Language of document : ECLI:EU:T:2005:455

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Segunda Secção alargada)

14 de Dezembro de 2005 (*)

«Recurso de anulação – Concorrência – Decisão da Comissão que declara uma concentração incompatível com o mercado comum – Regulamento (CEE) n.° 4064/89 – Ineficácia da crítica parcial da decisão – Mercados aeronáuticos – Recurso que não pode levar à anulação da decisão»

No processo T‑209/01,

Honeywell International Inc., com sede em Morristown, Nova Jérsia (Estados Unidos da América), representada por K. Lasok, QC, e F. Depoortere, advogado,

recorrente,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada por R. Lyal, P. Hellström e F. Siredey‑Garnier, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrida,

apoiada por:

Rolls‑Royce plc, com sede em Londres (Reino Unido), representada por A. Renshaw, solicitor,

e por

Rockwell Collins, Inc., com sede em Cedar Rapids, Iowa (Estados Unidos da América), representada por T. Soames, J. Davies, A. Ryan, solicitors, e P. Camesasca, advogado,

intervenientes,

que tem por objecto a anulação da Decisão 2004/134/CE da Comissão, de 3 de Julho de 2001, que declara uma concentração incompatível com o mercado comum e com o funcionamento do acordo EEE (processo COMP/M.2220 – General Electric/Honeywell) (JO 2004, L 48, p. 1),

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Segunda Secção Alargada),

composto por: J. Pirrung, presidente, V. Tiili, A. W. H. Meij, M. Vilaras e N. J. Forwood, juízes,

secretário: H. Jung,

vistos os autos e após a audiência de 25 de Maio de 2004,

profere o presente

Acórdão

 Quadro jurídico

1        O Regulamento (CEE) n.° 4064/89 do Conselho, de 21 de Dezembro de 1989, relativo ao controlo das operações de concentração de empresas (JO L 395, p. 1, com as rectificações publicadas no JO 1990, L 257, p. 13), na versão alterada em último lugar pelo Regulamento (CE) n.° 1310/97 do Conselho, de 30 de Junho de 1997 (JO L 180, p. 1) (a seguir, na versão rectificada e alterada, «Regulamento n.° 4084/89»), preceitua, no artigo 2.°, n.os 2 e 3:

«2.      Devem ser declaradas compatíveis com o mercado comum as operações de concentração que não criem ou não reforcem uma posição dominante de que resultem entraves significativos à concorrência efectiva no mercado comum ou numa parte substancial deste.

3.      Devem ser declaradas incompatíveis com o mercado comum as operações de concentração que criem ou reforcem uma posição dominante de que resultem entraves significativos à concorrência efectiva no mercado comum ou numa parte substancial deste.»

 Antecedentes do litígio

2        A Honeywell International, Inc. (a seguir «recorrente») é uma empresa que opera, designadamente, nos mercados dos produtos e serviços do sector aeronáutico, dos produtos para o sector automóvel, do material electrónico, dos produtos químicos especializados, dos polímeros de elevado desempenho, dos transportes e sistemas de produção de energia, e da vigilância para residências e para a indústria.

3        A General Electric Company (a seguir «GE») é uma empresa industrial diversificada, que opera, designadamente, nos domínios dos motores de aeronaves, dos electrodomésticos, dos serviços de informação, dos sistemas de produção de energia, da iluminação, dos sistemas industriais, dos sistemas médicos, dos plásticos, da radiodifusão, dos serviços financeiros e dos serviços de transportes.

4        Em 22 de Outubro de 2000, a GE e a recorrente celebraram um acordo nos termos do qual a GE adquiria a totalidade do capital social da recorrente (a seguir «concentração»), tornando‑se a Honeywell uma filial a 100% da GE.

5        Em 5 de Fevereiro de 2001, a Comissão foi notificada de uma proposta de concentração, nos termos do artigo 4.° do Regulamento n.° 4064/89.

6        Em 1 de Março de 2001, considerando que a concentração podia ser abrangida pelo âmbito de aplicação do Regulamento n.° 4064/89, a Comissão decidiu dar início ao processo de exame previsto no artigo 6.°, n.° 1, alínea c), do referido regulamento e no artigo 57.° do acordo sobre o Espaço Económico Europeu (EEE) (a seguir «decisão de instauração do processo»).

7        Em 15 de Março de 2001, a GE e a recorrente apresentaram conjuntamente à Comissão as suas observações sobre a decisão de instauração do processo.

8        Em 8 de Maio de 2001, a Comissão enviou uma comunicação de acusações à GE, a que esta respondeu em 24 de Maio de 2001.

9        Em 29 e 30 de Maio de 2001, a GE e a recorrente foram ouvidas pela Comissão.

10      Em 14 e 28 de Junho de 2001, a GE e a recorrente apresentaram, respectivamente, duas séries sucessivas de compromissos destinados a que a concentração fosse aceite pela Comissão.

11      Em 3 de Julho de 2001, a Comissão adoptou a Decisão 2004/134/CE (processo COMP/M.2220 – General Electric/Honeywell) (JO 2004, L 48, p. 1), que declarou a concentração incompatível com o mercado comum e com o funcionamento do acordo EEE (a seguir «decisão impugnada»).

 Decisão impugnada

12      A parte decisória da decisão impugnada tem a seguinte redacção:

«Artigo 1.°

A concentração mediante a qual a [GE] adquire o controlo da [recorrente] é declarada incompatível com o mercado comum e com o funcionamento do acordo EEE.

Artigo 2.°

[A GE] é destinatária da [decisão impugnada].

[...]»

13      Os fundamentos da decisão impugnada podem resumir‑se do seguinte modo.

14      Segundo a Comissão, a GE antes da operação de concentração, já detinha sozinha uma posição dominante nos mercados dos reactores para grandes aviões comerciais e para grandes aviões de transporte regional. A solidez da sua posição no mercado, aliada ao seu poder financeiro e à integração vertical na exploração da locação financeira de aeronaves, é um dos elementos que permitiu concluir pela existência de uma posição dominante da GE nestes mercados. O inquérito também demonstrou que a recorrente é o principal fornecedor de produtos de aviónica e de produtos não pertencentes à aviónica, assim como de motores para aviões de executivos e de equipamentos para arranque de motores, elemento fulcral no fabrico de motores.

15      O agrupamento das actividades das duas sociedades levaria à criação de posições dominantes nos mercados do fornecimento de produtos de aviónica, de produtos não pertencentes à aviónica e de reactores para aviões de executivos e ao reforço das posições dominantes existentes da GE em matéria de reactores para grandes aviões comerciais e para grandes aviões de transporte regional. A combinação de vários factores levaria à criação ou ao reforço de posições dominantes: sobreposições horizontais em determinados mercados, bem como o aumento do poder financeiro da GE e a sua integração vertical nas actividades da recorrente, e, por último, o agrupamento dos seus respectivos produtos complementares.

16      Segundo a Comissão, essa integração permitiria, com efeito, à entidade resultante da operação de concentração potenciar o poder de mercado das duas sociedades relativamente aos seus respectivos produtos. Este facto teria como consequência excluir concorrentes, eliminando desse modo a concorrência nesses mercados e teria, no fim de contas, um impacte negativo na qualidade dos produtos, no serviço e nos preços aplicados aos consumidores.

 Tramitação processual

17      Por petição entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 12 de Setembro de 2001, a recorrente interpôs o presente recurso. No mesmo dia, a GE interpôs também recurso da decisão impugnada (processo T‑210/01).

18      Por requerimentos entrados na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância, respectivamente em 11, 15 e 16 de Janeiro de 2002, a Rolls‑Royce Plc, a Rockwell Collins Inc. (a seguir «Rockwell») e a Thales SA pediram que fossem autorizadas a intervir em apoio da Comissão.

19      A recorrente solicitou que fossem tratadas confidencialmente, relativamente às intervenientes, determinadas informações contidas nos seus documentos e nos da Comissão.

20      Por despacho de 26 de Junho de 2002, o presidente da Primeira Secção do Tribunal de Primeira Instância deferiu os pedidos de intervenção da Rolls‑Royce e da Rockwell. No mesmo despacho, deferiu o pedido de tratamento confidencial apresentado pela recorrente, sem prejuízo das observações formuladas pelas intervenientes. Nos termos do artigo 116.°, n.° 6, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, a Thales foi autorizada a apresentar as suas observações na fase oral com base no relatório para audiência.

21      Na sequência da alteração da composição das Secções do Tribunal de Primeira Instância por decisão do Tribunal de Primeira Instância de 13 de Setembro de 2004 (JO C 251, p. 12), o juiz‑relator foi colocado na Segunda Secção, para a qual transitou, consequentemente, o presente processo.

