Language of document : ECLI:EU:T:2012:672

Processo T‑332/09

Electrabel

contra

Comissão Europeia

«Concorrência — Concentrações — Decisão que aplica uma coima pela realização de uma operação de concentração — Obrigação de suspensão da operação de concentração — Dever de fundamentação — Erro de apreciação — Prescrição — Montante da coima»

Sumário — Acórdão do Tribunal Geral (Terceira Secção) de 12 de dezembro de 2012

1.      Concentração de empresas — Exame pela Comissão — Decisão da Comissão que declara a existência de uma infração — Ónus da prova da infração e da respetiva duração a cargo da Comissão — Não contestação de certos elementos de facto e de direito durante o processo administrativo — Limitação do exercício do direito de recurso — Inexistência — Fiscalização jurisdicional — Alcance

(Artigos 83.°, CE e 230.°, quarto parágrafo, CE; Regulamento n.° 4064/89 do Conselho, artigos 4.°, n.° 1, e 7.°, n.° 1)

2.      Concentração de empresas — Conceito — Controlo exclusivo de facto — Exercício por parte de um acionista minoritário — Critérios de apreciação — Participação dos acionistas nas assembleias gerais dos anos anteriores — Fiscalização jurisdicional — Alcance

(Artigo 83.° CE; Regulamento n.° 4064/89 do Conselho, artigo 3.°, n.os 1 e 3; Comunicação 98/C 66/02 da Comissão, pontos 9, 14 e 15)

3.      Concorrência — Procedimento administrativo — Decisão que declara uma infração e aplica uma coima — Respeito do princípio da igualdade de tratamento — Obrigação de a Comissão seguir a sua prática decisória anterior — Inexistência — Fiscalização jurisdicional

(Artigos 81.° CE, 82.° CE e 83.° CE)

4.      Concentração de empresas — Conceito — Controlo exclusivo de facto — Exercício por parte de um acionista minoritário — Critérios de apreciação — Estrutura dos direitos de voto e direito de gerir as atividades da empresa em causa — Direito preferencial de subscrição — Simples índice a acrescentar aos demais e não condição suplementar desse controlo

(Artigo 83.° CE; Regulamento n.° 4064/89 do Conselho; Comunicação 98/C 66/02 da Comissão, ponto 15)

5.      Atos das instituições — Fundamentação — Dever — Alcance

(Artigo 253.° CE)

6.      Concentração de empresas — Exame pela Comissão — Obrigação de suspensão da concentração — Operação realizada antes de ser declarada compatível com o mercado comum — Faculdade de a Comissão pedir medidas provisórias para as operações abrangidas pelo âmbito de aplicação do Regulamento n.° 139/2004 e não para as abrangidas pelo Regulamento n.° 4064/89 — Falta desse pedido num caso abrangido pelo Regulamento n.° 4064/89 — Falta de incidência sobre a qualificação da infração

(Artigo 83.° CE; Regulamentos do Conselho n.° 139/2004, artigos 8.°, n.° 5, e 26.°, n.° 2, e n.° 4064/89, artigos 4.°, n.° 1, e 7.°, n.° 1)

7.      Concorrência — Procedimento administrativo — Prescrição em matéria de procedimentos — Prazo de prescrição — Concentração de empresas — Operação realizada antes de ser declarada compatível com o mercado comum — Apreciação

[Artigo 83.° CE; Regulamentos do Conselho n.° 2988/74, artigo 1.°, n.° 1, alíneas a) e b), e n.° 4064/89, artigo 7.°, n.° 1]

8.      Concorrência — Procedimento administrativo — Prescrição em matéria de procedimentos — Início da contagem — Concentração de empresas — Operação realizada antes de ser declarada compatível com o mercado comum — Infração continuada — Apreciação

(Artigo 83.° CE; Regulamentos do Conselho n.° 2988/74, artigo 1.°, n.° 2, e n.° 4064/89, artigo 7.°, n.° 1)

9.      Concentração de empresas — Coimas — Montante — Determinação — Fiscalização jurisdicional — Competência de plena jurisdição do juiz da União — Alcance

(Artigo 83.° CE; Artigo 261.° TFUE; Regulamento n.° 4064/89 do Conselho, artigo 16.°)

10.    Concentração de empresas — Coimas — Montante — Determinação — Critérios — Gravidade da infração — Poder de apreciação da Comissão — Orientações para o cálculo das coimas aplicadas em caso de violação dos artigos 81.° CE e 82.° CE — Inaplicabilidade — Aplicabilidade exclusiva das disposições do Regulamento n.° 4064/89

