Language of document : ECLI:EU:T:2022:48

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Décima Secção alargada)

2 de fevereiro de 2022 (*)

«Concorrência — Acordos, decisões e práticas concertadas — Mercado dos fabricantes de camiões — Decisão que declara uma infração ao artigo 101.o TFUE e ao artigo 53.o do Acordo EEE — Acordos e práticas concertadas sobre os preços de venda de camiões, o calendário relativo à comercialização das tecnologias em matéria de emissões e a repercussão dos custos relativos a essas tecnologias nos clientes — Procedimento “híbrido” escalonado no tempo — Presunção de inocência — Princípio da imparcialidade — Carta dos Direitos Fundamentais — Infração única e continuada — Restrição da concorrência por objeto — Âmbito geográfico da infração — Coima — Proporcionalidade — Igualdade de tratamento — Competência de plena jurisdição»

No processo T‑799/17,

Scania AB, com sede em Södertälje (Suécia),

Scania CV AB, com sede em Södertälje,

Scania Deutschland GmbH, com sede em Coblença (Alemanha),

representadas por D. Arts, F. Miotto, C. Pommiès, K. Schillemans, C. Langenius, L. Ulrichs, P. Hammarskiöld, S. Falkner e N. De Backer, advogados,

recorrentes,

contra

Comissão Europeia, representada por M. Farley e L. Wildpanner, na qualidade de agentes,

recorrida,

que tem por objeto um pedido baseado no artigo 263.o TFUE e destinado a obter a anulação da Decisão C(2017) 6467 final da Comissão, de 27 de setembro de 2017, relativa a um processo nos termos do artigo 101.o TFUE e do artigo 53.o do Acordo sobre o Espaço Económico Europeu (EEE) (processo AT.39824 — Camiões), ou, a título subsidiário, a redução do montante das coimas aplicadas às recorrentes na referida decisão,

O TRIBUNAL GERAL (Décima Secção alargada),

composto por: S. Papasavvas, presidente, A. Kornezov, E. Buttigieg (relator), K. Kowalik‑Bańczyk e G. Hesse, juízes,

secretário: B. Lefebvre, administrador,

vista a fase escrita do processo e após a audiência de 18 de junho de 2020,

profere o presente

Acórdão

I.      Antecedentes do litígio

1        As recorrentes, Scania AB, Scania CV AB e Scania Deutschland GmbH (a seguir «Scania DE»), são três entidades jurídicas do grupo Scania (a seguir «Scania»). A Scania tem como atividade o fabrico e a venda de camiões pesados (mais de 16 toneladas) destinados ao transporte de longo curso, à distribuição, aos transportes relacionados com atividades de construção e com trabalhos especializados.

2        Com a sua Decisão C(2017) 6467 final, de 27 de setembro de 2017, relativa a um processo nos termos do artigo 101.o TFUE e do artigo 53.o do Acordo sobre o Espaço Económico Europeu (EEE) processo AT.39824 — Camiões) (a seguir «decisão impugnada»), a Comissão Europeia declarou que as recorrentes tinham violado o artigo 101.o TFUE e o artigo 53.o do Acordo EEE por terem participado, de 17 de janeiro de 1997 a 18 de janeiro de 2011, com entidades jurídicas das empresas [confidencial] (1), [confidencial], [confidencial], [confidencial] e [confidencial], em acordos colusórios sobre os preços, sobre o aumento dos preços brutos dos camiões médios e pesados no EEE e sobre o calendário e a repercussão dos custos relativos à instalação das tecnologias em matéria de emissões para os camiões médios e pesados impostas pelas normas Euro 3 a Euro 6 (artigo 1.o da decisão impugnada). A Comissão aplicou, conjunta e solidariamente, à Scania AB e à Scania CV AB uma coima de 880 523 000 euros, dos quais a Scania DE é conjunta e solidariamente responsável pelo pagamento de 440 003 282 euros (artigo 2.o da decisão impugnada).

A.      Procedimento administrativo na origem da decisão impugnada

3        Em 20 de setembro de 2010, [confidencial] apresentou um pedido de imunidade em matéria de coimas, ao abrigo do n.o 14 da Comunicação da Comissão Relativa à imunidade em matéria de coimas e à redução do seu montante nos processos relativos a cartéis (JO 2006, C 298, p. 17, a seguir «comunicação sobre a cooperação»). Em 17 de dezembro de 2010, a Comissão concedeu uma imunidade condicional em matéria de coimas à [confidencial].

4        Entre 18 e 21 de janeiro de 2011, a Comissão efetuou inspeções nas instalações, nomeadamente, das recorrentes.

5        Em 28 de janeiro de 2011, [confidencial] pediu a imunidade em matéria de coimas ao abrigo do n.o 14 da comunicação sobre a cooperação e, a título subsidiário, uma redução da coima ao abrigo do n.o 27 da referida comunicação. Foi acompanhada nesta diligência por [confidencial] e por [confidencial].

6        No decurso do inquérito, a Comissão enviou, designadamente, às recorrentes diversos pedidos de informação nos termos do artigo 18.o do Regulamento (CE) n.o 1/2003 do Conselho, de 16 de dezembro de 2002, relativo à execução das regras de concorrência estabelecidas nos artigos [101.o e 102.o TFUE] (JO 2003, L 1, p. 1).

7        Em 20 de novembro de 2014, a Comissão deu início ao procedimento previsto no artigo 11.o, n.o 6, do Regulamento n.o 1/2003 contra as recorrentes e entidades jurídicas das empresas referidas no n.o 2, supra, e adotou uma comunicação de objeções que notificou a todas essas entidades, incluindo as recorrentes

8        Na sequência da notificação da comunicação de objeções, os seus destinatários tiveram acesso ao processo de inquérito da Comissão.

9        Durante o [confidencial], os destinatários da comunicação de objeções contactaram informalmente a Comissão para pedir o prosseguimento do processo no âmbito do procedimento de transação previsto no artigo 10.o‑A do Regulamento (CE) n.o 773/2004 da Comissão, de 7 de abril de 2004, relativo à instrução de processos pela Comissão para efeitos dos artigos [101.o e 102.o TFUE] (JO 2004, L 123, p. 18). A Comissão decidiu abrir um procedimento de transação depois de cada um dos destinatários da comunicação de objeções ter confirmado a sua vontade de participar em conversações com vista a uma transação.

10      Entre [confidencial] e [confidencial], realizaram‑se conversações com vista a uma transação entre cada destinatário da comunicação de objeções e a Comissão. Na sequência dessas conversações, alguns destinatários da comunicação de objeções apresentaram, individualmente, à Comissão, um pedido formal de transação ao abrigo do artigo 10.o‑A, n.o 2, do Regulamento n.o 773/2004 (a seguir «partes na transação»). As recorrentes não apresentaram esse pedido.

11      Em 19 de julho de 2016, a Comissão adotou, com fundamento no artigo 7.o e no artigo 23.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003, a Decisão C (2016) 4673 final, relativa a um processo nos termos do artigo 101.o TFUE e do artigo 53.o do Acordo EEE (processo AT.39824 ‑ Camiões), dirigida às partes na transação (a seguir «decisão de transação».

12      Na medida em que as recorrentes tinham decidido não apresentar um pedido formal de transação, a Comissão prosseguiu a investigação contra elas no âmbito do processo normal (não transacional).

13      Em 23 de setembro de 2016, as recorrentes, após terem tido acesso ao processo, apresentaram a sua resposta escrita à comunicação de objeções.

14      Em 18 de outubro de 2016, as recorrentes participaram numa audição.

15      Em 7 de abril de 2017, a Comissão, em conformidade com o n.o 111 da sua Comunicação sobre boas práticas para a instrução de processos de aplicação dos artigos 101.o e 102.o [TFUE] (JO 2011, C 308, p. 6), enviou à Scania AB uma carta de comunicação de factos. Em 23 de junho de 2017, a Comissão também enviou a referida carta de comunicação de factos à Scania CV AB e à Scania DE.

16      Em 12 de maio de 2017, a Scania AB comunicou à Comissão as suas observações escritas sobre os elementos de prova anexos à carta de comunicação de factos, que também refletiam a posição da Scania CV AB e da Scania DE.

17      Em 27 de setembro de 2017 a Comissão adotou a decisão impugnada.

B.      Decisão impugnada

1.      Estrutura do mercado de camiões e mecanismo de fixação dos preços na indústria dos camiões

18      A Comissão iniciou a decisão impugnada pela apresentação, nos considerandos 22 a 50, da estrutura do mercado de camiões e do mecanismo de fixação dos preços na indústria de camiões, incluindo no que respeita à Scania.

a)      Estrutura do mercado de camiões

19      No que respeita à estrutura do mercado de camiões, a Comissão salienta que este se caracteriza por um nível elevado de transparência e de concentração, uma vez que as participantes tiveram diversas oportunidades para reunir anualmente e discutir a situação do mercado. Segundo a Comissão, através de todas as interações, as participantes podiam ter uma ideia precisa da situação concorrencial de cada uma (considerandos 22 e 23 da decisão impugnada).

20      A Comissão também salienta que as participantes, incluindo a Scania, têm filiais em mercados nacionais importantes que atuam na qualidade de distribuidores dos seus produtos. Esses distribuidores nacionais dispunham da sua própria rede de concessionários (considerando 25 da decisão impugnada). A Comissão observa que a Scania vende os seus camiões através de distribuidores nacionais, que são suas filiais detidas a 100 % em todos os Estados do EEE, com exceção de [confidencial]. Os distribuidores nacionais da Scania vendiam os camiões que compravam através da sede a concessionários que eram filiais detidas a 100 % ou empresas independentes A Comissão salienta que, na Alemanha, a Scania dispõe de [confidencial] concessionários que são filiais a 100 % (considerando 26 da decisão impugnada).

b)      Mecanismo de fixação dos preços na indústria dos camiões

21      No que respeita ao mecanismo de fixação dos preços, a Comissão constata que este tem as mesmas etapas para todas as partes e começa, geralmente, no âmbito de uma primeira etapa, pela fixação, pela sede, de uma tabela inicial de preços brutos. Além disso, segundo a Comissão, no âmbito de uma segunda etapa, são fixados preços de transferência para a venda dos camiões nos diferentes mercados nacionais, entre a sede dos fabricantes e os distribuidores nacionais que são empresas independentes ou detidas a 100 % pela sede. Por outro lado, segundo a Comissão, no âmbito de uma terceira etapa, são fixados os preços pagos pelos concessionários aos distribuidores, e, no âmbito de uma quarta etapa, o preço líquido final pago pelos consumidores que é negociado pelos concessionários ou pelos próprios fabricantes quando vendem diretamente aos concessionários ou aos clientes importantes (considerando 38 da decisão impugnada).

22      A Comissão constata que, embora o preço final pago pelos consumidores possa variar (por exemplo, devido à aplicação de diferentes descontos a diferentes níveis da cadeia de distribuição), todos os preços aplicáveis em cada fase da cadeia de distribuição decorrem de modo direto (no caso dos preços de transferência entre a sede e o distribuidor) ou indireto (no caso do preço pago pelo concessionário ao distribuidor ou no caso do preço pago pelo cliente final) do preço bruto inicial. Verifica‑se, assim, segundo a Comissão, que as tabelas dos preços brutos iniciais fixadas pela sede constituem uma componente comum e fundamental dos cálculos dos preços aplicáveis a cada etapa das cadeias nacionais de distribuição em toda a Europa (considerando 38 da decisão impugnada). A Comissão esclarece que todas as partes, com exceção de [confidencial], estabeleceram entre 2000 e 2006 tabelas de preços brutos, compostas por preços brutos harmonizados para todo o EEE (considerando 40 da decisão impugnada).

c)      Mecanismo de fixação dos preços na Scania

23      Nos considerandos 41 a 50 da decisão impugnada, a Comissão descreve o mecanismo de fixação dos preços na Scania e as pessoas implicadas nessa fixação.

24      Segundo essa descrição, a sede da Scania fixa a tabela dos preços brutos à saída da fábrica (a seguir «FGPL») para todas as diferentes peças disponíveis de um camião (considerando 44 da decisão impugnada). [confidencial].

25      Cada distribuidor nacional da Scania (por exemplo a Scania DE) negoceia com a sede da Scania um «preço líquido para o distribuidor» (o preço que o distribuidor paga à sede por cada peça) com base na FGPL que recebeu. O preço líquido para o distribuidor é indicado num documento denominado «RPU» que representa a diferença entre a FGPL e o preço líquido para o distribuidor em termos de descontos. Os descontos concedidos ao distribuidor são fixados por [confidencial] na sede da Scania, mas também são discutidos no comité dos preços. A decisão final sobre o preço líquido para o distribuidor da Scania equivale [confidencial] (considerando 45 da decisão impugnada).

26      Além disso, o distribuidor nacional da Scania comunica a sua própria tabela de preços brutos (que consiste no preço líquido para o distribuidor mais a margem de lucro), para todas as diferentes peças disponíveis de um camião, aos concessionários Scania no seu território (considerando 46 da decisão impugnada).

27      O concessionário da Scania negociará com o distribuidor um «preço líquido para o concessionário» baseado na tabela de preços brutos do distribuidor menos uma redução substancial de que o concessionário beneficia (considerando 47 da decisão impugnada).

28      [Confidencial].

29      Os clientes que compram camiões nos concessionários da Scania pagam o «preço de cliente». O «preço de cliente» corresponde ao preço líquido para o concessionário acrescido da margem de lucro do concessionário e dos eventuais custos decorrentes da individualização do camião e deduzidas reduções e promoções oferecidas ao cliente (considerando 48 da decisão impugnada). A Comissão constata que a alteração do preço numa qualquer etapa da cadeia de distribuição terá um impacto limitado ou não tem incidência no preço final pago pelo consumidor (considerando 48 da decisão impugnada).

30      A Comissão constata que a FGPL é aplicável a nível mundial, ao passo que o preço líquido para o distribuidor e a tabela de preços brutos do distribuidor são aplicáveis na região em que o distribuidor opera. Do mesmo modo, o preço negociado pelo concessionário é aplicado na região em que o concessionário opera (considerando 49 da decisão impugnada).

31      O considerando 50 da decisão impugnada contém um gráfico das diversas etapas do mecanismo de fixação dos preços na Scania, conforme descritas nos n.os 24 a 29, supra. Esse gráfico foi apresentado pelas recorrentes durante o procedimento administrativo e apresenta‑se do seguinte modo:

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d)      Quanto ao impacto do aumento de preços a nível europeu nos preços a nível nacional

32      Nos considerandos 51 e 52 da decisão impugnada, a Comissão examina o impacto do aumento de preços a nível europeu nos preços a nível nacional. A este respeito, a Comissão observa que os distribuidores nacionais dos fabricantes, como a Scania DE, não são independentes na fixação dos preços brutos e das tabelas de preços brutos e que todos os preços aplicados em cada etapa da cadeia de distribuição até ao consumidor final decorrem das tabelas dos preços brutos pan‑europeus fixados ao nível da sede (considerando 51 da decisão impugnada).

33      Daqui resulta, segundo a Comissão, que um aumento dos preços na tabela pan‑europeia dos preços brutos, decidida ao nível da sede, determina o movimento do «preço líquido para o distribuidor», isto é, do preço que o distribuidor paga à sede para a aquisição do camião. Por conseguinte, segundo a Comissão, o aumento pela sede dos preços brutos acima referidos também influencia o nível do preço bruto do distribuidor, a saber, o preço que o concessionário paga ao distribuidor, mesmo que o preço para o consumidor final não seja necessariamente alterado na mesma proporção ou não seja sequer alterado (considerando 52 da decisão impugnada).

2.      Contactos colusórios entre a Scania e as partes na transação

34      Na decisão impugnada, a Comissão considerou que a Scania tinha participado em reuniões colusórias e em contactos com as partes na transação em diversos fóruns e a diferentes níveis, que evoluíram ao longo do tempo, enquanto as empresas participantes, os objetivos e os produtos em causa permaneciam os mesmos (considerando 75 da decisão impugnada).

35      A Comissão identificou três níveis de contactos colusórios.

36      Em primeiro lugar, a Comissão considerou que, nos primeiros anos da infração, os quadros superiores das participantes no cartel discutiam as suas intenções em matéria de preços, de futuros aumentos dos preços brutos, por vezes também da evolução dos preços líquidos ao consumo e, outras vezes, tinham chegado a acordo sobre o aumento dos seus preços brutos. Na decisão impugnada, a Comissão referia‑se a esse nível de contactos colusórios como o «nível dos órgãos dirigentes» (top management). A Comissão acrescentou que, nas reuniões ao nível dos órgãos dirigentes, as participantes no cartel acordaram, além disso, o calendário e a repercussão dos custos relativos à comercialização dos modelos de camiões conformes com as normas Euro 3 a Euro 5 e, em determinadas ocasiões, foi acordado não instalar as tecnologias em causa antes de uma determinada data (considerando 75 da decisão impugnada). A Comissão considerou que as reuniões ao nível dos órgãos dirigentes tiveram lugar entre 1997 e 2004 [considerando 327, alínea a), da decisão impugnada].

37      Em segundo lugar, a Comissão considerou que, durante um período limitado e paralelamente às reuniões ao nível dos órgãos dirigentes, quadros intermédios da sede das participantes no cartel mantinham conversações que incluíam, além da troca de informações técnicas, interações sobre os preços e sobre aumentos dos preços brutos. Na decisão impugnada, a Comissão referia‑se a este nível de contactos colusórios como «nível inferior ao da sede» (lower Headquarters level) (considerando 75 da decisão impugnada). A Comissão considerou que as reuniões a nível inferior ao da sede tinham tido lugar entre 2000 e 2008 [considerando 327, alínea a), da decisão impugnada].

38      Em terceiro lugar, a Comissão considerou que, na sequência da introdução do euro e das tabelas de preços brutos à escala europeia pela quase totalidade dos fabricantes de camiões, as participantes no cartel tinham prosseguido com a coordenação sistemática das suas intenções de preços futuros por intermédio das suas filiais alemãs. Na decisão impugnada, a Comissão referia‑se a este nível de contactos colusórios como «nível alemão» (German level meetings). A Comissão esclareceu que, da mesma maneira que os contactos dos primeiros anos do cartel, os representantes das filiais alemãs discutiam futuros aumentos dos preços brutos, bem como o calendário e a repercussão dos custos relativos à instalação das tecnologias em matéria de emissões para camiões médios e pesados, impostos pelas normas Euro 5 e Euro 6. Trocavam igualmente outras informações comerciais sensíveis (considerando 76 da decisão impugnada). A Comissão considerou que as reuniões ao nível alemão tinham tido lugar a partir de 2004 [considerando 327, alínea a), da decisão impugnada].

3.      Aplicação do artigo 101.o TFUE e do artigo 53.o do Acordo EEE

a)      Acordos e práticas concertadas

39      A Comissão considerou que as provas documentais que constam dos autos demonstravam que os contactos supramencionados diziam respeito:

–        às alterações, previstas pelas participantes no cartel, dos preços brutos, das tabelas de preços brutos, do calendário dessas alterações e, ocasionalmente, a interações relativas às alterações previstas dos preços líquidos ou aos descontos oferecidos aos clientes [considerando 212, alínea a), da decisão impugnada];

–        à data de instalação das tecnologias em matéria de emissões para os camiões médios e pesados, exigidas pelas normas Euro 3 a Euro 6, e à repercussão dos custos relativos à comercialização dessas tecnologias [considerando 212, alínea b), da decisão impugnada];

–        à partilha de outras informações sensíveis do ponto de vista da concorrência, como as quotas dos mercados em causa, os preços líquidos atuais e os descontos, as tabelas de preços brutos (mesmo antes da sua entrada em vigor), os configuradores de camiões, as encomendas e os níveis das existências [considerando 212, alínea c), da decisão impugnada].

40      A Comissão salientou que as partes tinham contactos multilaterais a diferentes níveis e que, por vezes, tinham contactos e reuniões comuns a diferentes níveis. Segundo a Comissão, estes contactos estavam relacionados entre si pelo seu conteúdo, pela sua data, por referências explícitas de uns a outros e pela circulação entre eles da informação obtida (considerando 213 da decisão impugnada).

41      A Comissão considerou que estas atividades constituíam uma forma de coordenação e de cooperação através da qual as partes substituíam conscientemente os riscos da concorrência por uma cooperação prática entre si. Segundo a Comissão, o comportamento em causa revestia a forma de um acordo ou de uma prática concertada no qual as empresas concorrentes se abstinham de determinar de forma independente a política comercial que pretendiam adotar no mercado, mas coordenavam antes o seu comportamento em matéria de preços através de contactos diretos e envolviam‑se no atraso coordenado da instalação das tecnologias. Segundo a Comissão, a participação sistemática nos contactos colusórios criou um clima de compreensão mútua da política de preços das partes (considerando 215 da decisão impugnada).

42      A Comissão salientou que a Scania participou regularmente nas diferentes formas colusórias durante todo o período de duração da infração e concluiu que a infração em que a Scania participara tinha a forma de um acordo e/ou de uma prática concertada na aceção do artigo 101.o TFUE e do artigo 53.o do Acordo EEE (considerando 229 da decisão impugnada).

b)      Restrição da concorrência

43      A Comissão salientou que o comportamento anticoncorrencial no caso em apreço tinha por objeto a restrição da concorrência (considerando 236 da decisão impugnada).

44      Segundo a Comissão, o principal aspeto do conjunto de acordos e práticas concertadas que podiam ser qualificados de restrição da concorrência consistia na coordenação dos preços e dos aumentos de preços brutos através de contactos sobre os preços, na coordenação sobre a data e dos custos adicionais resultantes da comercialização dos novos camiões conformes com as normas em matéria de emissões e na troca de informações sensíveis no plano da concorrência (considerando 237 da decisão impugnada).

45      A Comissão considerou que a Scania tinha participado nos contactos colusórios descritos no n.o 39, supra, e que o conjunto de acordos e práticas concertadas nos quais tinha participado tinham por objeto a restrição da concorrência na aceção do artigo 101.o TFUE (considerandos 238 e 239 da decisão impugnada).

c)      Infração única e continuada

46      A Comissão considerou que os acordos e/ou práticas concertadas entre a Scania e as partes na transação constituíam uma infração única e continuada abrangida pelo artigo 101.o, n.o 1, TFUE e pelo artigo 53.o do Acordo EEE no período compreendido entre 17 de janeiro de 1997 e 18 de janeiro de 2011. A infração consistiu numa colusão em relação aos preços e aos aumentos de preços brutos no EEE dos camiões médios e pesados, bem como ao calendário e à repercussão dos custos relativos à comercialização das tecnologias em matéria de emissões nos camiões médios e pesados impostas pelas normas Euro 3 a Euro 6 (considerando 315 da decisão impugnada).

47      Mais especificamente, a Comissão considerou que, através de contactos anticoncorrenciais, as partes tinham prosseguido um plano comum com um objetivo anticoncorrencial único e que a Scania tinha ou devia ter conhecimento do âmbito de aplicação geral e das características essenciais da rede de contactos colusórios e tinha a intenção de contribuir para o cartel através das suas ações (considerando 316 da decisão impugnada).

48      A Comissão salientou que o objetivo anticoncorrencial único consistia na limitação da concorrência no mercado de camiões médios e pesados no EEE. Este objetivo tinha sido atingido através de práticas que reduzem os níveis de incerteza estratégica entre as participantes no que respeita aos preços futuros e aos aumentos dos preços brutos, bem como ao calendário e à repercussão dos custos relacionados com a comercialização de camiões que respeitem as normas ambientais (considerando 317 da decisão impugnada).

d)      Âmbito geográfico da infração

49      A Comissão considerou que o âmbito geográfico da infração se estendia a todo o território do EEE durante todo o período de duração da infração (considerando 386 da decisão impugnada).

4.      Destinatários

50      Em primeiro lugar, a Comissão enviou a decisão impugnada à Scania CV AB e à Scania DE, que considerava serem responsáveis diretas pela infração nos seguintes períodos:

–        no que respeita à Scania CV AB, no período compreendido entre 17 de janeiro de 1997 e 27 de fevereiro de 2009;

–        no que respeita à Scania DE, no período compreendido entre 20 de janeiro de 2004 e 18 de janeiro de 2011 (considerando 410 da decisão impugnada).

51      Em segundo lugar, a Comissão também considerou que, no período compreendido entre 17 de janeiro de 1997 e 18 de janeiro de 2011, a Scania AB detinha, direta ou indiretamente, a totalidade das ações da Scania CV AB, a qual, por sua vez, detinha, direta ou indiretamente, a totalidade das ações da Scania DE (considerando 411 da decisão impugnada). Por conseguinte, a Comissão referiu que também enviou a decisão impugnada às seguintes entidades, que considerava serem conjunta e solidariamente responsáveis enquanto sociedades‑mãe:

–        à Scania AB, responsável, por um lado, pelo comportamento da Scania CV AB no período compreendido entre 17 de janeiro de 1997 e 27 de fevereiro de 2009 e, por outro, pelo comportamento da Scania DE no período compreendido entre 20 de janeiro de 2004 e 18 de janeiro de 2011;

–        à Scania CV AB, enquanto responsável pelo comportamento da Scania DE no período compreendido entre 20 de janeiro de 2004 e 18 de janeiro de 2011 (considerando 412 da decisão impugnada).

52      A Comissão concluiu que os destinatários da decisão impugnada eram as entidades Scania AB, Scania CV AB e Scania DE.

5.      Cálculo do montante da coima

53      A Comissão aplicou, no caso em apreço, as orientações para o cálculo das coimas aplicadas por força do n.o 2, alínea a), do artigo 23.o do Regulamento (CE) n.o 1/2003 (JO 2006, C 210, p. 2, a seguir «orientações para o cálculo das coimas»).

a)      Montante de base da coima

54      Em primeiro lugar, no que respeita ao valor das vendas, foi calculado com base nas vendas de camiões pesados realizadas pelas recorrentes no EEE (ajustadas para ter em conta a evolução do território do EEE) em 2010 — que é o último ano completo da infração (considerandos 429 a 431 decisão impugnada). A Comissão calculou que esse valor correspondia ao montante de [confidencial] euros.

55      A Comissão considerou que, tendo em conta a dimensão do valor das vendas das recorrentes, os objetivos de dissuasão e de proporcionalidade subjacentes ao artigo 23.o, n.o 2, alínea a), do Regulamento n.o 1/2003 podiam ser alcançados sem recorrer ao valor total das vendas de camiões pesados das recorrentes em 2010. Por conseguinte, e em conformidade com o n.o 37 das orientações para o cálculo das coimas, a Comissão decidiu considerar apenas uma fração do valor total das vendas para efeitos do cálculo da coima, a saber, o montante de [confidencial] euros (considerandos 432 e 433 da decisão impugnada). A Comissão sublinhou que a percentagem do valor das vendas que tinha considerado para a Scania era a mesma que a considerada na decisão de transação no que respeita às partes na transação (considerando 432, in fine, da decisão impugnada).

56      Em segundo lugar, no que respeita à gravidade da infração, a Comissão considerou que, tendo em conta, primeiro, o facto de os acordos relativos à coordenação dos preços figurarem, pela sua própria natureza, entre as infrações mais graves ao artigo 101.o TFUE e ao artigo 53.o do Acordo EEE, segundo, a circunstância de o cartel se estender a todo o EEE, e, terceiro, a elevada quota de mercado acumulada das empresas implicadas no cartel (que era superior a 90 %), o coeficiente de gravidade utilizado no caso em apreço (a saber, a percentagem do valor das vendas considerado) elevava‑se a 17 % (considerandos 434 a 437 da decisão impugnada).

57      Em terceiro lugar, tendo em conta a duração da participação da Scania na infração, a Comissão multiplicou o montante resultante do n.o 56, supra, por 14, uma vez que esse algarismo correspondia ao número de anos dessa participação (considerandos 438 e 439 da decisão impugnada).

58      Em quarto lugar, em conformidade com o n.o 25 das orientações para o cálculo das coimas, a Comissão, aumentou o montante de base com um montante adicional (taxa de entrada), que ascendia a 17 % do valor das vendas considerado (considerandos 440 e 441 da decisão impugnada).

59      Com base nestes cálculos, a Comissão concluiu que o montante de base da coima era de 880 523 000 euros (considerando 442 da decisão impugnada).

b)      Montante total da coima

60      A Comissão considerou que, no caso em apreço, não havia circunstâncias agravantes ou atenuantes que pudessem alterar o montante de base da coima aplicada à Scania (considerando 444 da decisão impugnada). Por conseguinte, concluiu que o montante total da coima ascendia a 880 523 000 euros e que esse montante não excedia o limite máximo legal de 10 % do volume de negócios da Scania (considerandos 445 a 447 da decisão impugnada).

6.      Dispositivo da decisão impugnada

61      O dispositivo da decisão impugnada tem a seguinte redação:

«Artigo 1. o

As seguintes entidades jurídicas da Scania, ao concertarem‑se sobre os preços e os aumentos de preços brutos no EEE dos camiões médios e pesados e sobre o calendário e a repercussão dos custos relativos à comercialização das tecnologias em matéria de emissões para os camiões médios e pesados, impostas pelas normas Euro 3 a 6, violaram o artigo 101.o TFUE e o artigo 53.o [do Acordo] EEE durante os períodos seguintes:

a)      a Scania AB (publ) no período compreendido entre 17 de janeiro de 1997 e 18 de janeiro de 2011;

b)      a Scania CV AB (publ) no período compreendido entre 17 de janeiro de 1997 e 18 de janeiro de 2011;

c)      a Scania DE no período compreendido entre 20 de janeiro de 2004 e 18 de janeiro de 2011.

Artigo 2. o

À infração referida no artigo 1.o, são aplicadas as seguintes coimas:

880 523 000 euros, conjunta e solidariamente, à Scania AB (publ) e à Scania CV AB (publ) com a qual a Scania DE é, conjunta e solidariamente, responsável [pelo] pagamento de 440 003 282 euros.

[…]»

II.    Tramitação processual e pedidos das partes

62      Por petição entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 11 de dezembro de 2017, as recorrentes interpuseram o presente recurso.

63      Por carta de 20 de fevereiro de 2019, a Secretaria do Tribunal Geral informou as partes do encerramento da fase escrita do processo.

64      Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 11 de março de 2019, as recorrentes apresentaram um pedido de audiência de alegações. A Comissão não se pronunciou no prazo fixado sobre a realização da audiência.

65      Tendo sido alterada a composição das Secções do Tribunal Geral, em conformidade com o artigo 27.o, n.o 5, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, o juiz‑relator foi afetado à Décima Secção, à qual por conseguinte o presente processo foi atribuído.

66      Por proposta do juiz‑relator, o Tribunal Geral (Décima Secção) decidiu dar início à fase oral do processo.

67      Por proposta da Décima Secção, o Tribunal Geral decidiu, em conformidade com o artigo 28.o do Regulamento de Processo, remeter o processo a uma formação de julgamento alargada.

68      No contexto da crise sanitária ligada à COVID‑19, a audiência prevista para 2 de abril de 2020 foi adiada.

69      Por impedimento de um membro da Décima Secção alargada, o presidente do Tribunal Geral designou o vice‑presidente do Tribunal Geral para completar a Décima Secção alargada e exercer, assim, a função de seu presidente.

70      Por carta de 5 de junho de 2020, as recorrentes pediram, com fundamento no artigo 66.o do Regulamento de Processo, a omissão ao público de determinados dados constantes do relatório de audiência. Por carta do mesmo dia e com o mesmo fundamento, a Comissão pediu a omissão ao público de determinados dados constantes, nomeadamente, do relatório de audiência e do acórdão que ponha termo à instância.

71      Por carta de 5 de junho de 2020 e com fundamento no artigo 109.o, n.o 2, do Regulamento de Processo, a Comissão pediu que a audiência fosse realizada à porta fechada. As recorrentes apresentaram as suas observações sobre este pedido em 9 de junho de 2020.

72      Em 12 de junho de 2020, o Tribunal Geral decidiu que a audiência seria realizada à porta fechada.

73      As partes foram ouvidas nas suas alegações e nas suas respostas às perguntas feitas pelo Tribunal Geral na audiência de 18 de junho de 2020.

74      Na audiência, o Tribunal Geral comunicou às partes que considerava necessário, para a resolução do litígio, o exame de determinados documentos mencionados na decisão impugnada.

75      Na sequência de esclarecimentos prestados pela Comissão, numa carta de 23 de junho de 2020, sobre o conteúdo e o regime jurídico dos documentos referidos no n.o 74, supra, por Despacho de 14 de julho de 2020, o Tribunal Geral adotou uma diligência de instrução e uma medida de organização do processo pedindo à Comissão a apresentação dos referidos documentos. A Comissão deu cumprimento ao pedido do Tribunal Geral no prazo fixado.

76      A fase oral do processo foi concluída em 26 de outubro de 2020.

77      As recorrentes concluem pedindo ao Tribunal Geral se digne:

–        anular a decisão impugnada;

–        se assim não for, anular parcialmente a decisão impugnada e reduzir o montante da coima que lhes foi aplicada nos termos do artigo 261.o TFUE e do artigo 31.o do Regulamento n.o 1/2003;

–        em qualquer caso, substituir pela sua própria apreciação a apreciação efetuada pela Comissão quanto ao montante da coima que lhes foi aplicada e reduzi‑la em conformidade com o artigo 261.o TFUE e com o artigo 31.o do Regulamento n.o 1/2003;

–        condenar a Comissão no pagamento das despesas.

78      A Comissão conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar as recorrentes nas despesas.

III. Questão de direito

A.      Quanto à omissão de determinados dados ao público

79      Na sua carta de 5 de junho de 2020 (v. n.o 70, supra), a Comissão pediu a omissão ao público, nomeadamente, dos dados que as partes na transação lhe tinham pedido para omitir na versão não confidencial da decisão impugnada. A Comissão informou o Tribunal Geral de que, em relação a estes últimos pedidos, as partes na transação tinham pedido ao Auditor que, com fundamento no artigo 8.o da Decisão 2011/695/UE do Presidente da Comissão, de 13 de outubro de 2011, relativa às funções e ao mandato do Auditor em determinados procedimentos de concorrência (JO 2011, L 275, p. 29), se pronunciasse e que, na referida data, o Auditor ainda não se tinha pronunciado sobre os pedidos das partes na transação supramencionados.

80      No âmbito da aplicação do artigo 66.o do Regulamento de Processo, o Tribunal Geral deve conciliar o princípio da publicidade das decisões judiciais com o direito à proteção dos dados pessoais e o direito à proteção do segredo profissional, tendo igualmente em conta o direito do público de ter acesso às decisões judiciais, em conformidade com os princípios consagrados no artigo 15.o TFUE (v., neste sentido e por analogia, Acórdão de 5 de outubro de 2020, Broughton/Eurojust, T‑87/19, não publicado, EU:T:2020:464, n.o 49).

81      No âmbito desse exercício de conciliação, o Tribunal Geral decidiu, no caso em apreço, em relação à versão não confidencial do presente acórdão, proceder à anonimização dos nomes das pessoas singulares e ocultar a denominação das pessoas coletivas distintas das recorrentes. Também decidiu ocultar determinados dados relativos, nomeadamente, ao mecanismo de fixação dos preços na Scania e ao cálculo da coima que lhe foi aplicada, cuja ocultação não afeta a compreensão da versão não confidencial do acórdão.

82      Em contrapartida, o Tribunal Geral decidiu não ocultar, na versão não confidencial do acórdão, os dados a que se referem os pedidos das partes na transação enviados à Comissão (v. n.o 79, supra). Com efeito, alguns desses dados podem ser inferidos do conteúdo dos documentos publicados no sítio Internet da Direção‑Geral «Concorrência» da Comissão e são, portanto, do domínio público. Alguns outros dados constituem simplesmente qualificações jurídicas do comportamento das partes na transação e da Scania ou fornecem esclarecimentos factuais relativos a esse comportamento. A ocultação desses dados afeta a compreensão do acórdão do Tribunal Geral pelo público.

83      A circunstância, invocada pela Comissão, de que o Auditor ainda não se tinha pronunciado sobre os pedidos das partes na transação não afeta a apreciação do Tribunal Geral. Com efeito, a apreciação do Auditor visa estabelecer a versão não confidencial da decisão impugnada, enquanto a apreciação efetuada pelo Tribunal Geral no âmbito do artigo 66.o do Regulamento de Processo diz respeito ao estabelecimento da versão não confidencial do acórdão. Por conseguinte, estas duas apreciações têm objetos diferentes e, portanto, o Tribunal Geral deve proceder independentemente da tramitação do processo perante o Auditor.

B.      Quanto ao mérito

84      Em apoio dos seus recursos as recorrentes alegaram nove fundamentos.

85      No âmbito do primeiro fundamento, as recorrentes invocam uma violação dos direitos de defesa, do princípio de boa administração e da presunção de inocência que resulta, nomeadamente, da adoção da decisão de transação prévia da adoção da decisão impugnada. No âmbito do segundo fundamento, relativo à violação do artigo 48.o, n.o 2, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta») e do artigo 27.o, n.os 1 e 2, do Regulamento n.o 1/2003, as recorrentes censuram, em substância, a Comissão por lhes ter recusado o acesso à totalidade das respostas à comunicação de objeções apresentadas por [confidencial] e por [confidencial].

86      O terceiro, quarto, quinto, sexto e sétimo fundamentos, relativos, nomeadamente, à aplicação errada do artigo 101.o TFUE e do artigo 53.o do Acordo EEE, visam, no essencial, a conclusão da Comissão relativa à existência, no caso em apreço, de uma infração única e continuada e a sua imputação à Scania.

87      No âmbito do oitavo fundamento, relativo a uma aplicação errada do artigo 101.o TFUE, do artigo 53.o do Acordo EEE e do artigo 25.o do Regulamento n.o 1/2003, as recorrentes censuram a Comissão por lhes ter aplicado uma coima relativa a um comportamento sujeito a prescrição e, em todo o caso, por não ter tomado em consideração o facto de o referido comportamento não ser continuado.

88      O nono fundamento é relativo à violação do princípio de proporcionalidade e do princípio de igualdade de tratamento quanto ao montante da coima. Apoiando‑se neste fundamento, as recorrentes pedem também ao Tribunal Geral, a título subsidiário, a redução do montante da coima, em conformidade com o artigo 261.o TFUE e com o artigo 31.o do Regulamento n.o 1/2003.

1.      Quanto ao primeiro fundamento, relativo à violação dos direitos de defesa, do princípio da boa administração e da presunção de inocência

89      Em apoio do primeiro fundamento, as recorrentes alegam, em substância, que a decisão de transação e a decisão impugnada, que foram adotadas com base nas mesmas objeções suscitadas na comunicação de objeções enviada quer às partes na transação, quer às recorrentes, dizem respeito ao mesmo alegado cartel e baseiam‑se ambas nos mesmos factos e provas.

90      Partindo desta premissa, em primeiro lugar, as recorrentes alegam que a decisão impugnada foi adotada em violação dos seus direitos de defesa conforme consagrados no artigo 48.o, n.o 2, da Carta e no artigo 27.o, n.os 1 e 2, do Regulamento n.o 1/2003, na medida em que a Comissão, na decisão de transação, tinha procedido à qualificação jurídica dos factos e tinha qualificado de infração o comportamento no qual a Scania tinha participado antes de ter tido a possibilidade de exercer de forma eficaz os seus direitos de defesa.

91      Em segundo lugar, as recorrentes sustentam que a Comissão não cumpriu a sua obrigação de proceder a um exame diligente e imparcial como decorre do princípio da boa administração consagrado no artigo 41.o, n.o 1, da Carta, na medida em que, tendo adotado a decisão de transação previamente à adoção da decisão impugnada, já não tinha condições de fazer prova de imparcialidade e de avaliar objetivamente os elementos de prova e os argumentos apresentados pela Scania no âmbito do procedimento que levou à adoção da decisão impugnada.

92      As recorrentes acrescentam que, nessas condições, nem mesmo um exame completo pelo Tribunal Geral dos elementos de prova em que a Comissão se baseia e que constam do seu processo pode sanar a violação do artigo 41.o, n.o 1, da Carta, cometida deste modo.

93      Em terceiro lugar, as recorrentes alegam que a decisão impugnada viola a presunção de inocência cujo respeito é garantido no artigo 48.o, n.o 1, da Carta. Mais especificamente, alegam que a decisão de transação define a posição final da Comissão quanto aos mesmos factos que os enunciados na comunicação de objeções e conclui que esses factos, em cuja realização a Scania também participou, são constitutivos de uma infração. Esta declaração excede a simples evocação de uma eventual responsabilidade da Scania e constitui, consequentemente, uma infração ao direito à presunção de inocência de que a Scania deveria beneficiar até prova em contrário, a apresentar pela Comissão.

