Language of document : ECLI:EU:C:2018:883

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)

7 de novembro de 2018 (*)

«Reenvio prejudicial — Ambiente — Diretiva 92/43/CEE — Preservação dos habitats naturais — Preservação da fauna e da flora selvagens — Projeto de construção rodoviária — Avaliação adequada das incidências sobre o ambiente — Alcance do dever de fundamentação — Diretiva 2011/92/UE — Avaliação dos efeitos de determinados projetos — Anexo IV, n.o 3 — Artigo 5.o, n.o 3, alínea d) — Alcance do conceito de “principais soluções alternativas”»

No processo C‑461/17,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pela High Court (Tribunal Superior, Irlanda), por decisão de 5 de maio de 2017, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 28 de julho de 2017, no processo

Brian Holohan,

Richard Guilfoyle,

Noric Guilfoyle,

Liam Donegan

contra

An Bord Pleanála,

sendo interveniente:

National Parks and Wildlife Service (NPWS),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

composto por: A. Prechal, presidente da Terceira Secção, exercendo funções de presidente da Segunda Secção, C. Toader (relatora) e A. Rosas, juízes,

advogado‑geral: J. Kokott,

secretário: K. Malacek, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 16 de maio de 2018,

vistas as observações apresentadas:

–        em representação de B. Holohan, R. Guilfoyle, N. Guilfoyle e L. Donegan, por D. Browne e C. Hugues, BL, P. O’Higgins e J. Devlin, SC, mandatados por C. Herlihy, L. O’Sullivan, e B. Harrington, solicitors,

–        em representação da An Bord Pleanála, por F. Valentine, BL, e N. Butler, SC, mandatados por M. Larkin e A. Doyle, solicitors,

–        em representação da Irlanda, por M. Browne, G. Hodge e A. Joyce, na qualidade de agentes, assistidos por G. Simons, SC, e M. Gray, BL,

–        em representação do Governo checo, por M. Smolek, J. Vláčil e L. Dvořáková, na qualidade de agentes,

–        em representação do Governo do Reino Unido, inicialmente por G. Brown, na qualidade de agente, assistida por C. Banner, barrister, e em seguida por R. Fadoju e J. Kraehling, na qualidade de agentes, assistidas por T. Buley e C. Banner, barristers,

–        em representação da Comissão Europeia, por C. Hermes, E. Manhaeve e M. Noll‑Ehlers, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões da advogada‑geral na audiência de 7 de agosto de 2018,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação da Diretiva 92/43/CEE do Conselho, de 21 de maio de 1992, relativa à preservação dos habitats naturais e da fauna e da flora selvagens (JO 1992, L 206, p. 7, a seguir «Diretiva Habitats»), bem como da Diretiva 2011/92/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de dezembro de 2011, relativa à avaliação dos efeitos de determinados projetos públicos e privados no ambiente (JO 2012, L 26, p. 1, a seguir «Diretiva AIA»).

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe Brian Holohan, Richard e Noric Guilfoyle, bem como Liam Donegan, à An Bord Pleanála (Agência de ordenamento do território, Irlanda) (a seguir «Agência»), a propósito da aprovação de um projeto de ampliação da circular rodoviária a norte da cidade de Kilkenny (Irlanda) (a seguir «projeto de desenvolvimento»).

 Quadro jurídico

 Direito da União

 Diretiva Habitats

3        O primeiro e terceiro considerandos da Diretiva Habitats enunciam:

«[…] a preservação, a proteção e a melhoria do ambiente, incluindo a preservação dos habitats naturais e da fauna e da flora selvagens, constituem objetivos essenciais de interesse geral da Comunidade, tal como dispõe o artigo [191.o TFUE];

[…]

[…] consistindo o objetivo principal da presente diretiva em favorecer a manutenção da biodiversidade, tomando simultaneamente em consideração as exigências económicas, sociais, culturais e regionais, contribui para o objetivo geral de desenvolvimento sustentável; […] a manutenção dessa biodiversidade pode, em certos casos, requerer a manutenção e até mesmo o encorajamento de atividades humanas».

4        O artigo 1.o desta diretiva dispõe:

«Para efeitos da presente diretiva, entende‑se por:

[…]

e)      Estado de conservação de um habitat natural: o efeito de conjunto das influências que atuam sobre o habitat natural em causa, bem como sobre as espécies típicas que nele vivem, suscetíveis de afetar a longo prazo a sua repartição natural, a sua estrutura e as suas funções, bem como a sobrevivência a longo prazo das suas espécies típicas no território referido no artigo 2.o

O “estado de conservação” de um habitat natural será considerado “favorável” sempre que:

–        a sua área de repartição natural e as superfícies que dentro dela abrange forem estáveis ou estiverem em expansão

e

–        a estrutura e as funções específicas necessárias à sua manutenção a longo prazo existirem e forem suscetíveis de continuar a existir num futuro previsível e

[…]

k)      Sítio de importância comunitária: um sítio que, na ou nas regiões biogeográficas a que pertence, contribua de forma significativa para manter ou restabelecer um tipo de habitat natural do anexo I ou uma espécie do anexo II, num estado de conservação favorável, e possa também contribuir de forma significativa para a coerência da rede Natura 2000 referida no artigo 3.o e/ou contribua de forma significativa para manter a diversidade biológica na região ou regiões biogeográficas envolvidas.

[…]

l)      Zona especial de conservação: um sítio de importância comunitária designado pelos Estados‑Membros por um ato regulamentar, administrativo e/ou contratual em que são aplicadas as medidas necessárias para a manutenção ou o restabelecimento do estado de conservação favorável, dos habitats naturais e/ou das populações das espécies para as quais o sítio é designado;

[…]»

5        Nos termos do artigo 2.o da referida diretiva:

«1.      A presente diretiva tem por objetivo contribuir para assegurar a biodiversidade através da conservação dos habitats naturais e da fauna e da flora selvagens no território europeu dos Estados‑Membros em que o Tratado é aplicável.

