Language of document : ECLI:EU:T:2004:27

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Segunda Secção)

28 de Janeiro de 2004 (*)

«Marca comunitária – Marca tridimensional – Forma de um acondicionamento de bebida – Bolsa que se mantém na vertical – Motivos absolutos de recusa – Artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento (CE) n.° 40/94 – Necessidade de disponibilidade do sinal»

Nos processos apensos T‑146/02 a T‑153/02,

Deutsche SiSi‑Werke GmbH & Co. Betriebs KG, com sede em Eppelheim (Alemanha), representada por A. Franke, advogado,

recorrente,

contra

Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos), representado por G. Schneider, na qualidade de agente,

recorrido,

que têm por objecto pedidos de anulação das decisões da Segunda Câmara de Recurso do Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) de 28 de Fevereiro de 2002 (processos R 719/1999‑2 a R 724/1999‑2, R 747/1999‑2 e R 748/1999‑2), relativas ao registo de marcas tridimensionais (bolsas que se mantêm na vertical),

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Segunda Secção),

composto por: N. J. Forwood, presidente, J. Pirrung e A. W. H. Meij, juízes,

secretário: D. Christensen, administradora,

vistas as petições apresentadas na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 8 de Maio de 2002,

visto o despacho de 9 de Julho de 2002 que apensou os processos T‑146/02 a T‑153/02,

vista a contestação apresentada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 20 de Setembro de 2002,

após a audiência de 23 de Setembro de 2003,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

1       Em 8 de Julho de 1997, a recorrente apresentou oito pedidos de marca comunitária ao Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (a seguir «Instituto»), ao abrigo do Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, de 20 de Dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (JO 1994, L 11, p. 1), alterado.

2       As marcas tridimensionais cujo registo foi pedido são constituídas por diferentes bolsas para bebidas que se mantêm na vertical. Tais bolsas de forma bombeada com fundo alargado têm, segundo os pedidos, uma face que se aproxima do triângulo alongado ou da oval, nalguns casos com concavidades laterais.

3       Os produtos e serviços para os quais o registo das marcas foi pedido incluem‑se nas classes 1, 3, 5, 6, 16, 20, 29, 30, 32, 33, 39 e 40, na acepção do Acordo de Nice respeitante à Classificação Internacional dos Produtos e Serviços com vista ao Registo das Marcas, de 15 de Junho de 1957, tal como revisto e modificado.

4       Por decisões de 24 e 27 de Setembro de 1999, o examinador rejeitou os oito pedidos, nos termos do artigo 38.° do Regulamento n.° 40/94, com fundamento em as marcas pedidas serem desprovidas de qualquer carácter distintivo na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94.

5       Em 11 de Novembro de 1999, a recorrente interpôs no Instituto, ao abrigo do artigo 59.° do Regulamento n.° 40/94, oito recursos contra as decisões do examinador, limitando os seus pedidos de marca aos produtos seguintes: «cervejas, águas minerais e gasosas e outras bebidas não alcoólicas; bebidas de fruta e sumos de fruta; xaropes e outras preparações para fazer bebidas», englobados na classe 32; «bebidas alcoólicas (com excepção de cervejas)», englobados na classe 33.

6       Por decisões de 28 de Fevereiro de 2002 (a seguir «decisões impugnadas»), notificadas à recorrente em 11 de Março de 2002, a Câmara de Recurso negou provimento aos recursos com o fundamento de que as marcas requeridas não eram distintivas na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94.

7       Em substância, a Câmara de Recurso considerou que os consumidores não reconheceriam nas bolsas que se mantêm na vertical qualquer indicação de origem comercial, mas apenas uma forma de acondicionamento. Acrescentou que, no interesse dos concorrentes, dos fabricantes de embalagens e dos produtores de bebidas, este tipo de embalagem não podia ser objecto de monopólio.

8       Por requerimento apresentado ao Instituto em 6 de Maio de 2002, a recorrente limitou os seus pedidos de marca aos produtos seguintes: «bebidas à base de sumo de fruta e sumos de fruta», englobados na classe 32.

