Language of document : ECLI:EU:T:2005:274

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Segunda Secção)

6 de Julho de 2005 (*)

«Contratos públicos de serviços – Processo de concurso comunitário – Prestação de serviços de agência de viagens para deslocações dos funcionários e agentes das instituições»

No processo T‑148/04,

TQ3 Travel Solutions Belgium SA, com sede em Mechelen (Bélgica), representada inicialmente por R. Ergec e K. Möric, posteriormente por B. Lissoir, advogados,

recorrente,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada por L. Parpala e E. Manhaeve, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrida,

apoiada por

Wagon‑Lits Travel SA, com sede em Bruxelas (Bélgica), representada por F. Herbert, H. Van Peer, advogados, e D. Harrison, solicitor, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

interveniente,

que tem por objecto, por um lado, um pedido de anulação das decisões da Comissão de não adjudicar à recorrente o lote n.° 1 do concurso objecto do aviso n.° 2003/S 143 129409, para a prestação de serviços de agência de viagens, e de adjudicar esse lote a outra empresa e, por outro lado, um pedido de indemnização pelo prejuízo sofrido pela recorrente na sequência da recusa da sua proposta,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Segunda Secção),

composto por: J. Pirrung, presidente, N. J. Forwood e S. Papasavvas, juízes,

secretário: J. Palacio González, administrador principal,

vistos os autos e após a audiência de 8 de Março de 2005,

profere o presente

Acórdão

 Quadro jurídico

1        A adjudicação de contratos de prestação de serviços da Comissão está sujeita às disposições do título V da primeira parte do Regulamento (CE, Euratom) n.° 1605/2002 do Conselho, de 25 de Junho de 2002, que institui o Regulamento Financeiro aplicável ao orçamento geral das Comunidades Europeias (JO L 248, p. 1, a seguir «Regulamento Financeiro»), bem como às disposições do Regulamento (CE, Euratom) n.° 2342/2002 da Comissão, de 23 de Dezembro de 2002, que estabelece as normas de execução do Regulamento Financeiro (JO L 357, p. 1, a seguir «normas de execução»). Estas disposições inspiram‑se nas directivas comunitárias na matéria, designadamente, para os contratos de serviços, na Directiva 92/50/CEE do Conselho, de 18 de Junho de 1992, relativa à coordenação dos processos de adjudicação de contratos públicos de serviços (JO L 209, p. 1), alterada pela Directiva 97/52/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de Outubro de 1997 (JO L 328, p. 1).

2        O artigo 100.°, n.° 1, do Regulamento Financeiro dispõe que «[o] gestor orçamental competente designará o adjudicatário do contrato, no respeito dos critérios de selecção e de atribuição previamente definidos nos documentos do contrato e das regras de adjudicação de contratos». O artigo 97.°, n.° 2, do Regulamento Financeiro e o artigo 138.°, n.° 1, alínea b), e n.° 2, das normas de execução referem que os contratos podem ser adjudicados à proposta de mais baixo preço ou à proposta economicamente mais vantajosa, a saber, a que apresentar a melhor relação qualidade/preço.

3        O artigo 100.°, n.° 2, do Regulamento Financeiro enuncia:

«A entidade adjudicante comunicará a qualquer candidato ou proponente que seja afastado os motivos da rejeição da sua candidatura ou da sua proposta [...] Todavia, a comunicação de certos elementos pode ser omitida nos casos em que constitua um obstáculo à aplicação da lei, seja contrária ao interesse público ou prejudicial aos interesses comerciais legítimos de empresas públicas ou privadas ou possa prejudicar a concorrência leal entre aquelas empresas.»

4        O artigo 139.°, n.° 1, das normas de execução prevê que, «[s]e, em relação a um determinado contrato, houver propostas que se revelem anormalmente baixas, antes de as rejeitar exclusivamente com base neste motivo, a entidade adjudicante solicitará por escrito esclarecimentos que entender necessários sobre os elementos constitutivos da proposta e verificará, de forma contraditória, esses elementos, tendo em conta as justificações fornecidas».

5        O artigo 146.°, n.° 4, das normas de execução dispõe que, «[n]o caso de propostas anormalmente baixas a que se refere o artigo 139.°, a comissão de avaliação solicitará as precisões que considere oportunas em matéria de composição da proposta».

 Factos na origem do litígio

6        Por contrato‑quadro 98/16/IX.D.1/1, datado de 13 de Janeiro de 1999, a sociedade Belgium International Travel foi encarregada pela Comissão da gestão dos serviços de agência de viagens destinadas aos seus agentes em Bruxelas. Este contrato foi celebrado por um período inicial de dois anos, com possibilidade de três renovações de um ano, ou seja, para o período de 1 de Abril de 1999 a 31 de Março de 2004. Por aditamento datado de 27 de Fevereiro de 2001, o dito contrato foi atribuído à recorrente.

7        Por anúncio de 30 de Maio de 2003 publicado no Suplemento ao Jornal Oficial da União Europeia (JO 2003, S 103), a Comissão lançou um concurso sob a forma de concurso limitado, sob a referência ADMIN/D1/PR/2003/051, para a prestação de serviços de agência de viagens para as deslocações dos funcionários e agentes em missão e de quaisquer outras pessoas que viajam por conta ou a pedido das instituições ou organismos comunitários.

8        Resulta do processo que este anúncio de concurso foi anulado pela Comissão na sequência da desistência de determinadas instituições comunitárias.

9        Em 29 de Julho de 2003, actuando ao abrigo do Regulamento Financeiro e das normas de execução, a Comissão publicou no Suplemento ao Jornal Oficial da União Europeia (JO 2003, S 143), sob a referência 2003/S 143‑129409, novo concurso, sob a forma de concurso limitado, para a prestação de serviços de agência de viagens para as deslocações dos funcionários e agentes em missão e de quaisquer outras pessoas que viajam por conta ou a pedido de determinadas instituições ou organismos comunitários (secção II.1.6 do anúncio). O contrato era constituído por um determinado número de lotes, correspondendo cada um a um lugar de execução das prestações, incluindo Bruxelas (lote n.° 1), Luxemburgo (lote n.° 2), Grange (lote n.° 3), Ispra (lote n.° 4), Geel (lote n.° 5), Petten (lote n.° 6) e Sevilha (lote n.° 7).

10      Por carta registada de 28 de Novembro de 2003, a recorrente apresentou à Comissão uma proposta para os lotes n.os 1, 2, 3, 5, 6 e 7 do dito concurso.

11      Por carta de 24 de Fevereiro de 2004, a Comissão informou a recorrente que a sua proposta para o lote n.° 1 do contrato (a seguir «lote n.° 1» ou o «contrato controvertido») não tinha sido seleccionada, uma vez que a relação qualidade/preço da sua proposta era inferior à da proposta seleccionada. A carta de 24 de Fevereiro de 2004 esclarecia:

«Após apreciação das propostas recebidas em resposta ao anúncio de concurso, lamentamos informá‑lo que a sua proposta não pôde ser acolhida para os lotes n.os 1, 2, 3 e 7 do contrato em causa. As razões que justificaram a rejeição da sua proposta são as seguintes:

Lote n.° 1 (Bruxelas)

Verificou‑se que a relação qualidade/preço da sua proposta (51,55) é inferior à da sociedade proposta como adjudicatária (87,62) [...]»

