Language of document : ECLI:EU:T:2020:249

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção)

10 de junho de 2020 (*)

«Função pública — Funcionários — Direito e obrigações do funcionário — Publicação de um texto cujo objeto está relacionado com a atividade da União — Obrigação de informação prévia — Artigo 17.o‑A do Estatuto — Relatório de notação — Responsabilidade»

No processo T‑608/18,

Mark Anthony Sammut, residente em Foetz (Luxemburgo), representado por P. Borg Olivier, advogado,

recorrente,

contra

Parlamento Europeu, representado por M. Sammut e I. Lázaro Betancor, na qualidade de agentes,

recorrido,

que tem por objeto um pedido nos termos do artigo 270.o TFUE e destinado a obter, em substância, por um lado, a anulação da Decisão do Parlamento de 4 de janeiro de 2018 na medida em que esta não deferiu o pedido do recorrente de remoção de uma apreciação no seu relatório de notação relativo ao ano de 2016 e, por outro, a reparação dos danos materiais e morais alegadamente sofridos pelo recorrente devido à referida decisão,

O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção),

composto por: H. Kanninen, presidente, M. Jaeger e N. Półtorak (relator), juízes,

secretário: S. Bukšek Tomac, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 28 de janeiro de 2020,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

1        O recorrente, Mark Anthony Sammut, é funcionário do Parlamento Europeu.

2        Em novembro de 2016, o recorrente publicou, em Malta, uma obra intitulada LAqwa flEwropa. IlPanama Papers u lPoter (Os melhores na Europa. Os Panamá Papers e o poder; a seguir «obra em causa»).

3        Em 13 de março de 2017, o recorrente comunicou ao diretor‑geral da Direção‑Geral (DG) da Tradução do Parlamento a sua intenção de proceder à publicação de uma segunda edição da obra em causa. Em 7 de abril de 2017, o Parlamento entendeu que o pedido do recorrente era inadmissível com o fundamento de que se tratava de uma segunda edição e, consequentemente, o referido pedido não podia ser considerado uma notificação prévia da publicação da referida obra.

4        O relatório de notação do recorrente relativo ao ano de 2016 contém uma apreciação segundo a qual o recorrente «parece ter omitido a informação junto da Autoridade Investida do Poder de Nomeação da sua intenção de publicar um livro, “L‑Aqwa fl‑Ewropa. Il‑Panama Papers u l‑Poter”, durante o ano de 2016» (a seguir «apreciação controvertida»). Esta apreciação figura na parte denominada «Conduta», com o título «3. Cumprimento de regras e procedimentos», do referido relatório de notação.

5        Em 17 de maio de 2017, o recorrente apresentou ao comité de classificação um pedido de reapreciação do seu relatório de notação relativo ao ano de 2016. Pedia, designadamente, a supressão da apreciação controvertida.

6        Em 4 de janeiro de 2018, o diretor‑geral da DG «Tradução» enviou uma carta ao recorrente informando‑o de que tinha decidido seguir as conclusões do comité de classificação de 8 de novembro de 2017 e, consequentemente, efetuar apenas uma alteração no seu relatório de notação relativo ao ano de 2016, a qual consistia em suprimir a apreciação relativa à produção do recorrente por dia de presença (a seguir «Decisão de 4 de janeiro de 2018»). Deste modo, recusou suprimir a apreciação controvertida do referido relatório de notação.

7        Em 26 de março de 2018, o recorrente apresentou uma reclamação nos termos do artigo 90.o, n.o 2, do Estatuto dos Funcionários da União Europeia (a seguir «Estatuto»), contra a Decisão de 4 de janeiro de 2018. Nesta reclamação, pediu, designadamente, que a Autoridade Investida do Poder de Nomeação (a seguir «AIPN») tome as medidas necessárias para que a apreciação controvertida seja retirada do seu relatório de notação relativo ao ano de 2016.

8        Por carta de 6 de julho de 2018, o Parlamento indeferiu a reclamação do recorrente (a seguir «decisão de indeferimento da reclamação»).

 Tramitação processual e pedidos das partes

9        Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 8 de outubro de 2018, o recorrente interpôs o presente recurso.

10      Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 11 de março de 2019, o recorrente apresentou um pedido de audição de testemunhas. Em 1 de abril de 2019, o Parlamento apresentou as suas observações sobre o referido pedido.