2.      As medidas tomadas ao abrigo da presente diretiva destinam‑se a garantir a conservação ou o restabelecimento dos habitats naturais e das espécies selvagens de interesse comunitário num estado de conservação favorável.

3.      As medidas tomadas ao abrigo da presente diretiva devem ter em conta as exigências económicas, sociais e culturais, bem como as particularidades regionais e locais.»

6        O artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva Habitats tem a seguinte redação:

«É criada uma rede ecológica europeia coerente de zonas especiais de preservação denominada “Natura 2000”. Esta rede, formada por sítios que alojam tipos de habitats naturais constantes do anexo I e habitats das espécies constantes do anexo II, deve assegurar a manutenção ou, se necessário, o restabelecimento dos tipos de habitats naturais e dos das espécies em causa num estado de conservação favorável, na sua área de repartição natural.

[…]»

7        O artigo 6.o desta diretiva enuncia:

«1.      Em relação às zonas especiais de conservação, os Estados‑Membros fixarão as medidas de conservação necessárias, que poderão eventualmente implicar planos de gestão adequados, específicos ou integrados noutros planos de ordenação, e as medidas regulamentares, administrativas ou contratuais adequadas que satisfaçam as exigências ecológicas dos tipos de habitats naturais do anexo I e das espécies do anexo II presentes nos sítios.

2.      Os Estados‑Membros tomarão as medidas adequadas para evitar, nas zonas especiais de conservação, a deterioração dos habitats naturais e dos habitats de espécies, bem como as perturbações que atinjam as espécies para as quais as zonas foram designadas, na medida em que essas perturbações possam vir a ter um efeito significativo, atendendo aos objetivos da presente diretiva.

3.      Os planos ou projetos não diretamente relacionados com a gestão do sítio e não necessários para essa gestão, mas suscetíveis de afetar esse sítio de forma significativa, individualmente ou em conjugação com outros planos e projetos, serão objeto de uma avaliação adequada das suas incidências sobre o sítio no que se refere aos objetivos de conservação do mesmo. Tendo em conta as conclusões da avaliação das incidências sobre o sítio e sem prejuízo do disposto no n.o 4, as autoridades nacionais competentes só autorizarão esses planos ou projetos depois de se terem assegurado de que não afetarão a integridade do sítio em causa e de terem auscultado, se necessário, a opinião pública.

4.      Se, apesar de a avaliação das incidências sobre o sítio ter levado a conclusões negativas e na falta de soluções alternativas, for necessário realizar um plano ou projeto por outras razões imperativas de reconhecido interesse público, incluindo as de natureza social ou económica, o Estado‑Membro tomará todas as medidas compensatórias necessárias para assegurar a proteção da coerência global da rede Natura 2000. O Estado‑Membro informará a Comissão das medidas compensatórias adotadas.

No caso de o sítio em causa abrigar um tipo de habitat natural e/ou uma espécie prioritária, apenas podem ser evocadas razões relacionadas com a saúde do homem ou a segurança pública ou com consequências benéficas primordiais para o ambiente ou, após parecer da Comissão, outras razões imperativas de reconhecido interesse público.»

8        De acordo com o artigo 7.o da Diretiva Habitats, as obrigações decorrentes dos n.os 2 a 4 do artigo 6.o desta diretiva aplicam‑se às zonas de proteção especial (a seguir «ZPE»), na aceção da Diretiva 2009/147/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de novembro de 2009, relativa à conservação das aves selvagens (JO 2010, L 20, p. 7, a seguir «Diretiva Aves»).

 Diretiva Aves

9        O artigo 4.o, n.o 1, quarto parágrafo, da Diretiva Aves prevê:

«Os Estados‑Membros classificam, nomeadamente, em [ZPE] os territórios mais apropriados, em número e em extensão, para a conservação destas espécies na zona geográfica marítima e terrestre de aplicação da presente diretiva.»

 Diretiva AIA

10      O artigo 1.o da Diretiva AIA tem a seguinte redação:

«1.      A presente diretiva aplica‑se à avaliação dos efeitos no ambiente de projetos públicos e privados suscetíveis de terem um impacto considerável no ambiente.

2.      Na aceção da presente diretiva, entende‑se por:

a)      “Projeto”:

–        a realização de obras de construção ou de outras instalações ou obras,

–        outras intervenções no meio natural ou na paisagem, incluindo as intervenções destinadas à exploração dos recursos do solo;

b)      “Dono da obra”: o autor de um pedido de aprovação de um projeto privado, ou a autoridade pública que toma a iniciativa relativa a um projeto;

c)      “Aprovação”: a decisão da autoridade ou das autoridades competentes que confere ao dono da obra o direito de realizar o projeto;

d)      “Público”: uma ou mais pessoas singulares ou coletivas, bem como, de acordo com a legislação ou práticas nacionais, as suas associações, organizações ou agrupamentos;

e)      “Público em causa”: o público afetado ou suscetível de ser afetado pelos processos de tomada de decisão no domínio do ambiente a que se refere o artigo 2.o, n.o 2, ou neles interessado. Para efeitos da presente definição, consideram‑se interessadas as organizações não governamentais que promovem a proteção do ambiente e cumprem os requisitos previstos na legislação nacional;

f)      “Autoridade ou autoridades competentes”: a entidade ou entidades que os Estados‑Membros designarem como responsáveis pelo desempenho das tarefas resultantes da presente diretiva.

