Language of document : ECLI:EU:C:2024:326

Edição provisória

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

ATHANASIOS RANTOS

apresentadas em 18 de abril de 2024 (1)

Processo C447/22 P

República da Eslovénia,

Comissão Europeia

contra

Petra Flašker

«Recurso de decisão do Tribunal Geral — Auxílios de Estado — Artigos 107.° e 108.° TFUE — Medidas de auxílio concedidas pela República da Eslovénia antes da adesão à União Europeia — Fase preliminar de análise — Decisão da Comissão Europeia que declara a inexistência de auxílios de Estado — Não abertura do procedimento formal de investigação — Conceito de “dificuldades sérias” quanto à existência de um auxílio ou à sua compatibilidade com o mercado interno — Âmbito dos deveres de diligência e de investigação da Comissão — Ónus da prova que incumbe à parte que invoca a existência de “dificuldades sérias”»






I.      Introdução

1.        Com o presente recurso, a República da Eslovénia pede a anulação do Acórdão do Tribunal Geral da União Europeia de 27 de abril de 2022, Flašker/Comissão (T‑392/20, a seguir «acórdão recorrido», EU:T:2022:245), que anulou a Decisão C(2020) 1724 final da Comissão, de 24 de março de 2020, que encerra a análise de medidas relativas à cadeia pública de farmácias de oficina Lekarna Ljubljana à luz das regras em matéria de auxílios estatais constantes dos artigos 107.° e 108.° TFUE [processo SA.43546 (2016/FC) — Eslovénia, a seguir «decisão controvertida»], na parte em que se refere aos «ativos sob gestão» da Lekarna Ljubljana.

2.        Este processo tem origem numa denúncia apresentada à Comissão, em 2016, por Petra Flašker (a seguir «PF»), que explora uma farmácia privada, sobre a existência de auxílios de Estado a favor da Lekarna Ljubljana, uma concorrente, nomeadamente sob a forma de concessão de ativos sob gestão, como instalações comerciais, em condições que não correspondem às condições de mercado. Com a decisão controvertida, a Comissão concluiu a análise dessa denúncia sem dar início ao procedimento de investigação aprofundado previsto no artigo 108.°, n.° 2, TFUE. A Comissão referiu, em substância, que, no termo da fase preliminar de análise prevista no artigo 108.°, n.° 3, TFUE, tinha formado a convicção de que as medidas em causa não constituíam auxílios de Estado, esclarecendo que, mesmo supondo que a concessão de ativos sob gestão pudesse constituir um auxílio de Estado, se trataria então de um «auxílio existente». Em sede de recurso de anulação, o Tribunal Geral, no acórdão recorrido, julgou procedente o fundamento invocado por PF, relativo ao facto de a Comissão não poder legalmente adotar a decisão controvertida sem dar início ao procedimento de investigação previsto no artigo 108.°, n.° 2, TFUE, e anulou a decisão controvertida, na parte em que se refere aos ativos sob gestão da Lekarna Ljubljana.

3.        Com o seu recurso, a República da Eslovénia, apoiada pela Comissão, alega, no âmbito dos seus dois primeiros fundamentos, que o acórdão recorrido padece de um erro de direito na interpretação e aplicação do artigo 108.°, n.os 2 e 3, TFUE, do artigo 4.°, n.os 2 e 3, do Regulamento (UE) 2015/1589 (2) e do conceito de «dificuldades sérias» que determinam a obrigação de abertura do procedimento formal de investigação. Conforme solicitado pelo Tribunal de Justiça, as presentes conclusões centrar‑se‑ão na análise dos dois primeiros fundamentos do recurso.

4.        O presente processo vem na continuidade de muitos outros processos que deram origem a uma jurisprudência constante dos órgãos jurisdicionais da União e na esteira de uma série de outros processos que originaram acórdãos mais recentes sobre a não abertura do procedimento formal de investigação (3). Oferece, portanto, ao Tribunal de Justiça a oportunidade de clarificar mais ainda, por um lado, o conceito de «dificuldades sérias», cuja existência, no termo de uma análise preliminar, implica a obrigação de a Comissão dar início ao procedimento formal, e, por outro, o ónus da prova e o âmbito dos deveres de diligência e de investigação que incumbem a esta instituição quando confrontada com uma situação de incerteza.

II.    Quadro jurídico

A.      Tratado de Adesão e Ato de Adesão

5.        O Tratado relativo à Adesão da República da Eslovénia à União Europeia (4) foi assinado pela República da Eslovénia em 16 de abril de 2003 e entrou em vigor a 1 de maio de 2004 (a seguir «Tratado de Adesão»).

6.        Ao abrigo do artigo 1.°, n.° 2, do Tratado de Adesão, as condições de admissão e as adaptações dos Tratados em que se funda a União Europeia constam do Ato relativo às Condições de Adesão à União Europeia e às Adaptações dos Tratados em que se Funda a União Europeia (a seguir «Ato de Adesão» (5)).

7.        O artigo 22.° do Ato de Adesão que, do mesmo modo que as demais disposições deste, faz parte integrante do Tratado de Adesão, enuncia que as medidas enumeradas no seu anexo IV devem ser aplicadas nas condições previstas neste anexo.

8.        O anexo IV, ponto 3, n.° 1, do Ato de Adesão prevê:

«Os regimes de auxílio e os auxílios individuais a seguir indicados em execução num novo Estado‑Membro antes da data da adesão e que continuem a ser aplicáveis depois dessa data devem ser considerados, no momento da adesão, auxílios existentes na aceção do n.° 1 do artigo [108.° TFUE]:

a)      Medidas de auxílio em execução antes de 10 de dezembro de 1994;

b)      Medidas de auxílio enumeradas no apêndice ao presente anexo;

c)      Medidas de auxílio que, antes da data da adesão, tenham sido avaliadas pela autoridade de controlo dos auxílios estatais do novo Estado‑Membro e consideradas compatíveis com o acervo, e às quais a Comissão [Europeia] não tenha levantado objeções motivadas por sérias dúvidas quanto à compatibilidade das medidas com o mercado comum, nos termos do n.° 2.

Todas as medidas ainda aplicáveis após a data da adesão que constituam um auxílio estatal e não preencham as condições acima enunciadas são consideradas novos auxílios no momento da adesão, para efeitos do n.° 3 do artigo [108.° TFUE].»

B.      Regulamento (UE) 2015/1589

9.        O artigo 1.° do Regulamento 2015/1589, sob a epígrafe «Definições», tem a seguinte redação:

«Para efeitos do presente regulamento, entende‑se por:

a)      “Auxílio”, qualquer medida que satisfaça os critérios fixados no artigo 107.°, n.° 1, [TFUE];

b)      “Auxílios existentes”:

i)      Sem prejuízo [...] do ponto 3 e do apêndice do anexo IV do Ato de Adesão da República Checa, da Estónia, de Chipre, da Letónia, da Lituânia, da Hungria, de Malta, da Polónia, da Eslovénia e da Eslováquia [...], qualquer auxílio que já existisse antes da entrada em vigor do [Tratado FUE] no respetivo Estado‑Membro, isto é, os regimes de auxílio e os auxílios individuais em execução antes da data de entrada em vigor do [Tratado FUE] no respetivo Estado‑Membro e que continuem a ser aplicáveis depois dessa data,

[...]

c)      “Novo auxílio”, quaisquer auxílios, isto é, regimes de auxílio e auxílios individuais, que não sejam considerados auxílios existentes, incluindo as alterações a um auxílio existente;

[...]»

10.      O artigo 4.° deste regulamento, sob a epígrafe «Análise preliminar da notificação e decisões da Comissão», dispõe, nos seus n.os 2 a 5:

«2.      Quando, após uma análise preliminar, a Comissão considerar que a medida notificada não constitui um auxílio, fará constar esse facto por via de decisão.

3.      Quando, após uma análise preliminar, a Comissão considerar que não há dúvidas quanto à compatibilidade da medida notificada com o mercado interno, na medida em que está abrangida pelo artigo 107.°, n.° 1, [TFUE], decidirá que essa medida é compatível com o mercado interno (“decisão de não levantar objeções”). A decisão referirá expressamente a derrogação do TFUE que foi aplicada.

4.      Quando, após uma análise preliminar, a Comissão considerar que a medida notificada suscita dúvidas quanto à sua compatibilidade com o mercado interno, decidirá dar início ao procedimento formal de investigação nos termos [do] artigo 108.°, n.° 2, [TFUE] (“decisão de início de um procedimento formal de investigação”).

5.      As decisões previstas nos n.os 2, 3 e 4 do presente artigo devem ser tomadas no prazo de dois meses. [...]»

C.      Regulamento (CE) n.° 794/2004

11.      O artigo 4.° do Regulamento (CE) n.° 794/2004 (6), sob a epígrafe «Procedimento de notificação simplificado para certas alterações de auxílios existentes» prevê, na primeira frase do seu n.° 1, que, para efeitos da alínea c) do artigo 1.° do Regulamento 2015/1589, se «[entende] por alteração de um auxílio existente qualquer modificação que não seja de natureza puramente formal ou administrativa destinada a não afetar a apreciação da compatibilidade da medida de auxílio com o mercado [interno]. Qualquer aumento até 20 % do orçamento inicial de um regime de auxílios existente não é considerado como uma alteração de auxílio existente».

III. Antecedentes do litígio

12.      Os antecedentes do litígio e o conteúdo da decisão controvertida estão expostos nos n.os 2 a 13 do acórdão recorrido e podem, para efeitos das presentes conclusões, ser resumidos como se segue.