 Pedidos das partes

9       A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–      anular as decisões impugnadas;

–      condenar o Instituto nas despesas.

10     O Instituto conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–      negar provimento aos recursos;

–      condenar a recorrente nas despesas.

 Questão de direito

 Quanto ao objecto do litígio

11     Interrogado sobre este ponto, o Instituto confirmou o carácter regular e efectivo da limitação da lista dos produtos em causa efectuada pela recorrente em 6 de Maio de 2002, posteriormente à adopção das decisões impugnadas.

12     O Tribunal constata que, na audiência, as partes acordaram em considerar que, em razão dessa limitação, se devia entender que pelos presentes recursos se pede a anulação das decisões impugnadas, apenas na medida em que estas não deferem as pretensões da recorrente no que respeita aos «sumos de fruta e bebidas à base de sumo de fruta», englobados na classe 32.

 Quanto à base jurídica das decisões impugnadas

13     A recorrente alega que a Câmara de Recurso, ao fundamentar as suas decisões na necessidade de evitar um monopólio, se baseou na necessidade de manter disponíveis determinados sinais e, consequentemente, no artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94.

14     O Tribunal realça que a conclusão da recorrente sobre a base jurídica da necessidade de disponibilidade está errada. Por um lado, o artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 é a única base jurídica indicada nas decisões impugnadas. Por outro lado, nenhuma relação directa e exclusiva pode ser estabelecida entre o risco de monopolização e um motivo absoluto de recusa específico. Pelo contrário, por força de uma jurisprudência constante, os motivos absolutos de recusa constantes do artigo 7.°, n.° 1, alíneas b) a e), do Regulamento n.° 40/94 traduzem a preocupação do legislador comunitário de evitar o reconhecimento, a favor de um operador, de direitos exclusivos que poderiam entravar a concorrência no mercado dos produtos ou serviços em causa (v., a respeito do motivo de recusa ligado ao carácter distintivo da marca, acórdão do Tribunal de Justiça de 6 de Maio de 2003, Libertel, C‑104/01, Colect., p. I‑3793, n.° 60).

15     Contudo, pelas mesmas razões, a rejeição do fundamento que a recorrente baseou no artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94 não implica, por si só, a rejeição das suas acusações relativas à aplicação no caso vertente da necessidade de disponibilidade. Tais acusações mantêm‑se, na medida em que dizem respeito à aplicação legal deste conceito no quadro do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94.

 Quanto ao carácter distintivo das marcas pedidas

 Argumentos das partes

16     A recorrente considera, em substância, que o acondicionamento de sumos de fruta e de bebidas à base de sumo de fruta em bolsas que se mantêm na vertical não é usual. O carácter inabitual deste tipo de embalagem para os produtos em causa afasta a necessidade de manter disponíveis os sinais em causa e confere às marcas requeridas um carácter distintivo.

17     Acrescenta que o consumidor está habituado a que a embalagem das bebidas seja utilizada em campanhas de comercialização. O mesmo compreende então, quando a isso há lugar, as embalagens de bebidas como indicações da origem comercial do produto.

18     A recorrente admite a existência de um interesse geral na disponibilidade dos sinais que, em razão de serem conformes ao modo habitual de designar os produtos ou os serviços em causa ou as suas características, não permitem preencher a função de identificação da empresa que os coloca no mercado. Em contrapartida, todos os sinais não usuais, nomeadamente a representação gráfica da forma de um produto, podem ser registados enquanto marca comunitária. Sublinha que, face aos critérios fixados pelo acórdão Libertel, referido no n.° 14 supra, o interesse geral prosseguido pela necessidade de disponibilidade não é posto em causa no caso vertente. Com efeito, por um lado, o sector abrangido é particularmente restrito, uma vez que apenas incide sobre as bebidas à base de sumo de fruta e sobre os sumos de fruta e, por outro, os sinais reivindicados não pertencem a qualquer categoria restrita, uma vez que o número de formas possíveis de embalagem para bebidas é infinito.