22      Devido a uma objecção da Rolls‑Royce relativamente à confidencialidade de um anexo da petição, concretamente o «relatório Nalebuff», realizou‑se uma reunião informal, em 15 de Outubro de 2002, na presença do presidente da Segunda Secção do Tribunal de Primeira Instância, a propósito das medidas de organização do processo, no seguimento da qual a recorrente apresentou uma nova versão não confidencial daquele documento. Questionada sobre a manutenção da sua objecção face à nova versão, a Rolls‑Royce não respondeu no prazo fixado.

23      Tendo sido rejeitado o pedido de tratamento confidencial do seu pedido de intervenção, por essa possibilidade não estar prevista no Regulamento de Processo, a Rolls‑Royce apresentou uma versão não confidencial deste último, tendo a Rockwell feito o mesmo. A recorrente e a Comissão apresentaram as suas observações relativas a esses pedidos dentro dos prazos fixados.

24      Nos termos do artigo 14.° do Regulamento de Processo e sob proposta da Segunda Secção, o Tribunal decidiu, ouvidas as partes nos termos do artigo 51.° do referido regulamento, atribuir o processo a uma secção alargada.

25      Na sua petição, a recorrente requereu a apensação do presente processo ao processo T‑210/01. O presidente da Segunda Secção alargada decidiu submeter a decisão de uma eventual apensação ao Tribunal, nos termos do artigo 50.° do Regulamento de Processo.

26      Com base no relatório do juiz‑relator, o Tribunal de Primeira Instância decidiu dar início à fase oral e colocou questões às partes, a título das medidas de organização do processo previstas no artigo 64.° do Regulamento de Processo. Pediu também à Comissão que apresentasse determinados documentos antes da audiência. As partes anuíram a tais pedidos.

27      Por carta entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 2 de Fevereiro de 2004, a Thales desistiu da sua intervenção. Por despacho de 23 de Março de 2004, o presidente da Segunda Secção Alargada do Tribunal de Primeira Instância registou essa desistência depois de ouvidas as outras partes.

28      Foram ouvidas as alegações e as respostas das partes às questões colocadas pelo Tribunal na audiência de 25 de Maio de 2004. No final dessa audiência, a fase oral foi declarada encerrada.

29      Por carta de 3 de Junho de 2004, a recorrente apresentou na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância um novo documento, assim como as suas observações quanto à pertinência do mesmo, tendo requerido a junção desses elementos aos autos. Por despacho de 8 de Julho de 2004, o Tribunal de Primeira Instância decidiu reabrir a fase oral do processo, nos termos do artigo 62.° do Regulamento de Processo, de modo a permitir às partes que se pronunciassem sobre esse pedido.

30      Ouvidas as partes, o Tribunal adoptou uma medida de organização do processo, nos termos do artigo 64.° do Regulamento de Processo, que consistiu na junção aos autos do documento e das observações apresentadas pela recorrente em 4 de Junho de 2004. As observações da Comissão e das intervenientes sobre a relevância dos referidos elementos foram igualmente juntas aos autos.

31      A fase oral foi novamente declarada encerrada em 23 de Novembro de 2004.

 Pedidos das partes

32      A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–        ordenar a apensação do presente processo ao processo T‑210/01, General Electric/Comissão;

–        ordenar a realização de todas as diligências de instrução que se revelem necessárias;

–        anular a decisão impugnada;

–        tomar todas as medidas alternativas ou suplementares necessárias à boa administração da justiça;

–        condenar a Comissão e as intervenientes nas despesas.

33      A Comissão, apoiada pela Rolls‑Royce e pela Rockwell, conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar a recorrente nas despesas.

 Questão de direito

1.     Quanto ao âmbito do recurso e ao objecto do litígio

 Argumentos das partes

34      A Comissão, apoiada nesta questão pela Rolls‑Royce, alega que a remissão feita pela recorrente na sua petição para os argumentos invocados pela GE no processo T‑210/01 é contrária ao artigo 44.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento de Processo, nos termos do qual a petição deve conter uma exposição sumária dos fundamentos do pedido. A remissão é tanto mais inaceitável quanto a recorrente só tinha tido conhecimento de uma versão simples do projecto da petição da GE e não de uma versão definitiva. O recurso deve portanto ser julgado inadmissível no que se refere às questões que não foram expressamente abordadas na petição.

35      A Comissão considera, à luz do conteúdo dos fundamentos expressamente invocados pela recorrente na petição, que se referem essencialmente à parte da decisão impugnada consagrada às vendas de produtos por pacotes, que a recorrente não se pronuncia sobre a parte substancial e essencial desse acto que é consagrada às questões de sobreposições horizontais e de integração vertical. A decisão impugnada baseia‑se em elementos de facto e de direito que, vistos em conjunto, demonstram que a conjugação do poder financeiro e da integração vertical em matéria de compra, financiamento e da locação financeira de aviões da GE e as posições de líder da recorrente em diversos mercados de produtos aeronáuticos levam à criação e ao reforço de posições dominantes.

36      Na sua contestação, a Comissão declarou que «a fundamentação da decisão baseia‑se numa combinação de elementos de facto e de direito que, tomados no seu conjunto (e apenas tomados no seu conjunto) levaram a que a Comissão proibisse a concentração proposta». No entanto, especificou, tanto na tréplica como na audiência, que cada um dos diferentes argumentos considerados na decisão impugnada bastava para justificar a proibição da concentração, tendo qualificado de «desastrada» a sua própria afirmação, que consta da contestação, na medida em que poderia eventualmente ser interpretada em sentido contrário. Por conseguinte, mesmo pressupondo que todas as acusações que a recorrente apresenta, designadamente no que se refere às vendas de produtos por pacotes, sejam procedentes, a decisão impugnada não deve ser anulada, dado que os restantes fundamentos bastam para demonstrar a justeza da decisão na parte em que a Comissão declara que a concentração é incompatível com o mercado comum.

37      A Rolls‑Royce sublinha que a recorrente não apresentou nenhum argumento contrário à maior parte dos fundamentos que justificam a proibição da concentração, designadamente o reforço das posições dominantes da GE no mercado dos motores de grandes aviões comerciais ou dos grandes aviões de transporte regional e a criação de posições dominantes nos mercados dos motores dos aviões de executivos e das pequenas turbinas a gás marítimas. Em especial, a recorrente não contestou seriamente, entre os três factores independentes que explicam o reforço da posição dominante da GE no mercado dos motores de grandes aviões comerciais, os efeitos de exclusão que resultam da integração vertical no que respeita aos equipamentos de arranque dos motores da recorrente. Consequentemente, o recurso não é pertinente e carece de objecto.

38      A Rockwell observa que a recorrente não abordou as questões das sobreposições horizontais ou da integração vertical na sua petição, pelo que os elementos a elas relativos, que constam da petição sob o título «Resumo da decisão», devem ser apenas considerados uma descrição da referida decisão.

39      A recorrente responde a tais acusações com três argumentos.

40      Em primeiro lugar, observa que afirmou, na sua petição, que alega todos os argumentos adicionais, relativamente aos seus, que foram invocados pela GE no processo T‑210/01. Segundo a recorrente, essa remissão para os articulados apresentados noutro processo conexo é permitida pela jurisprudência e tem por efeito incorporar o conteúdo desses articulados na sua petição. Na réplica, invocou a este respeito o acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 5 de Dezembro de 1990, Marcato/Comissão (T‑82/89, Colect., p. II‑735, n.os 22 a 24). Na audiência, referiu‑se a um «resumo» da jurisprudência relevante que consta das conclusões do advogado‑geral S. Alber relativas ao acórdão do Tribunal de Justiça de 20 de Setembro de 2001, Bélgica/Comissão (C‑263/98, Colect., pp. I‑6063, I‑6064), que cita um único acórdão, do Tribunal de Primeira Instância de 29 de Junho de 1995, ICI/Comissão (T‑37/91, Colect., p. II‑1901, n.° 43 e seguintes), no qual o Tribunal de Primeira Instância admitiu a remissão feita na petição para o processo T‑36/91, em que as partes eram as mesmas e eram representadas pelos mesmos advogados.

41      Por outro lado, a Comissão e a Rolls‑Royce não alegam que essa remissão tenha afectado a sua capacidade de defesa e a Rockwell pôde perfeitamente compreender e responder à totalidade dos argumentos apresentados.

42      Além disso, a recorrente lembra que pediu a apensação dos processos T‑209/01 e T‑210/01 e alega que, mesmo admitindo que a sua petição contém lacunas, como alega a Comissão, a apensação dos dois processos permitiria preencher essas lacunas. Na audiência, invocou, em especial, o acórdão do Tribunal de Justiça de 18 de Março de 1980, Forges de Thy‑Marcinelle e Monceau/Commissão (26/79 e 86/79, Recueil, p. 1083), em apoio da sua tese relativa aos efeitos jurídicos da apensação.