13.      Em 1979, foi criada em Ljubljana (Eslovénia), na então República Federal Socialista da Jugoslávia, uma entidade denominada Lekarna Ljubljana o.p., responsável pela distribuição oficinal de produtos farmacêuticos. De acordo com as indicações fornecidas pelas autoridades eslovenas, essa entidade foi dotada de ativos que lhe permitiam exercer a sua missão. Segundo PF, atualmente farmacêutica de oficina liberal, a referida entidade era uma «organização de trabalho em comum», não exercendo uma atividade económica de mercado e sem capacidade para ter uma propriedade.

14.      Após a independência da Eslovénia, foi adotada em 1991 a Lei relativa aos Estabelecimentos, que abrange, nomeadamente, os estabelecimentos públicos responsáveis por serviços de interesse económico geral. Nos termos do artigo 48.° desta lei «[o] estabelecimento é financiado para o desempenho da sua missão através de dotações do seu fundador, da venda de produtos e serviços e de outras fontes previstas na presente lei».

15.      No ano seguinte, foi igualmente adotada a Lei relativa à Farmácias. Esta lei prevê a coexistência de estabelecimentos públicos de farmácia e de farmácias privadas, bem como a responsabilidade dos municípios pela prestação de serviços farmacêuticos no respetivo território. As farmácias privadas recebem uma autorização de exercício sob a forma de concessão atribuída pelo município em causa através de concurso público. Os estabelecimentos públicos de farmácia são criados pelos municípios, que participam na sua direção, e são regidos pelo respetivo ato fundador. Segundo a Comissão, existem atualmente na Eslovénia cerca de 25 estabelecimentos públicos de farmácia, que exploram cerca de 200 farmácias de oficina, e 100 farmácias privadas.

16.      Com fundamento nestas duas leis, o município de Ljubljana criou, em 1997, por despacho, o estabelecimento público de farmácia Javni Zavod Lekarna Ljubljana (a seguir «Lekarna Ljubljana»), especificando que era o sucessor legal da Lekarna Ljubljana o.p. com a transmissão dos seus direitos e obrigações.

17.      Atualmente, a Lekarna Ljubljana explora cerca de cinquenta farmácias de oficina na Eslovénia, principalmente em Ljubljana, mas também em cerca de quinze outros municípios. Em Grosuplje (Eslovénia), a cidade em que PF explora a sua farmácia privada, estão igualmente situadas duas farmácias de oficina da Lekarna Ljubljana.

18.      Por denúncia apresentada oficialmente à Comissão em 27 de abril de 2016, após contactos prévios com os seus serviços, PF queixou‑se da existência de auxílios de Estado, na aceção do artigo 107.° TFUE, a favor da Lekarna Ljubljana. Uma das medidas identificadas durante a instrução desta denúncia foi «a concessão de ativos sob gestão» em condições que, segundo PF, não correspondem às condições de mercado. PF menciona, como ativos sob gestão, as instalações comerciais.

19.      Houve vários contactos entre a Comissão e as autoridades eslovenas, por um lado, e PF, por outro. Por duas vezes, a Comissão comunicou a esta última uma apreciação preliminar segundo a qual as medidas identificadas não constituíam auxílios de Estado. PF manteve sempre a sua denúncia apresentando elementos de informação complementares e foi apoiada, em 2018, por dezasseis outras farmácias privadas da Eslovénia.

20.      Em 24 de março de 2020, a Comissão enviou à República da Eslovénia a decisão controvertida. Esta decisão foi adotada sem que a Comissão tenha dado início ao procedimento de investigação aprofundado previsto no artigo 108.°, n.° 2, TFUE. A Comissão concluiu, no considerando 73 dessa decisão, que o exame das quatro medidas a favor da Lekarna Ljubljana identificadas da seguinte forma por PF durante a instrução, ou seja, i) o benefício, concedido pelo município de Skofljica (Eslovénia), de um arrendamento de longa duração gratuito, ii) a concessão de ativos sob gestão pelo município de Ljubljana, iii) a isenção de taxas de concessão atribuída por vários municípios e iv) a renúncia a lucros que deveriam ter sido partilhados com vários municípios, não revelou a existência de auxílios de Estado. No entanto, no que respeita à concessão de ativos sob gestão, a Comissão expôs, nos considerandos 37 a 40 da decisão controvertida, que, se a concessão desses ativos constituir um auxílio de Estado, se trata então de um «auxílio existente».

21.      A fundamentação constante destes últimos considerandos é a que se segue. Após recordar o disposto no artigo 48.° da Lei relativa aos Estabelecimentos, adotada em 1991, e indicar, por um lado, que o município de Ljubljana devia, a esse título, fazer uma dotação à Lekarna Ljubljana de ativos para que este estabelecimento pudesse iniciar a sua atividade e, por outro, que qualquer ativo obtido pela Lekarna Ljubljana, incluindo pelos seus próprios meios, é classificado como «ativo sob gestão» em aplicação das regras da contabilidade pública, a Comissão expõe que, segundo as autoridades eslovenas, o município de Ljubljana fez, em 1979, uma dotação à Lekarna Ljubljana o.p. de ativos necessários ao início das suas atividades, que, em 1997, estes ativos foram transferidos para a sua sucessora legal, a saber, a Lekarna Ljubljana, e que todos os restantes ativos posteriormente adquiridos por estas duas entidades desde 1979 o foram pelos seus próprios meios no mercado e em condições de mercado. Os únicos ativos sob gestão cuja concessão poderia constituir um auxílio de Estado são, portanto, os provenientes da dotação inicial de ativos à Lekarna Ljubljana o.p, transferida, em 1997, para a Lekarna Ljubljana.

22.      A Comissão faz depois referência ao anexo IV do Ato de Adesão, designadamente ao seu ponto 3, relativo à Política de Concorrência. Refere que, nos termos do seu n.° 1, «[o]s regimes de auxílio e os auxílios individuais a seguir indicados em execução num novo Estado‑Membro antes da data da adesão e que continuem a ser aplicáveis depois dessa data devem ser considerados, no momento da adesão, auxílios existentes na aceção do n.° 1 do artigo [108.° TFUE]: a) Medidas de auxílio em execução antes de 10 de dezembro de 1994».

23.      Além disso, a Comissão recorda que o artigo 1.°, alínea c), do Regulamento 2015/1589 define «novo auxílio» como «quaisquer auxílios, isto é, regimes de auxílio e auxílios individuais, que não sejam considerados auxílios existentes, incluindo as alterações a um auxílio existente». Relembra também que, nos termos do artigo 4.°, n.° 1, do Regulamento n.° 794/2004, «[se entende] por alteração de um auxílio existente qualquer modificação que não seja de natureza puramente formal ou administrativa destinada a não afetar a apreciação da compatibilidade da medida de auxílio com o mercado [interno]».

24.      A Comissão conclui que, mesmo que a concessão de ativos sob gestão constituísse um auxílio de Estado, seria então um auxílio existente, uma vez que foi concedido no âmbito da criação da Lekarna Ljubljana o.p., em 1979. A sua substituição pela Lekarna Ljubljana em 1997 é de natureza puramente administrativa, não alterando o contexto legal, nem a utilização e as condições de utilização dos ativos em causa. Esta substituição não pode, portanto, constituir uma alteração a um auxílio existente e, consequentemente, o auxílio em questão continua a ser um auxílio desta natureza.

IV.    Tramitação do processo no Tribunal Geral e acórdão recorrido

25.      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 19 de junho de 2020, PF interpôs recurso de anulação da decisão controvertida e pediu a condenação da Comissão nas despesas.

26.      Em apoio do recurso, PF invocou três fundamentos, o primeiro relativo à violação do dever de fundamentação da decisão controvertida, o segundo relativo à apreciação errada dos factos e a um erro na qualificação jurídica dos factos respeitantes à concessão de ativos sob gestão, que resultam na violação dos artigos 107.° e 108.° TFUE, e o terceiro relativo ao facto de a Comissão não poder legalmente adotar a decisão controvertida sem dar início ao procedimento de investigação previsto no artigo 108.°, n.° 2, TFUE (7).

27.      No acórdão recorrido, o Tribunal Geral julgou procedente o terceiro fundamento, que entendeu oportuno analisar em primeiro lugar, e deu provimento ao recurso, anulando a decisão controvertida, na parte em que se referia à apreciação, à luz das regras em matéria de auxílios de Estado, da concessão de ativos sob gestão à Lekarna Ljubljana, sem considerar necessário apreciar o primeiro e segundo fundamentos (8).

28.      Mais precisamente, após ter limitado o âmbito do recurso à apreciação das medidas relativas aos «ativos sob gestão» (9), e ter especificado que era oportuno analisar o terceiro fundamento de recurso à luz, nomeadamente, dos argumentos invocados por PF no âmbito do segundo fundamento (10), o Tribunal Geral cindiu em duas partes a sua análise relativa aos ativos sob gestão, consoante tenham sido concedidos em 1979, aquando da criação da Lekarna Ljubljana o.p., para poder dar início à sua atividade (a seguir «ativos sob gestão em 1979»), ou incorporados após essa data pela Lekarna Ljubljana o.p. e pela Lekarna Ljubljana (a seguir «ativos sob gestão após 1979») (11).