[…]»

11      O artigo 2.o, n.o 1, desta diretiva enuncia:

«Os Estados‑Membros tomarão as disposições necessárias para garantir que, antes de concedida a aprovação, os projetos que possam ter um impacto significativo no ambiente, nomeadamente pela sua natureza, dimensão ou localização, fiquem sujeitos a um pedido de aprovação e a uma avaliação dos seus efeitos. Esses projetos são definidos no artigo 4.o»

12      O artigo 3.o da referida diretiva tem a seguinte redação:

«A avaliação de impacto ambiental identificará, descreverá e avaliará de modo adequado, em função de cada caso particular e nos termos dos artigos 4.o a 12.o, os efeitos diretos e indiretos de um projeto sobre os seguintes fatores:

a)      O homem, a fauna e a flora;

b)      O solo, a água, o ar, o clima e a paisagem;

c)      Os bens materiais e o património cultural;

d)      A interação entre os fatores referidos nas alíneas a), b) e c).»

13      O artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva AIA dispõe:

«Sem prejuízo do disposto no artigo 2.o, n.o 4, os projetos incluídos no anexo I serão submetidos a uma avaliação nos termos dos artigos 5.o a 10.o»

14      O artigo 5.o desta diretiva prevê:

«1.      No caso de projetos que, em conformidade com o disposto no artigo 4.o, devem ser submetidos a uma avaliação de impacto no ambiente, nos termos do presente artigo e dos artigos 6.o a 10.o, os Estados‑Membros adotarão as medidas necessárias para assegurar que o dono da obra forneça, de uma forma adequada, as informações especificadas no anexo IV, na medida em que:

a)      Os Estados‑Membros considerem que essas informações são adequadas a uma determinada fase do processo de aprovação e às características específicas de um projeto determinado ou de um tipo de projeto e dos elementos do ambiente que possam ser afetados;

b)      Os Estados‑Membros considerem que se pode exigir razoavelmente que um dono da obra reúna essas informações, atendendo, nomeadamente, aos conhecimentos e aos métodos de avaliação existentes.

[…]

3.      As informações a fornecer pelo dono da obra nos termos do disposto no n.o 1 devem incluir, pelo menos:

[…]

c)      Os dados necessários para identificar e avaliar os principais impactos que o projeto possa ter no ambiente,

d)      Um resumo das principais soluções alternativas estudadas pelo dono da obra e a indicação das principais razões da sua escolha, atendendo aos efeitos no ambiente;

[…]»

15      O anexo IV da referida diretiva, intitulado «Informações referidas no artigo 5.o, n.o 1», enuncia, no seu n.o 3:

«Uma descrição dos elementos do ambiente suscetíveis de serem consideravelmente afetados pelo projeto proposto, nomeadamente, a população, a fauna, a flora, o solo, a água, a atmosfera, os fatores climáticos, os bens materiais, incluindo o património arquitetónico e arqueológico, a paisagem, bem como a inter‑relação entre os fatores mencionados.»

16      O artigo 3.o, n.o 2, da Diretiva 2014/52/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de abril de 2014, que altera a Diretiva 2011/92 (JO 2014, L 124, p. 1), dispõe:

«Os projetos ficam sujeitos às obrigações previstas no artigo 3.o e nos artigos 5.o a 11.o da Diretiva [AIA] antes da alteração introduzida pela presente diretiva se, antes de 16 de maio de 2017:

a)      O procedimento relativo ao parecer referido no artigo 5.o, n.o 2, da Diretiva [AIA] foi iniciado; ou

b)      As informações a que se refere o artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva [AIA] foram fornecidas.»

 Direito irlandês

17      A section 177V(1) que figura na parte XAB do Planning and Development Act 2000 (Lei de 2000 sobre o ordenamento do território e o desenvolvimento), enuncia:

«Uma avaliação adequada efetuada em conformidade com a presente parte deve incluir a apreciação da autoridade competente referida no artigo 6.o, n.o 3, da Diretiva [Habitats], quanto à questão saber se um projeto de urbanização ou se um projeto proposto é suscetível de afetar a integridade de um sítio da União [Europeia] e deve ser efetuada uma avaliação adequada pela autoridade competente sempre que esta autoridade verificou, em aplicação da section 177U(4), que era necessária uma avaliação adequada antes […] da concessão da aprovação para o projeto proposto».

18      A section 177V(2) dispõe:

«Ao proceder à avaliação adequada referida em (1), a autoridade competente deve tomar em consideração os seguintes elementos: (a) o relatório ou a declaração de impacto Natura, consoante o caso; (b) qualquer informação suplementar fornecida em relação a esse relatório ou a essa declaração; (c) se for caso disso, qualquer informação adicional solicitada pela autoridade e fornecida pelo requerente em relação a uma declaração de impacto Natura; (d) qualquer informação adicional fornecida à autoridade competente a seu pedido em relação a um relatório de impacto Natura; (e) qualquer informação ou conselho obtidos pela autoridade competente; (f) se for caso disso, qualquer observação escrita ou observação dirigida à autoridade competente em relação ao pedido de aprovação do projeto proposto; (g) qualquer outra informação relevante.»

19      A section 217B da Lei de 2000 sobre o ordenamento do território e o desenvolvimento autoriza a Agência a pedir informações suplementares às autoridades rodoviárias e a convidar estas últimas entidades a efetuarem alterações específicas às modalidades do projeto rodoviário proposto.

20      A section 50 do Roads Act 1993 (Lei das estradas de 1993) enuncia:

«(2) Uma declaração de impacto ambiental deve conter as seguintes informações específicas:

[…]

d)      Um resumo das principais soluções alternativas estudadas pela autoridade rodoviária em causa e a indicação das principais razões da sua escolha, atendendo aos efeitos no ambiente […]».

21      Nos termos da section 50(5) dessa lei, um parecer sobre a delimitação do âmbito de avaliação, a saber, um parecer escrito sobre as informações que devem ser incluídas nessa declaração de impacto ambiental, deve ser fornecido a pedido do dono da obra.