43      Em segundo lugar, a recorrente sustenta que os fundamentos da decisão impugnada que pôs detalhadamente em causa na petição, concretamente, as vendas de produtos por pacotes, constituem o elemento‑chave da decisão impugnada, pelo que o facto de o Tribunal de Primeira Instância declarar procedentes as acusações conduz inevitavelmente à anulação da decisão impugnada. Refere, a este respeito, que foi a própria Comissão, na contestação, que assinalou que a decisão impugnada se baseia num conjunto de elementos que, considerados no seu todo, justificam a sua conclusão quanto à incompatibilidade da operação com o mercado comum. Consequentemente, a decisão impugnada deve ser anulada se for demonstrado que o essencial da sua fundamentação, relativo aos efeitos de conglomerado, contém erros.

44      Na audiência, a recorrente acrescentou que a atitude da Comissão no decurso do procedimento administrativo levou as partes notificantes a acreditar que a sua operação seria aprovada se fosse encontrada uma solução que permitisse afastar as reservas da Comissão quanto às futuras vendas de produtos por pacotes. Foi por esta razão que a recorrente, perante o Tribunal, focou essencialmente este aspecto do processo.

45      Em terceiro lugar, a recorrente observa que, seja como for, no âmbito da descrição que fez da decisão impugnada, as questões das sobreposições horizontais e da integração vertical foram abordadas na sua petição sob o título de «Resumo da decisão». Sob esse título, a recorrente apresentou uma descrição comentada da decisão impugnada na qual expôs que a decisão se baseia, relativamente aos mercados em causa, em vários ou em todos os seguintes elementos: em primeiro lugar, nas sobreposições horizontais e nos efeitos anticoncorrenciais verticais; em segundo lugar, no poder financeiro da GE e na integração vertical da recorrente com as filiais da GE, a GE Capital Aviation Services (a seguir «GECAS») e a GE Capital Corporate Aviation Group (a seguir «GECCAG»), numa nova entidade e, em terceiro lugar, na prática por esta última de vendas de produtos por pacotes. A recorrente observa que, nos mercados em que as sobreposições horizontais têm uma função, a análise que dela é feita na decisão impugnada é, para cada um dos produtos, pouco credível ou insuficientemente fundamentada. A decisão impugnada baseia‑se, portanto, essencialmente nos outros dois elementos. Segundo a recorrente, o segundo elemento é tão‑pouco verosímil que não é necessário debruçar‑se sobre ele. Por conseguinte, o terceiro elemento, concretamente, a questão das vendas de produtos por pacotes, desempenha um papel determinante. Aliás, a questão essencial dos desinvestimentos considerados necessários pela Comissão diz respeito a esse aspecto da decisão impugnada.

46      A recorrente insiste no facto de que os vícios da decisão impugnada por ela denunciados são suficientemente graves para que esta última seja integralmente anulada. Com efeito, como é reconhecido pela Comissão, só a conjugação dos elementos de facto e de direito considerados no seu todo parece justificar a proibição da concentração. Respondendo à Rolls‑Royce, a recorrente precisa que a questão dos equipamentos de arranque de motores, aliás solucionada através de compromissos, não é suficiente para justificar a decisão impugnada.

47      Por todas estas razões, as acusações suscitadas pela Comissão e pelas intervenientes, relativas à alegada inadmissibilidade da remissão para a petição da GE e à ineficácia dos fundamentos constantes da petição apresentada no presente processo, são contrárias ao princípio da boa administração da justiça e não se baseiam em qualquer elemento que tenha sido provado.

 Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

 Introdução

48      Há que referir em primeiro lugar que, na medida em que alguns dos fundamentos contidos na decisão são susceptíveis, por si só, de a justificar juridicamente, os erros de que podem estar feridos outros fundamentos da decisão não têm, seja como for, influência na sua parte decisória (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 12 de Julho de 2001, Comissão e França/TF1, C‑302/99 P e C‑308/99 P, Colect., p. I‑5603, n.os 26 a 29).

49      Por outro lado, quando a parte decisória de uma decisão da Comissão se baseia em vários pilares de argumentação sendo cada um deles suficiente, por si só, para fundamentar essa parte decisória, esse acto só será anulado, em princípio, se cada um desses pilares for ilegal. Nesse caso, um erro ou uma outra ilegalidade que afecte apenas um dos pilares de argumentação não basta para justificar a anulação da decisão controvertida uma vez que não pode ter tido uma influência determinante sobre a parte decisória adoptada pela instituição (v., por analogia, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 14 de Maio de 2002, Graphischer Maschinenbau/Comissão, T‑126/99, Colect., p. II‑2427, n.os 49 a 51, e jurisprudência aí referida). Esta regra aplica‑se designadamente no contexto das decisões em matéria de controlo de concentrações (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 22 de Outubro de 2002, Schneider Electric/Comissão, T‑310/01, Colect., p. II‑4071, n.os 404 a 420, assim como n.os 80 e 81 infra).

50      Deve também recordar‑se a este respeito que, na medida em que um pilar de argumentação que é suficiente para fundamentar a parte decisória de um acto não seja posto em causa por um recorrente no seu recurso de anulação, há que considerar esse argumento, bem como, consequentemente, o acto que nele se baseia, legal e provado (v., neste sentido e por analogia, acórdão do Tribunal de Justiça de 14 de Setembro de 1999, Comissão/AssiDomän Kraft Products e o., C‑310/97 P, Colect., p. I‑5363, n.os 57 a 63).

51      Tendo em conta as considerações precedentes, há que examinar se, no caso em apreço, os fundamentos alegados pela recorrente, supondo fundados, bastam para invalidar a parte decisória da decisão impugnada e podem sustentar um recurso susceptível de conduzir, eventualmente, à anulação desta última. No caso de os fundamentos validamente suscitados não serem adequados, mesmo considerados no seu todo, para justificar a anulação da decisão impugnada, são inoperantes e, consequentemente, deve ser negado total provimento ao recurso (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 17 de Dezembro de 1997, EFMA/Conselho, T‑121/95, Colect., p. II‑2391, n.os 115 à 122).

52      A este respeito, há que determinar em primeiro lugar o âmbito efectivo do presente recurso, examinando a este respeito a eventual inadmissibilidade de determinados fundamentos que a recorrente afirma ter invocado.

 Quanto à remissão para os fundamentos suscitados no processo T‑210/01

53      Sem suscitar formalmente uma questão prévia de inadmissibilidade, a Comissão alegou a inadmissibilidade de determinados aspectos específicos do recurso. De qualquer modo, há que recordar que, segundo jurisprudência constante, as condições de admissibilidade dos recursos são questões de ordem pública que os órgãos jurisdicionais comunitários podem e devem, se for caso disso, suscitar oficiosamente (despachos do Tribunal de Primeira Instância de 15 de Setembro de 1998, Michailidis e o. /Comissão, T‑100/94, Colect., p. II‑3115, n.° 49, e de 25 de Outubro de 2001, Métropole Télévision – M 6/Comissão, T‑354/00, Colect., p. II‑3177, n.° 27; v., igualmente neste sentido, despacho do Tribunal de Justiça de 5 de Julho de 2001, Conseil national des professions de l’automobile e o./Comissão, C‑341/00 P, Colect., p. I‑5263, n.° 32).

54      Nos termos do artigo 21.° do Estatuto do Tribunal de Justiça e do artigo 44.°, n.° 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, a petição deve conter, designadamente «o objecto do litígio» e «a exposição sumária dos fundamentos do pedido». Além disso, segundo o artigo 48.°, n.° 2, do referido regulamento «[é] proibido deduzir novos fundamentos no decurso da instância, a menos que tenham origem em elementos de direito e de facto que se tenham revelado durante o processo». Decorre destas disposições que todo o fundamento que não esteja suficientemente articulado na petição inicial deve ser considerado inadmissível. A jurisprudência confirma expressamente que, tratando‑se de um fundamento de ordem pública, essa inadmissibilidade pode, se necessário, ser suscitada oficiosamente pelo Tribunal (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 21 de Março de 2002, Joynson/Comissão, T‑231/99, Colect., p. II‑2085, n.° 154).

55      Além disso, decorre da jurisprudência que a exposição sumária dos fundamentos invocados pela recorrente deve ser suficientemente clara e precisa para permitir que a parte demandada prepare a sua defesa e que o Tribunal decida a causa, sem mais informações se for caso disso (acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 24 de Fevereiro de 2000, ADT Projekt/Comissão, T‑145/98, Colect., p. II‑387, n.° 66, e de 16 de Março de 2004, Danske Busvognmænd/Comissão, T‑157/01, Colect., p. II‑0000, n.° 45). São requeridas exigências análogas quando um vício é invocado para sustentar um fundamento (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 14 de Maio de 1998, Mo Och Domsjö/Comissão, T‑352/94, Coelct., p. II‑1989, n.° 333).