29.      O Tribunal Geral considerou que, no termo da análise preliminar efetuada ao abrigo do artigo 108.°, n.° 3, TFUE, a Comissão não tinha dissipado as dúvidas sobre, por um lado, a questão de saber se os ativos que tinham sido concedidos sob gestão à Lekarna Ljubljana o.p. em 1979 e transferidos para a Lekarna Ljubljana em 1997, contanto que pudessem ser qualificados de «auxílio de Estado», eram auxílios existentes ou novos auxílios, na aceção do artigo 1.°, alínea b), do Regulamento 2015/1589 (12), e, por outro, a questão de saber se todos os ativos sob gestão incorporados pela Lekarna Ljubljana o.p. e pela Lekarna Ljubljana após 1979 o foram de facto por estes mesmos estabelecimentos em condições de mercado, como afirmaram as autoridades eslovenas, e, consequentemente, se não foram concedidos auxílios de Estado a estas entidades através desses ativos (13).

30.      Com base nestas duas constatações, o Tribunal Geral concluiu que a Comissão se viu «confrontada com dificuldades sérias que deveriam tê‑la levado a dar início ao procedimento previsto no artigo 108.°, n.° 2, TFUE [...]. A investigação aprofundada que este último procedimento implica teria, aliás, permitido, na medida do necessário, à Comissão pronunciar‑se de forma esclarecida sobre as seguintes questões: a própria existência de auxílios de Estado, na aceção do artigo 107.° TFUE, em caso de concessão à Lekarna Ljubljana de ativos sob gestão a título gratuito ou preferencial pelo município de Ljubljana, a qualificação desses ativos de auxílios existentes ou novos auxílios e a sua qualificação de auxílios individuais ou de auxílios abrangidos por um regime de auxílios. O que teria permitido à Comissão orientar com bom conhecimento de causa a tramitação ulterior do procedimento para, se necessário, apreciar a compatibilidade com o mercado interno das medidas que se revelassem ser auxílios, existentes ou novos, com necessidade de tal apreciação» (14).

V.      Tramitação do processo no Tribunal de Justiça e pedidos das partes

31.      Em 6 de julho de 2022, a República da Eslovénia interpôs recurso do acórdão recorrido. Pede ao Tribunal de Justiça que anule o acórdão recorrido e, a título principal, que negue provimento ao recurso em primeira instância; a título subsidiário, se o litígio não estiver em condições de ser julgado, que devolva o processo ao Tribunal Geral e condene PR nas despesas.

32.      Por seu turno, a Comissão pede ao Tribunal de Justiça que anule o acórdão recorrido e, a título principal, que, se o litígio estiver em condições de ser julgado, negue provimento ao recurso em primeira instância e condene PF nas despesas; a título subsidiário, que devolva o processo ao Tribunal Geral e reserve para final a decisão quanto às despesas.

33.      Por sua vez, PF pede ao Tribunal de Justiça que negue provimento ao presente recurso e condene a República da Eslovénia nas despesas.

34.      Foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às questões colocadas pelo Tribunal de Justiça na audiência realizada em 31 de janeiro de 2024.

VI.    Análise

35.      Para sustentar o seu recurso, a República da Eslovénia, apoiada pela Comissão, invoca quatro fundamentos relativos, o primeiro, a erros de direito na interpretação e na aplicação do artigo 108.°, n.os 2 e 3, TFUE e do artigo 4.°, n.os 2 e 3, do Regulamento 2015/1589, bem como a erros na interpretação do conceito de «dificuldades sérias» quanto à qualificação de auxílio de Estado, no que respeita aos ativos sob gestão após 1979; o segundo, à interpretação errada dos factos e a erros de direito no que respeita à existência de dificuldades sérias quanto à qualificação dos ativos sob gestão em 1979 de «auxílio existente»; o terceiro, à violação do dever de fundamentação que incumbe ao Tribunal Geral; e, o quarto, à violação do direito da Comissão à ação e a um tribunal imparcial, na aceção do artigo 47.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.

36.      A pedido do Tribunal de Justiça, as presentes conclusões limitar‑se‑ão à análise dos dois primeiros fundamentos do recurso.

37.      Uma vez que estes dois fundamentos têm por objeto a obrigação da Comissão de analisar uma denúncia sobre a existência de um suposto auxílio ou a sua compatibilidade com o mercado interno, parece‑me útil, num primeiro momento, examinar o alcance da obrigação da Comissão de dar início ao procedimento formal de investigação por força do artigo 108.°, n.° 2, TFUE, conforme estabelecido na jurisprudência do Tribunal de Justiça (A), e depois, num segundo momento, analisar o raciocínio do Tribunal Geral examinando as diferentes alegações suscitadas pela República da Eslovénia, apoiada pela Comissão, no âmbito do primeiro fundamento, relativo aos ativos sob gestão após 1979 (B), e do segundo fundamento, relativo aos ativos sob gestão em 1979 (C).

A.      Quanto à obrigação da Comissão de dar início ao procedimento formal de investigação por força do artigo 108.°, n.° 2, TFUE

38.      Considero útil, nesta fase, recordar as regras pertinentes relativas ao regime de fiscalização dos auxílios de Estado instituído pelo Tratado FUE e às obrigações que incumbem à Comissão no âmbito do procedimento de análise de um auxílio de Estado previsto no artigo 108.° TFUE.

39.      Recordo, desde logo, que a apreciação da compatibilidade das medidas de auxílio com o mercado interno é da competência exclusiva da Comissão (15). Efetivamente, para efeitos de aplicação dos artigos 93.° e 107.° TFUE, a Comissão, por força do artigo 108.° TFUE, tem competência específica e exclusiva para decidir da compatibilidade dos auxílios de Estado com o mercado interno, quando procede ao exame dos auxílios existentes, quando toma decisões sobre auxílios novos ou alterados e quando adota medidas em caso de incumprimento das suas decisões ou da obrigação de notificação (16). Esta competência exclusiva destina‑se, nomeadamente, à aplicação efetiva e uniforme do artigo 107.° TFUE em toda a União, com total previsibilidade e transparência (17).

40.      No âmbito do procedimento de exame de um auxílio de Estado previsto no artigo 108.° TFUE, é preciso distinguir entre, por um lado, a fase preliminar de análise dos auxílios instituída pelo artigo 108.°, n.° 3, TFUE, que apenas tem por objetivo permitir à Comissão formar uma primeira opinião sobre a existência ou a compatibilidade parcial ou total de um auxílio, e, por outro, a fase de análise a que se refere o n.° 2 do artigo 108.° TFUE, que se destina a permitir à Comissão ter uma informação completa sobre todos os dados do caso. A principal característica que distingue estas duas fases reside na inexistência, durante a fase preliminar, da obrigação de a Comissão notificar os interessados para apresentarem as suas observações antes de adotar a sua decisão (18). A arquitetura deste regime assenta, portanto, na ideia de que os serviços da Comissão não devem ser constrangidos a conduzir um procedimento pesado em termos de recursos, quando uma medida estatal, prima facie, não suscita dificuldades quanto à sua qualificação ou à sua compatibilidade com o mercado interno, o que explica também a razão por que as decisões que encerram a fase preliminar são tomadas, em princípio, no prazo de dois meses (19).

41.      A este respeito, decorre da letra do artigo 4.°, n.° 4, do Regulamento 2015/1589 e de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça que, quando a Comissão não pode adquirir a convicção, ao fim de uma primeira apreciação no âmbito do procedimento previsto no artigo 108.° n.° 3, TFUE, de que a medida estatal em causa não constitui um «auxílio» na aceção do artigo 107.°, n.° 1, TFUE ou de que, se for qualificada de auxílio, é compatível com o Tratado, ou quando este procedimento não lhe permitiu ultrapassar todas as dificuldades levantadas pela apreciação da compatibilidade da medida em causa, esta instituição tem o dever de dar início ao procedimento previsto no artigo 108.o, n.° 2, TFUE «sem dispor, nesta matéria, de uma margem de apreciação» (20). O procedimento previsto no artigo 108.°, n.° 2, TFUE reveste, portanto, um caráter indispensável sempre que a Comissão se depare com dificuldades sérias para apreciar a existência ou a compatibilidade de um auxílio com o mercado interno. Por outras palavras, a Comissão só pode, assim, limitar‑se à fase preliminar de análise prevista no artigo 108.°, n.° 3, TFUE para adotar uma decisão favorável a um auxílio se puder adquirir a convicção, após um exame inicial, de que esse auxílio é compatível com o mercado interno. Pelo contrário, se essa primeira análise a tiver levado à convicção oposta ou não tiver permitido ultrapassar todas as dificuldades suscitadas pela apreciação da existência ou da compatibilidade desse auxílio com o mercado interno, a Comissão tem o dever de obter todos os pareceres necessários e dar início, para o efeito, ao procedimento previsto no artigo 108.°, n.° 2, TFUE (21).

42.      Resulta igualmente da mesma jurisprudência que o conceito de «dificuldades sérias» tem caráter objetivo (22) e que a prova da existência de tais dificuldades, que deve ser procurada tanto nas circunstâncias da adoção da decisão tomada no termo da análise preliminar como no seu conteúdo, deve ser apresentada pelo requerente da anulação dessa decisão, a partir de um conjunto de indícios concordantes (23). Assim, o caráter insuficiente ou incompleto do exame levado a cabo pela Comissão no procedimento de análise preliminar constitui um indício de que esta instituição foi confrontada com sérias dificuldades para apreciar a compatibilidade da medida notificada com o mercado interno, o que a deveria ter levado a dar início ao procedimento formal de investigação (24).

