Language of document : ECLI:EU:T:2016:406

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Oitava Secção)

14 de julho de 2016 (*)

«Auxílios de Estado — Setor postal — Financiamento dos sobrecustos salariais e sociais relativos a uma parte do pessoal da Deutsche Post mediante subvenções e receitas obtidas com a remuneração dos serviços de tarifas reguladas — Decisão que declara o auxílio incompatível com o mercado interno — Conceito de vantagem — Acórdão ‘Combus’ — Demonstração da existência de uma vantagem económica e seletiva — Inexistência»

No processo T‑143/12,

República Federal da Alemanha, representada inicialmente por T. Henze e K. Petersen, e em seguida por T. Henze e K. Stranz, na qualidade de agentes, assistidos por U. Soltész, advogado,

recorrente,

contra

Comissão Europeia, representada por D. Grespan, T. Maxian Rusche e R. Sauer, na qualidade de agentes,

recorrida,

que tem por objeto um pedido nos termos do artigo 263.° TFUE e destinado a obter a anulação dos artigos 1.° e 4.° a 6.° da Decisão 2012/636/UE da Comissão, de 25 de janeiro de 2012, relativa à medida C 36/07 (ex NN 25/07) da Alemanha em favor da Deutsche Post AG (JO 2012, L 289, p. 1),

O TRIBUNAL GERAL (Oitava Secção),

composto por: D. Gratsias, presidente, M. Kancheva e C. Wetter (relator), juízes,

secretário: S. Bukšek Tomac, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 10 de dezembro de 2015,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

1        A República Federal da Alemanha, recorrente no presente processo, dotou‑se em 1950 de uma instituição postal, a Deutsche Bundespost, cujo estatuto era o de «ativo especial do Estado», o que, nos termos do direito administrativo alemão, não a dotava de personalidade jurídica, mas, todavia, lhe permitia dispor de orçamento próprio e não ter de responder pelas dívidas gerais do Estado. O § 15 da Gesetz über die Verwaltung der Deutschen Bundespost (Lei alemã sobre a organização dos correios) de 24 de julho de 1953 (BGBl. 1953 I, p. 676) proibia, em princípio, a concessão de subvenções do Orçamento do Estado à Deutsche Bundespost.

2        Posteriormente, a Haushaltsgrundsätzegesetz (Lei relativa aos princípios do direito orçamental), de 19 de agosto de 1969 (BGBl. 1969 I, p. 1273), confirmou a existência de orçamento e contabilidade próprios da Deutsche Bundespost.

3        Em 1989, a República Federal da Alemanha procedeu a uma primeira reforma da importância da Deutsche Bundespost. Esta reforma foi feita mediante duas leis, a Gesetz über die Unternehmensverfassung der Deutschen Bundespost (Lei relativa à gestão empresarial da Deutsche Bundespost), de 8 de junho de 1989 (BGBl. 1989 I, p. 1026), e a Gesetz über das Postwesen (Lei do sistema postal), de 3 de julho de 1989 (BGBl. 1989 I, p. 1450). Esta reforma não conferiu personalidade jurídica à Deutsche Bundespost, mas cindiu o ativo especial do Estado que esta constituía em três entidades distintas que se lhe substituíram, sempre como ativos especiais do Estado, ou seja, sem personalidade jurídica de pessoa coletiva, apesar de serem qualificadas de «empresas públicas». Tratava‑se da Postdienst (atividade postal), da Postbank (atividade bancária) e da Telekom (atividade de telecomunicações).

4        Segundo o § 37, n.os 2 e 3, da Lei relativa à gestão empresarial da Deutsche Bundespost, cada uma destas três entidades devia financiar os respetivos custos inteiramente com receitas próprias, mas era permitido o financiamento cruzado entre as três empresas na medida em que os prejuízos resultassem das obrigações de serviço universal. Além disso, o § 54, n.° 2, da Lei relativa à gestão empresarial da Deutsche Bundespost impunha à Postdienst, à Postbank e à Telekom a obrigação de financiarem integralmente as pensões de reforma e os reembolsos das despesas de saúde dos funcionários aposentados que tinham sido anteriormente funcionários da Deutsche Bundespost. A repartição deste encargo entre as três entidades foi efetuada com base na natureza das atividades anteriores de cada funcionário aposentado. Quanto aos funcionários ainda em funções, esta última disposição garantia‑lhes direitos perante o Estado federal, sem prejuízo da possibilidade de este último exigir da Postdienst, da Postbank e da Telekom o pagamento da totalidade do montante correspondente a esses direitos.

5        Em 7 de julho de 1994, a UPS Europe NV/SA (a seguir «UPS») apresentou uma denúncia à Comissão das Comunidades Europeias, alegando que a República Federal da Alemanha tinha atribuído auxílios ilegais à Postdienst.

6        Teve também lugar em 1994 a segunda reforma importante do sistema postal alemão, primeiro pelo Verordnung zur Regelung der Pflichtleistungen der Deutschen Bundespost Postdienst (Regulamento das prestações obrigatórias da atividade postal dos correios alemães), de 12 de janeiro de 1994 (BGBl. 1994 I, p. 86, a seguir «regulamento das prestações obrigatórias»), depois por duas leis da mesma data, a Gesetz zum Personalrecht der Beschäftigten der früheren Deutschen Bundespost (Lei laboral aplicável ao pessoal dos antigos correios alemães), de 14 de setembro de 1994 (BGBl. 1994 I, p. 2325, a seguir «lei relativa ao estatuto dos trabalhadores dos correios»), e a Gesetz zur Umwandlung von Unternehmen der Deutschen Bundespost in die Rechtsform der Aktiengesellschaft (Lei relativa à transformação da empresa dos correios alemães em sociedade anónima), de 14 de setembro de 1994 (BGBl. 1994 I, p. 2325).

7        O regulamento das prestações obrigatórias atribuía à Postdienst, na qualidade de prestadora do serviço universal, a função de transportar as cartas e encomendas com peso não superior a 20 kg e de prestar os serviços correspondentes na totalidade do território alemão, a preços uniformes. Esta obrigação manteve‑se inalterada quando, em aplicação da Lei relativa à transformação da empresa dos correios alemães em sociedade anónima, a Postdienst se tornou Deutsche Post AG, enquanto a Postbank e a Telekom assumiam igualmente a forma jurídica de sociedades anónimas, a partir de 1 de janeiro de 1995.

8        O § 1, n.° 1, da lei relativa ao estatuto dos trabalhadores dos correios previa que a Deutsche Post assumia todos os direitos e obrigações do Estado federal enquanto empregador. Em aplicação deste princípio, o artigo 2.°, n.° 1, da mesma lei especificava que os funcionários que tinham sido contratados pela Postdienst passariam para a Deutsche Post, que mantinha o seu estatuto jurídico e os respetivos direitos pecuniários ((§ 2, n.° 3, da lei relativa ao estatuto dos trabalhadores dos correios). No que respeita às pensões de reforma dos funcionários e ao reembolso dos cuidados de saúde dos funcionários aposentados, foi criado um fundo de pensões para os funcionários da Deutsche Post, em conformidade com o § 15 desta mesma lei. No que respeita aos compromissos assumidos pela Deutsche Bundespost, e posteriormente por cada uma das três entidades que lhe sucederam na qualidade de ativo especial do Estado, o § 2, n.° 2, da Lei relativa à transformação da empresa dos correios alemães em sociedade anónima imputou‑os integralmente à Telekom. Esta mesma disposição previa, em contrapartida, a possibilidade de a Telekom intentar uma ação de repetição contra a Postdienst e a Postbank. No entanto, o § 7 da referida lei, em derrogação do disposto no § 2, n.° 2, supramencionado, extinguiu os direitos da Telekom quanto ao exercício desta ação relativamente aos créditos no montante dos prejuízos acumulados da Postdienst em 31 de dezembro de 1994. Esta extinção de dívidas implicou uma transferência de ativos do mesmo montante para a Deutsche Post.

9        A Lei relativa à transformação da empresa dos correios alemães em sociedade anónima tinha igualmente previsto que o Estado federal garantiria todos os compromissos assumidos pela Deutsche Bundespost antes de 1995 e posteriormente transferidos para a Postdienst ou para uma das duas entidades criadas em 1989. Em contrapartida, o Estado federal não se assumiu garante para os títulos emitidos pela Deutsche Post a partir de 1 de janeiro de 1995.

10      A lei relativa ao estatuto dos trabalhadores dos correios tinha igualmente previsto uma repartição dos encargos entre o Estado federal e a Deutsche Post quanto aos montantes a atribuir anualmente ao fundo de pensões criado pelo § 15 da referida lei. Assim, o § 16 desta última previa, para o período compreendido entre 1 de janeiro de 1995 e 31 de dezembro de 1999, o pagamento pela Deutsche Post de um montante fixo anual de 2 045 milhões de euros. A partir de 1 de janeiro de 2000, este montante fixo anual foi substituído por um montante correspondente a 33% do total das remunerações dos funcionários empregados pela Deutsche Post. Tanto num caso como no outro, resultava deste mesmo § 16 que o saldo dos custos das pensões seria suportado pelo Estado federal (desde 1 de janeiro de 1995).

11      Em 1997, a Postgesetz (Lei postal), de 22 de dezembro de 1997 (BGBl. 1997 I, p. 3294), veio completar o regulamento das prestações obrigatórias e, em especial, prolongar as missões que incumbiam à Deutsche Post no âmbito do serviço universal. O § 11 da Lei postal definia o serviço universal como consistindo, designadamente, no transporte das cartas, encomendas com menos de 20 kg, livros, catálogos, jornais e revistas com um peso máximo de 200 g; o § 52 da referida lei prorrogava o mandato da Deutsche Post relativo ao fornecimento do serviço universal até 31 de dezembro de 2007, isto é, até à data de termo da licença exclusiva de que esta dispunha quanto aos serviços de correio. O limite de peso no que respeita às cartas e catálogos foi progressivamente reduzido entre 1 de janeiro de 1998, data de entrada em vigor da Lei postal, e a data em que terminou a licença exclusiva, atingindo finalmente 50 g.

12      O ano de 1997 é igualmente um ano decisivo na gestão pela Deutsche Post do seu pessoal, porque os agentes contratuais recrutados antes dessa data beneficiaram não só do regime de segurança social obrigatório mas também da possibilidade de dispor de um seguro de reforma complementar que lhes permita alcançar um nível de pensão de reforma equiparável aos dos funcionários aposentados da Deutsche Post. Até 1997, a pensão complementar dos agentes contratuais foi financiada pela Deutsche Post com base numa contribuição compreendida entre 5% e 10% do salário bruto de um agente contratual em atividade. A partir dessa data, a Deutsche Post, por um lado, constituiu provisões para cobrir as eventuais obrigações no que respeita aos pagamentos que devam ser efetuados à caixa de previdência da Deutsche Bundespost e, por outro, concedeu uma pensão complementar de reforma de menor valor ao pessoal contratado de novo, que financiou com base numa contribuição compreendida entre 0% e 5% do salário bruto de um agente contratual em atividade.