12      Por carta de 8 de Março de 2004, a recorrente requereu à Comissão a comunicação de informações mais detalhadas quanto à opção pela proposta seleccionada para o contrato controvertido. A recorrente pediu igualmente que fosse suspenso o processo de adjudicação deste concurso e que não fosse celebrado qualquer contrato com a empresa seleccionada.

13      Por carta de 16 de Março de 2004, a Comissão forneceu informações à recorrente quanto à fundamentação da sua decisão de 24 de Fevereiro de 2004 de não lhe adjudicar o contrato controvertido e da sua decisão de o adjudicar a outra empresa (a seguir, respectivamente, «decisão de não adjudicação» e «decisão de adjudicação»). A Comissão esclareceu, designadamente, que a proposta da recorrente tinha obtido 51,55 pontos, enquanto a proposta que foi seleccionada, da sociedade Wagon‑Lits Travel (a seguir «WT» ou «interveniente»), tinha conseguido 87,62 pontos após análise qualitativa e financeira, e que, por conseguinte, a proposta da WT era economicamente mais vantajosa justificando, assim, a adjudicação do contrato controvertido a essa empresa. A Comissão indicou, também, que a proposta da WT, embora tivesse sido claramente inferior à da recorrente ao nível de preço (índice 100 para a WT e índice 165,56 para a recorrente), «não [era] anormalmente baixa e não havia, por conseguinte, que recorrer às disposições previstas no artigo 139.° [das normas de execução]».

14      Por fax de 17 de Março de 2004, a Comissão propôs à recorrente a prorrogação do contrato‑quadro 98/16/IX.D.1/1 relativo aos serviços de agência de viagens, que terminaria em 31 de Março de 2004, até 27 de Junho de 2004, inclusive.

15      Por carta de 19 de Março de 2004, a Comissão justificou o seu pedido de prorrogação do contrato‑quadro acima referido, esclarecendo que a comunicação de instruções ao novo contraente, a saber, a WT, e os efeitos do novo contrato não podiam verificar‑se no termo previsto no referido contrato‑quadro. Esta carta especificava, com efeito, que, devido a «prazos incompressíveis e independentes da vontade da Comissão e do contraente, a passagem de instruções ao novo contraente e a produção de efeitos do novo contrato não podiam dar‑se no termo natural [do] contrato [da recorrente]».

16      Por fax de 22 de Março de 2004, a recorrente informou a Comissão que não pretendia prorrogar o contrato‑quadro e que, por conseguinte, este contrato terminaria em 1 de Abril de 2004.

17      Por cartas de 23 e 26 de Março de 2004, a Comissão solicitou a intervenção da recorrente, no sentido de esta transmitir à WT os ficheiros de «perfil de viajantes» que tinha constituído a fim de «assegurar a continuidade do serviço do sector missões». Por cartas de 25 e 31 de Março de 2004, a recorrente informou a Comissão que se recusava a transmitir esses à WT.

18      Em 31 de Março de 2004, a Comissão celebrou um contrato com a WT para a prestação de serviços de agência de viagens em Bruxelas. Este contrato entrou em vigor em 1 de Abril de 2004 com um aditamento que permitia ao novo contraente efectuar o serviço «ex‑plant» (nos seus próprios escritórios) por um período transitório, de 1 de Abril a 19 de Maio de 2004.

 Tramitação processual e pedidos das partes

19      Por petição entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância, em 26 de Abril de 2004, a recorrente interpôs o presente recurso que visa, por um lado, a anulação da decisão de não adjudicação e da decisão de adjudicação e, por outro, o ressarcimento do prejuízo sofrido devido a estas duas decisões.

20      Em 26 de Abril de 2004, a recorrente apresentou um requerimento para que o litígio fosse decidido segundo a tramitação acelerada, nos termos do artigo 76.°‑A do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância. Esse requerimento foi indeferido por decisão do Tribunal de 10 de Junho de 2004.

21      Por requerimento separado entrado na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância, em 26 de Abril de 2004, a recorrente apresentou um pedido de medidas provisórias no sentido de obter, por um lado, a suspensão de execução da decisão de não adjudicação e a decisão de adjudicação e, por outro, que fosse ordenada à Comissão a adopção das medidas necessárias para suspender os efeitos de decisão de adjudicação ou do contrato celebrado na sequência dessa decisão. Tendo este requerimento sido indeferido por despacho do presidente do Tribunal de Primeira Instância de 27 de Julho de 2004, ficou reservada para final a decisão quanto às despesas relativas a esse processo.

22      Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância, em 9 de Junho de 2004, a WT pediu para intervir no presente processo em apoio dos pedidos da Comissão. Por despacho de 14 de Julho de 2004, o presidente da Segunda Secção do Tribunal admitiu essa intervenção. A WT apresentou as suas alegações de intervenção e as outras partes apresentaram observações quanto a alegações nos prazos estabelecidos.

23      Com base no relatório do juiz‑relator, o Tribunal de Primeira Instância decidiu iniciar a fase oral e, a título de medidas de organização do processo previstas no artigo 64.° do Regulamento de Processo, pediu à Comissão para responder a várias questões e à WT, por um lado, para responder a uma questão e, por outro, apresentar cópia não confidencial da proposta financeira e técnica apresentada no quadro do processo de concurso em causa. Por carta de 9 de Fevereiro de 2005, a Comissão apresentou as suas respostas às questões do Tribunal e, por carta de 14 de Fevereiro de 2005, a WT apresentou o documento pedido e a resposta à questão do Tribunal de Primeira Instância.

24      A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–        anular a decisão de não adjudicação;

–        anular a decisão de adjudicação,

–        declarar que a ilegalidade cometida pela Comissão é constitutiva de um ilícito susceptível de implicar a responsabilidade da Comissão;

–        ordenar à Comissão, com base no artigo 64.° do Regulamento de Processo, a apresentação de todos os documentos na sua posse relativos à adjudicação do lote n.° 1;

–        remeter a questão à Comissão para que se proceda à avaliação do prejuízo sofrido;

–        condenar a Comissão nas despesas.

25      A Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–        negar provimento ao recurso na íntegra;

–        condenar a recorrente nas despesas.

26      A interveniente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar a recorrente nas despesas.

 Quanto aos pedidos de anulação

27      Em apoio dos pedidos de anulação, a recorrente invoca, no essencial, dois fundamentos. O primeiro baseado na violação do artigo 146.° das normas de execução e num erro manifesto de apreciação das propostas financeiras. O segundo baseado em erro manifesto de apreciação na qualidade das propostas.