56      Por outro lado, segundo jurisprudência assente, a fim de garantir a segurança jurídica e uma boa administração da justiça, é preciso, para que um recurso seja admissível, que os elementos essenciais de facto e de direito, nos quais este se funda, resultem, pelos menos sumariamente, mas de forma coerente e compreensível, do texto da própria petição (v. acórdão do Tribunal de Justiça de 9 de Janeiro de 2003, Itália/Comissão, C‑178/00, Colect., p. I‑303, n.° 6; acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 6 de Maio de 1997, Guérin automobiles/Comissão, T‑195/95, Colect., p. II‑679, n.os 20 e 21 ; ADT Projekt/Comissão, n.° 55 supra, n.° 66 ; despacho do Tribunal de Primeira Instância de 25 de Julho de 2000, RJB Mining/Comissão, T‑110/98, Colect., p. II‑2971, n.° 23, e jurisprudência aí referida; acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 10 de Abril de 2003, Travelex Global and Financial Services e Interpayment Services/Comissão, T‑195/00, Colect., p. II‑1677, n.° 26, e Danske Busvognmænd/Comissão, n.° 55 supra, n.° 45; v., igualmente neste sentido, acórdãos do Tribunal de Justiça de 15 de Dezembro de 1961, Fives Lille Cail e o./Alta Autoridade, 19/60, 21/60, 2/61 e 3/61, Recueil, pp. 561, 588, Colect. 1954‑1961, p. 637, e de 5 de Março de 1991, Grifoni/CEEA, C‑330/88, Colect., p. I‑1045, n.os 17 e 18).

57      A este respeito, embora a petição possa ser baseada e completada no que respeita a aspectos específicos, por remissões feitas para excertos de documentos que a ela são anexados, uma remissão global para outros documentos, mesmo anexados à petição, não poderá compensar a inexistência de elementos essenciais da argumentação de direito, que, por força das disposições acima recordadas, devem figurar na petição (despacho do Tribunal de Primeira Instância de 21 de Maio de 1999, Asia Motor France e o./Comissão, T‑154/98, Colect., p. II‑1703, n.° 49). Além disso, não compete ao Tribunal procurar e identificar, nos anexos, os fundamentos e os argumentos que pode considerar que constituem o fundamento do recurso, uma vez que os anexos têm uma função meramente probatória e instrumental (acórdão Joynson/Comissão, n.° 54 supra, n.° 154 ; acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 7 de Novembro de 1997, Cipeke/Comissão, T‑84/96, Colect., p. II‑2081, n.° 34, e de 20 de Abril de 1999, Limburgse Vinyl Maatschappij e o./Comissão, T‑305/94 a T‑307/94, T‑313/94 a T‑316/94, T‑318/94, T‑325/94, T‑328/94, T‑329/94 e T‑335/94, Colect., p. II‑931, n.° 39, não anulado quanto a este aspecto no recurso para o Tribunal de Justiça, que deu origem ao acórdão de 15 de Outubro de 2002, Limburgse Vinyl Maatschappij e o./Comissão, C‑238/99 P, C‑244/99 P, C‑245/99 P, C‑247/99 P, C‑250/99 P a C‑252/99 P e C‑254/99 P, Colect., p. I‑8375).

58      No entanto, a recorrente invoca vários acórdãos em que os órgãos jurisdicionais comunitários aceitaram a remissão para documentos apresentados noutros processos no mesmo órgão jurisdicional (v. n.° 40 supra). Segundo a recorrente, uma remissão para os documentos que tenham sido apresentados ao mesmo órgão jurisdicional noutro processo não pode ser considerada inadmissível.

59      A jurisprudência invocada pela recorrente, no n.° 40 supra, para justificar essa remissão não pode, contudo, levar o Tribunal a afastar, no presente caso, a aplicação da regra acima enunciada, segundo a qual os fundamentos suscitados por uma recorrente devem constar de forma sumária na própria petição. O Tribunal referiu no acórdão ICI/Comissão, n.° 40 supra (n.° 45), que a jurisprudência do Tribunal de Justiça tem em conta a este respeito as particularidades de cada caso concreto, invocando em apoio desta afirmação os acórdãos de 29 de Novembro de 1956, Charbonnages de Beeringen e o./Alta Autoridade (9/55, Recueil, pp. 325, 352, Colect. 1954‑1961, p. 107), de 8 de Julho de 1965, Prakash/Comissão (19/63 e 65/63, Recueil, pp. 677, 693, Colect. 1965‑1968, p. 171), de 13 de Julho de 1965, Lemmerz‑Werke/Alta Autoridade (111/63, Recueil, pp. 835, 858, Colect. 1965‑1968, p. 189), de 28 de Abril de 1971, Lütticke/Comissão (4/69, Recueil, p. 325, n.° 2, Colect., p. 111), e Forges de Thy‑Marcinelle e Monceau/Comissão, n.° 42 supra (n.° 4).

60      A este respeito, há que referir, em primeiro lugar, que uma abordagem que aceite essa remissão para uma petição apresentada noutro processo é em princípio incompatível com a jurisprudência referida nos n.os 55 a 57 supra, segundo a qual a própria petição deve conter uma exposição sumária dos fundamentos apresentados que permitam, designadamente, ao Tribunal, pronunciar‑se sobre o recurso, eventualmente sem mais informações.

61      Embora o órgão jurisdicional comunitário tenha por vezes admitido a possibilidade de serem suscitados fundamentos através de uma remissão para outro processo (acórdão Forges de Thy‑Marcinelle e Monceau/Comissão, n.° 42 supra, e acórdão Marcato/Comissão, n.° 40 supra), essa possibilidade foi recusada noutros processos (v. acórdão Charbonnages de Beeringen e o./Alta Autoridade, n.° 59 supra, e acórdão Prakash/Comissão, n.° 59 supra), sem indicar, pelo menos explicitamente, um critério determinante quanto a essa opção.

62      Há que referir que, em todos os processos que deram lugar aos acórdãos invocados pela recorrente ou referidos no n.° 45 do acórdão ICI/Comissão, n.° 40 supra, nos quais o órgão jurisdicional comunitário aceitou que se pode considerar que fundamentos não expressamente referidos na petição possam ser validamente suscitados através dessa remissão, a parte recorrente nesses processos tinha remetido para os seus próprios articulados noutro processo.

63      No presente caso, como foi acima referido, a remissão efectuada pela recorrente na sua petição refere‑se à petição que deu entrada no mesmo dia apresentada por outra recorrente, a GE.

64      Com efeito, aceitar a admissibilidade de fundamentos não contidos de forma expressa na petição, pelo facto de terem sido suscitados por um terceiro noutro processo, para o qual se remeteu na petição, equivaleria a permitir a fuga às exigências imperativas do artigo 44.°, n.° 1, do Regulamento de Processo, recordadas no n.° 54 supra.

65      Além disso, há que referir que a GE é representada no processo T‑210/01 por mandatários diferentes dos que representam a recorrente no presente caso. Por outro lado, a petição da GE não está anexada à que foi apresentada pela recorrente no presente processo. Estas circunstâncias só reforçam a conclusão a que se chegou no número anterior na medida em que confirmam o carácter distinto e autónomo do presente recurso relativamente ao do processo registado sob o número T‑210/01.

66      Há também que recordar que cada parte é a única responsável pelo conteúdo dos actos processuais que apresenta, princípio consagrado, designadamente, no artigo 43.°, n.° 1, do Regulamento de Processo (v., neste sentido, acórdão ICI/Comissão, n.° 40 supra, n.° 46). Ora, embora a recorrente afirme ter tomado conhecimento da versão provisória da petição da GE, não alega que sabia, no momento em que apresentou a sua própria petição, qual era o conteúdo exacto da versão definitiva da petição da GE para a qual remetia. Contrariamente às exigências de uma boa administração da justiça, a remissão para a petição da GE não permite ao Tribunal identificar com suficiente precisão os fundamentos que lhe foram apresentados no momento da interposição do recurso no presente processo.

67      Tendo em consideração o exposto e sem que seja necessário que este Tribunal se pronuncie no presente processo sobre a questão de saber quais as condições em que uma recorrente pode, eventualmente, suscitar fundamentos através de uma remissão para os seus próprios articulados constantes de outro processo, há que considerar que a identidade das partes nos dois processos, em especial da recorrente, é uma condição essencial da admissibilidade dos fundamentos alegadamente suscitados através de uma remissão para articulados constantes de outro processo.

68      Resulta do que precede que a remissão feita pela recorrente para a petição apresentada pela GE no processo T‑210/01 não tem por efeito incorporar, na petição apresentada pela recorrente no presente caso, os fundamentos suscitados pela GE no referido processo.

