Language of document : ECLI:EU:T:2015:746

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção)

6 de outubro de 2015 (*)

«Comparticipação financeira — Sexto programa‑quadro de investigação, desenvolvimento tecnológico e demonstração — Recuperação das quantias pagas pela Comissão no âmbito de um contrato de investigação de acordo com as conclusões de uma auditoria financeira — Compensação de créditos — Requalificação parcial do recurso — Pedido de declaração da inexistência de um crédito contratual — Cláusula compromissória — Custos elegíveis — Enriquecimento sem causa — Dever de fundamentação»

No processo T‑216/12,

Technion — Israel Institute of Technology, com sede em Haifa (Israel),

Technion Research & Development Foundation Ltd, com sede em Haifa,

representados por D. Grisay, advogado,

recorrentes,

contra

Comissão Europeia, representada por D. Calciu e F. Moro, na qualidade de agentes, assistidas inicialmente por L. Defalque e S. Woog, e em seguida por L. Defalque e J. Thiry, advogados,

recorrida,

que tem por objeto, por um lado, um pedido de anulação, com base no artigo 263.° TFUE, da decisão de compensação da Comissão que consta da carta de 13 de março de 2012 dirigida ao Technion — Israel Institute of Technology com vista à recuperação da quantia de 97 118,69 euros, correspondente ao montante das quantias ajustadas, acrescidas de juros, para o contrato n.° 034984 (Mosaica), na sequência das conclusões de uma auditoria financeira relativa, nomeadamente, a esse contrato celebrado no âmbito do sexto programa‑quadro da Comunidade Europeia de ações em matéria de investigação, desenvolvimento tecnológico e demonstração que visam contribuir para a realização do espaço europeu da investigação e para a inovação (2002‑2006), e, por outro, um pedido, com base no artigo 272.° TFUE, de declaração da inexistência do crédito que a Comissão alega deter contra a Technion, por força do contrato Mosaica, e que foi objeto da compensação controvertida,

O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção),

composto por: H. Kanninen, presidente, I. Pelikánová e E. Buttigieg (relator), juízes,

secretário: S. Bukšek Tomac, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 29 de abril de 2015,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

1        O artigo 71.°, n.os 1 a 3, do Regulamento (CE, Euratom) n.° 1605/2002 do Conselho, de 25 de junho de 2002, que institui o Regulamento Financeiro aplicável ao orçamento geral das Comunidades Europeias (JO L 248, p. 1) (a seguir «Regulamento Financeiro»), dispõe:

«1. O apuramento de um crédito é o ato pelo qual o gestor orçamental delegado ou subdelegado:

a)      Verifica a existência das dívidas do devedor;

b)      Determina ou verifica a veracidade e o montante da dívida;

c)      Verifica as condições de exigibilidade da dívida.

2. Os recursos próprios postos à disposição da Comissão, bem como qualquer crédito apurado como certo, líquido e exigível, devem ser objeto de uma ordem de cobrança emitida ao contabilista, seguida de uma nota de débito dirigida ao devedor, sendo ambos os documentos elaborados pelo gestor orçamental competente.

3. Os montantes pagos indevidamente são objeto de recuperação.»

2        Nos termos do artigo 73.°, n.° 1, do Regulamento Financeiro:

«O contabilista regista as ordens de cobrança dos créditos devidamente emitidas pelo gestor orçamental competente. Deve diligenciar no sentido de assegurar a cobrança das receitas das Comunidades e velar pela conservação dos respetivos direitos.

O contabilista procederá à cobrança por compensação junto de qualquer devedor que seja simultaneamente titular de um crédito certo, líquido e exigível perante as Comunidades, até ao limite das dívidas desse devedor às Comunidades.»

3        De acordo com o artigo 79.° do Regulamento (CE, Euratom) n.° 2342/2002 da Comissão, de 23 de dezembro de 2002, que estabelece as normas de execução do Regulamento Financeiro (JO L 357, p. 1):

«Para efeitos de apuramento de um crédito, o gestor orçamental assegura‑se:

a)      Do caráter certo do crédito, que não deve estar sujeito a qualquer condição;

b)      Do caráter líquido do crédito, cujo montante deve ser determinado em numerário e com exatidão;

c)      Do caráter exigível do crédito, que não deve estar sujeito a um termo;

[…]».

4        Segundo o artigo 83.° do Regulamento n.° 2342/2002, conforme alterado pelo Regulamento (CE, Euratom) n.° 1248/2006 da Comissão, de 7 de agosto de 2006 (JO L 227, p. 3):

«1. Se o devedor for titular, face às Comunidades, de um crédito apurado como certo, líquido e exigível e que tenha por objeto um montante apurado por uma ordem de pagamento, o contabilista procederá, decorrido o prazo referido no n.° 3, alínea b), do artigo 78.°, à cobrança por compensação do crédito apurado.

[…]

3. A compensação referida no n.° 1 terá os mesmos efeitos de um pagamento liberatório para as Comunidades relativamente ao montante da dívida e aos juros eventualmente devidos.»

5        Os recorrentes, Technion — Israel Institute of Technology e Technion Research & Development Foundation Ltd (a seguir «TRDF»), são duas entidades com atividade no ensino e na investigação. Mais em particular, o Technion é um instituto superior de educação em tecnologia, criado em 1912, ao passo que a TRDF, criada em 1952, é uma fundação, totalmente pertencente ao Technion e por ele integralmente financiada, que gere os aspetos financeiro e administrativo dos projetos em que o Technion intervém.

6        Em dezembro de 2003 e em julho de 2006, o Technion, como membro dos vários consórcios de contratantes, celebrou com a Comissão das Comunidades Europeias, que atuava por conta da Comunidade Europeia, quatro contratos no âmbito do sexto programa‑quadro da Comunidade Europeia de ações em matéria de investigação, desenvolvimento tecnológico e demonstração que visam contribuir para a realização do espaço europeu da investigação e para a inovação (2002‑2006), a saber, o contrato Terregov, assinado em 3 de dezembro de 2003 e com o número 507749, o contrato Cocoon, assinado em 11 de dezembro de 2003 e com o número 507126, o contrato Qualeg, assinado em 17 de dezembro de 2003 e com o número 507767, e ainda o contrato Mosaica, assinado em 24 de julho de 2006 e com o número 034984.