11      Tendo a composição das secções do Tribunal Geral sido alterada, em aplicação do artigo 27.o, n.o 5, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a juíza‑relatora foi afetada à Primeira Secção, à qual o presente processo foi, por conseguinte, atribuído.

12      Na audiência de 28 de janeiro de 2020, foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às questões colocadas pelo Tribunal.

13      O recorrente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        anular parcialmente a Decisão de 4 de janeiro de 2018;

–        anular a decisão de indeferimento da reclamação;

–        ordenar a remoção da apreciação controvertida no seu relatório de notação relativo ao ano de 2016;

–        condenar o Parlamento a reparar diversos danos causados pela Decisão de 4 de janeiro de 2018;

–        condenar o Parlamento nas despesas.

14      O Parlamento conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar o recorrente nas despesas.

 Questão de direito

 Observações preliminares

15      Com o primeiro e o segundo pedidos, o recorrente requer a anulação parcial da Decisão de 4 de janeiro de 2018 e a anulação da decisão de indeferimento da reclamação.

16      A este respeito, recorde‑se que, segundo a jurisprudência, a reclamação administrativa, tal como prevista no artigo 90.o, n.o 2, do Estatuto, e o seu indeferimento, expresso ou tácito, fazem parte integrante de um processo complexo e constituem apenas um requisito prévio à apreciação do Tribunal. Nestas condições, um recurso, ainda que formalmente interposto contra o indeferimento da reclamação, tem por efeito submeter à apreciação do juiz o ato lesivo contra o qual foi apresentada a reclamação (v., por analogia, Acórdão de 17 de janeiro de 1989, Vainker/Parlamento, 293/87, EU:C:1989:8, n.os 7 e 8), exceto no caso de o indeferimento da reclamação ter um alcance distinto do ato contra o qual a reclamação foi apresentada (Acórdão de 25 de outubro de 2006, Staboli/Comissão, T‑281/04, EU:T:2006:334, n.o 26).

17      Com efeito, qualquer decisão de indeferimento de uma reclamação, seja tácita ou expressa, se for pura e simples, limita‑se a confirmar o ato ou a abstenção que o recorrente contesta e não constitui em si mesma um ato recorrível, de modo que se deve entender que os pedidos dirigidos contra essa decisão sem conteúdo autónomo em relação à decisão inicial são dirigidos contra o ato inicial (v. Acórdão de 19 de junho de 2015, Z/Tribunal de Justiça, T‑88/13 P, EU:T:2015:393, n.o 141 e jurisprudência referida).

18      No presente processo, importa observar que a decisão de indeferimento da reclamação apresentada contra a Decisão de 4 de janeiro de 2018 se limita a confirmar a referida decisão, uma vez que não altera o dispositivo da mesma nem contém qualquer reapreciação da situação do recorrente em função de elementos de direito ou de facto novos. A circunstância de a decisão de indeferimento da reclamação especificar os fundamentos da Decisão de 4 de janeiro de 2018 não tem repercussão no seu caráter confirmativo. Em tal hipótese, é efetivamente a legalidade do ato inicial lesivo que é analisada ao tomar em consideração a fundamentação que figura na decisão de indeferimento da reclamação, presumindo‑se que essa fundamentação coincide com o referido ato (v., neste sentido, Acórdão de 9 de dezembro de 2009, Comissão/Birkhoff, T‑377/08 P, EU:T:2009:485, n.o 55 e jurisprudência referida).

19      Nestas condições, dado que a decisão de indeferimento da reclamação é desprovida de conteúdo autónomo, os pedidos de anulação devem ser entendidos como dirigidos contra a Decisão de 4 de janeiro de 2018, cuja legalidade deve ser apreciada tendo em consideração a fundamentação que figura na decisão de indeferimento da reclamação.

 Quanto à admissibilidade do terceiro pedido

20      Com o terceiro pedido, o recorrente pretende que o Tribunal Geral dirija uma injunção ao Parlamento destinada a remover a apreciação controvertida do seu relatório de notação relativo ao ano de 2016.

21      Cumpre recordar a este respeito a jurisprudência constante segundo a qual não cabe ao Tribunal Geral dirigir injunções a uma instituição da União, independentemente da obrigação geral, enunciada no artigo 266.o TFUE, da instituição de que emane o ato anulado, de tomar as medidas necessárias à execução do acórdão que procedeu à anulação (v. Acórdão de 15 de janeiro de 2019, HJ/EMA, T‑881/16, não publicado, EU:T:2019:5, n.o 26 e jurisprudência referida).