1.     Quanto ao primeiro fundamento, relativo à violação do artigo 146.° das normas de execução e a um erro manifesto de apreciação das propostas financeiras

 Argumentos das partes

28      A recorrente entende que a Comissão, ao considerar que a proposta da WT não era anormalmente baixa e, portanto, ao não cumprir o seu dever de pedir à WT oportunas especificações quanto à composição da proposta, violou o artigo 146.° das normas de execução uma vez que, em seu entender, o artigo 139.° das normas de execução não é aplicável ao caso vertente.

29      Segundo a recorrente, o preço da proposta da WT era inferior em 42% à média entre a proposta entregue pela recorrente e a proposta de um terceiro proponente que tinha apresentado uma proposta ainda mais elevada quanto ao preço, sabendo que a proposta da recorrente recebeu um índice para o seu preço de 165,56 e a proposta mais cara um índice de 181,13. Esta diferença maior deveria ter levado a Comissão a considerar a proposta da WT anormalmente baixa, sabendo que, por correio de 8 de Março de 2004, a recorrente tinha dado a conhecer à Comissão as suas dúvidas quanto à fiabilidade do conteúdo da proposta da WT.

30      A recorrente sublinha que, embora a Comissão disponha de um grande poder de apreciação quanto aos elementos a tomar em consideração com vista à tomada de uma decisão adjudicatória de um contrato na sequência de um concurso, o juiz comunitário fiscaliza, no entanto, o respeito das regras de processo e de fundamentação, bem como a exactidão material dos factos e a ausência de erro manifesto de apreciação ou de desvio de poder (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 27 de Setembro de 2002, Tideland Signal/Comissão, T‑211/02, Colect., p. II‑3781, n.° 33).

31      A este propósito, a recorrente lembra que o Tribunal de Primeira Instância considerou no acórdão de 25 de Fevereiro de 2003, Renco/Conselho (T‑4/01, Colect., p. II‑171, n.° 76), que o Conselho «deve [...] examinar a fiabilidade e a seriedade das propostas que lhe pareçam suspeitas em termos globais, o que implica necessariamente que solicite, sendo caso disso, esclarecimentos sobre preços individuais que lhe pareçam duvidosos, a fortiori quando forem numerosos», e que, além disso, «o facto de a proposta da demandante ter sido considerada conforme com o caderno de encargos não isenta o Conselho da obrigação, resultante do mesmo artigo, de verificar os preços de uma proposta caso surjam dúvidas quanto à respectiva fiabilidade no decurso do exame das propostas e após a avaliação inicial da respectiva conformidade».

32      No caso vertente, a recorrente realça que o preço dos serviços de agência de viagens é, para cada um dos lotes, composto, por um lado, por «despesas de gestão» («Management fee»), que constituem a remuneração devida à agência de viagens pelas despesas de gestão relativas às deslocações do pessoal das instituições e agências europeias e, por outro lado, das «despesas de transacção» («Transaction fee»), que constituem a remuneração devida à agência de viagens pelas despesas de administração relativas às deslocações de outras pessoas além do pessoal das instituições e agências europeias, mas que viajam a pedido das instituições e agências europeias.

33      A recorrente recorda que as «despesas de gestão» são constituídas pelos custos salariais, despesas de funcionamento e despesas gerais. De acordo com esta última, os custos salariais constituem o essencial das «despesas de gestão» e, por conseguinte, do preço pelos serviços de agência de viagens relativos ao lote n.° 1. Também, a recorrente considerou na sua proposta financeira que os custos salariais representavam 79,5% dos «custos de gestão». No entender da recorrente, sendo o preço dos serviços de agência de viagens essencialmente constituído de custos salariais, deveria a Comissão ter considerado o preço proposto pela WT como anormalmente baixo.

34      Nestas condições, a recorrente entende que a única possibilidade de reduzir os custos salariais e, portanto, a proposta de preço teria sido reduzir sensivelmente o número de pessoas ligadas à execução do contrato ou o montante das suas remunerações relativamente ao que propunha a recorrente. Tais reduções teriam, então, necessariamente, um impacto sobre a qualidade das prestações.

35      Em primeiro lugar, no que toca às remunerações, a recorrente observa que o caderno de encargos previa que os serviços de agência de viagens deviam ser prestados nas instalações das instituições e agências europeias. Os contratos de trabalho dos seus empregados ficariam, por conseguinte, sujeitos à lei belga, que impõe uma remuneração mínima para os contratos de trabalho.

36      Em segundo lugar, no tocante ao número de empregados, a recorrente entende que, para garantir a qualidade das prestações, é necessário o trabalho de 39 pessoas. Sendo as despesas de pessoal incompressíveis, a grande diferença de preços entre a proposta formulada pela WT e as dos dois outros proponentes permitiria concluir pela existência de uma proposta anormalmente baixa. Observa ainda que, mesmo que seja possível submeter uma proposta mais competitiva do que a sua, seria, no entanto e em todo o caso, dificilmente justificável uma diferença de 42%.

37      Além disso, a recorrente realça que foi erradamente que a Comissão atendeu à relação entre o volume das transacções e as «despesas de gestão», não figurando este critério no caderno de encargos. A este propósito, a recorrente sublinha que não pode existir qualquer proporcionalidade entre os volumes de transacções para os lotes n.os 1 e 2 e os orçamentos estimados para os ditos lotes. Com efeito, o orçamento previsível para o lote n.° 2 representa só 12,58% do orçamento previsível para o lote n.° 1. Além disso, o volume previsível para o lote n.° 2 representa apenas 22,8% do considerado para o lote n.° 1.

38      Por fim, a recorrente salienta que a Comissão recorreu a outros critérios para além do que figura no caderno de encargos, por um lado, à luz das «despesas de gestão» e, por outro, ao tomar em conta o sistema das comissões proposto pela WT bem como os seus meios técnicos e logísticos.

39      De acordo com a Comissão, a proposta apresentada pela WT não era anormalmente baixa, não sendo, portanto, necessário o recurso ao artigo 139.° das normas de execução. A utilização do verbo «revelar», no artigo 139.°, n.° 1, das normas de execução, evidencia a vontade do legislador comunitário de conferir à entidade adjudicante uma ampla margem de apreciação no caso dos processos de concurso. Além disso, a Comissão realça que resulta desse mesmo artigo que uma proposta anormalmente baixa não é ilegal só por si, podendo ser tidas em conta justificações para explicar o teor anormalmente baixo dessa proposta.

40      A Comissão sublinha que não existia nenhuma diferença significativa entre o custo médio das «despesas de transacção» oferecidas pela recorrente e pela WT, ao passo que existia uma variação não negligenciável quanto ao montante das «despesas de gestão» propostas pelas duas proponentes.

41      No que toca aos custos salariais, a WT avaliou correctamente o número de pessoas necessárias, baseando‑se, designadamente, numa ratio «volume médio anual de transacções por gestor». Além disso, a Comissão refere que nenhuma outra proposta apresentava igualmente um número de consultores inferior ao da recorrente. Atento o custo por pessoa, a Comissão observa que a WT propôs o segundo preço mais baixo, e a recorrente apresentou o preço mais elevado.