7        O contrato Mosaica tinha por objeto a realização de um projeto intitulado «Acesso colaborativo, semanticamente reforçado e multifacetado ao património cultural (Mosaica)» [Semantically Enhanced, Multifaceted, Collaborative Access to Cultural Heritage (Mosaica)], que consistia num conjunto de trabalhos descritos no anexo I do contrato (a seguir «projeto»). Segundo o artigo 4.°, n.° 2, do contrato Mosaica, a duração da execução do projeto era de 30 meses a contar de 1 de junho de 2006.

8        Segundo o artigo 5.° do contrato Mosaica, a Comunidade tinha‑se obrigado a contribuir financeiramente para o projeto sob a forma de subvenção para o orçamento.

9        O artigo 12.° do contrato Mosaica designava como direito aplicável o direito luxemburguês. Por outro lado, o seu artigo 13.° estipulava que os tribunais da União Europeia, o Tribunal de Justiça ou o Tribunal Geral, tinham competência exclusiva para conhecer de qualquer litígio entre as partes relativo à validade, à execução ou à interpretação do contrato Mosaica.

10      Segundo o artigo 14.° do contrato Mosaica, as condições gerais que constam do seu anexo II (a seguir «condições gerais FP6») faziam parte integrante do mesmo.

11      O artigo II.19, n.° 1, das condições gerais FP6 estipulava o seguinte:

«Os custos elegíveis resultantes da execução do projeto devem preencher as seguintes condições:

a)      devem ser reais, económicos e necessários para a execução do projeto e

[…]

d)      devem estar registados na contabilidade do contratante que os suportou […] Os procedimentos contabilísticos utilizados para registar os custos e as receitas devem respeitar as regras contabilísticas do Estado‑Membro em que está estabelecido o contratante e permitir o confronto direto entre os custos e as receitas resultantes da execução do projeto e as declarações de conjunto relativas a toda a atividade do contratante […]»

12      O artigo II.19, n.° 2, das condições gerais FP6 definia os custos não elegíveis que não podiam ser imputados ao projeto. Entre eles figuravam, alínea e), os custos declarados, suportados ou reembolsados relativamente a outro projeto comunitário e, alínea i), qualquer outro custo que não preenchesse as condições previstas no artigo II.19, n.° 1.

13      O artigo II.20, n.° 1, das condições gerais FP6 definia os custos diretos como todos os custos que preenchessem as condições do artigo II.19 acima mencionado, que pudessem ser identificados pelo contratante em conformidade com o seu sistema contabilístico e que pudessem ser atribuídos diretamente ao projeto.

14      O artigo II.24, n.° 1, alínea a), das condições gerais FP6 estipulava, nomeadamente, que, quando a Comunidade contribuía para o projeto através de um subvenção para o orçamento, a sua contribuição devia basear‑se no reembolso dos custos elegíveis reclamados pelos contratantes.

15      O artigo II.29, n.° 1, das condições gerais FP6 precisava, nomeadamente, que a Comissão podia, em qualquer momento da vigência do contrato e até cinco anos depois do final do projeto, mandar proceder a auditorias relativas aos aspetos científicos, financeiros ou tecnológicos quanto à boa execução do projeto e do contrato. Segundo essa cláusula, os montantes devidos à Comissão em razão dos resultados dessas auditorias podiam ser objeto de recuperação nos termos do artigo II.31 das condições gerais FP6.

16      O artigo II.31, n.° 3, das condições gerais FP6 estipulava que a recuperação poderia ser feita por compensação com as quantias devidas ao contratante, depois de este ter sido informado, ou através da execução de uma garantia financeira. Não era necessário o acordo prévio do contratante.

17      Por ofício de 29 de abril de 2009, a Comissão informou o Technion da sua decisão de efetuar uma auditoria financeira relativa aos custos reclamados no âmbito dos contratos Mosaica, Cocoon e Qualeg, nos termos do artigo II.29 das condições gerais FP6. A auditoria seria efetuada por uma sociedade de auditoria externa à Comissão (a seguir «auditor»), que atuaria como seu representante.

18      Em 10 de maio de 2010, o auditor comunicou ao Technion um projeto de relatório de auditoria. Relativamente a cada um dos contratos Terregov, Cocoon, Qualeg e Mosaica, que vieram a ser auditados, o auditor propôs um ajustamento dos custos reclamado pelo Technion à Comissão.

19      No que respeita, em particular, aos contratos Cocoon, Terregov e Mosaica, os ajustamentos propostos respeitavam, nomeadamente, às despesas de pessoal reclamadas pelo Technion pela contribuição de K., que tinha sido contratado a título temporário pelo Technion para a execução desses contratos. O auditor, em substância, considerou que não tinha a possibilidade de determinar o caráter real, na aceção do artigo II.19, n.° 1, alínea a), das condições gerais FP6, do tempo e dos custos declarados pelo Technion à Comissão relativamente às prestações de K. e expressou dúvidas quanto ao caráter real dessas prestações. Assim, concluiu pela rejeição, nomeadamente, de todos os custos diretos reclamados pelo Technion a título das prestações realizadas por K. no âmbito dos três contratos acima referidos. Quanto ao contrato Mosaica, esses custos diretos correspondiam a um montante de 81 487,38 euros.

20      Em 10 de junho de 2010, o Technion dirigiu uma carta ao auditor pedindo um prazo suplementar de quinze dias para apresentar os seus comentários sobre o projeto de relatório de auditoria. Pediu igualmente ao auditor que lhe fornecesse todas as informações relativas às prestações efetuadas por K. a favor de outras entidades diferentes do Technion, apesar de estar contratado por este a tempo inteiro.

21      Por ofício de 19 de julho de 2010, a Comissão concedeu a prorrogação de prazo pedida. Precisou igualmente que não tinha a possibilidade de fornecer as cópias dos documentos financeiros ou administrativos relativos às prestações realizadas por K. a favor de outras entidades diferentes do Technion, devido ao seu caráter confidencial.

22      Par carta de 13 de agosto de 2010, o Technion contestou o caráter confidencial dos documentos acima referidos e pediu, pelo menos, um acesso parcial aos mesmos. Precisou ainda por acréscimo que os elementos mencionados no projeto de relatório de auditoria e no ofício da Comissão de 19 de julho de 2010 não faziam prova bastante dos factos imputados a K.

23      A Comissão respondeu por ofício de 4 de outubro de 2010. Nesse ofício, indicou que, quanto aos projetos financiados pela União em que o Technion era parte e relativamente aos quais outras entidades tinham reclamado montantes correspondentes a prestações realizadas por K., podia fazer chegar ao Technion uma cópia dos relatórios de gestão de projeto (project management reports, a seguir «PMR») pelo facto de estes terem sido redigidos por consórcios de que o Technion era membro e de, portanto, o respetivo conteúdo ser do seu conhecimento. Assim, a Comissão anexou ao ofício o terceiro PMR do projeto Qualeg e o primeiro PMR do projeto Mosaica.