(Artigos 81.° CE, 82.° CE e 83.° CE; Artigo 261.° TFUE; Regulamentos do Conselho n.° 17, artigo 15.°, n.° 2, n.° 1/2003, artigo 23.°, n.° 2, e n.° 4064/89, artigo 14.°, n.° 3; Comunicações da Comissão 98/C 9/03 e 2006/C 210/02)

11.    Concentração de empresas — Coimas — Montante — Determinação — Critérios — Gravidade da infração — Conceito — Operação realizada antes de ser declarada compatível com o mercado comum — Inclusão — Violação por negligência — Irrelevância

[Artigos 3.°, n.° 1, alínea g) CE, 81.° CE, 82.° CE e 83.° CE; Artigo 261.° TFUE; Regulamento n.° 4064/89 do Conselho, considerando 17 e artigos 4.°, 7.°, n.° 1, e 14.°, n.° 2]

12.    Concentração de empresas — Coimas — Montante — Determinação — Critérios — Duração da infração

(Artigo 83.° CE; Regulamento n.° 4064/89 do Conselho, artigo 14.°, n.° 2)

13.    Concentração de empresas — Coimas — Montante — Determinação — Circunstâncias atenuantes — Margem de apreciação da Comissão — Não dissimulação da aquisição — Violação por negligência

(Artigo 83.° CE; Regulamento n.° 4064/89 do Conselho, artigo 14.°, n.° 2)

14.    Concentração de empresas — Coimas — Montante — Determinação — Critérios — Respeito do princípio da proporcionalidade — Alcance

(Artigo 83.° CE; Regulamento n.° 4064/89 do Conselho, artigo 14.°, n.° 2)

15.    Concentração de empresas — Coimas — Montante — Determinação — Critérios — Carácter dissuasivo — Tomada em consideração da dimensão e do poder económico da empresa sancionada

(Artigo 83.° CE; Regulamento n.° 4064/89 do Conselho, artigo 14.°, n.° 2)

16.    Concentração de empresas — Coimas — Montante — Determinação — Margem de apreciação reservada à Comissão — Aumento do nível geral das coimas — Admissibilidade — Violação do princípio da proteção da confiança legítima — Inexistência

(Artigo 83.° CE; Regulamento n.° 4064/89 do Conselho, artigo 14.°, n.° 2)

17.    Concentração de empresas — Coimas — Montante — Determinação — Política de clemência seguida em matéria de cartéis — Irrelevância

(Artigo 83.° CE; Regulamento n.° 4064/89 do Conselho, artigo 14.°, n.° 2)

1.      No domínio do direito da concorrência, em caso de litígio a respeito da existência de uma infração, compete à Comissão apresentar a prova das infrações por ela verificadas e produzir os elementos probatórios adequados à demonstração juridicamente satisfatória da existência dos factos constitutivos da infração. Para este efeito, deve reunir elementos de prova suficientemente precisos e coerentes para fundarem a firme convicção de que a infração alegada ocorreu. Com efeito, os processos no Tribunal são regidos pelo princípio livre administração das provas e o único critério pertinente para apreciar as provas produzidas reside na sua credibilidade.

(cf. n.os 31, 33, 36, 105‑107)

2.      V. texto da decisão.

(cf. n.os 40‑42, 47, 48, 115, 116, 120, 253)

3.      V. texto da decisão.

(cf. n.os 63, 123, 124, 173, 259, 274, 286)

4.      V. texto da decisão.

(cf. n.° 175)

5.      V. texto da decisão.

(cf. n.os 179‑181)

6.      V. texto da decisão.

(cf. n.os 192‑195)

7.      Resulta do artigo 7.°, n.° 1, do Regulamento n.° 4064/89, relativo ao controlo das operações de concentração de empresas, que existe infração a esta disposição se for realizada uma concentração de dimensão comunitária antes de ser notificada ou antes de ter sido declarada compatível com o mercado comum, dado que a notificação, enquanto tal, não é determinante para estabelecer a realidade da concentração, nem suficiente para se lhe pôr termo.

