Language of document : ECLI:EU:T:2005:336

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quinta Secção)

22 de Setembro de 2005 (*)

«Regime de associação dos PTU – Açúcar que não beneficia da origem PTU – Pedido de derrogação das regras de origem – Indeferimento do pedido de derrogação – Dever de fundamentação»

No processo T‑101/03,

Suproco NV, com sede em Curaçao (Antilhas Neerlandesas), representada por M. Slotboom e N. J. Helder, advogados,

recorrente,

apoiada por

Reino dos Países Baixos, representado por H. Sevenster, na qualidade de agente,

interveniente,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada por T. van Rijn e X. Lewis, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrida,

apoiada por

Conselho da União Europeia, representado inicialmente por G. Houttuin e M. Bishop e em seguida por G. Houttuin e D. Canga Fano, na qualidade de agentes,

e por

Reino de Espanha, representado por N. Díaz Abad, abogado del Estado, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

intervenientes,

que tem por objecto um pedido de anulação da Decisão 2003/34/CE da Comissão, de 10 de Janeiro de 2003, que recusa o pedido de derrogação à Decisão 2001/822/CE do Conselho, no que respeita às regras de origem aplicáveis ao açúcar das Antilhas Neerlandesas (JO L 11, p. 50),

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Quinta Secção),

composto por: M. Vilaras, presidente, F. Dehousse e D. Šváby, juízes,

secretário: J. Plingers, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 25 de Novembro de 2004,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

1        A sociedade Suproco NV, com sede em Curaçao (Antilhas Neerlandesas), é uma empresa cuja actividade consiste na transformação do açúcar de cana não refinado em açúcar de cana a granel e em pedaços.

2        A partir de 1995, data da sua constituição, a Suproco transformou açúcar de cana originário principalmente dos países da África, das Caraíbas e do Pacífico (ACP) e, acessoriamente, da Comunidade Europeia. Dado que beneficiavam do regime dito «da cumulação de origem», os produtos finais eram considerados originários dos países e territórios ultramarinos (PTU) e podiam, portanto, ser exportados para a Comunidade com isenção de direitos aduaneiros.

3        Tendo em conta as dificuldades de aprovisionamento em matéria‑prima bem como a instituição, pela Comunidade, de medidas de salvaguarda, designadamente, para o açúcar que cumula as origens ACP e PTU, a Suproco iniciou a comercialização de açúcar com base no regime dito «30/70», previsto inicialmente no anexo 2 do anexo II da Decisão 91/442/CEE do Conselho, de 25 de Julho de 1991, relativa à associação dos países e territórios ultramarinos à Comunidade Económica Europeia (JO L 263, p. 1). Este regime permite obter a origem PTU para o açúcar, desde que o valor do açúcar de cana ou da beterraba e da sacarose quimicamente pura, utilizados, qualquer que seja a sua origem, não exceda 30% do preço do produto à saída da fábrica. No âmbito deste regime, a recorrente colorava e aromatizava com melaço o açúcar proveniente da Colômbia.

4        No entanto, o artigo 5.º, n.° 1, alínea g), do anexo III da Decisão 2001/822/CE do Conselho, de 27 de Novembro de 2001, relativa à associação dos países e territórios ultramarinos à Comunidade Europeia (JO L 314, p. 1, a seguir «decisão PTU»), veio precisar que as operações que consistem na «adição de corantes ou formação de açúcar em pedaços» são operações de complemento de fabrico ou de transformação insuficientes para conferir a qualidade de produto originário.

5        Nestas circunstâncias, o Reino dos Países Baixos apresentou, em 20 de Fevereiro de 2002, um pedido de derrogação à Comissão, com base no artigo 37.º do anexo III da decisão PTU. Mais precisamente, pediu a concessão de uma derrogação para uma quantidade anual de 3 000 toneladas, em benefício da Suproco, incluída no âmbito do contingente anual de 28 000 toneladas de açúcar que beneficiava da cumulação de origem ACP/PTU/CE, prevista no artigo 6.º, n.° 4, do anexo III da decisão PTU.