24      Em contrapartida, a Comissão indicou que os documentos obtidos no âmbito de auditorias efetuadas junto de membros de outros consórcios, relativos a projetos em que o Technion não participava, e os documentos obtidos no âmbito de um inquérito estavam abrangidos pela exceção prevista no artigo 4.° do Regulamento (CE) n.° 1049/2001 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de maio de 2001, relativo ao acesso do público aos documentos do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão (JO L 145, p. 43), que tem por objeto a proteção dos objetivos de atividades de inspeção, inquérito e auditoria.

25      Por último, a Comissão concedeu ao Technion um prazo suplementar de quinze dias contados a partir da receção do ofício de 4 de outubro de 2010, para poder analisar os dois documentos a ele anexos.

26      Por carta de 18 de outubro de 2010, o Technion apresentou um pedido confirmativo de acesso aos documentos em causa.

27      Por carta de 19 de outubro de 2010 dirigida à Comissão, o Technion salientou que a posição desta não lhe permitia formular observações quanto ao conteúdo dos documentos com base nos quais o projeto de relatório de auditoria tinha concluído pela rejeição de todas as despesas ligadas ao pagamento de K. e ia contra os princípios do direito de defesa e do contraditório. O Technion acrescentou que os elementos de informação transmitidos pela Comissão nos ofícios de 19 de julho e 4 de outubro de 2010 e ainda o projeto de relatório de auditoria não faziam prova bastante dos factos imputados a K. Por último, o Technion indicou que aguardava uma proposta de data para a fixação da reunião de encerramento do procedimento de auditoria.

28      Por ofício de 26 de outubro de 2010, o Secretariado‑Geral da Comissão acusou a receção do pedido confirmativo do Technion de acesso aos documentos e informou‑o de que lhe seria enviada uma resposta nos próximos quinze dias úteis.

29      Por cartas de 18 de novembro e 9 de dezembro de 2010, o Secretariado‑Geral da Comissão anunciou que teria de prorrogar o prazo previsto no artigo 8.°, n.° 1, do Regulamento n.° 1049/2001 para responder ao pedido de acesso aos documentos.

30      Por decisão de 30 de junho de 2011, o secretário‑geral da Comissão confirmou a recusa de acesso do Technion aos documentos.

31      Por ofício de 2 de agosto de 2011, a Comissão indicou ao Technion que confirmava as conclusões do relatório de auditoria relativas aos ajustamentos necessários a fazer, anexando uma cópia desse relatório, e que considerava encerrada a auditoria. Nesse ofício, a Comissão precisou que o Technion tinha tido a oportunidade de apresentar as suas observações mesmo não o tendo feito oficialmente e que, não obstante, compreendia que o Technion não estava totalmente de acordo com as conclusões do relatório de auditoria. A Comissão precisou igualmente que os ajustamentos seriam feitos posteriormente em face de pagamentos futuros ou através da recuperação de créditos.

32      Por ofício de 26 de agosto de 2011, não deixando de contestar as conclusões do relatório de auditoria, os recorrentes informaram a Comissão da sua intenção de recorrerem da decisão de 30 de junho de 2011 e pediram a suspensão do procedimento de auditoria até decisão judicial.

33      Em 9 de setembro de 2011, os recorrentes interpuseram recurso de anulação da decisão de 30 de junho de 2011, registado sob a referência T‑480/11. Foi negado provimento a esse recurso por acórdão de 12 de maio de 2015, Technion e Technion Research & Development Foundation/Comissão (T‑480/11, Colet., EU:T:2015:272).

34      Por ofício de 22 de setembro de 2011, a Comissão respondeu aos recorrentes que não podia deferir o seu pedido de suspensão do procedimento de auditoria, na medida em que os documentos que lhe tinham sido comunicados faziam prova bastante da falta de fiabilidade dos tempos e custos declarados pelo Technion.

35      Em 11 de outubro de 2011, os recorrentes interpuseram recurso de anulação da decisão alegadamente contida no ofício da Comissão de 2 de agosto de 2011, registado sob a referência T‑546/11. Esse recurso foi julgado inadmissível por despacho de 14 de junho de 2012, Technion e Technion Research & Development Foundation/Comissão (T‑546/11, EU:T:2012:303).

36      Por ofício de 19 de outubro de 2011, a Comissão informou o Technion da sua intenção de recuperar o montante de 97 106,72 euros, correspondente ao montante total ajustado para o contrato Mosaica na sequência do relatório de auditoria. Nesse ofício precisava‑se que, na falta de outras observações do Technion no prazo de duas semanas, a Comissão lhe enviaria uma nota de débito. Precisava‑se ainda que as quantias devidas à Comissão e os juros de mora podiam ser objeto de compensação ou de um procedimento de recuperação coerciva.

37      Por ofício de 2 de novembro de 2011, os recorrentes pediram à Comissão que suspendesse o procedimento de recuperação até decisão judicial no processo T‑546/11.

38      Em 21 de dezembro de 2011, os recorrentes interpuseram recurso de anulação da decisão alegadamente contida no ofício da Comissão de 19 de outubro de 2011, registado sob a referência T‑657/11. Esse recurso foi julgado inadmissível por despacho de 6 de setembro de 2012, Technion e Technion Research & Development Foundation/Comissão (T‑657/11, EU:T:2012:411).

39      Em resposta, nomeadamente, à carta de 2 de novembro de 2011, a Comissão indicou, por ofício de 22 de dezembro de 2011, que, na falta de elementos capazes de alterar as conclusões do relatório de auditoria, não podia suspender as medidas de execução nem adiar a emissão da ordem de recuperação anunciada no seu ofício de 19 de outubro de 2011.

40      Em 19 de janeiro de 2012, a Comissão emitiu contra o Technion a nota de débito n.° 3241200225 no montante de 97 106,72 euros, fixando a data‑limite de pagamento em 5 de março de 2012.

41      Por ofício de 13 de março de 2012, a Comissão anunciou ao Technion a sua decisão de, no prazo de duas semanas e nos termos do artigo 73.°, n.° 1, do Regulamento Financeiro, proceder a uma compensação entre o montante de 130 000 euros que devia ao Technion por força dos três contratos com as referências PCIG10‑GA‑2011‑303921‑NLO, PIRG05‑GA‑2009‑249084 AC Removal Mechanism e PCIG10‑GA‑2011‑304020‑CHAMP RNA HEL e o montante de 97 118,69 euros que o Technion lhe devia por força do contrato Mosaica, acrescido de juros de mora (a seguir «decisão recorrida»). A nota de débito de 19 de janeiro de 2012 estava anexa a esse ofício.