43.      Por conseguinte, quando uma parte interessada pede a anulação de uma decisão da Comissão de não levantar objeções a respeito de um auxílio de Estado, aquela põe essencialmente em causa o facto de esta instituição ter adotado essa decisão sem abrir o procedimento formal de investigação, violando assim os seus direitos processuais. Para que o seu pedido de anulação seja procedente, essa parte pode invocar todos os fundamentos que demonstrem que a apreciação das informações e dos elementos de que a Comissão dispunha, na fase preliminar de análise, deveria ter suscitado dúvidas quanto à compatibilidade da medida em causa com o mercado interno. A utilização destes argumentos não pode, porém, ter por consequência transformar o objeto do recurso nem alterar os seus requisitos de admissibilidade. Pelo contrário, a existência de dúvidas sobre essa compatibilidade é precisamente a prova que deve ser feita para demonstrar que a Comissão estava obrigada a dar início ao procedimento formal de investigação previsto no artigo 108.°, n.° 2, TFUE e no artigo 6.°, n.° 1, do Regulamento 2015/1589 (25).

44.      Daqui decorre que a legalidade de uma decisão de não levantar objeções, fundada no artigo 4.°, n.° 3, do Regulamento 2015/1589, depende da questão de saber se a apreciação das informações e dos elementos de que a Comissão dispunha, na fase preliminar de análise da medida notificada, devia objetivamente ter suscitado dúvidas tanto quanto à qualificação dessa medida de «auxílio» como quanto à sua compatibilidade com o mercado interno, dado que tais dúvidas devem dar lugar à abertura de um procedimento formal de investigação em que podem participar as «partes interessadas» a que se refere o artigo 1.°, alínea h), do referido regulamento (26).

45.      Além disso, a legalidade de uma decisão tomada no termo do procedimento de análise preliminar, como a referida no artigo 4.°, n.° 2, do Regulamento 2015/1589, deve ser apreciada pelo juiz da União em função não apenas dos elementos de informação de que a Comissão dispunha no momento em que a adotou mas também dos elementos de que «podia dispor», o que inclui os elementos que se afiguraram pertinentes e cuja apresentação poderia ter obtido, a seu pedido, durante o procedimento administrativo (27).

46.      Com efeito, a Comissão é obrigada, no interesse de uma boa administração das regras em matéria de auxílios de Estado, a conduzir o procedimento de investigação das medidas em causa de forma diligente e imparcial para dispor, quando da adoção de uma decisão final que declare a existência e, se for caso disso, a incompatibilidade ou ilegalidade do auxílio, dos elementos o mais completos e fiáveis possíveis para tal (28).

47.      A este respeito, no Acórdão Tempus Energy, o Tribunal de Justiça esclareceu que, embora, quando da análise da existência e da legalidade de um auxílio de Estado, possa ser necessário que a Comissão vá, sendo caso disso, além da simples análise dos elementos de facto e de direito levados ao seu conhecimento, não lhe incumbe, no entanto, procurar, por sua própria iniciativa e na falta de qualquer indício nesse sentido, todas as informações que possam apresentar uma ligação com o processo que lhe é submetido, ainda que tais informações sejam do domínio público (29). Assim, a mera existência de um elemento de informação potencialmente pertinente de que a Comissão não tinha conhecimento e o qual não estava obrigada a investigar, à luz dos elementos de informação que estavam efetivamente na sua posse, não pode demonstrar a existência de dificuldades sérias, que teriam obrigado esta instituição a dar início ao procedimento formal de investigação (30).

48.      Quanto ao dever de fundamentação que impende sobre a Comissão por força do artigo 296.°, segundo parágrafo, TFUE, o Tribunal de Justiça especificou que, quando esteja em causa uma decisão, tomada em aplicação do artigo 108.°, n.° 3, TFUE, de não levantar objeções a uma medida de auxílio, esta decisão deve conter apenas as razões por que a Comissão considera não estar perante dificuldades sérias de apreciação da compatibilidade do auxílio em causa com o mercado interno e que mesmo uma fundamentação sucinta dessa decisão deve ser considerada suficiente face à exigência de fundamentação prevista no artigo 296.°, segundo parágrafo, TFUE, desde que revele de forma clara e inequívoca as razões por que a Comissão considerou não estar em presença de tais dificuldades, sendo a questão do mérito desta fundamentação alheia a esta exigência (31).

49.      Por último, há que sublinhar que, embora os princípios consagrados pela jurisprudência recapitulada nos n.os 41 a 47 das presentes conclusões tenham sido desenvolvidos principalmente em relação às decisões de não levantar objeções a que se refere o artigo 4.°, n.° 3, do Regulamento 2015/1589, aqueles são igualmente aplicáveis às decisões, como a decisão controvertida, que declaram que a medida «não constitui um auxílio», previstas no artigo 4.°, n.° 2, deste regulamento (32).

50.      É à luz destas exigências que importa verificar se o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao decidir, no acórdão recorrido, que a Comissão não dissipou, no termo da análise preliminar que efetuou ao abrigo do artigo 108.°, n.° 3, TFUE, as dúvidas à volta dos ativos sob gestão, a saber, determinar, por um lado, se os ativos sob gestão incorporados pela Lekarna Ljubljana o.p. e pela Lekarna Ljubljana após 1979 o foram, efetivamente, em condições de mercado, e, consequentemente, se foram concedidos auxílios através desses ativos (primeiro fundamento de recurso), e, por outro, se os ativos concedidos sob gestão em 1979 à Lekarna Ljubljana o.p. e transferidos em 1997 para a Lekarna Ljubljana, contanto que pudessem ser qualificados de auxílios de Estado, eram auxílios existentes ou novos auxílios (segundo fundamento de recurso).

B.      Quanto ao primeiro fundamento de recurso

1.      Argumentos das partes

51.      Com o primeiro fundamento de recurso, que tem por objeto os n.os 48 a 50 do acórdão recorrido, relativos à análise dos ativos sob gestão incorporados pela Lekarna Ljubljana o.p. e pela Lekarna Ljubljana após 1979, a República da Eslovénia, apoiada pela Comissão, acusa, em substância, o Tribunal Geral de ter definido mal o âmbito das obrigações que incumbem à Comissão durante a fase preliminar de análise instituída pelo artigo 108.°, n.° 3, TFUE, ao adotar um limiar de prova demasiado baixo no que respeita à determinação da existência de «dificuldades sérias» suscetíveis de justificar a abertura do procedimento formal de investigação, ao abrigo do artigo 108.°, n.° 2, TFUE.

52.      Mais precisamente, foi sem razão que o Tribunal Geral decidiu, no n.° 49 do acórdão recorrido, que a situação relativa à natureza e ao estatuto dos ativos sob gestão após 1979 não era «clara». Também concluiu erradamente, no n.° 50 desse acórdão, que a Comissão não tinha dissipado as dúvidas quanto à questão de saber se as empresas acima referidas tinham adquirido a totalidade dos seus ativos sob gestão, após 1979, de acordo com as condições de mercado e se, consequentemente, não tinham sido atribuídos auxílios de Estado a estas entidades através desses ativos.

53.      Em apoio destas considerações, a República da Eslovénia, num primeiro momento, toma posição sobre o conjunto dos sete documentos e elementos fornecidos por PF durante o procedimento de análise preliminar e analisados pelo Tribunal Geral no acórdão recorrido, alegando, em substância, que nenhum desses elementos pode, objetivamente, suscitar dúvidas quanto à existência de um hipotético auxílio de Estado. Com efeito, uma vez que PF não forneceu o menor indício concreto ou elemento de prova que pudesse objetivamente criar a suspeição de que o município de Ljubljana tinha transmitido à Lekarna Ljubljana ativos sob gestão a título gratuito ou em condições mais favoráveis do que as condições de mercado, a Comissão podia legitimamente confiar nas garantias dadas pelas autoridades eslovenas de que esses ativos sob gestão foram atribuídos em condições de mercado e não era obrigada a procurar, por sua própria iniciativa, informações que pudessem eventualmente ser pertinentes para efeitos de declaração da existência de um hipotético auxílio de Estado.

54.      Num segundo momento, a República da Eslovénia acusa o Tribunal Geral de ter considerado, como decorre do n.° 48 do acórdão recorrido, que não cabia a PF demonstrar, além de toda a dúvida possível, que os ativos sob gestão da Lekarna Ljubljana incluíam ativos constitutivos de um auxílio de Estado, mas que incumbia, pelo contrário, à Comissão, confrontada com uma situação de «incerteza», proceder a uma análise mais aprofundada. Ao decidir deste modo, o Tribunal Geral aplicou incorretamente o padrão jurídico das «dificuldades sérias», uma vez que aplicou um limiar probatório inadequado e manifestamente demasiado baixo para efeitos de determinação, por PF, da existência de uma dúvida, sem ter em conta, para tal, a margem de apreciação de que a Comissão dispõe para dar início ao procedimento formal de investigação ao abrigo do artigo 108.°, n.° 3, TFUE. Esta abordagem, que contraria, além disso, o padrão estabelecido pelo Tribunal de Justiça no Acórdão Tempus Energy, leva, portanto, a eliminar qualquer distinção entre a fase preliminar e o procedimento formal de investigação, obrigando a Comissão a prosseguir este último procedimento sempre que uma parte manifeste, durante a primeira dessas fases, preocupações relativamente a um alegado auxílio de Estado, ainda que essa parte não apresente o menor elemento de prova plausível em apoio das suas alegações.

55.      PF sustenta que o primeiro fundamento deve ser julgado improcedente.

2.      Apreciação

56.      Como decorre da jurisprudência do Tribunal de Justiça, a legalidade de uma decisão que, após uma análise preliminar, declare que uma medida não constitui um auxílio depende da questão de saber se a apreciação das informações e dos elementos de que a Comissão dispunha, na fase preliminar de análise, devia objetivamente ter suscitado dúvidas quanto a essa qualificação, dando lugar à abertura de um procedimento formal de investigação (33).