 Litígio no processo principal e questões prejudiciais

22      Os recorrentes no processo principal pretendem obter um despacho de certiorari anulatório da Decisão da Agência de 11 de julho de 2014 que contém a autorização do projeto de desenvolvimento concedida ao Kilkenny County Council (Conselho do condado de Kilkenny, Irlanda). Este projeto de desenvolvimento inclui a construção de cerca de 1,5 km de estrada com uma única faixa de rodagem, a construção de uma primeira rotunda e adaptação de uma segunda, a implantação de um percurso pedestre e de uma ciclovia do lado da cidade e diversos outros trabalhos.

23      A estrada proposta atravessa dois sítios Natura 2000: a ZPE do rio Nore, designada pela Irlanda ao abrigo da Diretiva Aves, e o sítio de importância comunitária (a seguir «SIC») dos rios Barrow e Nore, classificado como SIC ao abrigo da Diretiva Habitats desde 2004.

24      Os recorrentes no processo principal alegam, no essencial, em primeiro lugar, que a Agência cometeu um erro ao não examinar os efeitos no ambiente das principais soluções alternativas estudadas, em segundo lugar, que a avaliação adequada alegadamente efetuada é insuficiente e, em terceiro lugar, que a recorrida cometeu um erro ao aprovar o projeto de desenvolvimento e a declaração de impacto Natura (a seguir «DIN») apresentada pelo Conselho do condado de Kilkenny, na medida em que este Conselho não procedeu aos estudos ecológicos prévios a essa aprovação.

25      O órgão jurisdicional de reenvio refere que o dono da obra, a saber, o Conselho do condado de Kilkenny, elaborou a DIN para o projeto de desenvolvimento em maio de 2013. Segundo esse órgão jurisdicional, a DIN, que teve por base um documento preparado pelo National Parks and Wildlife Service (Serviço dos Parques Nacionais e da Fauna e Flora Selvagens do Ministério do Ambiente, do Património e da Administração Local, Irlanda) em 19 de julho de 2011, relativo aos objetivos de preservação e que expõe os objetivos a alcançar para a classificação como zona especial de conservação, não analisa plenamente o impacto noutras espécies além daquelas para as quais o sítio dos rios Barrow e Nore foi classificado e não menciona o impacto nas espécies ou nos habitats protegidos situados fora dos limites dos sítios em causa.

26      Em dezembro de 2013, o dono da obra elaborou igualmente um estudo de impacto ambiental (a seguir «EIA») e pediu, em 16 de dezembro de 2013, à Agência a aprovação do projeto de desenvolvimento.

27      Na sequência de uma oposição e de uma audição em abril de 2014, foi publicado um relatório de inspeção sobre este pedido em junho de 2014. Nesse relatório, o inspetor concluiu que as informações contidas no referido pedido, o EIA e a DIN não eram adequados e que era necessário um conjunto substancial de informações suplementares. O inspetor solicitou mais informações, nomeadamente sobre a fase de construção, um estudo científico de referência e desenhos à escala nos quais estivesse indicada a localização ou a possível localização de espécies ou habitats protegidos, bem como informações suplementares sobre a opção de «atravessar», que consiste na construção de uma ponte sobre a zona inundável. Não obstante este relatório de inspeção, a autoridade competente tomou a decisão, em julho de 2014, de aprovar o projeto de desenvolvimento.

28      Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, o EIA não aborda em pormenor a opção de «atravessar», uma vez que essa opção foi rejeitada pelo Conselho do condado de Kilkenny «numa fase inicial» a favor de uma «solução financeiramente mais vantajosa». Acrescenta que o EIA também não analisa expressamente o impacto do projeto em causa em todas as espécies que o mesmo identifica.

29      Nestas condições, a High Court (Tribunal Superior, Irlanda) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«[1)]      Se, em virtude da Diretiva [Habitats], uma Declaração de Impacto Natura deve indicar todos os habitats e espécies em relação aos quais o sítio está classificado;

[2)]      Se, em virtude da [Diretiva Habitats], o potencial impacto sobre todas as espécies (e não apenas as espécies protegidas) que contribuem e fazem parte de um habitat protegido deve ser identificado e analisado, numa Declaração de Impacto Natura;

[3)]      Se, em virtude da [Diretiva Habitats], uma Declaração de Impacto Natura deve mencionar expressamente o impacto do projeto proposto nas espécies e nos habitats protegidos situados na [Zona especial de conservação], bem como nas espécies e nos habitats situados fora dos seus limites;

[4)]      Se, em virtude da [Diretiva AIA], conforme alterada, um estudo de impacto ambiental deve indicar expressamente se o projeto proposto terá um impacto significativo nas espécies identificadas no estudo;

[5)]      Se uma solução que o dono da obra tenha considerado e analisado na avaliação de impacto ambiental, e/ou que tenha sido defendida por algumas das partes interessadas, e/ou que tenha sido considerada pela autoridade competente[,] representa uma “principal solução alternativa” na aceção do artigo 5.o, n.o 3, alínea d), da [Diretiva AIA], conforme alterada, mesmo que tenha sido rejeitada pelo dono da obra numa fase inicial;

[6)]      Se, em virtude da [Diretiva AIA], conforme alterada, uma avaliação de impacto ambiental deve conter informações suficientes sobre o impacto ambiental de cada solução alternativa, que permita comparar o interesse no plano ambiental das diferentes soluções alternativas; e/ou se o estudo de impacto ambiental deve indicar expressamente o modo como foram tidos em conta os efeitos no ambiente das soluções alternativas;

[7)]      Se o requisito nos termos do artigo 5.o, n.o 3, alínea d), da [Diretiva AIA], conforme alterada, segundo o qual as razões da escolha do dono da obra devem atender “aos efeitos no ambiente”, se aplica unicamente à opção escolhida, ou também às principais soluções alternativas estudadas, de modo que seja necessária uma análise destas opções para ter em conta os respetivos efeitos no ambiente;