 Tramitação do processo e pedidos das partes

42      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 18 de maio de 2012, os recorrentes interpuseram o presente recurso, com base no artigo 263.° TFUE, que tem por objeto um pedido de anulação da decisão recorrida.

43      Na sequência de tréplica da Comissão, os recorrentes, por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 25 de dezembro de 2012, pediram autorização para responder à tréplica, a fim de retificarem um erro material contido na réplica e explicarem a razão pela qual esse erro não afetava a sua argumentação.

44      Por decisão de 11 de janeiro de 2013, o presidente da Primeira Secção do Tribunal Geral autorizou os recorrentes a responderem à tréplica, limitando a sua resposta aos elementos referidos na carta de 25 de dezembro de 2012.

45      Os recorrentes apresentaram a sua resposta à tréplica em 6 de fevereiro de 2013, tendo a Comissão apresentado as suas observações sobre o articulado complementar dos recorrentes em 8 de março de 2013.

46      Com base no relatório do juiz‑relator, o Tribunal Geral (Primeira Secção) deu início à fase oral e, no âmbito das medidas de organização do processo previstas no artigo 64.° do Regulamento de Processo do Tribunal Geral de 2 de maio de 1991, apresentou questões escritas às partes, que responderam no prazo previsto.

47      Na audiência de 29 de abril de 2015, foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às questões colocadas pelo Tribunal Geral.

48      Os recorrentes concluem pedindo ao Tribunal que se digne:

–        anular a decisão recorrida;

–        condenar a Comissão nas despesas.

49      Na réplica, os recorrentes pedem ainda ao Tribunal que condene a Comissão a pagar ao Technion os montantes indevidamente retidos pela decisão recorrida.

50      A Comissão conclui pedindo ao Tribunal que se digne:

–        julgar inadmissível o recurso no respeitante à TRDF;

–        julgar o recurso improcedente no respeitante ao Technion;

–        condenar os recorrentes nas despesas.

51      Na tréplica, a Comissão pede ao Tribunal que julgue inadmissível o pedido deduzido pelos recorrentes na réplica.

 Questão de direito

 Quanto ao objeto do recurso

52      O presente recurso baseia‑se no artigo 263.° TFUE e, como expressamente se indica na parte introdutória e no pedido da petição, tem formalmente por objeto um pedido de anulação da decisão recorrida. Os recorrentes apresentam, em substância, três fundamentos de recurso, um «fundamento relativo a erro manifesto de apreciação da Comissão», um fundamento relativo à falta de fundamentação da decisão recorrida e um fundamento relativo a uma violação do princípio da proibição do enriquecimento sem causa.

53      A base expressa do recurso no artigo 263.° TFUE e os títulos dos fundamentos invocados em apoio do mesmo levam o Tribunal Geral a exercer a competência em matéria de fiscalização da legalidade da decisão recorrida. Quanto à natureza dessa decisão, há que recordar que um ato, como a decisão recorrida, pelo qual a Comissão procede a uma compensação extrajudicial entre dívidas e créditos resultantes de diferentes relações jurídicas com a mesma pessoa constitui um ato recorrível na aceção do artigo 263.° TFUE (v., neste sentido, acórdãos de 10 de julho de 2003, Comissão/CCRE, C‑87/01 P, Colet., EU:C:2003:400, n.° 45; de 8 de outubro de 2008, Helkon Media/Comissão, T‑122/06, EU:T:2008:418, n.° 46; e de 8 de novembro de 2011, Walton/Comissão, T‑37/08, Colet., EU:T:2011:640, n.° 25). É em sede desse recurso de anulação que deve o Tribunal Geral conhecer da legalidade de uma decisão de compensação à luz dos seus efeitos relativos ao não pagamento efetivo das quantias em causa ao recorrente (v., neste sentido, acórdãos Helkon Media/Comissão, já referido, EU:T:2008:418, n.° 46, e Walton/Comissão, já referido, EU:T:2011:640, n.° 25).

54      Não obstante, há que observar que se deve entender que os recorrentes, ao suscitarem o «fundamento relativo a erro manifesto de apreciação da Comissão», pedem ao Tribunal Geral que declare, com base no artigo 272.° TFUE, a inexistência da crédito que a Comissão alega deter contra o Technion, por força do contrato Mosaica, e que foi objeto da compensação em causa (a seguir «crédito contratual controvertido»). Os recorrentes contestam nomeadamente a conclusão do relatório de auditoria a propósito do caráter «irreal», na aceção do artigo II.19, n.° 1, alínea a), das condições gerais FP6, das prestações de K. e, para corroborarem a sua argumentação, juntaram à petição cópias dos contratos celebrados entre o Technion e a Comissão, nomeadamente uma cópia do contrato Mosaica.

55      Assim, o presente recurso visa, na realidade, obter não só a anulação da decisão recorrida mas igualmente a declaração pelo Tribunal Geral de que a Comissão não detém o crédito contratual controvertido contra o Technion.

56      Na sua resposta a uma questão escrita do Tribunal Geral (v. n.° 46 supra), os recorrentes confirmaram essa compreensão de duplo objeto do recurso interposto, que consiste, mais especificamente, num pedido de anulação da decisão recorrida e numa ação declarativa no sentido de o Tribunal Geral declarar a inexistência do crédito contratual controvertido.

57      Na medida em que, por um lado, em sede de recurso de anulação com base no artigo 263.° TFUE, o juiz da União não tem competência para conhecer de ações declarativas (v., neste sentido, despacho de 9 de dezembro de 2003, Itália/Comissão, C‑224/03, EU:C:2003:658, n.os 20 e 21) e, por outro, o contrato Mosaica contém, no seu artigo 13.°, uma cláusula compromissória na aceção do artigo 272.° TFUE, que confere ao juiz da União a competência exclusiva para conhecer de qualquer litígio entre as partes relativo à validade, execução ou interpretação desse contrato, há que verificar se é possível, no caso, requalificar parcialmente o presente recurso tanto como recurso interposto com base no artigo 263.° TFUE dirigido à anulação da decisão recorrida como com base no artigo 272.° TFUE dirigido a que seja declarado que a Comissão não detém o crédito contratual controvertido. Com efeito, na medida em que o artigo 272.° TFUE erige o juiz da União em juiz de conhecimento pleno ao permitir‑lhe, por oposição a um juiz da legalidade nos termos do artigo 263.° TFUE, conhecer de qualquer tipo de ação por força de uma cláusula compromissória (v., neste sentido, acórdão de 26 de fevereiro de 2015, Planet/Comissão, C‑564/13 P, Colet., EU:C:2015:124, n.os 21 a 27, e conclusões da advogada‑geral J. Kokott no processo Planet/Comissão, C‑564/13 P, Colet., C:2014:2352, n.os 19 a 22), esse artigo 272.° TFUE constitui a base jurídica adequada para conhecer do pedido dos recorrentes de declaração da inexistência do crédito contratual controvertido.