13      Na sequência de uma denúncia da UPS, a Comissão decidir dar início, em 17 de agosto de 1999, a um procedimento formal de investigação contra a República Federal da Alemanha relativamente a diversos auxílios concedidos à Postdienst e, posteriormente, à Deutsche Post (a seguir «decisão de abertura do procedimento de 1999»). Entre estas medidas figuravam, em primeiro lugar, garantias estatais por força das quais a República Federal da Alemanha garantia as dívidas contraídas pela Deutsche Bundespost antes da sua transformação em três sociedades anónimas, em segundo lugar, a existência de um financiamento público das pensões dos funcionários da Postdienst e da Deutsche Post (a seguir «financiamento público das pensões») e, em terceiro lugar, um eventual apoio financeiro do Estado a favor da Deutsche Post. Por carta de 16 de setembro de 1996, a República Federal da Alemanha apresentou as suas observações e facultou as informações solicitadas. A decisão de abertura do procedimento de 1999 foi publicada em 23 de outubro de 1999 no Jornal Oficial das Comunidades Europeias.

14      Após a publicação da decisão de abertura do procedimento de 1999, catorze interessados apresentaram observações, que a Comissão transmitiu à República Federal da Alemanha em 15 de dezembro de 1999. Esta última respondeu por carta de 1 de fevereiro de 2000.

15      Pela Decisão 2002/753/CE, de 19 de junho de 2002, relativa a medidas adotadas pela República Federal da Alemanha a favor da Deutsche Post AG (JO 2002, L 247, p. 27), a Comissão considerou que este Estado‑Membro tinha concedido à Deutsche Post um auxílio de 572 milhões de euros, incompatível com o mercado comum, graças ao qual aquela tinha podido cobrir os prejuízos causados por uma política de descontos no que respeita ao serviço de transporte de encomendas porta a porta aberto à concorrência.

16      A Decisão 2002/753 levou as autoridades alemãs a recuperarem da Deutsche Post o montante de 572 milhões de euros. Em 4 de setembro de 2002, a Deutsche Post interpôs no Tribunal Geral um recurso de anulação da referida decisão (processo T‑266/02).

17      De 1 de janeiro de 2003 a 31 de dezembro de 2007, a Bundesnetzagentur (Regulador postal, Alemanha), criada pela Lei postal, fixou os preços máximos para um conjunto de prestações correspondente às que eram objeto das tarifas reguladas do correio.

18      Em 13 de maio de 2004, a UPS apresentou uma nova denúncia à Comissão, alegando que, por um lado, esta, na Decisão 2002/753, não tinha examinado todas as medidas enumeradas na denúncia apresentada em 7 de julho de 1994 e que, por outro, tinham sido concedidos auxílios ilegais posteriormente à adoção dessa decisão.

19      Em 16 de julho de 2004, a TNT Post AG & Co. KG também apresentou uma denúncia à Comissão, com o fundamento de que a Deutsche Post faturava as prestações destinadas à Postbank a preços muto baixos, pagando esta última unicamente os custos variáveis dos serviços prestados.

20      Em novembro de 2004 e abril de 2005, a Comissão dirigiu pedidos de informações à República Federal da Alemanha, respeitantes tanto à denúncia apresentada em 13 de maio de 2004 pela UPS como à apresentada em 16 de julho de 2004 pela TNT Post, tendo aquela respondido em dezembro de 2004 e em junho de 2005.

21      Por carta de 12 de setembro de 2007, a Comissão notificou a República Federal da Alemanha da sua decisão de dar início ao procedimento previsto no artigo 88.°, n.° 2, CE, no que respeita ao auxílio de Estado concedido pelas autoridades alemãs a favor da Deutsche Post AG [auxílio C 36/07 (ex NN 25/07)] (a seguir «decisão de 2007»). Na decisão de 2007, publicada na língua que fazia fé no Jornal Oficial de 19 de outubro de 2007 (JO 2007, C 245, p. 21), a Comissão recordou as medidas tomadas no setor postal contra a República Federal da Alemanha nos termos do artigo 87.° CE desde 1994 e, invocando a necessidade de levar a cabo uma investigação global sobre todas as distorções de concorrência decorrentes da concessão de recursos estatais à Deutsche Post, informou que o procedimento aberto pela decisão de abertura do procedimento de 1999 seria complementado para englobar as informações recentemente comunicadas e adotar uma posição final sobre a compatibilidade dos referidos recursos com o Tratado CE.

22      Por petição apresentada em 22 de novembro de 2007, a Deutsche Post requereu ao Tribunal Geral a anulação da decisão de 2007 (processo T‑421/07).

23      Por acórdão de 1 de julho de 2008, Deutsche Post/Comissão (T‑266/02, EU:T:2008:235), o Tribunal Geral anulou a Decisão 2002/753, com o fundamento de que a Comissão não tinha provado a existência de uma vantagem para a Deutsche Post, ao não efetuar uma análise circunstanciada de todas as transferências de recursos estatais de que esta última tinha beneficiado e de todos os custos associados à prestação do serviço universal que ela devia suportar, de modo a determinar se as transferências em causa correspondiam a uma sobrecompensação ou a uma subcompensação em seu benefício ou em seu prejuízo. Em aplicação desse acórdão, objeto de recurso pela Comissão, a República Federal da Alemanha reembolsou a Deutsche Post no montante de 572 milhões de euros, acrescido de juros.

24      Em 30 de outubro de 2008, após numerosas interações com a República Federal da Alemanha quanto à justeza da decisão de 2007, a Comissão notificou este Estado‑Membro para apresentar todos os elementos contabilísticos requeridos para todo o período compreendido entre 1990 e 2007. Esta injunção (a seguir «injunção de 2008») foi objeto de um pedido de anulação tanto por parte da República Federal da Alemanha (processo T‑571/08) como da Deutsche Post (processo T‑570/08). Enquanto aguardava a decisão do Tribunal Geral, a República Federal da Alemanha cumpriu a injunção de 2008, apresentando, primeiro em novembro e em dezembro de 2008, e depois em março de 2009, os elementos contabilísticos requeridos.

25      Por despachos do 14 de julho de 2010, Deutsche Post/Comissão (T‑570/08, não publicado, EU:T:2010:311), e Alemanha/Comissão (T‑571/08, não publicado, EU:T:2010:312), o Tribunal Geral julgou os recursos contra a injunção de 2008 inadmissíveis. Estes despachos foram objeto de recurso para o Tribunal de Justiça pela República Federal da Alemanha (processo C‑465/10 P) e pela Deutsche Post (processo C‑463/10 P).

26      Por acórdão de 2 de setembro de 2010, Comissão/Deutsche Post (C‑399/08 P, EU:C:2010:481), o Tribunal de Justiça negou provimento ao recurso do acórdão de 1 de julho de 2008, Deutsche Post/Comissão (T‑266/02, EU:T:2008:235).

27      Por carta de 10 de maio de 2011, a Comissão notificou a República Federal da Alemanha da sua decisão «de ampliar» novamente o procedimento iniciado em 1999 (a seguir «decisão de 2011»), para efetuar uma análise aprofundada do financiamento público das pensões de que a Deutsche Post tinha beneficiado desde 1995. Esta última requereu ao Tribunal Geral, em 22 de julho de 2011, a anulação da decisão de 2011 (processo T‑388/11).

28      Por acórdão de 13 de outubro de 2011, Deutsche Post e Alemanha/Comissão (C‑463/10 P e C‑465/10 P, EU:C:2011:656), o Tribunal de Justiça anulou os despachos de 14 de julho de 2010, Deutsche Post/Comissão (T‑570/08, não publicado, EU:T:2010:311), e Alemanha/Comissão (T‑571/08, não publicado, EU:T:2010:312), com o fundamento de que a injunção de 2008 dizia direta e individualmente respeito à Deutsche Post, e remeteu os processos ao Tribunal Geral (processos T‑570/08 RENV e T‑571/08 RENV).

29      Por força da decisão de 2011, a Comissão, em 18 de novembro de 2011, pediu à República Federal da Alemanha informações relativas ao financiamento público das pensões no período subsequente a 2007, que lhe foram prestadas.

30      Por acórdão de 8 de dezembro de 2011, Deutsche Post/Comissão (T‑421/07, EU:T:2011:720), o Tribunal Geral entendeu que o recurso interposto pela Deutsche Post contra a decisão de 2007 era inadmissível, com o fundamento de que essa decisão não tinha modificado a situação jurídica desta e, portanto, não constituía um ato passível de recurso.

31      Pela Decisão 2012/636/UE, de 25 de janeiro de 2012, relativa à medida C 36/07 (ex NN 25/07) da Alemanha em favor da Deutsche Post AG (JO 2012, L 289, p. 1) (a seguir «decisão impugnada»), a Comissão considerou designadamente que o financiamento público das pensões constituía um auxílio de Estado ilegal, incompatível com o mercado interno. Em contrapartida, considerou que determinadas transferências públicas a favor da Deutsche Post eram um auxílio de Estado compatível com o mercado interno e que as garantias públicas pelas quais a República Federal da Alemanha se constituía garante das dívidas contraídas pela Deutsche Bundespost antes da sua transformação em três sociedades anónimas deviam ser analisadas como um auxílio existente.

32      A decisão impugnada foi notificada no dia seguinte à República Federal da Alemanha.

33      Por carta apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 4 de abril de 2012, a República Federal da Alemanha informou o Tribunal Geral de que desistia do recurso no processo T‑571/08 RENV, que foi cancelado do registo do Tribunal Geral (despacho de 10 de maio de 2012, Alemanha/Comissão, T‑571/08 RENV, não publicado, EU:T:2012:228).

34      Por acórdão de 24 de outubro de 2013, Deutsche Post/Comissão (C‑77/12 P, não publicado, EU:C:2013:695), o Tribunal de Justiça anulou o acórdão de 8 de dezembro de 2011, Deutsche Post/Comissão (T‑421/07, EU:T:2011:720), criticando o erro de direito cometido pelo Tribunal Geral ao decidir que a decisão de 2007 não era um ato suscetível de recurso. Remeteu igualmente ao Tribunal Geral a resolução do litígio em questão.

35      Por acórdão de 12 de novembro de 2013, Deutsche Post/Comissão (T‑570/08 RENV, não publicado, EU:T:2013:589), o Tribunal Geral negou provimento ao recurso interposto pela Deutsche Post contra a injunção de 2008. Esse acórdão foi objeto de uma retificação de um erro material (despacho de 15 de novembro de 2013, Deutsche Post/Comissão, T‑570/08 RENV, não publicado, EU:T:2013:606).

36      Por último, por acórdão de 18 de setembro de 2015, Deutsche Post/Comissão (T‑421/07 RENV, EU:T:2015:654), o Tribunal Geral anulou a decisão de 2007 com o fundamento de que esta tinha sido adotada em violação do Regulamento (CE) n.° 659/1999 do Conselho, de 22 de março de 1999, que estabelece as regras de execução do artigo [108.° TFUE] (JO 1999, L 83, p. 1), bem como do princípio da segurança jurídica, na medida em que tinha reaberto um procedimento formal de investigação completamente encerrado para adotar uma nova decisão sem revogar ou retirar a decisão de encerramento do procedimento.

 Tramitação processual e pedidos das partes

37      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 30 de março de 2012, a República Federal da Alemanha interpôs o presente recurso.

38      Em 13 de junho de 2012, a Comissão apresentou a contestação.

39      Por requerimento entrado na Secretaria do Tribunal Geral em 27 de julho de 2012, a UPS e a United Parcel Service Deutschland Inc. & Co. OHG pediram para intervir no presente processo em apoio dos pedidos da Comissão.

40      Em 24 de agosto de 2012, a República Federal da Alemanha apresentou um pedido de tratamento confidencial da petição e da contestação relativamente à UPS e à United Parcel Service Deutschland, apresentando para o efeito uma versão não confidencial da petição e da contestação.