[8)]      Se é compatível com a prossecução dos objetivos da [Diretiva Habitats] o facto de os pormenores da fase de construção (tais como a localização do complexo e as estradas de transporte) poderem ser definidos numa decisão posterior à aprovação e, em caso afirmativo, se uma autoridade competente pode autorizar que estas questões sejam determinadas por decisão unilateral do dono da obra, no âmbito de qualquer concessão de licença de projeto, e notificadas à autoridade competente, em vez de serem aprovadas pela mesma;

[9)]      Se, em virtude da [Diretiva Habitats], a autoridade competente está obrigada a documentar, com um grau de pormenor e clareza suficientes para dissipar quaisquer dúvidas quanto ao significado e aos efeitos de um parecer, em que medida um parecer científico apresentado à mesma autoridade propugna a favor da obtenção de informações suplementares antes da concessão de uma licença de projeto;

[10)]      Se, em virtude da [Diretiva Habitats], a autoridade competente está obrigada a apresentar razões ou razões detalhadas para rejeitar uma conclusão do inspetor segundo a qual são necessárias informações suplementares ou um estudo científico antes da concessão de uma licença de projeto; e

[11)]      Se, em virtude da [Diretiva Habitats], a autoridade competente, quando efetua uma avaliação adequada, deve apresentar razões detalhadas e explícitas relativamente a cada elemento da sua decisão.»

 Quanto às questões prejudiciais

 Quanto à Diretiva Habitats

30      A título preliminar, há que recordar que o artigo 6.o da Diretiva Habitats impõe aos Estados‑Membros uma série de obrigações e de procedimentos específicos destinados a assegurar, conforme resulta do artigo 2.o, n.o 2, dessa diretiva, a manutenção ou, se for caso disso, a reconstituição, num estado de conservação favorável, dos habitats naturais e das espécies de fauna e flora selvagens de interesse para a União, a fim de atingir o objetivo mais geral da referida diretiva que é garantir um alto nível de proteção do ambiente nos sítios por ela protegidos [Acórdão de 17 de abril de 2018, Comissão/Polónia (Floresta de Białowieża), C‑441/17, EU:C:2018:255, n.o 106 e jurisprudência referida].

31      Em especial, o artigo 6.o, n.o 3, da Diretiva Habitats prevê um procedimento de avaliação destinado a garantir, graças a um controlo prévio, que um plano ou projeto não diretamente relacionado com a gestão do sítio em causa, mas suscetível de o afetar de forma significativa, só seja autorizado desde que não afete a integridade desse sítio. A referida disposição prevê assim duas fases. A primeira fase, prevista na primeira frase desta disposição, exige que os Estados‑Membros efetuem uma avaliação adequada das incidências de um plano ou projeto sobre um sítio protegido quando exista a probabilidade de esse plano ou projeto afetar esse sítio de forma significativa. A segunda fase, prevista no artigo 6.o, n.o 3, segunda frase, da Diretiva Habitats, que ocorre após a referida avaliação adequada, sujeita a autorização desse plano ou projeto à condição de este não afetar a integridade do sítio em causa (v., neste sentido, Acórdão de 21 de julho de 2016, Orleans e o., C‑387/15 e C‑388/15, EU:C:2016:583, n.os 43 a 46 e jurisprudência referida).

 Quanto às três primeiras questões

32      Com as suas três primeiras questões, que há que examinar conjuntamente, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 6.o, n.o 3, da Diretiva Habitats deve ser interpretado no sentido de que uma «avaliação adequada» deve, por um lado, indicar a totalidade dos tipos de habitats e de espécies em relação aos quais um sítio é protegido assim como, por outro, identificar e analisar tanto as incidências do projeto proposto sobre as espécies presentes nesse sítio, mas para as quais este não foi classificado, como as incidências sobre os tipos de habitats e de espécies situados fora dos limites do referido sítio.

33      Nos termos do artigo 6.o, n.o 3, da Diretiva Habitats, uma avaliação adequada das incidências de um plano ou projeto sobre o sítio em causa implica que, antes de o mesmo ser aprovado, sejam identificados, tendo em conta os melhores conhecimentos científicos na matéria, todos os aspetos desse plano ou desse projeto que possam, por si só ou em conjugação com outros planos ou projetos, afetar os objetivos de conservação desse sítio. As autoridades nacionais competentes só autorizam uma atividade no sítio protegido se tiverem a certeza de que a mesma não será prejudicial para a integridade desse sítio. Assim acontece quando não subsiste nenhuma dúvida razoável, do ponto de vista científico, quanto à inexistência de tais efeitos (Acórdão de 8 de novembro de 2016, Lesoochranárske zoskupenie VLK, C‑243/15, EU:C:2016:838, n.o 42 e jurisprudência referida).

34      A avaliação efetuada nos termos desta disposição não pode apresentar lacunas e deve incluir constatações e conclusões completas, precisas e definitivas, por forma a dissipar toda e qualquer dúvida cientificamente razoável quanto aos efeitos dos trabalhos projetados no sítio protegido em causa (Acórdão de 25 de julho de 2018, Grace e Sweetman, C‑164/17, EU:C:2018:593, n.o 39 e jurisprudência aí referida).

35      O facto de não prejudicar a integridade de um sítio como habitat natural, na aceção do artigo 6.o, n.o 3, segunda frase, da Diretiva Habitats, pressupõe a sua preservação num estado de conservação favorável, o que implica a manutenção sustentável das características constitutivas desse sítio, ligadas à presença de um tipo de habitat natural, cujo objetivo de preservação justificou a designação desse sítio na lista dos sítios de importância comunitária, na aceção dessa diretiva [Acórdão de 17 de abril de 2018, Comissão/Polónia (Floresta de Białowieża), C‑441/17, EU:C:2018:255, n.o 116 e jurisprudência referida].