42      No que se refere aos preços gerais, a proposta da WT apresenta despesas gerais largamente inferiores às da recorrente.

43      O comité de avaliação teve igualmente em conta diversos parâmetros a fim de apreciar a coerência das propostas relativas às «despesas de gestão». Por um lado, este analisou o custo médio de uma transacção «missões» remunerada pelas «despesas de gestão» relativamente ao custo médio de uma transacção «outras deslocações» remunerada pelas «despesas de transacção». Este custo médio foi de 32,94 EUR contra 14,37 EUR para a recorrente, e de 16 EUR contra 15,66 EUR para a WT. Por outro lado, comparou o custo das «despesas de gestão» relativo ao lote n.° 1 (Bruxelas) com o relativo ao lote n.° 2 (Luxemburgo), em função do volume proporcional de cada lote. Resultou desta análise que as «despesas de gestão» da WT para o lote n.° 1 eram 3,64 vezes superiores às propostas para o lote n.° 2, para um volume de missões 3,56 vezes superior. As «despesas de gestão» da recorrente revelaram‑se superiores para o lote n.° 1, uma vez que estas eram 7,89 vezes superiores às propostas para o lote n.° 2, igualmente para um volume 3,56 vezes superior.

44      Face a esta análise, a Comissão considerou que a proposta da WT era realista, equilibrada e proporcional. Acrescenta que se baseou em parâmetros objectivos e comparáveis entre as propostas, permitindo assim apreciar a coerência entre o conteúdo técnico e o nível do preço da proposta.

45      A Comissão realça também que tomou em conta o sistema de comissões da WT [repartição entre a agência e a Comissão dos reembolsos negociados pela agência sobre o preço de compra dos bilhetes relativamente ao preço da International Air Transport Association (Associação de Transporte Aéreo Internacional), a seguir «IATA»]. Com efeito, considera ser este sistema de comissões um elemento pertinente, por um lado, para apreciar o rendimento potencial que um proponente pode obter além da remuneração de um serviço e, por outro, para apreciar o equilíbrio económico de uma proposta relativa às «despesas de gestão».

46      Por seu turno, a WT considera que a Comissão demonstrou ter procedido a uma análise comparativa minuciosa e precisa, pelo que a sua proposta não podia, pois, revelar‑se anormalmente baixa.

 Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

47      A título preliminar, importa recordar que a Comissão dispõe de um amplo poder de apreciação quanto aos elementos a tomar em consideração para a tomada de uma decisão de adjudicar um contrato com base em concurso e que a fiscalização do Tribunal deve limitar‑se à verificação do respeito das regras de processo e de fundamentação, bem como da exactidão material dos factos e da inexistência de erro manifesto de apreciação ou de desvio de poder (acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 24 de Fevereiro de 2000, ADT Projekt/Comissão, T‑145/98, Colect., p. II‑387, n.° 147, e de 26 de Fevereiro de 2002, Esedra/Comissão, T‑169/00, Colect., p. II‑609, n.° 95).

48      Há igualmente que observar que, de acordo com o artigo 97.° do Regulamento Financeiro, «[o]s contratos podem ser adjudicados à proposta de mais baixo preço ou à proposta economicamente mais vantajosa». Além disso, nos termos do artigo 138.° das normas de execução, «[a] proposta economicamente mais vantajosa é a que apresentar a melhor relação qualidade/preço, tendo em conta critérios justificados pelo objectivo do contrato».

49      Por outro lado, resulta do artigo 139.° das normas de execução que a entidade adjudicante tem a obrigação de permitir ao proponente explicitar ou mesmo justificar as características da sua proposta, antes de a rejeitar, se considerar que uma proposta é anormalmente baixa. Do mesmo modo, o dever de verificar a seriedade de uma proposta resulta da existência prévia de dúvidas quanto à sua fiabilidade, sabendo‑se, além disso, que este artigo tem por objecto principal permitir a um proponente não ser afastado do processo sem que tenha tido a possibilidade de justificar o conteúdo da sua proposta que se revele anormalmente baixa.

50      Por conseguinte, a aplicação do artigo 146.° das normas de execução está intrinsecamente ligada à do artigo 139.° do mesmo diploma, uma vez que só quando uma proposta é considerada anormalmente baixa, na acepção deste último artigo, é que o comité de avaliação é obrigado a pedir esclarecimentos oportunos quanto à composição da proposta antes de, eventualmente, a rejeitar. Assim, e contrariamente ao que alega a recorrente, no caso de a proposta não se revelar anormalmente baixa nos termos do dito artigo 139.°, o artigo 146.° das normas de execução não é relevante. Portanto, uma vez que o comité de avaliação, no caso vertente, não teve qualquer intenção de recusar a proposta da WT, uma vez que esta não se lhe afigurava anormalmente baixa, é irrelevante o artigo 139.° das normas de execução.

51      No que toca à adjudicação do contrato controvertido, resulta do artigo 6.° do caderno de encargos que, «para cada lote, o contrato será adjudicado ao proponente que apresente a proposta economicamente mais vantajosa tendo em conta a qualidade dos serviços e os preços propostos». De acordo com jurisprudência assente, para se identificar a proposta economicamente mais vantajosa, cada um dos critérios de adjudicação tomados em consideração pela entidade adjudicante não tem que ser necessariamente de natureza puramente económica, visto não se poder excluir que factores que não são puramente económicos possam afectar o valor de uma proposta no entender da referida entidade adjudicante (acórdão do Tribunal de Justiça de 17 de Setembro de 2002, Concordia Bus Finland, C‑513/99, Colect., p. I‑7213, n.° 55, e acórdão Renco/Conselho, já referido, n.° 67).

52      No caso vertente, os preços dos serviços de agência de viagens são constituídos por dois elementos essenciais: i) as «despesas de gestão», que representam o montante mensal global que cobre os custos salariais, as despesas de funcionamento e as despesas gerais e ii) as «despesas de transacção», que representam a remuneração devida à agência de viagens pelas despesas de administração relativas às deslocações das pessoas que viajam a pedido das instituições e agências europeias.

53      O Tribunal observa que a recorrente não põe em causa as «despesas de transacção» propostas pela WT, contestando unicamente o montante das «despesas de gestão» apresentadas por esta. Assim, importa determinar se a Comissão cometeu um erro manifesto de apreciação à luz do conteúdo financeiro das «despesas de gestão» consideradas nos seus diferentes elementos, sendo a proposta das «despesas de gestão» da WT a mais barata, a da recorrente a mais cara, situando‑se outras duas propostas entre ambas.

 Quanto aos custos salariais

54      Há que observar que os custos salariais são fixados em função, por um lado, do número de pessoas empregadas e, por outro, do custo que representa cada empregado.