22      Por conseguinte, os pedidos de que o Tribunal Geral ordene a remoção da apreciação controvertida no relatório de notação do recorrente relativo ao ano de 2016 devem ser julgados inadmissíveis.

 Quanto à admissibilidade da remissão para os argumentos constantes da reclamação

23      Na petição inicial, o recorrente remete para a reclamação apresentada em 26 de março de 2018, alegando que todos os pontos da referida reclamação devem ser considerados como fazendo parte integrante do presente recurso.

24      Recorde‑se, a este respeito, que, nos termos do artigo 21.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia e do artigo 76.o, alínea d), do Regulamento de Processo, a petição deve indicar o objeto do litígio, os fundamentos e argumentos invocados e a exposição sumária dos referidos fundamentos. Esta indicação deve ser suficientemente clara e precisa para permitir ao demandado preparar a sua defesa e ao Tribunal decidir o recurso, se for o caso, sem outras informações (v., neste sentido, Acórdão de 14 de março de 2013, Fresh Del Monte Produce/Comissão, T‑587/08, EU:T:2013:129, n.o 268).

25      Além disso, os anexos só podem ser tomados em consideração na medida em que sustentem ou completem fundamentos ou argumentos expressamente invocados pelos recorrentes no corpo da sua petição e em que seja possível determinar com precisão quais os elementos que aqueles contêm que sustentam ou completam os referidos fundamentos ou argumentos. Com efeito, ainda que o texto da petição possa ser sustentado e completado por remissões para determinadas passagens de documentos a ela anexados, não cabe ao Tribunal Geral procurar e identificar, nos anexos, os fundamentos e os argumentos que possa considerar que constituem a razão de ser do recurso, tendo os anexos uma função puramente probatória e instrumental (v., neste sentido, Acórdão de 11 de setembro de 2014, MasterCard e o./Comissão, C‑382/12 P, EU:C:2014:2201, n.os 40 e 41 e jurisprudência referida).

26      Ora, no presente processo, o recorrente limita‑se a efetuar uma remissão global para todos os pontos da reclamação, sem outras precisões. Assim sendo, há que observar que essa remissão deve ser julgada manifestamente inadmissível.

 Quanto ao mérito

 Quanto ao pedido de anulação

27      Em apoio do seu pedido de anulação, o recorrente invoca dois fundamentos, que devem ser apreciados conjuntamente. O primeiro é relativo a uma violação do direito fundamental à liberdade de expressão. O segundo é relativo a uma aplicação errada do artigo 17.o‑A, n.o 2, do Estatuto.

28      Os referidos fundamentos dividem‑se, em substância, em três alegações distintas. Em primeiro lugar, o recorrente alega que a obra em causa não é suscetível de prejudicar gravemente os interesses legítimos da União e que, consequentemente, foi punido erradamente no seu relatório de notação relativo ao ano de 2016. Em segundo lugar, o recorrente considera que foi com base numa interpretação demasiado lata do conceito de «atividade da União» que se considerou que o objeto da obra em causa estava relacionado com a referida atividade. Em terceiro lugar, considera que a decisão de indeferimento da reclamação não está fundamentada.

29      O Tribunal Geral julga conveniente examinar, em primeiro lugar, a terceira alegação.

–       Quanto à terceira alegação

30      O recorrente invoca falta de fundamentação da Decisão de 4 de janeiro de 2018 resultante do facto de esta se basear numa mera opinião e não em factos ou considerações jurídicas. A este respeito, alega, primeiro, que a expressão «considero que», utilizada pela AIPN na decisão de indeferimento da reclamação, demonstra que esta se baseia numa opinião e não em elementos objetivos que apresentem um grau de fundamentação suficiente. Segundo, alega que a AIPN não leu a obra em causa e se baseou unicamente no título para concluir que o seu objeto estava relacionado com a atividade da União. A este respeito, o chefe da Unidade linguística maltesa da DG «Tradução» admitiu, aliás, que a referida obra não faz nenhuma referência à atividade da União ou à do Parlamento. Consequentemente, a fundamentação da Decisão de 4 de janeiro de 2018 não é conforme com as exigências previstas quando é necessária a pronúncia sobre uma eventual violação de um direito fundamental.