19     A recorrente observa que, de acordo com o artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, basta um mínimo de carácter distintivo para que uma marca possa ser registada. Assim, não poderá ser negado o carácter distintivo a uma forma tridimensional se ela for inabitual no sector considerado.

20     No que respeita ao próprio produto, a recorrente aduz que o acondicionamento de sumos de fruta e de bebidas à base de sumo de fruta em bolsas que se mantêm na vertical não é usual. Com efeito, como a Câmara de Recurso admite, estas bebidas são mais frequentemente acondicionadas e vendidas em garrafas ou, menos frequentemente, em latas ou em embalagens de cartão. A circunstância de esta situação de facto perdurar apesar do sucesso comercial já antigo da recorrente no que respeita às bolsas que se mantêm na vertical demonstra a ausência de interesse geral na utilização dessas bolsas para as bebidas. Além disso, segundo a recorrente, as bolsas que se mantêm na vertical com a aparência requerida são totalmente inabituais, não podendo ser qualificadas de simples variante desse tipo de bolsa. São, além do mais, tecnicamente complexas de realizar e caras, não tendo vantagens relativamente às embalagens de bebidas habituais. Além disso, a sua aparência original, principalmente pela sua forma e pelo seu aspecto metálico devido a uma técnica especial, dá às marcas requeridas um aspecto único.

21     Para o consumidor médio, as bolsas que se mantêm na vertical para as quais as marcas foram pedidas são suficientemente originais para que nelas se possa reconhecer uma bebida não alcoólica bem precisa que aquele poderá atribuir a um determinado fabricante.

22     A recorrente considera que os artigos encontrados na Internet e invocados pela Câmara de Recurso nas decisões impugnadas não demonstram o carácter usual das bolsas que se mantêm na vertical para os sumos de fruta ou para as bebidas à base de sumo de fruta. Estes artigos não adiantam qualquer elemento relativamente à precisão actual de uma necessidade de disponibilidade, uma vez que nenhum deles diz respeito ao mercado europeu. Para mais, esses artigos – alguns dos quais remontam há vários anos – também não permitem justificar uma necessidade de disponibilidade futura.

23     A recorrente considera que, tendo em conta a prática do Instituto, a Câmara de Recurso aplicou com demasiada severidade, no caso presente, a exigência de originalidade de uma marca que representa um acondicionamento de bebida. A este respeito, a recorrente invoca, em especial, dois registos comunitários relativos à garrafa «Granini» e à «Brunnenflasche» e um registo relativo a uma caixa metálica ondulada para bebidas.

24     A recorrente invoca, finalmente, o registo pelo Deutsches Patent‑ und Markenamt (instituto alemão de marcas e patentes) de quatro das marcas presentemente requeridas. Precisa, a este respeito, que, embora o Instituto não esteja vinculado por estes registos, eles deveriam, em qualquer caso, ser examinados a fundo aquando da apreciação das marcas requeridas, na medida em que o Deutsches Patent‑ und Markenamt aplica a legislação em conformidade com a Primeira Directiva 89/104/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1988, que harmoniza as legislações dos Estados‑Membros em matéria de marcas (JO 1989, L 40, p. 1), directiva interpretada uniformemente pelos órgãos jurisdicionais comunitários e análoga, quanto ao ponto em consideração, ao Regulamento n.° 40/94.

25     O Instituto esclarece que a Câmara de Recurso se limitou a completar a sua apreciação do carácter distintivo das marcas requeridas com reparos adicionais sobre o risco de monopolização, sem deles fazer uma condição de aplicação do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94.

26     Segundo o Instituto, no caso de produtos que não podem ser comercializados sem acondicionamento (líquidos ou produtos perecíveis), e em especial quanto aos produtos de consumo corrente, uma função de indicação da origem comercial pressupõe que o acondicionamento do produto se distinga nitidamente dos acondicionamentos comparáveis utilizados para esse produto. No que respeita às marcas requeridas no caso vertente, o Instituto considera que as diferenças entre as bolsas cuja representação é requerida e as demais bolsas que se mantêm na vertical presentes no mercado não são suficientes para lhes conferir um carácter distintivo. O carácter usual deste tipo de embalagem para os produtos alimentares em geral e para as bebidas em especial é demonstrado pela consulta dos sítios Internet referidos pela Câmara de Recurso e confirmado pela consulta de outros sítios.