6        Por carta datada de 13 de Maio de 2002, dando seguimento a questões submetidas pela Comissão e às primeiras discussões do comité do código aduaneiro, o Reino dos Países Baixos indicou que retirava o seu pedido até nova ordem, e isto de modo a efectuar averiguações complementares quanto às possibilidades de abastecimento da recorrente em açúcar ACP.

7        Em 4 de Outubro de 2002, na sequência das averiguações complementares realizadas, o Reino dos Países Baixos enviou uma carta à Comissão para «reactivar» o pedido de derrogação.

8        Em 10 de Janeiro de 2003, a Comissão adoptou a Decisão 2003/34/CE, que recusa o pedido de derrogação à Decisão 2001/822/CE do Conselho, no que respeita às regras de origem aplicáveis ao açúcar das Antilhas Neerlandesas (JO L 11, p. 50, a seguir «decisão recorrida»).

 Tramitação processual e pedidos das partes

9        Por petição entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 14 de Março de 2003, a recorrente interpôs o presente recurso.

10      Através de despacho do presidente da Terceira Secção do Tribunal de Primeira Instância, de 18 de Setembro de 2003, o Conselho e o Reino de Espanha foram admitidos a intervir em apoio dos pedidos da recorrida e o Reino dos Países Baixos foi admitido a intervir em apoio dos pedidos da recorrente. Esta última pediu, nos termos do n.° 2 do artigo 116.° do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, que determinados elementos confidenciais, contidos na réplica, fossem excluídos da comunicação aos intervenientes. A recorrente entregou uma versão não confidencial da réplica e a comunicação dos actos processuais aos intervenientes limitou‑se a esta versão não confidencial. Os intervenientes não suscitaram objecções a este respeito e entregaram os respectivos articulados no prazo que lhes foi fixado para o efeito.

11      Com base no relatório do juiz‑relator, o Tribunal de Primeira Instância (Quinta Secção) decidiu dar início à fase oral. No âmbito das medidas de organização do processo, a Suproco, a Comissão e o Reino dos Países Baixos foram convidados a apresentar documentos.

12      Foram ouvidas as alegações e as respostas das partes às questões submetidas pelo Tribunal de Primeira Instância na audiência pública de 25 de Novembro de 2004. A Comissão foi convidada a responder, por escrito, a uma questão suplementar, o que fez no prazo fixado. A Suproco apresentou as suas observações relativas à resposta dada pela Comissão e apresentou uma versão não confidencial das mesmas. A comunicação das observações da Suproco aos intervenientes limitou‑se a esta versão não confidencial. Os intervenientes não suscitaram objecções a este respeito. A fase oral foi encerrada em 25 de Janeiro de 2005.

13      A Suproco conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–        julgar o seu recurso procedente;

–        anular a decisão recorrida;

–        condenar a Comissão nas despesas;

14      A Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar a Suproco nas despesas;

15      O Conselho conclui pedindo que o Tribunal se digne acolher os pedidos da Comissão.

16      O Reino de Espanha conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–        declarar inadmissível a excepção de ilegalidade suscitada no que respeita ao artigo 5.º, n.° 1, alínea g), do anexo III da decisão PTU e, subsidiariamente, julgá‑la improcedente;

–        negar provimento ao recurso interposto da decisão recorrida;

–        condenar a Suproco nas despesas.

17      O Reino dos Países Baixos conclui pedindo que o Tribunal se digne anular a decisão recorrida.

 Questão de direito

18      A Suproco invoca três fundamentos em apoio do seu recurso. O primeiro fundamento, apresentado a título principal, refere‑se a uma excepção de ilegalidade invocada no que respeita ao artigo 5.º, n.° 1, alínea g), do anexo III da decisão PTU. O segundo fundamento, invocado subsidiariamente, denuncia a incompetência da Comissão. O terceiro fundamento, apresentado a título ainda mais subsidiário, refere‑se a uma violação do artigo 37.º do anexo III da decisão PTU, bem como numa apreciação errada dos factos.