31      O Parlamento contesta os argumentos do recorrente.

32      A título preliminar, recorde‑se que o dever de fundamentação referido no artigo 296.o TFUE e recordado no artigo 41.o, n.o 2, alínea c), da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia é um princípio essencial do direito da União que tem por objetivo, por um lado, fornecer ao interessado uma indicação suficiente para apreciar a justeza do ato lesivo e a oportunidade de interpor um recurso jurisdicional para impugnar a sua legalidade e, por outro, permitir que o juiz da União exerça a sua fiscalização [v. Acórdão de 3 de julho de 2019, PT/BEI, T‑573/16, EU:T:2019:481, n.o 374 (não publicado) e jurisprudência referida].

33      A fundamentação de uma decisão é apreciada tendo em conta não só o seu teor, mas também o seu contexto e o conjunto das regras jurídicas que regulam a matéria em causa. Assim, uma decisão está suficientemente fundamentada quando tenha tido lugar num contexto conhecido do interessado que lhe permita compreender o alcance da medida adotada em relação a si (v. Acórdão de 1 de abril de 2004, N/Comissão, T‑198/02, EU:T:2004:101, n.o 70 e jurisprudência referida).

34      Importa, no entanto, recordar que o dever de fundamentação constitui uma formalidade essencial que deve ser distinguida da questão do mérito da fundamentação, a qual se prende com a legalidade material do ato controvertido (v. Acórdão de 1 de março de 2017, Silvan/Comissão, T‑698/15 P, não publicado, EU:T:2017:131, n.o 17 e jurisprudência referida).

35      É à luz destas considerações que cabe determinar se, atendendo nomeadamente aos fundamentos constantes da decisão de indeferimento da reclamação, a Decisão de 4 de janeiro de 2018 está suficientemente fundamentada no caso em apreço.

36      A este respeito, saliente‑se que, na decisão de indeferimento da reclamação, a AIPN recordou, primeiro, os direitos e deveres decorrentes do artigo 17.o‑A do Estatuto quanto à publicação de quaisquer textos pelos funcionários da União. Em seguida, observou que o recorrente não tinha notificado previamente o Parlamento da sua intenção de publicar a obra em causa. Por último, indicou ao recorrente o seguinte:

«[c]omo sugere o título do seu livro e como o descreve no n.o 2 da sua reclamação, o seu livro trata dos Panama Papers e das empresas offshores. O Parlamento adotou medidas no domínio do recurso a empresas offshores para o branqueamento de capitais e evasão fiscal. Concretamente, em junho de 2016, a comissão PANA […] foi criada e investigou as relações da União e dos seus Estados‑Membros com os Panama Papers. Por conseguinte, considero que existe uma conexão entre o seu livro e o trabalho do Parlamento.»

37      Neste contexto, em primeiro lugar, o recorrente sustenta que a utilização da expressão «considero» demonstra que a referida decisão não se baseia em elementos objetivos e, consequentemente, não apresenta o grau de fundamentação exigido. Cumpre, no entanto, observar que, contrariamente ao que alega o recorrente, a utilização da expressão «considero» pela AIPN não é, em nada, suficiente para demonstrar que a fundamentação da Decisão de 4 de janeiro de 2018 é subjetiva. Por conseguinte, a utilização daquela expressão não pode, por si só, afetar a legalidade da referida decisão.

38      Por conseguinte, há que julgar este argumento desprovido de fundamento.

39      Em segundo lugar, o recorrente sustenta que é por não ter lido a obra em causa que a AIPN concluiu que era relativa à atividade da União, apesar da opinião contrária formulada pelo chefe da Unidade linguística maltesa da DG «Tradução».

40      Antes de mais, observe‑se a este propósito que a opinião contrária de um chefe de Unidade na DG «Tradução» quanto ao conteúdo da obra em causa é indiferente para efeitos da determinação do caráter objetivamente suficiente da fundamentação da Decisão de 4 de janeiro de 2018.

41      Em seguida, há que constatar que as considerações relativas ao conteúdo da obra em causa remetem para a fiscalização da legalidade quanto ao mérito da decisão e não quanto à sua fundamentação e, consequentemente, não podem ser acolhidas no âmbito de uma alegação relativa à violação do dever de fundamentação. Em quaisquer circunstâncias, há que observar que o Parlamento especificou, na audiência de alegações, que o conteúdo da referida obra tinha sido explicado à AIPN.