27     O Instituto alega que a circunstância de a recorrente utilizar desde há muito as bolsas cuja representação é pedida não pode ser tida em conta no quadro do artigo 7.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94, disposição não invocada pela recorrente.

28     No que respeita aos registos nacionais e às decisões do Instituto referidos pela recorrente, o Instituto recorda, nomeadamente, que eles não o vinculam juridicamente.

 Apreciação do Tribunal

29     Nos termos do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, é recusado o registo das «marcas desprovidas de carácter distintivo».

30     As marcas que o artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 refere como desprovidas de carácter distintivo são as que são incapazes de exercer a função essencial da marca, que é a de identificar a origem comercial do produto ou do serviço.

31     Como resulta da jurisprudência, as marcas a que o artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 se refere são, designadamente, aquelas que, do ponto de vista do público pertinente, são comummente utilizadas, no comércio, para a apresentação dos produtos e dos serviços em causa ou a respeito das quais existem, pelo menos, indícios concretos que permitam concluir que são susceptíveis de ser utilizadas desta maneira [acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 2 de Julho de 2002, SAT. 1/IHMI (SAT. 2), T‑323/00, Colect., p. II‑2839, n.° 37, e de 5 de Março de 2003, Unilever/IHMI (Pastilha oval), T‑194/01, Colect., p. II‑0000, n.° 39].

32     Há que recordar que o interesse que podem ter os concorrentes do requerente de uma marca tridimensional constituída pela apresentação de um produto em poderem escolher livremente a forma e o desenho dos seus próprios produtos não é, em si mesmo, um motivo susceptível de justificar a recusa de registar essa marca nem um critério de apreciação, bastante por si só, do carácter distintivo da marca. Ao excluir o registo de sinais desprovidos de carácter distintivo, o artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 só protege o interesse na disponibilidade das diferentes variantes da apresentação de um produto, na medida em que a apresentação do produto cujo registo é pedido não possa, a priori e independentemente da sua utilização na acepção do artigo 7.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94, desempenhar a função de marca, consistente em permitir ao público em causa distinguir esse produto dos que têm outra origem comercial.

33     O carácter distintivo de um sinal apenas pode ser apreciado, por um lado, por referência aos produtos ou aos serviços relativamente aos quais o registo é solicitado e, por outro, por referência à percepção que dele tem o público relevante.

34     No que respeita aos presentes recursos, há que precisar que as marcas requeridas são constituídas pela aparência da embalagem dos produtos referidos, isto é, pela representação das diversas bolsas que se mantêm na vertical destinadas a acondicionar sumos de fruta e bebidas à base de sumo de fruta.

35     A Câmara de Recurso considerou, em cada uma das decisões impugnadas, que «o adquirente de bebidas, confrontado com a referida bolsa que se mantém na vertical, não a verá em primeiro lugar como referência a um fabricante, antes a compreendendo unicamente como uma forma de recipiente contendo a bebida que pretende adquirir» (decisões impugnadas, n.° 16, in fine), que todas as representações reivindicadas correspondiam a um recipiente usual dos produtos para os quais a recorrente pede o registo (decisões impugnadas, n.° 22; decisão R 722/1999‑2, n.° 21) e que o consumidor médio as compreenderia como variantes suplementares das bolsas que se mantêm na vertical (decisões impugnadas, n.° 20, salvo quanto à decisão R 722/1999‑2). Considerou ainda que, atendendo à importância crescente que este género de bolsas reveste para as indústrias da embalagem e das bebidas, uma bolsa que se mantém na vertical como as que estão em questão no caso vertente não pode ser monopolizada por um único fabricante (decisões impugnadas, n.° 20; decisão R 722/1999‑2, n.° 19).