19      Há que referir, antes de mais, que a decisão recorrida é uma decisão na acepção do artigo 249.º, quarto parágrafo, CE e deve, portanto, ser fundamentada, por força do artigo 253.º CE. A falta ou a insuficiência de fundamentação consubstancia uma violação das formalidades essenciais e constitui um fundamento de ordem pública que é de conhecimento oficioso do juiz comunitário (acórdão do Tribunal de Justiça de 2 de Abril de 1998, Comissão/Sytraval e Brink’s France, C‑367/95 P, Colect., p. I‑1719, n.° 67, e acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 12 de Julho de 2001, UK Coal/Comissão, T‑12/99 e T‑63/99, Colect., p. II‑2153, n.° 199).

20      Segundo jurisprudência assente, a fundamentação exigida pelo artigo 253.° CE deve ser adaptada à natureza do acto em causa e deixar transparecer, de forma clara e inequívoca, o raciocínio da instituição autora do acto, por forma a permitir aos interessados conhecerem as razões da medida adoptada e à jurisdição competente exercer a sua fiscalização. A exigência de fundamentação deve ser apreciada em função das circunstâncias do caso concreto, designadamente do conteúdo do acto, da natureza dos fundamentos invocados e do interesse que os destinatários ou outras pessoas, a quem o acto diga directa e individualmente respeito, possam ter em obter explicações. Não é exigido que a fundamentação especifique todos os elementos de facto e de direito pertinentes, na medida em que a questão de saber se a fundamentação de um acto preenche os requisitos do artigo 253.° CE deve ser apreciada à luz não somente do seu teor mas também do seu contexto e do conjunto das normas jurídicas que regem a matéria em causa (acórdãos do Tribunal de Justiça, Comissão/Sytraval e Brink’s France, referido no n.° 19, supra, n.° 63; de 30 de Setembro de 2003, Alemanha/Comissão, C‑301/96, Colect., p. I‑9919, n.° 87; e de 22 de Junho de 2004, Portugal/Comissão, C‑42/01, Colect., p. I‑6079, n.° 66).

21      No caso vertente, há que referir, em primeiro lugar, que o pedido de derrogação apresentado pelo Reino dos Países Baixos, nos termos do artigo 37.º do anexo III da decisão PTU, se baseia num determinado número de factos e de dados económicos comunicados à Comissão. Em especial, o Reino dos Países Baixos preencheu o formulário constante do apêndice 7 do anexo III da decisão PTU, a que se refere o artigo 37.º, n.° 2, do anexo III da decisão PTU. Este formulário, tal como completado pelas autoridades neerlandesas, continha informações relativas aos custos de produção e ao valor acrescentado ao produto pela utilização de matéria‑prima originária da Colômbia. Há que salientar que a Comissão, na decisão recorrida, não alegou a insuficiência dos dados comunicados pelo Reino dos Países Baixos. Por conseguinte, considerou que dispunha de todos os elementos exigidos pelo artigo 37.º, n.° 2, do anexo III da decisão PTU.

22      Em segundo lugar, há que referir que o Reino dos Países Baixos, enquanto requerente da derrogação, e a Suproco, enquanto beneficiária da derrogação se esta tivesse sido concedida, tinham interesse em receber explicações da Comissão.

23      Em terceiro lugar, há que referir que a decisão recorrida se baseia no artigo 37.º do anexo III da decisão PTU e, em especial, nos seus n.os 4 e 7, referidos, respectivamente, no primeiro e no oitavo considerando, para indeferir o pedido de derrogação apresentado pelo Reino dos Países Baixos.

24      Nos termos do artigo 37.º, n.° 4, do anexo III da decisão PTU, em qualquer caso, terá de se examinar se as regras de cumulação de origem permitem resolver o problema. Isto significa que se as regras de cumulação de origem permitem resolver o problema, a Comissão pode indeferir o pedido de derrogação.