42      Por último, resulta do n.o 36, supra, que a Decisão de 4 de janeiro de 2018 era, em substância, fundada no facto de a obra em causa ser relativa aos «Panama Papers» e a empresas offshores e à existência de uma conexão com o trabalho do Parlamento. Foi à luz desses elementos que se considerou que o recorrente não tinha cumprido as obrigações que lhe incumbiam a título do artigo 17.o‑A do Estatuto.

43      Neste contexto, importa observar que a fundamentação era suficiente para permitir ao recorrente determinar se a Decisão de 4 de janeiro de 2018 era fundamentada ou se enfermava de um vício que permitisse contestar a sua validade. Com efeito, com base nos fundamentos anteriormente expostos, o recorrente tinha a possibilidade de compreender as razões específicas pelas quais o Parlamento tinha considerado que deveria ter comunicado à AIPN a sua intenção de publicar a obra em causa. De resto, importa aliás salientar que as referidas razões são contestadas pelo recorrente no âmbito do presente recurso. Além disso, esses motivos são igualmente suficientes para permitir ao Tribunal Geral exercer a sua fiscalização jurisdicional da legalidade da Decisão de 4 de janeiro de 2018.

44      Assim, não se pode contestar que a referida decisão preenche os requisitos enunciados pela jurisprudência, conforme são recordados nos n.os 32 a 34, supra. Por conseguinte, a alegação do recorrente de falta de fundamentação da Decisão de 4 de janeiro de 2018 não deve ser acolhida.

–       Quanto à primeira alegação

45      O recorrente alega que a AIPN lhe impôs uma obrigação mais restritiva do que a prevista pelo artigo 17.o‑A, n.o 2, do Estatuto. O facto de o Parlamento ter criado uma comissão de inquérito responsável por examinar as alegações de infração e de má administração na aplicação do direito da União em matéria de branqueamento de capitais, de evasão fiscal e de fraude fiscal (a seguir «comissão PANA») não tem por consequência que não se possa exprimir sobre a atualidade associada aos «Panama Papers», salvo na hipótese de ter criticado o trabalho da referida comissão, do Parlamento ou da União, de maneira a desrespeitar gravemente os interesses legítimos desta última. O recorrente invoca, a este respeito, o Acórdão de 6 de março de 2001, Connolly/Comissão (C‑274/99 P, EU:C:2001:127), do qual resulta que, no presente processo, não importa saber se omitiu a notificação do projeto de publicação da obra em causa, mas antes determinar se os interesses legítimos da União podiam ser gravemente ameaçados pelo seu conteúdo. Assim, uma vez que a obra em causa não correspondia a essa ameaça, não se pode considerar como estando abrangida pelo requisito previsto no artigo 17.o‑A, n.o 2, do Estatuto, nem como estando relacionada com a atividade da União.

46      O Parlamento contesta a argumentação do recorrente.

47      A título preliminar, importa precisar que não cabe ao Tribunal Geral substituir pela sua apreciação a apreciação efetuada pelas pessoas encarregadas de avaliar o trabalho da pessoa notada. Com efeito, é reconhecido aos avaliadores um amplo poder de apreciação nas avaliações relativas ao trabalho das pessoas que devem classificar. Por conseguinte, a fiscalização jurisdicional exercida pelo juiz da União sobre o conteúdo dos relatórios de classificação limita‑se à fiscalização da regularidade processual, da exatidão material dos factos, bem como da inexistência de erros manifestos de apreciação ou de desvio de poder (v., neste sentido, Acórdãos de 1 de junho de 1983, Seton/Comissão, 36/81, 37/81 e 218/81, EU:C:1983:152, n.o 23, e de 25 de outubro de 2005, Cwik/Comissão, T‑96/04, EU:T:2005:376, n.o 41).

48      Além disso, recorde‑se que, segundo jurisprudência constante, os funcionários e agentes da União gozam do direito à liberdade de expressão, incluindo em áreas abrangidas pela atividade das instituições da União. Esta liberdade abrange a de exprimir, oralmente ou por escrito, opiniões discordantes ou minoritárias em relação às defendidas pela instituição em que trabalham (v. Acórdão de 6 de março de 2001, Connolly/Comissão, C‑274/99 P, EU:C:2001:127, n.o 43 e jurisprudência referida).