36     O público em causa, no que se refere às marcas requeridas, é o de todos os consumidores finais. Com efeito, as bebidas à base de sumo de fruta e os sumos de fruta são destinados a um consumo corrente. Há assim que apreciar o carácter distintivo das marcas pedidas tendo em consideração a presumível expectativa de um consumidor médio, normalmente informado e razoavelmente atento e avisado (v., por analogia, acórdão do Tribunal de Justiça de 16 de Julho de 1998, Gut Springenheide e Tusky, C‑210/96, Colect., p. I‑4657, n.os 30 a 32).

37     A este respeito, há que recordar que a percepção do público visado não é necessariamente a mesma no caso de uma marca tridimensional constituída pela aparência do próprio produto e no caso de uma marca nominativa, figurativa ou tridimensional que não seja constituída por essa aparência. Com efeito, se é certo que o público está habituado a apreender imediatamente estas últimas marcas como sinais identificadores do produto, já o mesmo não acontece necessariamente quando o sinal se confunde com a aparência do próprio produto (v., por analogia, acórdão Libertel, referido no n.° 14 supra, n.° 65; acórdão Pastilha oval, referido no n.° 31, supra, n.° 45).

38     Constituindo a embalagem de um produto líquido um imperativo da comercialização, o consumidor médio atribuir‑lhe‑á em primeiro lugar uma simples função de acondicionamento. Ora, um sinal que desempenha funções diferentes das da marca só é distintivo na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 se puder ser imediatamente percebido como uma indicação da origem comercial dos produtos ou serviços em causa, a fim de permitir ao público relevante distinguir sem confusão possível os produtos ou serviços do titular da marca dos de outra proveniência comercial [acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 5 de Dezembro de 2002, Sykes Enterprises/IHMI (REAL PEOPLE, REAL SOLUTIONS), T‑130/01, Colect., p. II‑5179, n.° 20]. Deste modo, o consumidor médio só apreenderá a forma de uma embalagem de bebida como uma indicação da origem comercial do produto se essa forma for susceptível de ser imediatamente apreendida como uma tal indicação.

39     A recorrente começa por sustentar que a embalagem das bebidas à base de sumo de fruta e dos sumos de fruta em bolsas que se mantêm na vertical é, em si mesma, inabitual.

40     A este respeito, a Câmara de Recurso constatou suficientemente, de um ponto de vista jurídico, com base nos sítios Internet indicados nas decisões impugnadas, que, por um lado, as bolsas que se mantêm na vertical já eram utilizadas para a embalagem de determinadas bebidas e que, por outro, esta utilização era susceptível de se generalizar quanto a todos os tipos de bebidas (decisões impugnadas, n.os 17 a 19).

41     As críticas da recorrente relativas à pertinência geográfica ou temporal dos exemplos encontrados na Internet não podem invalidar a pertinência de tais exemplos. Com efeito, a síntese das informações encontradas nos diferentes sítios Internet referidos demonstra que as bolsas deste tipo são actualmente utilizadas no mundo para a embalagem de bebidas, nomeadamente para sumos de fruta, e que tais bolsas existem na Comunidade para a embalagem de líquidos alimentares. As informações assim acessíveis constituem indícios concretos do facto de as bolsas que se mantêm na vertical serem comummente utilizadas, no comércio, para a apresentação dos produtos em causa ou, pelo menos, de serem susceptíveis de ser utilizadas dessa maneira.

42     Uma vez que este modo de acondicionamento é utilizado para líquidos alimentares em geral, nomeadamente as bebidas, ele não possui um carácter inabitual suficientemente pronunciado para que o consumidor médio apreenda este acondicionamento, em si mesmo, no sentido de indicar a origem comercial particular de um produto desta categoria. Esta ausência de carácter distintivo deste tipo de embalagem para os líquidos alimentares cobre cada um dos produtos que pertence a esta categoria e, em especial, as bebidas que estão em causa no caso vertente. O desenvolvimento previsível deste modo de acondicionamento confirma, se necessário fosse, o carácter comum da sua utilização.