36      É à luz destes objetivos de conservação que há que determinar o alcance da obrigação de efetuar uma avaliação adequada das incidências de um plano ou projeto sobre um determinado sítio.

37      Uma vez que, tal como foi salientado nos n.os 33 e 34 do presente acórdão, todos os aspetos que possam afetar esses objetivos devem ser identificados e que a avaliação efetuada deve conter constatações e conclusões completas, precisas e definitivas a esse respeito, há que considerar que a totalidade dos habitats e de espécies para os quais o sítio é protegido devem ser indicados. Com efeito, a não identificação, nessa avaliação, da totalidade dos habitats e das espécies para os quais o sítio foi classificado violaria os requisitos supramencionados e, por conseguinte, como observou, em substância, a advogada‑geral no n.o 31 das suas conclusões, não seria suscetível de dissipar toda e qualquer dúvida razoável, de um ponto de vista científico, quanto à inexistência de efeitos prejudiciais para a integridade do sítio protegido (v., neste sentido, Acórdão de 26 de abril de 2017, Comissão/Alemanha, C‑142/16, EU:C:2017:301, n.o 33).

38      Importa igualmente acrescentar que, devendo a avaliação demonstrar claramente a razão pela qual os tipos de habitats e de espécies protegidos não são afetados, poderá ser suficiente demonstrar, como observou a advogada‑geral no n.o 30 das suas conclusões, que apenas determinados tipos de habitats e de espécies protegidos se encontram na parte da zona protegida em causa no projeto e que não são suscetíveis de ser afetados os outros tipos de habitats e de espécies protegidos presentes no sítio.

39      No que diz respeito aos outros tipos de habitats e de espécies presentes no sítio em relação aos quais este não foi classificado, e aos tipos de habitats e de espécies situados fora desse sítio, importa recordar, conforme resulta da redação do artigo 6.o, n.o 3, da Diretiva Habitats, que esta submete ao mecanismo de proteção ambiental ali previsto «[o]s planos ou projetos não diretamente relacionados com a gestão do sítio e não necessários para essa gestão, mas suscetíveis de afetar esse sítio de forma significativa». A este respeito, conforme salientou a advogada‑geral nos n.os 43 e 48 das suas conclusões, resulta do objetivo de preservação prosseguido pela Diretiva Habitats, recordado no n.o 35 do presente acórdão, que habitats ou espécies típicas devem ser incluídos na avaliação adequada, se forem necessários à preservação dos tipos de habitats e de espécies classificados para a zona protegida.

40      Atendendo ao exposto, há que responder às três primeiras questões que o artigo 6.o, n.o 3, da Diretiva Habitats deve ser interpretado no sentido de que uma «avaliação adequada» deve, por um lado, indicar a totalidade dos tipos de habitats e de espécies em relação aos quais um sítio é protegido, bem como, por outro, identificar e analisar tanto as incidências do projeto proposto sobre as espécies presentes nesse sítio, mas para as quais este não foi classificado, como as incidências sobre os tipos de habitats e de espécies situados fora dos limites do referido sítio, desde que essas incidências sejam suscetíveis de afetar os objetivos de preservação do sítio.

 Quanto à oitava questão

41      Com a sua oitava questão, que importa tratar em segundo lugar, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 6.o, n.o 3, da Diretiva Habitats deve ser interpretado no sentido de que permite à autoridade competente autorizar um plano ou projeto que remeta para uma decisão posterior a tarefa de determinar alguns parâmetros relativos à fase de construção, tais como a localização do complexo de construção e as estradas de transporte, e, em caso afirmativo, se estes parâmetros podem, nessa fase posterior, ser determinados unilateralmente pelo dono da obra e simplesmente notificados à referida autoridade.

42      Há que recordar que resulta do artigo 6.o, n.o 3, da Diretiva Habitats que as autoridades nacionais competentes só autorizarão um plano ou projeto não diretamente relacionado ou necessário para a gestão do sítio, mas suscetível de afetar esse sítio de forma significativa, depois de se terem assegurado, no âmbito de uma avaliação adequada, de que não afetarão a integridade do sítio em causa.

43      Em conformidade com a jurisprudência recordada nos n.os 33 e 34 do presente acórdão, uma avaliação adequada das incidências de um plano ou projeto sobre um sítio protegido implica, em primeiro lugar, antes da aprovação desse plano ou projeto, a identificação de todos os aspetos do referido plano ou do referido projeto que possam afetar os objetivos de conservação desse sítio. Em segundo lugar, essa avaliação não pode ser considerada adequada se apresentar lacunas e não incluir constatações e conclusões completas, precisas e definitivas por forma a dissipar toda e qualquer dúvida cientificamente razoável quanto aos efeitos do plano ou projeto em questão sobre o referido sítio. Em terceiro lugar, todos os aspetos do plano ou projeto em causa que possam, por si só ou em conjugação com outros planos ou projetos, afetar os objetivos de conservação desse mesmo sítio devem ser identificados, tendo em conta os melhores conhecimentos científicos na matéria.

44      De acordo com a redação do artigo 6.o, n.o 3, da Diretiva Habitats, tais obrigações não incumbem ao dono da obra, mesmo quando este seja, como no caso em apreço, uma autoridade pública, mas sim à autoridade competente, a saber, a autoridade que os Estados‑Membros designam para desempenhar as tarefas resultantes desta diretiva.

45      Daqui resulta que esta disposição exige que a autoridade competente indique e avalie todos os aspetos de um plano ou projeto suscetível de afetar os objetivos de conservação do sítio protegido antes da concessão da autorização em causa.

46      Como observou igualmente a advogada‑geral nos n.os 56 e 57 das suas conclusões, só os parâmetros quanto aos quais não existe qualquer dúvida científica de que os seus efeitos não poderão afetar o sítio podem ser inteiramente deixados à decisão posterior do dono da obra.