94      Segundo as recorrentes, considerar que a violação da presunção de inocência não tem importância enquanto não levar a Comissão a adotar uma «má» decisão, a saber, uma decisão em que a constatação da infração não esteja devidamente sustentada por elementos de prova, equivale, na prática, a privar essa presunção do seu conteúdo ou do seu objetivo, uma vez que, se a recorrente pudesse demonstrar que a decisão estava errada, não teria então necessidade de invocar qualquer violação da equidade do processo.

95      As recorrentes concluem que, devido à adoção da decisão de transação antes da adoção da decisão impugnada, a Comissão não podia adotar esta última contra a Scania com toda a imparcialidade e sem proceder de forma irreparável a uma violação do seu direito de ser ouvida e da presunção de inocência a seu respeito.

96      A Comissão contesta os argumentos das recorrentes e conclui pela improcedência do primeiro fundamento.

97      A título preliminar, há que salientar, como as recorrentes confirmaram na audiência em resposta a uma pergunta do Tribunal Geral, que, no âmbito do primeiro fundamento, estas contestam o caráter «híbrido» do procedimento seguido pela Comissão, o qual, nas circunstâncias do caso em apreço, consideram que conduziu às violações alegadas, a saber, à violação do princípio da presunção de inocência, do dever de imparcialidade e dos direitos de defesa da Scania, que se tinha retirado do procedimento de transação. Especificamente, o facto de ter adotado a decisão de transação antes da decisão impugnada agravava essas violações.

98      A este respeito, importa recordar que o artigo 10.o‑A do Regulamento n.o 773/2004, sob a epígrafe «Procedimento de transação em processos de cartéis», prevê:

«1. Após ter dado início ao processo nos termos do n.o 6 do artigo 11.o do Regulamento […] n.o 1/2003, a Comissão pode fixar um prazo para que os interessados diretos declarem por escrito que estão dispostos a participar em conversações, tendo em vista a eventual apresentação de propostas de transação. A Comissão não é obrigada a tomar em consideração respostas recebidas após o termo do prazo fixado.

[…]

2. Os interessados diretos que participam nas conversações de transação podem ser informados pela Comissão:

a)      Das objeções que contra eles tenciona deduzir;

b)      Dos elementos de prova utilizados para estabelecer as objeções previstas;

c)      Das versões não confidenciais de qualquer documento acessível específico constante do processo nessa data, na medida em que o pedido formulado pelo interessado direto seja justificado para lhe permitir que faça valer a sua posição no que se refere a um período de tempo ou qualquer outro aspeto específico do cartel; e

d)      Do intervalo das coimas potenciais.

[…]

Se as conversações de transação progredirem, a Comissão poderá fixar um prazo dentro do qual os interessados diretos poderão submeter‑se ao procedimento de transação, mediante a apresentação de propostas de transação escritas que reflitam os resultados das conversações de transação e nas quais reconheçam a sua participação numa infração ao artigo 101.o [TFUE], bem como a sua responsabilidade […]. Antes de a Comissão fixar um prazo para a apresentação das suas propostas de transação, os interessados diretos terão o direito de dispor das informações especificadas no primeiro parágrafo, que lhes devem ser transmitidas mediante pedido, de forma atempada. A Comissão não será obrigada a tomar em consideração propostas de transação recebidas após o termo do prazo fixado. […]

3. Caso o teor das propostas de transação dos interessados diretos seja refletido na comunicação de objeções que lhes é notificada, a resposta escrita dos interessados diretos à comunicação de objeções deve, num prazo fixado pela Comissão, confirmar que a comunicação de objeções que lhes foi dirigida reflete o teor das suas propostas de transação. Nesse caso, a Comissão poderá adotar uma decisão nos termos do artigo 7.o e do artigo 23.o do Regulamento […] n.o 1/2003, após consulta do Comité Consultivo em matéria de acordos, decisões, práticas concertadas e posições dominantes, em conformidade com o artigo 14.o do mesmo regulamento.

4. A Comissão pode decidir, a qualquer momento durante o procedimento, pôr termo às conversações de transação num caso específico em consideração ou relativamente a um ou mais dos interessados diretos envolvidos, se considerar não ser verosímil a obtenção de eficiências processuais.»

99      Antes de mais, importa salientar que esta disposição não se opõe à possibilidade de a Comissão seguir um procedimento «híbrido» no âmbito da aplicação do artigo 101.o TFUE e não a exclui.

100    Por outro lado, o Tribunal Geral já admitiu que a Comissão tinha o direito de recorrer a esse procedimento «híbrido» e de aplicar um procedimento de transação a empresas que apresentem propostas de transação, prosseguindo ao mesmo tempo o procedimento regido pelas disposições gerais do Regulamento n.o 773/2004, em vez das que regulam o procedimento de transação, relativamente às empresas que não pretendam apresentar essas propostas de transação (v., neste sentido, Acórdão de 20 de maio de 2015, Timab Industries e CFPR/Comissão, T‑456/10, EU:T:2015:296, n.os 70, 71 e 104, confirmado em sede de recurso pelo Acórdão de 12 de janeiro de 2017, Timab Industries e CFPR/Comissão, C‑411/15 P, EU:C:2017:11, n.os 119 e 136).

101    Além disso, o Tribunal Geral também validou a possibilidade de a Comissão adotar, num primeiro momento, uma decisão de transação em relação às partes que decidiram transigir e, num segundo momento, uma decisão na sequência do procedimento ordinário em relação às partes que decidiram não transigir, desde que, no entanto, zele pelo respeito do princípio da presunção de inocência, nomeadamente quando a adoção da decisão de transação não exija que se determine a responsabilidade da parte que não participa na transação (v., neste sentido, Acórdão de 10 de novembro de 2017, Icap e o./Comissão, T‑180/15, EU:T:2017:795, n.os 265 a 268, confirmado em sede de recurso pelo Acórdão de 10 de julho de 2019, Comissão/Icap e o., C‑39/18 P, EU:C:2019:584).

102    Como alega a Comissão, atrasar ou abandonar qualquer procedimento de transação pelo facto de uma das empresas em causa, como sucede no caso em apreço com a Scania, se ter retirado desse procedimento é contrário ao objetivo prosseguido pelo procedimento de transação, como enunciado no considerando 4 do Regulamento (CE) n.o 622/2008 da Comissão, de 30 de junho de 2008, que altera o Regulamento n.o 773/2004 no que se refere à condução de procedimentos de transação nos processos de cartéis (JO 2008, L 171, p. 3), que é o de assegurar um tratamento mais rápido e mais eficaz do processo com as empresas que tenham optado por transigir. Todavia, o respeito do referido objetivo não deve prejudicar os requisitos relacionados com o respeito do princípio da presunção de inocência e do dever de imparcialidade.

103    As circunstâncias do caso em apreço, evidenciadas pelas recorrentes na audiência, a saber, o facto de a comunicação de objeções completa ter sido enviada a todas as partes e de estas terem obtido acesso completo ao processo de instrução, não permite concluir, contrariamente ao que as recorrentes alegam, que o recurso pela Comissão ao procedimento «híbrido» escalonado no tempo não permitiu cumprir esse objetivo de rapidez e de eficácia. Com efeito, o referido objetivo também é visado por outras circunstâncias próprias de um procedimento de transação, como o reconhecimento inequívoco pelas partes da sua responsabilidade na infração, a aceitação do exercício limitado do seu direito de defesa e do nível das coimas [v. Comunicação da Comissão relativa à condução de procedimentos de transação para efeitos da adoção de decisões nos termos do artigo 7.o e do artigo 23.o do Regulamento (CE) n.o 1/2003 do Conselho nos processos de cartéis (JO 2008, C 167, p. 1), n.os 20 e 21].

104    Em consequência, ao contrário do que as recorrentes alegam, em substância, os processos «híbridos» no âmbito da aplicação do artigo 101.o TFUE, nos quais a adoção da decisão de transação e da decisão de prosseguimento do processo ordinário são escalonados no tempo, não implicam, por si só, em todas as circunstâncias, uma violação da presunção de inocência, dos direitos de defesa ou do dever de imparcialidade e não têm como consequência inevitável que esses princípios e esses direitos tenham sido violados, como resulta da jurisprudência recordada nos n.os 100 e 101, supra.

105    Daqui resulta que a Comissão pode legitimamente recorrer a esse procedimento «híbrido», adotando a decisão de transação antes da decisão impugnada, desde que, todavia, seja assegurado o pleno respeito desses princípios e direitos.

106    Assim, há que verificar se, nas circunstâncias do caso em apreço, a Comissão respeitou a presunção de inocência e o seu dever de imparcialidade perante a Scania, bem como os seus direitos de defesa.

107    As recorrentes apoiam as suas objeções do primeiro fundamento principalmente na premissa de que a decisão de transação e a decisão impugnada assentam nos mesmos factos e nos mesmos elementos de prova. Referem‑se, a este respeito, aos factos relativos aos comportamentos das partes na transação, como os expostos no n.o 3 da decisão de transação, mas «que implicam necessariamente a Scania», pelo que o círculo de empresas cujo comportamento tinha sido juridicamente qualificado na decisão de transação não se limitava aos destinatários desta decisão, mas também incluía a Scania. As recorrentes também alegam que a violação do princípio da presunção de inocência resulta do facto de a decisão de transação e a decisão impugnada terem sido adotadas com base nas mesmas objeções suscitadas na comunicação de objeções dirigida tanto às partes na transação como às recorrentes.

108    A este propósito, no que se refere à objeção relativa à violação do princípio da presunção de inocência, importa recordar que este constitui um princípio geral do direito da União, atualmente enunciado no artigo 48.o, n.o 1, da Carta, que se aplica aos processos relativos a violações das regras de concorrência aplicáveis às empresas suscetíveis de conduzir à aplicação de coimas ou de sanções pecuniárias compulsórias (v. Acórdão de 22 de novembro de 2012, E.ON Energie/Comissão, C‑89/11 P, EU:C:2012:738, n.os 72 e 73 e jurisprudência referida).

109    O artigo 48.o da Carta corresponde ao artigo 6.o, n.os 2 e 3, da Convenção para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada em Roma, em 4 de novembro de 1950 (a seguir «CEDH»), como resulta das Anotações relativas à Carta. Daqui decorre, em conformidade com o artigo 52.o, n.o 3, da Carta, que há que tomar em consideração o artigo 6.o, n.os 2 e 3, da CEDH para efeitos da interpretação do artigo 48.o da Carta, enquanto limite de proteção mínima e que se inspirar na jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (a seguir «TEDH») relativa ao artigo 6.o, n.o 2, da CEDH. [v., neste sentido, Acórdão de 5 de setembro de 2019, AH e o. (Presunção de inocência), C‑377/18, EU:C:2019:670, n.os 41 e 42]. Com efeito, o artigo 52.o, n.o 3, da Carta obriga a dar aos direitos nela contidos que correspondam a direitos garantidos pela CEDH o mesmo sentido e o mesmo alcance que os que lhes são conferidos pela referida Convenção (v. Acórdão de 18 de julho de 2013, Schindler Holding e o./Comissão, C‑501/11 P, EU:C:2013:522, n.o 32 e jurisprudência referida).

110    Além disso, há que salientar que, no Acórdão do TEDH de 27 de setembro de 2011, A. Menarini Diagnostics S.R.L. c. Itália (CE:ECHR:2011:0927JUD004350908, n.os 39 a 44), relativo a uma sanção aplicada pela autoridade italiana de regulação da concorrência por práticas anticoncorrenciais análogas às imputadas às recorrentes, o TEDH considerou que, tendo em conta o elevado montante da coima aplicada, a sanção se integrava, pela sua severidade, no domínio penal. Todavia, o TEDH também declarou que a natureza de um procedimento administrativo, como o que estava em causa nesse acórdão, podia diferir, sob vários aspetos, da natureza de um processo penal no sentido estrito do termo. Embora essas diferenças não possam isentar os Estados contratantes da sua obrigação de respeitar todas as garantias oferecidas pela vertente penal do artigo 6.o da CEDH, podem, no entanto, influenciar as modalidades da sua aplicação (TEDH, 27 de setembro de 2011, A. Menarini Diagnostics S.R.L. c. Itália, CE:ECHR:2011:0927JUD004350908, n.o 62; v., igualmente, neste sentido, TEDH, 23 de novembro de 2006, Jussila c. Finlândia, CE:ECHR:2006:1123JUD007305301, n.o 43).

111    O princípio da presunção de inocência implica que qualquer pessoa acusada se presuma inocente até que a sua culpabilidade tenha sido legalmente provada. Opõe‑se assim a qualquer declaração formal e mesmo a qualquer alusão que tenha por objeto a responsabilidade de uma pessoa acusada de uma dada infração numa decisão que põe termo à ação, sem que essa pessoa tenha podido beneficiar de todas as garantias inerentes ao exercício dos direitos de defesa no âmbito de um processo que siga o seu curso normal e que culmine numa decisão sobre a procedência da contestação (v. Acórdão de 10 de novembro de 2017, Icap e o./Comissão, T‑180/15, EU:T:2017:795, n.o 257 e jurisprudência referida).

112    A este respeito, o TEDH considerou que a expressão prematura da culpabilidade de um suspeito numa sentença proferida contra suspeitos acusados separadamente também pode, em teoria, violar o princípio da presunção de inocência (v. TEDH, 27 de fevereiro de 2014, Karaman c. Alemanha, CE:ECHR:2014:0227JUD001710310, n.o 42 e jurisprudência referida).

113    Segundo o TEDH, o princípio da presunção de inocência é violado se uma decisão judicial ou uma declaração oficial relativa a um arguido contiver uma declaração clara, feita na falta de condenação definitiva, segundo a qual a pessoa em causa cometeu a infração em questão. Neste contexto, o TEDH sublinhou a importância, por um lado, da escolha dos termos utilizados pelas autoridades judiciais, bem como das circunstâncias especiais em que estes foram formulados e, por outro, da natureza e do contexto do processo em questão (v., neste sentido, TEDH, de 27 de fevereiro de 2014, Karaman c. Alemanha, CE:ECHR:20140227JUD001710310, n.o 63).

114    O TEDH reconheceu que, nos processos penais complexos em que estavam em causa diversos suspeitos que não podem ser julgados em conjunto, o órgão jurisdicional nacional deve imperativamente, para apreciar a culpa dos arguidos, mencionar a participação de terceiros que seriam em seguida possivelmente julgados separadamente. Todavia, precisou que, se fossem apresentados factos relativos ao envolvimento de terceiros, o órgão jurisdicional em causa devia evitar comunicar mais informações do que as necessárias para a análise da responsabilidade jurídica das pessoas julgadas perante ele. Além disso, este mesmo Tribunal sublinhou que a fundamentação das decisões judiciais devia ser formulada em termos que fossem suscetíveis de evitar um eventual juízo prévio relativo à culpa dos terceiros em causa, suscetível de comprometer o exame equitativo das acusações contra eles deduzidas no âmbito de um processo distinto (v., neste sentido, TEDH, 27 de fevereiro de 2014, Karaman c. Alemanha, CE:ECHR:20140227JUD001710310, n.os 64 e 65, e de 23 de fevereiro de 2016, Navalnyy e Ofitserov c. Rússia, CE:ECHR:2016:0223JUD004663213, n.o 99).

115    Segundo a jurisprudência do TEDH, a violação da presunção de inocência pode emanar não só de um juiz ou de um tribunal, mas também de outras autoridades públicas (v. TEDH, 15 de março de 2011, Begu c. Roménia, CE:ECHR:2011:0315JUD002044802, n.o 126 e jurisprudência referida).

116    No caso em apreço, há que salientar, à semelhança da Comissão, que nenhum dos trechos da decisão de transação evidenciados pelas recorrentes contém referências ou alusões à Scania, das quais resulte que a Comissão, no momento da sua adoção, já tinha antecipado a responsabilidade daquela no âmbito de uma infração ao artigo 101.o TFUE.

117    A este respeito, primeiro, importa recordar o teor do considerando 4 da decisão de transação, que estabelece o seguinte:

«Em 20 de novembro de 2014, a Comissão deu início a um processo nos termos do artigo 11.o, n.o 6, do Regulamento n.o 1/2003 contra os destinatários da presente decisão e diversas entidades de outra empresa. Essa empresa não apresentou proposta de transação em conformidade com o artigo 10.o‑A, n.o 2, do Regulamento n.o 773/2004. À data desta decisão [de transação], o procedimento administrativo instaurado contra essa empresa nos termos do artigo 7.o do Regulamento n.o 1/2003 está pendente. Para eliminar qualquer ambiguidade, a presente decisão [de transação] não formula nenhuma conclusão relativa a essa empresa quanto a uma infração ao direito da concorrência da União Europeia.»

118    Assim, no considerando 4 da decisão de transação, a Comissão visava implicitamente a Scania, por um lado, como sendo uma empresa contra a qual o procedimento administrativo com fundamento no artigo 7.o do Regulamento n.o 1/2003 estava pendente e, por outro, referindo que a decisão de transação não formulava nenhuma conclusão a seu respeito quanto a uma infração ao direito da concorrência da União. Ora, tal referência deve, no máximo, ser qualificada de a expressão de uma suspeita de responsabilidade da Scania, que deveria ainda ser demonstrada, e que não é constitutiva de uma violação da presunção de inocência (v., neste sentido e por analogia, TEDH, 27 de fevereiro de 2014, Karaman c. Alemanha, CE:ECHR:2014:0227JUD001710310, n.o 63, e 31 de outubro de 2017, Bauras c. Lituânia, CE:ECHR:2017:1031JUD005679513, n.o 51 e jurisprudência referida).

119    Todavia, segundo, ainda que a existência dessa referência explícita na decisão de transação à falta, nesta fase, de conclusão sobre a responsabilidade da Scania, nos termos do artigo 101.o TFUE demonstre a vontade da Comissão de cumprir a sua obrigação de respeitar o princípio de presunção de inocência, como foi apresentado pela jurisprudência do TEDH (v., neste sentido, TEDH, 27 de fevereiro de 2014, Karaman c. Alemanha, CE:ECHR:2014:0227JUD001710310, n.os 67, 69 e 70, e 31 de outubro de 2017, Bauras c. Lituânia, CE:ECHR:2017:1031JUD005679513, n.o 54), a saber, referindo claramente que a Scania estava abrangida por um processo distinto que se encontrava pendente e que a sua responsabilidade ainda não tinha sido legalmente estabelecida [v., neste sentido, Acórdão de 5 de setembro de 2019, AH e o. (Presunção de inocência), C‑377/18, EU:C:2019:670, n.o 45], não basta, só por si, para excluir a violação desse princípio, como a Comissão admitiu, em substância, na audiência.

120    Assim, para fiscalizar o respeito da presunção de inocência, há ainda que analisar a fundamentação da decisão de transação no seu conjunto, tendo em conta as circunstâncias específicas em que foi adotada, para verificar se outros excertos dessa decisão, suscetíveis de ser entendidos como uma expressão prematura da responsabilidade da Scania na infração ao direito da concorrência da União, não esvaziam do seu sentido a referência expressa à inexistência da conclusão sobre a sua responsabilidade [v., neste sentido, Acórdão de 5 de setembro de 2019, AH e o. (Presunção de inocência), C‑377/18, EU:C:2019:670, n.o 46].

121    A este respeito, as recorrentes referem o n.o 3 da decisão de transação, dedicado à descrição do comportamento dos seus destinatários e, mais especificamente, determinados excertos nos quais a Comissão descreveu os comportamentos em que tinham participado «entre outros» os destinatários dessa decisão (considerandos 47 e 60 da decisão de transação).

122    A Comissão alegou, na audiência, que essas referências não deviam ser interpretadas no sentido de visarem implicitamente a Scania, ainda que lidas conjuntamente com o considerando 4 da decisão de transação. As recorrentes não apresentaram argumentos suscetíveis de refutar esta interpretação dos considerandos 47 e 60 da decisão de transação.

123    Em todo o caso, mesmo admitindo que, ao fazer referência na decisão de transação ao comportamento «entre outros» dos seus destinatários, a Comissão visava implícita e designadamente a Scania, essa referência não diz respeito à responsabilidade desta na infração em causa na aceção da jurisprudência recordada no n.o 111, supra, mas, quando muito, à sua participação em determinados comportamentos imputados às partes na transação. Por conseguinte, não constitui uma declaração «clara», feita na falta de condenação definitiva, de que a Scania cometeu a infração em causa na aceção da jurisprudência recordada no n.o 113, supra.

124    Com efeito, na decisão de transação, a Comissão procedeu, como alega, à qualificação jurídica dos factos, conforme reconhecidos pelos seus destinatários, no sentido de que constituíam uma infração ao artigo 101.o TFUE e formulou, no n.o 4 da decisão de transação, conclusões quanto à responsabilidade nessa infração apenas no que respeita aos seus destinatários.

125    Contudo, as recorrentes alegam que a violação da presunção de inocência da Scania resulta do facto de a decisão de transação definir a posição final da Comissão em relação aos mesmos factos que os enunciados na comunicação de objeções e conclui que esses factos, em cuja realização a Scania também tinha participado, são constitutivos de uma infração. Segundo as recorrentes, essa declaração excede a simples evocação de uma eventual responsabilidade da Scania.

126    A este respeito, há que salientar que os factos considerados na decisão de transação são os reconhecidos pelas partes na transação, como resulta do considerando 3 da mesma.

127    O simples facto de os destinatários da decisão de transação terem admitido a sua participação na infração e terem reconhecido a sua culpa não pode conduzir ao reconhecimento implícito da responsabilidade da Scania pela sua eventual participação nesses mesmos factos, transformando assim automaticamente, de facto e de jure, as conclusões acolhidas relativamente às partes na transação numa espécie de «sentença disfarçada» da Comissão relativamente à Scania (v., neste sentido, Acórdão de 28 de março de 2019, Pometon/Comissão, T‑433/16, EU:T:2019:201, n.o 68).

128    Todavia, um reconhecimento da culpa pelas partes no cartel que participaram no procedimento de transação constitui uma circunstância que se pode repercutir nos factos que se referem à participação de «outra empresa» suspeita de ter participado no mesmo cartel, neste caso a Scania (v., neste sentido, Acórdão de 28 de março de 2019, Pometon/Comissão, T‑433/16, EU:T:2019:201, n.o 92; v., neste sentido e por analogia, TEDH, 23 de fevereiro de 2016, Navalnyy e Ofitserov c. Rússia, CE:ECHR:2016:0223JUD004663213, n.o 103). Consequentemente, a Comissão deve assegurar que os factos admitidos pelas partes na transação não sejam aceites relativamente a uma parte, como a Scania, que não participe nesse procedimento, sem um exame completo e adequado durante o procedimento ordinário à luz dos argumentos e elementos de prova que esta apresentou (v., neste sentido e por analogia, TEDH, 23 de fevereiro de 2016, Navalnyy e Ofitserov c. Rússia, CE:ECHR:2016:0223JUD004663213, n.os 103 a 105, e 31 de outubro de 2017, Bauras c. Lituânia, CE:ECHR:2017:1031JUD005679513, n.o 53).

129    Neste contexto, importa recordar que, no âmbito do procedimento administrativo ordinário, a empresa em causa e a Comissão se encontram, relativamente ao procedimento de transação, numa situação dita «tabula rasa», em que as responsabilidades devem ainda ser determinadas. Assim, aquando da adoção da decisão em relação à Scania na sequência do procedimento administrativo ordinário, por um lado, a Comissão estava apenas obrigada pela comunicação de objeções e, por outro, estava obrigada, no respeito do princípio do contraditório, a tomar em consideração todas as circunstâncias pertinentes, incluindo todas as informações e todos os argumentos avançados pela Scania no exercício do seu direito de ser ouvida, pelo que estava obrigada a reexaminar o processo tendo em conta esses elementos (v., neste sentido, Acórdão de 20 de maio de 2015, Timab Industries e CFPR/Comissão, T‑456/10, EU:T:2015:296, n.os 90, 96 e 107, conformado em sede de recurso pelo Acórdão de 12 de janeiro de 2017, Timab Industries e CFPR/Comissão, C‑411/15 P, EU:C:2017:11, n.os 119 e 136).

130    Por outro lado, uma qualificação jurídica dos factos feita pela Comissão relativamente às partes na transação não pressupõe, por si só, que a mesma qualificação jurídica dos factos seja necessariamente adotada pela Comissão em relação à Scania no termo do procedimento distinto que lhe diz respeito, como a Comissão sublinhou no considerando 366 da decisão impugnada e confirmou na audiência em resposta a uma pergunta do Tribunal Geral. Com efeito, como resulta da jurisprudência, nada impede a Comissão de concluir que uma parte num acordo ou numa prática concertada é responsável nos termos do artigo 101.o TFUE, ao passo que a outra não o é (v., neste sentido, Acórdão de 12 de julho de 2018, ABB/Comissão, T‑445/14, não publicado, EU:T:2018:449, n.os 177 a 179 e jurisprudência referida).

131    Quanto à alegação das recorrentes de que a violação da presunção de inocência resulta do facto de a decisão de transação e a decisão impugnada assentarem nos mesmos elementos de prova, a Comissão admite que existe uma certa sobreposição entre os elementos de prova em que se baseou nas duas decisões.

132    Todavia, essa sobreposição dos elementos de prova não permite, por si só, concluir que a presunção de inocência não foi respeitada no caso em apreço relativamente às recorrentes. Com efeito, o simples facto de se ter baseado nos mesmos elementos de prova nas duas decisões não constitui qualquer presunção sobre a conclusão que a Comissão podia daí retirar quanto à responsabilidade da Scania.

133    Por outro lado, como justamente alega a Comissão, quando o princípio da presunção de inocência se opõe à declaração formal de uma infração ou a qualquer alusão à responsabilidade das recorrentes que possa ser feita na decisão de transação, na medida em que estas não beneficiaram de todas as garantias habituais para efeitos do exercício dos direitos de defesa no âmbito da sua adoção, este princípio não exclui a possibilidade de se basear nos elementos de prova comuns na condição de as recorrentes terem a oportunidade de contestar, perante os órgãos jurisdicionais da União, as conclusões adotadas com fundamento nesses elementos de prova (v., neste sentido, Acórdão de 12 de outubro de 2007, Pergan Hilfsstoffe für industrielle Prozesse/Comissão, T‑474/04, EU:T:2007:306, n.os 76 e 77), o que é o caso em apreço.

134    Do mesmo modo, não pode colher a alegação das recorrentes de que a violação do princípio da presunção de inocência resulta do facto de a decisão de transação e a decisão impugnada terem sido adotadas com base nas mesmas objeções suscitadas na comunicação de objeções dirigida tanto às partes na transação como às recorrentes.

135    A este respeito, por um lado, há que salientar que, embora a Comissão tenha formulado conclusões sobre o papel e a responsabilidade da Scania em relação à infração em causa na comunicação de objeções enviada tanto à Scania como às partes que vieram a participar no processo de transação, contrariamente ao que alegam as recorrentes, a decisão de transação não se baseia diretamente nessa comunicação de objeções, mas na interpretação comum das objeções entre as partes na transação e a Comissão após as reuniões relativas às transações, em conformidade com o artigo 10.o‑A, n.o 2, do Regulamento n.o 773/2004 e com os n.os 16 e 17 da Comunicação da Comissão relativa à condução de procedimentos de transação para efeitos da adoção de decisões nos termos do artigo 7.o e do artigo 23.o do Regulamento n.o 1/2003 do Conselho nos processos de cartéis, conforme a Comissão sublinhou no considerando 367 da decisão impugnada.

136    Por outro lado, importa salientar que nada impedia as recorrentes de refutar, no procedimento que conduziu à adoção da decisão impugnada e no respeito dos seus direitos de defesa, as acusações formuladas a seu propósito na comunicação de objeções.

137    Com efeito, o respeito dos direitos de defesa obriga a Comissão a dar aos interessados, antes de tomar uma decisão em matéria de coimas, a oportunidade de se pronunciarem com eficácia sobre o seu ponto de vista relativamente às objeções que lhe são imputadas, nomeadamente quanto à realidade e à pertinência dos factos e das circunstâncias alegados e quanto aos documentos que tomou em consideração em apoio da sua alegação da existência de uma infração ao artigo 101.o TFUE (v., neste sentido, Acórdão de 13 de fevereiro de 1979, Hoffmann‑La Roche/Comissão, 85/76, EU:C:1979:36, n.os 9 e 11). |

138    No âmbito de um processo de infração às regras de concorrência, é a comunicação de objeções que constitui, a este respeito, a garantia processual essencial (v. Acórdão de 5 de março de 2015, Comissão e o./Versalis e o., C‑93/13 P e C‑123/13 P, EU:C:2015:150, n.o 95 e jurisprudência referida).

139    Daqui resulta que, ao alegar que a Comissão violou a presunção de inocência da Scania pelo facto de a decisão impugnada e a decisão de transação assentarem nos mesmos factos e elementos de prova, bem como nas mesmas objeções formuladas na comunicação de objeções, tanto em relação às partes na transação como em relação à Scania, as recorrentes não têm em conta o seu direito de apresentar, no exercício do seu direito de serem ouvidas no âmbito do procedimento administrativo ordinário, todos os elementos de prova destinados a contestar os factos e os elementos de prova nos quais a Comissão entende basear‑se, os quais, sendo caso disso, esta tinha tido em conta na adoção da decisão de transação, bem como na obrigação tenda Comissão de reexaminar os autos à luz desses novos elementos.

140    No caso em apreço, as recorrentes não contestam que tiveram oportunidade de exercer efetivamente os seus direitos de defesa no âmbito do procedimento administrativo ordinário antes da adoção da decisão impugnada, tanto por escrito como oralmente, e, consequentemente, de contestar os factos e os elementos de prova apresentados pela Comissão para sustentar as objeções que lhes são imputadas. Em especial, como resulta, nomeadamente, do considerando 379 da decisão impugnada, e que não é contestado pelas recorrentes, estas tiveram a oportunidade de apresentar os seus pontos de vista sobre os factos nos quais a Comissão se fundamentou, nomeadamente sobre aqueles que foram juntos ao processo de instrução após a comunicação de objeções, como os excertos das respostas de determinadas partes na transação à comunicação de objeções ou os elementos de facto adicionais apresentados pela Comissão no decurso do procedimento administrativo ordinário, corroborando as suas conclusões provisórias na comunicação de objeções, que foram comunicadas à Scania com a carta de exposição dos factos de 7 de abril de 2017.

141    Todavia, as recorrentes consideram que os argumentos e as provas que apresentaram foram em vão, uma vez que a Comissão já se tinha pronunciado sobre a qualificação jurídica do comportamento em que a Scania tinha participado como uma infração ao artigo 101.o TFUE.

142    Assim, alegam, em substância, que, ao ter adotado uma qualificação dos factos na decisão de transação como constituindo uma infração ao artigo 101.o TFUE, a Comissão já não estava em condições de alterar essa apreciação e de avaliar objetivamente os elementos de prova e os argumentos apresentados pela Scania, ou de adotar outras medidas de investigação suscetíveis de pôr em causa ou de enfraquecer essas apreciações feitas na decisão de transação. Assim, a decisão de transação influenciou a estratégia de inquérito da Comissão e, em última análise, o conteúdo das provas em que a Comissão fundamentou a decisão impugnada. A este respeito, as recorrentes invocam determinadas circunstâncias relativas à tramitação do procedimento que conduziu à adoção da decisão impugnada, das quais resulta a falta de imparcialidade da Comissão.

143    Assim, alegam que a Comissão violou, no âmbito de uma segunda objeção do primeiro fundamento, a sua obrigação de proceder a uma investigação imparcial, por força do artigo 41.o, n.o 1, da Carta.

144    A este propósito importa recordar que decorre de jurisprudência constante que a Comissão está obrigada a respeitar, ao longo do procedimento administrativo em matéria de cartéis, o direito a uma boa administração, consagrado no artigo 41.o da Carta (v., neste sentido, Acórdão de 11 de julho de 2013, Ziegler/Comissão, C‑439/11 P, EU:C:2013:513, n.o 154 e jurisprudência referida).

145    Nos termos do artigo 41.o da Carta, todas as pessoas têm direito, nomeadamente, a que os seus assuntos sejam tratados pelas instituições da União com imparcialidade. Esta exigência de imparcialidade abrange, por um lado, a imparcialidade subjetiva, no sentido de que nenhum membro da instituição em causa encarregada do processo deve manifestar ideias preconcebidas ou um juízo antecipado pessoal e, por outro, a imparcialidade objetiva, no sentido de que a instituição deve oferecer garantias suficientes para excluir a este respeito todas as dúvidas legítimas (v. Acórdão de 11 de julho de 2013, Ziegler/Comissão, C‑439/11 P, EU:C:2013:513, n.o 155 e jurisprudência referida).

146    Entre as garantias atribuídas pelo direito da União nos procedimentos administrativos, associadas ao princípio da boa administração, figura a que está ligada à obrigação de a instituição competente examinar, com cuidado e imparcialidade, todos os elementos relevantes do caso concreto (v. Acórdão de 27 de setembro de 2012, Shell Petroleum e o./Comissão, T‑343/06, EU:T:2012:478, n.o 170 e jurisprudência referida)

147    A título preliminar, importa recordar que, ao contrário do que a Comissão alega, uma violação do princípio da imparcialidade em circunstâncias semelhantes às do caso em apreço não pode ser avaliada unicamente enquanto eventual consequência de uma violação do princípio da presunção de inocência aquando da adoção da decisão de transação, mas pode resultar de outros incumprimentos da Comissão em oferecer garantias suficientes para excluir qualquer dúvida legítima, na aceção da jurisprudência recordada no n.o 145, supra, quanto à sua imparcialidade na condução do processo ordinário.

148    Todavia, nenhum dos argumentos alegados pelas recorrentes permite demonstrar que a Comissão não ofereceu, neste caso concreto, todas as garantias para excluir qualquer dúvida legítima quanto à sua imparcialidade no exame do processo relativo à Scania, nomeadamente no exame dos argumentos e dos elementos de prova que esta apresentou no âmbito do exercício dos seus direitos de defesa no processo administrativo ordinário.

149    Primeiro, importa sublinhar a este respeito que, quando examina, no âmbito do processo ordinário, os elementos de prova apresentados pelas partes que optaram por não transigir, a Comissão não está de modo algum vinculada pelas conclusões factuais e pelas qualificações jurídicas que teve em consideração na decisão de transação relativamente às partes que decidiram transigir. Assim, em conformidade com o princípio da presunção de inocência e do seu dever de imparcialidade, a Comissão pode chegar a conclusões factuais ou a qualificações jurídicas diferentes das efetuadas na decisão de transação, se a sua reapreciação ex novo dos elementos de prova à sua disposição, em conformidade com o princípio de «tabula rasa», o justificar.

150    Segundo, não pode acolher‑se o argumento das recorrentes de que a dúvida sobre a imparcialidade da Comissão resulta de o membro da Comissão responsável pela concorrência ter anunciado numa conferência de imprensa a adoção da decisão de transação, pelo que a Comissão já não se podia afastar das conclusões dessa decisão no âmbito da decisão impugnada. Com efeito, no comunicado de imprensa em questão, está claramente indicado, à semelhança do considerando 4 da decisão de transação (v. n.o 117, supra), que o membro da referida Comissão não formula nenhuma conclusão relativa à responsabilidade da Scania cujo processo ordinário ainda estava em curso. O membro da Comissão responsável pela concorrência limitou‑se assim, no referido comunicado, a informar o público sobre a adoção da decisão de transação com a discrição e reserva, no que se refere à responsabilidade da Scania na infração em causa, exigidas pelo respeito da presunção de inocência, e consequentemente, não violou a sua obrigação de imparcialidade (v., neste sentido e por analogia, Acórdão de 12 de dezembro de 2018, Servier e o./Comissão, T‑691/14, sob recurso, EU:T:2018:922, n.os 132 e 134).

151    Terceiro, as recorrentes não demonstram de que modo o facto de os mesmos serviços da Comissão, nomeadamente os da Direção‑Geral da «Concorrência», terem estado envolvidos na adoção tanto da decisão de transação como da decisão impugnada, era, por si só, capaz de provar a inexistência de um exame imparcial do seu processo. É certo que o envolvimento dos mesmos serviços na adoção das duas decisões torna mais difícil assegurar que o exame dos factos e das provas contra uma empresa após a adoção da decisão de transação se fará segundo o princípio de «tabula rasa» imposto pela jurisprudência (v. n.o 129, supra), o que poderia justificar, para eliminar todas as dúvidas a esse propósito, a atribuição dos processos a duas equipas diferentes.

152    Todavia, no caso em apreço, as recorrentes não demonstram que um membro da Comissão ou dos serviços envolvidos na adoção da decisão impugnada tenha manifestado ideias preconcebidas ou um juízo prévio pessoal em relação à Scania, nomeadamente pelo facto de ter participado na adoção da decisão de transação, em violação do princípio da imparcialidade subjetiva, o que poderia ser suscetível de afetar a análise imparcial dos factos e das provas no que respeita à Scania.

153    Quarto, quanto ao argumento das recorrentes de que a Comissão não esteve disposta a adotar novas medidas de investigação que a poderiam ter levado a pôr em causa a sua posição adotada na decisão de transação, deve recordar‑se que o princípio que prevalece em direito da União é o da livre administração das provas (v. Acórdão de 29 de fevereiro de 2016, Schenker/Comissão, T‑265/12, EU:T:2016:111, n.o 40 e jurisprudência referida).

154    Importa também salientar, à semelhança da Comissão, que esta dispõe de uma margem de apreciação quanto à oportunidade de adotar medidas de investigação. Assim, contrariamente ao que alegam as recorrentes, uma manifestação da parcialidade da Comissão em relação às recorrentes não pode ser deduzida de forma abstrata da existência dessa margem de apreciação na forma de conduzir o inquérito. Pelo contrário, a não adoção de outras medidas de investigação explica‑se, antes de mais, pelo exercício pela Comissão da sua margem de apreciação no que se refere à oportunidade de adotar tais medidas. Por conseguinte, competia às recorrentes apresentar argumentos que permitissem demonstrar de maneira concreta que a inexistência de medidas de investigação suplementares só podia ser explicada pela parcialidade da Comissão e não pelo exercício legítimo por esta da sua margem de apreciação na condução do inquérito.

155    As recorrentes alegam, a este respeito, que a Comissão, na sua apreciação da natureza e do alcance (temporal e geográfico) do comportamento alegado, nomeadamente nos considerandos 144 e 339 da decisão impugnada, se baseou numa apreciação dos factos, que a Scania rejeitava e refutava de forma circunstanciada. Nada indica no processo que a Comissão tenha prosseguido a investigação a fim de verificar as conclusões da Scania, por exemplo enviando‑lhe um pedido de informação para que esta apresentasse provas documentais das suas observações ou dessas conclusões, ou dirigindo tal pedido a outras partes. Assim, considera que a Comissão cometeu uma «omissão interessada».

156    Todavia, esses argumentos das recorrentes demonstram, quando muito, que a Comissão não seguiu as conclusões ou a interpretação dos factos propostas pela Scania, designadamente ao considerar que lhes faltava credibilidade (v., nomeadamente, considerando 301 da decisão impugnada) e que se confundem com a questão de saber se as apreciações de facto efetuadas na decisão impugnada estão devidamente demonstradas pelos elementos de prova que a Comissão apresentou e se cometeu erros de direito na sua análise, o que se enquadra no exame do mérito da sua apreciação (v., neste sentido, Acórdão de 12 de dezembro de 2018, Servier e o./Comissão, T‑691/14, pendente de recurso, EU:T:2018:922, n.o 137 e jurisprudência referida). Tais alegações não são suscetíveis de demonstrar que a Comissão se mostrou parcial ao decidir, no exercício da sua margem de apreciação, não prosseguir a instrução e, nomeadamente, não pedir às recorrentes para apresentarem elementos de prova adicionais em apoio das suas próprias alegações.

157    Quinto, as recorrentes alegam que a Comissão não agiu de maneira independente na medida em que, em relação aos alegados cartéis, é a autoridade responsável simultaneamente pela instrução, pelos procedimentos processuais e pela tomada de decisão.