43     No que se refere ao argumento da recorrente baseado na sua utilização antiga e não imitada do tipo de embalagem em causa para os produtos referidos, há que sublinhar que a utilização, mesmo exclusiva, de um sinal não lhe confere um carácter distintivo intrínseco. Com efeito, de acordo com a economia do artigo 7.° do Regulamento n.° 40/94, o uso de um sinal só pode ser tido em consideração no quadro do n.° 3 desse artigo com o fim de demonstrar a existência de um carácter distintivo adquirido. Não tendo a recorrente invocado um carácter distintivo adquirido pelas marcas requeridas em razão do seu uso no conjunto da Comunidade, o argumento não pode vingar.

44     A recorrente aduz seguidamente que as representações reivindicadas possuem elementos de design que não se limitam a características usuais ou funcionais. A este respeito, invoca principalmente, para além de uma série de elementos correspondentes a uma descrição minuciosa das bolsas cuja representação é pedida, a originalidade da forma essencial dessas bolsas, consistente, segundo os casos, numa oval ou num triângulo, e o seu aspecto metálico.

45     Há, portanto, que examinar a impressão de conjunto produzida pela aparência das bolsas em causa (v., por analogia, acórdão do Tribunal de Justiça de 11 de Novembro de 1997, SABEL, C‑251/95, Colect., p. I‑6191, n.° 23), o que não é incompatível com o exame sucessivo dos diferentes elementos de apresentação utilizados (acórdão Pastilha oval, referido no n.° 31 supra, n.° 54).

46     A este respeito, há que começar por constatar que as representações reivindicadas correspondem a um determinado tipo de acondicionamento dos líquidos. Os exemplos de bolsas que podem manter‑se na vertical fornecidos nas decisões impugnadas demonstram que, muito geralmente, tais bolsas são constituídas por três faces unidas por soldaduras feitas nos cinco lados e apresentam uma face dianteira e uma face traseira de forma quadrada ou rectangular.

47     Os elementos de design referidos pela recorrente, na sua maior parte, ou correspondem simplesmente à forma genérica das bolsas que podem manter‑se na vertical ou são demasiado ínfimos para poderem ser memorizados pelo público pertinente. Assim, a forma bombeada, as linhas paralelas sobre o lado, ou mesmo a linha horizontal superior correspondente a um soldadura não podem dar às representações das bolsas da recorrente um qualquer carácter distintivo relativamente à forma de base das bolsas que se mantêm na vertical. Além disso, o arco de círculo, ou o V, formado pela soldadura do fundo das bolsas, o diferente tamanho das faces dianteira e posterior ou a ausência de linha superior não podem ser entendidos pelo público pertinente como características que lhes permitam reconhecer tais bolsas.

48     Restam, portanto, três elementos que podem constituir uma diferenciação perceptível das representações das bolsas em causa relativamente a uma forma básica de bolsa que possa manter‑se na vertical, consistentes nas formas essenciais das bolsas, nas concavidades laterais e no aspecto metálico.

49     No que respeita, em primeiro lugar, às formas essenciais das diferentes bolsas em causa, são elas constituídas por um rectângulo, uma oval ou um triângulo. Correspondem às formas geométricas de base que são susceptíveis de ser aplicadas às bolsas que se mantêm na vertical. Além disso, em razão de limitações técnicas e da finalidade dessa embalagem, consistente em ela se manter na vertical, as formas ovais ou triangulares são ligeiramente alteradas pelos bordos inferior e superior direitos que as aproximam do quadrado ou do rectângulo. Em consequência, estas formas essenciais não podem, por si mesmas, conferir um carácter distintivo às marcas requeridas, na medida em que são correntemente utilizadas ou susceptíveis de ser utilizadas para as bolsas que se mantêm na vertical.

50     No que respeita, em segundo lugar, às concavidades laterais de quatro das apresentações reivindicadas, elas serão associadas, no espírito do consumidor médio, a uma melhor preensão das bolsas. Além disso, essas concavidades apresentam um aspecto suficientemente menor ou constituem variações dos bordos direitos que são demasiado básicas para serem capazes, por si próprias, de conferir um carácter distintivo às formas em causa.