55      Em primeiro lugar, relativamente ao número de empregados, importa notar que este pode ser um indicador útil à luz de uma eventual subavaliação das necessidades exigidas por uma boa execução dos serviços objecto do concurso. Contudo, esse número não pode ser considerado uma indicação determinante, pois a eficácia da organização estrutural de um proponente pode justificar menor número de empregados.

56      No caso vertente, o Tribunal observa que, para avaliar o número de empregados necessários, a WT se baseou no «volume médio anual de transacções por gestor», assentando este cálculo num critério objectivo e realista. A WT indicou, em resposta a uma questão escrita do Tribunal de Primeira Instância, que o número de empregados que considerava necessário para o lote n.° 1 era de 29, sabendo‑se que uma outra proposta indicava um número ainda mais baixo.

57      A estimativa da recorrente, de acordo com a qual são necessárias 39 pessoas para a execução dos serviços, não releva, pois não está excluído que outros proponentes tenham condições para oferecer um número menor de empregados graças, designadamente, ao modo operativo mais eficiente e uma maior competitividade técnica.

58      Por conseguinte, o Tribunal de Primeira Instância considera que a recorrente não demonstrou suficientemente que a estimativa da WT do número de empregados era inadequada e que esta subavaliou o referido número.

59      Em segundo lugar, quanto ao custo por pessoa, importa recordar que a WT propôs o segundo preço por empregado mais baixo tendo a recorrente, por seu turno, proposto o preço mais alto.

60      À luz desta constatação, verifica‑se que a WT não era o único agente económico a ter avaliado as necessidades exigidas para o lote n.° 1 em custo inferior ao avaliado pela recorrente. Além disso, o facto de nenhum outro proponente ter proposto um custo por pessoa inferior ao escolhido reforça a apreciação da entidade adjudicante de acordo com a qual os preços propostos pela WT não eram anormalmente baixos.

61      O Tribunal observa que a recorrente se limita a arguir que a WT propôs um número insuficiente de empregados ou o pagamento de uma remuneração anormalmente baixa. No entanto, importa observar que a recorrente não apresentou elementos susceptíveis de demonstrar que a Comissão cometeu um erro manifesto de apreciação. Portanto, a entidade adjudicante podia concluir que o número de empregados propostos pela WT era coerente e que a proposta escolhida não era anormalmente baixa.

 Quanto às despesas de funcionamento

62      No que concerne às despesas de funcionamento, resulta do anexo 2 do caderno de encargos que estas são compostas, por um lado, pelas despesas relativas ao financiamento pela agência do prazo entre a data de pagamento por esta das facturas dos seus fornecedores e a data de pagamento pela Comissão das facturas da agência, e, por outro, por todos os outros encargos e despesas de gestão relativos aos bens de equipamento, aos bens perecíveis, à manutenção e exploração do material informático e de comunicação utilizados para efeitos da execução do contrato.

63      A este propósito, a recorrente não provou que as despesas de funcionamento estimadas pela WT eram anormalmente baixas, tendo‑se limitado, no seu articulado, a definir as componentes das ditas despesas sem explicitar de que modo a avaliação feita pela WT era anormalmente baixa.

 Quanto às despesas gerais

64      No que toca às despesas gerais, há que observar que a Comissão podia considerar que a proposta da WT apresentava uma parte de despesas gerais largamente inferior à da proposta da recorrente. Quanto a esta rubrica, importa salientar que as proponentes procederam a uma avaliação de acordo com a sua prática e a sua experiência. Por conseguinte, as estimativas da recorrente não podem ser consideradas uma referência, sendo certo que a especificidade organizativa de cada proponente pode justificar a existência de despesas inferiores.

65      Além disso, segundo a Comissão, a WT preocupou‑se em «minimizar os custos continuando a assegurar um alto nível de qualidade, baseando‑se em infra‑estruturas e tecnologias mais desenvolvidas, graças a técnicas de produtividade avançadas». Resulta de uma resposta escrita a uma questão colocada pelo Tribunal de Primeira Instância que a Comissão tomou designadamente em conta o facto de que a WT estava em condições de propor soluções consideradas óptimas para a redução de custos no fornecimento de serviços, mas igualmente soluções informáticas inovadoras. Além disso, a discriminação exaustiva dos recursos técnicos e logísticos da proposta da WT permitiu à Comissão assegurar‑se que as infra‑estruturas utilizadas e os instrumentos desenvolvidos assentavam na produtividade e na redução de custos continuando a garantir a eficácia dos serviços. Assim, a proposta técnica evidenciava uma preocupação relativa à prestação do melhor serviço ao melhor preço.

66      Por conseguinte, e à luz destas considerações, o Tribunal considera que a Comissão verificou se as despesas gerais garantiam uma boa execução das prestações previstas e se a proposta escolhida era fiável e séria.

67      Importa igualmente notar que o comité de avaliação verificou a coerência das «despesas de gestão» comparando, em primeiro lugar, o custo médio de uma transacção «missões» remunerada pelas «despesas de gestão» com o de uma transacção «outras deslocações» remunerada pelas «despesas de transacção». Esta análise demonstrou que este custo era, relativamente à proposta da recorrente, cerca de duas vezes superior ao custo médio de uma transacção remunerada pelas «despesas de transacção» (32,94 EUR contra 14,37 EUR), contrariamente à proposta da WT, com custos ligeiramente diferentes (16 EUR contra 15,66 EUR).

68      O comité de avaliação comparou, em segundo lugar, o custo das «despesas de gestão» dos lotes n.° 1 (Bruxelas) e n.° 2 (Luxemburgo) em função do volume proporcional de cada lote. Ora, a proposta apresentada pela WT podia revelar‑se fiável para a entidade adjudicante, uma vez que as «despesas de gestão» para o lote n.° 1 eram 3,64 vezes superiores às propostas para o lote n.° 2, para um volume de missões 3,56 vezes superior, ou seja, uma proporção justificada e que não deixava transparecer qualquer incoerência nos preços propostos. Ao invés, as «despesas de gestão» da recorrente revelaram‑se bem maiores para o lote n.° 1, uma vez que estas eram 7,89 vezes superiores às propostas para o lote n.° 2, igualmente para um volume 3,56 vezes superior.

69      O Tribunal observa que a recorrente contesta esta comparação de ratio, mas não provou que a mesma estivesse errada, além de que, e contrariamente ao que alega a recorrente, a Comissão só recorreu a este processo comparativo para se assegurar da coerência da proposta adoptada e de modo algum para atribuir o lote n.° 1. A Comissão podia, portanto, validamente considerar que as «despesas de gestão» da proposta da WT eram sérias e fiáveis.

 Quanto ao sistema de comissões

70      Há que considerar, à semelhança da Comissão, que o sistema de comissões foi tomado em conta na determinação qualitativa da proposta, a fim de se demonstrar o acerto de não se considerar a mesma anormalmente baixa. Este elemento foi utilizado para assegurar a fiabilidade e a seriedade da proposta financeira no seu conjunto e não como critério de adjudicação. Uma vez que qualquer reembolso obtido pelo prestador dá origem a uma retribuição proporcional a favor da Comissão e que, no caso vertente, a proposta da WT apresentava parte importante do rendimento suplementar na parte de comissões, a Comissão podia assegurar‑se do equilíbrio económico das «despesas de gestão».