158    A este respeito, importa recordar que resulta da jurisprudência que a acumulação pela Comissão das funções de instrução e de punição das infrações ao artigo 101.o TFUE não é, em si, contrária ao artigo 6.o da CEDH como interpretado pelo TEDH e não constitui uma violação do princípio de imparcialidade, uma vez que as suas decisões estão sujeitas à fiscalização do juiz da União que oferece as garantias previstas nesse artigo 6.o da CEDH (v., neste sentido, Acórdãos de 18 de julho de 2013, Schindler Holding e o./Comissão, C‑501/11 P, EU:C:2013:522, n.os 33 a 38 e jurisprudência referida, e de 27 de junho de 2012, Bolloré/Comissão, T‑372/10, EU:T:2012:325, n.os 65 a 67).

159    Quanto à objeção relativa à violação dos direitos de defesa, importa salientar que as recorrentes não acusam a Comissão de não ter respeitado, no procedimento administrativo que conduziu à adoção da decisão impugnada, todas as garantias processuais ligadas ao exercício efetivo dos seus direitos de defesa, conforme previstos nomeadamente pelas disposições gerais do Regulamento n.o 773/2004 (v. n.o 140, supra), antes invocam a violação dos seus direitos de defesa apenas no que diz respeito à questão de, na decisão de transação, a Comissão ter procedido à qualificação jurídica dos factos reportando‑se aos comportamentos das partes na transação, mas implicando necessariamente a Scania, sem que esta tivesse tido a possibilidade de exercer os seus direitos de defesa.

160    A este respeito, importa recordar que o respeito dos direitos de defesa em qualquer procedimento suscetível de ter por resultado a aplicação de sanções, nomeadamente de coimas ou de sanções pecuniárias, constitui um princípio fundamental do direito da União, reiteradamente sublinhado pela jurisprudência do Tribunal de Justiça e consagrado no artigo 48.o, n.o 2, da Carta (v. Acórdão de 14 de setembro de 2010, Akzo Nobel Chemicals e Akcros Chemicals/Comissão e o., C‑550/07 P, EU:C:2010:512, n.o 92 e jurisprudência referida). Este princípio deve ser plenamente observado mesmo tratando‑se de um procedimento de natureza administrativa (v. Acórdãos de 9 de julho de 2009, Archer Daniels Midland/Comissão, C‑511/06 P, EU:C:2009:433, n.o 84 e jurisprudência referida, e de 5 de março de 2015, Comissão e o./Versalis e o., C‑93/13 P e C‑123/13 P, EU:C:2015:150, n.o 94 e jurisprudência referida).

161    O princípio do contraditório faz parte dos direitos de defesa. Aplica‑se a todos os procedimentos suscetíveis de conduzir a decisões de instituições da União que afetem de forma sensível os interesses de uma pessoa (v. Acórdão de 2 de dezembro de 2009, Comissão/Irlanda e o., C‑89/08 P, EU:C:2009:742, n.os 50 e 51 e jurisprudência referida).

162    Na medida em que as recorrentes alegam que a decisão de transação foi adotada sem que tenham podido exprimir‑se, há que salientar, como resulta do exame da objeção relativa a uma violação da presunção de inocência, que a decisão de transação não afetou de forma sensível os interesses das recorrentes na aceção da jurisprudência recordada no n.o 161, supra, na medida em que, contrariamente ao que alegam, a Comissão não procedeu na decisão de transação à qualificação jurídica dos factos imputados à Scania. Consequentemente, o facto de a Scania não ter sido ouvida no âmbito do procedimento que levou à adoção da decisão de transação não viola os seus direitos de defesa.

163    Por último, também não pode proceder o argumento das recorrentes de que, do facto de a Comissão ter consultado as partes na transação no âmbito da preparação da versão não confidencial da decisão impugnada com vista à sua publicação resulta uma «relação evidente» entre a decisão de transação e a decisão impugnada. Com efeito, por um lado, as recorrentes não explicam de que maneira essa «relação evidente» apoia as suas alegações apresentadas no âmbito do primeiro fundamento. Por outro lado, e em todo o caso, como alega a Comissão, procedendo desta forma, a referida instituição aplicou a jurisprudência resultante do Acórdão de 12 de outubro de 2007, Pergan Hilfsstoffe für industrielle Prozesse/Comissão (T‑474/04, EU:T:2007:306), ao oferecer às partes na transação a possibilidade de invocarem a confidencialidade de determinados dados que lhes diziam respeito, tendo em conta que, não sendo os destinatários da decisão impugnada, eram aí mencionadas.

164    Do mesmo modo, as recorrentes não podem alegar utilmente que um simples erro técnico que tem como consequência que, no sítio Internet da Comissão, na rubrica relativa à decisão impugnada, a ligação conduzia para a decisão de transação permite considerar que existe uma ligação entre as duas decisões, pelo que se poderia retirar daí uma conclusão relativa à responsabilidade da Scania nos termos do artigo 101.o TFUE.

165    Daqui resulta que o primeiro fundamento deve ser julgado improcedente.

2.      Quanto ao segundo fundamento, relativo à violação do artigo 48.o, n.o 2, da Carta e do artigo 27.o, n.os 1 e 2, do Regulamento n.o 1/2003

166    As recorrentes alegam, em substância, que a Comissão violou os seus direitos de defesa, infringindo o artigo 48.o, n.o 2, da Carta e o artigo 27.o, n.os 1 e 2, do Regulamento n.o 1/2003, ao recusar‑lhes o acesso à totalidade das respostas à comunicação de objeções apresentadas por [confidencial] e por [confidencial], uma vez que, em seu entender, é provável que estas contenham elementos de defesa em relação às outras partes, nomeadamente a Scania, além dos que figuram nos excertos dessas respostas às quais foi concedido acesso pelo Auditor.

167    Com efeito, segundo as recorrentes, [confidencial] e [confidencial] tinham utilizado as suas respostas à comunicação de objeções para contestar as alegações da Comissão a seu respeito, como demonstram os excertos que a Scania foi autorizada a examinar. As recorrentes consideram que o facto de a Comissão ter alterado parcialmente o seu parecer sobre a questão de saber se as respostas de [confidencial] e de [confidencial] eram a favor ou contra suscitam dúvidas quanto ao mérito da recusa de pleno acesso a essas respostas.

168    Baseando‑se na jurisprudência, a Comissão refuta os argumentos das recorrentes na medida em que não demonstram que a recusa de conceder à Scania o acesso à totalidade das respostas de [confidencial] de [confidencial] à comunicação de objeções que não se enquadram num processo de instrução propriamente dito, tinha prejudicado o exercício efetivo dos seus direitos de defesa e, nomeadamente, o direito de consultar os documentos suscetíveis de conter elementos de prova favoráveis que lhe dizem respeito.

169    Como resulta da jurisprudência recordada no n.o 160, supra, o respeito dos direitos de defesa em qualquer procedimento suscetível de ter como resultado a aplicação de sanções, nomeadamente coimas ou sanções pecuniárias, constitui um princípio fundamental do direito da União, reiteradamente sublinhado pela jurisprudência do Tribunal de Justiça e consagrado no artigo 48.o, n.o 2, da Carta. Este princípio deve ser plenamente observado mesmo tratando‑se de um procedimento de natureza administrativa.

170    Nos termos do artigo 27.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003, «[o]s direitos da defesa das partes interessadas serão plenamente acautelados no desenrolar do processo» e «[a]s partes têm direito a consultar o processo em poder da Comissão, sob reserva do interesse legítimo das empresas na proteção dos seus segredos comerciais».

171    Há que salientar que, segundo jurisprudência constante, o respeito dos direitos de defesa exige igualmente que a pessoa interessada tenha podido, durante o procedimento administrativo, dar a conhecer utilmente o seu ponto de vista sobre a realidade e a pertinência dos factos e das circunstâncias alegados bem como sobre os documentos considerados pela Comissão em apoio da sua alegação de existência de uma infração ao Tratado (v. Acórdão de 7 de janeiro de 2004, Aalborg Portland e o./Comissão, C‑204/00 P, C‑205/00 P, C‑211/00 P, C‑213/00 P, C‑217/00 P e C‑219/00 P, EU:C:2004:6, n.o 66 e jurisprudência referida).

172    Corolário do princípio do respeito dos direitos de defesa, o direito de acesso ao processo implica que a Comissão deva facultar à empresa em causa a possibilidade de proceder a um exame de todos os documentos que figuram no processo de instrução e que possam ser pertinentes para a sua defesa. Estes incluem elementos de prova tanto de acusação como de defesa, com a ressalva dos segredos comerciais de outras empresas, dos documentos internos da Comissão e de outras informações confidenciais (Acórdão de 7 de janeiro de 2004, Aalborg Portland e o./Comissão, C‑204/00 P, C‑205/00 P, C‑211/00 P, C‑213/00 P, C‑217/00 P e C‑219/00 P, EU:C:2004:6, n.o 68).

173    A este propósito, há que recordar que é unicamente no início da fase administrativa contraditória do processo que a empresa interessada é informada, através da comunicação de acusações, de todos os elementos essenciais nos quais a Comissão se funda nesta fase do processo, e que esta empresa goza do direito de acesso ao processo a fim de garantir o exercício efetivo dos seus direitos de defesa. Por conseguinte, a resposta das outras partes à comunicação de acusações não está, em princípio, incluída no conjunto dos documentos do processo de instrução que as partes podem consultar (Acórdãos de 14 de maio de 2020, NKT Verwaltung e NKT/Comissão, C‑607/18 P, não publicado, EU:C:2020:385, n.o 263, e de 30 de setembro de 2009, Hoechst/Comissão, T‑161/05, EU:T:2009:366, n.o 163).

174    Porém, se a Comissão entende basear‑se numa passagem de uma resposta à comunicação de acusações ou num documento anexo a essa resposta, para concluir pela existência de uma infração num processo de aplicação do artigo 101.o TFUE, deve ser dada às outras partes no processo a possibilidade de se pronunciarem sobre esse elemento de prova. Nestas circunstâncias, a passagem em questão de uma resposta à comunicação de acusações ou o documento anexo a essa resposta constituem, na verdade, um elemento de acusação contra as diferentes partes que participaram na infração (Acórdão de 14 de maio de 2020, NKT Verwaltung e NKT/Comissão, C‑607/18 P, não publicado, EU:C:2020:385, n.o 264; v., igualmente, Acórdão de 30 de setembro de 2009, Hoechst/Comissão, T‑161/05, EU:T:2009:366, n.o 164 e jurisprudência referida).

175    Por analogia, se uma passagem de uma resposta a uma comunicação de acusações ou um documento anexo a essa resposta puder ser pertinente para a defesa de uma empresa na medida em que lhe permite invocar elementos não compatíveis com as deduções efetuadas nessa fase pela Comissão, constitui um elemento de defesa. Nesse caso, a empresa em causa deve ter a possibilidade de proceder a uma análise da passagem ou do documento em questão e de se pronunciar sobre o mesmo (Acórdão de 12 de julho de 2011, Mitsubishi Electric/Comissão, T‑133/07, EU:T:2011:345, n.o 43).

176    No entanto, o simples facto de outras empresas terem invocado os mesmos argumentos que a empresa em causa e de eventualmente terem utilizado mais recursos na sua defesa não é suficiente para considerar esses argumentos elementos de defesa (v., neste sentido, Acórdão de 27 de setembro de 2006, Jungbunzlauer/Comissão, T‑43/02, EU:T:2006:270, n.os 353 e 355).

177    Relativamente às consequências de um acesso ao processo que não respeite essas regras, quanto à não comunicação de um documento de defesa, a empresa em causa deve demonstrar que a sua não divulgação pôde influenciar, em prejuízo desta última, o desenrolar do processo e o conteúdo da decisão da Comissão. Basta que a empresa demonstre que poderia ter feito uso do referido documento de defesa, no sentido de que, se o pudesse ter invocado durante o procedimento administrativo, teria podido invocar elementos que não eram concordantes com as deduções feitas nessa fase pela Comissão e, consequentemente, teria podido influenciar, de uma maneira ou de outra, as apreciações feitas por esta última na decisão, pelo menos no que respeita à gravidade e à duração do comportamento que lhe era censurado, e, portanto, o nível da coima (Acórdão de 7 de janeiro de 2004, Aalborg Portland e o./Comissão, C‑204/00 P, C‑205/00 P, C‑211/00 P, C‑213/00 P, C‑217/00 P e C‑219/00 P, EU:C:2004:6, n.os 74 e 75).

178    A possibilidade de que um documento não divulgado tenha podido influenciar o desenrolar do procedimento e o conteúdo da decisão da Comissão só pode ser provada através de um exame provisório de determinados meios de prova, do qual resulte que os documentos não divulgados podiam ter tido — em relação a esses meios de prova — uma importância que não deveria ter sido menosprezada (Acórdão de 7 de janeiro de 2004, Aalborg Portland e o./Comissão, C‑204/00 P, C‑205/00 P, C‑211/00 P, C‑213/00 P, C‑217/00 P e C‑219/00 P, EU:C:2004:6, n.o 76).

179    Contudo, cabe ao recorrente apresentar um primeiro indício da utilidade dos documentos não comunicados para a sua defesa (v. Acórdão de 14 de março de 2013, Fresh Del Monte Produce/Comissão, T‑587/08, EU:T:2013:129, n.o 690 e jurisprudência referida; v., igualmente, neste sentido, Acórdão de 14 de maio de 2020, NKT Verwaltung e NKT/Comissão, C‑607/18 P, não publicado, EU:C:2020:385, n.o 265 e jurisprudência referida). Assim, deve nomeadamente indicar os potenciais elementos de defesa ou fornecer um indício que ateste da sua existência e, assim, da sua utilidade para as necessidades da instância (v. Acórdão de 16 de junho de 2011, Heineken Nederland e Heineken/Comissão, T‑240/07, EU:T:2011:284, n.o 257 e jurisprudência referida).

180    Tendo em conta estes princípios, há que examinar se, no caso em apreço, a recusa da Comissão de conceder o acesso à totalidade das respostas de [confidencial] e de [confidencial] à comunicação de objeções era suscetível de lesar os direitos de defesa das recorrentes na medida em que não tinham tido um acesso adequado aos elementos de prova potencialmente de defesa, como alegam.

181    A este respeito, há que salientar, à semelhança da Comissão, que existe uma diferença no acesso ao processo da Comissão relativo ao cartel em causa em função do momento em que um documento foi junto ao processo de instrução, o que também resulta do n.o 27 da Comunicação da Comissão relativa às regras de acesso ao processo nos casos de aplicação dos artigos [101.o] e [102.o TFUE], dos artigos 53.o, 54.o e 57.o do Acordo EEE e do Regulamento (CE) n.o 139/2004 do Conselho (JO 2005, C 325, p. 7). Enquanto as partes interessadas, para poderem exercer eficazmente o seu direito de defesa, têm o direito de consultar o processo de instrução tal como existe no momento do envio da comunicação de objeções, e isto para poderem responder utilmente às acusações feitas nessa fase pela Comissão, o acesso aos elementos juntos em seguida ao processo, nomeadamente às respostas das outras participantes no cartel à comunicação de objeções, não é automático nem ilimitado (v., neste sentido, Acórdão de 14 de maio de 2020, NKT Verwaltung e NKT/Comissão, C‑607/18 P, não publicado, EU:C:2020:385, n.o 265).

182    No caso em apreço, há que recordar que o Auditor concedeu às recorrentes o acesso a certas passagens das respostas à comunicação de objeções apresentadas por [confidencial] e por [confidencial], considerando que podiam conter elementos de defesa relativos à Scania, tendo em conta que provinham de um requerente de clemência e de uma empresa à qual a Comissão tinha enviado um pedido de informações, de modo que podiam conter alterações ou retiradas das declarações nas quais a Comissão se tinha baseado.

183    No entanto, as recorrentes alegam que «é provável» que as respostas à comunicação de objeções apresentadas por [confidencial] e por [confidencial] contenham ainda outros elementos de defesa que poderiam ter invocado utilmente no âmbito do exercício dos seus direitos de defesa.

184    Todavia, há que constatar que, como alega, em substância, a Comissão, as recorrentes continuam a ser muito vagas no que respeita à identificação dos potenciais elementos de defesa que consideram que as respostas de [confidencial] e de [confidencial] à comunicação de objeções contêm e que não lhes foram comunicadas na sequência da decisão do Auditor e, portanto, não apresentam nenhum indício que demonstre a sua existência e, consequentemente, a sua utilidade para a sua defesa na aceção da jurisprudência referida no n.o 179, supra.

185    Com efeito, as recorrentes não esclarecem de forma alguma as apreciações da Comissão constantes da decisão impugnada que poderiam ter sido influenciadas se lhes tivesse sido concedido o acesso integral às respostas à comunicação de objeções de [confidencial] e de [confidencial]. Especificamente, não identificam nenhuma dedução relativa ao comportamento infracional da própria Scania que a Comissão tenha baseado concretamente num elemento abrangido pelo pedido de clemência [confidencial] ou na resposta ao pedido de informações de [confidencial] e que pudesse, eventualmente, ter sido alterado ou retirado por essas partes nas suas respostas à comunicação de objeções.

186    A este respeito, as recorrentes invocam as circunstâncias processuais específicas deste caso e, mais concretamente, o facto de [confidencial] e [confidencial], duas partes na transação, terem enviado à Comissão as suas respostas à comunicação de objeções no momento em que estavam em curso as conversações relativas à resolução por transação, apenas algumas semanas antes de terem «verdadeiramente» apresentado a sua proposta de transação e antes da adoção da decisão de transação. As recorrentes deduzem daí que essas respostas deveriam conter, necessariamente, as contestações das alegações da Comissão a seu respeito, o que resultava também dos excertos das respostas em questão cujo acesso foi concedido à Scania.

187    Todavia, esse indício circunstancial e temporal relativo ao facto de as partes na transação terem respondido à comunicação de objeções durante o procedimento de resolução por transação não basta, por si só, para demonstrar que essas respostas contêm novos elementos de prova de defesa relativamente à Scania.

188    Ora, as recorrentes não contestam que os excertos das respostas em causa a que o Auditor lhes concedeu acesso continham elementos de prova de defesa úteis para a sua defesa e nem sequer tentam inferir desses excertos indícios que sugiram que as partes não divulgadas dessas respostas podiam, por dedução, conter outros elementos de defesa úteis para a sua defesa. Com efeito, os argumentos das recorrentes a este respeito são apenas gerais e abstratos.

189    Resulta do que precede que as recorrentes não apresentaram qualquer indício da utilidade, para a sua defesa, das partes não divulgadas das respostas à comunicação de objeções apresentadas por [confidencial] e por [confidencial]. Consequentemente, não demonstraram que a Comissão tenha violado os seus direitos de defesa pelo facto de não lhes ter comunicado as versões integrais das respostas em causa.

190    Nestas circunstâncias, o segundo fundamento deve ser julgado improcedente, sem que haja que adotar a medida de organização do processo pedida pelas recorrentes e que tinha por objeto instar a Comissão a apresentar as versões integrais das respostas à comunicação de objeções em causa.

3.      Quanto aos terceiro, quarto, quinto, sexto e sétimo fundamentos, na medida em que visam a conclusão da Comissão relativa à existência de uma infração única e continuada e à sua imputação à Scania

a)      Observações preliminares

1)      Quanto ao conceito de infração única e continuada

191    Segundo jurisprudência constante, a violação do artigo 101.o TFUE pode resultar não apenas de um ato isolado, mas igualmente de uma série de atos, ou mesmo de um comportamento continuado, quando efetivamente um ou diversos elementos dessa série de atos ou desse comportamento continuado também possam constituir, por si sós e considerados isoladamente, uma violação da referida disposição. Assim, quando as diferentes ações se inscrevem num «plano de conjunto», em razão do seu objeto idêntico que falseia o jogo da concorrência no interior do mercado interno, a Comissão pode imputar a responsabilidade por essas ações em função da participação na infração considerada no seu todo (v. Acórdão de 6 de dezembro de 2012, Comissão/Verhuizingen Coppens, C‑441/11 P, EU:C:2012:778, n.o 41 e jurisprudência referida).

192    Uma empresa que participou numa infração única e complexa, através de comportamentos que lhe são próprios, que integram as noções de acordo ou de prática concertada que têm um objetivo anticoncorrencial no sentido do artigo 101.o, n.o 1, TFUE e que visam contribuir para a realização da infração no seu conjunto, também pode ser responsável pelos comportamentos postos em prática por outras empresas, no quadro da mesma infração, durante todo o período em que participou na referida infração. É o que ocorre quando se prova que a empresa em questão pretendeu contribuir, com o seu próprio comportamento, para os objetivos comuns prosseguidos pelo conjunto das participantes e tinha conhecimento dos comportamentos infratores perspetivados ou aplicados por outras empresas na prossecução dos mesmos objetivos, ou podia razoavelmente prevê‑los e estava pronta a aceitar o risco (v. Acórdão de 6 de dezembro de 2012, Comissão/Verhuizingen Coppens, C‑411/11 P, EU:C:2012:778, n.o 42 e jurisprudência referida).

193    Assim, uma empresa pode ter participado diretamente em todos os comportamentos anticoncorrenciais que compõem a infração única e continuada, caso em que a Comissão tem o direito de lhe imputar a responsabilidade de todos esses comportamentos e, portanto, da referida infração no seu todo. A empresa pode igualmente só ter participado numa parte dos comportamentos anticoncorrenciais que compõem a infração única e continuada, mas ter tido conhecimento de todos os outros comportamentos infratores perspetivados ou aplicados por outros participantes no cartel na prossecução dos mesmos objetivos, ou ter podido razoavelmente prevê‑los e ter estado pronta a aceitar o risco. Nesse caso, a Comissão tem também o direito de lhe imputar a responsabilidade de todos os comportamentos anticoncorrenciais que compõem essa infração e, por consequência, de toda a infração. (Acórdão de 6 de dezembro de 2012, Comissão/Verhuizingen Coppens, C‑411/11 P, EU:C:2012:778, n.o 43).

194    Em contrapartida, se uma empresa participou diretamente num ou em vários comportamentos anticoncorrenciais que compõem uma infração única e continuada, mas não foi provado que, com o seu próprio comportamento, pretendia contribuir para todos os objetivos comuns prosseguidos pelos outros participantes no cartel e tinha conhecimento de todos os outros comportamentos infratores perspetivados ou aplicados pelos referidos participantes na prossecução dos mesmos objetivos, ou podia razoavelmente prevê‑los e estava pronta a aceitar o risco, a Comissão só tem o direito de lhe imputar a responsabilidade dos comportamentos em que participou diretamente e dos comportamentos perspetivados ou aplicados por outros participantes na prossecução dos mesmos objetivos que ela prosseguia, de que está provado que tinha conhecimento ou podia razoavelmente prevê‑los e estava pronta a aceitar o risco (Acórdão de 6 de dezembro de 2012, Comissão/Verhuizingen Coppens, C‑411/11 P, EU:C:2012:778, n.o 44).

195    Por último, o Tribunal de Justiça esclareceu que, para qualificar diferentes comportamentos de infração única e continuada, não havia que verificar se apresentavam um nexo de complementaridade, no sentido de que cada um deles se destinava a fazer face a uma ou mais consequências do jogo normal da concorrência, contribuindo, através de uma interação, para a realização de todos os efeitos anticoncorrenciais pretendidos pelos seus autores, no âmbito de um plano global com um objetivo único. Em contrapartida, a condição relativa ao conceito de objetivo único implica que se verifique se não existem elementos que caracterizam os diferentes comportamentos que fazem parte da infração que sejam suscetíveis de indicar que os comportamentos materialmente executados por outras empresas participantes não partilham o mesmo objetivo ou o mesmo efeito anticoncorrencial e não se inscrevem consequentemente num «plano de conjunto» em razão do seu objetivo idêntico que falseia a concorrência no mercado interno (v., neste sentido, Acórdão de 19 de dezembro de 2013, Siemens e o./Comissão, C‑239/11 P, C‑489/11 P e C‑498/11 P, não publicado, EU:C:2013:866, n.os 247 e 248).

196    Conforme resulta da jurisprudência referida nos n.os 191 e 192, supra, para concluir pela participação de uma empresa numa infração única e continuada são determinantes três elementos. O primeiro diz respeito à própria existência da infração única e continuada. Os diferentes comportamentos em causa devem fazer parte de um «plano de conjunto» que possui um objetivo único. Os segundo e terceiro elementos dizem respeito à imputabilidade da infração única e continuada a uma empresa. Por um lado, esta empresa tem de ter tido a intenção de contribuir através do seu próprio comportamento para os objetivos comuns prosseguidos por todos os participantes. Por outro, tem de ter tido conhecimento dos comportamentos ilícitos projetados ou adotados por outras empresas na prossecução dos mesmos objetivos, ou devia poder razoavelmente prevê‑los e estar disposta a correr o respetivo risco (Acórdão de 24 de setembro de 2019, HSBC Holdings e o./Comissão, T‑105/17, pendente de recurso, EU:T:2019:675, n.o 208; v., igualmente, neste sentido, Acórdão de 16 de junho de 2011, Team Relocations e o./Comissão, T‑204/08 e T‑212/08, EU:T:2011:286, n.o 37).

2)      Quanto ao ónus e ao nível da prova

197    Na medida em que a qualificação de infração única e continuada faz com que seja imputada a uma empresa a participação numa infração ao direito da concorrência, importa recordar que, no domínio do direito da concorrência, em caso de litígio sobre a existência de uma infração, compete à Comissão provar as infrações que constata e apresentar os elementos de prova adequados a demonstrar, juridicamente, a existência de factos constitutivos de uma infração (v. Acórdão de 22 de novembro de 2012, E.ON Energie/Comissão, C‑89/11 P, EU:C:2012:738, n.o 71 e jurisprudência referida).

198    Para demonstrar a existência de uma infração ao artigo 101.o, n.o 1, TFUE, é necessário que a Comissão apresente provas sérias, precisas e concordantes. Porém, as provas que esta apresenta não têm de necessariamente cumprir estes critérios relativamente a todos os elementos da infração. Basta que o conjunto dos indícios apresentados por essa instituição, apreciados globalmente, satisfaça esta exigência (v. Acórdão de 1 de julho de 2010, Knauf Gips/Comissão, C‑407/08 P, EU:C:2010:389, n.o 47 e jurisprudência referida).

199    Por outro lado, quando, na demonstração de uma infração ao direito da concorrência, a Comissão se baseia em provas documentais, cabe às empresas em causa não só apresentarem uma alternativa plausível à tese da Comissão, mas também arguírem a insuficiência das provas em que a decisão impugnada se baseia para dar por provada a existência da infração (v. Acórdão de 16 de junho de 2015, FSL e o./Comissão, T‑655/11, EU:T:2015:383, n.o 181 e jurisprudência referida).

200    Acresce que, se subsistir uma dúvida no espírito do juiz, a mesma deve aproveitar à empresa destinatária da decisão que declara uma infração (Acórdão de 16 de fevereiro de 2017, Hansen & Rosenthal e H & R Wax Company Vertrieb/Comissão, C‑90/15 P, não publicado, EU:C:2017:123, n.o 18). Com efeito, há que recordar que a presunção de inocência constitui um princípio geral do direito da União, atualmente enunciado no artigo 48.o, n.o 1, da Carta. Este princípio aplica‑se aos processos relativos a violações das regras de concorrência aplicáveis às empresas suscetíveis de conduzir à aplicação de coimas ou de sanções pecuniárias compulsórias (v. n.o 108, supra).

3)      Decisão impugnada

201    Na decisão impugnada, a Comissão considerou que a Scania e as partes na transação prosseguiam um plano comum com o objetivo anticoncorrencial único de limitar a concorrência no mercado de camiões médios e pesados no EEE. Este objetivo foi alcançado através de práticas que reduzem os níveis de incerteza estratégica entre as partes no que respeita aos preços futuros e aos aumentos dos preços brutos, bem como ao calendário e à repercussão dos custos ligados à comercialização de camiões que respeitam as normas ambientais (considerando 317 da decisão impugnada). A Comissão esclareceu que as interações entre as partes:

–        estavam relacionadas com alterações projetadas dos preços brutos e das tabelas de preços brutos, bem como, ocasionalmente, dos preços líquidos ou com alterações dos descontos oferecidos aos clientes, bem como com o calendário dessas alterações;

–        estavam relacionadas com o calendário e a repercussão dos custos da instalação das tecnologias em matéria de emissões para os camiões médios e pesados exigidos pelas normas Euro 3 a Euro 6;

–        constituíam uma forma de partilhar outras informações sensíveis do ponto de vista da concorrência, como informações relativas aos prazos de entrega, às encomendas, às existências, às quotas de mercado alvo, aos preços líquidos atuais e aos descontos e às tabelas de preços brutos (mesmo antes da sua entrada em vigor) e aos operadores de veículos pesados.

202    A Comissão considerou que o comportamento referido supra fazia parte de um plano comum com um objetivo anticoncorrencial único por cinco razões, apresentadas em detalhe nos n.os 452 a 462, infra. Estas razões resultavam, nomeadamente, do facto de os contactos anticoncorrenciais dizerem respeito aos mesmos produtos, a saber, camiões médios e pesados, e ao mesmo grupo de fabricantes de camiões, do facto de a natureza das informações partilhadas (informações sobre tabelas de preços e informações sobre o calendário e a comercialização dos modelos de camiões conformes com normas ambientais específicas) se ter mantido a mesma durante todo o período de duração da infração, do facto de os contactos anticoncorrenciais terem ocorrido de maneira frequente e sistemática e do facto de a natureza, o alcance e o objetivo desses contactos terem permanecido os mesmos durante todo o período de duração da infração apesar de a circunstância de o nível e as responsabilidades internas dos trabalhadores envolvidos nesses contactos terem evoluído durante a infração.

4)      Quanto ao argumento das recorrentes de que o conceito de infração única e continuada pressupõe que a Comissão identifique várias infrações manifestamente relacionadas entre si

203    Na réplica, as recorrentes alegaram que o recurso ao conceito de infração única e continuada pressupunha a identificação pela Comissão de várias infrações manifestamente relacionadas entre si. Segundo as recorrentes, uma infração única e continuada não pode englobar comportamentos que não constituam uma infração em si mesma.

204    Partindo desta premissa, em primeiro lugar, as recorrentes alegaram que a Comissão deveria ter avaliado as provas relativas a cada nível dos contactos separadamente para determinar se cada nível constituía uma infração e, em caso afirmativo, determinar o seu alcance e o objetivo anticoncorrencial que era prosseguido. Em segundo lugar, a Comissão deveria ter avaliado se as infrações em causa deviam ser consideradas uma infração global única pelo facto de prosseguirem um plano global que servia um objetivo anticoncorrencial único. Em terceiro e último lugar, a Comissão deveria ter avaliado o alcance temporal e geográfico da infração única e continuada com base nas provas consideradas no seu conjunto. Segundo as recorrentes, a Comissão ignorou as duas primeiras etapas e, assumindo a existência de uma infração única e continuada, justificou‑a atribuindo aos contactos ao nível inferior ao da sede e aos contactos ao nível alemão a mesma natureza e alcance que os atribuídos aos contactos ao nível dos órgãos dirigentes. Ao fazê‑lo, a Comissão declarou a existência de uma infração única e continuada onde ela não existia.

205    Esta argumentação das recorrentes, que deve ser examinada antes do exame dos terceiro, quarto, quinto, sexto e sétimo fundamentos, deve ser julgada improcedente.

206    Com efeito, a premissa desta argumentação, segundo a qual uma infração única e continuada deve englobar comportamentos que, considerados isoladamente, devem constituir uma infração ao artigo 101.o TFUE, não encontra apoio na jurisprudência da União. Assim, como já foi observado, esta esclareceu que uma violação do artigo 101.o TFUE podia resultar de uma série de atos ou mesmo de um comportamento continuado, «quando efetivamente um ou diversos elementos dessa série de atos ou desse comportamento continuado também possam constituir, por si sós e considerados isoladamente, uma violação da referida disposição» (v. n.o 191, supra).

207    Segundo o Tribunal de Justiça, quando as diferentes ações se inscrevem num «plano de conjunto» em razão do seu objeto idêntico que falseia o jogo da concorrência no interior do mercado comum, a Comissão pode imputar a responsabilidade por essas ações em função da participação na infração considerada no seu todo (Acórdão de 7 de janeiro de 2004, Aalborg Portland e o./Comissão, C‑204/00 P, C‑205/00 P, C‑211/00 P, C‑213/00 P, C‑217/00 P e C‑219/00 P, EU:C:2004:6, n.o 258).

208    Resulta desta jurisprudência que o reconhecimento da existência de uma infração única e continuada não pressupõe necessariamente a prova pela Comissão de várias infrações, cada uma delas abrangida pelo artigo 101.o TFUE, mas a demonstração de que os diversos comportamentos que identificou se inscrevem num plano de conjunto destinado à realização de um objetivo anticoncorrencial único. A demonstração pela Comissão da existência desse plano e da conexão dos comportamentos supramencionados nesse plano reveste assim uma importância particular.

209    De resto, resulta da jurisprudência que o conceito de infração única se refere, nomeadamente, a uma situação em que diversas empresas participaram numa infração constituída por um comportamento continuado prosseguido com uma única finalidade económica destinada a falsear a concorrência (v., neste sentido Acórdão de 7 de novembro de 2019, Campine e Campine Recycling/Comissão, T‑240/17, não publicado, EU:T:2019:778, n.o 269 e jurisprudência referida).

210    No caso em apreço, é pacífico que, na decisão impugnada, a Comissão não qualificou os comportamentos, em cada um dos três níveis de contactos, de infração ao artigo 101.o TFUE e ao artigo 53.o EEE. Em contrapartida, considerou que esses comportamentos, considerados em conjunto, faziam parte de um plano global destinado à realização do objetivo anticoncorrencial único de limitar a concorrência no mercado de camiões médios e pesados no EEE. Para chegar a esta conclusão, e em conformidade com a jurisprudência referida no n.o 195, supra, a Comissão invocou os cinco elementos que caracterizam os comportamentos referidos e resumidos no n.o 202, supra. Tendo em conta a análise que consta nos n.os 206 a 208, supra, esta abordagem da Comissão não padece de erro.

211    Resulta das considerações anteriores que a argumentação das recorrentes, na medida em que se baseia na premissa errada de que o recurso ao conceito de infração única e continuada pressupõe a identificação de várias infrações pela Comissão, deve ser julgada improcedente. O exame dos terceiro, quarto, quinto, sexto e sétimo fundamentos, a seguir, permite ao Tribunal Geral fiscalizar, nomeadamente, o mérito da conclusão da Comissão de que os diferentes comportamentos, identificados na decisão impugnada, se inscrevem num plano de conjunto destinado à realização de um objetivo anticoncorrencial único, constituindo assim uma infração única e continuada.

b)      Quanto ao terceiro fundamento, relativo à aplicação errada do artigo 101.o TFUE e do artigo 53.o do Acordo EEE na medida em que as trocas de informações a nível inferior ao da sede foram consideradas constitutivas de uma infração a essas disposições

212    No âmbito do presente fundamento, as recorrentes apresentam duas objeções. Por um lado, acusam a Comissão de ter considerado que os três níveis dos contactos colusórios apresentavam ligações entre si, nomeadamente o nível inferior ao da sede com os outros dois níveis (primeira objeção). Nesse contexto, alegam que não havia nenhum contacto nem nenhuma reunião comum entre esses níveis que funcionaram separadamente um do outro. Por outro lado, as recorrentes acusam a Comissão de ter considerado, baseando‑se nomeadamente nas alegadas relações existentes entre os três níveis referidos supra, que os contactos colusórios ao nível inferior ao da sede constituíam uma infração ao artigo 101.o TFUE e ao artigo 53.o do Acordo EEE (segunda objeção).

213    A Comissão contesta a argumentação das recorrentes.

214    Antes de abordar as duas referidas objeções importa recordar as passagens pertinentes da decisão impugnada.

1)      Decisão impugnada

215    No considerando 213 da decisão impugnada, na parte relativa ao exame da questão respeitante à existência de acordos e práticas concertadas na aceção do artigo 101.o TFUE, a Comissão observou que as participantes no cartel estavam em contacto a diferentes níveis e que, por vezes, os diferentes níveis tinham reuniões comuns, por exemplo no que respeita aos trabalhadores ao nível inferior ao da sede e aos trabalhadores do nível alemão. A Comissão esclareceu no considerando 213 supramencionado que os contactos estavam relacionados entre si pelo seu conteúdo, pelo seu calendário, por referências expressas a uns e a outros e pela transmissão das informações recolhidas, fornecendo, a este respeito, exemplos de transmissão das informações trocadas ao nível alemão para as sedes respetivas das participantes no cartel.

216    Nos considerandos 315 a 317 da decisão impugnada, a Comissão concluiu pela existência de uma infração única e continuada, ao verificar que todos os contactos colusórios apresentados no n.o 6.2 da decisão impugnada (e que integram três níveis), segundo uma ordem cronológica, serviam um plano comum que tinha como objetivo anticoncorrencial único a restrição da concorrência no mercado de camiões médios e pesados no EEE. Segundo a Comissão, esse objetivo foi alcançado através de práticas que reduziam os níveis de incerteza estratégica entre as partes relativamente aos preços futuros e aos aumentos dos preços brutos, bem com ao calendário e à repercussão dos custos ligados à comercialização de camiões que respeitam as normas ambientais.

217    No considerando 327, alínea a), da decisão impugnada, a Comissão, para corroborar a sua conclusão de que a deslocação das interações do nível dos órgãos dirigentes para o nível alemão não tinha afetado a natureza contínua da infração, verificou que havia uma sobreposição temporal considerável entre as reuniões realizadas a diferentes níveis. A Comissão salientou que, não obstante a interrupção dos contactos ao nível dos órgãos dirigentes, em setembro de 2004, tinham continuado os contactos aos outros dois níveis. Especificamente, entre 2003 e 2007, eram organizados reuniões e contactos entre concorrentes, em comum ao nível inferior da sede e ao nível alemão, e, frequentemente, trabalhadores da sede participavam em reuniões ao nível alemão e vice‑versa. A Comissão também invocou a circunstância de as partes discutirem repetidamente a nível inferior da sede quais as informações que deviam ser trocadas e a que nível.

2)      Quanto à primeira objeção

218    No que se refere à primeira objeção alegada pelas recorrentes e relativa às «relações» entre os três níveis dos contactos colusórios, há que constatar que a Comissão invocou os seguintes elementos que demonstram a existência dessas relações: o facto de os participantes nesses níveis serem trabalhadores das mesmas empresas, isto é, da Scania e das partes na transação; o facto de as interações em cada um dos níveis terem o mesmo conteúdo; o facto de ter havido uma sobreposição temporal entre as reuniões realizadas nos diferentes níveis; o facto de os níveis se referirem um ao outro e trocarem informações recolhidas; o facto de haver por vezes contactos comuns e reuniões entre os diferentes níveis, referindo‑se a Comissão especificamente a contactos comuns e a reuniões entre os trabalhadores ao nível inferior da sede e trabalhadores do nível alemão das empresas em causa [v. considerandos 213 e 327 da decisão impugnada].

219    A presente objeção das recorrentes baseia‑se, nomeadamente, no facto de não ter havido contactos ou reuniões comuns entre os três níveis dos contactos colusórios.

220    A este respeito, em primeiro lugar, importa observar que, como resulta dos n.os 215 e 217, supra, e, de resto, de clarificações da Comissão no n.o 122 da contestação, esta não baseou a sua conclusão de que os níveis de contactos colusórios estavam ligados entre si no facto de existirem contactos ou reuniões comuns entre o nível dos órgãos dirigentes e o nível inferior da sede e entre o nível dos órgãos dirigentes e o nível alemão. A Comissão baseou‑se unicamente na existência dos contactos e das reuniões comuns entre o nível inferior da sede e o nível alemão. Portanto, a argumentação das recorrentes destinada a demonstrar a inexistência de contactos e de reuniões comuns entre o nível dos órgãos dirigentes e o nível inferior da sede e entre o nível dos órgãos dirigentes e o nível alemão é improcedente.

221    Em segundo lugar, há que salientar que, na decisão impugnada, a Comissão considerou que havia contactos e reuniões comuns entre o nível inferior da sede e o nível alemão, em especial entre 2003 e 2007 [considerando 327, alínea a), da decisão impugnada]. Resulta da decisão impugnada que este elemento constituiu um dos factos em que a Comissão se baseou para concluir pelo caráter continuado da infração.

222    No que respeita a esta conclusão da Comissão, resulta dos autos que eram muitas vezes organizadas reuniões ao nível inferior da sede e ao nível alemão na mesma época e no mesmo local com vista à preparação das feiras comerciais e que os participantes ao nível inferior da sede eram informados do conteúdo das interações ao nível alemão, transmitiam esse conteúdo dentro das respetivas empresas e, a título mais geral, estavam em contacto com os participantes nas interações ao nível alemão.