51     No que respeita, em terceiro lugar, ao aspecto metálico das bolsas representado pela cor cinzenta acompanhada por um jogo de luzes, será ele apreendido, mal ou bem, pelo público pertinente, como devido ao constituinte da folha utilizada para fabricar as bolsas. Assim, este aspecto metálico não será apreendido pelo consumidor médio como uma indicação da origem comercial dos produtos em causa.

52     Finalmente, no que respeita à aparência de cada uma das bolsas em causa, tomada no seu conjunto, a Câmara de Recurso considerou correctamente que as diferenças que as formas e o aspecto pedidos apresentam relativamente à aparência genérica de uma bolsa que se mantém na vertical constituem simples variantes dessa aparência. Com efeito, a soma dessas diferenças não confere à aparência global de cada uma das bolsas em causa uma vincada diferença relativamente à aparência genérica de uma bolsa que se mantém na vertical. A associação dos diferentes elementos menores de design ou a aparência global das diferentes bolsas não são susceptíveis de ser memorizáveis pelo consumidor médio, cuja atenção é a este respeito pouco elevada, enquanto indicação da origem comercial dos produtos em causa.

53     Há ainda que acrescentar que as dificuldades técnicas ou o custo da realização das bolsas segundo as representações requeridas não constituem critérios pertinentes para apreciar o carácter distintivo das marcas requeridas. Com efeito, uma forma inteiramente privada de carácter distintivo não o adquire em razão da dificuldade ou do custo da sua realização.

54     Além disso, a Câmara de Recurso tinha o direito de evocar o risco de monopolização das bolsas que se mantêm na vertical, quanto às bebidas em causa, pois que esta análise vinha confirmar a ausência de carácter distintivo dessas bolsas para tais produtos, de acordo com o interesse geral que subjaz ao motivo absoluto de recusa baseado no artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94. De resto, a existência de riscos de monopolização mostra‑se tão mais perceptível no caso vertente quanto os presentes pedidos de marcas cobrem uma grande parte das variações possíveis, relativamente à forma genérica das bolsas que se mantêm na vertical.

55     No que diz respeito à invocação, pela recorrente, de diversos registos comunitários de acondicionamento de bebidas, há que recordar que, segundo jurisprudência constante, o carácter registável de um sinal como marca comunitária só deve ser apreciado com base na regulamentação comunitária pertinente, tal como interpretada pelo juiz comunitário, e não com base na prática decisória anterior das Câmaras de Recurso [acórdão SAT.2, referido no n.° 31 supra, n.° 60, e acórdão Sykes Enterprises/IHMI (REAL PEOPLE, REAL SOLUTIONS), referido no n.° 38 supra].

56     No que se refere ao argumento relativo às quatro marcas registadas pelo Deutsches Patent‑ und Markenamt, três das quais são muito similares a algumas das pedidas no caso vertente (processos T‑148/02, T‑149/02 e T‑151/02), resulta de uma jurisprudência constante que os registos já efectuados em Estados‑Membros constituem elementos que, sem ser determinantes, apenas podem ser tomados em consideração para efeitos de registo de uma marca comunitária (v. acórdão Pastilha oval, referido no n.° 31 supra, n.° 68, e a jurisprudência aí referida). Em consequência, a Câmara de Recurso teve devidamente em conta tais registos nacionais ao precisar que estes não a levavam a alterar a sua apreciação.

57     Face ao que precede, a Câmara de Recurso considerou correctamente que as oito representações de bolsas que se mantêm na vertical eram privadas de carácter distintivo no que respeita aos produtos referidos, incluindo as bebidas à base de sumo de fruta e os sumos de fruta.

58     Deve, portanto, ser negado provimento aos presentes recursos.

 Quanto às despesas

59     Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, a parte vencida é condenada nas despesas se tal tiver sido requerido. Tendo a recorrente sido vencida, há que condená‑la nas despesas, em conformidade com o pedido do Instituto.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Segunda Secção)

decide:

1)      É negado provimento aos recursos.

2)      A recorrente é condenada nas despesas.

Forwood

Pirrung

Meij

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 28 de Janeiro de 2004.

O secretário

 

      O presidente

H. Jung

 

      J. Pirrung


* Língua do processo: alemão.