57.      Para proceder a esse controlo da legalidade, e na medida em que o conteúdo dos n.os 48 a 50 do acórdão recorrido, expressamente referidos no primeiro fundamento, reflete a análise efetuada nos números anteriores do acórdão recorrido, considero útil recordar o raciocínio seguido pelo Tribunal Geral nos n.os 40 a 50 desse acórdão, sobre a análise dos ativos sob gestão adquiridos pela Lekarna Ljubljana o.p. e pela Lekarna Ljubljana após 1979 (34).

58.      A este respeito, o Tribunal Geral observou, num primeiro momento, que a conclusão da Comissão segundo a qual esses ativos não constituíam auxílios de Estado se baseava na afirmação das autoridades eslovenas de que todos os referidos ativos foram adquiridos no mercado privado sem nenhum apoio público. No entanto, para chegar a esta conclusão, a Comissão limitou‑se a fazer referência às garantias dadas nesse sentido pelas autoridades eslovenas, embora não tivesse sido apresentado nenhum elemento de prova concreto em apoio desta afirmação (35).

59.      Num segundo momento, para determinar se tinham sido concedidos auxílios de Estado através dos ativos sob gestão após 1979, o Tribunal Geral examinou os diferentes documentos apresentados por PF para demonstrar a existência de «dificuldades sérias» com as quais a Comissão se deparou. O Tribunal Geral começou por se pronunciar sobre o extrato do relatório anual da Lekarna Ljubljana relativo a 2012, que fazia referência a dois bens imóveis que beneficiavam de um estatuto especial e que lhe tinham sido transferidos sob gestão pelo município de Ljubljana (a seguir «dois bens imóveis em causa»), sem que fossem especificadas as condições dessa transferência (36). Em seguida, após ter constatado que a Lekarna Ljubljana pertencia à categoria de beneficiários prevista no artigo 24.° da Lei eslovena relativa aos Ativos Físicos do Estado e das Autarquias Locais, ao abrigo do qual o Estado e as autarquias locais podem atribuir gratuitamente ativos físicos a entidades públicas que não sejam empresas públicas, se for do interesse público, o Tribunal Geral indicou, em substância, que não podia excluir‑se que este tipo de cessão de ativos físicos fosse abrangido pelo conceito de «auxílio de Estado» (37). Por último, O Tribunal Geral examinou os diferentes extratos de contas públicas da Lekarna Ljubljana e do município de Ljubljana relativos a 2010, apresentados por PF. Esses extratos revelaram certas discrepâncias entre os números do município relativos ao valor dos ativos concedidos sob gestão à Lekarna Ljubljana e os que resultavam das contas públicas desta última. A este respeito, o Tribunal Geral salientou que «não parece possível saber, apenas com base nessas contas públicas, quais dos ativos concedidos sob gestão à Lekarna Ljubljana correspondem, respetivamente, a ativos imobiliários atribuídos gratuitamente ou em condições preferenciais pelo município de Ljubljana, a ativos imobiliários adquiridos em condições de mercado pela Lekarna Ljubljana ou ainda a ativos financeiros ou monetários» e que «não cabia a [PF] provar, sem margem de dúvida, que os ativos sob gestão da Lekarna Ljubljana incluíam ativos correspondentes a auxílios de Estado, mas sim à Comissão, perante uma situação de incerteza nesta matéria, aprofundar as suas investigações» (38).

60.      Tendo em conta os elementos precedentes, o Tribunal Geral concluiu, em substância, que, no termo da análise preliminar efetuada ao abrigo do artigo 108.°, n.° 3. TFUE, a Comissão não tinha dissipado as dúvidas existentes sobre se os ativos sob gestão incorporados pela Lekarna Ljubljana o.p. e pela Lekarna Ljubljana após 1979 o foram em condições de mercado e, consequentemente, se foram concedidos auxílios de Estado a estas entidades através desses ativos (39). Em seu entender, a Comissão não cumpriu o ónus da prova que lhe incumbia, uma vez que certos elementos realçados por PF durante o procedimento administrativo, como os mencionados nos n.os 58 e 59 das presentes conclusões, refletiam uma situação «pouco clara» quanto à natureza e ao estatuto desses ativos sob gestão. O Tribunal Geral acrescentou que, perante tal situação, cabia à Comissão aprofundar as suas investigações para determinar — através dos amplos poderes de que dispõe ao abrigo do Tratado FUE e do Regulamento 2015/1589 — se os ativos sob gestão da Lekarna Ljubljana incluíam ativos correspondentes a auxílios de Estado. Não se podia considerar que o ónus da prova a este respeito incumbia a PF, para a qual pode ser muito mais difícil obter os elementos de informação pertinentes a este respeito junto das autoridades públicas suscetíveis de terem concedido auxílios de Estado (40).

61.      É com base nesta análise que importa abordar as várias alegações apresentadas pela República da Eslovénia e pela Comissão.

62.      Em primeiro lugar, há que recordar que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, quando o Tribunal Geral apura ou aprecia os factos, o Tribunal de Justiça só tem competência, ao abrigo do artigo 256.° TFUE, para fiscalizar a qualificação jurídica desses factos e as consequências jurídicas deles extraídas. A apreciação dos factos não constitui, portanto, exceto em caso de desvirtuação dos elementos de prova apresentados ao Tribunal Geral, uma questão de direito sujeita, enquanto tal, à fiscalização do Tribunal de Justiça no âmbito de um recurso (41). No caso em apreço, independentemente da questão de saber se o Tribunal Geral considerou erradamente, no n.° 50 do acórdão recorrido, que a Comissão não tinha dissipado as dúvidas sobre se os ativos sob gestão após 1979 constituíam auxílios de Estado, as alegações que visam contestar o valor dos elementos de prova que PF apresentou no âmbito do procedimento administrativo e que o Tribunal Geral analisou no acórdão recorrido devem ser julgadas inadmissíveis, porquanto se destinam, na realidade, a obter uma nova apreciação desses elementos de facto, o que extravasa da competência do Tribunal de Justiça. Além disso, na audiência, a República da Eslovénia e a Comissão afirmaram que não punham em causa a materialidade dos factos apurados pelo Tribunal Geral invocando a desvirtuação dos elementos de prova. Por conseguinte, não há que analisar os argumentos específicos, de natureza factual, invocados pela República da Eslovénia e pela Comissão, que dizem respeito aos vários elementos de prova.

63.      Em segundo lugar, como elas também confirmaram na audiência, tanto a República da Eslovénia como a Comissão contestam a qualificação jurídica dos factos acima referidos, enquanto indícios suscetíveis de demonstrar dúvidas que rodeiam a existência ou a compatibilidade da medida em causa com o mercado interno. Ora, o alegado erro na qualificação jurídica pressupõe a existência de um erro na definição do limiar do ónus da prova que incumbe a PF quando invoca a existência de «dificuldades sérias» suscetíveis de justificar a abertura do procedimento formal de investigação.

64.      A este respeito, no âmbito da determinação das «normas e princípios aplicáveis» (42), o Tribunal Geral, nos n.os 35 e 36 do acórdão recorrido, referiu‑se ao padrão jurídico aplicável de modo, totalmente, conforme com a jurisprudência constante, referida nos n.os 41 a 47 das presentes conclusões. Mais precisamente, no n.° 35 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral recordou, com razão, que, «quando a Comissão examina medidas de auxílios à luz do artigo 107.° TFUE para determinar se são compatíveis com o mercado interno, é obrigada a dar início [ao procedimento formal de investigação] se, após a fase de análise preliminar, não pôde afastar todas as dificuldades que impedem de concluir pela compatibilidade dessas medidas com o mercado interno» e que «[o]s mesmos princípios devem ser aplicados quando a Comissão permaneça com dúvidas quanto à própria qualificação de auxílio, na aceção do artigo 107.°, n.° 1, TFUE, da medida examinada». Do mesmo modo, no n.° 36 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral concluiu que «quando a Comissão examina uma medida à luz dos artigos 107.° e 108.° TFUE e se vê confrontada, no termo de uma análise preliminar [...], com dificuldades persistentes ou com dúvidas, isto é, com dificuldades sérias, quer quanto à qualificação dessa medida de auxílio de Estado, quer quanto à sua qualificação de auxílio existente ou de novo auxílio, quer quanto à sua compatibilidade com o mercado interno se considerar estar perante um novo auxílio, é obrigada a dar início ao procedimento previsto no artigo 108.°, n.° 2, TFUE».

65.      Daqui resulta que o Tribunal Geral não pode ser acusado de ter aplicado um limiar manifestamente demasiado baixo no que respeita às exigências probatórias a cumprir para criar a obrigação de abertura do procedimento formal de investigação.

66.      Em terceiro lugar, embora o limiar probatório se revele bem definido, e correndo o risco de ser levado a efetuar uma nova apreciação dos factos, coloca‑se a questão de uma aplicação supostamente errada desse limiar pelo Tribunal Geral, designadamente atendendo aos n.os 48, 49 e 50 do acórdão recorrido, que são expressamente referidos no recurso. Há que recordar que, no n.° 49 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral chegou à conclusão de que, «ao passo que a decisão [controvertida] se limita[va] a fazer referência, no que respeita aos ativos sob gestão incorporados […] após 1979, à afirmação das autoridades eslovenas segundo a qual todos foram adquiridos por entidades em condições de mercado, os elementos apresentados pela recorrente durante o procedimento administrativo […] revelam uma situação pouco clara sobre a natureza e o estatuto dos ativos sob gestão da Lekarna Ljubljana» (o sublinhado é meu). A Comissão alega que esta afirmação das autoridades eslovenas, tendo em conta a obrigação de cooperação leal dos Estados‑Membros, deveria bastar para dissipar qualquer incerteza quanto à existência de um hipotético auxílio de Estado.