223    A este respeito, o Tribunal Geral refere‑se, em especial, aos elementos de prova apresentados no considerando 137 da decisão impugnada, relativos a uma reunião entre concorrentes em 24 de agosto de 2004, em Munique (Alemanha). Segundo [confidencial], participaram nessa reunião trabalhadores ao nível inferior da sede e ao nível alemão. Pela Scania, estavam presentes A do nível inferior da sede e B do nível alemão. Nessa reunião, houve uma troca de informações sobre futuros aumentos de preços no mercado alemão e sobre as datas de comercialização de modelos de camiões conformes com as normas ambientais. Uma apresentação em power point, preparada por [confidencial], evocada no considerando 137 da decisão impugnada, demonstra que a informação trocada na reunião de 24 de agosto de 2004 foi transmitida à sede da [confidencial].

224    O Tribunal Geral também se refere aos elementos de prova apresentados no considerando 147 da decisão impugnada que demonstram que os trabalhadores do nível inferior da sede eram informados do conteúdo das interações sobre os preços que tinham tido lugar ao nível alemão numa reunião entre concorrentes em Munique, em 4 e 5 de julho de 2005. Mais especificamente, o Tribunal Geral refere‑se à mensagem de correio eletrónico enviada por C, do nível inferior da sede de [confidencial], a trabalhadores das outras empresas concorrentes, que pertencem igualmente ao nível inferior da sede. Nessa mensagem de correio eletrónico, C, referindo‑se à reunião de 4 e 5 de julho de 2005 supramencionada, indicava nomeadamente que, nessa reunião, [confidencial] tinha fornecido aos concorrentes informações sobre a tabela atual de preços de [confidencial] (baseada no mercado alemão) e pedia, nomeadamente, aos destinatários da sua mensagem de correio eletrónico para fazerem a mesma coisa. O trabalhador da sede [confidencial], que figurava entre os destinatários da referida mensagem de correio eletrónico, respondeu que a sua empresa pretendia manter as interações sobre preços ao nível do mercado (a saber, ao nível alemão) e indicou os nomes dos trabalhadores [confidencial] que deviam ser contactados no âmbito dessas interações. A mensagem de correio eletrónico de C também era dirigida a D, do nível inferior da sede da Scania, que tinha participado na reunião de 4 e 5 de julho de 2005 supramencionada. Resulta dos autos que D não recebeu a referida mensagem, uma vez que o seu nome estava mal escrito (v. considerando 147 da decisão impugnada). Assim sendo, a mensagem de correio eletrónico de C demonstra que os trabalhadores ao nível inferior da sede, incluindo os trabalhadores da Scania, estavam ao corrente das interações sobre os preços que ocorreram na referida reunião de 4 e 5 de julho de 2005.

225    O Tribunal Geral também observa que alguns dos trabalhadores das empresas participantes, embora pertencentes à sede, participavam nas interações ao nível alemão, o que corrobora a conclusão da Comissão relativa à existência de relações entre o nível inferior da sede e o nível alemão. O Tribunal Geral refere‑se nomeadamente ao caso de C de [confidencial] e de E de [confidencial]. Estes trabalhadores, embora pertencessem à sede, tinham atividade e organizavam a troca de informações ao nível alemão.

226    Resulta do que precede que a conclusão da Comissão de que havia contactos entre o nível inferior da sede e o nível alemão está juridicamente demonstrada de forma bastante.

227    Em terceiro lugar, no âmbito do presente fundamento, as recorrentes também contestaram a afirmação da Comissão no considerando 213 da decisão impugnada, segundo a qual os níveis dos contactos colusórios se referiam abertamente uns aos outros e a afirmação, no considerando 327, alínea a), da decisão impugnada, segundo a qual as participantes no cartel discutiam repetidamente a nível inferior da sede a informação que devia ser trocada e a que nível.

228    Estas afirmações da Comissão estão juridicamente provadas de forma bastante. Com efeito, resulta, nomeadamente, dos elementos de prova apresentados no considerando 116 da decisão impugnada, relativos a uma reunião entre concorrentes de nível inferior da sede, em 3 e 4 de julho de 2001, que os trabalhadores da sede estavam ao corrente do conteúdo das interações ao nível alemão e que consideravam que essas interações iam «demasiado longe» e eram «potencialmente perigosas». Resulta dos elementos de prova apresentados no considerando 117 da decisão impugnada que, na reunião de 3 e 4 de julho de 2001 supramencionada, os concorrentes chegaram a acordo para trocar no futuro, ao nível inferior da sede, informações sobre os produtos e informações técnicas, mas não informações sobre os preços ou os dados comparativos. Do mesmo modo, resulta dos elementos de prova apresentados no considerando 147 da decisão impugnada (v. n.o 224, supra) que os trabalhadores do nível inferior da sede discutiam a propósito da questão de saber qual a informação que devia ser trocada e a que nível e que, nesse contexto, alguns desses trabalhadores manifestaram o desejo de que as interações sobre os preços se realizassem unicamente ao nível alemão.

229    Resulta das considerações anteriores que, no âmbito do presente fundamento, as recorrentes não conseguiram pôr em causa as conclusões da Comissão, apresentadas nomeadamente nos considerandos 213 e 327, alínea a), da decisão impugnada, relativas às relações existentes entre os três níveis dos contactos colusórios. Como já foi observado, a Comissão invocou um certo número de elementos que demonstram a existência de relações entre os três níveis de contactos colusórios (v. n.o 218, supra) que não foram contestados, a saber, o facto de os participantes serem trabalhadores das mesmas empresas, o facto de haver uma sobreposição temporal entre as reuniões realizadas aos três níveis dos contactos colusórios, ou que foram contestados sem serem postos em causa no âmbito do presente fundamento, a saber, o facto de existirem contactos entre os trabalhadores ao nível inferior das sedes respetivas das participantes no cartel e os trabalhadores ao nível alemão. Tendo em conta estes elementos, o Tribunal Geral considera que os três níveis dos contactos colusórios estavam relacionados entre si e não agiam de forma separada e autónoma uns dos outros.

3)      Quanto à segunda objeção

230    No que se refere à segunda objeção suscitada pelas recorrentes (v. n.o 212, supra), há que recordar que a Comissão, na decisão impugnada, não qualificou os contactos colusórios ao nível inferior da sede (nem, aliás, os contactos colusórios aos dois outros níveis considerados separadamente) como infração ao artigo 101.o TFUE e ao artigo 53.o EEE, mas considerou que todos os contactos aos três níveis faziam parte de uma infração única e continuada, na medida em que prosseguiam um plano comum com o objetivo anticoncorrencial de restringir a concorrência no mercado de camiões médios e pesados no EEE através, nomeadamente, de interações que reduziam a incerteza estratégica em relação aos preços futuros, ao aumento dos preços brutos, bem como ao calendário e à repercussão dos custos relacionados com a comercialização das tecnologias em matéria de emissões para os camiões médios e pesados impostos pelas normas Euro 3 a Euro 6 (considerando 317 da decisão impugnada).

231    Importa também recordar que a Comissão não estava obrigada a qualificar as interações ao nível inferior da sede, consideradas separadamente, de infração distinta ao artigo 101.o TFUE e ao artigo 53.o EEE para concluir pela existência de uma infração única e continuada (v. n.o 208, supra).

232    Resulta do que precede que a presente objeção das recorrentes se baseia na premissa errada de que a Comissão qualificou, na decisão impugnada, as interações ao nível inferior da sede de infração ao artigo 101.o TFUE e ao artigo 53.o EEE. Assim sendo, e não obstante esta premissa errada, há que examinar, atendo em conta as considerações que figuram nos n.os 208 a 211, supra, e à luz da argumentação das recorrentes, em que medida as interações ao nível inferior da sede contribuíam para a realização do plano comum apresentado no n.o 230, supra.

233    A este respeito, em primeiro lugar, importa recordar que, como se concluiu no âmbito do exame da primeira objeção, os participantes ao nível inferior da sede estavam informados do conteúdo das interações ao nível alemão, transmitiam esse conteúdo às suas respetivas empresas e, a título mais geral, estavam em contacto com os participantes nas interações ao nível alemão (v n.o 222, supra). Verifica‑se, assim, que os trabalhadores ao nível inferior da sede, estando associados a interações que reduziam a incerteza estratégica relativamente aos preços futuros e às datas de comercialização dos modelos de camiões conformes com as normas ambientais, contribuíam para a realização do plano comum supramencionado.

234    Em segundo lugar, os elementos de prova apresentados no considerando 144 da decisão impugnada, relativos a uma reunião entre concorrentes ao nível inferior da sede, em 3 e 4 de fevereiro de 2005, em Lyon (França), demonstram que, nessa reunião, [confidencial] informou os outros fabricantes, entre os quais a Scania, do futuro aumento de 5 % do preço de um dos modelos de camiões que fabricava. Há que observar que as recorrentes alegaram que essa informação era do domínio público à data da reunião referida e que, em apoio dessa alegação, apresentaram, na fase da réplica e alguns dias antes da audiência, um artigo de uma revista especializada cuja versão eletrónica datava de 4 de fevereiro de 2005. Independentemente da admissibilidade desse elemento de prova, o Tribunal Geral considera que o artigo referido não demonstra o mérito da alegação das recorrentes na medida em que o alcance da informação comunicada por [confidencial] na reunião de 3 e 4 de fevereiro de 2005 era mais amplo do que o da informação contida no artigo referido, a qual evocava o aumento do preço do modelo de camião de [confidencial] apenas para o mercado do Reino Unido.

235    A informação sobre preços comunicada por [confidencial] na reunião de 3 e 4 de fevereiro de 2005 ao nível inferior da sede demonstra que as interações a esse nível, independentemente da questão de saber se constituem uma infração às regras da concorrência, contribuíam para a realização do plano comum apresentado no n.o 230, supra, na medida em que demonstra que essas interações também diziam respeito a questões relativas ao preço dos camiões e não apenas a questões técnicas.

236    Em terceiro lugar, resulta de uma mensagem de correio eletrónico interno de [confidencial], enviada por F, do nível inferior da sede dessa empresa, apresentada no considerando 146 da decisão impugnada e relativa à reunião entre concorrentes, em 4 e 5 de julho de 2005, que os trabalhadores ao nível inferior da sede, entre os quais trabalhadores da sede da Scania, trocavam informações relativas, nomeadamente, à data de comercialização de modelos conformes com as normas ambientais Euro 4 e Euro 5. A título de exemplo, na mensagem de correio eletrónico referida supra, F informava os seus colegas do facto, revelado na reunião de 4 e 5 de julho de 2005, de que a Scania «apresenta[ria] uma gama completa de motores conformes com [a norma] Euro 4 (e alguns motores conformes com [a norma] Euro 5) no evento de [confidencial]» e de que já tinham sido feitas à Scania 2 000 encomendas de motores compatíveis com a norma Euro 4. Também a título de exemplo, F informava os seus colegas de que, segundo informações prestadas por [confidencial] na reunião referida supra, o aumento dos preços relacionados com a introdução da norma Euro 5 não era contestado pelos seus clientes, e de que já tinham sido vendidos 6 000 camiões compatíveis com essa norma. O conteúdo da troca de informações ao nível inferior da sede na reunião de 4 e 5 de julho de 2005 demonstra, também ele, que as trocas ao nível inferior da sede contribuíam para a realização do plano comum apresentado no n.o 230, supra, na medida em que demonstra que as referidas trocas também incidiam sobre questões relativas à data de comercialização dos modelos de camiões conformes com normas ambientais específicas.

237    Em quarto lugar, importa recordar que os participantes nos três níveis dos contactos colusórios eram trabalhadores das mesmas empresas, que as reuniões ao nível inferior da sede coincidiam, do ponto de vista temporal, com as reuniões aos dois outros níveis e que havia contactos entre os trabalhadores ao nível inferior da sede e os trabalhadores ao nível alemão (v. n.os 218 a 229, supra).

238    Com fundamento nestes elementos, há que observar que as trocas de informações ao nível inferior da sede contribuíam para a realização do plano comum apresentado no n.o 230, supra e, por conseguinte, que a Comissão podia tê‑las em consideração para efeitos da conclusão relativa à existência de uma infração única e continuada.

239    Tendo em conta as considerações anteriores, há que concluir que o presente fundamento é improcedente.

c)      Quanto ao quarto fundamento, relativo à violação do dever de fundamentação e à aplicação errada do artigo 101.o TFUE e do artigo 53.o do Acordo EEE na medida em que a Comissão considerou que as recorrentes tinham celebrado um acordo ou participado numa prática concertada sobre o calendário e a comercialização das tecnologias em matéria de emissões

240    A argumentação das recorrentes no âmbito do presente fundamento pode ser dividida em três partes, adiante examinadas sucessivamente.

1)      Quanto à primeira parte do quarto fundamento, relativo à violação do dever de fundamentação

241    As recorrentes alegam que o raciocínio contido na decisão impugnada não lhes permite compreender a natureza e o alcance da infração que lhes foi imputada. Com efeito, por um lado, resulta do artigo 1.o da decisão impugnada que a Comissão considerou que as recorrentes tinham cometido uma infração, nomeadamente, ao concertarem‑se sobre o calendário e a comercialização das tecnologias em matéria de emissões impostas pelas normas Euro 3 a Euro 6 e que esse comportamento constituía uma infração de pleno direito. Por outro lado, a decisão impugnada também parece sustentar, nos considerandos 243 e 321, que os factos relativos à concertação referida são «conexos» e «complementares» do alegado acordo sobre preços e preços brutos, sugerindo assim que a simples troca de informações sobre as datas de comercialização de tecnologias não constitui em si mesma uma infração.

242    As recorrentes concluem que esta incoerência no raciocínio da Comissão constitui uma violação do artigo 296.o TFUE e que, com este fundamento, a decisão impugnada deve ser anulada.

243    As recorrentes também acusam a Comissão de não ter explicado as razões pelas quais a troca de informações sobre o calendário e a instalação de tecnologias em matéria de emissões constituía uma infração por objeto.

244    A Comissão contesta a argumentação das recorrentes.

245    Importa recordar que, segundo jurisprudência constante, o dever de fundamentação previsto no artigo 296.o, segundo parágrafo, TFUE constitui uma formalidade essencial que deve ser distinguida da questão do mérito dos fundamentos, o qual faz parte da legalidade em sede de mérito do ato controvertido. Nesta perspetiva, a fundamentação exigida deve ser adaptada à natureza do ato em causa e deixar transparecer, de forma clara e inequívoca, o raciocínio da instituição, autora do ato, de forma a permitir aos interessados conhecer as razões da medida adotada e ao órgão jurisdicional competente exercer o seu controlo. Quanto, em particular, à fundamentação das decisões individuais, o dever de fundamentar tais decisões tem assim por finalidade, além de permitir uma fiscalização jurisdicional, fornecer ao interessado indicações suficientes para saber se a decisão enferma eventualmente de um vício que permita contestar a sua validade (v. Acórdão de 7 de novembro de 2019, Campine e Campine Recycling/Comissão, T‑240/17, não publicado, EU:T:2019:778, n.o 321 e jurisprudência referida).

246    Por outro lado, a exigência de fundamentação deve ser apreciada em função das circunstâncias do caso em apreço, designadamente do conteúdo do ato em causa, da natureza dos fundamentos invocados e do interesse que os destinatários ou outras pessoas a quem o ato diga e respeito, na aceção do artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE podem ter em obter explicações. Não é exigido que a fundamentação especifique todos os elementos de facto e de direito pertinentes, na medida em que a questão de saber se a fundamentação de um ato satisfaz as exigências do artigo 296.o TFUE deve ser apreciada à luz não somente do seu teor mas também do seu contexto e do conjunto das normas jurídicas que regem a matéria em causa (v. Acórdão de 7 de novembro de 2019, Campine e Campine Recycling/Comissão, T‑240/17, não publicado, EU:T:2019:778, n.o 322 e jurisprudência referida).

247    Além disso, o dever de fundamentação previsto no artigo 296.o TFUE exige que o raciocínio em que se baseia uma decisão seja claro e inequívoco. Assim a fundamentação de um ato deve ser lógica e não apresentar, nomeadamente, contradições internas que constituam um entrave à compreensão dos motivos que subjazem a este ato (v. Acórdão de 29 de setembro de 2011, Elf Aquitaine/Comissão, C‑521/09 P, EU:C:2011:620, n.o 151 e jurisprudência referida).

248    No processo em apreço, no considerando 236 da decisão impugnada, no n.o 7.2.3, intitulado «Restrição da concorrência», a Comissão indicou que o comportamento anticoncorrencial tinha por objeto restringir a concorrência no território do EEE.

249    No considerando 237 da decisão impugnada, a Comissão esclareceu que o elemento principal do conjunto dos acordos e das práticas concertadas no caso em apreço, que podia ser qualificado de restrição da concorrência, consistia na coordenação dos preços e dos aumentos dos preços brutos através de contactos sobre os preços, sobre a data e sobre os custos adicionais relativos à comercialização dos novos modelos de camiões conformes com as normas de emissões, e na troca de informações sensíveis do ponto de vista da concorrência.

250    No considerando 238, alínea b), da decisão impugnada, a Comissão observou que a Scania tinha celebrado acordos e/ou se tinha coordenado com concorrentes sobre o calendário e a repercussão dos custos relativos à instalação das tecnologias em matéria de emissões para camiões médios e pesados, exigidas pelas normas Euro 3 a Euro 6.

251    No considerando 239 da decisão impugnada, a Comissão verificou que o conjunto de acordos e práticas concertadas nos quais a Scania tinha participado tinha por objeto restringir a concorrência na aceção do artigo 101.o, n.o 1, TFUE e tinha permitido às empresas adaptar a sua estratégia de preços tendo em conta as informações recebidas dos concorrentes.

252    No considerando 243 da decisão impugnada, a Comissão explicou que as recorrentes, ao discutirem a data da instalação das novas normas ambientais e os custos adicionais ocasionados pela nova tecnologia, obtinham informações sobre as intenções dos seus concorrentes no que respeitava ao nível dos preços brutos. Segundo as explicações da Comissão, a repercussão dos custos relativos à instalação da nova tecnologia ambiental implicava alterações do preço bruto dos modelos de camiões em causa. As partes conheciam a data a partir da qual os novos modelos (em que os custos adicionais seriam repercutidos) eram incluídos na tabela dos preços brutos dos concorrentes, na medida em que conheciam a data da comercialização desses novos modelos no mercado. Por conseguinte, segundo a Comissão, a natureza das conversações e dos acordos relativos à data de comercialização dos novos modelos de camiões compatíveis com as normas ambientais era conexa e complementar tendo em atenção a colusão das partes no que respeita aos preços e aos aumentos dos preços brutos.

253    Por outro lado, resulta dos considerandos 315 a 350 da decisão impugnada, no n.o 7.2.4, intitulado «Infração única e continuada», que a Comissão imputou à Scania a prática de uma infração ao artigo 101.o TFUE e ao artigo 53.o do Acordo EEE, que qualificou de infração única e continuada, a qual consiste em contactos colusórios que tinham por objeto o preço e o aumento dos preços brutos dos camiões médios e pesados no EEE, bem como o calendário e a repercussão dos custos relativos à comercialização das tecnologias em matéria de emissões para camiões médios e pesados impostas pelas normas Euro 3 a Euro 6. Segundo a Comissão, esses contactos colusórios tinham por objeto restringir a concorrência, reduzindo o nível de incerteza estratégica entre os concorrentes relativamente aos preços futuros, aos aumentos de preços brutos, ao calendário e à repercussão dos custos relacionados com a comercialização de modelos de camiões conformes com as normas ambientais (considerando 317 da decisão impugnada).

254    No considerando 321 da decisão impugnada, a Comissão reiterou a sua análise apresentada no considerando 243 da decisão impugnada, segundo a qual a natureza das conversações e dos acordos relativos à data de comercialização dos novos modelos de camiões compatíveis com as normas ambientais era conexa e complementar à colusão das partes no que respeitava aos preços e aos aumentos dos preços brutos.

255    Por último, importa recordar que, nos termos do artigo 1.o da decisão impugnada:

«As seguintes entidades jurídicas da Scania, ao concertarem‑se sobre os preços e os aumentos de preços brutos dos camiões médios e pesados no EEE e sobre o calendário e a repercussão dos custos relativos à comercialização das tecnologias em matéria de emissões para os camiões médios e pesados, impostas pelas normas Euro 3 a 6, violaram o artigo 101.o TFUE e o artigo 53.o [do Acordo] EEE durante os períodos seguintes […]»

256    Por um lado, resulta da apresentação referida da decisão impugnada que, contrariamente à alegação das recorrentes, a Comissão, nesta, não qualificou separadamente de infração distinta do artigo 101.o TFUE a concertação sobre o calendário e a instalação das tecnologias em matéria de emissões. Em contrapartida, é claro que a Comissão considerou que a concertação referida supra fazia parte de uma infração única e continuada que tinha por objeto anticoncorrencial único a restrição da concorrência no mercado de camiões médios e pesados no território do EEE.

257    Por outro lado, resulta, nomeadamente, dos considerandos 236, 237, 239, 243 e 321 da decisão impugnada que a Comissão considerou que as trocas de informações sobre o calendário e a instalação das tecnologias em matéria de emissões eram conexas e complementares da troca de informações relativas aos preços e aos aumentos dos preços brutos e que, no essencial, o conjunto dessas trocas permitia às empresas em causa adaptar as suas estratégias de preços em função da informação recebida pelos concorrentes, constituindo assim uma restrição da concorrência por objeto.

258    Resulta das considerações anteriores que a fundamentação contida na decisão impugnada apresenta de forma clara e inequívoca o raciocínio da Comissão, permitindo assim ao Tribunal Geral exercer a sua fiscalização jurisdicional. Por outro lado, o conteúdo e o caráter pormenorizado da argumentação das recorrentes perante o Tribunal Geral demonstra que a fundamentação da decisão impugnada lhes permitiu contestá‑la de forma efetiva perante este órgão jurisdicional.

259    Com base no exposto, há que julgar improcedente a primeira parte do presente fundamento.

2)      Quanto à segunda parte do quarto fundamento, relativa à aplicação errada do artigo 101.o TFUE e do artigo 53.o do Acordo EEE na medida em que a Comissão considerou que as recorrentes tinham celebrado um acordo ou tinham participado numa prática concertada quanto ao calendário de comercialização no mercado das tecnologias em matéria de emissões

260    As recorrentes contestam a apreciação da Comissão de que celebraram um acordo ou participaram numa prática concertada quanto ao calendário de comercialização das tecnologias em matéria de emissões.

261    A este respeito, as recorrentes observam que a obrigação de conformidade dos motores de camiões com as normas Euro decorre da regulamentação europeia, conhecida dos fabricantes de camiões, e não resulta de qualquer concorrência em matéria de inovação.

262    As recorrentes também alegam que a Scania sempre tinha respeitado as diferentes normas de emissões Euro antes mesmo da aplicação dos prazos fixados pela regulamentação europeia e que a sua produção era, geralmente, planificada cerca de seis ou sete anos antes da data‑limite prevista pela referida regulamentação relativa à instalação de tecnologias conformes com as referidas normas. Segundo as recorrentes, este facto não é conciliável com a tese da Comissão de que a Scania celebrou com os seus concorrentes um acordo ou participou numa prática concertada quanto ao calendário de instalação das tecnologias conformes com as normas Euro.

263    As recorrentes também invocam a circunstância de as datas de lançamento das tecnologias em matéria de emissões variarem enormemente entre os fabricantes de camiões, o que põe em causa a existência de uma coordenação entre eles no que respeita a essas datas.

264    As recorrentes contestam igualmente o facto de as trocas de informação descritas na decisão impugnada demonstrarem que celebraram um acordo ou que participaram numa prática concertada relativa à instalação de novas tecnologias em matéria de emissões.

265    A Comissão contesta a argumentação das recorrentes.

266    A este respeito, há que referir que os conceitos de «acordo», de «decisões de associações de empresas» e de «prática concertada» incluem, do ponto de vista subjetivo, formas de conluio que são da mesma natureza e só se distinguem umas das outras pela respetiva intensidade e pelas formas como se manifestam (v. Acórdão de 4 de junho de 2009, T‑Mobile Netherlands e o., C‑8/08, EU:C:2009:343, n.o 23 e jurisprudência referida).

267    Quanto à definição de prática concertada, o Tribunal de Justiça declarou que consiste numa forma de coordenação entre empresas que, sem se ter desenvolvido até à celebração de uma convenção propriamente dita, substitui cientemente os riscos da concorrência por uma cooperação prática entre elas (v. Acórdão de 4 de junho de 2009, T‑Mobile Netherlands e o., C‑8/08, EU:C:2009:343, n.o 26 e jurisprudência referida).

268    Os critérios de coordenação e de cooperação constitutivos de uma prática concertada, longe de exigirem a elaboração de um verdadeiro «plano», devem ser entendidos à luz da conceção inerente às disposições dos Tratados CE e CECA relativas à concorrência, segundo a qual qualquer operador económico deve determinar de maneira autónoma a política que pretende seguir no mercado comum e as condições que deseja aplicar à sua clientela (v. Acórdãos de 28 de maio de 1998, Deere/Comissão, C‑7/95 P, EU:C:1998:256, n.o 86 e jurisprudência referida, e de 19 de março de 2015, Dole Food e Dole Fresh Fruit Europe/Comissão, C‑286/13 P, EU:C:2015:184, n.o 119 e jurisprudência referida).

269    Embora essa exigência de autonomia não exclua o direito de os operadores económicos se adaptarem inteligentemente ao comportamento verificado ou esperado dos seus concorrentes, opõe‑se, no entanto, rigorosamente a qualquer contacto direto ou indireto entre esses operadores que possa influenciar o comportamento no mercado de um concorrente efetivo ou potencial, isto é, revelar a esse concorrente o comportamento que decidiu ter ou que projeta adotar nesse mercado, quando esses contactos tenham por objeto ou por efeito levar a condições de concorrência que não correspondam às condições normais do mercado em causa, tendo em conta a natureza dos produtos ou das prestações fornecidas, a importância e o número das empresas e o volume desse mercado (v. Acórdãos de 28 de maio de 1998, Deere/Comissão, C‑7/95 P, EU:C:1998:256, n.o 87 e jurisprudência referida, e de 19 de março de 2015, Dole Food e Dole Fresh Fruit Europe/Comissão, C‑286/13 P, EU:C:2015:184, n.o 120 e jurisprudência referida).

270    Assim, o Tribunal de Justiça declarou que a troca de informações entre concorrentes era suscetível de ir contra as normas de concorrência quando atenua ou elimina o grau de incerteza sobre o funcionamento do mercado em causa, tendo como consequência uma restrição da concorrência entre empresas (v. Acórdão de 19 de março de 2015, Dole Food e Dole Fresh Fruit Europe/Comissão, C‑286/13 P, EU:C:2015:184, n.o 121 e jurisprudência referida).

271    No caso em apreço, importa recordar que, no considerando 238, alínea b), da decisão impugnada, a Comissão afirmou que a Scania tinha celebrado acordos e/ou se tinha coordenado com os seus concorrentes quanto ao calendário e à repercussão dos custos relativos à instalação das tecnologias em matéria de emissões para camiões médios e pesados, exigidas pelas normas Euro 3 a Euro 6. Esta afirmação da Comissão assenta em diversos elementos de prova apresentados na decisão impugnada que demonstram o seu mérito.

272    Em primeiro lugar, há que referir a ata de uma reunião ao nível dos órgãos dirigentes, realizada em 6 de abril de 1998 em Bruxelas (Bélgica), apresentada no considerando 103 da decisão impugnada. Esta ata demonstra claramente que os participantes nessa reunião trocaram informações sobre os preços e sobre o calendário de comercialização de modelos de camiões conformes com a norma Euro 3 e acordaram em não instalar a tecnologia conforme com essa norma antes de essa instalação se tornar obrigatória. A ata referida supra também demonstra que os participantes nessa reunião trocaram informações sobre a repercussão da instalação da nova tecnologia nos preços. Na medida em que a referida ata faz referência a «todos os membros de [confidencial]», pode inferir‑se que a Scania participou na reunião de 6 de abril de 1998 supramencionada.

273    Em segundo lugar, o Tribunal Geral refere‑se à reunião ao nível dos órgãos dirigentes, de 10 e 11 de abril de 2003, em Gotemburgo (Suécia), na qual a Scania participou, apresentada no considerando 127 da decisão impugnada. Notas manuscritas tomadas por um representante da [confidencial] que participou nessa reunião, e apresentadas no referido considerando, demonstram que os participantes trocaram informações sobre os preços e sobre a instalação das tecnologias conformes com a norma Euro 4. Segundo essas notas:

«Vendas de [confidencial] na Euro 4 out. 2004. [confidencial]/Scania pode instalar mais cedo, mas não quer. Todos concordam em instalar em [confidencial] “Início das vendas”.»

274    O conteúdo da reunião de 10 e 11 de abril de 2003, referida no n.o 273, supra, é explicado na telecópia enviada em 8 de maio de 2003 por [confidencial] aos concorrentes, entre os quais a Scania, apresentada no considerando 128 da decisão impugnada, onde se indica:

«Durante a nossa reunião em Gotemburgo, discutimos a comercialização da especificação Euro 4 no mercado. Tomei a iniciativa de discutir esta questão com a nossa colega, [G]. Embora [confidencial] duvide que mantenhamos todos os nossos compromissos, aceita uma comercialização em setembro de 2004, [confidencial]. Muito claramente, não devíamos pô‑la à venda antes dessa data. Suponho que continuamos todos de acordo e que o manteremos até essa data. Se, por qualquer razão, não vos for possível, agradeço que me informem disso em resposta por telecópia.»

275    As recorrentes invocaram as explicações de [confidencial] no procedimento administrativo segundo as quais as notas referidas no n.o 273, supra, não relatavam a existência de um acordo entre os fabricantes de camiões, mas apenas que todos tinham aceitado como uma realidade que, provavelmente, os motores conformes com a norma Euro 4 não seriam lançados antes de [confidencial] de setembro de 2004. Todavia, há que considerar que estas explicações, apresentadas a posteriori e que contradizem a redação clara das notas do representante de [confidencial] e da telecópia de 8 de maio de 2003 demonstrando que os concorrentes tinham acordado comercializar os motores conformes com a norma Euro 4 em setembro de 2004, não são convincentes.

276    Em terceiro lugar, importa que se refira a mensagem de correio eletrónico enviada em 16 de setembro de 2004 por H, representante da [confidencial], aos concorrentes, entre os quais a Scania, na qual referia a sua decisão de não participar na reunião ao nível dos órgãos dirigentes prevista em Hanôver (Alemanha). A referida mensagem, apresentada no considerando 138 da decisão impugnada, esclarecia o seguinte:

«Esta decisão é motivada pela deceção. Considero intolerável o comportamento de alguns dos nossos colegas (um deles em particular) na comunicação relativa à Euro 4 e à Euro 5, bem como a forma como esses colegas tentaram prejudicar a imagem da indústria dos camiões e de alguns dos seus colegas em particular […]»

277    [Confidencial] explicou numa declaração verbal, submetida durante o procedimento administrativo e apresentada no considerando 138 da decisão impugnada, que tinha instalado a tecnologia conforme com a norma Euro 4 antes da data acordada com os concorrentes, a saber, setembro de 2004 (v. n.os 273 e 274, supra), e que isso estava na origem do descontentamento expresso pelo representante de [confidencial] nessa mensagem. Resulta dos autos que, na sequência desse incidente, as interações ao nível dos órgãos dirigentes cessaram (considerando 138 da decisão impugnada).

278    A mensagem de correio eletrónico do representante de [confidencial], apresentada no n.o 276, supra, tendo em atenção os elementos de prova apresentados nos n.os 273 e 274, supra, demonstra a existência de um acordo entre concorrentes, entre os quais a Scania, relativo à data de comercialização das tecnologias conformes com a norma Euro 4.

279    As recorrentes invocaram a declaração sob juramento do representante de [confidencial] e autor da mensagem de correio eletrónico apresentada no n.o 276, supra, na qual explicava que a sua mensagem tinha sido enviada por causa das tensões entre [confidencial] e [confidencial] e que não havia nenhum acordo entre os fabricantes de camiões relativo à data de comercialização dos motores conformes com a norma Euro 4. Segundo as recorrentes, a referida declaração sob juramento é corroborada pelo facto de [confidencial] e o seu representante não terem reagido de forma alguma ao anúncio da Scania acerca do lançamento do seu primeiro motor conforme com a norma Euro 4 numa conferência de imprensa em 31 de março de 2004. Segundo as recorrentes, pode supor‑se que, se os fabricantes tivessem celebrado um acordo sobre o calendário de instalação da tecnologia conforme com a norma Euro 4, o representante de [confidencial] teria reagido da mesma forma no que respeita ao anúncio da Scania.

280    Esta argumentação das recorrentes não parece convincente.

281    Por um lado, no que se refere à declaração sob juramento supramencionada, foi feita pelo autor da mensagem de correio eletrónico apresentada no n.o 276, supra, vários anos após os acontecimentos relevantes, com vista ao procedimento administrativo e, por conseguinte, in tempore suspecto. Portanto, o seu conteúdo não pode pôr em causa o valor probatório de elementos de prova contemporâneos dos eventos e mais objetivos, como a telecópia apresentada no n.o 274, supra, bem como o valor probatório da declaração de [confidencial] referida no n.o 277, supra (v., neste sentido, Acórdãos de 27 de setembro de 2006, Archer Daniels Midland/Comissão, T‑59/02, EU:T:2006:272, n.o 277; de 8 de julho de 2008, Lafarge/Comissão, T‑54/03, não publicado, EU:T:2008:255, n.o 379, e de 29 de junho de 2012, E.ON Ruhrgas e E.ON/Comissão, T‑360/09, EU:T:2012:332, n.o 201). Todos estes elementos de prova demonstram a existência de um acordo entre os fabricantes de camiões no que respeita à data de instalação da tecnologia conforme com a norma Euro 4.

282    Por outro lado, no que respeita ao argumento relativo à conferência de imprensa da Scania de 31 de março de 2004, há que referir que o comunicado de imprensa apresentado pelas recorrentes, longe de corroborar a sua tese, anunciava a comercialização dos motores de 420 cavalos (horse power) conformes com a norma Euro 4 em setembro de 2004, data que corresponde à data convencionada entre os concorrentes na reunião de 10 e 11 de abril de 2003 em Gotemburgo (v. n.os 273 e 274, supra).

283    Em quarto lugar, o Tribunal Geral refere‑se às trocas de informações entre concorrentes, entre as quais constava a Scania DE, que ocorreram entre 2 e 8 de dezembro de 2004, tendo por objeto os aumentos de preços previstos para 2005 (considerando 140 da decisão impugnada). Nesse contexto, [confidencial] referiu que faturaria 5 410 euros pela passagem de «Euro 3 para a Euro 4».

284    Como resulta do considerando 141 da decisão impugnada, em 2 de dezembro de 2004, B, representante da Scania DE, enviou uma mensagem de correio eletrónico a trabalhadores das empresas concorrentes, na qual perguntava em que data e a que preço bruto seriam entregues os motores conforme com as normas 4 e 5. O representante [confidencial] respondeu comunicando as informações pedidas, indicando, em especial, que os preços adicionais para os motores conformes com a norma Euro 4 e com a norma Euro 5 seriam, respetivamente, de 11 500 euros e de 14 800 euros. Em 17 de dezembro de 2004, B transmitiu as informações obtidas aos concorrentes (considerando 142 da decisão impugnada).

285    Em quinto lugar, há que mencionar a reunião de 12 de setembro de 2005, apresentada no considerando 149 da decisão impugnada, que tinha, nomeadamente, como temas, «situação Euro 4/5» e «aumentos de preços previstos para 2006». Resulta das notas manuscritas que, nessa reunião, os concorrentes, entre os quais figurava I, representante da Scania DE, trocaram informações sobre a data de lançamento dos modelos de camiões conformes com as normas Euro 4 e Euro 5 e sobre o seu preço.

286    Em sexto lugar, cumpre referir uma mensagem de correio eletrónico de 21 de julho de 2009, apresentada no considerando 180 da decisão impugnada, na qual um trabalhador da [confidencial] propunha que fosse incluído na ordem de trabalhos da reunião entre concorrentes, organizada pela Scania DE, que se devia realizar em 17 e 18 de setembro de 2009, o seguinte ponto: «Euro VI — eu sei — estamos autorizados a falar disso, e queremo‑lo?»

287    O considerando 181 da decisão impugnada dá conta da reunião de 17 e 18 de setembro de 2009, referida no n.o 286, supra. Resulta dos elementos de prova apresentados no considerando supramencionado, não contestados pelas recorrentes, que os concorrentes trocaram informações sobre a data de instalação da tecnologia conforme com a norma Euro 6 e sobre os aumentos de preços previstos para 2010.

288    Resulta dos elementos de prova e dos factos apresentados nos n.os 272 a 287, supra, que a Comissão fez prova juridicamente bastante de que a Scania tinha celebrado acordos e/ou se tinha coordenado com os seus concorrentes quanto ao calendário e à repercussão dos custos relativos à comercialização das tecnologias em matéria de emissões para camiões médios e pesados exigidos pelas normas Euro 3 a Euro 6.

289    Esta conclusão não é posta em causa pela argumentação das recorrentes apresentada nos n.os 261 a 263, supra. Em particular, importa observar que a regulamentação europeia relativa às datas de instalação das normas Euro em matéria de emissões se referia apenas aos seus prazos de comercialização (v. considerando 6 da decisão impugnada) e não obrigava os fabricantes de camiões a trocar informações relativas ao calendário de lançamento dos produtos conformes com essas normas. Por outro lado, a circunstância de a Scania planificar a sua produção vários anos antes da data‑limite prevista pela regulamentação europeia para a introdução de uma norma Euro específica não demonstra a sua falta de participação na concertação com os outros fabricantes de camiões. Do mesmo modo, o facto de as datas de lançamento das tecnologias em matéria de emissões variarem entre os fabricantes de camiões também não demonstra a inexistência de trocas de informações entre eles, uma vez que essas trocas lhes permitem conhecer os planos dos seus concorrentes.

290    Com base nas considerações anteriores, há que julgar improcedente a segunda parte do presente fundamento.

3)      Quanto à terceira parte do quarto fundamento, relativa ao facto de as trocas de informações sobre o calendário de instalação das tecnologias em matéria de emissões não constituir uma infração por objeto

291    As recorrentes alegam que, quando muito, os elementos de prova constantes dos autos revelam que, a título excecional, as partes partilharam informações sobre o calendário de lançamento das respetivas tecnologias em matéria de emissões. Ora, essas raras trocas de informações não constituem uma infração por objeto. Segundo as recorrentes, a decisão impugnada não faz prova de que a troca de informações sobre o calendário de instalação das tecnologias em matéria de emissões pode, por natureza, ser considerada prejudicial para o bom funcionamento do jogo normal da concorrência, sem ter de examinar os seus efeitos.

292    Com efeito, segundo as recorrentes, é difícil compreender de que modo a troca de informações sobre as datas de lançamento poderia conduzir ao menor atraso ou entravar a concorrência na oferta da nova tecnologia em questão, na medida em que, primeiro, o desenvolvimento técnico de uma nova tecnologia de controlo de emissões demora cerca de seis ou sete anos, segundo, todos os fabricantes estavam obrigados a conceber novos motores conformes com as normas Euro e lançaram as tecnologias em causa antes dos prazos fixados pela legislação europeia e, terceiro, praticamente não havia procura de camiões conformes com essas normas antes de estas se tornarem obrigatórias.  É evidente, segundo as recorrentes, que o objetivo da troca de informações não era «atrasar» a instalação das tecnologias em matéria de emissões.

293    A Comissão contesta a argumentação das recorrentes.

294    Importa recordar que, no considerando 238, alínea b), e no considerando 239 da decisão impugnada, a Comissão observou que todos os acordos e práticas concertadas em que a Scania tinha participado, entre os quais figuravam os acordos ou as práticas concertadas sobre o calendário e a repercussão dos custos relativos à instalação das tecnologias em matéria de emissões, tinham por objeto restringir a concorrência na aceção do artigo 101.o TFUE e tinham permitido às empresas adaptar a sua estratégia de preços tendo em atenção as informações recebidas dos concorrentes. Por outro lado, nos considerandos 243 e 321 da decisão impugnada, a Comissão explicou que a natureza das conversações e dos acordos relativos à data de comercialização dos novos modelos de camiões conformes com as normas ambientais era conexa e complementar à colusão das partes no que respeitava aos preços e aos aumentos dos preços brutos. Importa também recordar que a Comissão concluiu pela existência de uma infração única e continuada cujo objetivo era restringir a concorrência no mercado de camiões médios e pesados no EEE e que consistia em práticas que reduziam os níveis de incerteza estratégica entre as partes no que respeitava, nomeadamente, aos preços futuros e aos aumentos dos preços brutos (considerando 317 da decisão impugnada).