25      Quanto ao artigo 37.º, n.° 7, do anexo III da decisão PTU, este dispõe que «[s]em prejuízo dos n.os 1 a 6, será concedida derrogação, quando o valor acrescentado aos produtos não originários utilizados no PTU interessado for de, pelo menos, 45% do valor do produto acabado, desde que a derrogação não seja susceptível de causar um prejuízo grave a um sector económico da Comunidade ou de um ou mais dos seus Estados‑Membros». A utilização dos termos «sem prejuízo» significa que a regra deste artigo 7.º mantém integralmente aplicáveis os n.os 1 a 6 do artigo 37.º do anexo III da decisão PTU. Em especial, mesmo na hipótese abrangida pelo artigo 37.º, n.° 7, do anexo III da decisão PTU, a Comissão está obrigada, por força do artigo 37.º, n.° 4, desse mesmo anexo, a examinar se as regras relativas à cumulação de origem permitem resolver o problema. Se for esse o caso, tal como foi acima indicado, a Comissão pode indeferir o pedido de derrogação. Seja como for, quer a Comissão decida aplicar, ou não, o artigo 37.º, n.° 7, do anexo III da decisão PTU, os fundamentos que apoiam a sua decisão devem ser expressos de forma suficientemente clara.

26      À luz das considerações expostas, há que analisar se a fundamentação da decisão recorrida cumpre, no caso vertente, os requisitos do artigo 253.º CE.

27      A decisão recorrida é constituída por nove considerandos e uma parte decisória, que inclui dois artigos, concluindo pelo indeferimento do pedido de derrogação.

28      O primeiro considerando precisa o contexto jurídico do pedido de derrogação apresentado pelo Reino dos Países Baixos, mencionando, em especial, o artigo 37.º, n.os 1 e 4, do anexo III da decisão PTU.

29      O segundo considerando recorda o objecto do pedido de derrogação apresentado inicialmente pelo Reino dos Países Baixos em 20 de Fevereiro de 2002.

30      O terceiro considerando indica que o Reino dos Países Baixos retirou esse pedido em 13 de Maio de 2002.

31      O quarto considerando indica que «os produtores de açúcar de cinco Estados ACP diferentes se haviam recusado, em Maio e Junho de 2002, a abastecer o produtor em questão com as quantidades de açúcar solicitadas, enquanto um produtor de açúcar na Guiana estava disposto a abastecer essa empresa, mas pedia um preço muito superior [450 dólares americanos (USD)/tonelada FOB Georgetown] ao preço do açúcar colombiano (275 dólares USD/tonelada franco entreposto do cliente)». Estas informações foram transmitidas à Comissão pelo Reino dos Países Baixos, em 4 de Outubro de 2002.

32      O quinto considerando indica que o Reino dos Países Baixos alega que os custos da mão-de-obra e os encargos nas Antilhas se elevam a 1 095 570 EUR para 3 000 toneladas de produtos acabados, tendo estes últimos um valor de 3 241 200 EUR. Estes dados resultam do formulário junto ao pedido de derrogação.

33      O sexto considerando precisa que o exame das informações fornecidas demonstra que o valor acrescentado da transacção é superior a 45% do preço à saída da fábrica do produto acabado, tanto no caso de fornecimento de açúcar da Colômbia como de açúcar da Guiana. A afirmação relativa ao valor acrescentado ao açúcar da Guiana resulta de um cálculo efectuado pela Comissão, com base nos dados comunicados pelo Reino dos Países Baixos.

34      O sétimo considerando recorda que a Suproco beneficiou, nos limites do contingente anual de 28 000 toneladas aberto para 2002, de uma licença de importação para uma quantidade de 6 222 toneladas. Esta informação foi comunicada pelo Reino dos Países Baixos à Comissão, na sua carta de 4 de Outubro de 2002.

35      Daí resulta que, embora o primeiro considerando da decisão recorrida recorde determinadas disposições do anexo III da decisão PTU e o segundo considerando, o objecto do pedido de derrogação, os terceiro a sétimo considerandos limitam‑se a retomar elementos de facto avançados pelo Reino dos Países Baixos (terceiro a quinto e sétimo considerando) ou determinados com base em informações por ele transmitidas (sexto considerando). Quanto ao nono considerando, ele indica que as medidas previstas na decisão recorrida estão conformes com o parecer do comité do código aduaneiro.

36      É no oitavo considerando da decisão recorrida que está expressa a fundamentação jurídica do indeferimento, pela Comissão, do pedido de derrogação apresentado pelo Reino dos Países Baixos.

