no litígio devem suportar as suas próprias despesas. O Parlamento e o Conselho suportarão as suas próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Quarta Secção)

decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      OE é condenada a suportar, além das suas próprias despesas, as despesas efetuadas pela Comissão Europeia.

3)      O Parlamento Europeu e o Conselho da União Europeia suportarão as suas próprias despesas.

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 7 de setembro de 2022.

Assinaturas


*      Língua do processo: francês.