47      Atendendo ao exposto, há que responder à oitava questão que o artigo 6.o, n.o 3, da Diretiva Habitats deve ser interpretado no sentido de que só permite à autoridade competente autorizar um plano ou projeto que conceda liberdade ao dono da obra para determinar posteriormente certos parâmetros relativos à fase de construção, tais como a localização do complexo de construção e as estradas de transporte, se houver certeza de que a autorização fixa condições suficientemente rigorosas que garantam que esses parâmetros não irão afetar a integridade do sítio.

 Quanto à nona a décima primeira questões

48      Com a nona a décima primeira questões, que há que examinar conjuntamente, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 6.o, n.o 3, da Diretiva Habitats deve ser interpretado no sentido de que, quando a autoridade competente recusa as conclusões de um parecer científico segundo as quais são necessárias informações suplementares, a «avaliação adequada» deve conter uma fundamentação explícita e detalhada suscetível de garantir que, não obstante esse parecer, não há nenhuma dúvida científica razoável quanto às incidências ambientais dos trabalhos previstos no sítio considerado pelas referidas conclusões.

49      Resulta, nomeadamente, da jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa ao artigo 6.o, n.o 3, da Diretiva Habitats, conforme resumida no n.o 43 do presente acórdão, que a avaliação efetuada nos termos do artigo 6.o, n.o 3, da Diretiva Habitats não pode apresentar lacunas e deve incluir constatações e conclusões completas, precisas e definitivas, por forma a dissipar toda e qualquer dúvida cientificamente razoável quanto aos efeitos dos trabalhos projetados no sítio considerado.

50      Ora, na falta de tais conclusões suscetíveis de dissipar toda e qualquer dúvida quanto ao caráter suficiente das informações disponíveis, a avaliação não pode ser considerada «adequada», na aceção do artigo 6.o, n.o 3, da Diretiva Habitats.

51      Em circunstâncias como as que estão em causa no processo principal, o referido requisito implica que a autoridade competente possa indicar suficientemente as razões que lhe permitiram, antes da concessão da autorização, adquirir a certeza, não obstante o parecer do seu inspetor convidando‑a a obter informações suplementares, de que está excluída toda e qualquer dúvida científica razoável quanto às incidências ambientais dos trabalhos previstos no sítio considerado.

52      Tendo em conta as considerações precedentes, há que responder à nona a décima primeira questões que o artigo 6.o, n.o 3, da Diretiva Habitats deve ser interpretado no sentido de que, quando a autoridade competente recusa as conclusões de um parecer científico segundo as quais são necessárias informações suplementares, a «avaliação adequada» deve conter uma fundamentação explícita e detalhada suscetível de dissipar toda e qualquer dúvida científica razoável quanto aos efeitos dos trabalhos projetados no sítio considerado.

 Quanto à Diretiva AIA

53      Embora o pedido de decisão prejudicial se refira às alterações introduzidas pela Diretiva 2014/52, importa salientar que, nos termos do artigo 3.o, n.o 2, desta diretiva, as referidas alterações só são aplicáveis se determinadas etapas processuais tiverem sido cumpridas após 16 de maio de 2017.

54      No processo principal, a decisão impugnada foi adotada em 11 de julho de 2014.

55      Daqui resulta que as questões relativas à Diretiva AIA têm de ser analisadas à luz da versão inicial desta diretiva.

 Quanto à quarta questão

56      Com a sua quarta questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 5.o, n.os 1 e 3, bem como o anexo IV da Diretiva AIA, devem ser interpretados no sentido de que impõem ao dono da obra que forneça informações que avaliem explicitamente os efeitos potencialmente significativos sobre todas as espécies identificadas na declaração apresentada ao abrigo destas disposições.

57      Nos termos do artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva AIA, o dono da obra deve fornecer as informações especificadas no anexo IV desta diretiva. O n.o 3 deste anexo prevê especificamente a este respeito que, entre as informações a que se refere o artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva AIA, figura «[u]ma descrição dos elementos do ambiente suscetíveis de serem consideravelmente afetados pelo projeto proposto, nomeadamente, […] a fauna, a flora […] bem como a inter‑relação entre os fatores mencionados». Por outro lado, o artigo 5.o, n.o 3, alínea c), desta diretiva impõe ao dono da obra que inclua «[o]s dados necessários para identificar e avaliar os principais impactos que o projeto possa ter no ambiente».

58      Como salientou a advogada‑geral nos n.os 84 e 85 das suas conclusões, resulta destas disposições que a referida obrigação não se estende a todas as incidências sobre todas as espécies presentes, antes se limitando aos efeitos significativos, devendo este conceito ser interpretado à luz do artigo 1.o, n.o 1, e do artigo 2.o, n.o 1, da Diretiva AIA, nos termos dos quais devem ser submetidos a uma avaliação dos seus efeitos os projetos suscetíveis de terem um impacto significativo no ambiente.

59      Atendendo ao exposto, há que responder à quarta questão que o artigo 5.o, n.os 1 e 3, bem como o anexo IV da Diretiva AIA, devem ser interpretados no sentido de que impõem ao dono da obra que forneça informações que avaliem explicitamente os efeitos significativos do seu projeto sobre todas as espécies identificadas na declaração apresentada ao abrigo destas disposições.

 Quanto à quinta a sétima questões

60      Com a quinta a sétima questões, que há que examinar conjuntamente, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 5.o, n.o 3, alínea d), da Diretiva AIA deve ser interpretado no sentido de que o dono da obra deve fornecer informações sobre os efeitos no ambiente tanto da solução escolhida como de cada uma das principais soluções alternativas por ele estudadas e as razões da sua escolha atendendo aos seus efeitos no ambiente, mesmo em caso de rejeição de uma dessas soluções alternativas numa fase inicial.