 Quanto ao pedido de apensação

69      Em apoio do seu pedido de apensação do presente processo ao processo T‑210/01, a recorrente alega que, ainda que a remissão efectuada na sua petição para a da GE não permita que se considerem admissíveis os fundamentos que pretendia suscitar relativamente aos aspectos do processo que não os das vendas de produtos por pacotes, essa apensação permitiria preencher eventuais lacunas que afectam a admissibilidade da sua própria petição. Na audiência, a recorrente invocou o acórdão Forges de Thy‑Marcinelle e Monceau/Comissão, n.° 42 supra (n.° 4), assim como jurisprudência que descreveu remontar ao início da história jurisdicional comunitária.

70      No que se refere às consequências de uma eventual apensação dos processos T‑209/01 e T‑210/01, há que recordar, em primeiro lugar, que nos termos do artigo 50.° do Regulamento de Processo:

«Ouvidas as partes e o advogado‑geral, o presidente pode, a todo o tempo, por razões de conexão, e para efeitos da fase escrita, da fase oral ou do acórdão que ponha termo à instância, ordenar a apensação de causas que tenham o mesmo objecto. A decisão que ordenar a apensação pode ser revogada. O presidente pode submeter estas questões ao Tribunal.»

71      Como foi indicado pelo Tribunal de Justiça no acórdão de 21 de Junho de 2001, Moccia Irme e o./Comissão (C‑280/99 P a C‑282/99 P, Colect., p. I‑4717, n.° 66), decorre desta disposição que um despacho de apensação não afecta a independência nem o carácter autónomo dos processos aí visados, sendo sempre possível adoptar uma decisão de desapensação. Assim, nesse acórdão, o Tribunal de Justiça referiu que as duas recorrentes não tinham legitimidade para alegar no Tribunal de Justiça fundamentos que não suscitaram na primeira instância, não obstante a apensação dos seus processos no Tribunal de Primeira Instância a outros processos nos quais esses fundamentos tinham efectivamente sido suscitados por outras recorrentes (n.os 61 a 68 do acórdão).

72      Há também que observar que a apensação é uma medida que o presidente, sendo caso disso o Tribunal de Primeira Instância, pode ordenar, nos termos do disposto no artigo 50.° do Regulamento de Processo, mas à qual não está obrigado ainda que as partes o requeiram, uma vez que essa decisão entra no âmbito da sua livre apreciação quanto ao modo mais adequado de organizar o processo. Daqui resulta que a tese da recorrente teria por consequência, se fosse seguida, que uma decisão processual do presidente tomada no âmbito da livre apreciação deste último pudesse alargar o âmbito de uma petição e, consequentemente, ser determinante para o resultado do processo judicial, o que introduziria um elemento arbitrário neste último.

73      No que diz respeito ao acórdão Charbonnages de Beeringen e o./Alta Autoridade, n.° 59 supra, há que referir que o Tribunal de Justiça, ao afirmar que uma referência genérica para o conteúdo de um outro processo não é suficiente para que a petição seja admissível, e isto tanto mais que a referência foi feita sem ter sido requerida simultaneamente a apensação dos processos, não declarou que a petição seria admissível se o pedido de apensação tivesse sido atempadamente formulado. Pelo contrário, limitou‑se a referir que, no processo então em apreço, a inexistência desse pedido convidando o Tribunal de Justiça a apreciar conjuntamente os dois processos reforça o carácter insuficiente da remissão global efectuada na sua petição para o recurso interposto por um terceiro.

74      Além disso, na medida em que o Tribunal, no seu acórdão Forges de Thy‑Marcinelle e Monceau/Comissão, n.° 42 supra, considerou que «a admissibilidade da segunda petição cobre a inadmissibilidade da primeira», há que referir que, nesse processo, as petições em causa foram apresentadas pela mesma pessoa, enquanto no presente caso a recorrente invoca fundamentos suscitados por um terceiro.

75      Deste modo, sem que seja necessário apreciar no presente processo os eventuais efeitos da apensação de dois recursos que tenham sido interpostos pela mesma recorrente, basta declarar que o facto de apensar dois processos que têm recorrentes diferentes não pode alterar o alcance da petição apresentada separadamente por cada um dos recorrentes, sob pena de se violar a independência e autonomia dos seus diferentes recursos (v., por analogia, acórdão Moccia Irme e o./Comissão, n.° 71 supra, n.° 66).

76      Assim, no presente processo, só os fundamentos diferentes dos que são alegadamente suscitados exclusivamente por meio da remissão global para a petição da GE poderão ser tomados em consideração.

77      Nas circunstâncias do presente caso, não há que apensar o presente processo ao processo T‑210/01. O pedido formulado pela recorrente nesse sentido é consequentemente indeferido.

 Quanto à eficácia dos fundamentos invocados no presente processo

78      O segundo argumento da recorrente, a este respeito, consiste em alegar que os fundamentos relativos às vendas de produtos por pacotes constituem o elemento‑chave da decisão impugnada, sem o qual esse acto não pode ser mantido.

79      Há que recordar que resulta do artigo 2.°, n.° 3, do Regulamento n.° 4064/89 que, em matéria de concentrações, se uma operação notificada criar ou reforçar uma posição dominante num único mercado da qual resulte um entrave significativo à concorrência efectiva no mercado comum, a Comissão deve, em princípio, proibi‑la, mesmo que a operação não cause nenhum outro entrave à concorrência. Quando a Comissão examina sucessivamente diferentes mercados e conclui que será criada ou reforçada uma posição dominante em vários desses mercados, facto que se traduzirá num entrave substancial à concorrência efectiva, há que declarar que, salvo indicação expressa em contrário constante da decisão, a Comissão considera que a situação resultante para cada um desses mercados da concentração justifica, por si só, a proibição da operação notificada.

80      A este respeito, há que recordar que no seu acórdão Schneider Electric/Comissão, n.° 49 supra (n.os 404 a 420), o Tribunal de Primeira Instância declarou que os erros detectados nesse processo referentes à análise dos diferentes mercados nacionais não eram suficientes, por si só, para pôr em causa as acusações que a Comissão tinha emitido a propósito dos diferentes mercados sectoriais franceses. Assim, a análise subjacente à decisão da Comissão que culminou na proibição da concentração em causa não pode ser considerada insuficiente relativamente aos referidos mercados apenas pelo facto de terem sido detectados erros noutros mercados.

81      Do mesmo modo, quando a Comissão verifica que será criada ou reforçada uma posição dominante num único mercado por razões distintas e autónomas, há que considerar que, em princípio, e não havendo qualquer indicação contrária nos fundamentos relevantes da decisão adoptada pela Comissão, cada um dos motivos individualmente considerados levaria a Comissão a essa conclusão. Isto é tanto mais verdadeiro quanto decorre da descrição autónoma desse elemento de argumentação que é suficiente por si só para provar que as condições de concorrência no mercado em causa são alteradas qualitativamente ou de forma substancial.

82      No presente caso, a Comissão especificou no considerando 567 da decisão impugnada que havia que concluir que «a concentração proposta levaria à criação ou reforço de uma posição dominante nos mercados dos motores para grandes aeronaves comerciais, dos motores para grandes jactos regionais, dos motores para jactos executivos, dos produtos de aviónica e não pertencentes à aviónica, bem como das pequenas turbinas de gás marítimas, o que iria prejudicar significativamente a eficácia da concorrência no mercado comum».

83      Como refere a Comissão na contestação, não foi estabelecida uma hierarquia, na decisão impugnada, entre os problemas concorrenciais identificados em cada um dos mercados examinados e em seguida enumerados, no âmbito da conclusão exposta no número anterior. Consequentemente, há que concluir que decorre da decisão impugnada que cada uma das diferentes vertentes da sua fundamentação e, sobretudo, da análise feita a cada um dos mercados referidos no número anterior constitui efectivamente um pilar autónomo da decisão impugnada.

84      Esta conclusão é corroborada por uma análise detalhada a cada uma das diferentes vertentes da fundamentação da Comissão.

85      A este respeito, há que referir que as considerações relativas às sobreposições horizontais resultantes da operação notificada sobre, respectivamente, o mercado dos reactores para grandes aviões de transporte regional, o mercado dos reactores para aviões de executivos e o mercado das pequenas turbinas de gás marítimas, não são susceptíveis de se reforçar mutuamente tendo em conta a inexistência de ligações económicas entre esses mercados. Em especial, a criação de uma posição dominante no mercado das pequenas turbinas de gás marítimas não pode afectar nem ser afectada pela criação ou pelo reforço de posições dominantes nos diferentes mercados dos reactores e de outros componentes aeronáuticos, quando se trata, nos dois casos, de produtos que fazem parte de sectores comerciais distintos.