71      Atento o exposto, não se verifica que a Comissão tenha cometido qualquer erro manifesto de apreciação ao considerar que a proposta financeira da WT era economicamente a mais vantajosa sem que por isso fosse anormalmente baixa. Portanto, improcede o primeiro fundamento.

2.     Quanto ao segundo fundamento, relativo a um erro manifesto na apreciação da qualidade das propostas técnicas

 Argumentos das partes

72      A recorrente considera que a Comissão cometeu um erro manifesto de apreciação ao atribuir à proposta da WT a nota mais alta (87,62 em 100) para a qualidade dos serviços propostos. Em seu entender, a fim de explicar a obtenção de uma nota superior, a proposta da WT devia apresentar significativas garantias de qualidade quanto aos serviços de agência de viagens, além de garantias de qualidade superiores às que ela própria propôs. Ora, em seu entender, a proposta da WT não pode de modo algum assegurar uma qualidade suficiente para os ditos serviços.

73      A recorrente considera que a WT, ao recrutar 14 dos seus 35 antigos empregados, não dispunha do pessoal necessário para garantir uma boa qualidade das prestações.

74      A recorrente realça que não lhe pode ser imputada qualquer falha no decurso da execução das prestações durante a execução do contrato‑quadro, ou seja, desde 1 de Abril de 1999 a 31 de Março de 2004. A este propósito, lembra que, numa nota interna de 6 de Dezembro de 2001, o chefe de unidade encarregado das missões na Comissão reconheceu a boa execução das suas prestações como agência de viagens, sublinhando o seu carácter «globalmente positivo». Por conseguinte, a recorrente considera que a sua proposta preenchia plenamente as exigências estabelecidas pelo caderno de encargos.

75      A recorrente sublinha que a Comissão sabia, antes mesmo do início da execução do contrato, que a WT não podia assegurar uma execução correcta dos serviços durante um prazo de três meses, ou seja, um período correspondente a um oitavo da duração inicial do contrato. Ora, a recorrente nota que o anexo 1 do caderno de encargos faz da prestação dos serviços de agência de viagens nas instalações das instituições condição imperativa da execução do serviço, sabendo‑se, além disso, que o contrato pode ser rescindido «quando a execução do contrato não tiver começado efectivamente nos três meses seguintes à data prevista para o efeito». A recorrente estranha também que, apesar de se prever no momento da avaliação das propostas que a WT não poderia executar o contrato durante três meses, lhe tenha sido atribuída a nota qualitativa mais alta.

76      A recorrente considera que a atribuição do lote n.° 1 à WT foi feita em inobservância das prescrições do caderno de encargos, que enuncia, no anexo 1, como condição de admissibilidade das propostas, a apresentação da prova de que os proponentes dispõem das autorizações necessárias para emitir títulos de transporte e esclarece que o número de licença da IATA (a seguir «licença IATA») é exigido antes do início da execução do contrato. Ora, o contrato celebrado com a WT, em 31 de Março de 2004, começou a ser aplicado a partir de 1 de Abril de 2004, quando a WT não estava em condições de apresentar o referido número de licença. Por conseguinte, a recorrente considera ser a única dos proponentes em condições de respeitar o caderno de encargos, no que se refere à obtenção da licença IATA.

77      Por seu turno, a Comissão considera ter avaliado a qualidade das propostas técnicas de acordo com o caderno de encargos e com a metodologia de avaliação estabelecida previamente à abertura das propostas sem cometer qualquer erro manifesto de apreciação.

78      Relativamente à impossibilidade de assegurar a execução do contrato entre 1 de Abril e 27 de Junho de 2004, a Comissão nota que nenhum contraente, para além da recorrente, estava em condições de cumprir as formalidades administrativas e técnicas necessárias para a execução dos serviços nos gabinetes da Comissão no prazo de seis semanas a contar da decisão de adjudicação e a menos de um mês da primeira data útil para assinatura do contrato. Daí a Comissão ter pedido à recorrente que continuasse a assegurar este serviço, tendo esta finalmente recusado aceder a esse pedido.

79      Por conseguinte, a Comissão sublinha que, em face de uma situação de urgência imperiosa resultante de acontecimentos imprevistos não imputáveis à identidade adjudicante e susceptíveis de pôr em perigo os interesses da Comunidade, teve de recorrer ao artigo 126.°, n.° 1, alínea c), das normas de execução. Portanto, assinou o contrato em causa com uma cláusula que permitia ao novo contraente efectuar serviços «ex‑plant», isto é, nas suas próprias instalações, por um período transitório entre 1 de Abril e 19 de Maio de 2004 e não por três meses como alega a recorrente.

80      A este propósito, a Comissão lembra que se deparou com a desistência imprevista de várias instituições entre as quais o Parlamento Europeu e o Tribunal de Justiça. No caso vertente, o caderno de encargos não previa qualquer data precisa para o início de execução das prestações, a não ser que o contrato tinha de ser assinado antes de 30 de Junho de 2004 e que as propostas tinham uma validade de nove meses, a contar de 2 de Dezembro de 2003. Além disso, a WT esteve sempre em condições de executar o contrato controvertido, que devia iniciar‑se, o mais tardar, em 1 de Julho de 2004.

81      Além disso, contesta a alegação de que conhecia, aquando do anúncio de proposta interinstitucional, as dificuldades que seriam causadas na sequência da desistência das instituições. Com efeito, só em 8 de Março de 2004, na reunião com a WT, surgiram os problemas de ordem técnica e administrativa que tornaram impossível a execução do contrato «in‑plant» a partir de 1 de Abril de 2004. Por conseguinte, a Comissão considera que os problemas apenas foram conhecidos após o encerramento do concurso, obrigando a Comissão a encontrar uma solução adequada.

82      A Comissão sublinha que, de acordo com o caderno de encargos, a licença IATA apenas seria exigida antes do início das prestações, ou seja, posteriormente ao encerramento do processo de concurso. Além disso, esta licença nunca seria um critério de avaliação qualitativa.

83      A WT, por seu turno, contesta o facto de que deva automaticamente ser atribuída a nota mais alta a um contraente que tenha já sido escolhido.

84      Relativamente às licenças IATA, a WT sublinha que dispunha de uma licença global que cobria as suas actividades na Bélgica e as licenças IATA para cada uma das suas agências. Considera que nenhum proponente, com excepção da recorrente, podia dispor de uma licença no que respeita às instalações situadas no espaço da Comissão. Além disso, a WT sublinha que resulta do anexo 1 do caderno de encargos (cláusula 2.2) que o facto de dispor de um número de licença IATA específico para a execução do contrato não constitui de modo algum uma condição de admissibilidade das propostas.