49      No entanto, a liberdade de expressão pode ser objeto das restrições a que se refere o artigo 10.o, n.o 2, da Convenção Europeia de Salvaguarda dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada em Roma em 4 de novembro de 1950, nos termos do qual o exercício desta liberdade, que inclui deveres e responsabilidades, pode ser submetido a certas formalidades, condições, restrições ou sanções, previstas pela lei, que constituam providências necessárias, numa sociedade democrática (v, Acórdão de 13 de dezembro de 2012, Strack/Comissão, T‑199/11 P, EU:T:2012:691, n.o 137 e jurisprudência referida).

50      É igualmente legítimo, numa sociedade democrática, submeter os funcionários, devido ao seu estatuto, a deveres como os constantes dos artigos 17.o‑A do Estatuto. Estes deveres, que, é certo, constituem restrições ao exercício da liberdade de expressão, destinam‑se a preservar a relação de confiança que deve existir entre a instituição e os seus funcionários ou agentes (Acórdão de 13 de dezembro de 2012, Strack/Comissão, T‑199/11 P, EU:T:2012:691, n.o 138; v., por analogia, Acórdão de 6 de março de 2001, Connolly/Comissão, C‑274/99 P, EU:C:2001:127, n.o 44).

51      A este respeito, resulta do artigo 17.o‑A, n.o 2, do Estatuto que o funcionário que, individualmente ou em colaboração, tencione publicar ou mandar publicar qualquer texto relacionado com a atividade da União deve informar previamente a AIPN. Esta última está obrigada a manifestar as suas eventuais objeções num prazo de 30 dias úteis a contar da receção da informação, findo o qual se presume que deu o seu acordo implícito a este respeito. A jurisprudência especificou que o referido acordo só pode ser recusado a título excecional, quando a publicação prevista for suscetível de causar um grave prejuízo aos interesses legítimos da União (v., neste sentido, Acórdão de 15 de setembro de 2017, Skareby/SEAE, T‑585/16, EU:T:2017:613, n.os 80 e 81).

52      Daqui resulta que o procedimento a seguir pelos funcionários que tencionem publicar qualquer texto cujo objeto esteja relacionado com a atividade da União é constituído por duas etapas distintas. A primeira etapa prevê a obrigação, que recai sobre o funcionário, de notificar a AIPN da sua intenção de proceder à referida publicação, uma vez que o objeto do texto em causa está associado à atividade da União. A segunda etapa prevê a obrigação, que recai sobre a AIPN, de comunicar ao funcionário em causa, por escrito, a sua decisão num prazo de 30 dias quando tem a possibilidade de demonstrar que esse texto é suscetível de causar um grave prejuízo aos interesses legítimos da União.

53      As diferentes regras que caracterizam cada uma destas duas etapas correspondem ao próprio objeto do procedimento previsto pelo artigo 17.o‑A do Estatuto. Assim, a notificação prévia, pelo funcionário em causa, da sua intenção de publicar qualquer texto cujo objeto esteja relacionado com a atividade da União permite, em seguida, que as instituições exerçam o controlo que estão obrigadas a efetuar nos termos do artigo 17.o‑A, n.o 2, segundo parágrafo, do Estatuto. Atendendo a estas considerações, a capacidade do texto em causa para causar um grave prejuízo aos interesses legítimos da União não é, pois, um critério pertinente a tomar em consideração na fase da notificação da intenção de publicar qualquer texto cujo objeto esteja relacionado com a atividade da União.

54      No presente processo, observe‑se que a AIPN não foi previamente informada da publicação da obra em causa. A este respeito, na Decisão de 4 de janeiro de 2018, o Parlamento apenas considerou que a apreciação controvertida que figurava na parte denominada «Conduta», no título «3. Cumprimento de regras e procedimentos», do relatório de notação do recorrente relativo ao ano de 2016, era justificada à luz do artigo 17.o‑A, n.o 2, do Estatuto, constatando assim um incumprimento do dever de notificação prévia. Em contrapartida, não fez nenhuma apreciação sobre a eventual ameaça que a obra em causa poderia representar para os interesses legítimos da União.