37      O oitavo considerando dispõe que, «[t]endo em conta todos estes elementos, a derrogação solicitada não se justifica nos termos do n.° 1 do artigo 37.º do anexo III. As informações fornecidas demonstraram que as regras aplicadas à cumulação de origem podem trazer uma solução ao problema. Não foi fornecida nenhuma informação que indicasse que a utilização do açúcar da Guiana era não rentável ao ponto de levar o produtor a cessar a sua actividade. Além disso, dado que o valor acrescentado resultante da operação no caso de entrega do açúcar colombiano como do açúcar da Guiana é superior a 45% do preço à saída da fábrica do produto acabado, não é aplicável o n.º 7 do artigo 37.º».

38      O segundo período desse considerando diz respeito à aplicação do artigo 37.º, n.° 4, do anexo III da decisão PTU, uma vez que indica que as regras relativas à cumulação de origem permitem resolver o problema. No entanto, a afirmação categórica e sucinta contida neste período não se baseia numa fundamentação precisa.

39      Em especial, a afirmação do segundo período do oitavo considerando não é suficientemente justificada no terceiro período do mesmo considerando.

40      Os termos empregues nesse terceiro período indicam que foi provavelmente efectuado pela Comissão um cálculo da rentabilidade em caso de utilização de açúcar da Guiana. Tal cálculo era, além disso, necessário para apreciar se as regras em matéria de cumulação de origem permitiam resolver o problema com que a Suproco deparou. No entanto, nem o método empregue pela Comissão para efectuar tal cálculo nem mesmo o simples resultado deste cálculo constam da decisão recorrida. Também não resulta dos documentos do processo que esse método ou esse resultado fossem conhecidos do Reino dos Países Baixos e, a fortiori, da Suproco, durante o procedimento administrativo. Mesmo supondo que o cálculo em questão pudesse ser deduzido dos diferentes elementos contidos nos outros considerandos da decisão recorrida, tal cálculo continuaria impreciso, tendo em conta a conversão monetária a efectuar. Com efeito, os preços do açúcar da Guiana, mencionados no quarto considerando da decisão recorrida, são expressos em dólares americanos (USD), ao passo que os dados económicos retomados no quinto considerando da decisão recorrida são expressos em euros. Ora, nem a decisão recorrida nem os documentos do processo relativos ao procedimento administrativo referem a taxa de câmbio que foi utilizada pela Comissão.

41      Por outro lado, o terceiro período do oitavo considerando não explica por que razão uma empresa que se dedica a uma actividade «não rentável» (ou «antieconómica», segundo outras versões linguísticas da decisão recorrida) poderia decidir, apesar de tudo, prosseguir a sua produção.

42      Resulta desses elementos que não é possível determinar de forma suficientemente clara a fundamentação que levou a Comissão a concluir que as regras em matéria de cumulação de origem permitiam resolver o problema e que a utilização de açúcar da Guiana não levaria à cessação da actividade do produtor. Nestas condições, a fundamentação da decisão recorrida, a este respeito, não permite que o Tribunal de Primeira Instância exerça a sua fiscalização.

43      Essa fundamentação também não permite ao Reino dos Países Baixos e à Suproco conhecerem as justificações da medida adoptada e defenderem os seus direitos no Tribunal de Primeira Instância. Quanto a este ponto, há que referir que a Suproco invoca, na sua petição, um fundamento relativo à violação do artigo 37.º, n.° 3, alínea b), do anexo III da decisão PTU, fundamento defendido pelo Reino dos Países Baixos no seu articulado de intervenção. Em especial, a Suproco entende que a Comissão violou essa disposição na medida em que considerou que a cessação da actividade era uma condição essencial para a concessão da derrogação. Ora, é difícil determinar, ao ler a decisão recorrida, se o artigo 37.º, n.° 3, alínea b), do anexo III da decisão PTU foi aplicado ou não pela Comissão, designadamente, à luz da afirmação que consta do seu oitavo considerando, segundo a qual a utilização do açúcar da Guiana não levaria o produtor a cessar a sua actividade.

44      Além disso, há que referir que a fundamentação contida no último período do oitavo considerando da decisão recorrida, relativo ao artigo 37.º, n.° 7 do anexo III da decisão PTU, também não cumpre os requisitos do artigo 253.º CE.