41      Por despacho do presidente da Sexta Secção do Tribunal Geral de 11 de setembro de 2012, o pedido de intervenção no litígio apresentado pela UPS e pela United Parcel Service Deutschland foi indeferido, regulando ipso jure a questão relativa ao tratamento confidencial da petição e da contestação.

42      A réplica da República Federal da Alemanha deu entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 24 de setembro de 2012. A tréplica deu entrada na mesma Secretaria em 13 de dezembro de 2012.

43      Subsequentemente, o presente processo foi atribuído a um novo juiz‑relator da mesma Secção.

44      Na sequência da renovação parcial da composição do Tribunal Geral, o juiz‑relator foi afetado à Oitava Secção, à qual o presente processo foi, por conseguinte, distribuído.

45      O Tribunal Geral apresentou questões às partes no âmbito das medidas de organização do processo, nos termos do artigo 64.° do Regulamento de Processo do Tribunal Geral de 2 de maio de 1991, tendo estas respondido no prazo fixado. O Tribunal Geral pretendeu designadamente, no interesse de uma boa administração da justiça e em vista de uma otimização da gestão dos processos T‑421/07 RENV, T‑388/11 e T‑152/12, que opunham a Deutsche Post à Comissão, bem como do presente processo, conhecer a opinião das partes sobre o que podiam ou deviam ser as prioridades quanto à ordem de tratamento desses processos e à possibilidade de suspender um ou vários processos na pendência dos restantes.

46      Na sequência das observações das partes, por despachos de 15 de setembro de 2014 do presidente da Primeira Secção do Tribunal Geral no processo T‑388/11, Deutsche Post/Comissão, e do presidente da Oitava Secção do Tribunal Geral no presente processo e no processo T‑152/12, Deutsche Post/Comissão, estes três processos foram suspensos a aguardar a decisão que põe termo à instância no processo T‑421/07 RENV, a qual foi proferida em 18 de setembro de 2015, conforme indicado no n.° 36 supra.

47      No âmbito de uma medida de organização do processo, nos termos do artigo 89.° do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, as partes foram convidadas a dar a conhecer ao Tribunal Geral as consequências que, segundo elas, decorrem do acórdão de 18 de setembro de 2015, Deutsche Post/Comissão (T‑421/07 RENV, EU:T:2015:654), para o tratamento do presente litígio. Em 3 e 30 de novembro de 2015, respetivamente, a República Federal da Alemanha e a Comissão apresentaram as suas observações na Secretaria do Tribunal Geral.

48      Em 1 de dezembro de 2015, o Tribunal Geral convidou as partes a apresentarem as suas eventuais observações quanto à realização da audiência em parte à porta fechada, na medida em que determinados elementos suscetíveis de aí serem abordados coincidiam com os evocados pelas partes principais nos processos T‑388/11, Deutsche Post/Comissão, e T‑152/12, Deutsche Post/Comissão, elementos que tinham levado a Deutsche Post a pedir o tratamento confidencial dos mesmos face às partes intervenientes nesses dois processos.

49      Em 4 de dezembro de 2015, a Comissão comunicou à Secretaria do Tribunal Geral que não tinha observações a apresentar e, nessa mesma data, a República Federal da Alemanha apresentou na Secretaria do Tribunal Geral as suas observações, nos termos das quais não tinha objeções a que a audiência tivesse lugar à porta fechada, mas se reservava o direito de apresentar novas conclusões se os elementos não incluídos na versão pública da decisão impugnada devessem ser mencionados na audiência.

50      As partes foram ouvidas em alegações e nas suas respostas às questões formuladas pelo Tribunal Geral na audiência que decorreu, em parte, à porta fechada, em 10 de dezembro de 2015.

51      A República Federal da Alemanha conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        anular os artigos 1.° e 4.° a 6.° da decisão impugnada;

–        condenar a Comissão nas despesas.

52      A Comissão conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        a título principal, negar provimento ao recurso;

–        a título subsidiário, no caso de uma das partes do sexto fundamento ou um dos argumentos que ele inclui ser julgado procedente, ou no caso de o sétimo fundamento ser julgado procedente, anular a decisão impugnada apenas parcialmente, em função da procedência dos referidos fundamentos, aspetos e argumentos;

–        condenar a República Federal da Alemanha nas despesas.

 Questão de direito

53      Em apoio do seu recurso, a República Federal da Alemanha invoca formalmente dez fundamentos.

54      O primeiro fundamento é relativo à violação de artigo 107.°, n.° 1, TFUE e assenta na afirmação segundo a qual o financiamento público das pensões não favorecia a Deutsche Post; o segundo fundamento baseia‑se na inobservância desta mesma disposição, em razão do facto de o financiamento público das pensões não compensar os custos da Deutsche Post; o terceiro fundamento é relativo à violação, a título principal, do artigo 107.°, n.° 1, TFUE e, a título subsidiário, do artigo 107.°, n.° 3, TFUE, atendendo a que são tidas em conta as receitas obtidas pela Deutsche Post com o auxílio das tarifas reguladas do correio; o quarto fundamento é relativo à violação dos artigos 107.° e 108.° TFUE e do Regulamento n.° 659/1999, bem como à existência de um desvio de poder e de processo resultante da cobrança de receitas obtidas pela Deutsche Post com o auxílio das referidas tarifas reguladas; o quinto fundamento é igualmente relativo à violação dos artigos 107.° e 108.° TFUE e do Regulamento n.° 659/1999, bem como à existência de um desvio de poder e de processo resultante da procura de subvenções cruzadas; o sexto fundamento é relativo, a título principal, à violação do artigo 107.°, n.° 1, TFUE e, a título subsidiário, à do artigo 107.°, n.° 3, TFUE, devido a cálculos errados na comparação dos encargos sociais da Deutsche Post com os dos operadores concorrentes; o sétimo fundamento é relativo, a título principal, à violação do artigo 107.°, n.° 1, TFUE e, a título subsidiário, à do artigo 107.°, n.° 3, TFUE, devido à qualificação de auxílio de Estado incompatível com o mercado interno entre 1995 e 2002; o oitavo fundamento é relativo à inobservância do artigo 1.°, alínea b), i), do Regulamento n.° 659/1999 devido à qualificação de auxílio novo; o nono fundamento é unicamente relativo ao artigo 4.°, n.os 1 e 4, da decisão impugnada, que, segundo a República Federal da Alemanha, é contrário ao artigo 7.°, n.° 5, e ao artigo 14.°, n.° 1, do Regulamento n.° 659/1999; por último, o décimo fundamento é relativo à duração excessiva do processo e à inação da Comissão, alegando‑se que infringem o artigo 6.° TUE, o artigo 41.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, o artigo 6.° da Convenção Europeia para a proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada em Roma, em 4 de novembro de 1950, e o artigo 10.°, n.° 1, do Regulamento n.° 659/1999.

55      No entanto, na medida em que a República Federal da Alemanha alega, em apoio do primeiro, segundo e sexto fundamentos, que a decisão impugnada está afetada por falta de fundamentação, a apreciação dos argumentos associados a esta questão será dissociada da dos argumentos em sede de mérito e tratada no âmbito de um fundamento distinto (v., neste sentido, acórdãos de 2 de abril de 1998, Comissão/Sytraval e Brink’s France, C‑367/95 P, EU:C:1998:154, n.os 66 e 67, e de 5 de dezembro de 2013, Comissão/Edison, C‑446/11 P, não publicado, EU:C:2013:798, n.° 20).

56      Dado que a falta de fundamentação se prende com a violação das formalidades essenciais, o Tribunal Geral considera adequado tratar o fundamento que a invoca antes de abordar os fundamentos jurídicos em sede de mérito.

 Quanto à falta de fundamentação da decisão impugnada

57      A República Federal da Alemanha considera que a decisão impugnada está afetada de falta de fundamentação, em primeiro lugar, no que respeita à afirmação segundo a qual o financiamento público das pensões constitui uma vantagem seletiva a favor da Deutsche Post, em segundo lugar, no que respeita à afirmação segundo a qual o referido financiamento corresponde a encargos que normalmente devem onerar o orçamento de uma empresa, em terceiro lugar, no que respeita à falta de explicação da Comissão quanto à inaplicabilidade ao caso em apreço da jurisprudência resultante do acórdão de 16 de março de 2004, Danske Busvognmænd/Comissão (T‑157/01, a seguir «acórdão Combus», EU:T:2004:76), e, em quarto lugar, no que respeita à recusa de tomar em consideração a argumentação apresentada pela República Federal da Alemanha para demonstrar o caráter errado do índice de referência escolhido pela Comissão.

58      A Comissão contesta estas afirmações.

59      Há que recordar que, segundo jurisprudência constante, a fundamentação exigida pelo artigo 296.° TFUE deve ser adaptada à natureza do ato em causa e deixar transparecer, de forma clara e inequívoca, o raciocínio da instituição, autora do ato, por forma a permitir aos interessados conhecer as razões da medida adotada e ao órgão jurisdicional competente exercer a sua fiscalização (v. acórdão de 11 de dezembro de 2013, Cisco Systems e Messagenet/Comissão, T‑79/12, EU:C:2013:635, n.° 108 e jurisprudência aí referida). A este propósito, a Comissão não está obrigada, na fundamentação das decisões que é levada a adotar para garantir a aplicação do direito da União em matéria de auxílios de Estado, a tomar posição sobre todos os argumentos invocados pelos interessados em apoio do seu pedido. Basta‑lhe expor os factos e as considerações jurídicas que se revestem de importância essencial na sistemática da decisão (v., neste sentido, acórdãos de 1 de julho de 2008, Chronopost e La Poste/UFEX e o., C‑341/06 P e C‑342/06 P, EU:C:2008:375, n.° 96, e de 16 de dezembro de 2010, Países Baixos e NOS/Comissão, T‑231/06 e T‑237/06, EU:T:2010:525, n.os 141, 142 e jurisprudência aí referida).

60      A questão de saber se a fundamentação de um ato satisfaz as exigências do artigo 296.° TFUE deve ser apreciada à luz não somente do seu teor, mas também do seu contexto bem como do conjunto das normas jurídicas que regem a matéria em causa (acórdãos de 2 de abril de 1998, Comissão/Sytraval e Brink’s France, C‑367/95 P, EU:C:1998:154, n.° 63; de 1 de julho de 2008, Chronopost e La Poste/UFEX e o., C‑341/06 P e C‑342/06 P, EU:C:2008:375, n.° 88; e de 16 de setembro de 2013, Iliad e o./Comissão, T‑325/10, EU:T:2013:472, n.° 260). Assim, a Comissão não viola o dever de fundamentação que lhe incumbe se, na sua decisão, não tomar posição sobre elementos manifestamente despropositados, desprovidos de significado ou claramente secundários (acórdãos de 2 de abril de 1998, Comissão/Sytraval e Brink’s France, C‑367/95 P, EU:C:1998:154, n.° 64; de 1 de julho de 2008, Chronopost e La Poste/UFEX e o., C‑341/06 P e C‑342/06 P, EU:C:2008:375, n.° 89; e de 27 de setembro de 2012, Wam Industriale/Comissão, T‑303/10, não publicado, EU:T:2012:505, n.° 87).

61      É à luz destes princípios que importa verificar se os quatro aspetos da decisão impugnada que a República Federal da Alemanha considera feridos de falta de fundamentação efetivamente o são.