58      Quanto à possibilidade de requalificar parcialmente o presente recurso como ação proposta com base no artigo 272.° TFUE, há que recordar que, segundo jurisprudência assente, quando conhece de um recurso de anulação ou de uma ação de indemnização, quando o litígio é, na realidade, de natureza contratual, o Tribunal Geral requalificará o recurso, se estiverem preenchidos os pressupostos dessa requalificação (acórdão de 19 de setembro de 2001, Lecureur/Comissão, T‑26/00, Colet., EU:T:2001:222, n.° 38; despacho de 10 de maio de 2004, Musée Grévin/Comissão, T‑314/03 e T‑378/03, Colet., EU:T:2004:139, n.° 88; e acórdão de 17 de junho de 2010, CEVA/Comissão, T‑428/07 e T‑455/07, Colet., EU:T:2010:240, n.° 57).

59      Em contrapartida, perante um litígio de natureza contratual, o Tribunal Geral considera‑se na impossibilidade de requalificar um recurso de anulação quer quando a vontade expressa da recorrente em não fundamentar o seu pedido no artigo 272.° TFUE se opõe a essa requalificação, quer quando o recurso não assenta num fundamento relativo à violação das normas que regem a relação contratual em causa, independentemente de serem cláusulas contratuais ou disposições da lei nacional indicada no contrato (v. acórdão CEVA/Comissão, n.° 58 supra, EU:T:2010:240, n.° 59 e jurisprudência aí referida).

60      Daí resulta que a requalificação do recurso é possível, sem que sejam afetados os direitos de defesa da instituição demandada, no caso de, por um lado, a vontade expressa da parte recorrente não se opor a isso e, por outro lado, pelo menos um fundamento relativo à violação das normas que regem a relação contratual em causa seja invocado na petição, de acordo com o disposto no artigo 44.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento de Processo de 2 de maio de 1991. Estes dois pressupostos são cumulativos (v., neste sentido, acórdão de 24 de outubro de 2014, Technische Universität Dresden/Comissão, T‑29/11, Colet., EU:T:2014:912, n.° 44).

61      No caso, por um lado, na sua resposta a uma questão escrita do Tribunal Geral (v. n.° 46 supra), os recorrentes deram o seu acordo quanto à requalificação parcial do recurso.

62      Por outro lado, como já acima se assinalou no n.° 54, os recorrentes impugnaram a existência do crédito contratual controvertido ao fazerem expressa referência ao artigo II.19, n.° 1, das condições gerais FP6.

63      Há que notar ainda que, na contestação, a Comissão fez uma apresentação detalhada do contrato Mosaica, realçando as estipulações que entendia relevantes para a decisão da causa. Por outro lado, desenvolveu a sua argumentação de que o Technion não tinha cumprido as obrigações que lhe impunha o artigo II.19 das condições gerais FP6, o qual, segundo a Comissão, limita a participação financeira da União aos custos elegíveis, a saber, os custos reais e justificados. Esta argumentação demonstra que a Comissão tinha compreendido que os recorrentes impugnavam, em substância, a existência do crédito contratual controvertido e tinha podido, portanto, assegurar a sua defesa de forma efetiva na contestação. Além disso, na audiência, a Comissão afirmou que, no caso de uma requalificação parcial do recurso, os seus direitos de defesa não seriam afetados.

64      Em contrapartida, na audiência, a Comissão expressou o seu desacordo com a requalificação parcial do recurso.

65      Em particular, em primeiro lugar, a Comissão alegou que, como resulta dos acórdãos Comissão/CCRE, n.° 53 supra (EU:C:2003:400), e Helkon Media/Comissão, n.° 53 supra (EU:T:2008:418), a validade de uma decisão de compensação só pode ser posta em causa no âmbito do artigo 263.° TFUE.

66      Esta argumentação não põe em causa a requalificação parcial no presente caso, na medida em que o objetivo dessa requalificação não é permitir que o Tribunal Geral analise a validade da decisão recorrida. Essa análise pode ser efetuada, sem requalificação, com base no artigo 263.° TFUE, que constitui a base jurídica expressa do recurso interposto. Em contrapartida, a requalificação parcial feita no presente caso destina‑se a permitir ao Tribunal Geral conhecer da ação declarativa dos recorrentes dirigida à declaração da inexistência do crédito contratual controvertido. Essa possibilidade de requalificação parcial de modo nenhum é posta em causa pelos acórdãos Comissão/CCRE, n.° 53 supra (EU:C:2003:400), e Helkon Media/Comissão, n.° 53 supra (EU:T:2008:418), invocados pela Comissão.

67      Em segundo lugar, a Comissão invocou o facto de, nos despachos Technion e Technion Research & Development Foundation/Comissão, n.° 35 supra (EU:T:2012:303), e Technion e Technion Research & Development Foundation/Comissão, n.° 38 supra (EU:T:2012:411), o Tribunal Geral ter recusado requalificar os recursos de anulação respetivos como recursos baseados no artigo 272.° TFUE, não obstante os fundamentos desses recursos de anulação serem os mesmos que os do presente caso.

68      A este respeito, há que observar que não se pode estabelecer nenhum paralelismo entre os processos que deram origem aos despachos acima referidos e o presente processo. Nesses despachos, o Tribunal Geral declarou que as recorrentes não tinham apresentado, nem sequer de forma sumária, qualquer fundamento, argumento ou alegação de violação das disposições dos contratos em causa ou do direito nacional aplicável (despachos Technion e Technion Research & Development Foundation/Comissão, n.° 35 supra, EU:T:2012:303, n.os 62 a 65, e Technion e Technion Research & Development Foundation/Comissão, n.° 38 supra, EU:T:2012:411, n.os 58 a 60). Ora, na presente lide, como acima se refere nos n.os 54 e 62, os recorrentes alegaram essa violação das disposições contratuais. Daí resulta que as circunstâncias de direito e de facto que levaram o Tribunal Geral a não proceder à requalificação dos recursos nos processos que deram origem aos despachos acima mencionados são diferentes das circunstâncias na origem do presente processo.