45      Sem que haja necessidade de apreciar a possível aplicação, ao caso vertente, do artigo 37.º, n.° 7, do anexo III da decisão PTU, basta referir que o método de cálculo utilizado pela Comissão relativamente ao valor acrescentado ao açúcar da Guiana não é identificável na decisão recorrida e que a Comissão forneceu resultados diferentes deste cálculo nos seus articulados (n.° 35 da contestação), na audiência (na sequência de uma questão colocada pelo Tribunal de Primeira Instância) e após a audiência (no âmbito de uma resposta escrita de 6 de Dezembro de 2004 a uma questão colocada pelo Tribunal de Primeira Instância).

46      A esse respeito, resulta das explicações dadas pela Comissão que, para calcular, no valor do produto acabado, a percentagem da parte do valor acrescentado (entendido como o preço à saída de fábrica dos produtos, reduzido do valor aduaneiro das matérias importadas de países terceiros para a Comunidade, para os Estados ACP ou para os PTU) ao açúcar importado, a taxa de câmbio aplicável foi a que estava em vigor em 4 de Outubro de 2002, ou seja, 1 USD para 1,0111 EUR. Portanto, a Comissão admite, na sua resposta escrita, ter aplicado uma taxa de câmbio diferente, 1 USD para 1 EUR, para calcular o valor aduaneiro do açúcar importado. Além disso, esta última taxa de câmbio foi utilizada num cálculo realizado a partir de um montante (3 241 200 EUR) resultante de uma conversão efectuada segundo uma terceira taxa de câmbio (1 USD para 1,1505 EUR, em vigor em 20 de Fevereiro de 2002). Além disso, este montante de 3 241 200 EUR, que a decisão recorrida afirma, sem mais explicações, representar o valor dos produtos acabados, corresponde não ao preço à saída de fábrica dos produtos mas a este preço acrescido das despesas de entrega aos compradores.

47      Por outro lado, resulta dos documentos que a Comissão entende que um montante de 37,2 USD por tonelada para as despesas de transporte do açúcar importado se justifica para calcular o valor acrescentado ao açúcar da Guiana, considerando que o montante de 85 USD por tonelada, avançado pelo Reino dos Países Baixos na sua carta de 4 de Outubro de 2002, é excessivo. Ora, este montante de 37,2 USD por tonelada não consta da decisão recorrida. Também não resulta dos documentos do processo relativos ao procedimento administrativo que este montante fosse conhecido do Reino dos Países Baixos e, a fortiori, da Suproco.

48      Nestas condições, a fundamentação do último período do oitavo considerando da decisão recorrida também não permite ao Reino dos Países Baixos nem à Suproco defenderem os seus direitos no Tribunal de Primeira Instância e a este último exercer a sua fiscalização.

49      Por todas as considerações expostas, há que considerar que a decisão recorrida não cumpre os requisitos do artigo 253.º CE e que, portanto, deve ser anulada por esse motivo, sem que seja necessário analisar os fundamentos de mérito invocados pela Suproco no seu recurso.

 Quanto às despesas

50      Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a Comissão sido vencida, há que condená‑la nas despesas, de acordo com o pedido da Suproco.

51      Além disso, nos termos do artigo 87.°, n.° 4, do Regulamento de Processo, os Estados‑Membros e as instituições que intervierem no processo devem suportar as respectivas despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quinta Secção)

decide:

1)      É anulada a Decisão 2003/34/CE da Comissão, de 10 de Janeiro de 2003, que recusa o pedido de derrogação à Decisão 2001/822/CE do Conselho, no que respeita às regras de origem aplicáveis ao açúcar das Antilhas Neerlandesas.

2)      A Comissão suportará as suas próprias despesas e as da Suproco.

3)      O Conselho, o Reino de Espanha e o Reino dos Países Baixos suportarão as suas próprias despesas.

Vilaras

Dehousse

Šváby

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 22 de Setembro de 2005.

O secretário

 

       O presidente

H. Jung

 

       M. Vilaras


* Língua do processo: neerlandês.