62      No que respeita à afirmação segundo a qual o financiamento público das pensões constitui uma vantagem a favor da Deutsche Post, resulta da decisão impugnada, por um lado, que a seletividade reside, segundo a Comissão, no facto de a «subvenção para pensões [ter sido] concedida ao fundo de pensões unicamente para aliviar a Deutsche Post dos custos com as pensões dos funcionários públicos, beneficiando, portanto, em última instância, a Deutsche Post» (considerando 259 da decisão impugnada), e, por outro, quanto à própria existência de uma vantagem, que a Comissão expôs, no ponto VII.1.1, sob o título «Vantagem financeira devido à reforma das pensões de 1995», as razões pelas quais considerava que essa vantagem estava, no caso em apreço, demonstrada (considerandos 260 a 274 da decisão impugnada), tendo o cuidado de refutar os argumentos aduzidos pela República Federal da Alemanha. A decisão impugnada é, pois, quanto a este aspeto, fundamentada de forma juridicamente bastante.

63      No que respeita ao argumento relativo ao facto de a Comissão ter omitido a fundamentação da afirmação segundo a qual o financiamento público das pensões corresponde a encargos que devem onerar normalmente o orçamento de uma empresa, é imperioso salientar que a Comissão procedeu à mera constatação, sobre cuja procedência não há lugar a pronúncia na fase da apreciação do dever de fundamentação, de que tal contribuição do empregador fazia parte do modo normal de funcionamento de uma empresa em economia de mercado. A este propósito, indica‑se, no considerando 263 da decisão impugnada, «que os custos suportados por uma empresa devido a obrigações de pagamento ao abrigo da legislação laboral ou de acordos coletivos com os sindicatos, por exemplo, os custos com pensões, fazem parte dos custos normais de uma empresa que devem ser cobertos por recursos próprios» e que «[e]stes custos devem ser considerados como parte da atividade económica da empresa». Acrescente‑se que a Comissão se referiu, além disso, à sua prática decisória e à jurisprudência do Tribunal Geral (notas de pé de página n.os 6 e 7 da decisão impugnada). Assim, a Comissão não infringiu o artigo 296.° TFUE neste aspeto.

64      No que respeita à alegada falta de explicação da Comissão quanto à inaplicabilidade do acórdão de 16 de março de 2004, Combus (T‑157/01, EU:T:2004:76) ao caso em apreço, o argumento não corresponde aos factos, dado que a Comissão tomou expressamente posição, na decisão impugnada, sobre este aspeto da argumentação da República Federal da Alemanha. No considerando 260 da decisão impugnada, a Comissão menciona este argumento e, no considerando 262 da mesma decisão, refuta‑o pormenorizadamente. Além disso, o considerando 115 da decisão impugnada faz referência à decisão de 2011, na qual a Comissão tinha igualmente excluído essa jurisprudência como sendo inaplicável ao caso em apreço. A decisão impugnada está pois suficientemente fundamentada a esse respeito.

65      Quanto, por último, à alegada falta de elementos que justifiquem a recusa de tomar em consideração os argumentos da República Federal da Alemanha relativos à determinação da taxa de contribuição de referência, cumpre observar, por um lado, que a Comissão expôs claramente os motivos pelos quais tinha adotado as taxas da contribuição total, concretamente as cotizações do empregador e as cotizações do assalariado, para os seguros de reforma e desemprego, bem como a contribuição do empregador para os seguros de doença e tratamento (considerandos 301 a 306 da decisão impugnada) e, por outro, analisado, e depois excluído, as objeções apresentadas pelo Estado‑Membro em causa (considerandos 308 a 311 da decisão impugnada). Além disso, importa recordar que, por força da jurisprudência referida no n.° 59 supra, a Comissão não tem o dever de se pronunciar sobre todos os argumentos que lhe são apresentados. Também quanto a este quarto ponto, a decisão impugnada está suficientemente fundamentada.

66      Os argumentos relativos à falta de fundamentação da decisão impugnada devem, pois, ser julgados improcedentes na sua totalidade.

67      Importa, agora, analisar conjuntamente o quarto e quinto fundamentos do recurso, pelos quais a República Federal da Alemanha convida o Tribunal Geral a precisar o alcance exato dos artigos 107.° e 108.° TFUE, bem como do Regulamento n.° 659/1999, à luz dos poderes atribuídos à Comissão para investigar a existência de um auxílio de Estado.

 Quanto ao quarto e quinto fundamentos, relativos ao alcance dos artigos 107.° e 108.° TFUE, bem como do Regulamento n.° 659/1999, à luz dos poderes atribuídos à Comissão para investigar a existência de um auxílio de Estado, e à existência de um desvio de poder e do processo

68      No âmbito do seu quarto fundamento, a República Federal da Alemanha alega que a Comissão, tendo em conta a ordem de recuperação que figura no artigo 4.°, n.° 4, da decisão impugnada, cobrou ilegalmente receitas realizadas pela Deutsche Post com o auxílio das tarifas reguladas; no âmbito do seu quinto fundamento, alega que tanto o direito primário como o direito derivado pertinente se opõem à procura de subvenções cruzadas.

69      A Comissão opõe‑se a estas críticas.

70      Há que recordar, em primeiro lugar, que o único destinatário de uma decisão como a decisão impugnada é o Estado‑Membro em causa, ou seja, no presente caso, a República Federal da Alemanha (v., neste sentido, acórdãos de 2 de julho de 1974, Itália/Comissão, 173/73, EU:C:1974:71, n.os 16 e 18; de 25 de junho de 1998, British Airways e o./Comissão, T‑371/94 e T‑394/94, EU:T:1998:140, n.° 92; e de 11 de março de 2009, TF1/Comissão, T‑354/05, EU:T:2009:66, n.° 31), como decorre aliás expressamente do artigo 7.° da decisão impugnada. Com efeito, é a este Estado‑Membro que compete adotar, contra a sua própria vontade, medidas juridicamente vinculativas, de forma a respeitar as obrigações que para ele decorrem do direito da União [despacho de 21 de janeiro de 2014, França/Comissão, C‑574/13 P(R), EU:C:2014:36, n.° 24], em concreto, designadamente, recuperar junto do ou dos seus beneficiários o montante do auxílio que a Comissão considerou que tinha sido ilegalmente concedido.

71      É pois errado alegar, como faz a República Federal da Alemanha no âmbito do quarto fundamento, que a Comissão, ainda que indiretamente, cobrou receitas resultantes das tarifas reguladas: o Estado‑Membro em causa, único destinatário da decisão impugnada, foi simplesmente obrigado a recuperar da Deutsche Post, sem que o referido Estado‑Membro designe para o efeito, e, a fortiori, sem que tenha o dever de designar, uma parte específica da compatibilidade desta última, correspondendo o montante a uma série de medidas que a Comissão tinha considerado como constitutivas de um auxílio de Estado ilegal. O facto de a Deutsche Post reembolsar o referido montante através dos lucros obtidos com o auxílio das tarifas reguladas do correio ou segundo outras modalidades não pode pois deixar de ter repercussões sobre a legalidade da decisão impugnada.

72      Em seguida, a República Federal da Alemanha também não tem fundamento para invocar, ao abrigo do quinto fundamento, a proibição, no caso específico, de investigar a existência de eventuais subvenções cruzadas.

73      Cumpre recordar que, à luz dos princípios resultantes da jurisprudência, não só o artigo 107.°, n.° 1, TFUE não se opõe ao controlo da existência de tais subvenções mas, pelo contrário, esta disposição implica que se proceda a uma verificação deste tipo.

74      O artigo 107.° TFUE tem por objetivo evitar que as trocas comerciais entre os Estados‑Membros sejam afetadas por vantagens concedidas pelas autoridades públicas que, por diversas formas, falseiem ou ameacem falsear a concorrência, favorecendo certas empresas ou certas produções (acórdãos de 2 de julho de 1974, Itália/Comissão, 173/73, EU:C:1974:71, n.° 26, e de 15 de março de 1994, Banco Exterior de España, C‑387/92, EU:C:1994:100, n.° 12). O conceito de auxílio abrange, portanto, não só prestações positivas, como as subvenções, mas também intervenções que, sob formas diversas, aliviam os encargos que normalmente oneram o orçamento de uma empresa e que, não sendo subvenções na aceção estrita da palavra, têm a mesma natureza e efeitos idênticos (acórdãos de 15 de março de 1994, Banco Exterior de España, C‑387/92, EU:C:1994:100, n.° 13, e de 11 de julho de 1996, SFEI e o., C‑39/94, EU:C:1996:285, n.° 58).

75      Mais exatamente, a correta aplicação do direito da União implica que se verifique se as receitas obtidas com uma atividade legalmente subvencionada não servem para financiar outras atividades da mesma empresa (v., neste sentido, acórdãos de 10 de junho de 2010, Fallimento Traghetti del Mediterraneo, C‑140/09, EU:C:2010:335, n.° 50; de 27 de fevereiro de 1997, FFSA e o./Comissão, T‑106/95, EU:T:1997:23, n.os 187 a 190; e de 11 de julho de 2010, M6 e TF1/Comissão, T‑568/08 e T‑573/08, EU:T:2010:272, n.os 118, 121, 126 e 135), dispondo a Comissão de um certo poder de apreciação quanto à adoção do método mais adequado para se assegurar da inexistência de subvenção cruzada em benefício de atividades concorrenciais (acórdão de 27 de fevereiro de 1997, FFSA e o./Comissão, T‑106/95, EU:T:1997:23, n.° 187).

76      Ainda que o título do seu quinto fundamento (v. n.° 54 supra) não o deixe presumir, a República Federal da Alemanha parece, na realidade, concordar com o facto de a Comissão ter o direito de proceder à procura de subvenções cruzadas, mas contesta que as condições exigidas para uma verificação desse tipo estejam reunidas no presente caso. Indica assim na petição o seguinte: «ainda que seja apenas devido à falta de transferência de ‘recursos estatais’ na aceção do artigo 107.°, n.° 1, TFUE, as condições de uma ‘subvenção cruzada’ na aceção da legislação em matéria de auxílios não estão preenchidas».

77      Em quaisquer circunstâncias, não se observa, de modo nenhum, que, ao proceder à apreciação da compatibilidade do auxílio alegadamente resultante do § 16 da lei relativa ao estatuto dos trabalhadores dos correios à luz da aplicação do § 20, n.° 2, da Lei postal, aplicação essa que permitiu à Deutsche Post afetar uma parte das receitas resultantes da aplicação das tarifas reguladas ao fundo de pensões, a Comissão tenha procedido à procura de uma subvenção cruzada, a qual tem lugar, por definição, na fase da determinação da própria existência do auxílio, e não na da sua compatibilidade com o mercado interno.

78      A República Federal da Alemanha alega, além disso, que incumbia à Comissão intentar uma ação por incumprimento de Estado, na aceção do artigo 258.° TFUE, se considerava que a regulação dos preços prevista pelo § 20, n.° 2, da Lei postal estava na origem de subvenções cruzadas. Considera, por consequência, que teve lugar um desvio de poder e de processo.