67.      Ora, primeiro, embora seja verdade que, nos termos do artigo 4.°, n.° 3, TUE, os Estados‑Membros têm obrigação de cooperar com a Comissão e de prestar todas as informações necessárias para lhe permitir cumprir as obrigações que para ela decorrem do Regulamento 2015/1589 (43), isto não exclui, em si, a existência de «dificuldades sérias» ou de «dúvidas» com as quais a Comissão possa ter sido confrontada no termo de uma análise preliminar. Com efeito, seria contrário ao próprio espírito do procedimento de denúncia na Comissão e à sua eficácia que as «dúvidas» pudessem ser automaticamente dissipadas apenas com base nas afirmações das autoridades nacionais. Aceitar que as dúvidas que rodeiam a existência ou a compatibilidade de uma medida de auxílio possam ser dissipadas com tal facilidade com base nas únicas afirmações das autoridades nacionais privaria não só o procedimento preliminar previsto no artigo 108.°, n.° 2, TFUE de qualquer razão de ser como também poderia pôr em causa o mecanismo de fiscalização dos auxílios de Estado e o papel confiado à Comissão. Bastaria, assim, que um Estado‑Membro negasse as alegações dos denunciantes sem apresentar provas para pôr termo a um procedimento instaurado ao abrigo do artigo 108.° TFUE. Por outro lado, no caso em apreço, como decorre dos n.os 58 a 60 das presentes conclusões, foi só após uma análise aprofundada dos diferentes elementos realçados por PF durante o procedimento administrativo que o Tribunal Geral considerou que a situação era «pouco clara» quanto à natureza e ao estatuto dos ativos sob gestão.

68.      Segundo, considero que foi com razão que o Tribunal Geral declarou, no n.° 49 do acórdão recorrido, que a Comissão não tinha «ela própria esclarecido a questão com base em documentos, cuja não apresentação não pode imputar a [PF]», e que «pode ser, efetivamente, muito mais difícil para um denunciante obter os elementos de informação pertinentes junto das autoridades públicas suscetível de ter concedido auxílios de Estado [...] do que para a Comissão, que dispõe de amplos poderes para o efeito, que decorrem diretamente do Tratado FUE, mas também do Regulamento 2015/1589». Com efeito, por um lado, os denunciantes têm geralmente um acesso limitado às informações pertinentes, tanto públicas como privadas, o que não lhes permite fornecer informações pormenorizadas para que a Comissão possa tomar uma decisão com base em elementos suficientemente completos e fiáveis. Esta dificuldade de acesso aos elementos de prova é ainda mais notória no contexto de um processo, como o que está em causa, que teve origem nos anos 1970, marcado pela transição de uma economia dirigida para uma economia livre e por uma relação de concorrência entre farmácias públicas e privadas (o que torna ainda mais difícil o acesso de PF às informações pertinentes da Lekarna Ljubljana). Por outro lado, importa sublinhar que a Comissão dispõe de um significativo conjunto de poderes que lhe permitem solicitar informações adicionais aos Estados‑Membros, que, regra geral, estão em melhores condições do que os denunciantes para dissipar as eventuais dúvidas (44). Por outro lado, a Comissão é obrigada a conduzir a fase preliminar de análise de forma diligente e imparcial para dispor, quando da adoção de uma decisão final que declare a existência e a compatibilidade ou legalidade do auxílio, dos elementos o mais completos e fiáveis possíveis (45). Neste sentido, não me parece excessivo ou desrazoável considerar que, nesse caso, se lhe impõe dar início ao procedimento formal de investigação, uma vez que a abertura de uma investigação contraditória lhe permite estar mais bem esclarecida antes de tomar uma decisão.

69.      Terceiro, e visto que essa apreciação cabe ao Tribunal Geral, a título exaustivo, observo que, dado que a existência de dificuldades que devem «objetivamente» suscitar dúvidas quanto à qualificação de uma medida de «auxílio» cria a obrigação de abertura de um procedimento formal de investigação, impõe‑se referir, por um lado, que um regime especial, como o regime esloveno, que permite uma relação de concorrência entre as farmácias públicas e privadas, suscita a meu ver, por si só e «objetivamente», interrogações evidentes sobre a sua compatibilidade com as regras em matéria de auxílios de Estado. Por outro lado, a circunstância de existir uma transferência não de ativos, mas, como alega a República da Eslovénia, de «ativos sob gestão» provenientes do município de Ljubljana, uma vez mais, «objetivamente», não exclui, por si só, a possibilidade de transferência de uma vantagem constitutiva de um auxílio de Estado que deveria ter sido mais examinada.

70.      Tendo em conta o que precede, considero que o primeiro fundamento de recurso deve ser julgado improcedente.

C.      Quanto ao segundo fundamento de recurso

1.      Argumentos das partes

71.      Com o segundo fundamento de recurso, que se refere aos n.os 51 a 55 do acórdão recorrido e que tem por objeto a concessão dos ativos sob gestão em 1979, a República da Eslovénia acusa, em substância, o Tribunal Geral de ter decidido que a Comissão era confrontada com «dificuldades sérias» quanto à questão de saber se essa medida, contanto que pudesse ser considerada um auxílio de Estado, constituía um auxílio «existente», na aceção do artigo 1.°, alínea b), do Regulamento 2015/1589, ou se, entretanto, tinha sido «alterada», na aceção do artigo 4.°, n.° 1, do Regulamento 794/2004, de modo que fosse qualificada de «novo auxílio», na aceção do artigo 1.°, alínea c), do Regulamento 2015/1589.

72.      Com efeito, segundo a República da Eslovénia, o Tribunal Geral concluiu erradamente, nos n.os 55 e 56 do acórdão recorrido, pela existência de dificuldades sérias no que respeita à referida medida, apesar de resultar inequivocamente do considerando 39 da decisão controvertida que a Comissão tinha claramente decidido que a medida de concessão dos ativos sob gestão à Lekarna Ljubljana o.p. em 1979, aquando da sua criação, «contanto que essa medida pudesse constituir um auxílio de Estado, poderia, quando muito, ser um auxílio existente».

73.      Foi também erradamente que o Tribunal Geral considerou, no n.° 54 do acórdão recorrido, que a situação «de início», a saber, a existente em 10 de dezembro de 1994 (46), era incerta, uma vez que a decisão controvertida não continha nenhuma informação suscetível de esclarecer se, nessa data, já havia farmácias privadas que tinham obtido concessões municipais ou se a Lekarna Ljubljana o.p. ainda estava em situação de monopólio na sua área de atividade (47).

74.      Além disso, o Tribunal Geral considerou, erradamente, nos n.os 51 a 54 do acórdão recorrido, que a Lekarna Ljubljana e a Lekarna Ljubljana o.p. operavam em condições diferentes, quando, tendo em conta as alterações jurídicas e legislativas ocorridas antes de 10 de dezembro de 1994, esta última, na realidade, operou nas mesmas condições que a sua sucessora (48).

75.      Por último, a República da Eslovénia pretende, neste âmbito, refutar as diferentes alegações formuladas por PF durante o procedimento administrativo, designadamente, as relativas, por um lado, ao facto de a Comissão não ter dissipado as dúvidas sobre se a medida em causa foi alterada após 1 de maio de 2004, a saber, a data de adesão da República da Eslovénia à União Europeia, e, por outro, ao facto de a Comissão não ter verificado a compatibilidade dessa medida com o mercado interno. No que respeita à primeira destas alegações, ela invoca, em substância, que, dado que o Tribunal Geral, no n.° 54 do acórdão recorrido, refere incorretamente que a Lekarna Ljubljana apresentava diferenças notórias em relação à entidade à qual sucedeu em 1997, esta alegação suscitada por PF deixa de ter fundamento. Quanto à segunda alegação, a República da Eslovénia considera que é juridicamente irrelevante, uma vez que a compatibilidade de uma medida de auxílio só se impõe, por força do artigo 108.°, n.° 1, TFUE, no que se refere aos regimes de auxílios, ao passo que a medida em causa no caso em apreço é um auxílio individual. Ora, o Tribunal Geral acolheu este argumento jurídico, não tendo indicado quaisquer motivos para o rejeitar.

76.      Tendo em conta as considerações precedentes, a República da Eslovénia conclui que a Comissão não tinha qualquer obrigação de dar início ao procedimento formal de investigação ao abrigo do artigo 108.°, n.° 2, TFUE. Com efeito, atendendo aos dados de que dispunha na fase preliminar de análise, não teve nenhuma base material ou jurídica para concluir pela existência de «dificuldades sérias». Por outro lado, contrariamente ao que o Tribunal Geral sustentou no acórdão recorrido, essa decisão estava suficientemente fundamentada.

77.      PF propõe que este fundamento seja julgado improcedente.

2.      Apreciação

78.      Tendo em conta o caráter técnico e específico das diferentes alegações apresentadas pela República da Eslovénia no âmbito do segundo fundamento, a sua análise exige relembrar o raciocínio seguido pelo Tribunal Geral, exposto nos n.os 51 a 55 do acórdão recorrido.