295    Resulta do exposto que a argumentação das recorrentes apresentada nos n.os 291 e 292, supra, se baseia numa série de premissas erradas.

296    Com efeito, como já foi observado, as trocas de informações sobre o calendário e a instalação das tecnologias em matéria de emissões não foram qualificadas pela Comissão de infração só por si. Do mesmo modo, essas trocas de informações não foram consideradas isoladamente como restrição da concorrência por objeto, mas foram tomadas em consideração conjuntamente com outras práticas colusórias. Foi «este conjunto de acordos e de práticas concertadas» que foi qualificado, no considerando 239 da decisão impugnada, de restrição da concorrência por objeto, que permitiu às participantes adaptarem a sua estratégia de preços tendo em atenção as informações recebidas dos concorrentes.

297    Além disso, há que salientar que a conclusão da Comissão relativa à existência de uma infração única e continuada não se baseia na constatação de que os acordos ou práticas concertadas sobre o calendário e a comercialização das tecnologias em matéria de emissões constituíram um entrave na oferta das novas tecnologias, como sugere a argumentação das recorrentes apresentada no n.o 292, supra. A conclusão da Comissão baseia‑se na constatação de que essas práticas colusórias eram complementares das práticas colusórias relativas aos preços e aos aumentos dos preços brutos. Com efeito, resulta do conteúdo das interações entre os concorrentes, apresentados na decisão impugnada, que a instalação das tecnologias que asseguram a conformidade dos motores de camiões com as normas Euro podia ter um impacto nos preços dos modelos de camiões em causa e implicar o aumento desses preços. Os concorrentes discutiam entre si não só o calendário, mas também a repercussão dos custos relativos à instalação da nova tecnologia. Por conseguinte, a Comissão podia legitimamente salientar, nos considerandos 243 e 321 da decisão impugnada, que os concorrentes, ao discutirem a data de instalação das novas tecnologias e os custos adicionais por elas gerados, tomavam conhecimento do nível dos preços brutos previstos e do calendário do aumento desses preços brutos. Daqui resulta que a argumentação das recorrentes, apresentada no n.o 292, supra, se baseia numa compreensão errada da decisão impugnada e é inoperante.

298    No que respeita à questão de saber se a troca de informações entre os fabricantes de camiões, que lhes permitia ter conhecimento do nível previsto dos preços brutos dos seus concorrentes e do calendário de aumento desses preços brutos, constitui uma restrição da concorrência por objeto, a mesma não é abordada pela argumentação das recorrentes no âmbito do presente fundamento, a qual, como já foi observado, se baseia na compreensão errada de que a Comissão acusava os referidos fabricantes de entravar a oferta de novas tecnologias (v. n.o 297, supra). Para todos os efeitos úteis, há que recordar que a troca de informações entre concorrentes é suscetível de ir contra as normas de concorrência quando atenua ou elimina o grau de incerteza sobre o funcionamento do mercado em causa, tendo como consequência uma restrição da concorrência entre empresas (v. n.o 270, supra). Em particular, deve considerar‑se que tem um objetivo anticoncorrencial uma troca de informações suscetível de eliminar incertezas no espírito dos interessados quanto à data, à dimensão e às modalidades da adaptação do comportamento no mercado que as empresas em causa vão pôr em prática (v. Acórdão de 19 de março de 2015, Dole Food e Dole Fresh Fruit Europe/Comissão, C‑286/13 P, EU:C:2015:184, n.o 122 e jurisprudência referida).

299    No caso em apreço, tendo em conta a jurisprudência apresentada no n.o 298, supra, há que constatar que as trocas de informações entre concorrentes que lhes permitem obter informações sobre o nível dos preços brutos previstos e sobre o calendário de aumento desses preços brutos, eliminando assim a incerteza relativa ao comportamento futuro que vão adotar, constituem uma restrição da concorrência por objeto (v., neste sentido, Acórdão de 16 de setembro de 2013, Mamoli Robinetteria/Comissão, T‑376/10, EU:T:2013:442, n.o 72).

300    Tendo em conta as considerações anteriores, há que julgar improcedente a terceira parte do presente fundamento. Por conseguinte, este fundamento deve ser julgado totalmente improcedente.

d)      Quanto ao quinto fundamento, relativo a uma errada aplicação do artigo 101.o TFUE e do artigo 53.o do Acordo EEE, na medida em que a Comissão qualificou as trocas de informações ao nível alemão de infração «por objeto»

1)      Observações preliminares

301    As recorrentes alegam que a Comissão não apresentou provas precisas e concordantes que corroborem a tese de que a troca de informações ao nível alemão constituía um entrave suficiente à concorrência para ser qualificada de restrição «por objeto», na aceção do Acórdão de 11 de setembro de 2014, CB/Comissão (C‑67/13 P, EU:C:2014:2204).

302    As recorrentes afirmam que uma análise do conteúdo, dos objetivos e do quadro económico e jurídico das informações trocadas ao nível alemão revela que a avaliação «por objeto» realizada pela Comissão está viciada por um erro de direito ou por um erro manifesto de apreciação.

303    A Comissão contesta a argumentação das recorrentes.

304    Importa recordar que, no considerando 238 da decisão impugnada, a Comissão constatou, primeiro, que a Scania tinha celebrado acordos e/ou coordenado com as partes na transação sobre as alterações previstas dos preços brutos e das tabelas de preços brutos e sobre o calendário dessas alterações e, ocasionalmente, sobre alterações previstas dos preços líquidos ou de descontos oferecidos aos clientes, segundo, que a Scania tinha celebrado acordos e/ou coordenado com as partes na transação o calendário e a repercussão dos custos relativos à instalação de tecnologias em matéria emissões para camiões médios e pesados exigida pelas normas Euro 3 a Euro 6 e, terceiro, que a Scania e as partes na transação tinham trocado outras informações comercialmente sensíveis, a saber informações relativas aos prazos de entrega, às encomendas efetuadas e ao nível das existências, às quotas de mercado alvo, aos preços líquidos atuais e aos descontos, às tabelas de preços brutos (mesmo antes da sua entrada em vigor) e aos configuradores de camiões.

305    Segundo o considerando 212 da decisão impugnada, as práticas colusórias apresentadas pela Comissão no considerando 238 da referida decisão tinham lugar aos três níveis identificados nos n.os 35 a 38, supra, e, nomeadamente, ao nível alemão.

306    A Comissão entendeu, no considerando 239 da decisão impugnada, que todos os acordos e práticas concertadas apresentados no considerando 238 tinham por objeto restringir a concorrência na aceção do artigo 101.o, n.o 1, TFUE e tinham permitido às empresas adaptar a sua estratégia de preços tendo em conta as informações recebidas dos concorrentes.

307    Há também que recordar que a Comissão qualificou o conjunto desses comportamentos colusórios de infração única e continuada, que durou de 1997 a 2011. Segundo a Comissão, a Scania e as partes na transação prosseguiram um plano de conjunto que tinha como objetivo anticoncorrencial único restringir a concorrência no mercado de camiões médios e pesados no EEE. Esse objetivo tinha sido alcançado através de práticas que reduziam os níveis de incerteza estratégica entre os concorrentes no que respeitava aos preços futuros e aos aumentos dos preços brutos, ao calendário e à repercussão dos custos relativos à comercialização dos camiões conformes com as normas ambientais (considerando 317 da decisão impugnada).

308    Resulta do que precede que, embora a Comissão não tenha qualificado, no caso em apreço, os contactos colusórios ao nível alemão de infração, por si só, ao artigo 101.o TFUE, considerou que esses contactos constituíam restrições da concorrência por objeto e faziam parte da infração única e continuada imputada à Scania, contribuindo para a sua realização. No âmbito do presente fundamento, há que examinar o mérito da apreciação da Comissão de que os contactos colusórios ao nível alemão constituíam uma restrição da concorrência por objeto.

309    A este propósito, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que determinadas formas de coordenação entre empresas revelam um grau suficiente de nocividade para a concorrência para que se possa considerar que não há que examinar os seus efeitos (Acórdãos de 11 de setembro de 2014, CB/Comissão, C‑67/13 P, EU:C:2014:2204, n.o 49, e de 19 de março de 2015, Dole Food e Dole Fresh Fruit Europe/Comissão, C‑286/13 P, EU:C:2015:184, n.o 113; v., também, neste sentido, Acórdão de 14 de março de 2013, Allianz Hungária Biztosító e o., C‑32/11, EU:C:2013:160, n.o 34).

310    A distinção entre «infrações pelo objetivo» e «infrações pelo efeito» tem a ver com o facto de determinadas formas de conluio entre empresas poderem ser consideradas, pela sua própria natureza, prejudiciais ao bom funcionamento da concorrência (Acórdãos de 11 de setembro de 2014, CB/Comissão, C‑67/13 P, EU:C:2014:2204, n.o 50, e de 19 de março de 2015, Dole Food e Dole Fresh Fruit Europe/Comissão, C‑286/13 P, EU:C:2015:184, n.o 114; v., também, neste sentido, Acórdão de 14 de março de 2013, Allianz Hungária Biztosító e o., C‑32/11, EU:C:2013:160, n.o 35).

311    Assim, é um dado adquirido que certos comportamentos colusórios, como os que levam à fixação horizontal dos preços por cartéis, podem de tal modo ser considerados suscetíveis de ter efeitos negativos, particularmente no preço, na quantidade ou na qualidade dos produtos e serviços, que se pode considerar inútil, para efeitos de aplicação do artigo 101.o, n.o 1, TFUE, demonstrar que têm efeitos concretos no mercado. Com efeito, a experiência revela que esses comportamentos envolvem reduções de produção e subidas dos preços, levando a uma má repartição dos recursos, particularmente em detrimento dos consumidores (Acórdãos de 11 de setembro de 2014, CB/Comissão, C‑67/13 P, EU:C:2014:2204, n.o 51, e de 19 de março de 2015, Dole Food e Dole Fresh Fruit Europe/Comissão, C‑286/13 P, EU:C:2015:184, n.o 115).

312    Em contrapartida, no caso de um tipo de coordenação entre empresas não ter suficiente grau de nocividade para a concorrência, há que analisar os seus efeitos e, para o proibir, exigir a reunião dos elementos que demonstrem que o jogo da concorrência foi, de facto, impedido, restringido ou falseado de forma sensível (Acórdãos de 14 de março de 2013, Allianz Hungária Biztosító e o., C‑32/11, EU:C:2013:160, n.o 34; de 11 de setembro de 2014, CB/Comissão, C‑67/13 P, EU:C:2014:2204, n.o 52, e de 19 de março de 2015, Dole Food e Dole Fresh Fruit Europe/Comissão, C‑286/13 P, EU:C:2015:184, n.o 116).

313    Segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, para verificar se um acordo entre empresas ou uma decisão de associação de empresas apresenta suficiente grau de nocividade para ser considerado uma restrição da concorrência «pelo objetivo» na aceção do artigo 101.o, n.o 1, TFUE, há que ter em conta nomeadamente os objetivos que pretende atingir e o contexto económico e jurídico em que se insere. Na apreciação desse contexto, há que tomar também em consideração a natureza dos bens ou serviços afetados e as condições reais do funcionamento e da estrutura do ou dos mercados em causa (Acórdãos de 11 de setembro de 2014, CB/Comissão, C‑67/13 P, EU:C:2014:2204, n.o 53, e de 19 de março de 2015, Dole Food e Dole Fresh Fruit Europe/Comissão, C‑286/13 P, EU:C:2015:184, n.o 117; v., também, neste sentido, Acórdão de 14 de março de 2013, Allianz Hungária Biztosító e o., C‑32/11, EU:C:2013:160, n.o 36).

314    Além disso, embora a intenção das partes não constitua um elemento necessário para determinar o caráter restritivo de um tipo de coordenação entre empresas, nada impede as autoridades da concorrência ou os tribunais nacionais e da União de a terem em conta (Acórdãos de 14 de março de 2013, Allianz Hungária Biztosító e o., C‑32/11, EU:C:2013:160, n.o 37; de 11 de setembro de 2014, CB/Comissão, C‑67/13 P, EU:C:2014:2204, n.o 54, e de 19 de março de 2015, Dole Food e Dole Fresh Fruit Europe/Comissão, C‑286/13 P, EU:C:2015:184, n.o 118).

315    Mais em particular, no que diz respeito à troca de informações entre concorrentes, há que recordar que os critérios de coordenação e de cooperação constitutivos de uma prática concertada devem ser analisados à luz da conceção inerente às disposições do Tratado relativas à concorrência, segundo a qual qualquer operador económico deve determinar de forma autónoma a política que tenciona seguir no mercado interno (Acórdãos de 4 de junho de 2009, T‑Mobile Netherlands e o., C‑8/08, EU:C:2009:343, n.o 32, e de 19 de março de 2015, Dole Food e Dole Fresh Fruit Europe/Comissão, C‑286/13 P, EU:C:2015:184, n.o 119).

316    Embora essa exigência de autonomia não exclua o direito de os operadores económicos se adaptarem inteligentemente ao comportamento verificado ou esperado dos seus concorrentes, opõe‑se, no entanto, rigorosamente a qualquer contacto direto ou indireto entre esses operadores que possa influenciar o comportamento no mercado de um concorrente efetivo ou potencial, isto é, revelar a esse concorrente o comportamento que decidiu ter ou que projeta adotar nesse mercado, quando esses contactos tenham por objeto ou por efeito levar a condições de concorrência que não correspondam às condições normais do mercado em causa, tendo em conta a natureza dos produtos ou das prestações fornecidas, a importância e o número das empresas e o volume desse mercado (Acórdãos de 4 de junho de 2009, T‑Mobile Netherlands e o., C‑8/08, EU:C:2009:343, n.o 33, e de 19 de março de 2015, Dole Food e Dole Fresh Fruit Europe/Comissão, C‑286/13 P, EU:C:2015:184, n.o 120).

317    O Tribunal de Justiça considerou, assim, que a troca de informações entre concorrentes era suscetível de ir contra as normas de concorrência quando atenua ou elimina o grau de incerteza sobre o funcionamento do mercado em causa, tendo como consequência uma restrição da concorrência entre empresas (Acórdãos de 2 de outubro de 2003, Thyssen Stahl/Comissão, C‑194/99 P, EU:C:2003:527, n.o 81; de 4 de junho de 2009, T‑Mobile Netherlands e o., C‑8/08, EU:C:2009:343, n.o 35, e de 19 de março de 2015, Dole Food e Dole Fresh Fruit Europe/Comissão, C‑286/13 P, EU:C:2015:184, n.o 121).

318    Em particular, deve considerar‑se que tem um objetivo anticoncorrencial uma troca de informações suscetível de eliminar incertezas no espírito dos interessados quanto à data, à dimensão e às modalidades da adaptação do comportamento no mercado que as empresas em causa vão pôr em prática (Acórdão de 19 de março de 2015, Dole Food e Dole Fresh Fruit Europe/Comissão, C‑286/13 P, EU:C:2015:184, n.o 122; v. também, neste sentido, Acórdão de 4 de junho de 2009, T‑Mobile Netherlands e o., C‑8/08, EU:C:2009:343, n.o 41).

319    Por outro lado, uma prática concertada pode ter um objetivo anticoncorrencial mesmo não tendo qualquer ligação direta com os preços no consumo. Com efeito, a redação do artigo 101.o, n.o 1, TFUE não permite considerar que só são proibidas as práticas concertadas com efeitos diretos no preço pago pelos consumidores finais (Acórdão de 19 de março de 2015, Dole Food e Dole Fresh Fruit Europe/Comissão, C‑286/13 P, EU:C:2015:184, n.o 123; v. também, neste sentido, Acórdão de 4 de junho de 2009, T‑Mobile Netherlands e o., C‑8/08, EU:C:2009:343, n.o 36).

320    Pelo contrário, resulta desse artigo 101.o, n.o 1, TFUE que uma prática concertada pode ter um objetivo anticoncorrencial se consistir «em fixar de forma direta ou indireta os preços de compra ou de venda ou outras condições de transação» (Acórdãos de 4 de junho de 2009, T‑Mobile Netherlands e o., C‑8/08, EU:C:2009:343, n.o 37, e de 19 de março de 2015, Dole Food e Dole Fresh Fruit Europe/Comissão, C‑286/13 P, EU:C:2015:184, n.o 124).

321    De qualquer forma, o artigo 101.o TFUE visa, à semelhança de outras normas de concorrência constantes do Tratado, proteger não só os interesses diretos dos concorrentes ou dos consumidores, mas também a estrutura do mercado e, desse modo, a concorrência enquanto tal. Assim, a verificação da existência do objetivo anticoncorrencial de uma prática concertada não pode estar sujeita à da sua ligação direta com os preços no consumo (Acórdãos de 4 de junho de 2009, T‑Mobile Netherlands e o., C‑8/08, EU:C:2009:343, n.os 38 e 39, e de 19 de março de 2015, Dole Food e Dole Fresh Fruit Europe/Comissão, C‑286/13 P, EU:C:2015:184, n.o 125).

322    Por último, há que recordar que resulta dos próprios termos do artigo 101.o, n.o 1, TFUE que o conceito de prática concertada implica, além da concertação entre as empresas em causa, um comportamento no mercado que dê seguimento a essa concertação e um nexo causa/efeito entre esses dois elementos (Acórdãos de 4 de junho de 2009, T‑Mobile Netherlands e o., C‑8/08, EU:C:2009:343, n.o 51, e de 19 de março de 2015, Dole Food e Dole Fresh Fruit Europe/Comissão, C‑286/13 P, EU:C:2015:184, n.o 126).

323    A esse respeito, o Tribunal de Justiça considerou que se devia presumir, sem prejuízo de prova em contrário a ser feita pelos operadores interessados, que as empresas participantes na concertação e com atividade no mercado têm em conta as informações trocadas com os seus concorrentes para determinarem o seu comportamento nesse mercado. Em particular, o Tribunal de Justiça concluiu que essa prática concertada está abrangida pelo artigo 101.o, n.o 1, TFUE mesmo sem efeitos anticoncorrenciais no mercado (Acórdãos de 4 de junho de 2009, T‑Mobile Netherlands e o., C‑8/08, EU:C:2009:343, n.o 51, e de 19 de março de 2015, Dole Food e Dole Fresh Fruit Europe/Comissão, C‑286/13 P, EU:C:2015:184, n.o 127).

2)      Quanto ao conteúdo das informações trocadas

i)      Quanto às alterações previstas dos preços brutos e das tabelas de preços brutos e ao calendário dessas alterações, referidas no considerando 238, alínea a), da decisão impugnada

324    As recorrentes alegam que as informações trocadas ao nível alemão sobre os preços brutos não eram suscetíveis de atenuar a incerteza «estratégica» entre os concorrentes.

325    A este respeito, em primeiro lugar, as recorrentes alegam que as informações de preços trocadas ao nível alemão diziam respeito aos preços em vigor aplicados pelos distribuidores aos concessionários na Alemanha e não a preços futuros ou a intenções de preços. Em segundo lugar, as recorrentes sustentam que as interações ao nível alemão diziam respeito a preços que já eram públicos e, em terceiro lugar, sustentam que as informações trocadas sobre os preços brutos trocados não tinham nenhum valor informativo acerca dos preços efetivamente aplicados ao consumidor final.

–       Quanto ao argumento das recorrentes relativo ao caráter atual ou futuro da informação trocada ao nível alemão

326    No considerando 240 da decisão impugnada, a Comissão salientou que os concorrentes discutiam entre si diversos fatores relativos a preços futuros e à evolução futura dos preços brutos.

327    As recorrentes contestam a conclusão da Comissão na decisão impugnada, segundo a qual as informações trocadas ao nível alemão sobre os preços brutos diziam respeito a preços brutos futuros e a intenções de preços. Sustentam, no essencial, que essa troca de informações dizia respeito a preços brutos em vigor e, por conseguinte, não tinha uma importância estratégica tal que pudesse ser qualificada de restrição da concorrência «por objeto». Os preços brutos objeto daquela troca de informações eram preços em vigor (atuais) na medida em que, antes dessa troca, já tinham sido comunicados às redes de concessionários ou eram aplicados a entregas ou a encomendas já efetuadas por clientes.

328    A este respeito, há que constatar que os autos contêm numerosas provas que demonstram que as conversações, ao nível alemão, sobre os aumentos dos preços brutos tinham claramente um caráter prospetivo e se destinavam a eliminar as incertezas quanto à política de preços futuros dos concorrentes. Assim, as interações entre 2 e 8 de dezembro de 2004, descritas no considerando 140 da decisão impugnada, tinham por objeto os aumentos de preços planeados para 2005, as trocas de informações ocorridas em 12 de setembro de 2005, descritas no considerando 149 da decisão impugnada, tinham por objeto os aumentos de preços planeados para 2006, as trocas de informações que tiveram lugar em junho e julho de 2007, descritas no considerando 158 da decisão impugnada, tinham por objeto os aumentos de preços planeados para 2008, as trocas de informações que tiveram lugar em 12 e 13 de março de 2008, descritas no considerando 166 da decisão impugnada, tinham por objeto os aumentos de preços para o período compreendido entre 2008 e 2009, as trocas de informações que tiveram lugar em julho de 2009, descritas no considerando 179 da decisão impugnada, tinham por objeto os aumentos de preços planeados para 2010 e a mensagem de correio eletrónico de 14 de outubro de 2010, descrita no considerando 190 da decisão impugnada demonstra uma troca de informações relativamente a aumentos de preços para 2011. Trabalhadores da Scania DE participavam em todas essas trocas de informações.

329    Por outro lado, resulta dos autos que, em resposta a pedidos de um dos concorrentes, tanto a Scania como os outros concorrentes, comunicaram entre si os aumentos dos preços que, para o efeito, tencionavam aplicar. Assim, numa mensagem de correio eletrónico de 2 de dezembro de 2004, descrita no considerando 140 da decisão impugnada, um trabalhador de [confidencial] ao nível alemão pedia aos concorrentes informações sobre os aumentos de preços planeados para 2005, referindo: «Aumentos de preços 2005: como todos os anos, o patrão deseja saber se e quando vai aumentar os seus preços para o próximo ano». Além disso, esclarecia: «Por esta razão, por favor partilhe esta informação com toda a gente para não perder tempo a responder a pedidos individuais». Do mesmo modo, na mensagem de correio eletrónico de 20 de julho de 2009, apresentada no considerando 179 da decisão impugnada, relativa a um pedido de informações sobre, nomeadamente, os aumentos de preços para 2010, refere‑se: «[C]omo todos os anos, o planeamento prospetivo deve ser feito na casa mãe e com esta [devem ser abordados] alguns problemas relacionados».

330    As recorrentes contestam o caráter prospetivo dos preços brutos trocados alegando que as informações sobre tabelas de preços trocadas ao nível alemão diziam respeito às tabelas de preços brutos distribuidores‑concessionários que já tinham sido comunicadas aos concessionários e serviam de base para encomendas efetuadas por clientes finais. Em apoio desta argumentação, as recorrentes invocam dois relatórios elaborados por um gabinete de consultoria económica, o primeiro, datado de 20 de setembro de 2016, apresentado à Comissão durante o procedimento administrativo (a seguir «relatório económico de 20 de setembro de 2016») e, o segundo, datado de 9 de dezembro de 2017, apresentado pela primeira vez no Tribunal Geral (a seguir «relatório económico de 9 de dezembro de 2017»). Estes relatórios analisam as trocas de informações entre concorrentes nas quais a Scania DE estava implicada (e mencionadas na comunicação de objeções e na decisão impugnada) e, baseando‑se em dados fornecidos pela Scania, demonstram, alegadamente, que cada uma dessas trocas de informações dizia respeito a tabelas de preços brutos, as quais, antes da sua comunicação aos concorrentes da Scania DE, já tinham sido comunicadas aos concessionários da Scania na Alemanha ou tinham servido de referência para a realização de encomendas por clientes finais.

331    Esta argumentação das recorrentes não convence o Tribunal Geral.

332    Com efeito, independentemente do caráter fiável e preciso dos dados utilizados nos dois relatórios referidos no n.o 330, supra, que tinham sido encomendados pelas recorrentes com vista à sua defesa no âmbito do procedimento administrativo e no Tribunal Geral, há que observar que diversas trocas de informações apresentadas na decisão impugnada revelam que os aumentos dos preços discutidos durante essas trocas de informações se aplicavam às encomendas efetuadas posteriormente às mesmas. Por conseguinte, o caráter prospetivo da informação trocada está demonstrado mesmo seguindo a análise utilizada pelas recorrentes. A este respeito, o Tribunal Geral refere‑se, a título de exemplo, às trocas de informações ao nível alemão, apresentadas nos considerandos 140, 149, 166, 171 e 190 da decisão impugnada. Assim, aquando das trocas de informações de dezembro de 2004, apresentadas no considerando 140 da decisão impugnada, [confidencial] informou os seus concorrentes de que as tabelas de preços relativas aos veículos e às opções seriam aumentadas em 3 % para encomendas feitas depois de 1 de abril de 2005; no âmbito de uma apresentação feita pela [confidencial] numa reunião entre concorrentes ao nível alemão, em 12 e 13 de março de 2008, apresentada no considerando 166 da decisão impugnada, [confidencial] informou os seus concorrentes do aumento dos preços de determinados modelos de camiões aplicado a encomendas efetuadas a partir de abril de 2008, de outubro de 2008 e de abril de 2009; a mensagem de correio eletrónico de 7 de novembro de 2008, apresentada no considerando 171 da decisão impugnada, informa os concorrentes dos aumentos de preços aplicados pela [confidencial] para encomendas efetuadas a partir de abril de 2009 e dos aumentos de preços aplicados por [confidencial] para encomendas efetuadas a partir de fevereiro de 2009.

333    Além disso, há que observar que, mesmo que os fabricantes de camiões, antes de trocar informações sobre os aumentos dos preços brutos ao nível alemão, tivessem comunicado «internamente», isto é, aos seus concessionários, a sua intenção de aumentar os preços brutos e mesmo que já tivessem recebido encomendas com base nesses preços brutos, isso não significa que as informações trocadas não fossem úteis para os seus concorrentes, na medida em que essas informações não eram públicas e revelavam a estratégia de preços futura dos fabricantes de camiões que as prestavam.

334    Para corroborar a sua tese de que as trocas de informações entre fabricantes ao nível alemão diziam respeito aos preços brutos em vigor e não aos preços futuros, as recorrentes também alegam que a Scania DE não alterou os seus preços na sequência das informações (sobre os preços) que podia ter recebido dos seus concorrentes. Em apoio desta alegação, as recorrentes invocaram o relatório económico de 9 de dezembro de 2017, o qual, alegadamente, demonstrava que tinha sido realizado um volume significativo de vendas com base nas tabelas de preços, depois de a Scania DE as ter comunicado aos outros participantes ao nível alemão.

335    Este argumento, que deve ser abordado à luz dos princípios apresentados nos n.os 322 e 323, também não pode ser acolhido, na medida em que não demonstra de modo algum que a Scania não tomava em conta as informações recebidas no âmbito das interações ao nível alemão para determinar a sua estratégia de preços. A circunstância de a Scania ter participado em interações com os seus concorrentes durante 14 anos e com regularidade demonstra o valor estratégico que estas informações tinham para a Scania (v., neste sentido, Acórdão de 4 de junho de 2009, T‑Mobile Netherlands e o., C‑8/08, EU:C:2009:343, n.o 51).

336    Para contestar o caráter prospetivo dos preços brutos trocados ao nível alemão, as recorrentes invocam dois outros argumentos. Por um lado, referem‑se às declarações de outros fabricantes de camiões que constam do processo, as quais, em seu entender, confirmam que a troca de informações ao nível alemão não dizia respeito a intenções de preços futuros. Por outro lado, sustentam que os trabalhadores da Scania DE que participavam nas interações ao nível alemão não tinham por missão estabelecer os preços e estavam persuadidos de que as informações «prospetivas» sobre os preços não pertenciam à sua rede de contactos. Os trabalhadores da Scania DE tinham confirmado que as informações comunicadas aos trabalhadores dos outros fabricantes tinham sempre sido amplamente difundidas nas redes de concessionários da Scania e supunham que as informações de preços fornecidas pelos outros fabricantes diziam respeito a preços «atuais» e não futuros.

337    Os argumentos das recorrentes apresentados no n.o 336, supra, também não podem ser acolhidos.

338    Antes de mais, nas declarações invocadas pelas recorrentes, os fabricantes de camiões referiram, em substância, que as informações trocadas sobre os preços brutos ao nível alemão já tinham sido (isto é, antes das trocas) comunicadas aos concessionários e revestiam, portanto, segundo os referidos fabricantes, caráter público. O caráter «público» da informação trocada ao nível alemão será examinado nos n.os 342 a 350, infra. Nesta fase da análise, há que observar que os autos contêm elementos de prova que demonstram que as interações s ao nível alemão tinham nomeadamente por objeto aumentos futuros dos preços brutos, e isso também é demonstrado pelas declarações dos próprios fabricantes. Com efeito, como a Comissão realça nos considerandos 89 e 91 da decisão impugnada, a maioria dos fabricantes confirmou que, entre os assuntos de discussão ao nível alemão, constavam os aumentos futuros dos preços brutos e que essas interações tinham caráter sistemático e regular.

339    Em seguida, as declarações dos trabalhadores da Scania DE baseiam‑se na premissa errada de que os preços brutos objeto de interação ao nível alemão constituíam preços «atuais», uma vez que já tinham sido comunicados às redes dos concessionários. Em todo o caso, no que respeita à perceção que os trabalhadores da Scania DE tinham das trocas de informações ao nível alemão, importa lembrar que, segundo a jurisprudência, a imputação de uma infração ao artigo 101.o TFUE a uma empresa não pressupõe um conhecimento dos trabalhadores da empresa afetada por essa infração, mas sim a ação de uma pessoa que está autorizada a agir por conta da empresa (v., neste sentido, Acórdão de 14 de março de 2013, Dole Food e Dole Germany/Comissão, T‑588/08, EU:T:2013:130, n.o 581 e jurisprudência referida). No caso em apreço, como a Comissão salienta, as recorrentes não contestam que os trabalhadores da Scania DE que participaram nas trocas de informações estavam autorizados a fazê‑lo. Portanto, o argumento das recorrentes relativo à perceção supramencionada dos trabalhadores da Scania DE e à sua responsabilidade na fixação dos preços não opera e deve ser rejeitado.

340    Por último, há que rejeitar a alegação das recorrentes de que a Comissão ignorou o relatório económico de 20 de setembro de 2016 referido no n.o 330, supra. Os autos não demonstram o mérito dessa alegação e resulta das considerações anteriores que o referido relatório tinha uma utilidade limitada na medida em que visava corroborar uma tese errada, a saber, a de que as informações trocadas ao nível alemão eram «atuais» na medida em que já tinham sido comunicadas às redes dos concessionários.

341    Tendo em conta as considerações anteriores, há que julgar improcedente toda a argumentação das recorrentes relativa ao caráter «atual» da informação trocada ao nível alemão.

–       Quanto ao argumento das recorrentes relativo ao caráter público dos preços brutos objeto de troca de informações ao nível alemão

342    As recorrentes alegam que, tendo em conta o prazo bastante longo que decorre entre a encomenda de um camião e a sua entrega, as informações trocadas, ao nível alemão, sobre os preços brutos já tinham sido comunicadas pelos fabricantes de camiões às suas redes de concessionários e já eram referidas nas negociações entre os concessionários e os clientes, pertencendo assim no domínio público. Portanto, estas informações não tinham qualquer valor estratégico para os concorrentes. As recorrentes alegam que a sua análise é corroborada, em certa medida, pela nota de pé de página n.o 4, no ponto 74, das Orientações da Comissão sobre a aplicação do artigo 101.o TFUE aos acordos de cooperação horizontal (JO 2011, C 11, p. 1).

343    Esta argumentação das recorrentes não convence o Tribunal Geral.

344    Em primeiro lugar, num plano geral, salienta‑se que as trocas de informações de preços ao nível alemão ocorreram frequentemente e durante vários anos. Resulta também dos autos que essas trocas de informações tinham um caráter estruturado e bem organizado, sendo, muitas vezes, pedido aos participantes para preencherem um quadro Excel com informações relativas, nomeadamente, aos aumentos planeados dos preços brutos, e o Tribunal Geral remete, a este respeito, a título de exemplo, para os considerandos 150, 166, 171, 172, 175, 179 e 188 da decisão impugnada, e para as declarações de alguns dos fabricantes durante o procedimento administrativo, apresentadas no considerando 91 da decisão impugnada. Tendo em conta esse facto, a tese de que as interações ao nível alemão não tinham valor para os concorrentes para efeitos do planeamento das suas estratégias de preços não é plausível.

345    Em segundo lugar, há que observar que as recorrentes não demonstram que os fabricantes de camiões podiam obter as informações trocadas ao nível alemão através de um meio diferente do dos contactos diretos entre concorrentes e admitem que são incapazes de fornecer exemplos de anúncios de aumentos dos preços feitas através de uma fonte acessível a todos. As recorrentes também não contestam as declarações de alguns dos concorrentes durante o procedimento administrativo, apresentadas nos considerandos 269 e 270 da decisão impugnada, segundo as quais os preços brutos e as intenções de aumentar os preços brutos, que eram objeto das interações ao nível alemão, não eram geralmente públicos e apenas podiam ser em parte excertos de fontes acessíveis ao público, e as informações sobre os preços brutos que eram do domínio público não eram tão detalhadas e precisas como as recebidas diretamente dos concorrentes.

346    Neste mesmo contexto, também importa esclarecer que as recorrentes não demonstram que as informações obtidas pelos concessionários e pelos clientes finais de um fabricante de camiões relativas a aumentos futuros dos preços brutos chegam de forma simples, direta e sistemática aos outros fabricantes de camiões. A este respeito, um fabricante de camiões esclareceu, durante o procedimento administrativo, que, em geral, os clientes não partilhavam informações relativas a aumentos planeados de preços brutos dos concorrentes no âmbito das suas negociações com os concessionários, na medida em que essas informações não reforçavam o seu poder negocial relativamente a esses concessionários (v. considerando 279 da decisão impugnada).

347    Resulta das considerações anteriores que a comunicação às redes de concessionários das informações relativas aos aumentos aplicados às tabelas de preços brutos não tornava «públicas» essas informações, uma vez que uma informação pública era um dado objetivo do mercado, identificável de forma imediata (v., neste sentido, Acórdão de 8 de julho de 2008, BPB/Comissão, T‑53/03, EU:T:2008:254, n.o 236).

348    Daqui também resulta que a troca de informações ao nível alemão sobre os aumentos aplicáveis às tabelas de preços brutos era o único meio que permitia aos concorrentes ter acesso a essas informações de forma simples, rápida e detalhada e criar um clima de confiança mútua no que respeitava às suas futuras políticas de preços (v., neste sentido, Acórdão de 8 de julho de 2008, BPB/Comissão, T‑53/03, EU:T:2008:254, n.o 236).

349    Por conseguinte, há que validar a conclusão da Comissão, na decisão impugnada, de que as informações trocadas ao nível alemão não eram públicas (v., neste sentido, considerando 242 da decisão impugnada). Importa também esclarecer que, contrariamente ao alegado pelas recorrentes (v. n.o 342, supra), esta conclusão da Comissão é conforme com as Orientações sobre a aplicação do artigo 101.o TFUE aos acordos de cooperação horizontal. Com efeito, no n.o 74 das referidas orientações, a Comissão explicou que se devia considerar a troca entre concorrentes, de dados individualizados relativos às intenções futuras em matéria de preços ou quantidades, uma restrição da concorrência por objetivo. É certo que, na nota de pé de página n.o 4, nesse n.o 74, a Comissão precisou que, em situações específicas em que as empresas se comprometeram irrevogavelmente a vender no futuro a preços que anunciaram previamente ao público (ou seja, que não podem rever), estes anúncios públicos individualizados sobre preços ou quantidades futuros não podem ser considerados intenções e, por conseguinte, não se considera normalmente que restringem a concorrência por objeto. Todavia, o conteúdo desta nota de pé de página não é pertinente no caso em apreço, na medida em que os fabricantes dos camiões, incluindo a Scania, não anunciavam ao grande público, mas apenas às suas redes de concessionários, as informações sobre os preços trocadas ao nível alemão.

350    Com base nas considerações anteriores, há que julgar improcedente a argumentação das recorrentes relativa ao caráter público das informações sobre os preços brutos trocadas ao nível alemão.

–       Quanto ao argumento das recorrentes relativo à falta de valor informativo dos preços brutos objeto de troca de informações ao nível alemão sobre os preços efetivamente aplicados nas transações do mercado

351    As recorrentes sustentam que as informações trocadas ao nível alemão sobre os preços brutos não fornecem qualquer indicação quanto ao comportamento tarifário futuro dos concorrentes. Explicam que, devido à complexidade e ao número de fatores de fixação de preços dos camiões, os preços brutos e as tabelas de preços brutos não têm qualquer valor informativo sobre os preços efetivamente aplicados nas transações de mercado, contrariamente à apreciação da Comissão na decisão impugnada.

352    Este argumento das recorrentes é reiterado e mais desenvolvido no âmbito da sua argumentação relativa ao contexto económico e jurídico da troca de informações ao nível alemão. Por conseguinte, será abordado no âmbito da apreciação desta argumentação.

ii)    Quanto às alterações previstas dos preços líquidos e dos descontos oferecidos aos clientes, referidos no considerando 238, alínea a), da decisão impugnada

353    Importa recordar que a Comissão salientou, no considerando 238, alínea a), da decisão impugnada, que a Scania e as partes na transação trocaram, ocasionalmente, informações sobre as alterações previstas dos preços líquidos ou sobre alterações aos descontos oferecidos aos clientes. Resulta do considerando 212, alínea a), da decisão impugnada que, segundo a Comissão, diversas interações dessas tinham lugar ao nível alemão.

354    As recorrentes contestam que essas interações tenham ocorrido e sustentam que as provas documentais invocadas pela Comissão não demonstram a sua existência.

355    Resulta dos autos que a Comissão fez prova bastante da existência das práticas apresentadas no n.o 353, supra.

356    No que respeita às trocas de informações relativas aos descontos, a sua existência é comprovada nas notas manuscritas de um trabalhador da [confidencial], relativas a uma reunião entre concorrentes, em 3 e 4 de maio de 2004, nas instalações da Scania DE, apresentadas no considerando 134 da decisão impugnada. Essas notas referem: «média dos preços +5, 6, 7,5 %! nenhuma alteração dos preços brutos, mesmo nível de descontos». Por outro lado, resulta das provas documentais apresentadas no considerando 156 da decisão impugnada que, em 7 de setembro de 2006, um trabalhador da [confidencial] informou os trabalhadores dos outros fabricantes ao nível alemão, entre os quais um trabalhador da Scania DE, a propósito de um aumento dos preços praticado por [confidencial], referindo que «haver[ia] um aumento dos preços (apenas [confidencial]) a partir de 1 de outubro: 2 % para todos os [confidencial] modelos» e que «[as] tabelas de preços não eram alteradas, mas sim o desconto do vendedor». Do mesmo modo, resulta da prova documental apresentada no considerando 158 da decisão impugnada que, em 10 de julho de 2007, um trabalhador da [confidencial], em resposta a um pedido de informações proveniente de um trabalhador da [confidencial] e dirigido a trabalhadores dos concorrentes do nível alemão, comunicou uma alteração dos descontos aplicados por [confidencial]. Trabalhadores da Scania DE participavam nas trocas de informações supramencionadas.