A este respeito, a distinção que dá lugar a dois prazos de prescrição diferentes no Regulamento n.° 2988/74, relativo à prescrição quanto a procedimentos e execução de sanções no domínio do direito dos transportes e da concorrência da Comunidade Económica Europeia, está igualmente relacionada com a natureza da infração, sendo um prazo curto de três anos previsto no artigo 1.°, n.° 1, alínea a), do referido regulamento, para as infrações relativas aos pedidos ou às notificações das empresas ou associações de empresas, aos pedidos de informação ou à execução de averiguações, e um prazo mais longo de cinco anos previsto no n.° 1, alínea b), do referido artigo, para as restantes infrações. É evidente que a primeira categoria de infrações, referido na alínea a), a respeito das infrações tem caráter formal ou processual. Ora, a realização antecipada de uma concentração, em violação do artigo 7.°, n.° 1, do Regulamento n.° 4064/89, constitui uma infração que não pode ser qualificada de puramente formal ou processual, uma vez que é suscetível de produzir alterações substanciais das condições de concorrência. Ainda que se trate de uma questão relativa à competência da Comissão, a mesma diz, no entanto, respeito a uma infração diferente das visadas no artigo 1.°, n.° 1, alínea a), do Regulamento n.° 2988/74.

(cf. n.os 205‑207)

8.      Não pode ser acolhida uma interpretação segundo a qual a argumentação respeitante à aplicação do artigo 1.°, n.° 2, do Regulamento n.° 2988/74, relativo à prescrição quanto a procedimentos e execução de sanções no domínio do direito dos transportes e da concorrência da Comunidade Económica Europeia, que prevê que a prescrição começa a correr a partir do dia em que a infração foi cometida, exceto em relação às infrações permanentes ou continuadas, para as quais a prescrição só começa a correr a partir do dia em que a infração cessou, prevê uma distinção entre infrações continuadas permanentes que terminam com um só ato e infrações continuadas sucessivas.

Com efeito, a possibilidade de exercer uma influência determinante sobre a atividade da empresa controlada prolonga‑se necessariamente no tempo, entre a data de aquisição do controlo e o fim deste. No que diz respeito ao caráter continuado da infração, a entidade que adquiriu o controlo da empresa continua a exercê‑lo em violação da obrigação de suspensão que decorre do artigo 7.°, n.° 1, do Regulamento n.° 4064/89, relativo ao controlo das operações de concentração de empresas, até ao momento em que lhe põe termo, obtendo autorização da Comissão ou deixando de exercer esse controlo. Assim, a infração persiste enquanto se mantiver o controlo adquirido em violação do referido artigo 7.°, n.° 1, e enquanto a concentração não tiver sido autorizada pela Comissão.

(cf. n.os 211, 212)

9.      Nos termos do artigo 16.° do Regulamento n.° 4064/89, relativo ao controlo das operações de concentração de empresas, o Tribunal de Justiça conhece com plena jurisdição dos recursos interpostos das decisões em que tenha sido fixada uma multa ou uma sanção pecuniária compulsória pela Comissão; o Tribunal pode suprimir, reduzir ou aumentar a coima ou a sanção pecuniária compulsória aplicada. Esta competência habilita o juiz, além da simples fiscalização da legalidade da sanção, a substituir a sua apreciação à da Comissão e, consequentemente, a suprimir, reduzir ou agravar a coima ou a sanção pecuniária compulsória aplicada.

Porém, o exercício da competência de plena jurisdição não equivale a uma fiscalização a título oficioso na medida em que a tramitação processual nos órgãos jurisdicionais da União é contraditória. Com exceção dos fundamentos de ordem pública que o juiz tem o dever de suscitar oficiosamente, como a inexistência de fundamentação da decisão impugnada, é ao recorrente que compete invocar fundamentos contra essa decisão e apresentar elementos de prova que alicercem estes fundamentos.

(cf. n.os 221, 222)

10.    Os princípios e os métodos para o cálculo das coimas especificados nas orientações para o cálculo das coimas aplicadas nos termos do artigo 23.°, n.° 2, alínea a), do Regulamento n.° 1/2003 assim como nas orientações para o cálculo das coimas aplicadas por força do n.° 2 do artigo 15.° do Regulamento n.° 17 e do n.° 5 do artigo 65.° do Tratado CECA aplicam-se unicamente no âmbito do Regulamento n.° 17, Primeiro Regulamento de execução dos artigos 81.° CE e 82.° CE, e do Regulamento n.° 1/2003, relativo à execução das regras de concorrência estabelecidas nos artigos 101.° TFUE e 102.° TFUE e, por isso, não se aplicam às coimas aplicadas nos termos do Regulamento n.° 4064/89, relativo ao controlo das operações de concentração de empresas.