86      Por outro lado, há que referir a este respeito que, nos considerandos 428 a 431, sob o título «a) Sobreposição horizontal das plataformas existentes», a Comissão descreveu os efeitos imediatos da concentração no mercado dos reactores para grandes aviões de transporte regional resultantes da referida sobreposição. Essa descrição contém uma referência à influência da GE Capital e da GECAS, factor que reforça a posição dominante preexistente da GE no mercado em causa, feita pela Comissão para julgar improcedente o argumento das partes envolvidas na concentração, segundo o qual o monopólio criado pela sua fusão se traduziria num fenómeno meramente estatístico. Pelo contrário, a Comissão não invocou, nesse contexto, a sua tese relativa à venda de produtos por pacotes. Esta última tese foi apenas invocada, no que se refere ao mercado dos reactores para grandes aviões de transporte regional, sob o título «b) Efeitos ao nível dos concursos relativos a futuras plataformas», que contém uma exposição distinta consagrada aos efeitos a médio e a longo prazo da fusão no referido mercado. Resulta do exposto que a Comissão declarou na decisão impugnada que a sobreposição horizontal no mercado dos reactores para grandes aviões de transporte regional que resultaria da concentração reforçaria de imediato a posição dominante preexistente da GE, independentemente de qualquer outro factor que pudesse reforçar ainda essa posição no futuro.

87      Quanto ao mercado das pequenas turbinas a gás, a Comissão descreve a sobreposição horizontal sob um título separado, nos considerandos 476 e 477 da decisão impugnada, antes de analisar, em secções distintas, a «exclusão dos concorrentes» do mercado através da integração vertical da recorrente na GE e a «exclusão dos concorrentes» do mercado através da integração vertical, por um lado, das pequenas turbinas a gás marítimas e, por outro, dos produtos electrónicos e dos comandos da recorrente. A Comissão expôs, no considerando 476 da decisão, que a concentração criaria uma entidade que passaria a deter entre 65% e 80% do mercado em causa, sendo a sua dimensão quatro a cinco vezes superior à do seu concorrente imediato. No considerando 477, a Comissão conclui que essa entidade seria de longe o maior interveniente no mercado das pequenas turbinas a gás marítimas e explica os motivos pelos quais a concorrência feita pelos outros intervenientes actuais e potenciais nesse mercado não seria efectiva. Resulta assim da estrutura e da redacção desta parte da decisão impugnada que, segundo a Comissão, os efeitos da concentração descritos na primeira secção consagrada à sobreposição horizontal no domínio das turbinas eram suficientes para criar uma posição dominante nesse mercado, independentemente de outros factores que servem para vedar o mercado e, consequentemente, reforçar ainda mais essa posição.

88      Em todo o caso, há que referir que, no presente caso, a recorrente também não contestou a tese da Comissão relativa à exclusão dos concorrentes do mercado das pequenas turbinas de gás marítimas devido à integração vertical das actividades de fabrico desses produtos da GE e à actividade de fabrico de comandos e de outros componentes utilizados nas referidas turbinas da recorrente, nem a tese da Comissão relativa à exclusão dos concorrentes no mercado das pequenas turbinas de gás marítimas resultante da integração vertical da recorrente na GE devido ao poder financeiro desta última (v. considerandos 478 a 484 da decisão impugnada, assim como n.os 113 e 114 infra).

89      No que se refere à exclusão dos concorrentes do mercado devido à integração vertical da actividade de fabrico de reactores para grandes aviões comerciais e da dos equipamentos dos motores de arranque da recorrente, a Comissão indicou expressamente, no considerando 419 da decisão impugnada, que, independentemente das consequências das ofertas de produtos por pacotes, a operação de concentração preconizada iria reforçar a posição dominante da GE no mercado dos reactores para grandes aviões comerciais devido à exclusão vertical de fabricantes de motores concorrentes.

90      Contudo, a recorrente referiu, na réplica, que a Comissão afirmou, no n.° 51 da contestação, que, «para além disso e acima de tudo, a fundamentação da decisão baseia‑se essencialmente numa conjugação de elementos de facto e de direito que, tomados no seu conjunto (e apenas tomados no seu conjunto), levaram a Comissão a proibir a concentração proposta». Segundo a recorrente, decorre desta afirmação que a decisão impugnada só não será anulada se todos os principais elementos em que a decisão se baseia estiverem fundamentados, designadamente a análise das vendas de produtos por pacotes, que a recorrente põe detalhadamente em causa na sua petição.

91      Contudo, a Comissão referiu, no n.° 18 da tréplica, reiterando‑o na audiência, que cada um dos pilares considerados na decisão impugnada era suficiente para justificar a proibição da operação notificada. Na audiência, qualificou a sua própria afirmação, referida no número precedente, de «desastrada» e referiu que essa afirmação se inscreve no âmbito de uma análise formulada para responder aos argumentos da recorrente segundo os quais a decisão se baseia «essencialmente» em duas teorias, concretamente, em primeiro lugar, no alegado poder financeiro da GE e na sua integração vertical nos serviço financeiros, na aquisição de aeronaves, na locação e nas actividades do mercado de assistência pós‑venda e, em segundo lugar, na prática futura de vendas de produtos por pacotes.

92      Ora, deve aceitar‑se esta explicação da Comissão.

93      Com efeito, resulta da leitura conjugada dos n.os 48 a 51 da contestação que a Comissão procurou pôr em causa a tese da recorrente segundo a qual estas duas «teorias» constituem por si só o verdadeiro fundamento da decisão impugnada, com exclusão dos outros aspectos anticoncorrenciais da operação notificada analisados nesse acto.

94      Por outro lado, como a Comissão salientou com razão na audiência, compete ao Tribunal fiscalizar a legalidade da própria decisão tomando em consideração os fundamentos contidos nesse acto, e não à luz do que a esse propósito foi afirmado na contestação. É certo que a Comissão se exprimiu na sua contestação de forma ambígua, podendo a expressão por si utilizada ser interpretada no sentido de que renunciava a alegar que cada elemento da sua análise podia ser suficiente para fundamentar a decisão impugnada. Mas, atendendo a que precisou na tréplica e na audiência que não era essa a sua posição, não há que interpretar a decisão impugnada desse modo, ou seja, de forma contrária ao que resulta da sua redacção, da sua estrutura e da sua economia geral (v. n.os 79 a 85 supra).

95      Na audiência, a recorrente alegou também que o Tribunal se deve limitar a examinar se a situação concorrencial constatada pela Comissão era diferente da que efectivamente resultaria da concentração. No caso de existirem diferenças significativas a este respeito, a decisão impugnada deve ser anulada. Com esta argumentação, a recorrente refere, essencialmente, que cabe à Comissão decidir se há que proibir uma concentração na sequência de um acórdão do Tribunal de Primeira Instância que rejeita a sua análise relativa a determinados mercados. Segundo esta argumentação, não compete ao Tribunal manter uma decisão de proibição substituindo a conclusão da Comissão pela sua própria conclusão.

96      No entanto, como foi referido no n.° 79 supra, a Comissão tem o dever de proibir uma concentração que preencha os critérios do artigo 2.°, n.° 3, do Regulamento n.° 4064/89. Por conseguinte, não há que anular uma decisão de proibição pelo facto de a recorrente ter demonstrado a existência de um ou de diversos erros que viciam a análise feita relativamente a um ou a vários mercados quando, apesar disso, resultar da decisão de proibição que a concentração notificada preenchia os referidos requisitos relativamente a um ou a vários outros mercados (v. n.os 48 a 50 e 79 a 81 supra). Em especial, se os fundamentos referentes a esses outros mercados não tiverem sido postos em questão na petição, há que considerá‑los procedentes, para efeitos do recurso em causa. Ao tirar assim estas consequências do âmbito material de uma petição, o Tribunal não substitui as apreciações da Comissão pelas suas próprias, uma vez que são as apreciações da referida instituição que, não tendo sido postas em causa, continuam a constituir o fundamento desse acto.

97      No quadro da sua argumentação, retomada no n.° 78 supra, a recorrente também observou, na audiência, que a Comissão deu a entender, sobretudo durante a fase pré‑contenciosa, que o risco de vendas de produtos por pacotes depois da concentração constituía o aspecto determinante do processo. Esse entendimento falseou toda a fase pré‑contenciosa e não permitiu às partes envolvidas na concentração a possibilidade de proporem compromissos susceptíveis de resolverem os outros problemas. Foi também por esta razão que a recorrente centralizou a sua petição nos efeitos de conglomerado que alegadamente resultariam da concentração.

98      Esta argumentação, apresentada pela primeira vez pela recorrente na audiência, constitui um fundamento novo. Na medida em que esse fundamento se refere à atitude alegadamente adoptada pela Comissão durante a fase pré‑contenciosa, é evidente que a recorrente podia tê‑lo suscitado na petição inicial. Consequentemente, este argumento é inadmissível nos termos do artigo 48.°, n.° 2, do Regulamento de Processo.