61      Nos termos do seu artigo 3.o, a Diretiva AIA tem, nomeadamente, por objetivo que os efeitos de projetos no ambiente sejam identificados, descritos e avaliados.

62      A este respeito, o artigo 5.o da Diretiva AIA estabelece uma lista das informações, especificadas no anexo IV, que o dono da obra deve fornecer de forma adequada às autoridades competentes, a fim de lhes permitir proceder à avaliação dos efeitos no ambiente do projeto que apresenta.

63      Em especial, o artigo 5.o, n.o 3, alínea d), da Diretiva AIA prevê que o dono da obra deve fornecer, pelo menos, «[u]m resumo das principais soluções alternativas estudadas [por este] e a indicação das principais razões da sua escolha, atendendo aos efeitos no ambiente».

64      Resulta expressamente da redação deste enunciado que incumbe ao dono da obra fornecer às autoridades competentes um resumo das principais soluções alternativas por este estudadas e a indicação das principais razões da sua escolha, atendendo aos efeitos no ambiente.

65      A este respeito, há, antes de mais, que salientar que a Diretiva AIA não contém nenhuma definição do conceito de «principais soluções alternativas», previsto no artigo 5.o, n.o 3, alínea d), da Diretiva AIA. Contudo, há que considerar, à semelhança da advogada‑geral nos n.os 94 e 95 das suas conclusões, que aquilo que é determinante para identificar as soluções alternativas que devem ser consideradas «principais» é a influência dessas soluções sobre os efeitos, ou a falta de efeitos, do projeto no ambiente. Neste contexto, a data em que uma solução de substituição é rejeitada pelo dono da obra é irrelevante.

66      Em seguida, uma vez que, nos termos do artigo 5.o, n.o 3, alínea d), da Diretiva AIA, só um resumo das referidas soluções deve ser fornecido, há que considerar que esta disposição não impõe que as principais alternativas estudadas sejam submetidas a uma avaliação dos efeitos, equivalente à do projeto escolhido. No entanto, exige que o dono da obra indique as razões da sua escolha, pelo menos atendendo aos seus efeitos no ambiente. Com efeito, a obrigação que impende sobre o dono da obra de resumir as principais soluções alternativas tem nomeadamente por objetivo fundamentar a sua escolha.

67      Esta obrigação imposta ao dono da obra permite, subsequentemente, à autoridade competente proceder a uma avaliação exaustiva do impacto ambiental que identifique, descreva e avalie, de modo adequado, os efeitos no ambiente do projeto selecionado, nos termos do artigo 3.o da Diretiva AIA.

68      Por último, importa salientar que o resumo previsto nesta disposição deve ser fornecido para todas as principais soluções alternativas estudadas pelo dono da obra, quer as que tenham sido inicialmente equacionadas por este ou pela autoridade competente quer aquelas que tenham sido defendidas por algumas das partes interessadas.

69      Atendendo ao exposto, há que responder à quinta a sétima questões que o artigo 5.o, n.o 3, alínea d), da Diretiva AIA deve ser interpretado no sentido de que o dono da obra deve fornecer informações sobre os efeitos no ambiente tanto da solução escolhida como de cada uma das principais soluções alternativas por ele estudadas e as razões da sua escolha atendendo, pelo menos, aos seus efeitos no ambiente, mesmo em caso de rejeição de uma dessas soluções alternativas numa fase inicial.

 Quanto às despesas

70      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) declara:

1)      O artigo 6.o, n.o 3, da Diretiva 92/43/CEE do Conselho, de 21 de maio de 1992, relativa à preservação dos habitats naturais e da fauna e da flora selvagens, deve ser interpretado no sentido de que uma «avaliação adequada» deve, por um lado, indicar a totalidade dos tipos de habitats e de espécies em relação aos quais um sítio é protegido, bem como, por outro, identificar e analisar tanto as incidências do projeto proposto sobre as espécies presentes nesse sítio, mas para as quais este não foi classificado, como as incidências sobre os tipos de habitats e de espécies situados fora dos limites do referido sítio, desde que essas incidências sejam suscetíveis de afetar os objetivos de preservação do sítio.

2)      O artigo 6.o, n.o 3, da Diretiva 92/43 deve ser interpretado no sentido de que só permite à autoridade competente autorizar um plano ou projeto que conceda liberdade ao dono da obra para determinar posteriormente certos parâmetros relativos à fase de construção, tais como a localização do complexo de construção e as estradas de transporte, se houver certeza de que a autorização fixa condições suficientemente rigorosas que garantam que esses parâmetros não irão afetar a integridade do sítio.

3)      O artigo 6.o, n.o 3, da Diretiva 92/43 deve ser interpretado no sentido de que, quando a autoridade competente recusa as conclusões de um parecer científico segundo as quais são necessárias informações suplementares, a «avaliação adequada» deve conter uma fundamentação explícita e detalhada suscetível de dissipar toda e qualquer dúvida científica razoável quanto aos efeitos dos trabalhos projetados no sítio considerado.

4)      O artigo 5.o, n.os 1 e 3, bem como o anexo IV da Diretiva 2011/92/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de dezembro de 2011, relativa à avaliação dos efeitos de determinados projetos públicos e privados no ambiente, devem ser interpretados no sentido de que impõem ao dono da obra que forneça informações que avaliem explicitamente os efeitos significativos do seu projeto sobre todas as espécies identificadas na declaração apresentada ao abrigo destas disposições.

5)      O artigo 5.o, n.o 3, alínea d), da Diretiva 2011/92 deve ser interpretado no sentido de que o dono da obra deve fornecer informações sobre os efeitos no ambiente tanto da solução escolhida como de cada uma das principais soluções alternativas por ele estudadas e as razões da sua escolha atendendo, pelo menos, aos seus efeitos no ambiente, mesmo em caso de rejeição de uma dessas soluções alternativas numa fase inicial.

Assinaturas


*      Língua do processo: inglês.