79      Este argumento não pode ser acolhido. Com efeito, os órgãos jurisdicionais da União já excluíram um raciocínio semelhante, ao recordar, a propósito da opção da Comissão de perseguir um abuso de posição dominante por parte de um operador histórico alemão em matéria de telefonia, e ao não acionar o Estado‑Membro autor da legislação que possibilitou esse abuso, que, mesmo que a Comissão tivesse podido, a esse título, intentar uma ação por incumprimento contra a República Federal da Alemanha, esta eventualidade não era, de modo nenhum, suscetível de afetar a legalidade da decisão impugnada (acórdão de 10 de abril de 2008, Deutsche Telekom/Comissão, T‑271/03, EU:T:2008:101, n.° 271) e, mais amplamente, no sistema instituído pelo artigo 258.° TFUE, a Comissão dispõe de um poder discricionário para intentar uma ação por incumprimento, não competindo aos tribunais da União apreciar a oportunidade do seu exercício (acórdãos de 26 de junho de 2003, Comissão/França, C‑233/00, EU:C:2003:371, n.° 31, e de 14 de outubro de 2010, Deutsche Telekom/Comissão, C‑280/08 P, EU:C:2010:603, n.° 47).

80      O desvio de poder e de processo não está, portanto, demonstrado quanto ao quinto fundamento. Também não o está quanto ao quarto fundamento, em cujo âmbito é igualmente invocado.

81      A República Federal da Alemanha alega que a Comissão, na sequência de uma denúncia apresentada em 22 de abril de 2004 pela UPS com base no artigo 102.° TFUE (considerando 46 da decisão impugnada), tinha iniciado um procedimento destinado a verificar o abuso de posição dominante da Deutsche Post em razão da faturação com tarifas excessivas dos serviços regulados de correio, tendo renunciado, em 25 de março de 2008, a prosseguir o referido procedimento, por considerar difícil provar esse abuso (considerando 48 da decisão impugnada).

82      Segundo a República Federal da Alemanha, é a impossibilidade de poder provar o abuso de posição dominante da Deutsche Post que conduziu a Comissão a recorrer artificialmente a outro procedimento, o da fiscalização dos auxílios de Estado.

83      Basta aqui salientar que o simples facto de a Comissão, no âmbito da avaliação das provas de que dispõe para punir uma infração ao artigo 102.° TFUE, renunciar a reprimir um abuso de posição dominante que considera não ter a possibilidade de demonstrar de forma juridicamente bastante constitui uma ilustração do princípio da boa administração e o próprio respeito do princípio da legalidade.

84      Mais ainda, uma decisão só está viciada por desvio de poder ou de processo se se verificar, com base em indícios objetivos, relevantes e concordantes, que foi adotada para atingir fins diversos dos invocados (acórdãos de 12 de novembro de 1996, Reino Unido/Conselho, C‑84/94, EU:C:1996:431, n.° 69, e de 16 de setembro de 1998, IECC/Comissão, T‑133/95 e T‑204/95, EU:T:1998:215, n.° 188). Além disso, em caso de pluralidade de objetivos prosseguidos, mesmo quando um motivo injustificado se junta aos motivos válidos, a decisão não enferma por esse facto de desvio de poder, quando não sacrifique o objetivo essencial (acórdão de 21 de dezembro de 1954, Itália/Alta Autoridade, 2/54, EU:C:1954:8, pp. 73, 103; de 8 de julho de 1999, Vlaamse Televisie Maatschappij/Comissão, T‑266/05, EU:T:1999:144, n.° 131; e de 21 de setembro de 2005, EDP/Comissão, T‑87/05, EU:T:2005:333, n.° 87).

85      No presente caso, nada permite provar que a decisão impugnada não tenha sido adotada para punir um auxílio de Estado incompatível com o mercado interno ou, em qualquer caso, designadamente em vista de tal objetivo.

86      Resulta do exposto que o quarto e quinto fundamentos devem ser julgados improcedentes.

87      Cumpre proceder em seguida à apreciação do primeiro e segundo fundamentos, bem como da primeira parte do terceiro, sexto e sétimo fundamentos, que se prendem com a questão da existência de um auxílio de Estado, no caso em apreço.

 Quanto ao primeiro e segundo fundamentos, bem como à primeira parte do terceiro, sexto e sétimo fundamentos, na medida em que estes são relativos à existência de um auxílio de Estado

88      Antes de mais, cumpre recordar que a qualificação de auxílios de Estado na aceção do artigo 107.°, n.° 1, TFUE pressupõe a reunião de quatro condições, em concreto, que exista uma intervenção do Estado ou através de recursos estatais, que essa intervenção seja suscetível de afetar as trocas comerciais entre os Estados‑Membros, que conceda uma vantagem seletiva ao seu beneficiário e que falseie ou ameace falsear a concorrência (v., neste sentido, acórdãos de 17 de março de 1993, Sloman Neptun, C‑72/91 e C‑73/91, EU:C:1993:97, n.° 18; de 19 de dezembro de 2013, Association Vent de colère! e o., C‑262/12, EU:C:2013:851, n.° 15; e de 11 de junho de 2009, Itália/Comissão, T‑222/04, EU:T:2009:194, n.° 39).

89      A medida cuja anulação a República Federal da Alemanha pede é a qualificação de auxílio de Estado incompatível com o mercado interno tal como referida no artigo 1.° da decisão impugnada, no que respeita à «subvenção para pensões atribuída à Deutsche Post». Com esta terminologia, a Comissão refere‑se com muita precisão ao financiamento público das pensões dos antigos funcionários públicos dos correios (considerando 3 da decisão impugnada), excluindo, consequentemente, o das pensões dos antigos agentes contratuais recrutados a partir de 1 de janeiro de 1995. É, pois, também neste sentido que se deve interpretar a expressão «financiamento público das pensões» utilizada no presente acórdão. O referido financiamento é regulado pelo § 16 da lei relativa ao estatuto dos trabalhadores dos correios, que constitui assim o objeto da decisão impugnada. No entanto, cumpre salientar que, na fase da apreciação da compatibilidade do alegado auxílio com o mercado interno, a Comissão salientou que o efeito desta última e o do § 20, n.° 2, da Lei postal eram cumulativos para libertar a Deutsche Post do custo das pensões de reforma dos seus antigos funcionários (considerandos 116 e 332 a 338 da decisão impugnada).

90      Cumpre assim, ao analisar os diferentes fundamentos invocados a este respeito pela República Federal da Alemanha, verificar se o financiamento público das pensões podia, adequadamente, ser qualificado de auxílio de Estado à luz dos critérios recordados no n.° 88 supra.

 Quanto à primeira condição, relativa à existência de uma intervenção do Estado ou através de recursos estatais

91      Impõe‑se observar que, no presente caso, não há dúvida quanto à intervenção do Estado e à utilização de recursos estatais. Estão patentes à luz do mecanismo instituído pelo § 16 da lei relativa ao estatuto dos trabalhadores dos correios, dado que, conforme indicado no n.° 10 supra, o Estado federal assumiu, nos anos 1995 a 1999, a diferença entre o custo total das pensões de reforma dos antigos funcionários da Deutsche Post e um montante fixo anual de 4 mil milhões de marcos alemães (DEM) (cerca de 2 045 milhões de euros), e posteriormente, a partir do ano 2000, entre o custo total das pensões de reforma desses antigos funcionários e 33% da remuneração bruta dos funcionários da Deutsche Post em atividade.

92      A República Federal da Alemanha contrapõe, no entanto, que estes recursos correspondem unicamente às receitas obtidas pela Deutsche Post com o auxílio das tarifas reguladas, receitas essas que não podem ser qualificadas de recursos estatais, dado que correspondem à remuneração pelos seus clientes de prestações da Deutsche Post no âmbito de relações económicas privadas.

93      No entanto, esta tese não resiste à análise. Não se pode contestar que a Deutsche Post, graças à intervenção do Estado federal, foi liberta de uma parte do custo das pensões devidas aos seus funcionários aposentados, custo que esta deveria ter repercutido nas tarifas não reguladas das suas prestações caso não tivesse havido essa intervenção. É, pois, com justeza que a Comissão indica que o montante deduzido do montante total dos encargos atinentes ao pagamento das referidas pensões correspondia a 151 milhões de euros em 1995, para atingir 3 203 milhões de euros em 2010. No período compreendido entre 1995 e 2010, este encargo assumido atingiu um montante total correspondente a mais de 37 mil milhões de euros.

94      Além disso, o facto de uma parte das receitas resultantes das tarifas reguladas aprovadas pelo Regulador postal nos termos do § 20, n.° 2, da Lei postal se destinar a minorar a contribuição da Deutsche Post para o fundo de pensões tem como consequência que o encargo assumido pelo Estado federal, definido a partir do montante fixo e, depois, da percentagem apresentados no n.° 91 supra, foi superior ao que deveria ter sido. Trata‑se, pois, em definitivo, de um aumento de subvenções públicas, ainda que seja exato que as receitas resultantes das tarifas reguladas, intrinsecamente consideradas, têm natureza privada.

95      Está pois preenchida a primeira condição, relativa à intervenção do Estado ou à utilização de recursos estatais.

 Quanto à segunda e quarta condições, relativas à afetação das trocas comerciais entre Estados‑Membros e à violação ou ao perigo de violação da concorrência

96      A aplicação destas duas condições ao caso em apreço não é objeto de uma contestação específica por parte da República Federal da Alemanha. Em qualquer caso, há que entender que a Comissão não cometeu nenhum erro de direito nem de apreciação ao afirmar, nos considerandos 275 a 277 da decisão impugnada, que, tendo em conta, por um lado, que os mercados das encomendas e da imprensa sempre estiveram abertos à concorrência na Alemanha e, por outro, que, na sequência da abertura do mercado do correio à concorrência, a Deutsche Post tinha perdido progressivamente os seus direitos exclusivos neste setor, em que intervinham novas empresas, as condições da afetação das trocas comerciais entre Estados‑Membros e de violação da concorrência estavam preenchidas.

 Quanto à terceira condição, relativa à existência de uma vantagem conferida a uma empresa ou a um tipo de produção

97      A República Federal da Alemanha alega que esta condição foi infringida nas suas duas componentes. Considera, primeiro, que, mesmo que exista, no caso, uma vantagem seletiva, o seu ou seus beneficiários não são uma empresa na aceção do artigo 107.°, n.° 1, TFUE e, segundo, que o financiamento público das pensões não deu lugar a tal vantagem.

98      Importa examinar sucessivamente estes dois elementos.

–       Quanto à identidade do beneficiário da vantagem alegada e à sua qualidade de empresa

99      A República Federal da Alemanha refere, no âmbito do seu primeiro fundamento, que o beneficiário da medida em causa não é a Deutsche Post, mas quer, diretamente, o fundo de pensões dos antigos funcionários dos serviços postais quer, indiretamente, os próprios funcionários aposentados, isto é, pessoas singulares.

100    A Comissão contesta esta análise.

101    Há que refutar as alegações da República Federal da Alemanha quanto à identidade e natureza do beneficiário do financiamento público das pensões. Com efeito, resulta dos elementos do processo que a Deutsche Post, cuja qualidade de empresa não é contestável, sem este financiamento, deveria ter pago, a favor dos antigos funcionários dos seus antecessores jurídicos, um determinado montante suplementar, contribuição de que, em parte, foi dispensada. É, pois, na realidade, a beneficiária da medida em causa.

102    Importa, pois, verificar se esse financiamento parcial, conforme definido no n.° 10 supra, podia, com justeza, ser qualificado de vantagem na aceção do artigo 107.°, n.° 1, TFUE.