69      Em terceiro e último lugar, a Comissão alegou que a requalificação no presente caso não era necessária na medida em que a fiscalização da legalidade do Tribunal Geral poderia estender‑se até à interpretação e à aplicação do contrato Mosaica. Para corroborar esta tese, por um lado, a Comissão estabeleceu um paralelismo entre a fiscalização da legalidade da decisão recorrida e a fiscalização da legalidade de uma decisão de atribuição de contratos públicos e alegou que, na medida em que, no âmbito desta última fiscalização, o julgador podia verificar o caderno de encargos, por analogia, em sede de fiscalização da legalidade da decisão recorrida, o julgador podia verificar o contrato Mosaica. Por outro lado, a Comissão invocou os acórdãos de 21 de setembro de 2011, Berliner Institut für Vergleichende Sozialforschung/Comissão (T‑34/08, EU:T:2011:504), de 28 de março de 2012, Berliner Institut für Vergleichende Sozialforschung/Comissão (T‑296/08, EU:T:2012:162), de 13 de setembro de 2013, Berliner Institut für Vergleichende Sozialforschung/Comissão (T‑73/08, EU:T:2013:433), e de 12 de dezembro de 2013, Berliner Institut für Vergleichende Sozialforschung/Comissão (T‑171/08, EU:T:2013:639), para alegar que, nesses acórdãos, o Tribunal Geral tinha analisado os contratos em causa em sede de fiscalização da legalidade dos atos recorridos.

70      A este respeito, antes de mais, há que rejeitar o paralelismo feito pela Comissão entre a presente lide e o contencioso relativo aos contratos públicos, na medida em que o caderno de encargos não constitui um contrato no âmbito de um procedimento de concurso. Seguidamente, quanto à referência feita pela Comissão, em termos gerais e abstratos, à jurisprudência acima mencionada no n.° 69, esta não demonstra que a requalificação parcial do recurso, no caso, seria impossível ou inoportuna, apesar de essa requalificação preencher os pressupostos cumulativos previstos a seu respeito na jurisprudência assente acima referida nos n.os 58 a 60.

71      Em face destas considerações, há que requalificar parcialmente o presente recurso como recurso interposto com base no artigo 263.° TFUE, com vista à anulação da decisão recorrida, e também como ação proposta com base no artigo 272.° TFUE, com vista à declaração de que a Comissão não detém o crédito contratual controvertido.

72      Há que examinar primeiro a parte do recurso baseada no artigo 272.° TFUE.

 Quanto ao pedido de declaração da inexistência do crédito contratual controvertido

73      A título preliminar, há que precisar que, no que respeita ao pedido de declaração de inexistência do crédito contratual controvertido, o recurso é admissível unicamente no que respeita ao Technion. Visto a TRDF não ser parte no contrato Mosaica que contém a cláusula compromissória, o recurso, no que respeita ao pedido acima referido, não é admissível na medida em que é interposto por essa entidade (v., neste sentido, acórdão de 16 de dezembro de 2010, Comissão/Arci Nuova associazione comitato di Cagliari e Gessa, T‑259/09, EU:T:2010:536, n.° 40 e jurisprudência aí referida). De resto, os recorrentes admitiram, na audiência, a inadmissibilidade do recurso, na parte baseada no artigo 272.° TFUE, no que respeita à TRDF.

74      Quanto ao mérito, o Technion contesta em juízo a conclusão do auditor, confirmada pela Comissão, relativa au caráter «irreal», na aceção do artigo II.19, n.° 1, alínea a), das condições gerais FP6, dos custos reclamados à Comissão a título das prestações de K. A este respeito, o Technion alega que os documentos à sua disposição e, em particular, o primeiro PMR do projeto Mosaica, que lhe foi comunicado pela carta de 4 de outubro de 2010, não demonstram que K. tivesse trabalhado simultaneamente para várias entidades no âmbito do projeto Mosaica. Neste contexto, o Technion alega igualmente que, no âmbito do procedimento de auditoria, os seus direitos de defesa foram violados, na medida em que a Comissão recusou dar‑lhe acesso aos documentos em que o auditor tinha, alegadamente, baseado as suas conclusões. Assim, o Technion ficou impossibilitado de apresentar utilmente o seu ponto de vista.

75      A Comissão contesta esta argumentação.

76      Há que recordar que o auditor concluiu pela inelegibilidade de todos os custos diretos reclamados pelo Technion à Comissão relativos às prestações de K., pelo facto de não ter a possibilidade de apurar o caráter real, na aceção do artigo II.19, n.° 1, alínea a), das condições gerais FP6, desses custos e de ter dúvidas a respeito desse caráter real.

77      Em primeiro lugar, o auditor detetou uma série de falhas relativas aos descritivos do tempo de trabalho (timesheets) de K. que punham em dúvida a veracidade do seu conteúdo. Primeiro, esses descritivos eram todos assinados de uma só vez, na mesma data e retroativamente para o ano anterior. Segundo, alguns descritivos não estavam assinados pelo gestor do projeto (project manager). Terceiro, as horas de trabalho registadas por K. pareciam horas orçamentadas (budgeted hours) e não horas reais (atual hours), na medida em que eram as mesmas por cada dia durante todo o período auditado.

78      Em segundo lugar, com base em informações fornecidas pela Comissão e com base na sua auditoria, o auditor verificou que K. trabalhava simultaneamente para outras entidades para além do Technion. Ora, conforme apurou o auditor, os contratos celebrados entre K. e o Technion demonstravam que K. era empregado a tempo inteiro por essa entidade. Por outro lado, o auditor foi informado durante a auditoria de que os contratos celebrados entre o Technion e K. não permitiam a este último trabalhar simultaneamente para outras entidades sem disso notificar o Technion. Ora, segundo as informações à disposição do auditor, K. não tinha notificado o Technion.

79      Com base nestes elementos, o auditor expressou dúvidas quanto ao caráter real do tempo e dos custos declarados pelo Technion à Comissão relativos às prestações de K. e concluiu que não tinha a possibilidade de apurar esses caráter real. Considerou igualmente que o Technion também não tinha a possibilidade de demonstrar esse caráter real. Propôs, assim, a rejeição de todos os custos diretos reclamados relativos ao trabalho de K.