79.      Antes de mais, importa recordar que, no âmbito do sistema de fiscalização dos auxílios de Estado, o procedimento difere consoante os auxílios sejam existentes ou novos. Enquanto os auxílios existentes podem, em conformidade com o artigo 108.°, n.° 1, TFUE, ser normalmente executados desde que a Comissão não tenha declarado a sua incompatibilidade, o artigo 108.°, n.° 3, TFUE prevê que os projetos relativos à instituição de auxílios novos ou à alteração de auxílios existentes devem ser notificados, atempadamente, à Comissão, e não podem ser postos em execução antes de o procedimento haver sido objeto de uma decisão final. Devem ser considerados auxílios novos sujeitos à obrigação de notificação as medidas adotadas após a entrada em vigor do Tratado FUE que visem instituir ou alterar auxílios, sendo que essas alterações podem dizer respeito quer aos auxílios existentes quer aos projetos iniciais notificados à Comissão (49).

80.      A este respeito, o conceito de «novo auxílio» é definido, no artigo 1.°, alínea c), do Regulamento 2015/1589, como «quaisquer auxílios, isto é, regimes de auxílio e auxílios individuais, que não sejam considerados auxílios existentes, incluindo as alterações a um auxílio existente». O artigo 4.°, n.° 1, primeiro período, do Regulamento n.° 794/2004 dispõe, a este respeito, que «[se entende] por alteração de um auxílio existente qualquer modificação que não seja de natureza puramente formal ou administrativa destinada a não afetar a apreciação da compatibilidade da medida de auxílio com o mercado [interno]». O Tribunal de Justiça declarou que uma alteração não pode ser qualificada de «puramente formal ou administrativa», na aceção desta disposição, quando for suscetível de influir na avaliação da compatibilidade da medida de auxílio com o mercado interno (50).

81.      A este respeito, o ponto de partida da análise do Tribunal Geral é a decisão controvertida. Assim, recordou no n.° 52 do acórdão recorrido que, para explicar que os ativos concedidos sob gestão em 1979 e transferidos em 1997 para a Lekarna Ljubljana constituíam, contanto que pudessem ser auxílios de Estado, auxílios existentes, a Comissão se limitou a indicar, no considerando 39 da decisão controvertida, que a sucessão, em 1997, entre a Lekarna Ljubljana o.p. e a Lekarna Ljubljana era de natureza puramente administrativa e que o contexto legal, a utilização e as condições de utilização dos ativos não tinham mudado desde então, pelo que o auxílio existente em vigor em 1997 não tinha sido alterado e continuava a ser um auxílio existente.

82.      O Tribunal Geral constatou, no n.° 53 do acórdão recorrido, que, em conformidade com as disposições do anexo IV, ponto 3, n.° 1, alínea a), do Ato de Adesão, os auxílios individuais em execução antes de 10 de dezembro de 1994 na Eslovénia e que continuavam a ser aplicáveis depois da data da adesão desse Estado‑Membro, a saber, 1 de maio de 2004, eram considerados, no momento da adesão, auxílios existentes. No caso em apreço, o Tribunal Geral considerou, portanto, que um auxílio executado na Eslovénia antes de 10 de dezembro de 1994 devia ser considerado um auxílio existente em 1 de maio de 2004, desde que não tivesse sido alterado entre essas duas datas, sob pena de ser considerado um «novo auxílio» a partir da segunda data. Por outro lado, a alteração desse auxílio após 1 de maio de 2004 torná‑lo‑ia também um novo auxílio. Por conseguinte, para que os ativos concedidos sob gestão em 1979 à Lekarna Ljubjana o.p., e depois transferidos em 1997 para a Lekarna Ljubjana, constituam «auxílios existentes», é necessário que nenhuma alteração desses supostos auxílios se tenha verificado entre 10 de dezembro de 1994 e o dia da adoção da decisão controvertida. Esse quadro de análise, que, de resto, não é contestado, é válido juridicamente.

83.      Neste contexto, nos n.os 54 e 55 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral verificou, portanto, corretamente, se os diferentes elementos apresentados por PF eram suscetíveis de demonstrar uma «alteração» da natureza do «auxílio existente» ocorrida após 10 de dezembro de 1994, que o teria tornado um «novo auxílio».

84.      A este respeito, o Tribunal Geral decidiu, antes de mais, que, em 10 de dezembro de 1994, o contexto regulamentar era «incerto», dado que nenhuma informação constante da decisão controvertida permitia dizer se as farmácias privadas já tinham, nessa data, obtido concessões municipais e se a Lekarna Ljubljana o.p. ainda estava em situação de monopólio na sua área de atividade. Em seguida, com base em indicações não desmentidas fornecidas por PF, o Tribunal Geral observou que, em 1997, quando a Lekarna Ljubljana sucedeu à Lekarna Ljubljana o.p., o mercado era concorrencial, o que teria provocado alterações notórias para a nova entidade, tais como a capacidade de adquirir propriedades; a prossecução, pelo menos a partir de 2007, de um fim lucrativo; e o alargamento da sua atividade fora do território do município de Ljubljana. Na falta de uma análise mais aprofundada no que respeita à evolução do contexto legal e económico da atividade em causa, que a Comissão devia, no âmbito das suas obrigações de fiscalização, efetuar por sua própria iniciativa, o Tribunal Geral concluiu que esses elementos «impedem de ter certeza quanto à inexistência de uma alteração do eventual auxílio em causa desde 10 de dezembro de 1994». Esta conclusão não foi posta em causa pela afirmação da Comissão segundo a qual a sucessão ocorrida em 1997 era de natureza puramente administrativa e que o contexto legal e as condições de utilização dos ativos em questão não tinham mudado, afirmação que era, «pelo menos, insuficientemente fundamentada a este respeito». Foi assim que o Tribunal Geral concluiu, no n.° 55 do acórdão recorrido, que a Comissão não tinha dissipado as dúvidas sobre se os ativos em causa, contanto que pudessem ser qualificados de «auxílios de Estado», constituíam auxílios existentes ou novos auxílios.

85.      À luz dessa análise, saliento, em primeiro lugar, que, pelas mesmas razões evocadas no n.° 62 das presentes conclusões, os argumentos apresentados pela República da Eslovénia no âmbito do segundo fundamento, que se destinam, na realidade, a pôr em causa apreciações de ordem factual efetuadas pelo Tribunal Geral, devem ser julgados inadmissíveis.

86.      Em segundo lugar, à semelhança da minha conclusão no âmbito do primeiro fundamento de recurso, saliento que não se verificou nenhum erro na definição do padrão jurídico que permite provar a existência de dificuldades sérias, uma vez que as observações preliminares do Tribunal Geral constantes dos n.os 35 e 36 do acórdão recorrido, examinadas no n.° 64 das presentes conclusões, são igualmente válidas e pertinentes para a análise do segundo fundamento de recurso. Por outro lado, foi a esses mesmos números que o Tribunal Geral fez referência, no n.° 54 do acórdão recorrido, quando decidiu que era necessária uma análise mais aprofundada quanto à evolução do contexto legal e económico da atividade em causa.

87.      Em terceiro lugar, no que respeita às alegações mais circunscritas relativas à qualificação jurídica dos factos e ao risco de ser levado a proceder a uma nova apreciação, parece‑me razoável, tendo em conta a natureza e a importância das incertezas que rodeiam o contexto legal e económico, identificadas pelo Tribunal Geral no n.° 54 do acórdão recorrido, concluir que essas incertezas deveriam objetivamente ter suscitado dúvidas quanto à qualificação de auxílio existente do auxílio em causa, dando origem à abertura de um procedimento formal de investigação. Com efeito, à luz da jurisprudência referida no n.° 80 das presentes conclusões, essas incertezas diziam respeito a elementos suscetíveis «de influir na avaliação da compatibilidade da medida com o mercado interno».

88.      Por conseguinte, considero que também deve ser julgado improcedente o segundo fundamento de recurso.

VII. Conclusão

89.      Tendo em conta as considerações precedentes, e porquanto as presentes conclusões têm por objeto os dois primeiros fundamentos de recurso, proponho que o Tribunal de Justiça julgue improcedentes esses fundamentos.


1      Língua original: francês.


2      Regulamento do Conselho, de 13 de julho de 2015, que estabelece as regras de execução do artigo 108.° [TFUE] (JO 2015, L 248, p. 9).


3      V., nomeadamente, Acórdãos de 29 de abril de 2021, Achemos Grupė e Achema/Comissão (C‑847/19 P, a seguir «Acórdão Achemos Grupė», EU:C:2021:343, n.° 44); de 2 de setembro de 2021, Comissão/Tempus Energy e Tempus Energy Technology (C‑57/19 P, a seguir «Acórdão Tempus Energy», EU:C:2021:663); de 6 de outubro de 2021, Scandlines Danmark e Scandlines Deutschland/Comissão (C‑174/19 P e C‑175/19 P, a seguir «Acórdão Scandlines», EU:C:2021:801); de 17 de novembro de 2022, Irish Wind Farmers’ Association e o./Comissão (C‑578/21 P, a seguir Acórdão «Irish Wind Farmers’ Association», EU:C:2022:898); de 14 de setembro de 2023, Comissão e IGG/Dansk Erhverv (C‑508/21 P e C‑509/21 P, a seguir «Acórdão IGG/Dansk Erhverv», EU:C:2023:669); de 23 de novembro de 2023, Ryanair/Comissão (C‑209/21 P, a seguir «Acórdão Ryanair», EU:C:2023:905); e de 11 de janeiro de 2024, Wizz Air Hungary/Comissão (C‑440/22 P, a seguir «Acórdão Wizz Air», EU:C:2024:26).


4      JO 2003, L 236, p. 17.


5      JO 2003, L 236, p. 33.


6      Regulamento da Comissão de 21 de abril de 2004, relativo à aplicação do Regulamento (UE) 2015/1589 do Conselho, que estabelece as regras de execução do artigo 108.° [TFUE] (JO 2004, L 140, p. 1), conforme alterado pelo Regulamento (UE) 2015/2282 da Comissão, de 27 de novembro de 2015 (JO 2015, L 325, p. 1).