–       Quanto à existência de uma vantagem em benefício da Deutsche Post, na aceção do artigo 107.°, n.° 1, TFUE

103    Importa, em primeiro lugar, recordar de que modo o juiz da União interpreta o conceito de vantagem, antes de, em segundo lugar, resumir o teor da decisão impugnada a este propósito, depois, em terceiro lugar, determinar, face aos fundamentos e argumentos invocados pela República Federal da Alemanha, se o raciocínio da Comissão permitia, no caso em apreço, concluir pela existência de uma vantagem na aceção do artigo 107.°, n.° 1, TFUE e, em seguida, na medida em que estivessem preenchidas as outras condições, conforme referido nos n.os 91 a 96 supra, pela existência de um auxílio de Estado.

104    Em primeiro lugar, o conceito de auxílio de Estado, como definido pelo Tratado, é um conceito jurídico e deve ser interpretado com base em elementos objetivos. Por essa razão, o juiz da União deve, em princípio e tendo em conta tanto os elementos concretos do litígio submetido à sua apreciação como o caráter técnico ou complexo das apreciações feitas pela Comissão, exercer uma fiscalização exaustiva no que diz respeito à questão de saber se uma medida recai no âmbito de aplicação do artigo 107.°, n.° 1, TFUE (acórdãos de 22 de dezembro de 2008, British Aggregates/Comissão, C‑487/06 P, EU:C:2008:757, n.° 111, e de 16 de setembro de 2013, British Telecommunications e BT Pension Scheme Trustrees/Comissão, T‑226/09 e T‑230/09, não publicado, EU:T:2013:466, n.° 39).

105    Assim acontece quanto a saber se uma medida confere ou não uma vantagem a uma empresa.

106    Esta vantagem deve ser de natureza económica e seletiva.

107    A vantagem deve ser de natureza económica, isto é, recai sobre a Comissão a obrigação de realizar uma análise completa de todos os elementos pertinentes da operação controvertida e do seu contexto, incluindo da situação da empresa beneficiária e do mercado em causa, para verificar se a empresa beneficiária recebe uma vantagem económica que não teria obtido em condições normais de mercado (v., neste sentido, acórdãos de 6 de março de 2003, Westdeutsche Landesbank Girozentrale e Land Nordrhein‑Westfalen/Comissão, T‑228/99 e T‑233/99, EU:T:2003:57, n.os 251 e 257, e de 3 de março de 2010, Bundesverband deutscher Banken/Comissão, T‑163/05, EU:T:2010:59, n.° 98).

108    No âmbito dessa verificação, a Comissão deve ter em conta, enquanto elementos do contexto pertinente, todas as particularidades do regime jurídico de que faz parte a medida nacional analisada. A este respeito, importa recordar, em primeiro lugar, que o artigo 107.°, n.° 1, TFUE não faz distinções em função das causas ou objetivos das intervenções estatais, definindo‑as, sim, em função dos seus efeitos (acórdão de 9 de junho de 2011, Comitato «Venezia vuole vivere» e o./Comissão, C‑71/09 P, C‑73/09 P e C‑76/09 P, EU:C:2011:368, n.° 94), e, em segundo lugar, que uma intervenção que não tem por efeito colocar as empresas a que é aplicável numa posição concorrencial mais favorável em relação às empresas que lhes fazem concorrência não recai no âmbito de aplicação do artigo 107.°, n.° 1, TFUE (v., neste sentido, acórdão de 24 de julho de 2003, Altmark Trans e Regierungspräsidium Magdeburg, C‑280/00, EU:C:2003:415, n.° 87)

109    Neste contexto, foi decidido que uma compensação representando a contrapartida das prestações efetuadas pelas empresas beneficiárias para executar obrigações de serviço público não confere uma vantagem na aceção do artigo 107.°, n.° 1, TFUE e, consequentemente, não recai no âmbito de aplicação desta disposição quando, designadamente, não excede o que é necessário para cobrir total ou parcialmente os custos ocasionados pelo cumprimento das obrigações de serviço público, tendo em conta as receitas obtidas, assim como um lucro razoável pela execução destas obrigações. Com efeito, se esta condição estiver preenchida, o financiamento em questão não reforça a posição concorrencial da empresa que dele beneficia (acórdão de 24 de julho de 2003, Altmark Trans e Regierungspräsidium Magdeburg, C‑280/00, EU:C:2003:415, n.° 92).

110    Além disso, uma vez que o artigo 107.°, n.° 1, TFUE tem por único objeto impedir vantagens que favoreçam certas empresas, o conceito de auxílio abrange apenas intervenções que aliviam os encargos que normalmente oneram o orçamento de uma empresa e que devem ser considerados uma vantagem económica que a empresa beneficiária não teria obtido em condições normais de mercado (v., neste sentido, acórdãos de 2 de julho de 1974, Itália/Comissão, 173/73, EU:C:1974:71, n.° 26; de 15 de março de 1994, Banco Exterior de España, C‑387/92, EU:C:1994:100, n.os 12 e 13; e de 24 de julho de 2003, Altmark Trans e Regierungspräsidium Magdeburg, C‑280/00, EU:C:2003:415, n.° 84 e jurisprudência aí referida). Portanto, uma medida pela qual um Estado‑Membro liberta uma empresa, inicialmente obrigada pela lei a continuar a empregar os funcionários do seu antecessor jurídico e a indemnizar o referido Estado em contrapartida das remunerações e das pensões cujo pagamento este prosseguia, da «desvantagem estrutural» que constitui «o estatuto privilegiado e dispendioso d[esse]s funcionários» relativamente ao dos empregados dos concorrentes privados da referida empresa não constitui, em princípio, uma intervenção que alivie os encargos que normalmente oneram o orçamento de uma empresa e, por conseguinte, um auxílio (v., neste sentido, acórdão de 16 de março de 2004, Combus, T‑157/01, EU:T:2004:76, n.os 6, 7, 56 e 57). No entanto, mesmo neste caso, tem de existir uma conexão direta entre os custos adicionais suportados e o montante da compensação (v., neste sentido, acórdãos de 28 de novembro de 2008, Hôtel Cipriani e o./Comissão, T‑254/00, T‑270/00 e T‑277/00, EU:T:2008:537, n.° 189, e de 16 de setembro de 2013, British Telecommunications e BT Pension Scheme Trustees/Comissão, T‑226/09 e T‑230/09, não publicado, EU:T:2013:466, n.° 72), o que permite medir o efeito líquido do referido auxílio.

111    A vantagem deve também ser de natureza seletiva. Com efeito, segundo jurisprudência constante, o artigo 107.°, n.° 1, TFUE proíbe os auxílios que «favoreçam certas empresas ou certas produções», isto é, os auxílios seletivos (acórdãos de 15 de dezembro de 2005, Itália/Comissão, C‑66/02, EU:C:2005:768, n.° 94, e de 6 de setembro de 2006, Portugal/Comissão, C‑88/03, EU:C:2006:511, n.° 52). No que respeita à apreciação dessa condição de seletividade, o artigo 107.°, n.° 1, TFUE impõe que se determine se, no quadro de um dado regime jurídico, uma medida estatal é suscetível de favorecer «certas empresas ou certas produções» relativamente a outras que, à luz do objetivo prosseguido pelo referido regime, se encontrem numa situação factual e jurídica comparável (v., neste sentido, acórdãos de 8 de novembro de 2001, Adria‑Wien Pipeline e Wietersdorfer & Peggauer Zementwerke, C‑143/99, EU:C:2001:598, n.° 41; de 29 de abril de 2004, GIL Insurance e o., C‑308/01, EU:C:2004:252, n.° 68; e de 3 de março de 2005, Heiser, C‑172/03, EU:C:2005:130, n.° 40). Para apreciar a seletividade de uma medida, há que analisar se, no quadro de um dado regime jurídico, a referida medida constitui uma vantagem para certas empresas em relação a outras que se encontrem numa situação factual e jurídica comparável (acórdãos de 6 de setembro de 2006, Portugal/Comissão, C‑88/03, EU:C:2006:511, n.° 56, e de 28 de julho de 2011, Mediaset/Comissão, C‑403/10 P, não publicado, EU:C:2011:533, n.° 36).

112    É pois unicamente em relação aos concorrentes da empresa em causa que a referida vantagem deve ser apreciada (v., neste sentido, acórdão de 27 de setembro de 2012, Itália/Comissão, T‑257/10, não publicado, EU:T:2012:504, n.° 70). Aliás, o sentido da recuperação de um auxílio ilegal é que o beneficiário perde a vantagem de que tinha beneficiado no mercado relativamente aos seus concorrentes, e a situação anterior ao pagamento do auxílio é reposta (v. acórdão de 29 de abril de 2004, Itália/Comissão, C‑372/97, EU:C:2004:234, n.os 103, 104 e jurisprudência aí referida; acórdão de 27 de setembro de 2012, Itália/Comissão, T‑257/10, não publicado, EU:T:2012:504, n.° 147).

113    Em segundo lugar, conforme indicado no âmbito da apreciação da fundamentação da decisão impugnada, a Comissão dedicou os considerandos 260 a 274 da referida decisão, sob o título «Vantagem financeira devido à reforma das pensões de 1995», a mostrar em que medida, segundo esta, a Deutsche Post tinha beneficiado de uma vantagem.

114    A Comissão começou por recordar, no considerando 261 da decisão impugnada, que se tratava de determinar se o financiamento público das pensões tinha permitido evitar à Deutsche Post suportar custos que os recursos financeiros próprios da empresa normalmente teriam de suportar, impedindo assim que as forças do mercado produzissem as suas consequências normais.

115    No considerando 262 da decisão impugnada, a Comissão refutou os argumentos da República Federal da Alemanha relativos à aplicabilidade ao presente caso da jurisprudência resultante do acórdão de 16 de março de 2004, Combus (T‑157/01, EU:T:2004:76).

116    No considerando 263 desta mesma decisão, a Comissão apresentou, como premissa maior do seu silogismo, a afirmação de que os custos resultantes da aplicação da legislação do trabalho ou de convenções coletivas fazem parte dos custos normais que uma empresa deve financiar com recursos próprios, e, como premissa menor, a afirmação de que as contribuições para as pensões, determinadas por força da legislação do trabalho ou de convenções coletivas, fazem parte desses custos. Concluiu daí que a Deutsche Post, no que respeita às pensões dos seus antigos funcionários, se encontrava perante um custo inerente à atividade económica da empresa, na aceção do artigo 107.°, n.° 1, TFUE.

117    Os considerandos 264 a 266 da decisão impugnada são consagrados à evolução do estatuto do serviço alemão de correios de 1950 a 1995 (v., a este respeito, n.os 1 a 12 supra). A Comissão deduziu desta evolução que a Deutsche Bundespost e, posteriormente, a Postdienst assumiam integralmente um encargo que a Deutsche Post já suporta apenas parcialmente, resultando daí um benefício em sua vantagem.

118    No considerando 267 da decisão impugnada, a Comissão indicou que os argumentos relativos à questão de saber se a Deutsche Post suportava custos com pensões superiores aos dos seus concorrentes privados «[eram] irrelevantes no que respeita[va] à questão de saber se a subvenção para pensões satisfaz[ia] o elemento de auxílio», mas que, em contrapartida, deviam ser tidos em consideração «no âmbito da análise da compatibilidade [do auxílio]». Esta ideia é igualmente expressa no considerando 268 da decisão impugnada.

119    Por último, os considerandos 269 a 273 da decisão impugnada são relativos à refutação de diversos argumentos aduzidos pela República Federal da Alemanha no procedimento administrativo.

120    Em terceiro lugar, importa determinar, atendendo aos fundamentos e argumentos invocados a este respeito pela República Federal da Alemanha, se a Comissão concluiu corretamente que existia uma vantagem conferida por este Estado‑Membro à Deutsche Post.