85      Por fim, no que respeita ao número de empregados, a WT lembra que ela preenchia a condição enunciada no aviso de concurso. Com efeito, dispunha de pelo menos 70 empregados na Bélgica, sabendo‑se, em seu entender, que estes possuíam, na sua maioria, as qualificações profissionais visadas no artigo 5.2 do anexo 1 do caderno de encargos.

 Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

86      Há que recordar, a título preliminar, que resulta de jurisprudência assente que a qualidade das propostas deve ser avaliada com base nas próprias propostas e não a partir da experiência adquirida pelos candidatos com a entidade adjudicante nos anteriores contratos ou com base nos critérios de selecção, como a capacidade técnica dos proponentes, que já foram verificados na fase de selecção das candidaturas e que não podem ser de novo tomados em conta para efeitos da comparação das propostas (acórdão do Tribunal de Justiça de 20 de Setembro de 1988, Beentjes, 31/87, Colect., p. 4635, n.° 15, e acórdão Esedra/Comissão, já referido, n.° 158).

87      No caso vertente, resulta do artigo 6.° do caderno de encargos que os critérios de adjudicação do contrato são dois, a saber, a qualidade dos serviços propostos e os preços apresentados. Relativamente à qualidade da proposta, esta deve ser avaliada de acordo com quatro critérios: i) pessoal, ii) meios técnicos e logísticos, iii) gestão e comunicação da informação e iv) capacidade de negociação dos melhores preços.

88      Assim, a experiência passada da recorrente não pode constituir obstáculo à existência de uma proposta de outro proponente capaz de oferecer uma qualidade de serviços superiores à sua e que responda de modo adequado aos quatro critérios a que deve obedecer a qualidade pretendida.

89      No que toca ao número de empregados, a WT propôs 29 empregados para o lote n.° 1, tendo a recorrente, por seu turno, indicado 39. A estimativa da WT pareceu fiável à Comissão, sabendo‑se que a produtividade e eficácia da WT, como explicitada por esta numa das respostas escritas ao Tribunal de Primeira Instância e mencionadas no n.° 65 supra, podem justificar um número claramente mais baixo de empregados do que a recorrente, sem que a qualidade esperada das prestações fique comprometida.

90      Além disso, importa observar que nem o Regulamento Financeiro nem as normas de execução exigem que um proponente disponha efectivamente, no momento em que apresenta a sua proposta, do pessoal para executar um contrato futuro que lhe poderá ser atribuído. Com efeito, qualquer proponente escolhido deve estar em condições de fornecer as prestações na data fixada no contrato resultante do processo de apresentação de propostas e não antes de o contrato lhe ser finalmente adjudicado. Exigir que o proponente disponha no momento da apresentação da sua proposta do número de empregados exigidos significaria privilegiar o proponente já instalado negando assim a própria essência do concurso público. No caso vertente, o caderno de encargos exigia unicamente que o proponente, no momento da apresentação da sua proposta, dispusesse de, pelo menos, 70 empregados na Bélgica, condição essa preenchida pela WT.

91      Importa recordar que as dificuldades de execução encontradas pela WT, que não estava em condições de obter a licença IATA exigida e, portanto, fornecer os serviços em regime interno a partir de 1 de Abril de 2004, estavam ligadas à desistência de determinadas instituições, o que implicou o lançamento de um segundo concurso, e tal só surgiu posteriormente à adjudicação do contrato. Com efeito, só em 8 de Março de 2004, na reunião entre a Comissão e a WT, se manifestaram essas dificuldades. Por conseguinte, é irrelevante o argumento da recorrente segundo o qual as dificuldades de execução da WT durante os três primeiros meses do contrato não podiam justificar a obtenção de uma nota alta e deveriam ter levado a Comissão a rescindir o contrato finalmente assinado com a WT.

92      Da leitura do projecto de contrato anexo ao caderno de encargos, resulta que a possibilidade de rescisão é apenas uma faculdade que cabe à instituição, contrariamente ao que alega a recorrente. Ora, no caso vertente, a Comissão considerou que os serviços em causa não tinham sido fornecidos com atraso excessivo e que a sua execução não tinha implicado um prazo inaceitável, sabendo‑se, além disso, que a WT começou a prestar os seus serviços a partir de 1 de Abril de 2004, e nas condições fixadas e adaptadas no aditamento.

93      Além disso, da leitura do caderno de encargos não resulta que a capacidade de executar imediatamente as prestações constituísse um critério de avaliação qualitativo, uma vez que só previa uma data‑limite para o início de execução das prestações, no caso, 1 de Julho de 2004. Portanto, o facto de a WT não estar em condições de fornecer os seus serviços a partir de 1 de Abril de 2004 não constitui uma violação do caderno de encargos, uma vez que este apenas indicava data‑limite para o início das prestações. Com efeito, a WT prestou serviços «in‑plant» a partir de 24 de Maio de 2004, ou seja, mais de um mês antes da data‑limite estipulada no caderno de encargos.

94      No que se refere à licença específica para a execução do contrato, o caderno de encargos enuncia que «são exigidos antes do início das actividades [...] um número de licença IATA específico para a execução do contrato bem como um certificado das autoridades locais no âmbito das agências de viagens [...]» [anexo 1 do caderno de encargos (cláusula 2.2)]. A WT indicou na audiência que tinha recebido, em 10 de Maio de 2004, a licença «A», exigida para poder obter seguidamente uma licença IATA. No caso vertente, a WT obteve a referida licença IATA em 18 de Maio de 2004. Portanto, a WT respeitou o disposto no caderno de encargos pois estava de posse da dita licença antes de 1 de Julho de 2004.

95      Quanto à utilização do procedimento por negociação, o artigo 126.°, n.° 1, alínea c), das normas de execução enuncia que «[a]s entidades adjudicantes podem recorrer a um procedimento por negociação, sem publicação prévia de anúncio de contrato [...] na medida do estritamente necessário, quando por força de urgência imperiosa, decorrente de acontecimentos imprevisíveis e não imputáveis à entidade adjudicante e susceptíveis de comprometer os interesses das Comunidades, não for compatível com os prazos exigidos pelos outros procedimentos».