80      Há que notar que em nenhum momento o Technion impugnou as considerações do auditor relativas à falta de fiabilidade dos descritivos do tempo de trabalho de K. e, de forma mais geral, à sua impossibilidade de demonstrar o caráter real das suas prestações no âmbito de diversos projetos em que participava o Technion e, em particular, no âmbito do projeto Mosaica. Pelo contrário, o Technion limitou‑se a impugnar a observação de que K. tinha trabalhado simultaneamente para outras entidades.

81      A esse respeito, há que observar que, como resulta, em particular, do artigo 19.°, n.° 1, alíneas a) e d), e do artigo 20.°, n.° 1, das condições gerais FP6, os métodos de registo e de certificação do tempo de trabalho utilizados pelo contratante devem permitir que a Comissão verifique se os custos declarados representam encargos reais, correspondem à racionalidade económica, são necessários à realização do projeto e podem‑lhe ser diretamente atribuídos.

82      É pacífico que os descritivos do tempo de trabalho do pessoal empregue no âmbito de um projeto constituem um meio que permite à Comissão proceder aos controlos acima referidos e que devem, por isso, ser fiáveis. Resulta igualmente da jurisprudência que o desrespeito da obrigação de apresentar, na auditoria financeira, descritivos de tempo de trabalho fiáveis para demonstrar os custos de pessoal declarados constitui um motivo suficiente para rejeitar a totalidade desses custos (v., neste sentido, acórdãos de 22 de maio de 2007, Comissão/IIC, T‑500/04, Colet., EU:T:2007:146, n.os 114 a 117, e CEVA/Comissão, n.° 58 supra, EU:T:2010:240, n.° 139 e jurisprudência aí referida).

83      No caso, na falta de impugnação do Technion a esse respeito, há que confirmar a conclusão do auditor de que os três elementos acima identificados no n.° 77 retiravam a fiabilidade aos descritivos do tempo de trabalho de K. e, portanto, privavam a Comissão de um instrumento de verificação da elegibilidade dos custos declarados.

84      Por outro lado, há que observar que em nenhum momento o Technion apresentou elementos de prova do caráter real das prestações de K. e que, de uma forma mais geral, pusessem em causa a consideração do auditor de que o Technion não tinha a possibilidade de assegurar que os custos declarados relativamente às prestações de K. eram reais. Ora, como já recordou o juiz da União num processo relativo ao sexto programa‑quadro, os cocontratantes da Comissão estão sujeitos à obrigação de poderem demonstrar a realidade das despesas que declaram como elegíveis a um financiamento pelo orçamento da União e que essa obrigação resulta da necessidade, que lhes incumbe, de provar que está preenchida a condição da elegibilidade dos encargos, prevista no artigo II.19, n.° 1, das condições gerais FP6 (acórdão de 2 de outubro de 2012, ELE.SI.A/Comissão, T‑312/10, EU:T:2012:512, n.° 115).

85      O Technion limitou‑se a alegar que os elementos de informação que lhe tinham sido comunicados, nomeadamente o relatório de auditoria e o primeiro PMR do projeto Mosaica, não demonstravam que K. tivesse trabalhado simultaneamente para várias entidades no âmbito desse projeto.

86      Antes de mais, há que observar que essa argumentação não é suscetível de demonstrar a fiabilidade dos descritivos do tempo de trabalho de K. nem, de uma forma mais geral, a existência no Technion de um sistema de controlo que permitisse à Comissão verificar a conformidade dos custos declarados com os requisitos previstos no artigo II.19, n.° 1, alínea a), das condições gerais FP6 (v. n.° 84 supra). Essa argumentação é, portanto, inoperante.

87      De qualquer forma, os PMR comunicados ao Technion, lidos em conjugação com os elementos de informação contidos no relatório final de auditoria, demonstram que outras entidades para além do Technion declaravam horas e custos por prestações fornecidas por K. em períodos em que era suposto este trabalhar a tempo inteiro no Technion (v. n.° 78 supra). Esta circunstância era suscetível de pôr em dúvida o caráter real de todas as horas e custos declarados relativamente a K., tendo em conta, igualmente, a falta de fiabilidade dos seus descritivos de tempo de trabalho. A argumentação do Technion limitou‑se a um conjunto de deduções abstratas e arbitrárias, sem corroboração por qualquer elemento probatório que demonstrasse o caráter real das horas declaradas de K.

88      Há que rejeitar igualmente o argumento do Technion segundo o qual essa entidade respondeu de forma satisfatória às exigências do contrato Mosaica, efetuando as prestações «de forma ótima». Com efeito, há que recordar que, segundo um princípio fundamental que rege a concessão de contribuições financeiras da União, esta só pode subvencionar despesas efetivamente realizadas. Resulta deste princípio que não basta o beneficiário da ajuda demonstrar que foi realizado um projeto para justificar a atribuição de uma subvenção específica. Deve também fazer a prova de que efetuou as despesas declaradas de acordo com as condições fixadas para a concessão da contribuição em causa, só podendo ser consideradas elegíveis as despesas devidamente comprovadas. A sua obrigação de respeitar as condições financeiras fixadas constitui um dos seus compromissos essenciais e, por isso, condiciona a atribuição da comparticipação financeira (v. acórdão Technische Universität Dresden/Comissão, n.° 60 supra, EU:T:2014:912, n.° 71 e jurisprudência aí referida).

89      Por último, a alegação do Technion relativa à violação dos seus direitos de defesa também não pode ser aceite, na medida em que os elementos de informação que estavam à sua disposição eram suficientes para servir de base às conclusões do relatório de auditoria. De qualquer forma, o Tribunal Geral, com o seu acórdão Technion e Technion Research & Development Foundation/Comissão, n.° 33 supra (EU:T:2015:272), validou a recusa de acesso a certos documentos oposta ao Technion pela Comissão com base no Regulamento n.° 1049/2001.

90      Em face destas considerações, há que concluir que a Comissão tinha razões para considerar inelegíveis todos os custos relativos às prestações de K. e que, por isso, detinha o crédito contratual controvertido. Consequentemente, improcede o pedido do Technion deduzido com base no artigo 272.° TFUE.

91      Daí resulta igualmente que improcede também o pedido formulado na réplica. De qualquer forma, esse pedido é inadmissível com base no artigo 44.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento de Processo de 2 de maio de 1991, uma vez que, tendo sido apresentado pela primeira vez na réplica, é extemporâneo [v., neste sentido, acórdão de 31 de janeiro de 2001, Sunrider/IHMI (VITALITE), T‑24/00, Colet., EU:T:2001:34, n.° 12].