121    Como referido no n.° 87 supra, a República Federal da Alemanha consagrou diversos fundamentos à contestação da existência de um auxílio de Estado no caso em apreço. No âmbito de cada um destes fundamentos, nega que a Deutsche Post tenha beneficiado de uma vantagem na aceção do artigo 107.°, n.° 1, TFUE.

122    Cumpre analisar, antes de mais, os argumentos consagrados pela República Federal da Alemanha, no seu primeiro fundamento, à refutação do cumprimento, no caso em apreço, desta terceira condição, relativa à existência de uma vantagem económica e seletiva.

123    A Comissão pede ao Tribunal Geral que não acolha esses argumentos.

124    Em primeiro lugar, a República Federal da Alemanha alega que o financiamento público das pensões não constitui uma vantagem para a Deutsche Post devido ao facto de o montante que ela deve pagar «ao fundo de pensões ser determinado pela lei». No entanto, há que excluir esse argumento como inoperante, uma vez que a Comissão tinha precisamente o dever de determinar, nesta fase, se, devido ao § 16 da lei relativa ao estatuto dos trabalhadores dos correios, a Deutsche Post beneficiava de uma vantagem económica relativamente aos seus concorrentes de que não dispunha antes. É absolutamente indiferente, a este respeito, que a vantagem, se se provar existir, resulte de uma obrigação legal ou de uma intervenção do Estado sob outra forma, uma vez que tanto uma como outra estão subordinadas ao disposto no artigo 107.°, n.° 1, TFUE.

125    Em seguida, a República Federal da Alemanha alega que a Comissão, para apreciar a existência de um auxílio de Estado, tomou em consideração elementos relativos ao quadro legal da segurança social e das relações laborais alemãs. No entanto, importa salientar que este argumento não se adequa aos factos, dado que apenas na fase da apreciação da compatibilidade do alegado auxílio com o mercado interno foram aduzidas considerações desta natureza pela Comissão na decisão impugnada.

126    Por último, a República Federal da Alemanha invoca a prática decisória anterior da Comissão, fazendo referência à Decisão 2009/945/CE da Comissão, de 13 de julho de 2009, relativa à reforma das modalidades de financiamento do regime de pensões da RATP [auxílio C 42/07 (ex N 428/06)] a que a França tenciona proceder em benefício da RATP (JO 2009, L 327, p. 21). Este argumento deve igualmente ser julgado improcedente. Com efeito, importa recordar, sem que seja necessário analisar se a prática invocada está provada, que ela não pode afetar a validade da decisão impugnada, que tem de ser apreciada à luz das regras objetivas do Tratado (v., neste sentido, acórdãos de 20 de maio de 2010, Todaro Nunziatina & C., C‑138/09, EU:C:2010:291, n.° 21, e de 27 de setembro de 2012, Wam Industriale/Comissão, T‑303/10, não publicado, EU:T:2012:505, n.° 82). Assim sendo, não pode depender de uma apreciação subjetiva da Comissão e deve ser determinada independentemente de qualquer prática anterior desta instituição (acórdãos de 27 de setembro de 2012, Wam Industriale/Comissão, T‑303/10, não publicado, EU:T:2012:505, n.° 82, e de 5 de fevereiro de 2015, Ryanair/Comissão, T‑500/12, não publicado, EU:T:2015:73, n.° 39).

127    Há pois que julgar improcedentes os argumentos da República Federal da Alemanha constantes do primeiro fundamento na medida em que são relativos à própria existência de uma vantagem.

128    Tendo em conta, por um lado, a improcedência da parte do referido fundamento relativa à falta de fundamentação da decisão impugnada (v. n.os 55 e 66 supra) e, por outro, a improcedência das alegações do mesmo fundamento relativas à identidade do beneficiário da alegada vantagem e à contestação da sua qualidade de empresa (v. n.° 101 supra), o primeiro fundamento deve ser julgado improcedente na sua totalidade.

129    No âmbito do seu segundo fundamento, baseado no facto de o financiamento público das pensões não compensar os custos suportados pela Deutsche Post, a República Federal da Alemanha apresenta uma argumentação com três aspetos, sendo os dois primeiros destinados a refutar a afirmação de que os custos compensados com o auxílio do financiamento público das pensões oneram normalmente o orçamento das empresas, e o terceiro relativo à questão da compensação de uma desvantagem estrutural.

130    Importa, a título preliminar, indicar novamente (v. n.° 110 supra) que, no acórdão de 16 de março de 2004, Combus (T‑157/01, EU:T:2004:76, n.os 6, 7, 56 e 57), o Tribunal Geral considerou que uma medida pela qual um Estado‑Membro libertava uma empresa, inicialmente obrigada pela lei a continuar a empregar os funcionários do seu antecessor jurídico e, em contrapartida, a indemnizar o referido Estado pelos vencimentos e pelas pensões que este continuava a pagar, da «desvantagem estrutural» que constituía «o estatuto privilegiado e dispendioso d[esse]s funcionários» relativamente ao dos empregados dos concorrentes privados da referida empresa não constituía, em princípio, uma intervenção que aliviasse os encargos que normalmente oneram o orçamento de uma empresa e, portanto, um auxílio. Com efeito, não se pode alegar que faz parte dos encargos normais de uma empresa o custo de um regime de reforma que exceda o direito comum imposto pela legislação de um Estado‑Membro, quer se trate, como no processo na origem do acórdão de 16 de março de 2004, Combus (T‑157/01, EU:T:2004:76), da legislação aplicável aos funcionários dinamarqueses ou, como no presente processo, da que regula as pensões dos funcionários que, historicamente, foram recrutados pela Deutsche Bundespost para assegurar o serviço público postal, tendo sido equiparados aos funcionários públicos alemães.

131    Saliente‑se que, decidindo assim, o Tribunal Geral não pretendeu tomar em consideração apenas a intenção do legislador nacional (ou seja, libertar o operador em causa de uma desvantagem estrutural), independentemente dos seus efeitos. Deste modo, o Tribunal Geral especificou expressamente que o Estado dinamarquês «teria podido […] obter o mesmo resultado», isto é, o mesmo efeito, «através da readmissão dos referidos funcionários na Administração Pública, sem pagamento de uma bonificação específica» (acórdão de 16 de março de 2004, Combus, T‑157/01, EU:T:2004:76, n.° 57). A jurisprudência resultante desse acórdão não entra, pois, em contradição com a referida no n.° 108 supra, que recorda que o artigo 107.°, n.° 1, TFUE não distingue em função das causas ou dos objetivos das intervenções estatais, definindo‑as antes em função dos seus efeitos (v., neste sentido, acórdãos de 3 de março de 2005, Heiser, C‑172/03, EU:C:2005:130, n.° 46, de 9 de junho de 2011, Comitato «Venezia vuole vivere» e o./Comissão, C‑71/09 P, C‑73/09 P e C‑76/09 P, EU:C:2011:368, n.os 94 e 95; e de 16 de setembro de 2013, British Telecommunications e BT Pension Scheme Trustees/Comissão, T‑226/09 e T‑230/09, não publicado, EU:T:2013:466, n.° 74).

132    Por conseguinte, seguindo a mesma lógica que a que regula a jurisprudência resumida nos n.os 108 e 109 supra, para determinar se a medida em causa confere à Deutsche Post uma vantagem na aceção do artigo 107.°, n.° 1, TFUE, há que examinar se ela tem por efeito reforçar a posição desta última relativamente à das empresas que lhe fazem concorrência. No âmbito desta análise, há que ter em conta eventuais obrigações que recaem sobre a Deutsche Post por força da legislação nacional relativa ao financiamento das pensões que não recaem sobre os concorrentes desta empresa. Com efeito, tal como a imposição de uma obrigação de serviço público exclui que o pagamento de uma compensação que não seja superior ao necessário para cobrir os custos causados pela sua execução seja considerada como conferindo uma vantagem na aceção do artigo 107.°, n.° 1, TFUE, a imposição, por força de um ato de poder público, de uma obrigação de suportar o custo integral das pensões do pessoal dotado de estatuto de funcionário em vez de contribuir para o seguro de pensões exclui que o financiamento desse custo seja qualificado de vantagem, desde que tal financiamento não exceda o que é necessário para colocar as obrigações da Deutsche Post em situação de igualdade com as obrigações das empresas que lhe fazem concorrência. A existência de uma vantagem pode, pois, ser admitida unicamente se o financiamento em questão exceder esse limiar.

133    Conforme resulta da petição e da réplica, a República Federal da Alemanha alega que a Comissão não efetuou nenhum exame concreto para determinar se os custos assumidos pelo financiamento público das pensões faziam parte dos que oneram normalmente o orçamento das empresas e que a Comissão efetuou um início de comparação com os encargos que uma empresa deve normalmente liquidar apenas no âmbito da análise relativa à compatibilidade da medida em causa com o mercado interno.

134    Alega ainda que a simples afirmação de que os encargos relativos às pensões constituem custos normais da exploração de uma empresa não pode bastar tratando‑se do financiamento público das pensões de antigos funcionários e que era necessário que a Comissão especificasse se a comparação devia ser efetuada com uma empresa que não empregasse trabalhadores privados ou se pressupunha que esta última contasse com funcionários entre os seus empregados atuais ou já aposentados.

135    Para o Estado‑Membro em causa, esta omissão constitui um erro de apreciação que justifica, por si só, a anulação da decisão impugnada: com efeito, uma análise concreta teria permitido demonstrar que os encargos sociais relativos aos funcionários da Deutsche Post não faziam parte dos custos que normalmente oneram o orçamento das empresas.

136    Estes custos correspondem, em seu entender, a uma desvantagem estrutural na aceção do acórdão de 16 de março de 2004, Combus (T‑157/01, EU:T:2004:76), que a Comissão infringiu.

137    A República Federal da Alemanha alega, por último, o facto de que as subvenções relativas às pensões não libertaram a Deutsche Post do pagamento, primeiro, do montante fixo anual correspondente 2 045 milhões de euros e, depois, do montante correspondente a 33% do total dos salários brutos dos funcionários da Deutsche Post em atividade, dado que a Deutsche Post nunca teve tal obrigação, que incumbia somente à Deutsche Bundespost.

138    A Comissão, por sua vez, argumentou, incluindo na audiência, que tinha efetivamente procedido à análise concreta da questão de saber se os custos de que a Deutsche Post tinha sido liberta pelo § 16 da lei relativa ao estatuto dos trabalhadores dos correios eram custos normalmente imputados a uma empresa. Recordou que, segundo a jurisprudência, o custo do trabalho fazia parte dos custos normais de uma empresa, o qual também abrangia o pagamento das pensões de reforma.

139    Segundo a Comissão, o facto de terem sido efetuados recrutamentos, nos anos anteriores a 1995, em condições distintas das concedidas a partir dessa data aos novos funcionários da Deutsche Post não tem repercussões sobre a obrigação imposta a esta última de respeitar, quanto ao pessoal afetado, isto é, os funcionários, as condições que lhes tinham sido concedidas. Pelas mesmas razões, a forma que assume o custo das pensões de reforma é indiferente no presente caso dado que se trata simplesmente de determinar se o referido custo faz parte dos custos que uma empresa normalmente deve assumir.

140    Contrapõe à República Federal da Alemanha que os métodos propostos por esta última para determinar os custos em questão não são compatíveis com a jurisprudência e alega que o acórdão de 16 de março de 2004, Combus (T‑157/01, EU:T:2004:76), não foi confirmado pela jurisprudência nem pela prática decisória da Comissão.