96      No que se refere ao carácter imprevisível e não imputável à entidade adjudicante do facto, importa notar que foi na sequência da desistência de outras instituições que a Comissão procedeu a nova publicação do contrato, em 29 de Junho de 2003, dando origem a uma diferença de calendário. A Comissão explicou na resposta a uma questão colocada pelo Tribunal de Primeira Instância que, após ter dado o seu acordo à publicação do anúncio do contrato, o Parlamento manifestou reticências na participação num concurso, em reunião de 3 de Julho de 2003. O Parlamento emitiu, designadamente, reservas no que se refere à adjudicação do contrato com base num lote por cidade. Por nota de 11 de Junho de 2003, o director‑geral do pessoal do Parlamento comunicou a impossibilidade de o Parlamento finalizar o caderno de encargos antes de 30 de Outubro de 2003. O cumprimento do prazo proposto pelo Parlamento teria comprometido o desenvolvimento do concurso relativamente ao prazo máximo do contrato em curso, a saber, 31 de Março de 2004. Em 8 de Julho de 2003, o Parlamento anunciou a sua desistência, arrastando também a de outras instituições. A Comissão explicou igualmente não poder especificar uma data de início das prestações no concurso, mas simplesmente uma data‑limite, uma vez que cada lote tinha especificidades próprias, nomeadamente datas e prazos diferentes, o que tornava impossível a fixação de uma data única de início das prestações de serviços para o conjunto dos lotes. Além disso, foi só na reunião de 8 de Março de 2004 que a Comissão teve conhecimento de que o processo de obtenção da licença IATA, necessária para a prestação de serviços «in‑plant», exigia algum tempo e podia, assim, causar um certo atraso na execução das prestações.

97      Deste modo, a fim de obviar a esta dificuldade resultante da desistência inicial das instituições, a Comissão pediu à recorrente que assegurasse o serviço durante um pedido transitório de seis a oito semanas, o que esta recusou.

98      O Tribunal de Primeira Instância considera, portanto, que o calendário, perturbado pela desistência imprevista de determinadas instituições e pela recusa da recorrente de fornecer os serviços durante um período transitório, não permitia à Comissão manter a continuidade dos serviços de agência de viagens sem recorrer à assinatura de um aditamento que permitisse à WT fornecer os serviços «ex‑plant», de 1 de Abril a 19 de Maio de 2004, a fim de responder à situação de urgência imperiosa com que se viu confrontada.

99      Além disso, verifica‑se que a Comissão não teve qualquer papel nas desistências em causa, não lhe podendo estas ser imputáveis além de que eram imprevisíveis, uma vez que as reservas do Parlamento só se manifestaram posteriormente à publicação inicial do anúncio do concurso.

100    Estando em perigo os interesses da Comunidade, é de considerar que a importância da continuidade dos serviços visados pelo presente processo, que implica cerca de 57 000 missões por ano, é tal que a Comissão devia assegurar a sua continuidade recorrendo a um procedimento de negociação.

101    O Tribunal constata que o procedimento de negociação não foi utilizado no quadro do concurso. Com efeito, este procedimento apenas foi usado para assinar um aditamento ao contrato principal, que resulta do procedimento de concurso e foi assinado em 31 de Março de 2004. Por conseguinte, este aditamento teve como única função permitir uma prestação «ex‑plant» dos referidos serviços durante o período de 1 de Abril a 19 de Maio de 2004, face à recusa da recorrente de assegurar os serviços durante o período transitório.

102    O Tribunal de Primeira Instância considera também, à luz da interpretação do caderno de encargos, que não era na data de apresentação da proposta, mas sim em 1 de Julho de 2004, que se exigia que o proponente estivesse em condições de prestar os serviços internamente. Devido à recusa da recorrente de prorrogar o contrato após o termo do contrato‑quadro de 31 de Março de 2004, a Comissão viu‑se na necessidade de chegar a um entendimento com a WT a fim de assegurar a continuidade dos serviços. Com efeito, é legítimo que uma execução prematura dos serviços à data de 1 de Abril de 2004 tivesse exigido uma adaptação contratual, permitindo, designadamente, uma prestação temporária dos serviços «ex‑plant». A este respeito, importa também realçar que a WT podia responder às exigências colocadas pelo caderno de encargos, uma vez que estava em condições de prestar os serviços internamente a partir de 24 de Maio de 2004, ou seja, mais de um mês antes da data‑limite fixada no dito caderno.

103    Portanto, é de considerar que se verificavam as condições enunciadas no artigo 126.°, n.° 1, alínea c), das normas de execução e que foi justificado o recurso ao procedimento de negociação.

104    No que toca ao último fundamento da recorrente invocado na réplica, baseado na violação dos princípios da igualdade de tratamento e da não discriminação previstos pelo artigo 89.°, n.° 1, do Regulamento Financeiro, importa notar que, nos termos do artigo 48.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, é proibido deduzir novos fundamentos no decurso da instância a menos que tenham origem em elementos de direito e de facto que se tenham revelado durante o processo. Dado que este fundamento não foi mencionado no requerimento e que não se trata de um elemento que se tenha revelado durante o processo, deve ser julgado inadmissível.

105    Atento o exposto, não se verifica que a Comissão tenha cometido qualquer erro manifesto na apreciação qualitativa da proposta seleccionada. Portanto, improcede o segundo fundamento.

3.     Quanto ao pedido de apresentação de documentos relativos à adjudicação do lote n.° 1

106    No âmbito das medidas de organização do processo, o Tribunal de Primeira Instância pediu designadamente à interveniente que apresentasse dados relativos à sua proposta. Assim, o Tribunal de Primeira Instância considerou‑se suficientemente esclarecido pelos elementos dos autos para poder decidir a causa sem necessidade de ordenar à Comissão a apresentação de todos os documentos relativos à adjudicação do lote n.° 1, pedida pela recorrente com base no artigo 64.° do Regulamento de Processo.

 Quanto aos pedidos de indemnização

107    Decorre do que vem dito que a Comissão não cometeu qualquer erro manifesto de apreciação na escolha do proponente seleccionado nem cometeu qualquer violação do Regulamento Financeiro. A recorrente também não invoca nenhum outro elemento, além destes dois fundamentos, que possa constituir uma ilegalidade susceptível de gerar a responsabilidade da Comunidade. Por conseguinte, o pedido de indemnização deve ser considerado improcedente sem necessidade de o Tribunal se pronunciar quanto à sua admissibilidade.

108    Portanto e em face do exposto, deve ser negado provimento ao recurso na sua totalidade.

 Quanto às despesas

109    Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a recorrente sido vencida, há que condená‑la nas despesas da Comissão e da interveniente, incluindo as relativas ao processo de medidas provisórias.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Segunda Secção)

decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      A recorrente é condenada nas despesas da Comissão e da interveniente, incluindo as relativas ao processo de medidas provisórias.

Pirrung

Forwood

Papasavvas

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 6 de Julho de 2005.

O secretário

 

      O presidente

H. Jung

 

      J. Pirrung

Índice

Quadro jurídico

Factos na origem do litígio

Tramitação processual e pedidos das partes

Quanto aos pedidos de anulação

1.  Quanto ao primeiro fundamento, relativo à violação do artigo 146.° das normas de execução e a um erro manifesto de apreciação das propostas financeiras

Argumentos das partes

Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

Quanto aos custos salariais

Quanto às despesas de funcionamento

Quanto às despesas gerais

Quanto ao sistema de comissões

2.  Quanto ao segundo fundamento, relativo a um erro manifesto na apreciação da qualidade das propostas técnicas

Argumentos das partes

Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

3.  Quanto ao pedido de apresentação de documentos relativos à adjudicação do lote n.° 1

Quanto aos pedidos de indemnização

Quanto às despesas


* Língua do processo: francês.