99      De qualquer modo, a Comissão referiu claramente, na sua comunicação de acusações de 8 de Maio de 2001, as acusações relativas a todas as consequências anticoncorrenciais da fusão, designadamente as consequências relativas aos efeitos horizontais e verticais dela decorrentes, posteriormente adoptados na decisão impugnada (v., em especial, os n.os 118 a 122, 124 a 126, 459 a 471, 473, 474, 578 a 586 e 612 a 633 dessa comunicação). Ora, há que considerar que, em matéria de controlo de concentrações, a Comissão não pode ser obrigada, exceptuada a obrigação de expor as acusações consideradas numa comunicação e de a completar caso depois decida considerar novas acusações, a indicar o estado da sua reflexão sobre a eventual resolução dos problemas que foram anteriormente constatados entre o envio dessa comunicação e a adopção da decisão final (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal de Justiça de 14 de Julho de 1972, Sandoz/Commission, 53/69, Recueil, p. 845, n.° 14; Colect. 1972, p. 299, e de 7 de Janeiro de 2004, Aalborg Portland e o./Comissão, C‑204/00 P, C‑205/00 P, C‑211/00 P, C‑213/00 P, C‑217/00 P e C‑219/00 P, Colect., p. I‑123, n.os 192 e 193 ; acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 4 de Março de 1999, Assicurazioni Generali e Unicredito/Comissão, T‑87/96, Colect., p. II‑203).

100    Além disso, não tendo sequer a recorrente recebido garantias precisas, incondicionais e concordantes, provenientes de fontes autorizadas e fiáveis da Comissão relativamente à renúncia desta última a determinadas acusações, o princípio da confiança legítima não pode aplicar‑se no caso em apreço (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 6 de Julho de 1999, Forvass/Comissão, T‑203/97, ColectFP. p. I‑A‑129 e II‑705, n.° 70, e jurisprudência aí citada, e de 18 de Janeiro de 2000, Mehibas Dordtselaan/Comissão, T‑290/97, Colect., p. II‑15, n.° 59).

101    Por último, há que referir, para todos os fins úteis, no que se refere ao mercado dos reactores para grandes aviões de transporte regional, que a Comissão referiu no considerando 20 da decisão impugnada a importância especial desses aviões no contexto comunitário, na medida em que representavam 14% da frota total europeia em 1992 e 33% dessa frota em 1998. Observou, no considerando 431 da decisão impugnada, que a importância desse mercado no qual a nova entidade teria o monopólio depois da fusão teria como consequência o facto de as companhias aéreas se tornarem cada vez mais dependentes dessa entidade.

102    Tendo em conta as considerações precedentes, há que considerar improcedente a argumentação da recorrente segundo a qual as acusações por ela apresentadas relativamente ao mérito no que diz respeito aos efeitos de conglomerado, essencialmente as vendas de produtos por pacotes, são suficientes para justificar a anulação da decisão impugnada.

103    Há que referir que os efeitos anticoncorrenciais horizontais e verticais da operação de concentração indicados na decisão impugnada não constituem motivos subsidiários na estrutura geral da decisão impugnada e são suficientes para justificar a proibição da operação notificada.

104    Consequentemente, a petição só poderia conduzir à anulação da decisão impugnada se os fundamentos expressamente suscitados na própria petição pusessem em causa o entendimento da Comissão relativamente a cada um dos aspectos autónomos analisados na decisão impugnada, designadamente os efeitos anticoncorrenciais e verticais que aí foram considerados.

 Quanto ao alcance da petição

105    Finalmente, há que analisar a este respeito a argumentação da recorrente, segundo a qual apresentou acusações, na sua petição, sob o título «Resumo da decisão», relativas aos efeitos anticoncorrenciais horizontais e verticais da concentração referidos na decisão impugnada. Há que analisar se essas observações da recorrente podem ser qualificadas de fundamentos.

106    A este respeito, há que referir, em primeiro lugar, que os elementos constantes de uma petição na qual se pede a anulação de uma decisão sob o título «Resumo da decisão» não podem, à primeira vista, constituir fundamentos autónomos susceptíveis de conduzir à anulação da decisão impugnada, sendo antes descritíveis do acto posto em causa. Contudo, não se pode excluir a priori a possibilidade de essa parte da petição poder conter a exposição de um ou de mais fundamentos de anulação. No entanto, só na medida em que resulte de uma passagem sob esse título de forma clara e inequívoca que, para além da sua função descritiva, essa passagem põe em causa a validade das declarações adoptadas na decisão impugnada, pode esta última, eventualmente, ser considerada um fundamento, não obstante a estrutura da petição e a sua localização na economia geral desta última.

107    Examinam‑se a seguir sucessivamente as afirmações contidas na petição sob o título «Resumo da decisão» relativas a cada um dos principais pilares nos quais assenta a decisão impugnada.

–       Sobreposição horizontal no mercado dos reactores para grandes aviões de transporte regional

108    A este respeito, a recorrente limita‑se a afirmar o seguinte, no n.° 30 da sua petição:

«[…] a Comissão admite que o aumento da quota de mercado resultante da fusão é ‘relativamente reduzida’ e seria feita no contexto do domínio alegadamente preexistente da GE. Consequentemente, as afirmações segundo as quais a integração da GE e da Honeywell impediria os clientes ‘de beneficiar de uma concorrência sobre os preços’ (afirmação que parece contradizer a conclusão segundo a qual a GE já domina o mercado) e lhes daria ‘uma vantagem de titularidade excepcional para [...] de futuras plataformas’, pouco ou nenhum peso tem.»

109    Decorre destas afirmações que a recorrente considera que os fundamentos da decisão impugnada relativos a esse mercado descrevem uma alteração pouco importante do ambiente da concorrência. Contudo, os elementos essenciais de facto e de direito nos quais o recurso se baseia relativamente a essa questão não resultam de forma coerente e compreensível, mesmo sumariamente, da passagem referida no número anterior. Com efeito, a recorrente limita‑se a pôr em causa a pouca importância dos efeitos anticoncorrenciais horizontais referidos pela Comissão relativamente aos efeitos horizontais no mercados dos reactores para grandes aviões de transporte regional sem explicar quais seriam, em seu entender, as consequências jurídicas dessa argumentação.

110    Em especial, não pode deduzir‑se da passagem em causa se a posição da recorrente consiste em alegar que a «suposta» posição dominante preexistente da GE nesse mercado não seria de modo nenhum reforçada pela operação de concentração ou se seria reforçada numa medida não significativa abrangida pelo conceito «de minimis» ou, por último, se o reforço dessa posição dominante teria apenas como consequência o entrave significativo da concorrência efectiva no mercado comum ou numa parte substancial deste último. Nestas condições, não compete ao Tribunal completar esta parte da petição escolhendo ele próprio a qualificação jurídica que há que atribuir às críticas excessivamente fluídas formuladas pela recorrente.

111    Assim, a passagem do n.° 30 da petição que faz parte do título «Resumo da decisão» não é suficientemente clara e precisa para constituir uma exposição de um fundamento na acepção do artigo 44.°, n.° 1, do Regulamento de Processo e da jurisprudência que o interpreta (v., em especial, n.° 55 supra).

112    Em consequência, independentemente da situação respeitante aos outros mercados analisados na decisão impugnada, há que concluir que a análise da Comissão relativa à sobreposição horizontal no mercado dos reactores para grandes aviões de transporte regional não foi posta em causa pela petição e tem, consequentemente, de considerar‑se fundamentada para efeitos do presente processo.

–       Sobreposição horizontal no mercado das pequenas turbinas de gás marítimas

113    A este respeito, a recorrente limitou‑se a expor o seguinte, no n.° 39 da sua petição:

«Relativamente às pequenas turbinas de gás marítimas, a Comissão considerou que a fusão conduziria à criação de uma posição dominante porque: (i) a entidade resultante da concentração passaria a ter entre 65% e 80% do mercado; (ii) a posição preponderante da Honeywell no mercado seria reforçada pela sua associação com a capacidade financeira da GE e a integração vertical; e (iii) a GE poderia exercer uma influência significativa sobre os seus concorrentes através da actividade da Honeywell que consiste em fornecer componentes essenciais a concorrentes.»

114    Há que concluir que esta passagem descreve pura e simplesmente as constatações da decisão impugnada a propósito desse mercado e não contém o mais pequeno elemento que permita que seja interpretada como fundamento de anulação nos termos do artigo 44.°, n.° 1, do Regulamento de Processo. Assim, uma vez mais, independentemente da situação no que diz respeito aos outros mercados examinados na decisão impugnada, há que concluir que a análise da Comissão relativa à sobreposição horizontal no mercado das pequenas turbinas de gás marítimas não foi posta em causa na petição e tem, consequentemente, de ser considerada fundamentada para efeitos do presente processo.