Embora possam ser estabelecidos paralelismos, a Comissão não pode ser acusada de não ter seguido, para fixar o montante das coimas num caso de concentração de empresas, um determinado método definido nas referidas orientações. O âmbito da sua análise devia ser o do artigo 14.°, n.° 3, do Regulamento n.° 4064/89 ‑ segundo o qual, para determinar o montante da coima, deve tomar‑se em consideração a natureza e a gravidade da infração ‑ para o qual a Comissão não adotou as orientações respeitantes ao método de cálculo que impõe a si própria na fixação das coimas.

(cf. n.os 227, 228, 272)

11.    O facto de o Regulamento n.° 4064/89, relativo ao controlo das operações de concentração de empresas, prever coimas mais pesadas que podem ir até 10% do volume de negócios das empresas em causa, demonstra a vontade do legislador de proteger o sistema de notificação e de autorização prévia para a realização de uma operação de concentração de dimensão comunitária.

Com efeito, o objetivo da regulamentação da União em matéria de controlo das concentrações é a prevenção de prejuízos irreparáveis e permanentes à concorrência. Todavia, também resulta do Regulamento n.° 4064/89 que o sistema de controlo das concentrações que este regulamento põe em prática se destina a permitir à Comissão exercer uma fiscalização efetiva de todas as operações de concentração em função do seu efeito sobre a estrutura da concorrência (sétimo considerando) e que a realidade desse sistema é assegurada através da previsão de uma fiscalização ex ante dos efeitos das operações de concentração de dimensão comunitária. Decorre do considerando 17, bem como do artigo 4.° e do artigo 7.°, n.° 1, do Regulamento n.° 4064/89 que a eficácia desta supervisão é baseada no dever de as empresas notificarem previamente essas operações de concentração e de suspenderem a sua execução até à decisão da Comissão que as declare compatíveis com o mercado comum. Além disso, as limitações que a possibilidade de dispensa da obrigação de suspensão do artigo 7.° envolve e a severidade das sanções associadas à sua violação, no âmbito do artigo 14.°, n.° 2, alínea b), do Regulamento n.° 4064/89, confirmam a importância primordial atribuída pelo legislador à obrigação de suspensão no âmbito do controlo das concentrações, abordagem esta que se justifica pelo facto de a realização de uma concentração afetar a estrutura do mercado e de poder tornar mais difíceis as decisões da Comissão que visam, sendo caso disso, restabelecer uma concorrência efetiva.

No que diz respeito, nesse contexto, ao papel desempenhado pela negligência, o artigo 14.°, n.° 2, do Regulamento n.° 4064/89 não distingue consoante a infração tenha sido cometida com dolo ou por negligência, mas refere‑se estes dois requisitos de aplicação de uma coima a título alternativo. Além disso, as infrações cometidas por negligência não são, do ponto de vista dos seus efeitos na concorrência, menos graves do que as cometidas deliberadamente.

(cf. n.os 234‑237, 245‑246, 253, 273)

12.    O risco de um efeito prejudicial sobre os consumidores aumenta com a duração devendo esse risco deve ser apreciado a priori, tratando‑se de uma violação da obrigação de suspender uma concentração, independentemente da análise dos efeitos da operação no futuro. Quando uma infração é definida como a prática de um ato ou de uma atividade ilícita, é legítimo ter em conta o alcance do ato ou atividade em causa, bem como da duração do período em que a atividade foi exercida, mesmo que se trate de circunstâncias posteriores ao momento da prática da infração.

(cf. n.° 267)

13.    V. texto da decisão.

(cf. n.os 272, 275‑277)

14.    V. texto da decisão.

(cf. n.° 279)

15.    V. texto da decisão.

(cf. n.° 282)

16.    V. texto da decisão.

(cf. n.os 286, 299)

17.    A política de clemência praticada em matéria de cartéis, responde a dificuldades específicas de deteção dos cartéis, que são por natureza infrações secretas. O programa de clemência e as transações são instrumentos específicos relativos a esse contexto e qualquer aplicação por analogia no quadro do regime das concentrações de dimensão comunitária, que assenta num dever de notificação e no respeito do poder exclusivo de autorização prévia da Comissão, deve ser rejeitada.

(cf. n.os 291, 292)