357    No que respeita às trocas de informações relativas aos preços líquidos, resulta da prova documental apresentada no considerando 140 da decisão impugnada que, em resposta a um pedido de informações, de 2 de dezembro de 2004, [confidencial] proveniente de um trabalhador de [confidencial], relativo aos aumentos dos preços planeados para 2005, informou os seus concorrentes, nomeadamente, de que os preços líquidos seriam aumentados em 1 % a partir de 1 de janeiro de 2005 para as opções e a partir de 1 de fevereiro de 2005 para todas as séries. [confidencial] esclareceu que o aumento dos preços ia ser efetuado através de uma redução dos descontos. Do mesmo modo, resulta da prova documental apresentada no considerando 149 da decisão impugnada que, no âmbito de uma reunião entre concorrentes realizada em 12 de setembro de 2005 ao nível alemão, na qual a Scania tinha participado, [confidencial] informou os seus concorrentes a propósito de um aumento de preços de 8 para 10 % líquidos para o modelo de camião [confidencial]. Por outro lado, resulta da prova documental apresentada no considerando 179 da decisão impugnada que, em resposta a um pedido de informações de 20 de julho de 2009, proveniente de um trabalhador da [confidencial], relativo, nomeadamente, a aumentos de preços para 2010, [confidencial] informou os seus concorrentes de um aumento de 1,5 % dos preços líquidos, aplicado às encomendas efetuadas a partir de outubro de 2009. As trocas de informações relativas a preços líquidos resultam também da prova documental apresentada nos considerandos 184 e 188 da decisão impugnada. Trabalhadores da Scania DE participavam nas trocas de informações supramencionadas.

358    No que se refere a diversas trocas de informações apresentadas nos n.os 356 e 357, supra (por exemplo, as apresentadas nos considerandos 140, 149, 156 e 158 da decisão impugnada), as recorrentes, socorrendo‑se do raciocínio apresentado nos n.os 327 e 342, supra, invocam a circunstância de as informações trocadas serem informações «atuais» (e não futuras) pertencentes ao domínio público. Na medida em que este raciocínio já foi rejeitado pelo Tribunal Geral, a argumentação das recorrentes não põe em causa a conclusão formulada no n.o 355, supra.

iii) Quanto à repercussão dos custos relativos à comercialização das tecnologias em matéria de emissões para os camiões médios e pesados, exigidas pelas normas Euro 3 a Euro 6, referida no considerando 238, alínea b), da decisão impugnada

359    Importa recordar que a Comissão, no considerando 238, alínea b), da decisão impugnada, salientou que a Scania e as partes na transação tinham celebrado acordos e/ou se tinham coordenado sobre a repercussão dos custos relativos à comercialização das tecnologias em matéria de emissões para os camiões médios e pesados, exigidas pelas normas Euro 3 à Euro 6. Resulta do considerando 212, alínea b), da decisão impugnada que, segundo a Comissão, várias dessas práticas colusórias tinham lugar ao nível alemão.

360    As recorrentes contestam terem‑se concertado ao nível alemão no que respeita à repercussão dos custos (aumento dos preços brutos) relacionados com a comercialização das tecnologias em matéria de emissões. Por outro lado, embora não neguem que se tenham trocado informações sobre os preços ao nível alemão, contestam que os preços relacionados com a instalação das tecnologias objeto das trocas de informações fossem preços futuros ou preços previstos.

361    Resulta dos autos que a Comissão fez prova bastante da existência das práticas colusórias apresentadas no n.o 359, supra, e da participação da Scania nestas práticas.

362    A título de exemplo, resulta dos elementos de prova apresentados no considerando 140 da decisão impugnada que, no âmbito de uma troca de informações ao nível alemão, que teve lugar entre 2 e 8 de dezembro de 2004, na qual participou um trabalhador da Scania DE, [confidencial] informou os seus concorrentes da sua intenção de aumentar o preço para os novos modelos conformes com a norma Euro 4 em 5 410 euros. Do mesmo modo, resulta dos elementos de prova apresentados no considerando 141 da decisão impugnada que, em resposta a uma mensagem de correio eletrónico de B, trabalhador da Scania DE, dirigida aos concorrentes e pedindo informações relativas aos preços e às datas de entrega dos motores conformes com as normas Euro 4 e Euro 5, J da filial alemã [confidencial], respondeu que esse fabricante entregaria camiões conforme com essas normas a partir de abril ou de maio de 2005 e que os preços adicionais para os motores conforme com as normas Euro 4 e Euro 5 seriam, respetivamente, de 11 500 euros e de 14 800 euros. Por outro lado, resulta dos elementos de prova apresentados no considerando 149 da decisão impugnada que ocorreram interações sobre os preços na reunião entre concorrentes, ao nível alemão, em 12 de setembro de 2005. Entre os temas em discussão constavam os aumentos de preços planeados para 2006. I da Scania DE esteve presente na reunião. Resulta das notas manuscritas de um dos participantes na reunião que [confidencial] informou os seus concorrentes a propósito de adicionais que esse fabricante aplicaria em consequência da instalação das tecnologias conformes com as normas Euro 4 e Euro 5. Também resulta dos elementos de prova que constam dos autos que, na reunião de 12 de setembro de 2005 supramencionada, I da Scania DE fez uma apresentação detalhada sobre os aumentos de preços resultantes da instalação das tecnologias conformes com as normas Euro 3 e Euro 4 aplicados pela Scania. Resulta igualmente dos elementos de prova apresentados no considerando 166 da decisão impugnada, relativos a uma reunião entre concorrentes ao nível alemão em 12 e 13 de março de 2008, que houve trocas de informações sobre os aumentos planeados dos preços. Uma apresentação feita por [confidencial] referiu um aumento de 2 350 euros para os motores conformes com a norma Euro 5 a partir do mês de maio de 2008.

363    No que respeita às diversas interações apresentadas no n.o 362, supra (as apresentadas nos considerandos 141, 149 e 166 da decisão impugnada), as recorrentes, socorrendo‑se do raciocínio apresentado nos n.os 327 e 342, supra, alegam que as informações trocadas eram atuais e não futuras e pertenciam ao domínio público. Na medida em que este raciocínio já foi rejeitado pelo Tribunal Geral, a argumentação das recorrentes não põe em causa a conclusão formulada no n.o 361, supra.

iv)    Quanto à troca de outras informações comercialmente sensíveis, referida no considerando 238, alínea c), da decisão impugnada

364    Importa recordar que, no considerando 238, alínea c), da decisão impugnada, a Comissão salientou que a Scania e as partes na transação tinham trocado outras informações comercialmente sensíveis, como informações relativas aos prazos de entrega, às encomendas efetuadas e ao nível das existências, às quotas de mercado alvo, aos preços líquidos atuais e às entregas, às tabelas de preços brutos (mesmo antes da sua entrada em vigor) e aos configuradores dos camiões.

365    As recorrentes alegam, nomeadamente, que as «outras informações comercialmente sensíveis» que, por vezes, foram trocadas ao nível alemão eram de natureza técnica e insuscetíveis de eliminar a incerteza estratégica entre as participantes quanto ao seu comportamento no mercado. Segundo as recorrentes, estas informações não podiam ser consideradas, isoladamente ou em associação com as outras informações mencionadas no considerando 238 da decisão impugnada, como fazendo parte de uma infração «por objeto».

366    A este respeito, há que observar que resulta do considerando 237 da decisão impugnada que, segundo a Comissão, a troca de informações comercialmente sensíveis, apresentada no n.o 364, supra, constituía um dos meios utilizados pelos concorrentes que lhes permitia coordenar os preços e os aumentos dos preços brutos, sendo os restantes meios os contactos colusórios relativos aos preços, ao calendário e aos custos adicionais resultantes da comercialização dos novos modelos de camiões conformes com as normas de emissão [visados no considerando 238, alíneas a) e b) da decisão impugnada.

367    Resulta também do considerando 317 da decisão impugnada que, segundo a Comissão, o intercâmbio de informações comercialmente sensíveis, apresentadas no n.o 364, supra, constituía um dos meios utilizados pelos concorrentes para reduzir a incerteza estratégica entre si no que respeitava aos preços futuros, aos aumentos dos preços brutos, ao calendário e à repercussão dos custos relativos à comercialização dos modelos de camiões conformes com as normas ambientais.

368    Há também que observar que o artigo 1.o do dispositivo da decisão impugnada não faz referência às trocas de «outras informações comercialmente sensíveis», identificadas no considerando 238, alínea c), da decisão impugnada.

369    Por outro lado, a Comissão explicou, na contestação, que a referência às «outras informações comercialmente sensíveis» constituía um dos exemplos da forma como os membros do cartel puseram em prática a sua concertação sobre os preços futuros e os aumentos dos preços brutos, bem como sobre o calendário e a comercialização das tecnologias e da repercussão dos custos gerados e que essa referência não ampliava o alcance da infração.

370    Resulta do que precede que a análise do mérito das apreciações da Comissão relativas às trocas de «outras informações comercialmente sensíveis» se torna supérfluo se se verificar que a Comissão consegue demonstrar a existência das outras práticas colusórias identificadas no considerando 238, alíneas a) e b), e no considerando 317, alíneas a) e b), da decisão impugnada e a restrição «por objeto» da concorrência resultante dessas práticas. O Tribunal Geral pronuncia‑se sobre esta questão no n.o 394, infra.

371    A este respeito, o Tribunal Geral tem igualmente em conta a circunstância de as conclusões da Comissão relativas às trocas de «outras informações comercialmente sensíveis» não terem impacto na duração e na gravidade da infração e, por conseguinte, no montante da coima, na medida em que estas são determinadas pelas práticas colusórias identificadas no considerando 238, alíneas a) e b), e no considerando 317, alíneas a) e b), da decisão impugnada.

3)      Quanto ao objetivo das trocas de informações ao nível alemão

372    As recorrentes alegam que as trocas de informações ao nível alemão incidiam sobretudo sobre informações técnicas relativas aos produtos. Os participantes tinham por objetivo manter‑se informados sobre a evolução técnica dos camiões para melhor servir os clientes. Segundo as recorrentes, os participantes nas interações ao nível alemão por conta da Scania DE eram formadores em vendas e não participavam nas tomadas de decisões da Scania DE sobre os preços. Em apoio das suas alegações, as recorrentes apresentaram declarações sob juramento dos trabalhadores da Scania DE que participavam nas trocas de informações ao nível alemão.  Também invocaram uma resposta [confidencial] à comunicação de objeções.

373    A Comissão alega que os argumentos das recorrentes são desprovidos de fundamento.

374    Importa observar que o conteúdo dos autos não corrobora a alegação das recorrentes de que as interações ao nível alemão diziam principalmente respeito a questões técnicas. Em contrapartida, os elementos de prova que constam dos autos demonstram que uma parte importante dessas trocas incidia sobre informações de preços, as quais, contrariamente à análise das recorrentes, tinham caráter prospetivo e não eram do domínio público. O objetivo anticoncorrencial das interações ao nível alemão também é demonstrado pela circunstância de várias dessas interações terem origem nos pedidos de informações feitos por trabalhadores de diversos fabricantes relativos aos aumentos dos preços planeados pelos concorrentes para o futuro. Assim, na mensagem de correio eletrónico de 2 de dezembro de 2004 apresentada no considerando 140 da decisão impugnada, K de [confidencial] escreve, a propósito de um «[a]umento dos preços 2005», «como acontece todos os anos, o patrão deseja saber se e quando vai aumentar os seus preços no próximo ano» e esclarece «Por esta razão, por favor partilhe esta informação com toda a gente para não perder tempo [evitando] pedidos individuais». Na mensagem de correio eletrónico de 21 de julho de 2009, apresentada no considerando 180 da decisão impugnada, L, trabalhador da [confidencial], em resposta a uma mensagem de correio eletrónico de I da Scania DE, que pedia temas de discussão para a reunião dos concorrentes ao nível alemão, de 17 e 18 de setembro de 2009, formulava «sugestões espontâneas dos assuntos» especificando: «Euro VI? Sei — o que se pode falar e querer‑se‑á falar sobre este assunto? — Como poderemos fazer subir o nível de preços deste ano?»

375    Nas suas declarações sob juramento, os trabalhadores da Scania DE afirmaram que não participavam no processo de tomada de decisões sobre preços nesta sociedade, mas essas afirmações não corroboram a alegação de que as interações ao nível alemão respeitavam sobretudo a informações técnicas, nem a alegação de que os trabalhadores supramencionados, pela sua participação nas referidas interações, tinham por objeto manter‑se informados sobre as evoluções técnicas.

376    Do mesmo modo, a afirmação [confidencial], invocada pelas recorrentes, de que as informações sobre os preços não constituíam a razão principal da participação dos seus trabalhadores nas interações ao nível alemão e a sua afirmação de que essa sociedade se interessava pelas tabelas de preços dos outros fabricantes pela razão principal de que eram os únicos documentos com uma visão completa dos diferentes modelos e variações de camiões, não convencem o Tribunal Geral. Como a Comissão observa com razão, as afirmações referidas supra [confidencial] não explicam a razão pela qual era necessário, para efeitos da obtenção da lista dos diferentes modelos e variações de camiões, trocar também informações sobre os futuros aumentos de preços. De resto, resulta dos autos que esse fabricante referiu claramente no procedimento administrativo (nas suas respostas a um pedido de informação da Comissão) que as interações ao nível alemão também diziam respeito a informações relativas aos aumentos previstos das tabelas de preços e que essas interações tinham caráter sistemático e regular.

377    Resulta do que precede que as alegações das recorrentes apresentadas no n.o 372, supra,  não convencem o Tribunal Geral. Em contrapartida, os autos demonstram o mérito da conclusão da Comissão no considerando 307 da decisão impugnada, segundo a qual as interações relativas aos aumentos dos preços brutos dos camiões iam além de uma troca de informações que fosse do domínio público e tinham por objeto aumentar a transparência entre as partes e, por conseguinte, reduzir as incertezas associadas ao funcionamento normal do mercado.

378    Por outro lado, mesmo admitindo que as trocas de informações ao nível alemão tenham prosseguido objetivos legítimos, como os invocados pelas recorrentes, que coexistiam com o objetivo anticoncorrencial demonstrado, essa circunstância não põe em causa a conclusão da Comissão relativa à existência de uma restrição da concorrência «por objeto». Com efeito, resulta de jurisprudência assente que se pode considerar que um comportamento colusório tem um objeto restritivo da concorrência mesmo que não tenha por único objetivo restringir a concorrência, prosseguindo igualmente outros objetivos legítimos (v., neste sentido, Acórdão de 20 de novembro de 2008, Beef Industry Devlopment Society e Barry Brothers, C‑209/07, EU:C:2008:643, n.o 21 e jurisprudência referida).

379    Tendo em conta as considerações anteriores, há que julgar improcedente a argumentação das recorrentes relativa ao objetivo das trocas de informações ao nível alemão.

4)      Quanto ao contexto da troca de informações ao nível alemão

380    As recorrentes alegam que uma análise do contexto económico e jurídico, em particular da natureza e da estrutura do mercado de camiões e das condições do seu funcionamento, põe em causa a natureza «por objeto» da infração considerada pela Comissão.

381    As recorrentes explicam que os camiões são produzidos e comercializados sob um grande número de formas e de variações em função das necessidades dos clientes e que o seu preço final depende das suas características e das especificidades do mercado nacional em que são vendidos. As recorrentes observam também que os compradores de camiões são profissionais que dispõem de um importante poder negocial.

382    As recorrentes concluem assim que, devido à complexidade dos camiões e da multiplicidade de fatores que influenciam o preço final faturado ao cliente, que se torna um preço individualizado, os preços brutos e as tabelas de preços brutos trocadas entre os concorrentes não têm valor informativo sobre os parâmetros da concorrência (isto é, sobre os preços a faturar ou efetivamente aplicados nas transações do mercado), e que a Comissão não tomou suficientemente em conta este contexto no momento de determinar a natureza das trocas de informações.

383    As recorrentes também alegam que a Scania utiliza um mecanismo de fixação de preços que é complexo e no qual as decisões nesse domínio são tomadas em diversos escalões comerciais independentes uns dos outros e com base em negociações livres entre a sede da Scania, os distribuidores nacionais, os concessionários locais e os clientes finais. A variação dos preços ao longo da cadeia de abastecimento, suscitada pela natureza independente das negociações a todos os níveis, cria, portanto, uma desconexão entre os preços fábrica‑distribuidores e as tabelas dos preços brutos distribuidores‑concessionários e o preço real da transação aplicado pelos concessionários independentes aos clientes finais. Em apoio da sua argumentação, as recorrentes invocam o relatório económico de 9 de dezembro de 2017, que demonstra, no que respeita à Scania, a grande diferença entre os preços brutos distribuidor‑concessionários e os preços das transações correspondentes, bem como a inexistência de tendência comum nas tabelas de preços brutos e nos preços reais das transações. Daqui resulta que um concorrente não poderia ter deduzido qual teria sido a variação aproximativa do preço real da transação a partir de uma alteração na tabela dos preços brutos.

384    Em primeiro lugar, importa recordar que a Comissão apresentou nos considerandos 22 a 40 da decisão impugnada a estrutura do mercado de camiões e o mecanismo de fixação dos preços na indústria dos camiões (v. n.os 19 a 22, supra).

385    Importa também recordar que, nos considerandos 51 e 52 da decisão impugnada, a Comissão examina o impacto dos aumentos de preços ao nível europeu sobre os preços ao nível nacional (v. n.os 32 e 33, supra). A este respeito, a Comissão observa que os distribuidores nacionais dos fabricantes, como a Scania DE, não são independentes na fixação dos preços brutos e das tabelas de preços brutos e que todos os preços aplicados em cada etapa da cadeia de distribuição até ao consumidor final decorrem das tabelas dos preços brutos pan‑europeus fixados ao nível da sede (considerando 51 a decisão impugnada).

386    Daqui resulta, segundo a Comissão, que um aumento dos preços na tabela pan‑europeia dos preços brutos, decidido ao nível da sede, determina o movimento do preço líquido para o distribuidor, isto é, do preço que o distribuidor paga à sede para a aquisição do camião. Por conseguinte, segundo a Comissão, o aumento pela sede dos preços brutos acima referidos influencia também o nível do preço bruto do distribuidor, ou seja, o preço que o concessionário paga ao distribuidor, ainda que o preço ao consumidor final não seja necessariamente alterado na mesma proporção ou não seja de todo alterado (considerando 52 da decisão impugnada).

387    É, portanto, tendo em conta este contexto factual que a Comissão, no âmbito da apreciação do caráter anticoncorrencial das trocas de informações relativas aos aumentos futuros dos preços brutos, esclarece, no considerando 284 da decisão impugnada, que, devido à maior transparência do mercado de camiões e à sua grande concentração, a única incerteza com que as partes se defrontavam era a de saber se a política de preços oficial dos seus concorrentes ia ser alterada, e se assim fosse, por que razão e em que data. A Comissão constata que, para eliminar essa incerteza, a Scania e as partes na transação estabeleceram uma troca bem estruturada e sistemática das informações estratégicas relativas aos desenvolvimentos tarifários futuros. Segundo a Comissão, os aumentos futuros dos preços brutos constituíam um fator de fixação dos preços aplicado às tabelas pan‑europeias dos preços brutos (de que todas as partes dispunham, salvo [confidencial]), uma vez que essas tabelas estavam na origem de todos os preços aplicados a nível nacional, incluindo os preços finais das transações (considerando 284 da decisão impugnada).

388    A Comissão também esclarece que o facto de não ser possível calcular exatamente os preços finais dos camiões vendidos aos consumidores com base na troca de informações não é relevante. Segundo a Comissão, a troca de informações que revelava a tendência do futuro movimento dos preços brutos permitia aos concorrentes compreender a data e a forma como os preços evoluiriam na Europa. Por outro lado, segundo a Comissão, a troca das tabelas de preços brutos detalhados permitia aos fabricantes deduzir aproximadamente os preços líquidos atuais e/ou futuros através da combinação de diferentes tipos de informações que obtinham (considerando 285 da decisão impugnada).

389    Em segundo lugar, há que recordar que a Comissão, nos considerandos 41 a 50 da decisão impugnada, descreve o mecanismo de fixação dos preços na Scania e as pessoas envolvidas nessa fixação (v. n.os 23 a 31, supra).

390    Resulta dos n.os 384 a 389, supra, que, contrariamente à alegação das recorrentes, a Comissão tomou suficientemente em conta o contexto das trocas de informações em que a Scania participou, para concluir pelo seu caráter anticoncorrencial «por objeto». Em especial, a Comissão teve em conta as características do mercado de camiões e o mecanismo dos seus preços para concluir pelo caráter anticoncorrencial «por objeto» das trocas de informações prospetivas efetuadas, nomeadamente, ao nível alemão.

391    Em terceiro lugar, no que respeita à argumentação das recorrentes apresentada no n.o 383, supra, primeiro, há que recordar que, segundo a jurisprudência, uma prática concertada pode ter um objetivo anticoncorrencial mesmo não tendo qualquer ligação direta com os preços no consumo (v. n.os 319 a 321, supra). Por conseguinte, a falta de impacto que poderia ter um aumento dos preços brutos, decidida numa qualquer fase da cadeia de distribuição da Scania, sobre o preço pago pelo consumidor final não basta para pôr em causa a conclusão da Comissão de que a troca de informações sobre as alterações futuras dos preços brutos, efetuada nomeadamente ao nível alemão, constituía uma restrição da concorrência «por objeto» devido à utilidade das informações trocadas para a definição da estratégia de preços dos concorrentes.

392    Segundo, a argumentação das recorrentes, apresentada no n.o 383, supra, não demonstra a inexistência de caráter estratégico das informações sobre as alterações futuras dos preços brutos fornecidos pelos trabalhadores da Scania DE nas interações ao nível alemão. Com efeito, como resulta da apresentação do mecanismo de fixação de preços na Scania (v. nomeadamente n.os 26, 27 e 31, supra), os preços brutos aplicados pela Scania, aos quais são aplicados descontos, constituem a base do preço de venda dos camiões aos concessionários no mercado alemão. Daqui resulta que as alterações futuras dos preços brutos supramencionados constituem um elemento que influencia o preço de transferência do camião pela Scania DE para os concessionários alemães e que as trocas de informações relativas a essas alterações revestem assim um caráter estratégico.

393    Em quarto lugar, e a título mais geral, o caráter estratégico das informações relativas à alteração futura dos preços brutos, trocadas ao nível alemão, é também demonstrado pela frequência, pelo caráter regular e sistemático das trocas e pelo facto, não contestado, salientado no considerando 93 da decisão impugnada, de, no caso da maioria dos fabricantes, essas informações serem frequentemente transferidas para as respetivas sedes e tomadas em conta no âmbito da determinação das suas estratégias de preços.

394    Com base nas considerações anteriores, há que rejeitar a argumentação das recorrentes relativa ao contexto das trocas de informações ao nível alemão. Importa também concluir que a qualificação, pela Comissão, das trocas de informações ao nível alemão como restrição da concorrência «por objeto» não está viciada de erro. Por conseguinte, o quinto fundamento deve ser julgado improcedente.

e)      Quanto ao sexto fundamento, relativo a uma aplicação errada do artigo 101.o TFUE e do artigo 53.o do Acordo EEE na medida em que a Comissão considerou que o âmbito geográfico da infração relativa ao nível alemão abrangia todo o território do EEE

395    As recorrentes contestam a conclusão da Comissão, no considerando 386 da decisão impugnada, de que o âmbito geográfico da infração se estendia a todo o território do EEE durante toda a sua duração, abrangendo assim o comportamento dos concorrentes ao nível alemão.

396    Importa recordar que, no caso em apreço, a Comissão concluiu pela existência de uma infração única e continuada ao artigo 101.o TFUE e ao artigo 53.o do Acordo EEE, de 17 de janeiro de 1997 a 18 de janeiro de 2011.

397    No que respeita ao âmbito geográfico da infração, a Comissão considerou que esta se estendia a todo o território do EEE durante todo o período compreendido entre 17 de janeiro de 1997 e 18 de janeiro de 2011 (considerando 386 da decisão impugnada).

398    O raciocínio da Comissão que fundamentou a conclusão no considerando 386 da decisão impugnada é apresentado, nos seguintes termos, nos considerandos 388 e 389 da decisão impugnada:

«(388)      A Scania e as partes na transação dispõem dos preços brutos aplicáveis à escala europeia e das tabelas de preços brutos. Os elementos de prova demonstram que, antes e depois da introdução das tabelas de preços à escala europeia ou mundial, os concorrentes tinham conversações anticoncorrenciais que abrangiam o território das partes contratantes no Acordo EEE e concordavam sobre os aumentos dos preços brutos para alinhar os preços para camiões médios e pesados no EEE. Antes da introdução das tabelas europeias de preços, os elementos de prova demonstram que as conversações não diziam apenas respeito a países específicos, mas [que] tinham, de forma explícita, um alcance europeu (v. considerandos 103 e 104). Depois da introdução das tabelas europeias dos preços brutos, aplicáveis em todo o território do EEE, os concorrentes podiam perceber a estratégia de preços europeia trocando informações sobre os aumentos de preços brutos na Alemanha (v. considerando 175) na medida em que estes refletiam os aumentos dos preços brutos aplicados pelas sedes nas respetivas tabelas de preços brutos.

(389)      Por outro lado, chegaram a acordo e/ou coordenaram o calendário e a repercussão dos custos relativos à instalação das tecnologias em matéria de emissões para camiões médios e pesados, impostas pelas normas Euro 3 a [Euro] 6 que eram aplicáveis em todo o território do EEE. As interações sobre as datas de instalação das novas normas tecnológicas (por exemplo, a norma Euro 3) e sobre os aumentos dos preços correspondentes não estavam limitadas a determinados países, mas abrangiam todo o EEE (v. considerandos 100 e 103).»

399    Há também que recordar que, na decisão impugnada, a Comissão declarou que as interações entre concorrentes ao nível dos órgãos dirigentes foram interrompidas em setembro de 2004 e que, após essa data, as interações entre concorrentes foram continuadas ao nível alemão [considerando 327, alínea a), da decisão impugnada].

400    Entre os destinatários da decisão impugnada encontrava‑se a Scania DE, dado que a Comissão considerou que esta entidade era diretamente responsável pelas trocas de informações anticoncorrenciais no período compreendido entre 20 de janeiro de 2004 e 18 de janeiro de 2011 [considerando 410, alínea a), da decisão impugnada].

401    Para alicerçar a sua tese de que as trocas de informações entre concorrentes ao nível alemão tinham um alcance que não excedia o território alemão, as recorrentes formulam, em substância, dois grupos de argumentos.

402    Por um lado, as recorrentes alegam que as informações que a Scania DE obtinha dos seus concorrentes não tinham um interesse além do mercado alemão. Acresce que, segundo as recorrentes, a Scania DE nunca supôs que essas informações apresentavam tal interesse e que eram suscetíveis de reduzir a incerteza quanto à estratégia de preços europeia dos seus concorrentes.

403    Por outro lado, as recorrentes sustentam que a Scania DE não forneceu informações aos seus concorrentes que tivessem um interesse além do mercado alemão, reduzindo assim a sua incerteza quanto à estratégia de preços da Scania fora da Alemanha. Além disso, a Scania DE não tinha dado aos seus concorrentes a «impressão» de fornecer informações com interesse para todo o EEE.

404    Estes dois grupos de argumentos são adiante examinados.

1)      Quanto ao alcance geográfico das informações obtidas pela Scania DE

405    Em primeiro lugar, resulta dos autos que os fabricantes de camiões começaram a aplicar progressivamente tabelas europeias de preços brutos a partir de 2000 e que, em 2006, a maioria dos fabricantes dispunha dessas tabelas, a saber, [confidencial], [confidencial], [confidencial], [confidencial] e [confidencial]. O Tribunal Geral conclui que esse era também o caso da Scania, como se explicará nos n.os 426 a 428, infra. Apenas [confidencial] não tinha tabela europeia de preços brutos.

406    Importa também salientar que as recorrentes não põem em causa, no que respeita às outras partes, a conclusão da Comissão, nos considerandos 51 e 52 da decisão impugnada, de que as tabelas europeias dos preços brutos são estabelecidas na sede dos fabricantes e de que os aumentos de preços indicados nessas tabelas influenciam o nível dos preços ao nível dos distribuidores e dos concessionários.

407    Em segundo lugar, os autos do presente processo contêm elementos de prova que sugerem que os concorrentes tinham um conhecimento, mais ou menos preciso, da existência dessas tabelas. Assim, resulta de uma apresentação interna do [confidencial] de 30 de março de 2006, apresentada no considerando 151 da decisão impugnada, que este fabricante dispunha das informações relativas aos aumentos dos preços dos concorrentes, retiradas das tabelas europeias de preços brutos de [confidencial], de [confidencial], da Scania e de [confidencial], da tabela italiana de preços [confidencial] e da tabela alemã de preços de [confidencial]. Do mesmo modo, como resulta do considerando 160 da decisão impugnada, segundo um inquérito sobre a «estrutura dos preços» levado a cabo por trabalhadores dos concorrentes com sede em Espanha cujos resultados estavam indicados num quadro, [confidencial], [confidencial], [confidencial], [confidencial] e [confidencial] tinham «preços comuns» na União, ao passo que [confidencial] e a Scania não tinham. O quadro com os resultados do inquérito era comunicado aos trabalhadores dos concorrentes estabelecidos em Espanha, entre os quais os trabalhadores da Scania Espanha.

408    Quanto à invocação pelas recorrentes de uma apresentação interna de [confidencial] de abril de 2008, que podia sugerir que esta empresa não pensava, em 2008, que os seus concorrentes utilizavam tabelas europeias de preços brutos, o Tribunal Geral não a considera determinante no âmbito da apreciação global que faz dos elementos de prova. Aliás, esta empresa afirmou, em 2010, no âmbito do seu pedido de imunidade, que dispunha de uma tabela europeia de preços brutos e que «esse também podia ser o caso dos concorrentes», sugerindo assim à Comissão que o alcance geográfico das interações podia ser europeu.

409    Em terceiro lugar, alguns fabricantes que dispunham das tabelas europeias dos preços brutos ([confidencial]) esclareceram, no procedimento administrativo, que os aumentos de preços que comunicavam ao nível alemão eram, no essencial, os aumentos aplicados às referidas tabelas europeias, na medida em que essas tabelas tinham substituído as tabelas nacionais. O Tribunal Geral refere‑se, a este respeito, às respostas de [confidencial], de [confidencial] e de [confidencial] ao pedido de informações da Comissão, de 27 de novembro de 2012, anexas à contestação, e à resposta de [confidencial] ao pedido de informações da Comissão, de 19 de setembro de 2013, apresentada por esta na sequência da medida de instrução adotada pelo Tribunal Geral (v. n.o 75, supra). Resulta desses elementos de prova que o alcance das informações anticoncorrenciais dadas, pelo menos, por alguns dos concorrentes da Scania durante as interações ao nível alemão, nas quais é pacífico que participavam trabalhadores da Scania DE, excedia o mercado alemão.

410    Em quarto lugar, como é referido no considerando 327, alínea c), da decisão impugnada, resulta dos autos que, em várias ocasiões, os trabalhadores dos fabricantes que participavam nas trocas de informações ao nível alemão comunicavam essas informações à sede, o que constitui um elemento adicional que demonstra que o alcance dessas trocas excedia o mercado alemão (v. considerando 213 da decisão impugnada que remete para exemplos de comunicação à sede de informações trocadas ao nível alemão). A este respeito, há que referir, nomeadamente, o conteúdo do considerando 175 da decisão impugnada, que demonstra não só a comunicação à sede da [confidencial] da informação trocada ao nível alemão, mas também corrobora a tese da Comissão, exposta no considerando 388 da decisão impugnada, de que as informações trocadas ao nível alemão, relativas aos aumentos dos preços brutos, ajudavam os fabricantes a compreender a estratégia de preços dos seus concorrentes a nível europeu. Assim, segundo a prova documental que consta do considerando 175 da decisão impugnada, o administrador da [confidencial] na sede da sociedade escreveu aos seus colegas a propósito da informação trocada ao nível alemão: «Pela presente, quero partilhar convosco um resumo do mercado alemão relativo aos prazos de fabrico e aos aumentos de preços nos concorrentes […] Pelo menos a estratégia de preços alinha‑se fortemente com a abordagem global europeia dos concorrentes».

411    Do mesmo modo, o facto, demonstrado no âmbito do exame do terceiro fundamento, segundo o qual os trabalhadores ao nível inferior da sede estavam ao corrente das trocas de informações sobre preços ao nível alemão (v. n.os 221 a 229, supra), corrobora a tese da Comissão relativa ao alcance geográfico das interações ao nível alemão.

412    Em quinto lugar, resulta dos autos que, como a Comissão observa no considerando 327, alínea b), da decisão impugnada, tendo em conta o facto de as filiais alemãs das participantes não fabricarem camiões e não terem que desenvolver tecnologias, uma vez que essas responsabilidades são da competência exclusiva da sede, se podia considerar que a informação trocada ao nível alemão sobre o calendário e os custos adicionais relativos à conformidade com as normas Euro 5 e Euro 6 provinha da sede e abrangia todo o EEE.

413    A conclusão do n.o 412, supra, é ilustrada pela prova documental apresentada no considerando 148 da decisão impugnada respeitante à Scania. Numa mensagem de correio eletrónico de 26 de julho de 2005, I, trabalhador da Scania DE, participante nas interações ao nível alemão, forneceu a E, da sede de [confidencial], informações sobre a data da apresentação pela Scania de toda a sua gama de motores conformes com a norma Euro 4 e sobre a comercialização dos modelos de camiões conformes com a norma Euro 5, esclarecendo que teria conhecimento das datas exatas e dos preços «após as férias [do pessoal] da fábrica de Södertälje [Suécia]». Na medida em que a Södertälje é a cidade onde a Scania tem a sede, este esclarecimento dado pelo trabalhador da Scania DE ao trabalhador de [confidencial], permite inferir que as informações a que o trabalhador da Scania DE se referia provinham da sede e tinham, portanto, um alcance que excedia o mercado alemão. A prova documental apresentada no considerando 148 da decisão impugnada também demonstra a influência da sede da Scania no estabelecimento dos preços aplicados ao mercado alemão, problemática que é abordada nos n.os 422 a 438, infra.

414    Tendo em conta as considerações que constam dos n.os 405 a 413, supra, consideradas em conjunto, há que concluir que o alcance das informações obtidas pela Scania DE nas interações ao nível alemão excedia o mercado alemão.

415    A este respeito, a alegação das recorrentes de que os trabalhadores da Scania DE que participaram nas interações ao nível alemão nunca supuseram que as informações recebidas dos representantes das filiais de outros fabricantes de camiões se referiam a preços europeus ou que podiam reduzir a incerteza quanto à estratégia de preços europeia dos outros fabricantes não convence o Tribunal Geral.

416    Primeiro, há que recordar que os autos do presente processo contêm elementos de prova que sugerem que a utilização das tabelas europeias de preços brutos pela maioria dos fabricantes não constituía um segredo (v. n.o 407, supra). Por conseguinte, é perfeitamente possível pressupor que os trabalhadores da Scania DE e da sede na Suécia conheciam a existência dessas tabelas e podiam, portanto, deduzir a estratégia de preços dos seus concorrentes com base nas informações obtidas ao nível alemão, por exemplo, com base nas informações relativas a aumentos dos preços brutos, que eram aplicados às tabelas europeias de preços dos concorrentes (v. n.o 409, supra).

417    Segundo, o Tribunal Geral não ficou convencido com a alegação das recorrentes de que a Scania DE, contrariamente aos outros participantes nas interações ao nível alemão, nunca transmitiu à sua sede as informações recebidas ao nível alemão. É certo que os autos não contêm prova de que essa transmissão ocorreu efetivamente. Dito isto, resulta da prova documental apresentada no considerando 166 da decisão impugnada que I da Scania DE, organizador e participante numa reunião ao nível alemão realizada em Coblença (Alemanha) em 12 e 13 de maio de 2008, transmitiu aos seus colegas da Scania DE informações relativas a aumentos de preços, trocadas nessa reunião, embora esclarecendo que essas informações «ainda» não tinham sido enviadas para a sede na Suécia. A utilização do termo «ainda» sugere que a intenção do referido trabalhador da Scania DE era comunicar a informação à sede e que essa comunicação à sede não tinha um caráter excecional.

418    Em todo o caso, o facto de os autos conterem elementos de prova que demonstram que os trabalhadores ao nível inferior da sede estavam ao corrente da troca de informações sobre preços anticoncorrenciais ao nível alemão (v. n.o 228, supra) e que as reuniões aos dois níveis se realizavam frequentemente na mesma data e no mesmo local torna não determinante a falta de prova direta da transmissão à sede da Scania de informações trocadas ao nível alemão pelos trabalhadores da Scania DE. Com efeito, tendo em conta os dois elementos acima referidos, pode inferir‑se que a sede da Scania conhecia o conteúdo dessas informações.

419    Terceiro, importa observar que trabalhadores da sede de determinados fabricantes também participavam nas interações ao nível alemão. Assim sucedia, frequentemente, com [confidencial]. Por outro lado, numa mensagem de correio eletrónico de 11 de novembro de 2004, apresentada no considerando 139 da decisão impugnada, que enviou da sede de [confidencial] e dirigiu a trabalhadores dos concorrentes pertencentes tanto à sede como ao nível alemão, entre os quais A da sede da Scania e B da Scania DE, C apresentou dois novos trabalhadores da sede de [confidencial] que seriam responsáveis pela tabela central de preços desse fabricante. Estes elementos relativos à participação dos trabalhadores da sede nas interações que tinham lugar ao nível alemão constituem um indício de que os trabalhadores da Scania DE não podiam desconhecer que as informações trocadas ao nível alemão tinham interesse para a estratégia de preços dos concorrentes a nível europeu.

420    Quarto, tendo em conta os elementos probatórios acima expostos, as declarações, sob juramento, dos trabalhadores da Scania DE que participaram nas interações ao nível alemão e apoiaram a alegação apresentada no n.o 415, supra, não convencem o Tribunal Geral. De resto, pelas razões expostas no n.o 281, supra, essas declarações, prestadas após o termo da infração e com a finalidade específica de apoiar a posição da Scania, têm um valor probatório limitado.

421    Com fundamento nos elementos anteriores, apreciados globalmente (v. n.o 198, supra), há que concluir que a Scania DE, através da participação dos seus trabalhadores em trocas de informações ao nível alemão, obtinha informações que tinham um alcance que excedia o mercado alemão. Com base nesta conclusão, o presente fundamento deve ser julgado improcedente, independentemente da questão de saber se a Scania DE também prestava informações que excediam o mercado alemão (v., neste sentido e por analogia, Acórdão de 12 de julho de 2001, Tate & Lyle e o./Comissão, T‑202/98, T‑204/98 e T‑207/98, EU:T:2001:185, n.o 58). Assim sendo, o Tribunal Geral considera oportuno examinar esta última questão para efeitos da apreciação da gravidade da violação do artigo 101.o, n.o 1, TFUE, cometida pela Scania e, sendo caso disso, da determinação do montante da coima (v., neste sentido, Acórdão de 6 de dezembro de 2012, Comissão/Verhuizingen Coppens, C‑441/11 P, EU:C:2012:778, n.o 45 e jurisprudência referida).

2)      Quanto ao alcance geográfico das informações prestadas pela Scania DE

422    Importa recordar que a Comissão, no considerando 388 da decisão impugnada, considerou que, na sequência da introdução das tabelas europeias de preços brutos, os fabricantes de camiões eram capazes de compreender a estratégia europeia de preços dos seus concorrentes trocando informações relativas aos aumentos dos preços brutos aplicados ao mercado alemão, na medida em que esses aumentos refletiam aumentos aplicados pelas sedes dos fabricantes nas suas tabelas europeias dos preços brutos.

423    As recorrentes alegam, em substância, que as informações sobre as tabelas de preços brutos prestadas nas interações ao nível alemão não refletiam os preços da Scania à escala europeia e, portanto, não contribuíam para reduzir a incerteza dos concorrentes da Scania relativamente à sua estratégia de preços fora da Alemanha.

424    A este respeito, as recorrentes precisam que não é exato considerar que a FGPL constitui uma tabela de preços brutos à escala do EEE e que serve de base às negociações realizadas no âmbito do processo de fixação de preços. Em apoio da sua alegação, as recorrentes invocam o relatório económico de 9 de dezembro de 2017 que demonstra que não existe qualquer correlação entre a FGPL e o preço bruto distribuidores‑concessionários na Alemanha. As recorrentes explicam que a FGPL constitui um instrumento de referência interno que a sede da Scania utiliza para acompanhar o nível geral dos preços das diferentes peças de um camião no processo de fabrico da Scania. Apesar do seu nome, a FGPL não constitui uma «tabela de preços», uma vez que não fixa o preço de transferência das peças em qualquer nível da rede de distribuição. As recorrentes esclarecem que as negociações, baseadas na igualdade, entre os distribuidores e a sede são feitas com base em tabelas de preços líquidos fábrica‑distribuidores de cada país e que são essas tabelas que são negociadas sempre que as condições de mercado justifiquem um aumento ou uma redução dos preços. Em apoio da sua argumentação relativa à natureza da FGPL, as recorrentes apresentaram declarações sob juramento dos trabalhadores da sede da Scania e da Scania DE. Em apoio da sua alegação relativa ao facto de as negociações entre os distribuidores Scania e a sede serem conduzidas em pé de igualdade e serem equivalentes a negociações entre partes que agem como parceiros comerciais independentes e centros de custo concorrentes, as recorrentes invocam um relatório interno da Scania, feito em 2010, o «Masterfile da Scania sobre os preços de transferência».