7      Acórdão recorrido, n.os 18 a 20.


8      Acórdão recorrido, n.° 57.


9      Acórdão recorrido, n.° 17.


10      Acórdão recorrido, n.° 22.


11      V., respetivamente, acórdão recorrido, n.os 51 a 57 e n.os 40 a 50. Quanto à análise do Tribunal Geral sobre os ativos sob gestão em 1979 e os ativos sob gestão após 1979, v., respetivamente, n.os 58 a 60 e n.os 79 a 83 das presentes conclusões.


12      Acórdão recorrido, n.° 55.


13      Acórdão recorrido, n.° 50.


14      Acórdão recorrido, n.° 56.


15      V. Acórdão de 24 de novembro de 2020, Viasat Broadcasting UK (C‑445/19, EU:C:2020:952, n.° 17).


16      Regulamento 2015/1589, considerando 2.


17      Regulamento 2015/1589, considerando 3.


18      V. Regulamento 2015/1589, artigo 6.° V., igualmente, Acórdãos de 20 de março de 1984, Alemanha/Comissão (84/82, EU:C:1984:117, n.os 11 e 13); de 2 de abril de 1998, Comissão/Sytraval e Brink’s France (C‑367/95 P, EU:C:1998:154, n.os 33 a 42); de 3 de maio de 2001, Portugal/Comissão (C‑204/97, EU:C:2001:233, n.os 27 a 35); de 17 de setembro de 2015, Mory e o./Comissão (C‑33/14 P, EU:C:2015:609, n.° 94); e de 20 de janeiro de 2022, Deutsche Lufthansa/Comissão (C‑594/19 P, EU:C:2022:40, n.° 33).


19      V. Regulamento 2015/1589, artigo 4.°, n.° 5.


20      V. Acórdão de 22 de dezembro de 2008, British Aggregates/Comissão (C‑487/06 P, EU:C:2008:757, n.° 113 e jurisprudência referida).


21      V. Acórdãos de 20 de março de 1984, Alemanha/Comissão (84/82, EU:C:1984:117, n.° 13), Irish Wind Farmers’ Association (n.° 53 e jurisprudência referida) e IGG/Dansk Erhverv (n.° 69).


22      Quanto aos conceitos de «dificuldades sérias» e de «dúvidas», v. Conclusões do advogado‑geral E. Tanchev no processo Comissão/Tempus Energy e Tempus Energy Technology (C‑57/19 P, EU:C:2021:451, n.° 73), que observa que esta expressão e termo são utilizados de forma intermutável na jurisprudência do Tribunal de Justiça.


23      V. Acórdãos de 21 de dezembro de 2016, Club Hotel Loutraki e o./Comissão (C‑131/15 P, a seguir «Acórdão Club Hotel Loutraki», EU:C:2016:989, n.° 31), Tempus Energy (n.° 40), Irish Wind Farmers’ Association (n.° 54), IGG/Dansk Erhverv (n.° 70), Ryanair (n.° 109) e Wizz Air (n.° 95).


24      V. Acórdãos de 12 de outubro de 2016, Land Hessen/Pollmeier Massivholz (C‑242/15 P, EU:C:2016:765, n.° 38), Achemos Grupė (n.° 44), Tempus Energy (n.° 41), Ryanair (n.° 110) e Wizz Air (n.° 96).


25      V. Acórdãos de 24 de maio de 2011, Comissão/Kronoply e Kronotex (C‑83/09 P, EU:C:2011:341, n.° 59), Ryanair (n.° 108) e Wizz Air (n.° 94 e jurisprudência referida).


26      V., neste sentido, Acórdãos Club Hotel Loutraki (n.os 32 e 33), Irish Wind Farmers’ Association (n.° 55) e IGG/Dansk Erhverv (n.° 71).


27      V. Acórdãos de 10 de julho de 1986, Bélgica/Comissão (234/84, EU:C:1986:302, n.° 16), Achemos Grupė (n.° 42), Tempus Energy (n.os 42 e 43) e Irish Wind Farmers’ Association (n.° 56).


28      V. Acórdãos de 2 de abril de 1998, Comissão/Sytraval e Brink’s France (C‑367/95 P, EU:C:1998:154, n.° 62), Achemos Grupė (n.° 43) e Tempus Energy (n.° 44).


29      Acórdão Tempus Energy (n.° 45).


30      V. Acórdãos Tempus Energy (n.° 51) e Irish Wind Farmers’ Association (n.° 59).


31      V. Acórdãos Tempus Energy (n.° 199) e Ryanair (n.° 95).


32      V. Acórdãos Club Hotel Loutraki (n.° 33) e Irish Wind Farmers’ Association (n.° 60).


33      V. n.° 44 das presentes conclusões.


34      Acórdão recorrido, n.° 38.


35      Acórdão recorrido, n.° 40.


36      Acórdão recorrido, n.° 45.


37      Acórdão recorrido, n.° 47.


38      Acórdão recorrido, n.° 48.


39      Acórdão recorrido, n.° 50.


40      Acórdão recorrido, n.os 48 e 49.


41      V. artigo 256.°, n.° 1, segundo parágrafo, TFUE e artigo 58.°, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia. V., igualmente, Acórdãos Scandlines (n.° 86) e Wizz Air (n.os 57 e 58 e jurisprudência referida).


42      V. Acórdão recorrido, n.os 23 a 37.


43      Regulamento 2015/1589, considerando 6. Quanto à obrigação de cooperação leal que vincula reciprocamente a Comissão e os Estados‑Membros na aplicação das regras em matéria de auxílios de Estado, v. Acórdão de 28 de julho de 2011, Mediaset/Comissão (C‑403/10 P, EU:C:2011:533, n.° 126 e jurisprudência referida).


44      V. Acórdãos de 18 de setembro de 1995, SIDE/Comissão (T‑49/93, EU:T:1995:166, n.° 71), e de 28 de setembro de 1995, Sytraval e Brink’s France/Comissão (T‑95/94, EU:T:1995:172, n.° 77).


45      V. n.° 46 das presentes conclusões.


46      Mais precisamente, trata‑se da data considerada no anexo IV, ponto 3, n.° 1, alínea a), do Ato de Adesão para a qualificação de um auxílio concedido pela República da Eslovénia como «auxílio existente».


47      Estas considerações do Tribunal Geral estão erradas porque decorre dos elementos salientados no n.° 51 do acórdão recorrido que, entre 10 de dezembro de 1994 e a data em que a Lekarna Ljubljana sucedeu à Lekarna Ljubljana o.p., a saber, em 1997, o mesmo quadro legal era aplicável, uma vez que as diferentes leis nacionais que regulam, nomeadamente, a abertura do mercado esloveno à concorrência já tinham sido adotadas antes de 10 de dezembro de 1994. Ora, este aspeto é determinante para apreciar se a alteração da segunda medida em causa, qualificada de «auxílio existente», constitui um «novo auxílio», na aceção do artigo 1.°, alínea c), do Regulamento 2015/1589. Com efeito, admitindo‑se que, devido à sua evolução, a segunda medida em causa, sem ter sido um auxílio de Estado no momento da sua introdução, tivesse passado a sê‑lo, essa evolução teria ocorrido, de qualquer modo, antes de 10 de dezembro de 1994. Daqui resultaria que a Comissão não tinha cometido nenhum erro ao concluir, no ponto 39 da decisão controvertida, que, dado que nem o contexto legal nem as condições de utilização dos ativos sob gestão sofreram uma alteração entre 10 de dezembro de 1994 e a data em que a Lekarna Ljubljana substituiu a Lekarna Ljubljana o.p., esta substituição era de natureza puramente administrativa, pelo que não podia constituir uma alteração que tornava um auxílio existente num novo auxílio.


48      Em especial, seria errado considerar, como alegou o Tribunal Geral no n.° 54 do acórdão recorrido, que as entidades se caracterizavam por ter diferenças notórias, uma vez que, ao contrário da sua antecessora, a Lekarna Ljubljana tinha a capacidade de adquirir ativos sob gestão, incluindo bens imóveis, pelo que se impunha questionar se a manutenção da disponibilização de ativos imobiliários sob gestão, sem a respetiva propriedade, continuava a justificar‑se. Ora, à semelhança da Lekarna Ljubljana, a sua antecessora teria, pelo menos desde 1991, quando começou a operar enquanto estabelecimento, tido igualmente a capacidade de adquirir esses ativos sob gestão. A este respeito, a República da Eslovénia precisa que, tal como a sua antecessora, a Lekarna Ljubljana só pode utilizar os ativos que obtém (formalmente) sob gestão do município de Ljubljana, mesmo que esses ativos sejam adquiridos com meios providenciados pela Lekarna Ljubljana. A preocupação do Tribunal Geral quanto à questão de saber se ainda se justifica continuar a disponibilizar ativos sob gestão seria infundada. É evidente que se trata apenas de uma forma de assegurar a um estabelecimento público a utilização dos ativos (como foi indicado, todos os ativos de que dispõe um estabelecimento são detidos sob a forma de ativos sob gestão), o que não implica, em caso algum, a atribuição, a título gratuito, dos ativos sob gestão.


49      V. Acórdão de 28 de outubro de 2021, Eco Fox e o. (C‑915/19 a C‑917/19, EU:C:2021:887, n.os 36 a 38 e jurisprudência referida).


50      V. Acórdão de 28 de outubro de 2021, Eco Fox e o. (C‑915/19 a C‑917/19, EU:C:2021:887, n.° 41 e jurisprudência referida).