141    Conclui recordando que, segundo jurisprudência constante, a existência de um auxílio deve ser avaliada em função dos efeitos das intervenções estatais e não segundo as suas causas ou objetivos.

142    A este propósito, saliente‑se que, como confirmou a Comissão na contestação e no âmbito das respostas às questões que lhe foram colocadas na audiência, essa instituição se limitou, nos considerandos 262 e 263 da decisão impugnada, a considerar que existia uma vantagem pelo simples facto de o Estado federal alemão assumir parcialmente o custo das pensões de reforma dos antigos funcionários, quando, segundo aquela, tal assunção do encargo não existia anteriormente. Mas, presumindo que esta afirmação é exata, facto de que é permitido duvidar, dado que, se, na realidade, não existiam subvenções diretas por parte do Estado federal alemão, existiam, no entanto, compensações indiretas, isto é, compensações por parte da Postbank e da Telekom de que beneficiava a Postdienst, antecessora jurídica da Deutsche Post, para colmatar os seus prejuízos, o que, também nesse caso, foi demonstrado na audiência, a referida afirmação não podia bastar para provar que a Deutsche Post era beneficiada relativamente aos seus concorrentes.

143    Com efeito, é perfeitamente possível deduzir desta evolução que, na sequência da aplicação da medida em causa, a Deutsche Post é menos prejudicada do que antes da adoção da referida medida, mas que continua a sê‑lo relativamente aos seus concorrentes, ou que se encontra em igualdade com eles, sem ser, por consequência, beneficiária de uma vantagem. Com efeito, como expõe a Comissão nos considerandos 294 e 297 da decisão impugnada, o encargo que implica o custo integral das pensões de reforma imposto à Deutsche Post antes de 1995, em concreto num ambiente de monopólio, é tal que a empresa em questão não teria tido a possibilidade de enfrentar os seus concorrentes e, consequentemente, teria tido de sair do mercado na falta de medidas que a libertassem parcialmente desse encargo.

144    Neste contexto, resulta do exposto nos n.os 108, 109 e 132 supra que o conceito de «encargos que normalmente oneram o orçamento de uma empresa» não inclui os encargos impostos a uma única empresa por força de disposições legislativas que derrogam as regras geralmente aplicáveis às empresas concorrentes e que têm por efeito impor‑lhe obrigações que não impendem sobre estas últimas. Em contrapartida, os «encargos que normalmente oneram o orçamento de uma empresa» são os decorrentes do regime geral.

145    A posição exposta no considerando 263 da decisão impugnada, segundo a qual o único elemento determinante para efeitos da apreciação da existência de uma vantagem é que «as empresas suport[e]m, de uma forma ou de outra, o total dos custos com pensões» e que, a este respeito, o encargo que recaiu sobre a Deutsche Post foi moderado, enferma, pois, de um erro de direito. Além disso, se, como argumenta a Comissão, o conceito de «encargos que normalmente oneram o orçamento de uma empresa» devesse ser definido com referência às regras específicas respeitantes à empresa alegadamente beneficiária, nada impede que se considere que a medida em causa que modera os encargos da Deutsche Post faz parte dessas regras, o que excluiria a existência de uma vantagem.

146    O mesmo acontece, por via de consequência, com a posição exposta nos considerandos 267 e 268 da decisão impugnada, segundo a qual o facto de a Deutsche Post estar sujeita a obrigações legais em matéria de financiamento das pensões do seu pessoal mais significativas do que as que oneram os seus concorrentes é inoperante na perspetiva da existência de uma vantagem, sendo pertinente unicamente no âmbito da apreciação da compatibilidade da medida com o mercado interno.

147    A Comissão deveria pois ter verificado, desde a apreciação do conceito de vantagem, se, ao assumir a diferença entre, por um lado, a quantia fixa estabelecida entre 1995 e 1999 e o montante total do custo das pensões dos antigos funcionários da Deutsche Post e, por outro, o montante correspondente a 33% dos salários brutos dos funcionários ativos da Deutsche Post e esse mesmo montante total, o Estado federal tinha conferido a esta última uma vantagem económica relativamente aos seus concorrentes.

148    Resulta, com efeito, da jurisprudência, em conformidade com o exposto nos n.os 108, 109 e 132 supra, que é precisamente nesta fase da aplicação do artigo 107.°, n.° 1, TFUE, em concreto a da prova da existência de uma vantagem, que a Comissão deve demonstrar, por exemplo, que uma isenção parcial da obrigação de pagar cotizações para o fundo de proteção dos aposentados constitui, para um antigo operador histórico, uma vantagem económica seletiva (v., neste sentido, acórdão de 16 de setembro de 2013, British Telecommunications e BT Pension Scheme Trustees/Comissão, T‑226/09 e T‑230/09, não publicado, EU:T:2013:466, n.° 46).

149    Em caso de sucessão de medidas destinadas a compensar os encargos impostos a uma única empresa por força de disposições legislativas que derrogam as regras geralmente aplicáveis às empresas concorrentes e que têm por efeito impor‑lhe obrigações que não oneram estas últimas, a Comissão deve, como é evidente, na análise de uma dessas medidas na perspetiva do direito dos auxílios de Estado, tomar em consideração os efeitos produzidos pelas medidas anteriores, a fim de determinar se a última medida que lhe foi submetida, na perspetiva das que tinha já analisado, constitui ou não uma sobrecompensação, o que permite, por consequência, considerar essa sobrecompensação, se a mesma for demonstrada, como constitutiva de uma vantagem económica, recordando‑se que é sempre possível ao Estado‑Membro, no quadro da análise de uma nova medida, demonstrar que esta última não leva a que se ultrapasse o limiar a partir do qual a empresa que dele aufere é beneficiada relativamente às empresas concorrentes. Importa, no entanto, recordar que a hipótese de uma sucessão de disposições, analisadas pela Comissão à medida que são notificadas pelo Estado‑Membro em causa, não corresponde ao caso em apreço, dado que essa instituição só procedeu, no presente processo, à análise do financiamento público das pensões no seguimento de denúncias de empresas concorrentes.

150    No presente caso, se a Comissão procurou demonstrar a existência efetiva de uma vantagem económica seletiva, e não admiti‑la por simples postulado, fê‑lo, como ela própria reconheceu na contestação e confirmou na audiência, apenas na fase da análise da compatibilidade do auxílio com o mercado interno, nos considerandos 288 a 410 da decisão impugnada. Ora, resulta do que antecede que só os eventuais montantes que excederam o necessário para alinhar o custo das pensões impostas à Deutsche Post antes de 1995 pelo custo suportado pelos seus concorrentes tenham sido suscetíveis de conferir a esta última essa vantagem e, consequentemente, de constituir um auxílio de Estado na aceção do artigo 107.°, n.° 1, TFUE.

151    A República Federal da Alemanha, como recordado no n.° 133 supra, ao salientar que a Comissão «efetuou um início de comparação com os encargos que uma empresa deve ‘normalmente’ liquidar [relativamente aos assalariados de direito privado em conformidade com o direito social alemão] apenas no âmbito da análise relativa à compatibilidade da medida em causa com o mercado interno», demonstrou de forma juridicamente bastante que a Comissão não tinha observado a jurisprudência referida no n.° 148 supra. Importa salientar que a referida jurisprudência, longe de se limitar a recordar uma exigência de ordem formal, salienta os dois momentos que deve comportar a análise de uma medida à luz do disposto no artigo 107.° TFUE, aspeto que tem associadas consequências muito importantes.

152    Com efeito, num primeiro momento, conforme indicado no n.° 104 supra, o juiz da União exerce uma fiscalização exaustiva no que diz respeito à questão de saber se uma medida cai no âmbito de aplicação do artigo 107.°, n.° 1, TFUE (acórdãos de 22 de dezembro de 2008, British Aggregates/Comissão, C‑487/06 P, EU:C:2008:757, n.° 111, e de 16 de setembro de 2013, British Telecommunications e BT Pension Scheme Trustees/Comissão, T‑226/09 e T‑230/09, não publicado, EU:T:2013:466, n.° 39). Daí resulta que incumbe ao juiz da União verificar se os factos invocados pela Comissão são materialmente exatos e se são de natureza a demonstrar que todas as condições que permitem a qualificação como «auxílio» na aceção do artigo 107.°, n.° 1, TFUE estão preenchidas (acórdão de 1 de julho de 2008, Chronopost e La Poste/UFEX e o., C‑341/06 P e C‑342/06 P, EU:C:2008:375, n.° 142). Além disso, afirmou reiteradamente que o artigo 107.°, n.° 3, alínea c), TFUE conferia à Comissão um poder discricionário cujo exercício implica apreciações de ordem económica e social (acórdãos de 20 de setembro de 2007, Fachvereinigung Mineralfaserindustrie/Comissão, T‑375/03, não publicado, EU:T:2007:293, n.° 138, e de 27 de setembro de 2012, Itália/Comissão, T‑257/10, não publicado, EU:T:2012:504, n.° 133), do qual resulta que a fiscalização que exerce sobre essas apreciações incide sobre a verificação do respeito das regras processuais, o caráter suficiente da fundamentação, a exatidão material dos factos e a inexistência de erro manifesto de apreciação e de desvio de poder (acórdão de 13 de setembro de 1995, TWD/Comissão, T‑244/93 e T‑486/93, EU:T:1995:160, n.° 82).

153    Num segundo momento, a concessão de um auxílio ilegal pode implicar, para o seu beneficiário, além da obrigação de reembolsar o referido auxílio, a obrigação de pagamento dos juros relativos ao período de duração da ilegalidade ou a indemnização dos seus concorrentes (v., por analogia, acórdão de 12 de fevereiro de 2008, CELF e ministre de la Culture et de la Communication, C‑199/06, EU:C:2008:79, n.° 55).

154    Resulta de tudo o que antecede que a República Federal da Alemanha tem fundamento para defender que a simples afirmação de que os encargos com pensões fazem parte dos custos que oneram normalmente o orçamento de uma empresa não basta para demonstrar, no caso em apreço, a existência de uma vantagem económica real a favor da Deutsche Post. A Comissão, à qual incumbia o ónus de provar a referida vantagem, não cumpriu essa obrigação, cometendo assim um erro de direito.

155    Por consequência, o segundo fundamento deve ser julgado procedente, com exceção dos argumentos que contém relativos à observância do dever de fundamentação (v. n.° 66 supra).

156    Esta única constatação basta para proceder à anulação dos artigos 1.° e 4.° a 6.° da decisão impugnada e para dar provimento ao recurso da República Federal da Alemanha, sem que seja necessário conhecer do oitavo a décimo fundamentos nem das partes restantes do terceiro, sexto e sétimo fundamentos.

 Quanto às despesas

157    Nos termos do artigo 134.°, n.° 1, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a Comissão sido vencida, há que condená‑la nas despesas, em conformidade com os pedidos da República Federal da Alemanha.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Oitava Secção)

decide:

1)      São anulados os artigos 1.° e 4.° a 6.° da Decisão 2012/636/UE da Comissão, de 25 de janeiro de 2012, relativa à medida C 36/07 (ex NN 25/07) da Alemanha em favor da Deutsche Post AG.

2)      A Comissão Europeia é condenada nas despesas.

Gratsias

Kancheva

Wetter

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 14 de julho de 2016.

Assinaturas


* Língua do processo: alemão.