425    A argumentação das recorrentes, apresentada no n.o 424, supra, revela uma divergência entre a descrição do sistema de fixação de preços da Scania que foi facultada no âmbito das respostas a pedidos de informações enviados pela Comissão durante o procedimento administrativo e a descrição desse sistema que foi apresentada na resposta à comunicação de objeções e no Tribunal Geral.

426    A descrição do sistema de fixação de preços da Scania na decisão impugnada (v. n.os 23 a 31, supra) baseou‑se nas informações prestadas pela Scania no âmbito das respostas, nomeadamente de 16 de abril e 5 de julho de 2012, a pedidos de informações enviados pela Comissão. O gráfico que consta do considerando 50 da decisão impugnada (v. n.o 31, supra), que revela a influência da FGPL sobre os preços aplicados nas diferentes etapas da cadeia de distribuição, também foi feito pela Scania no âmbito das respostas supramencionadas. Do mesmo modo, no âmbito da resposta de 5 de julho de 2012, a Scania tinha descrito, nomeadamente, o papel do comité de preços e do vice‑presidente executivo de vendas [confidencial].

427    Em contrapartida, a argumentação apresentada no n.o 424, supra, reflete a posição da Scania exposta in tempore suspecto, a saber, na sua resposta à comunicação de objeções e no Tribunal Geral.

428    Nestas circunstâncias, o Tribunal Geral, à semelhança da Comissão, considera que deve ser atribuída maior força probatória às respostas das recorrentes aos pedidos de informações, enviados pela Comissão nos termos do artigo 18.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003, do que às explicações dadas pelas recorrentes posteriormente, em resposta à comunicação de objeções. Em conformidade com o artigo 23.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1/2003, podem ser aplicadas às empresas que forneçam informações inexatas ou deturpadas em resposta a um pedido de informações apresentado nos termos do artigo 18.o, n.o 2, do referido regulamento, coimas até 1 % do volume de negócios total anual.

429    Por outro lado, há que observar que as recorrentes não apresentaram qualquer documento que corroborasse a sua argumentação relativa à natureza da FGPL. Como a Comissão refere no considerando 299, alínea a), da decisão impugnada, era lógico esperar que a Scania estivesse em condições de fornecer documentação que corroborasse a sua análise da FGPL. A Scania não o fez e limitou‑se a apresentar declarações sob juramento de alguns dos seus trabalhadores, que têm força probatória limitada e não convencem o Tribunal Geral (v. n.o 420, supra).

430    Em relação à inovação pelas recorrentes do relatório económico de 9 de dezembro de 2017 que demonstra a inexistência de uma correlação entre a FGPL e os preços brutos distribuidores‑concessionários na Alemanha (v. n.o 424, supra), o referido relatório constata que as alterações específicas na FGPL não são acompanhadas de alterações idênticas no preço bruto distribuidores‑concessionários aplicado na Alemanha. Ora, há que observar que a análise da Comissão na decisão impugnada não se baseia nessa correlação, uma vez que esta não apoiou de modo nenhum que um aumento dos preços na FGPL conduzia a um aumento idêntico do preço bruto distribuidor‑concessionário na Alemanha. Na decisão impugnada, a Comissão considerou que um aumento dos preços que figurava na FGPL influenciava o preço líquido para o distribuidor (isto é, o preço que o distribuidor paga à sede) e o preço bruto do distribuidor (ou seja, o preço que o concessionário paga ao distribuidor), ainda que o preço ao consumidor final não seja necessariamente alterado na mesma proporção ou não seja de todo alterado (considerando 52 da decisão impugnada). Verifica‑se, assim, que a decisão impugnada não se baseia na correlação evocada no relatório económico de 9 de dezembro de 2017.

431    Resulta dos n.os 423 a 430, supra, que a tese da Comissão de que a FGPL constitui uma tabela europeia de preços brutos que influencia a fixação de preços dos camiões ao nível dos distribuidores nacionais (e, portanto, ao nível da Scania DE) está suficientemente demonstrada.

432    A título mais geral, os elementos de prova que constam dos autos demonstram que os distribuidores nacionais da Scania (e, portanto, a Scania DE) não são independentes da sede na determinação da sua política de preços para com os concessionários.

433    A este respeito, primeiro, há que ter em conta o facto de a FGPL estar estabelecida ao nível da sede. Resulta do gráfico apresentado no n.o 31, supra, que a FGPL constitui uma componente importante da fixação de preços, na medida em que todos os preços aplicados nas fases a jusante da cadeia de distribuição da Scania decorrem dessa FGPL e dos descontos e margens de lucro de que beneficiam os diferentes operadores.

434    Segundo, há que ter em conta o facto de os distribuidores da Scania constituírem, na sua grande maioria, filiais controladas a 100 % pela sede (v. n.o 20, supra), o que era, de resto, o caso da Scania DE. Tendo em conta esta circunstância, o Tribunal Geral não está convencido da alegação das recorrentes de que as negociações de preços entre os referidos distribuidores e a sede constituíam negociações entre partes que atuavam como parceiros comerciais independentes e centros de custo concorrentes.

435    A este propósito, importa observar que os elementos de prova apresentados nos considerandos 249 e 250 da decisão impugnada, consistem em documentos internos do comité de preços (v. n.o 24, supra), que demonstram que este órgão (dependente da sede da Scania) detinha uma posição de força quanto à determinação do nível dos descontos aplicados aos distribuidores nacionais. Apoiando‑se numa declaração sob juramento de um membro do comité de preços, as recorrentes limitam‑se a alegar que os documentos internos mencionados supra se referiam a um evento excecional, a saber, o lançamento de um novo motor, altamente estratégico para a Scania, e não refletiam uma situação habitual. Ora, essa declaração sob juramento não tem valor probatório suficiente para pôr em causa o valor probatório e o conteúdo claro dos elementos de prova apresentados nos considerandos 249 e 250 da decisão impugnada e não convence o Tribunal Geral.

436    Por outro lado, no que se refere à invocação pela Scania do seu «Masterfile sobre os preços de transferência» de 2010 (v. n.o 424, supra), importa observar que este documento tem por objetivo demonstrar o respeito do princípio da plena concorrência (arm’s length principle), por parte da Scania, na fixação dos preços de transferência intragrupo (por exemplo, na fixação dos preços líquidos para os distribuidores), em caso de fiscalização tributária. Ora, à semelhança da Comissão (v. considerando 296 da decisão impugnada), o Tribunal Geral considera que o facto de a sede da Scania aplicar preços de transferência que respeitam o princípio da plena concorrência não demonstra a independência dos distribuidores da Scania nas negociações de preços, mas demonstra antes que esses preços de transferência são fixados a níveis que permitem que os referidos preços não sejam contestados pelas autoridades fiscais competentes.

437    Terceiro, a circunstância de a Scania DE não ser independente na determinação da sua política de preços é ilustrada pela prova documental apresentada no considerando 148 da decisão impugnada (v. n.o 413, supra). Também é ilustrada pelas provas documentais apresentadas nos considerandos 134 e 135 da decisão impugnada, que revelam a coerência das informações sobre os aumentos dos preços brutos fornecidos aos concorrentes, respetivamente, pelos trabalhadores da Scania DE e pelos trabalhadores da Scania ao nível dos órgãos dirigentes. Assim, resulta da prova documental apresentada no considerando 134 da decisão impugnada que, na reunião de 3 e 4 de maio de 2004, ao nível alemão, o trabalhador da Scania DE informou os concorrentes de que os preços da nova série [confidencial] de camiões seriam em média 6 % mais elevados que os da atual série [confidencial]. Ora, resulta da prova documental apresentada no considerando 135 da decisão impugnada que o representante da Scania que participou na reunião de 27 e 28 de maio de 2004, ao nível dos órgãos dirigentes, informou os concorrentes de que os preços da série [confidencial] de camiões seriam entre 5 e 6 % mais elevados do que os preços da série [confidencial]. Esta coerência das informações dadas nas interações aos dois níveis dos contactos colusórios acima referidos é suscetível de demonstrar, também ela, o facto de as informações fornecidas pelos trabalhadores da Scania DE durante as interações ao nível alemão terem um alcance que excedia o mercado alemão.

438    Tendo em conta o papel desempenhado pela sede da Scania na determinação da política de preços da Scania DE, como demonstrado nos n.os 433 a 437, supra, a Comissão podia considerar que as informações tarifárias anticoncorrenciais fornecidas pelos trabalhadores da Scania DE aos concorrentes nas interações ao nível alemão refletiam uma estratégia de preços estabelecida ao nível da sede da Scania e tinham, portanto, um alcance que excedia o mercado alemão.

439    Esta conclusão do Tribunal Geral não é posta em causa pelo conteúdo dos relatórios económicos de 20 de setembro de 2016 e de 9 de dezembro de 2017, invocados pelas recorrentes.

440    Segundo as recorrentes, os dois relatórios económicos referidos supra demonstram que os preços brutos distribuidores‑concessionários da Scania DE não são representativos dos preços praticados noutros países europeus e, por essa razão, não podem reduzir a incerteza quanto à estratégia de preços da Scania no EEE. Ora, há que concluir que, relativamente à Scania, a decisão impugnada não se baseia na tese de que havia um qualquer paralelismo entre os preços brutos distribuidores‑concessionários aplicados aos diferentes países europeus, na medida em que, como resulta do gráfico apresentado no n.o 31, supra, o preço bruto do distribuidor nacional é determinado em função dos descontos aplicados à FGPL e da sua margem de lucro. A decisão impugnada baseia‑se na consideração de que qualquer aumento aplicado à FGPL e, por conseguinte, decidido pela sede, influencia, em graus diferentes (em função dos descontos aplicados), o preço bruto do distribuidor nacional (v. considerandos 51 e 52 da decisão impugnada).

441    Em todo o caso, contrariamente às alegações das recorrentes, o Tribunal Geral considera que os autos demonstram de forma bastante que, independentemente do real alcance geográfico das informações prestadas pela Scania DE, esta dava a impressão aos seus concorrentes de que as informações que lhes fornecia tinham um alcance e um interesse que excediam o mercado alemão, contribuindo assim para os objetivos comuns prosseguidos através de uma troca de informações anticoncorrenciais ao nível alemão.

442    A este respeito, o Tribunal Geral refere‑se à interação apresentada no considerando 148 da decisão impugnada (v. n.o 413, supra). Com efeito, tendo em conta a insinuação do trabalhador da Scania DE de que a informação sobre as datas de comercialização dos modelos de camiões e sobre os preços, que ia comunicar ao trabalhador da [confidencial], provinha da sede da Scania, é razoável inferir que o referido trabalhador de [confidencial] tenha percecionado essa informação no sentido de que tinha um interesse que excedia o mercado alemão. Importa também que se refira a mensagem de correio eletrónico de 28 de outubro de 2009, apresentada no considerando 185 da decisão impugnada, que demonstra que a sede de [confidencial] tinha recebido uma informação da Scania, durante as interações ao nível alemão, segundo a qual estava planeado um aumento de 3 % dos preços de 3 % para entrar em vigor em 1 de janeiro de 2010, estando esse aumento ligado a um «facelift» dos camiões. Assim, na medida em que o aumento dos preços revelado pela Scania ao seu concorrente estava ligado a um custo de produção dos camiões e na medida em que a Scania DE não fabricava camiões, pode‑se inferir que [confidencial] tinha percebido a informação referida supra relativa ao aumento dos preços como tendo um alcance que excedia o mercado alemão.

443    Com base em todas as considerações anteriores, o sexto fundamento deve ser julgado improcedente.

f)      Quanto ao sétimo fundamento, relativo a uma aplicação errada do artigo 101.o TFUE e do artigo 53.o do Acordo EEE na medida em que a Comissão considerou que o comportamento identificado constituía uma infração única e continuada e que as recorrentes eram responsáveis a esse respeito

444    Há que recordar que a Comissão considerou que os acordos e/ou práticas concertadas entre a Scania e as partes na transação constituíam uma infração única e continuada entre 17 de janeiro de 1997 e 18 de janeiro de 2011. Considerou que a infração consistiu numa colusão relativa aos preços e aos aumentos de preços brutos para os camiões médios e pesados no EEE e ao calendário e à repercussão dos custos relativos à comercialização das tecnologias em matéria de emissões para os camiões médios e pesados, exigidas pelas normas Euro 3 a Euro 6 (considerando 315 da decisão impugnada).

445    Mais especificamente, a Comissão considerou que, através dos contactos anticoncorrenciais, as partes prosseguiram um plano comum com um objetivo anticoncorrencial único e que a Scania tinha conhecimento ou devia ter conhecimento do âmbito de aplicação geral e das características essenciais da rede de contactos colusórios e tinha a intenção de contribuir para o cartel através das suas ações, pelo que podia ser considerada responsável pela infração no seu conjunto (considerandos 316 e 350 da decisão impugnada).

446    As recorrentes contestam, em substância, a existência de uma infração única e continuada no caso em apreço e a imputação dessa infração no seu conjunto às recorrentes.

1)      Quanto à existência, no caso em apreço, de uma infração única e continuada

i)      Observações preliminares

447    Importa recordar que, para provar a existência de uma infração única e continuada, a Comissão deve demonstrar que os diferentes comportamentos em causa fazem parte de um «plano de conjunto» que dispõe de um objetivo único (v. n.o 196, supra).

448    A jurisprudência identificou vários critérios relevantes para apreciar o caráter único de uma infração, a saber, a identidade dos objetivos das práticas em causa, a identidade dos produtos e dos serviços em causa, a identidade das empresas participantes e a identidade das formas de execução (v. Acórdão de 17 de maio de 2013, Trelleborg Industrie e Trelleborg/Comissão, T‑147/09 e T‑148/09, EU:T:2013:259, n.o 60 e jurisprudência referida; v. também, neste sentido, Acórdão de 19 de dezembro de 2013, Siemens e o./Comissão, C‑239/11 P, C‑489/11 P e C‑498/11 P, não publicado, EU:C:2013:866, n.o 243). Além disso, a identidade das pessoas singulares envolvidas por conta das empresas e a identidade do âmbito de aplicação geográfico das práticas em causa também são elementos que podem ser tomados em conta para efeitos dessa análise (Acórdão de 17 de maio de 2013, Trelleborg Industrie e Trelleborg/Comissão, T‑147/09 e T‑148/09, EU:T:2013:259, n.o 60).

449    Importa também esclarecer que o conceito de objetivo único não pode ser determinado pela referência geral à distorção da concorrência no mercado abrangido pela infração, uma vez que o impacto sobre a concorrência constitui, enquanto objeto ou efeito, um elemento consubstancial a qualquer comportamento abrangido pelo âmbito de aplicação do artigo 101.o, n.o 1, TFUE. Essa definição do conceito de objetivo único pode retirar ao conceito de infração única e continuada uma parte do seu sentido, na medida em que pode ter por consequência que vários comportamentos relativos a um setor económico proibidos pela disposição supramencionado devam ser sistematicamente qualificados como elementos constitutivos de uma infração única (Acórdão de 12 de dezembro de 2007, BASF e UCB/Comissão, T‑101/05 e T‑111/05, EU:T:2007:380, n.o 180).

450    Por outro lado, como já se observou (v. n.o 195, supra), o requisito relativo ao conceito de objetivo único implica que se deve verificar se não existem elementos que caracterizem os diferentes comportamentos que fazem parte da infração que sejam suscetíveis de indicar que os comportamentos materialmente praticados por outras empresas participantes não partilham o mesmo objeto ou o mesmo efeito anticoncorrencial e que, por conseguinte, não se inscrevem num «plano de conjunto» em razão do seu objeto idêntico que falseia o jogo da concorrência no mercado interno.

ii)    Decisão impugnada

451    Importa recordar que, na decisão impugnada, a Comissão considerou que os contactos colusórios aos três níveis, descritos no seu considerando 317, faziam parte de um plano de conjunto com um objetivo anticoncorrencial único pelas seguintes razões.

452    Em primeiro lugar, todos os contactos diziam respeito aos mesmos produtos, a saber, camiões médios e pesados (considerando 319 da decisão impugnada).

453    Em segundo lugar, a natureza das informações partilhadas — informações sobre os preços, os aumentos dos preços brutos, as datas previstas de lançamento de camiões que respeitam as novas normas ambientais e a intenção dos concorrentes de repercutirem os custos associados nos clientes — manteve‑se a mesma durante todo o período de duração da infração. A Comissão esclareceu que a natureza das conversações e dos acordos sobre o calendário e a comercialização dos novos modelos de camiões que eram conformes com determinadas normas ambientais estava ligada e era complementar à colusão relativa aos preços e aos aumentos dos preços brutos (considerando 321 da decisão impugnada).

454    Nesse mesmo contexto, a Comissão esclareceu que, embora, a partir de setembro de 2004, as partes já não tivessem procurado ativamente, como tinham feito anteriormente, celebrar um acordo específico sobre futuros aumentos comuns dos preços brutos ou sobre datas de lançamento específicas para os camiões conformes com as novas normas ambientais ou sobre o montante dos custos que as partes repercutiriam nos consumidores por esses camiões, continuaram a entender‑se trocando o mesmo tipo de informações e prosseguindo o mesmo objetivo de restringir a concorrência através da redução do nível de incerteza estratégica entre si (considerando 322 da decisão impugnada).

455    Em terceiro lugar, a Comissão salientou que os contactos anticoncorrenciais ocorreram com frequência e abrangiam o mesmo grupo de fabricantes de camiões, a saber, a Scania e as partes na transação. As pessoas implicadas nos contactos pertenciam aos mesmos fabricantes e organizavam as interações em pequenos grupos de trabalhadores nos fabricantes (considerando 323 da decisão impugnada).

456    Em quarto lugar, a Comissão considerou que, embora o nível e as responsabilidades internas dos trabalhadores envolvidos no comportamento tivessem evoluído ao longo do cartel, a natureza, o objetivo e o alcance dos contactos e das reuniões tinham permanecido idênticos durante todo o período de duração do cartel (considerando 325 da decisão impugnada). A este respeito, a Comissão explicou que os contactos colusórios que tiveram lugar aos três níveis tinham, todos, o objetivo anticoncorrencial de restringir a concorrência no mercado de camiões médios e pesados no EEE no que respeita aos preços futuros e aos aumentos de preços brutos, bem como ao calendário e à repercussão dos custos em relação à comercialização dos camiões conformes com as normas ambientais (considerando 326 da decisão impugnada).

457    No considerando 327 da decisão impugnada, a Comissão considerou três elementos de facto que corroboram a sua conclusão de que a deslocação das interações (the shift in the exchanges) do nível dos órgãos dirigentes para o nível alemão não tinha afetado a natureza continuada da infração.

458    Primeiro, a Comissão considerou que havia uma sobreposição temporal considerável entre as reuniões realizadas no âmbito dos diferentes níveis, dado que as reuniões dos órgãos dirigentes se realizaram entre 1997 e 2004; as reuniões ao nível inferior ao da sede tiveram lugar entre 2000 e 2008 e as conversações ao nível alemão realizaram‑se a partir de 2004. O resultado era, segundo a Comissão, que, apesar de as reuniões dos órgãos dirigentes não terem continuado após 16 de setembro de 2004, os contactos aos outros dois níveis tinham continuado sem interrupção [considerando 327, alínea a), da decisão impugnada]. Nesse contexto, a Comissão também considerou que, por um lado, durante o período compreendido entre 2003 e 2007, havia contactos entre os trabalhadores ao nível inferior da sede e os trabalhadores do nível alemão e eram organizadas reuniões comuns e, por outro, as partes conversavam repetidamente ao nível inferior da sede sobre informações que deviam ser trocadas e a que nível [considerando 327, alínea a), da decisão impugnada].

459    Segundo, a Comissão considerou que as filiais alemãs das partes não fabricavam camiões e não tinham que desenvolver tecnologias, uma vez que essas responsabilidades eram da competência exclusiva da sede. Por conseguinte, segundo a Comissão, sempre que os trabalhadores ao nível alemão trocavam informações sobre o calendário e os custos adicionais relativos à instalação das tecnologias conformes com as normas Euro 5 e Euro 6, trocavam informações provenientes da sede e respeitantes a todo o EEE [considerando 327, alínea b), da decisão impugnada].

460    Terceiro, a Comissão considerou que, em relação a diversos participantes no cartel, havia provas de que as filiais alemãs reportavam sistematicamente as suas intenções de preços à sede e, ainda mais importante, às pessoas ao nível da administração central implicadas no processo de troca de informações sobre os preços. Nesse contexto, a Comissão também salientou que a sede social da Scania tinha o poder de estabelecer os preços brutos de fábrica e os descontos aplicados aos distribuidores (que eram filiais detidas a 100 % pela sociedade‑mãe) e que a Scania dispunha de um esquema estruturado de reuniões para assegurar uma rápida execução das decisões estratégicas da sede, o que indicava que a sede da Scania não podia razoavelmente não ter estado ao corrente dessas informações.

461    A Comissão concluiu, no considerando 328 da decisão impugnada, que a alteração no cartel (the change in the cartel) tinha sido gerida coletiva e coordenadamente entre as diferentes partes, com o objetivo de assegurar a continuidade nas interações.

462    Em quinto lugar, segundo a Comissão, embora a maneira como as informações foram trocadas tenha naturalmente evoluído ao longo dos 14 anos que durou a infração, isso foi feito de forma progressiva e a natureza fundamental das interações manteve‑se a mesma: os contactos evoluíram de trocas multilaterais, reuniões ou apresentações pessoais para trocas multilaterais em correio eletrónico graças à compilação de informações sobre os preços futuros organizada por correio eletrónico e apresentadas numa folha de cálculo (considerando 329 da decisão impugnada).

463    Com fundamento nestes cinco elementos, a Comissão concluiu que os contactos colusórios estavam ligados entre si e eram complementares na sua natureza (considerando 330 da decisão impugnada).

iii) Apreciação

464    Em primeiro lugar, é pacífico que os contactos colusórios em causa diziam respeito, durante toda a sua duração, aos mesmos produtos, isto é, aos camiões médios e pesados, e eram efetuados pelo mesmo grupo de fabricantes de camiões, a saber, a Scania e as partes na transação. Por outro lado, os autos revelam que os contactos implicavam um pequeno grupo de trabalhadores em cada nível, cuja composição se mantinha relativamente estável, e tinham lugar de forma regular e frequente.

465    Em segundo lugar, importa recordar a existência de relações entre os três níveis dos contactos colusórios, a saber, que os participantes nesses níveis eram trabalhadores das mesmas empresas, isto é, da Scania e das partes na transação, que as trocas em cada um dos níveis tinham o mesmo conteúdo, que havia uma sobreposição temporal entre as reuniões realizadas aos diferentes níveis, que os níveis se referiam uns aos outros e trocavam informações recolhidas e que havia contactos comuns entre os níveis (v. n.o 218, supra). Importa também recordar que as recorrentes não conseguiram, no âmbito do terceiro fundamento, pôr em causa as conclusões da Comissão relativas à existência das relações entre os três níveis dos contactos colusórios (v. n.o 229, supra).

466    Em terceiro lugar o Tribunal Geral conclui, à semelhança da Comissão (v. n.os 453 e 454, supra), que o conteúdo das interações entre as partes e o objetivo dessas interações, que era reduzir a incerteza entre as partes no que respeita, em substância, às suas futuras estratégias de preços, se mantiveram os mesmos. Nesse contexto, recorde‑se que o Tribunal Geral considerou que a Comissão podia legitimamente salientar, nos considerandos 243 e 321 da decisão impugnada, que a natureza das conversações e dos acordos sobre o calendário de comercialização dos novos modelos de camiões conformes com certas normas ambientais estava relacionado e era complementar das práticas colusórias relativas aos preços e aos aumentos dos preços brutos (v. n.o 297, supra).

467    Em quarto lugar, importa recordar que a Comissão podia legitimamente considerar que o alcance geográfico das interações anticoncorrenciais ao nível alemão se estendia a todo o EEE, à semelhança das interações anticoncorrenciais ao nível dos órgãos dirigentes.

468    Com base nos elementos supramencionados, há que confirmar a conclusão da Comissão de que as interações entre as partes, descritas no considerando 317 da decisão impugnada, faziam parte de um plano de conjunto com um objetivo anticoncorrencial único.

469    A argumentação das recorrentes não põe em causa a conclusão do Tribunal Geral. Esta argumentação pode dividir‑se em três grupos. Primeiro, as recorrentes alegam que a Comissão cometeu um erro ao avaliar em conjunto os três níveis de contactos entre as partes. Segundo, contestam a conclusão da Comissão de que as informações trocadas nos três níveis dos contactos eram da mesma natureza, como resulta do considerando 320 da decisão impugnada. Terceiro, as recorrentes contestam a consideração da Comissão, no considerando 327 da decisão impugnada, de que a «deslocação» das interações do nível dos órgãos dirigentes ao nível alemão não afetou a natureza continuada da infração.

–       Quanto à avaliação de conjunto dos três níveis dos contactos

470    Para contestar a existência de um plano de conjunto no caso em apreço, as recorrentes alegam, em substância, que, contrariamente à abordagem seguida pela Comissão na decisão impugnada, os três níveis dos contactos deviam ser avaliados separadamente e não em conjunto.

471    Para justificar esta tese, em primeiro lugar, as recorrentes alegam que a Comissão não estabeleceu nenhuma relação factual pertinente entre os três níveis dos contactos colusórios. Pelas razões evocadas no n.o 465, supra, esta objeção deve ser julgada improcedente.

472    Em segundo lugar, as recorrentes alegam que o alcance da infração deve ser determinado com base em elementos factuais diretamente relacionados com os trabalhadores que participaram no alegado comportamento colusório. Ora, alegam que a Comissão não demonstrou que os trabalhadores das empresas que participaram nos contactos colusórios aos diferentes níveis tinham um conhecimento e uma compreensão comum do alcance do comportamento colusório. Nesse contexto, as recorrentes salientam que diferentes trabalhadores representavam as empresas nos diferentes níveis dos contactos.

473    A este respeito, há que recordar que os contactos colusórios em causa foram efetuados, durante toda a sua duração, pelo mesmo grupo de fabricantes de camiões, a saber, a Scania e as partes na transação. Por outro lado, esses contactos envolviam um pequeno grupo de trabalhadores em cada nível, cuja composição se mantinha relativamente estável, e tinham lugar de forma regular e frequente. Importa também recordar as relações entre os três níveis de contactos colusórios. Tendo em conta estes elementos, a circunstância de não participarem os mesmos trabalhadores nos contactos colusórios não põe em causa a conclusão relativa à existência de um plano comum no caso em apreço.

474    No que respeita à alegação das recorrentes, apresentada no n.o 472, supra, de que a Comissão não demonstrou que os trabalhadores das empresas que participaram nos contactos colusórios aos diferentes níveis tinham um conhecimento e uma compreensão comum do alcance do comportamento colusório, esta alegação refere‑se à questão de saber se a tomada de consciência do plano de conjunto deve ser apreciada ao nível da empresa ou ao nível dos trabalhadores da empresa. As recorrentes acusam a Comissão de ter apreciado esta tomada de consciência ao nível da empresa e de não ter examinado a tomada de consciência ao nível dos trabalhadores.

475    Esta objeção das recorrentes não procede.

476    Com efeito, importa observar que o direito da concorrência da União visa as atividades das «empresas» e que este conceito deve ser entendido como designando uma unidade económica, mesmo que, do ponto de vista jurídico, essa unidade económica seja constituída por várias pessoas singulares ou coletivas (v. Acórdão de 10 de setembro de 2009, Akzo Nobel e o./Comissão, C‑97/08 P, EU:C:2009:536, n.os 54 e 55 e jurisprudência referida).

477    Importa referir também que, em relação à questão da imputabilidade às empresas dos atos ilícitos dos seus trabalhadores, resulta da jurisprudência que o poder que a Comissão tem para aplicar sanções a uma empresa só pressupõe a atuação de uma pessoa que está, geralmente, autorizada a agir por conta da empresa (v. Acórdão de 12 de dezembro de 2014, H & R ChemPharm/Comissão, T‑551/08, EU:T:2014:1081, n.o 73 e jurisprudência referida).

478    Resulta da jurisprudência referida nos n.os 476 e 477, supra, que a questão da tomada de consciência da existência de um plano de conjunto deve ser forçosamente apreciada ao nível das empresas implicadas e não ao nível dos seus trabalhadores. Como acertadamente refere a Comissão, se estivesse obrigada a provar que cada um dos trabalhadores da mesma empresa que participou no cartel tinha um conhecimento preciso do comportamento dos outros trabalhadores no cartel, tornar‑se‑ia impossível demonstrar a existência de uma infração única e continuada, tanto mais que os cartéis são geralmente clandestinos por natureza e que as provas são frequentemente fragmentárias e esparsas nos processos de cartel (v., neste sentido, Acórdão de 13 de julho de 2011, Trade‑Stomil/Comissão, T‑53/07, EU:T:2011:360, n.o 64 e jurisprudência referida). No caso em apreço, devido à existência de relações entre os três níveis dos contactos colusórios e, nomeadamente, ao facto de as pessoas singulares que participaram nos três níveis dos contactos colusórios serem trabalhadores das mesmas empresas, pode‑se inferir que essas empresas tinham um conhecimento e uma compreensão comum do plano de conjunto e, portanto, do comportamento ilícito.

479    Resulta do que precede que a alegação das recorrentes de que a Comissão devia avaliar separadamente os três níveis dos contactos colusórios deve ser jugada improcedente.

–       Quanto à natureza das informações trocadas no âmbito dos três níveis dos contactos

480    As recorrentes contestam a consideração, expressa nomeadamente nos considerandos 320 e 322 da decisão impugnada, de que as informações trocadas aos diferentes níveis dos contactos eram da mesma natureza e prosseguiam o mesmo objetivo anticoncorrencial.

481    A este respeito, em primeiro lugar, as recorrentes invocam o considerando 322 da decisão impugnada, que revela uma alteração fundamental na natureza dos contactos, na medida em que enuncia que, a partir de setembro de 2004, as partes deixaram de procurar ativamente um acordo preciso sobre futuros aumentos de preços brutos, como tinham feito até essa data.

482    Este argumento das recorrentes não pode proceder. É certo que o considerando 322 da decisão impugnada refere que, após setembro de 2004, as partes deixaram de procurar celebrar acordos explícitos, limitando‑se, em substância, a trocar informações com o objetivo de restringir a concorrência. Todavia, como a Comissão refere acertadamente, embora essa alteração possa influenciar a qualificação do comportamento em causa de acordo ou de prática concertada, não diz respeito à «natureza» das informações trocadas, que, segundo o considerando 322 da decisão impugnada, se manteve a mesma e visava reduzir o grau de incerteza estratégica das partes no que se refere aos preços futuros e aos aumentos dos preços brutos, assim como ao calendário e à repercussão dos custos relativos à instalação dos camiões que respeitavam os novos padrões ambientais.

483    Em segundo lugar, as recorrentes invocam os considerandos 116 e 117 da decisão impugnada, que referem uma reunião ao nível inferior da sede, em 3 e 4 de julho de 2001, no âmbito da qual os trabalhadores da sede das participantes manifestaram a sua preocupação relativamente às de um plano comum ao nível alemão, que, em seu entender, iam demasiado longe, e concordaram em trocar no futuro apenas informações técnicas e não informações sobre os preços. Segundo as recorrentes, estes considerandos demonstram que as trocas de informações ao nível inferior da sede e ao nível alemão não eram da mesma natureza e não tinham o mesmo objetivo.

484    A este respeito, importa recordar que o Tribunal Geral já declarou, no âmbito da análise dos terceiro e quinto fundamentos, que as de um plano comum ao nível inferior da sede e ao nível alemão contribuíam para a realização do plano comum e que estes dois níveis dos contactos colusórios apresentavam relações factuais entre si, tendo, nomeadamente, em conta o facto de os participantes a esses níveis serem trabalhadores das próprias empresas, o facto de haver uma sobreposição temporal entre as reuniões efetuadas aos dois níveis, o facto de haver contactos entre os trabalhadores ao nível inferior da sede e os trabalhadores do nível alemão e o facto de os trabalhadores ao nível inferior da sede estarem informados do conteúdo das interações ao nível alemão (v. n.os 224 e 228, supra). Por outro lado, os autos demonstram que, não obstante o acordo celebrado em 2001 entre os participantes ao nível inferior da sede de não continuar a trocar informações sobre preços no futuro (v. n.o 478, supra), essas trocas ocorreram (v. n.o 229, supra). Nestas circunstâncias, o argumento das recorrentes apresentado no n.o 483, supra, deve ser rejeitado. Em todo o caso, há que ter em conta que, segundo os elementos de prova apresentados na decisão impugnada e não postos em causa pelas recorrentes, as reuniões ao nível dos órgãos dirigentes das participantes que tiveram lugar até setembro de 2004, portanto, paralelamente às reuniões ao nível inferior da sede, tiveram claramente um objetivo anticoncorrencial idêntico ao das interações ao nível alemão prosseguidas após 2004 e até ao termo da infração em 2011.

485    Com base nas considerações que precedem, há que concluir que a Comissão não incorreu em erro ao declarar, no presente processo, a existência de um plano de conjunto.

–       Quanto ao caráter continuado da infração

486    Em primeiro lugar, há que concluir que a interrupção dos contactos colusórios, em setembro de 2004, ao nível dos órgãos dirigentes das participantes não provocou uma interrupção dos contactos colusórios nos dois outros níveis.

487    Assim, de acordo com a prova documental apresentada no considerando 139 da decisão impugnada, em 11 de novembro de 2004, C, da sede da [confidencial], escreveu a trabalhadores dos outros fabricantes, ao nível inferior da sede e ao nível alemão, para lhes apresentar duas novas pessoas de contacto na sede de [confidencial], responsáveis pela fixação central de preços dos produtos na sede de [confidencial] em [confidencial]. C pediu aos concorrentes que lhe indicassem as pessoas de contacto nas suas organizações. A mensagem de correio eletrónico de C foi enviada, nomeadamente, a A e a B, pertencentes, respetivamente, ao nível inferior da sede e ao nível alemão da Scania. Do mesmo modo, como foi relatado no considerando 140 da decisão impugnada, os concorrentes trocaram, a partir de 2 de dezembro de 2004, ao nível alemão, informações sobre os aumentos dos preços planeados para 2005. No âmbito dessa troca, I, trabalhador da Scania DE, forneceu as seguintes informações a K, organizador dessa troca de informações e trabalhador da filial alemã de [confidencial]: «[A] partir de março de 2005 aumentaremos [os preços de] todas as nossas séries [confidencial] em 1,5 %». Verifica‑se, assim, que as interações das participantes no cartel ao nível alemão tinham o mesmo conteúdo que as suas interações ao nível dos órgãos dirigentes e se inscreviam na mesma linha.

488    Em segundo lugar, há que constatar que a argumentação da Comissão, no considerando 327 da decisão impugnada (v. n.os 457 a 461, supra), não está ferida de erro. Assim, é pacífico que havia uma sobreposição temporal entre as reuniões realizadas aos diferentes níveis. Por outro lado, no âmbito do terceiro fundamento, o Tribunal Geral concluiu que a Comissão tinha demonstrado a existência dos contactos entre os trabalhadores do nível inferior da sede e do nível alemão e o facto de os trabalhadores ao nível inferior da sede estarem ao corrente do conteúdo das interações ao nível alemão. Além disso, no âmbito do sexto fundamento, o Tribunal Geral concluiu que a Comissão tinha demonstrado que as informações sobre preços trocadas ao nível alemão provinham da sede das participantes e que os trabalhadores ao nível alemão comunicavam à sede as informações sobre preços obtidas no âmbito das suas interações.

489    Com fundamento nestes elementos de facto, o Tribunal Geral concluiu que a Comissão tinha razão ao considerar que, não obstante a circunstância de os contactos colusórios ao nível dos órgãos dirigentes terem sido interrompidos em setembro de 2004, o mesmo cartel (com o mesmo conteúdo e o mesmo alcance) tinha prosseguido após essa data, com a única diferença de que os trabalhadores envolvidos pertenciam a níveis organizacionais diferentes nas empresas implicadas, e não ao nível dos órgãos dirigentes.

490    Os argumentos das recorrentes não põem em causa esta conclusão.

491    Por um lado, as recorrentes acusam a Comissão de não ter explicado a forma como se operou a «deslocação» dos contactos colusórios do nível dos órgãos dirigentes para o nível alemão. Alegam que, para que se possa considerar que uma «deslocação» constitui a prossecução das práticas anteriores, devia ter sido implementado um mecanismo de controlo para assegurar a continuidade. Invocam também o Acórdão de 10 de novembro de 2017, Icap e o./Comissão (T‑180/15, EU:T:2017:795, n.o 223), no qual o Tribunal Geral recordou que, nas circunstâncias em que o prosseguimento de um acordo ou de práticas concertadas exigia medidas positivas especiais, a Comissão não podia presumir a continuação do cartel na falta de prova da adoção das referidas medidas.

492    Esta argumentação das recorrentes não pode ser acolhida. Com efeito, resulta da decisão impugnada que a Comissão utilizou os termos «deslocação» ou «migração» das interações do nível dos órgãos dirigentes ao nível alemão para indicar que tinha ocorrido uma mudança no nível dos trabalhadores que participavam nos contactos colusórios, e não para indicar que tinha havido qualquer interrupção do cartel. Por outro lado, no considerando 327 da decisão impugnada, a Comissão apresentou as circunstâncias factuais que demonstravam a continuação do cartel após setembro de 2004 (v. n.os 458 a 460, supra) e, tendo em conta estas circunstâncias, afigura‑se que não foi exigida nenhuma «medida positiva especial» (v., neste sentido, Acórdão de 10 de novembro de 2017, Icap e o./Comissão (T‑180/15, EU:T:2017:795, n.o 223).

493    Por outro lado, as recorrentes censuram a Comissão por não ter demonstrado na decisão impugnada que os trabalhadores da Scania DE que tinham participado nas reuniões ao nível alemão sabiam que estavam envolvidos na continuação das práticas que tinham tido lugar nos dois outros níveis ou que os trabalhadores da Scania que participavam nas reuniões ao nível das instâncias inferiores da sede tinham conhecimento das reuniões ao nível dos órgãos dirigentes.

494    Esta argumentação das recorrentes baseia‑se na tese de que a tomada de consciência do plano de conjunto deve ser apreciada ao nível dos trabalhadores da empresa e não ao nível da própria empresa. Ora, como já se concluiu, esta tese é errada (v. n.os 474 a 478, supra).

495    No que respeita à questão da tomada de consciência, ao nível da empresa Scania, do caráter continuado da infração apesar da «deslocação» das trocas do nível dos órgãos dirigentes para o nível alemão, há que recordar os seguintes elementos.

496    Primeiro, importa recordar o importante papel desempenhado pela sede da Scania na fixação dos preços ao nível dos distribuidores nacionais da empresa e, portanto, ao nível da Scania DE, que é uma filial detida a 100 %. O mecanismo de fixação dos preços na Scania foi examinado no âmbito do sexto fundamento.

497    Segundo, importa recordar que os elementos de prova que constam dos autos demonstram que os trabalhadores da sede da Scania (nível inferior da sede) conheciam o conteúdo das trocas ao nível alemão (v. n.o 418, supra). Não é plausível que os órgãos dirigentes dessa empresa não estivessem ao corrente dos mesmos.

498    Terceiro, importa recordar que os elementos de prova que constam dos autos sugerem que os trabalhadores da Scania DE trocavam ao nível alemão informações provenientes da sede da Scania (v. n.os 413, 437, 438 e 442, supra).