 Quanto ao pedido de anulação da decisão recorrida

 Quanto à admissibilidade relativamente à TRDF

92      Sem arguir formalmente uma exceção de inadmissibilidade nos termos do artigo 114.° do Regulamento de Processo de 2 de maio de 1991, a Comissão alega que o pedido de anulação é inadmissível relativamente à TRDF uma vez que a decisão recorrida não lhe diz diretamente respeito, na aceção do artigo 263.°, quarto parágrafo, TFUE.

93      A este respeito, há que recordar que cabe ao Tribunal Geral apreciar o que manda uma boa administração da justiça nas circunstâncias da causa (acórdão de 26 de fevereiro de 2002, Conselho/Boehringer, C‑23/00 P, Colet., EU:C:2002:118, n.os 50 a 52). No caso, o Tribunal Geral entende que deve conhecer primeiro do mérito do pedido.

 Quanto ao mérito

94      Em apoio do pedido de anulação da decisão recorrida, os recorrentes invocam um fundamento relativo à falta de fundamentação da decisão recorrida e um fundamento relativo à violação do princípio da proibição do enriquecimento sem causa.

–       Quanto ao fundamento relativo à falta de fundamentação

95      Como acertadamente refere a Comissão, os recorrentes não apresentam nenhum argumento em apoio do fundamento segundo o qual a decisão recorrida estaria insuficientemente fundamentada. De qualquer forma, refira‑se que a Comissão respeitou o dever de fundamentação previsto no artigo 296.° TFUE.

96      A este respeito, há que recordar que, segundo jurisprudência constante, o alcance do dever de fundamentação depende da natureza do ato em causa e do contexto em que foi adotado. A fundamentação deve revelar clara e inequivocamente o raciocínio da instituição autora do ato, de forma a permitir, por um lado, que o juiz da União exerça a sua fiscalização da legalidade e, por outro, que os interessados conheçam as justificações da medida tomada, a fim de poderem defender os seus direitos e verificar se a decisão é fundada (v., neste sentido, acórdão de 28 de março de 2012, Ryanair/Comissão, T‑123/09, Colet., EU:T:2012:164, n.° 177 e jurisprudência aí referida).

97      A fundamentação não tem de especificar necessariamente todos os elementos de facto e de direito relevantes, uma vez que a questão de saber se a fundamentação de um ato preenche os requisitos do artigo 296.° TFUE deve ser apreciada à luz não só da sua redação mas também do seu contexto e do conjunto das normas jurídicas que regem a matéria em causa. Em especial, um ato desfavorável está suficientemente fundamentado quando tiver sido adotado num contexto conhecido do interessado, que lhe permita compreender o alcance da medida adotada a seu respeito (v. acórdão de 15 de abril de 2011, República Checa/Comissão, T‑465/08, Colet., EU:T:2011:186, n.° 163 e jurisprudência aí referida).

98      No caso de uma decisão de compensação, a fundamentação deve permitir identificar com precisão os créditos compensados, não se podendo exigir que a fundamentação inicialmente utilizada em apoio da declaração de cada um dos créditos seja repetida no ato de compensação (acórdão República Checa/Comissão, n.° 97 supra, EU:T:2011:186, n.° 164).

99      No caso, há que observar que a decisão recorrida identifica claramente os créditos objeto da compensação em causa e as relações jurídicas de que resultam esses créditos, a saber, o contrato Mosaica, por um lado, e os três contratos acima referidos no n.° 41, por outro. A decisão recorrida contém igualmente, em anexo, uma cópia da nota de débito que, ao fazer referência aos resultados da auditoria, explica em termos breves, mas suficientes, a génese do crédito da Comissão contra o Technion. A nota de débito refere igualmente a carta de pré‑informação da Comissão de 19 de outubro de 2011 (v. n.° 36 supra), que assim clarifica, se necessário fosse, o contexto em que essa nota foi emitida. Por último, há que observar que a decisão recorrida identifica claramente a sua base jurídica ao fazer referência ao artigo 73.° do Regulamento Financeiro.

100    Consequentemente, há que considerar que a decisão recorrida surgiu num contexto conhecido pelos recorrentes que lhes permitia compreender o seu alcance. Há que concluir, portanto, que essa decisão está suficientemente fundamentada. Improcede, portanto, o presente fundamento.

–       Quanto ao fundamento relativo à violação do princípio da proibição do enriquecimento sem causa

101    Os recorrentes alegam que, ao proceder à compensação controvertida, a Comissão violou o princípio da proibição do enriquecimento sem causa, na medida em que, na sequência da compensação controvertida, o seu património ficou enriquecido, em prejuízo do património do Technion, sem causa nem justificação.

102    A Comissão contesta esta argumentação.

103    Conforme já declarou o juiz da União, resulta da maior parte dos sistemas jurídicos nacionais que as ações baseadas em enriquecimento sem causa são concebidas para constituir, em circunstâncias específicas do direito civil, uma fonte de uma obrigação não contratual para aquele que está na posição de enriquecido, que consiste geralmente na restituição do que indevidamente recebeu [acórdão de 16 de novembro de 2006, Masdar (UK)/Comissão, T‑333/03, Colet., EU:T:2006:348, n.° 91].

104    Para ser procedente a ação baseada no enriquecimento sem causa, é essencial que o enriquecimento seja desprovido de qualquer base legal válida. Este pressuposto não está preenchido, nomeadamente, quando o enriquecimento encontra a sua justificação em obrigações contratuais [acórdão de 16 de dezembro de 2008, Masdar (UK)/Comissão, C‑47/07 P, Colet., EU:C:2008:726, n.° 46].

105    No caso, há que notar que o alegado enriquecimento da Comissão encontra o seu fundamento no contrato Mosaica, que a vincula ao Technion. Nestas circunstâncias, esse enriquecimento não pode ser qualificado de «sem causa». Assim, o presente fundamento deve ser julgado improcedente.

106    Consequentemente, há que julgar improcedente o pedido de anulação da decisão recorrida, sem que seja necessário analisar a causa de não conhecimento de mérito arguida pela Comissão.

107    Decorre destas considerações que há que negar integralmente provimento ao recurso.

 Quanto às despesas

108    Nos termos do artigo 134.°, n.° 1, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo os recorrentes sido vencidos, há que condená‑los nas despesas, em conformidade com o pedido da Comissão.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção)

decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      O Technion — Israel Institute of Technology e a Technion Research & Development Foundation Ltd são condenados nas despesas.

Kanninen

Pelikánová

Buttigieg

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 6 de outubro de 2015.

Assinaturas


* Língua do processo: francês.