–       Integração vertical das actividades de fabrico de equipamentos para o arranque dos motores

115    Relativamente à integração vertical das actividades de fabrico de equipamentos para o arranque dos motores da recorrente nas da actividade de fabrico de reactores para os grandes aviões comerciais da GE, a recorrente limita‑se, no n.° 29 da sua petição, a descrever os fundamentos pertinentes da decisão impugnada:

«No que se refere ao mercado de motores das grandes aeronaves comerciais, a Comissão considerou que a GE já detinha uma posição dominante nesse mercado no qual a presença da Honeywell é nula. A Comissão concluiu que a concentração reforçaria a posição dominante da GE porque: […] (iii) a entidade resultante da concentração teria motivos e possibilidades para impedir outros fabricantes de motores de lhe fazerem concorrência por a Honeywell ser um fornecedor importante de motores de arranque.»

116    Há, uma vez mais, que concluir que esta descrição não contém o mais pequeno elemento que possa ser interpretado como fundamento de anulação nos termos do artigo 44.°, n.° 1, do Regulamento de Processo. Assim, a conclusão da Comissão quanto ao reforço da posição dominante da GE no mercado dos reactores das grandes aeronaves comerciais devido à posição da recorrente na produção de equipamentos para o arranque dos motores tem também de ser considerada fundamentada para efeitos do presente processo.

117    Assim, independentemente da situação no que diz respeito aos outros mercados analisados na decisão impugnada, há que concluir que a análise da Comissão relativamente à integração vertical das actividades de equipamentos para o arranque dos motores não foi questionada na petição e tem, consequentemente, de se considerar fundamentada para efeitos do presente processo.

–       Efeitos de conglomerado resultantes da integração vertical

118    Por último, no que se refere aos efeitos de conglomerado decorrentes da integração vertical da recorrente nas filiais da GE, concretamente na GECAS, na GECCAG e na GE Capital, a recorrente só analisa quanto ao mérito o aspecto relativo à possibilidade de financiamento cruzado devido ao poder financeiro da GE Capital. Quanto à possibilidade de influenciar as escolhas feitas pelos clientes com o objectivo de favorecer os motores da GE e os produtos de aviónica e não pertencentes à aviónica da recorrente, esta última, tendo descrito resumidamente essa tese da Comissão, alega, no n.° 43 da sua petição: «Esta teoria é de tal modo inverosímil que não me debruçarei mais sobre assunto no presente recurso.» Uma vez que a recorrente não apresenta qualquer argumento que ponha em causa a justeza dos fundamentos da decisão impugnada relativos à influência que a GECAS e a GECCAG poderiam exercer na qualidade de compradores de aviões, estes argumentos têm de ser considerados procedentes para efeitos do presente recurso.

–       Sobreposição horizontal no mercado dos reactores para aviões de executivos

119    A recorrente fez comentários detalhados nos n.os 31 a 37 da petição pondo em causa, em especial, a definição do mercado em questão bem como o facto de a Comissão se apoiar nos dados quantitativos relativos às quotas de mercado. Não obstante, o facto de essa argumentação constar do título «Resumo da decisão», há que concluir que os elementos de facto e de direito apresentados a este respeito na sua petição são suficientes para constituir um fundamento que pode, caso proceda, infirmar a análise da Comissão na decisão impugnada no que se refere à criação de uma posição dominante nesse mercado, designadamente devido aos efeitos anticoncorrenciais horizontais resultantes da concentração.

 Conclusão

120    A recorrente não contestou vários pilares autónomos que constituem o fundamento da proibição da operação de concentração. Em especial, não contestou a constatação relativa ao reforço da posição dominante preexistente da GE no mercado dos reactores para grandes aviões de transporte regional, nem a criação de uma posição dominante no mercado das pequenas turbinas de gás marítimas, devido a sobreposições horizontais entre as actividades das duas empresas. Também não pôs em causa a constatação relativa ao reforço da posição dominante preexistente da GE no mercado dos reactores para grandes aviões comerciais resultante da integração vertical da actividade de fabrico de equipamentos para o arranque dos motores da recorrente e a do fabrico dos referidos reactores.

121    Assim, os fundamentos não contestados da decisão impugnada têm de ser considerados procedentes para efeitos do presente processo. Atendendo à natureza ligada mas autónoma dos argumentos em causa, de modo que cada um poderia, em princípio, justificar a proibição da concentração por si só, a Comissão teria necessariamente proibido a operação de concentração no caso de ter apenas considerado procedente, na decisão impugnada, alguma das constatações dos efeitos anticoncorrenciais não contestados no presente processo. Em especial, não resulta da comunicação de acusações nem da decisão impugnada que a tese da Comissão relativa à incompatibilidade da operação notificada com o mercado comum se baseava exclusivamente ou mesmo essencialmente na sua análise das ofertas de produtos por pacotes.

122    Consequentemente, os fundamentos suscitados pela recorrente declarados admissíveis e que afectam, se considerados procedentes, os fundamentos da decisão impugnada relativos às vendas de produtos por pacotes, às subvenções cruzadas e aos efeitos horizontais no mercados dos aviões de executivos, são ineficazes na medida em que não conduzem à anulação da decisão impugnada no presente recurso.

123    Daqui resulta que, mesmo que todos os fundamentos jurídicos e os argumentos apresentados pela recorrente no presente caso fossem julgados procedentes, não seriam suficientes para levar à anulação da decisão impugnada no presente processo.

2.     Violação dos direitos processuais

 Argumentos das partes

124    A recorrente apresenta um fundamento baseado numa alegada violação dos direitos de defesa. Invoca, no essencial, que, ao introduzir pela primeira vez, na decisão impugnada, os conceitos de subvenções cruzadas entre as diferentes actividades da nova entidade e de preços predadores, a Comissão violou os seus direitos de defesa.

125    A Comissão responde, no essencial, que estes dois aspectos do processo foram resumidamente suscitados na comunicação de acusações de 8 de Maio de 2001 e que, seja como for, não podem ser consideradas acusações autónomas.

 Apreciação do Tribunal

126    Há que referir que a alegada violação dos direitos de defesa invocada no presente caso se refere exclusivamente aos elementos da decisão impugnada que a recorrente pôs em causa no âmbito dos seus outros fundamentos, concretamente, as vendas de produtos por pacotes e as subvenções cruzadas. Consequentemente, mesmo que o presente fundamento seja procedente, não poderia abalar os pilares da fundamentação da Comissão contra os quais esses outros fundamentos também são dirigidos. Assim, o presente fundamento não pode ter qualquer incidência nos outros pilares que constituem o fundamento da decisão impugnada.

127    Deste modo, o presente fundamento não procede tal como e pelas mesmas razões que os outros fundamentos apresentados pela recorrente.

128    Seja como for, há que concluir no presente caso que os dois conceitos em causa foram resumidamente referidos na comunicação das acusações e que estão intimamente ligados a outros elementos que foram objecto de uma exposição detalhada nesta última, pelo que não há que considerá‑las acusações autónomas. Nestas condições, a recorrente pôde defender‑se de forma útil relativamente a estas considerações.

 Conclusão

129    Nestas circunstâncias, dado que a recorrente não contestou todos os pilares que constituem, individualmente, um fundamento jurídico e factual bastante da decisão impugnada, supondo mesmo que todos os fundamentos validamente apresentados pela recorrente são procedentes, o seu recurso não pode levar à anulação da decisão impugnada no presente processo.

130    Consequentemente, há que negar provimento ao recurso.

 Quanto às despesas

131    Por força do disposto no n.° 2 do artigo 87.° do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a recorrente sido vencida e tendo a recorrida, bem como as intervenientes, a Rolls‑Royce e a Rockwell, pedido a condenação da recorrente nas despesas, há que condenar esta última nas suas próprias despesas e nas despesas efectuadas pela recorrida e pelas intervenientes.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Segunda Secção Alargada)

decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      A recorrente suportará as suas próprias despesas, bem como as despesas efectuadas pela Comissão e pelas intervenientes.

Pirrung

Tiili

Meij

Vilaras

 

      Forwood

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 14 de Dezembro de 2005.

O secretário

 

      O presidente

E. Coulon

 

      J. Pirrung

Índice

Quadro jurídico

Antecedentes do litígio

Decisão impugnada

Tramitação processual

Pedidos das partes

Questão de direito

1.  Quanto ao âmbito do recurso e ao objecto do litígio

Argumentos das partes

Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

Introdução

Quanto à remissão para os fundamentos suscitados no processo T‑210/01

Quanto ao pedido de apensação

Quanto à eficácia dos fundamentos invocados no presente processo

Quanto ao alcance da petição

–  Sobreposição horizontal no mercado dos reactores para grandes aviões de transporte regional

–  Sobreposição horizontal no mercado das pequenas turbinas de gás marítimas

–  Integração vertical das actividades de fabrico de equipamentos para o arranque dos motores

–  Efeitos de conglomerado resultantes da integração vertical

–  Sobreposição horizontal no mercado dos reactores para aviões de executivos

Conclusão

2.  Violação dos direitos processuais

Argumentos das partes

Apreciação do Tribunal

Conclusão

Quanto às despesas


* Língua do processo: inglês.