499    Estes três elementos demonstram que, não obstante o facto de as trocas ao nível dos órgãos dirigentes terem terminado em setembro de 2004, a empresa Scania e a sua sede tinham conhecimento de que a mesma infração tinha prosseguido após setembro de 2004, com a única diferença de que já não participavam nos contactos colusórios trabalhadores ao nível dos órgãos dirigentes. A este respeito, a circunstância, alegada pelas recorrentes, de os trabalhadores da Scania DE não conhecerem a existência dos contactos colusórios ao nível dos órgãos dirigentes não tem importância.

500    Com base nas considerações anteriores, há que declarar que a conclusão da Comissão relativa à existência, no caso em apreço, de uma infração única e continuada não está viciada de erro.

2)      Quanto à imputabilidade da infração única e continuada à Scania

501    A Comissão salientou, no considerando 332 da decisão impugnada, que a Scania tinha participado diretamente em todos os aspetos relevantes do cartel.

502    Por outro lado, no considerando 333 da decisão impugnada, a Comissão observou que, mesmo que a Scania só fabricasse e vendesse camiões pesados, sabia ou devia saber que as outras participantes no cartel também fabricavam camiões médios e que os contactos colusórios diziam respeito a estes dois tipos de camiões (médios e pesados). Por conseguinte, a Comissão concluiu que a Scania sabia ou devia saber que as práticas anticoncorrenciais diziam respeito aos camiões médios e pesados.

503    Com fundamento nestas considerações, a Comissão concluiu, no considerando 334 da decisão impugnada, que a Scania tinha a intenção de contribuir para a infração e conhecia ou devia conhecer a sua existência.

504    Para contestar a imputabilidade da infração única e continuada à Scania, as recorrentes censuram a Comissão por não ter demonstrado a existência do «elemento mental» necessário. Por outras palavras, censuram‑na por não ter demonstrado, na decisão impugnada, que os critérios cumulativos do interesse, do conhecimento e da aceitação do risco, estabelecidos no Acórdão de 8 de julho de 1999, Comissão/Anic Partecipazioni (C‑49/92 P, EU:C:1999:356, n.o 87), estavam preenchidos no caso em apreço relativamente aos representantes da Scania que participaram nos três níveis dos contactos.

505    A este propósito importa observar que, na medida em que a tomada de consciência da existência de um plano de conjunto deve ser apreciada ao nível das empresas envolvidas e não ao nível dos seus trabalhadores (v. n.o 478, supra), de maneira análoga, os fatores que determinam a imputabilidade da infração única e continuada devem ser forçosamente apreciados igualmente ao nível da empresa.

506    Além disso, no que respeita aos fatores que determinam a imputabilidade da infração única e continuada a uma empresa, resulta do Acórdão de 6 de dezembro de 2012, Comissão/Verhuizingen Coppens (C‑441/11 P, EU:C:2012:778, n.os 43 a 45), que, se a empresa em causa tiver participado diretamente em todos os comportamentos anticoncorrenciais que compõem a infração única e continuada, a Comissão tem o direito de lhe imputar toda a infração, sem que seja obrigada a demonstrar o cumprimento dos critérios do interesse, do conhecimento e da aceitação do risco.

507    No presente processo, pode‑se observar que, conforme salientado no considerando 332 da decisão impugnada, a empresa Scania participou diretamente em todos os aspetos relevantes do cartel. Com efeito, os seus trabalhadores participaram nos contactos colusórios que tiveram lugar aos três níveis. A empresa Scania trocou informações com os seus concorrentes sobre os preços e os aumentos dos preços brutos, bem como sobre o calendário e a repercussão dos custos relativos à instalação das tecnologias conformes com as normas Euro 3 a Euro 6. A Scania participou ativamente no cartel, organizou reuniões e participou em trocas de mensagens de correio eletrónico (v. considerando 332 da decisão impugnada).

508    É verdade que a Scania não fabrica camiões médios. No entanto, resulta dos autos que os contactos colusórios nos quais os trabalhadores da Scania participavam diziam indistintamente respeito aos camiões médios e aos camiões pesados (v. considerando 333 da decisão impugnada). Por conseguinte, a Comissão teve razão ao imputar à empresa Scania a infração única e continuada que incidia também sobre os camiões médios na medida em que esta empresa tinha necessariamente conhecimento deste aspeto do cartel.

509    Tendo em conta as considerações anteriores, há que concluir que a imputabilidade da totalidade da infração única e continuada à Scania não está ferida de erro. Daqui decorre que o sétimo fundamento deve ser julgado improcedente.

4.      Quanto ao oitavo fundamento, relativo a uma aplicação errada do artigo 101.o TFUE, do artigo 53.o do Acordo EEE e do artigo 25.o do Regulamento n.o 1/2003, na medida em que a Comissão aplicou uma coima que incide sobre um comportamento sujeito a prescrição e, em qualquer caso, não tomou em consideração o facto de o referido comportamento não ser continuado

510    Em primeiro lugar, as recorrentes alegam que os factos relativos ao nível dos órgãos dirigentes que justificam a aplicação de uma coima prescreveram nos termos do artigo 25.o do Regulamento n.o 1/2003, na medida em que as reuniões ao referido nível terminaram em setembro de 2004, ou seja, mais de cinco anos antes do início do inquérito da Comissão. As recorrentes acrescentam que, nessas circunstâncias, a Comissão também não tem interesse legítimo, na aceção do artigo 7.o do Regulamento n.o 1/2003, em declarar a existência de uma infração relacionada com um comportamento ao nível dos órgãos dirigentes.

511    Em segundo lugar, as recorrentes alegam que, ainda que o Tribunal Geral considerasse que os factos em causa constituíam uma infração única e continuada (quod non), a decisão impugnada deveria ser reformada na medida em que não tem em conta as interrupções da alegada infração relativamente ao nível dos órgãos dirigentes. Nesse contexto, as recorrentes alegam que a decisão impugnada não contém prova suficiente da existência de reuniões ao nível dos órgãos dirigentes em 1999.

512    Por outro lado, as recorrentes alegam que, tendo em conta a falta de provas sobre a participação da Scania nas reuniões ao nível dos órgãos dirigentes em 1999 e em 2002, a decisão impugnada concluiu erradamente que a Scania tinha participado de forma continuada nas reuniões dos órgãos dirigentes entre 17 de janeiro de 1997 e 24 de setembro de 2004. Entendem que deveria antes ter concluído que essas reuniões tinham sido interrompidas, pelo menos no que respeita à Scania, entre 3 de setembro de 1998 e 3 de fevereiro de 2000 (17 meses de interrupção) e entre 20 de novembro de 2001 e 10 de abril de 2003 (mais 17 meses de interrupção).

513    As recorrentes concluem que a decisão impugnada deve ser anulada e que, em qualquer caso, a aplicação de uma coima devia estar prescrita para qualquer infração anterior a 10 de abril de 2003. A título subsidiário, as recorrentes alegam que a aplicação de uma coima devia estar prescrita para qualquer infração anterior a 3 de fevereiro de 2000. As recorrentes alegam, por outro lado, que, em qualquer caso, o cálculo de uma coima relacionada com o nível dos órgãos dirigentes deveria ter conta longos períodos de menor intensidade da infração.

514    A Comissão contesta a argumentação das recorrentes.

515    Em primeiro lugar, no que respeita ao argumento das recorrentes relativo à prescrição em matéria de aplicação de coimas pela Comissão, há que recordar que, nos termos do artigo 25.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 1/2003, conjugado com o artigo 23.o, n.o 2, alínea a), do mesmo regulamento, o poder conferido à Comissão de aplicar coimas às empresas por infrações, nomeadamente, ao artigo 101.o TFUE está sujeito a um prazo de prescrição de cinco anos. O artigo 25.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003 prevê que, no que se refere às infrações continuadas ou repetidas, o prazo de prescrição apenas começa a ser contado a partir do dia em que tiver cessado essa infração. O artigo 25.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1/2003 prevê, nomeadamente, que a prescrição em matéria de aplicação de coimas é interrompida por qualquer ato da Comissão destinado à investigação da infração ou à instrução do respetivo processo.

516    No caso em apreço, a Comissão concluiu, sem cometer qualquer erro, que o comportamento ao nível dos órgãos dirigentes fazia parte de uma infração única e continuada que terminou em 18 de janeiro de 2011. Por conseguinte, o prazo de prescrição quinquenal só começa a correr a partir desta última data, o que significa que, neste caso, o poder da Comissão de aplicar uma coima não está sujeito a prescrição.

517    Em segundo lugar, no que respeita à alegação das recorrentes relativa à alegada falta de provas das reuniões ao nível dos órgãos dirigentes em 1999, há que referir o seguinte.

518    Primeiro, importa salientar que a decisão impugnada contém suficientes provas da existência de reuniões ao nível dos órgãos dirigentes em 1998 e em 2000. Mais especificamente, o considerando 105 da decisão impugnada apresenta uma prova documental relativa a uma reunião ao nível dos órgãos dirigentes, que teve lugar em 3 de setembro de 1998, durante a qual os representantes das participantes trocaram previsões de mercado para 1999. Segundo essa prova documental, um representante da sede da Scania, N, participava nessa reunião. Reuniões semelhantes ocorreram em 2000, como resulta dos considerandos 109 a 112 da decisão impugnada, em que N, da sede da Scania, também participou.

519    Segundo, resulta da prova documental apresentada no considerando 106 da decisão impugnada que a reunião seguinte ao nível dos órgãos dirigentes após a que teve lugar em 3 de setembro de 1998 (v. n.o 518, supra) estava prevista para janeiro de 1999.

520    Terceiro, no considerando 106 da decisão impugnada, a Comissão refere‑se a uma declaração de clemência de [confidencial] segundo a qual se realizaram reuniões entre concorrentes no período entre 1998 e 2001, pelo menos uma vez por ano. Segundo essa declaração, os participantes nessas reuniões, que não pertenciam ao nível dos órgãos dirigentes, trocaram informações relativas, nomeadamente, ao aumento futuro dos preços. Entre os participantes nessas reuniões estava identificado O, diretor‑geral da Scania DE.

521    Quarto, importa recordar, à semelhança da Comissão, que as reuniões ao nível dos órgãos dirigentes faziam parte de uma infração única e continuada e que, consequentemente, todas as reuniões entre os concorrentes, independentemente do nível organizacional, deviam ser tomadas em conta na apreciação do prosseguimento da infração em 1999.

522    Quinto, importa igualmente recordar que, conforme jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, no que respeita, nomeadamente, a uma infração que se entende por vários anos, o facto de não ter sido feita prova direta da participação de uma sociedade nessa infração, num período determinado, não obsta a que se possa concluir que essa participação se verificou também nesse período, desde que tal conclusão assente em indícios objetivos e concordantes, podendo o não distanciamento público dessa sociedade ser tido em conta a esse respeito (v. Acórdão de 26 de janeiro de 2017, Villeroy & Boch/Comissão, C‑625/13 P, EU:C:2017:52, n.o 111 e jurisprudência referida).

523    Tendo em conta os elementos apresentados nos n.os 518 a 521, supra, e a jurisprudência referida no n.o 522, supra, há que concluir que a Comissão não cometeu qualquer erro ao declarar que a infração única no caso em apreço não foi interrompida em 1999 e que a Scania participou na referida infração também durante esse ano.

524    Em terceiro lugar, no que respeita à alegação das recorrentes de que a participação da Scania nas reuniões ao nível dos órgãos dirigentes em 2002 não está demonstrada, há que referir o seguinte.

525    Primeiro, resulta do considerando 119 da decisão impugnada que, em relação a uma reunião ao nível dos órgãos dirigentes que teve lugar em 7 de fevereiro de 2002, tinha sido enviado um convite a M da sede da Scania.

526    Segundo, resulta das notas manuscritas de uma reunião ao nível dos órgãos dirigentes, em 27 e 28 de junho de 2002, tomadas por um representante do [confidencial], apresentadas no considerando 123 da decisão impugnada, que a Scania comunicou valores das vendas relativos a 2002 a vários países.

527    Terceiro, um relatório interno de [confidencial] que resume as informações trocadas numa reunião ao nível dos órgãos dirigentes em 18 de setembro de 2002, mencionado no considerando 126 da decisão impugnada, mostra que a Scania forneceu informações sobre os seus aumentos de preços para 2002 e sobre uma ação judicial na qual e defrontava o Reino Unido.

528    Tendo em conta os elementos apresentados nos n.os 525 a 527, supra, há que concluir que a Comissão fez prova bastante da participação da Scania nas reuniões ao nível dos órgãos dirigentes em 2002.

529    Esta conclusão não é posta em causa pela declaração sob juramento de M, representante da Scania nas reuniões ao nível dos órgãos dirigentes, de que, «tanto quanto se lembra», não participou em nenhuma reunião deste tipo em 2002. Esta declaração é bastante vaga e não convence o Tribunal Geral. Por outro lado, já foi observado que os documentos elaborados in tempore non suspecto, como as notas manuscritas tomadas numa reunião, são dotados de maior força probatória que os documentos que não datam da época dos factos, como as declarações sob juramento.

530    Em quarto lugar, o Tribunal Geral observa que as recorrentes, na nota de pé de página n.o 554 da petição, alegam que a participação da Scania em determinadas reuniões ao nível dos órgãos dirigentes, apresentadas na decisão impugnada, não ficou demonstrada. Trata‑se das reuniões em Bruxelas, em 17 de janeiro de 1997 (considerando 98 da decisão impugnada) e 6 de abril de 1998 (considerando 103), em Amesterdão (Países Baixos), em 3 de fevereiro de 2000 (considerandos 108 a 110) e em Eindhoven (Países Baixos), em 6 de setembro de 2000 (considerando 111). Em apoio desta alegação, invocam a declaração sob juramento de N, que afirma não se recordar de ter participado nessas reuniões.

531    O Tribunal Geral observa que os considerandos da decisão impugnada, mencionados no n.o 530, supra, apresentam provas documentais que demonstram a participação da Scania nas reuniões em causa. No que respeita ao conteúdo da declaração sob juramento de N e à sua força probatória, o Tribunal Geral remete para as considerações que constam do n.o 529, supra. O Tribunal Geral conclui que a alegação das recorrentes apresentada no n.o 530, supra, é improcedente.

532    Tendo em conta as considerações anteriores, o Tribunal Geral julga improcedente o presente fundamento, esclarecendo que as razões alegadas pelas recorrentes em apoio da reforma da decisão impugnada (v. n.os 511 e 513, supra) não têm fundamento, uma vez que os autos pendentes no Tribunal Geral não revelam nenhuma interrupção da infração única apurada nem a existência de períodos de menor intensidade da mesma.

5.      Quanto ao nono fundamento, relativo à violação do princípio de proporcionalidade e do princípio de igualdade de tratamento no que respeita ao montante da coima, e, em qualquer caso, quanto à necessidade de uma redução do montante da coima nos termos do artigo 261.o TFUE e do artigo 31.o do Regulamento n.o 1/2003

533    As recorrentes alegam que a decisão impugnada deve ser reformada na medida em que a coima aplicada não é conforme com os princípios da proporcionalidade e da igualdade de tratamento. Por outro lado, e em qualquer caso, pedem ao Tribunal Geral que, no âmbito da sua competência de plena jurisdição, substitua a apreciação da Comissão pela sua própria apreciação e reduza o montante da coima.

534    De acordo com a interpretação do Tribunal Geral baseada na utilização do verbo «reformar», as recorrentes pedem‑lhe que exerça a sua competência de plena jurisdição reconhecida ao juiz da União pelo artigo 31.o do Regulamento n.o 1/2003, em conformidade com o artigo 261.o TFUE.

535    A este propósito, recorde‑se que o sistema de fiscalização jurisdicional das decisões da Comissão relativas aos processos de aplicação dos artigos 101.o TFUE e 102.o TFUE consiste numa fiscalização da legalidade dos atos das instituições consagrada no artigo 263.o TFUE, a qual, em aplicação do artigo 261.o TFUE e mediante pedido dos recorrentes, pode ser completada pelo exercício, pelo Tribunal Geral, de uma competência de plena jurisdição no que respeita às sanções aplicadas neste domínio pela Comissão (v. Acórdão de 21 de janeiro de 2016, Galp Energía España e o./Comissão, C‑603/13 P, EU:C:2016:38, n.o 71 e jurisprudência referida).

536    Assim, uma vez que exerce a sua competência de plena jurisdição prevista no artigo 261.o TFUE e no artigo 31.o do Regulamento n.o 1/2003, para além da simples fiscalização da legalidade da sanção, o juiz da União pode substituir a apreciação da Comissão, autora do ato em que esse montante foi inicialmente fixado, pela sua própria apreciação para a determinação do montante dessa sanção (v. Acórdão de 21 de janeiro de 2016, Galp Energía España e o./Comissão, C‑603/13 P, EU:C:2016:38, n.o 75 e jurisprudência referida).

537    Em contrapartida, o âmbito desta competência de plena jurisdição está estritamente limitado, diferentemente da fiscalização da legalidade prevista no artigo 263.o TFUE, à determinação do montante da coima (v. Acórdão de 21 de janeiro de 2016, Galp Energía España e o./Comissão, C‑603/13 P, EU:C:2016:38, n.o 76 e jurisprudência referida).

538    Daí resulta que a competência de plena jurisdição de que dispõe o Tribunal Geral ao abrigo do artigo 31.o do Regulamento n.o 1/2003 diz unicamente respeito à apreciação, por este, da coima aplicada pela Comissão, com exclusão de quaisquer modificações dos elementos constitutivos da infração legalmente declarada pela Comissão na decisão de que o Tribunal Geral é chamado a conhecer (Acórdão de 21 de janeiro de 2016, Galp Energía España e o./Comissão, C‑603/13 P, EU:C:2016:38, n.o 77).

539    A fim de determinar o montante da coima aplicada, cabe ao Tribunal Geral apreciar ele próprio as circunstâncias do caso em apreço e o tipo de infração em causa. Este exercício pressupõe, em aplicação do artigo 23.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1/2003, que seja tida em consideração, para cada empresa punida, a gravidade e a duração da infração em causa, respeitando os princípios, designadamente, da fundamentação, da proporcionalidade, da individualização das sanções e da igualdade de tratamento, sem que o Tribunal Geral esteja vinculado pelas regras indicativas definidas pela Comissão nas suas orientações (v., neste sentido, Acórdão de 21 de janeiro de 2016, Galp Energía España e o./Comissão, C‑603/13 P, EU:C:2016:38, n.os 89 e 90).

a)      Quanto à violação do princípio da proporcionalidade

540    Em primeiro lugar, as recorrentes alegam que a decisão impugnada não avaliou de forma proporcionada a gravidade da infração, na medida em que não considerou que os trabalhadores da Scania DE não podiam saber que as informações recebidas dos concorrentes podiam ter um alcance europeu. Por conseguinte, ainda que os trabalhadores da Scania DE tivessem querido prejudicar a concorrência no mercado geográfico (Alemanha) pelo qual eram responsáveis (quod non), a coima aplicada pela decisão impugnada não é proporcional à gravidade da infração considerada, na medida em que tem em conta o valor das vendas ao nível do EEE.

541    Em segundo lugar, as recorrentes alegam que a decisão impugnada viola o princípio da proporcionalidade, na medida em que, em relação à fixação do montante da coima, não tem em conta o facto de os contactos entre os fabricantes de camiões terem mudado de natureza e intensidade durante o período tomado em consideração, como alegam ter sido constatado no considerando 322 da decisão impugnada.

542    Em terceiro lugar, as recorrentes salientam que a infração descrita nos considerandos da decisão impugnada é mais ampla do que a que dá lugar a uma coima no dispositivo da mesma. A este respeito, comparam o considerando 317 da decisão impugnada, que se refere às trocas de informações sensíveis no plano da concorrência, com o artigo 1.o do seu dispositivo, o qual não faz referência a tais trocas. As recorrentes consideram que esta apresentação tem incidência no cálculo do montante da coima e que, por conseguinte, a coima fixada na decisão impugnada não é proporcionada à infração tal como a Comissão a pretendia descrever.

543    A Comissão contesta a argumentação das recorrentes.

544    No que respeita à argumentação das recorrentes apresentada no n.o 540, supra, há que recordar que, no âmbito do exame do sexto fundamento, o Tribunal Geral rejeitou a alegação das recorrentes segundo a qual os trabalhadores da Scania DE que participavam nas interações ao nível alemão nunca tinham presumido que as informações recebidas nessas trocas se referiam a preços europeus ou que podiam reduzir a incerteza quanto à estratégia de preços europeia dos outros fabricantes (v. n.o 415, supra). Daqui resulta que a argumentação apresentada no n.o 540, supra, não demonstra o caráter desproporcionado da coima.

545    No que se refere à argumentação das recorrentes apresentada no n.o 541, supra, importa recordar que, no considerando 322 da decisão impugnada, a Comissão esclareceu que, ainda que, a partir de setembro de 2004, as participantes tivessem deixado de procurar ativamente, como tinham feito anteriormente, celebrar um acordo específico sobre os futuros aumentos comuns de preços brutos ou sobre datas de lançamento específicas para os camiões conformes com as novas normas ambientais ou sobre o montante dos custos desses camiões que as participantes repercutiam nos consumidores, estas continuaram a concertar‑se trocando o mesmo tipo de informações e prosseguindo o mesmo objetivo de restringir a concorrência pela redução do grau de incerteza estratégica entre si.

546    Importa também recordar a conclusão do Tribunal Geral segundo a qual a alteração efetuada a partir de setembro de 2004, embora possa influenciar a qualificação do comportamento em causa de acordo ou de prática concertada, não diz respeito à «natureza» das informações trocadas, a qual, segundo o considerando 322 da decisão impugnada, continuou a ser a mesma (v. n.o 482, supra).

547    Verifica‑se assim que as tentativas que faziam antes de setembro de 2004 para celebrar acordos específicos sobre os preços, tentativas que cessaram depois dessa data, são a única diferença relativamente ao comportamento das participantes antes de setembro de 2004 e após setembro de 2004. Ora, como acertadamente refere a Comissão, tendo em conta, por um lado, o princípio de que as práticas concertadas podem prejudicar tanto a concorrência como os acordos e, por outro, o facto de a Comissão não ter aumentado o fator de gravidade pertinente devido às tentativas das partes de celebrarem acordos sobre os preços, a argumentação das recorrentes, apresentada no n.o 541, supra, não demonstra o caráter desproporcionado da coima.

548    No que respeita à argumentação das recorrentes apresentada no n.o 542, supra, há que recordar que, no considerando 317 da decisão impugnada, a Comissão evocou a existência de práticas que reduziam o nível da incerteza estratégica entre as participantes no que respeitava aos preços futuros, aos aumentos dos preços brutos, ao calendário e à repercussão dos custos relativos à comercialização dos modelos de camiões conformes com as normas ambientais. No considerando 317, alíneas a) a c), e como resulta da utilização dos termos «[a] este respeito», a Comissão esclareceu em que consistiam as práticas supramencionadas. No considerando 317, alínea c), a Comissão evocou a partilha de «outras informações sensíveis no plano da concorrência».

549    No artigo 1.o do dispositivo da decisão impugnada, a Comissão evoca a colusão sobre os preços e os aumentos dos preços brutos, sobre o calendário e a repercussão dos custos relativos à instalação das tecnologias em matéria de emissões.

550    Resulta da comparação do considerando 317 com o artigo 1.o do dispositivo da decisão impugnada que não há divergência entre as duas disposições na descrição da infração, uma vez que a referência da Comissão à partilha de «outras informações sensíveis no plano da concorrência» é apenas um exemplo da colusão sobre os preços e os aumentos dos preços brutos, bem como sobre o calendário e a repercussão dos custos relativos à instalação das tecnologias em matéria de emissões.

551    Decorre das considerações anteriores que nenhum dos argumentos das recorrentes demonstra o caráter desproporcionado da coima.

b)      Violação do princípio da igualdade de tratamento

552    As recorrentes invocam três argumentos em apoio da sua alegação de que o nível da coima aplicada viola o princípio da igualdade de tratamento.

553    Em primeiro lugar, as recorrentes alegam que a redação da decisão impugnada sublinha exageradamente o seu papel na infração e ignora, quanto ao essencial, o papel dos outros fabricantes de camiões, procedendo assim a uma distorção da realidade. Segundo as recorrentes, devido a essa redação da decisão impugnada, é impossível comparar o seu papel com o dos outros fabricantes de camiões na infração e, devido a essa impossibilidade de comparação, diversas avaliações relativas ao nível da coima, feitas pela Comissão na decisão impugnada, violam o princípio da igualdade de tratamento. As recorrentes referem‑se ao considerando 444 da decisão impugnada, no qual a Comissão concluiu pela inexistência de circunstâncias agravantes ou atenuantes no caso em apreço. Referem‑se igualmente ao considerando 432 da decisão impugnada, no qual a Comissão esclareceu que, para efeitos do cálculo do montante de base da coima aplicada à Scania, considerou a mesma proporção do valor das suas vendas que a proporção do valor das vendas das partes na transação, fixada na decisão de transação.

554    As recorrentes também alegam que o facto de a decisão impugnada descrever de forma mais precisa e orientada o seu papel no comportamento em causa em relação à descrição que é feita do papel dos outros concorrentes na decisão de transação as desfavorece no âmbito das ações de indemnização a que estão expostas.

555    Em segundo lugar, as recorrentes alegam que a decisão impugnada viola o princípio da igualdade de tratamento na medida em que aplica a todos os fabricantes o mesmo método de cálculo da coima sem ter em conta que a sua quota de mercado ao nível europeu é menor que a dos outros fabricantes e que a diferença com os leaders do mercado é muito importante, nomeadamente na Alemanha.

556    As recorrentes alegam igualmente que a decisão impugnada violou o princípio da igualdade de tratamento na medida em que não teve em conta o facto de os trabalhadores da Scania DE terem desempenhado um papel passivo, ou, pelo menos, não terem desempenhado um papel de primeiro plano no comportamento em causa, em comparação com os dois grandes fabricantes no mercado.

557    Em terceiro lugar, as recorrentes alegam que a decisão impugnada viola o princípio da igualdade de tratamento na medida em que o método seguido pela Comissão para fixar o montante da coima aplicada às recorrentes é o mesmo que o aplicado aos outros fabricantes de camiões, apesar de as recorrentes, ao contrário destes últimos, não fabricarem camiões médios.

558    A Comissão contesta a argumentação das recorrentes.

559    Antes de abordar cada um dos argumentos referidos supra, há que recordar que o princípio da igualdade de tratamento constitui um princípio geral do direito da União, consagrado nos artigos 20.o e 21.o da Carta. Segundo jurisprudência constante, o referido princípio exige que situações comparáveis não sejam tratadas de modo diferente e que situações diferentes não sejam tratadas de modo igual, exceto se esse tratamento for objetivamente justificado (Acórdãos de 11 de julho de 2013, Ziegler/Comissão, C‑439/11 P, EU:C:2013:513, n.o 132, e de 26 de janeiro de 2017, Zucchetti Rubinetteria/Comissão, C‑618/13 P, EU:C:2017:48, n.o 38). Além disso, resulta também de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça que da aplicação de métodos de cálculo diferentes para determinação do montante da coima não pode resultar uma discriminação entre as empresas que participaram num acordo ou numa prática concertada contrária ao artigo 101.o, n.o 1, TFUE (Acórdãos de 11 de julho de 2013, Ziegler/Comissão, C‑439/11 P, EU:C:2013:513, n.o 133; de 12 de novembro de 2014, Guardian Industries e Guardian Europe/Comissão, C‑580/12 P, EU:C:2014:2363, n.o 62; e de 26 de janeiro de 2017, Zucchetti Rubinetteria/Comissão, C‑618/13 P, EU:C:2017:48, n.o 38).

560    No que respeita ao argumento das recorrentes apresentado no n.o 553, supra, primeiro, há que recordar, à semelhança da Comissão, que esta instituição estava obrigada, por força do artigo 296.o TFUE, a fundamentar suficientemente a decisão impugnada, o que fez. Na medida em que a Scania era a única destinatária da decisão impugnada, era normal que a apreciação fosse baseada no seu papel no cartel. As outras participantes no cartel já tinham sido objeto da decisão de transação, que tinha demonstrado a sua responsabilidade no papel que tinham desempenhado no cartel.

561    Segundo, importa salientar que, contrariamente à alegação das recorrentes, a redação da decisão impugnada não «ignora» o papel dos outros fabricantes de camiões no cartel. O seu comportamento resulta claramente da cronologia dos acontecimentos, descrita no n.o 6.2 da decisão impugnada, que explica detalhadamente a natureza e o conteúdo das interações, bem como os participantes nestas últimas. Daqui resulta que a alegação das recorrentes de que é impossível comparar o seu papel no cartel com o das outras partes é improcedente.

562    Terceiro, o Tribunal Geral verifica, com base na decisão impugnada e no processo que lhe foi submetido, que o papel da Scania no cartel não era diferente do das outras partes e que as recorrentes não invocaram qualquer argumento e não apresentaram qualquer prova demonstrativa do contrário. Por outro lado, conforme observa a Comissão, com razão, cada um dos fatores tomados em consideração para determinar, no âmbito do cálculo do montante de base da coima, a gravidade da infração e o «direito de entrada», a saber a natureza da infração, a quota de mercado acumulada das empresas envolvidas, o alcance geográfico da infração e a sua execução, foi aplicado da mesma maneira à Scania e às outras partes.

563    Tendo em conta as considerações anteriores, o Tribunal Geral conclui que a Comissão não cometeu qualquer erro na sua decisão de fixar a mesma proporção do valor das vendas da Scania que a fixada relativamente aos outros fabricantes e de aplicar o mesmo coeficiente de gravidade (17 %) e o mesmo «direito de entrada» (17 %) que os aplicados aos outros fabricantes na decisão de transação.

564    Por conseguinte, o argumento apresentado no n.o 553, supra, deve ser julgado improcedente.

565    No que se refere ao argumento apresentado no n.o 554, supra, há que salientar que a circunstância de a decisão impugnada apresentar de forma detalhada o comportamento ilícito da Scania, em conformidade com os requisitos do dever de fundamentação da Comissão, resulta do facto de esta decisão ter como único destinatário a Scania, uma vez que esta empresa não reconheceu a sua responsabilidade no cartel, contrariamente às outras partes que apresentaram um pedido formal de transação. Daqui resulta que as recorrentes não se encontram na mesma situação que as partes na transação e, por conseguinte, o seu argumento, apresentado no n.o 554, supra, não demonstra a violação do princípio da igualdade de tratamento.

566    No que se refere ao argumento das recorrentes apresentado no n.o 555, supra, há que observar que a Comissão, tanto na decisão impugnada como na decisão de transação, se referiu nomeadamente, para a determinação das coimas, ao valor das vendas no EEE de bens relacionados com a infração das empresas implicadas, de resto, em conformidade com as suas orientações para o cálculo das coimas. Com efeito, no n.o 6 dessas orientações, a Comissão explicou que a combinação do valor das vendas relacionadas com a infração e da sua duração é considerada um valor de substituição adequado para refletir a importância económica da infração, bem como o peso relativo de cada empresa que participa na mesma.

567    No caso em apreço, o Tribunal Geral não tem motivo para pôr em causa a opção da Comissão de se referir, no que respeita a todas as empresas implicadas, ao valor das suas vendas no EEE dos bens relacionados com a infração. Trata‑se de uma opção razoável para refletir o peso relativo de cada empresa participante na infração e que abrangeu todas as empresas participantes no cartel e não apenas a Scania.

568    Por outro lado, o Tribunal de Justiça afirmou que o direito da União não incluía qualquer princípio de aplicação geral segundo o qual a sanção devia ser proporcional à importância da empresa no mercado dos produtos objeto da infração (Acórdão de 18 de maio de 2006, Archer Daniels Midland e Archer Daniels Midland Ingredients/Comissão, C‑397/03 P, EU:C:2006:328, n.o 101).

569    Com fundamento nestas considerações, há que concluir que o argumento das recorrentes, apresentado no n.o 555, supra, não demonstra a violação pela Comissão do princípio da igualdade de tratamento e deve ser julgado improcedente.

570    No que se refere ao argumento das recorrentes apresentado no n.o 556, supra, deve ser julgado improcedente na medida em que não resulta dos autos que os trabalhadores da Scania DE desempenharam um papel passivo ou um papel de segundo plano no comportamento infrator, demonstrado no caso em apreço. Por conseguinte, não há que reduzir o montante da coima com este fundamento.

571    No que se refere ao argumento das recorrentes apresentado no n.o 557, supra, é forçoso observar que, como resulta do considerando 429 da decisão impugnada, para calcular o montante da coima aplicada às recorrentes, a Comissão teve em conta o valor das suas vendas de camiões pesados no EEE, contrariamente ao que fez para efeitos do cálculo do montante das coimas aplicadas às partes na transação na decisão de transação, na qual teve em conta o valor das vendas de camiões médios e pesados no EEE (considerando 109 da decisão de transação). Daqui resulta que a alegação das recorrentes de que a Comissão não teve em conta o facto de a Scania não fabricar camiões médios não tem fundamento.

572    Tendo em conta o que precede, há que concluir que nenhum dos argumentos das recorrentes relativos à violação do princípio da igualdade de tratamento demonstra que a coima deve ser reduzida.

c)      Quanto ao montante da coima

573    Há que salientar que, à luz da competência de plena jurisdição de que o Tribunal Geral dispõe em matéria de coimas por infração às regras da concorrência, nada nas alegações, argumentos e elementos de direito e de facto apresentados pelas recorrentes no âmbito de todos os fundamentos anteriormente examinados permite concluir que o montante da coima aplicada pela decisão impugnada deve ser alterado.

IV.    Quanto às despesas

574    Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

575    Tendo as recorrentes sido vencidas, há que condená‑las a suportar as suas próprias despesas, e as despesas efetuadas pela Comissão, em conformidade com o seu pedido.

Pelos fundamentos expostos

O TRIBUNAL GERAL (Décima Secção alargada)

decide:

É negado provimento ao recurso.A Scania AB, a Scania CV AB e a Scania Deutschland GmbH suportarão as suas próprias despesas e as despesas efetuadas pela Comissão Europeia.

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 2 de fevereiro de 2022.


Índice


I. Antecedentes do litígio

A. Procedimento administrativo na origem da decisão impugnada

B. Decisão impugnada

1. Estrutura do mercado de camiões e mecanismo de fixação dos preços na indústria dos camiões

a) Estrutura do mercado de camiões

b) Mecanismo de fixação dos preços na indústria dos camiões

c) Mecanismo de fixação dos preços na Scania

d) Quanto ao impacto do aumento de preços a nível europeu nos preços a nível nacional

2. Contactos colusórios entre a Scania e as partes na transação

3. Aplicação do artigo 101.o TFUE e do artigo 53.o do Acordo EEE

a) Acordos e práticas concertadas

b) Restrição da concorrência

c) Infração única e continuada

d) Âmbito geográfico da infração

4. Destinatários

5. Cálculo do montante da coima

a) Montante de base da coima

b) Montante total da coima

6. Dispositivo da decisão impugnada

II. Tramitação processual e pedidos das partes

III. Questão de direito

A. Quanto à omissão de determinados dados ao público

B. Quanto ao mérito

1. Quanto ao primeiro fundamento, relativo à violação dos direitos de defesa, do princípio da boa administração e da presunção de inocência

2. Quanto ao segundo fundamento, relativo à violação do artigo 48.o, n.o 2, da Carta e do artigo 27.o, n.os 1 e 2, do Regulamento n.o 1/2003

3. Quanto aos terceiro, quarto, quinto, sexto e sétimo fundamentos, na medida em que visam a conclusão da Comissão relativa à existência de uma infração única e continuada e à sua imputação à Scania

a) Observações preliminares

1) Quanto ao conceito de infração única e continuada

2) Quanto ao ónus e ao nível da prova

3) Decisão impugnada

4) Quanto ao argumento das recorrentes de que o conceito de infração única e continuada pressupõe que a Comissão identifique várias infrações manifestamente relacionadas entre si

b) Quanto ao terceiro fundamento, relativo à aplicação errada do artigo 101.o TFUE e do artigo 53.o do Acordo EEE na medida em que as trocas de informações a nível inferior ao da sede foram consideradas constitutivas de uma infração a essas disposições

1) Decisão impugnada

2) Quanto à primeira objeção

3) Quanto à segunda objeção

c) Quanto ao quarto fundamento, relativo à violação do dever de fundamentação e à aplicação errada do artigo 101.o TFUE e do artigo 53.o do Acordo EEE na medida em que a Comissão considerou que as recorrentes tinham celebrado um acordo ou participado numa prática concertada sobre o calendário e a comercialização das tecnologias em matéria de emissões

1) Quanto à primeira parte do quarto fundamento, relativo à violação do dever de fundamentação

2) Quanto à segunda parte do quarto fundamento, relativa à aplicação errada do artigo 101.o TFUE e do artigo 53.o do Acordo EEE na medida em que a Comissão considerou que as recorrentes tinham celebrado um acordo ou tinham participado numa prática concertada quanto ao calendário de comercialização no mercado das tecnologias em matéria de emissões

3) Quanto à terceira parte do quarto fundamento, relativa ao facto de as trocas de informações sobre o calendário de instalação das tecnologias em matéria de emissões não constituir uma infração por objeto

d) Quanto ao quinto fundamento, relativo a uma errada aplicação do artigo 101.o TFUE e do artigo 53.o do Acordo EEE, na medida em que a Comissão qualificou as trocas de informações ao nível alemão de infração «por objeto»

1) Observações preliminares

2) Quanto ao conteúdo das informações trocadas

i) Quanto às alterações previstas dos preços brutos e das tabelas de preços brutos e ao calendário dessas alterações, referidas no considerando 238, alínea a), da decisão impugnada

– Quanto ao argumento das recorrentes relativo ao caráter atual ou futuro da informação trocada ao nível alemão

– Quanto ao argumento das recorrentes relativo ao caráter público dos preços brutos objeto de troca de informações ao nível alemão

– Quanto ao argumento das recorrentes relativo à falta de valor informativo dos preços brutos objeto de troca de informações ao nível alemão sobre os preços efetivamente aplicados nas transações do mercado

ii) Quanto às alterações previstas dos preços líquidos e dos descontos oferecidos aos clientes, referidos no considerando 238, alínea a), da decisão impugnada

iii) Quanto à repercussão dos custos relativos à comercialização das tecnologias em matéria de emissões para os camiões médios e pesados, exigidas pelas normas Euro 3 a Euro 6, referida no considerando 238, alínea b), da decisão impugnada

iv) Quanto à troca de outras informações comercialmente sensíveis, referida no considerando 238, alínea c), da decisão impugnada

3) Quanto ao objetivo das trocas de informações ao nível alemão

4) Quanto ao contexto da troca de informações ao nível alemão

e) Quanto ao sexto fundamento, relativo a uma aplicação errada do artigo 101.o TFUE e do artigo 53.o do Acordo EEE na medida em que a Comissão considerou que o âmbito geográfico da infração relativa ao nível alemão abrangia todo o território do EEE

1) Quanto ao alcance geográfico das informações obtidas pela Scania DE

2) Quanto ao alcance geográfico das informações prestadas pela Scania DE

f) Quanto ao sétimo fundamento, relativo a uma aplicação errada do artigo 101.o TFUE e do artigo 53.o do Acordo EEE na medida em que a Comissão considerou que o comportamento identificado constituía uma infração única e continuada e que as recorrentes eram responsáveis a esse respeito

1) Quanto à existência, no caso em apreço, de uma infração única e continuada

i) Observações preliminares

ii) Decisão impugnada

iii) Apreciação

– Quanto à avaliação de conjunto dos três níveis dos contactos

– Quanto à natureza das informações trocadas no âmbito dos três níveis dos contactos

– Quanto ao caráter continuado da infração

2) Quanto à imputabilidade da infração única e continuada à Scania

4. Quanto ao oitavo fundamento, relativo a uma aplicação errada do artigo 101.o TFUE, do artigo 53.o do Acordo EEE e do artigo 25.o do Regulamento n.o 1/2003, na medida em que a Comissão aplicou uma coima que incide sobre um comportamento sujeito a prescrição e, em qualquer caso, não tomou em consideração o facto de o referido comportamento não ser continuado

5. Quanto ao nono fundamento, relativo à violação do princípio de proporcionalidade e do princípio de igualdade de tratamento no que respeita ao montante da coima, e, em qualquer caso, quanto à necessidade de uma redução do montante da coima nos termos do artigo 261.o TFUE e do artigo 31.o do Regulamento n.o 1/2003

a) Quanto à violação do princípio da proporcionalidade

b) Violação do princípio da igualdade de tratamento

c) Quanto ao montante da coima

IV. Quanto às despesas


*      Língua do processo: inglês.


1 Dados confidenciais ocultados.