55      Por conseguinte, há que declarar que a circunstância invocada pelo recorrente, segundo a qual a obra em causa não era suscetível de causar um grave prejuízo aos interesses legítimos da União, não é pertinente para efeitos da apreciação da legalidade da Decisão de 4 de janeiro de 2018.

56      Importa, pois, excluir a alegação relativa ao facto de, na medida em que a obra em causa não era suscetível de causar um grave prejuízo aos interesses legítimos da União, o Parlamento ter imposto ao recorrente uma obrigação mais restritiva do que a prevista pelo artigo 17.o‑A, n.o 2, do Estatuto, ao considerar que este último deveria ter notificado o projeto de publicação à AIPN.

–       Quanto à segunda alegação

57      Em primeiro lugar, o recorrente alega que o dever de informação a que estão obrigados os funcionários que tencionem publicar um qualquer texto só recai sobre estes últimos na medida em que o referido texto esteja relacionado com a atividade da União. A este respeito, a AIPN tem a obrigação de adotar uma interpretação estrita do conceito de atividade da União, designadamente à luz de outras orientações que determinam o contexto em cujo âmbito o referido conceito deve ser interpretado. No presente caso, a evocação de uma simples conexão entre a obra em causa e a atividade da União não basta para demonstrar que o recorrente estava obrigado a comunicar à administração a sua intenção de proceder à referida publicação.

58      O recorrente alega, assim, em substância, que a obra em causa não fazia referência a nenhuma atividade da União, respeitando pura e simplesmente a um debate de política interna maltesa. Na medida em que o Parlamento se ocupa de numerosos assuntos em diversos domínios, julgar procedente o raciocínio da AIPN equivaleria a proibir os funcionários da União de se exprimirem sobre qualquer assunto objeto de trabalhos da comissão PANA e do Parlamento. Ora, visto que a obra em causa não faz referência à atividade da referida comissão ou à da União, o seu objeto não respeita, assim, à atividade da União. Assim sendo, o recorrente não prejudicou a sua relação de confiança, nem faltou aos seus deveres de lealdade e de imparcialidade relativamente à União ao não notificar o seu projeto de publicação. Por último,  na hipótese de o objeto desta obra respeitar à atividade da União, o que, no presente caso, estava errado, alega que este último no máximo completa a reflexão da AIPN e do inquérito da comissão PANA.

59      Em segundo lugar, o recorrente acrescenta que, ao aplicar‑lhe uma sanção, a AIPN se atribuiu um poder discricionário superior ao que lhe confere o artigo 17.o‑A, n.o 2, do Estatuto, e, deste modo, desrespeitou o seu direito à liberdade de expressão.

60      Em terceiro lugar, o recorrente salienta que, devido à adição dos diferentes prazos previstos pelo artigo 17.o‑A, n.o 2, do Estatuto, e pelo artigo 90.o, n.o 2, do Estatuto, o prazo previsto para os pedidos de revisão de publicações sujeitas a notificação prévia corresponde a um período de cinco meses. Em face da importância deste prazo, cumpre circunscrever o dever de notificação às publicações que respeitam estritamente à atividade da União.

61      O Parlamento contesta a argumentação do recorrente.

62      Em primeiro lugar, no que respeita à argumentação do recorrente que consiste em sustentar que a obra em causa é relativa a um debate político interno maltês (v. n.os 57 e 58, supra), importa recordar que a Decisão de 4 de janeiro de 2018 é motivada, em substância, pelo facto de a AIPN ter considerado que a obra em causa era relativa ao processo denominado dos «Panama Papers» e a empresas offshores e que, na medida em que este assunto estava ligado ao trabalho do Parlamento, a intenção do recorrente de publicar a referida obra dever‑lhe‑ia ter sido previamente notificada.

63      A este respeito, observe‑se que, em 8 de junho de 2016, o Parlamento adotou a Decisão (UE) 2016/1021, sobre a criação de uma comissão de inquérito para investigar alegadas contravenções ou má administração na aplicação do direito da União relacionadas com o branqueamento de capitais e com a elisão e a evasão fiscais — atribuições, composição numérica e duração do mandato (JO 2016, L 166, p. 10). Resulta do n.o 2 da Decisão 2016/1021 que o exame efetuado pela comissão PANA devia designadamente abranger a atividade de todos os Estados‑Membros da União, entre os quais Malta.

64      Além disso, se é certo que o relatório final redigido no âmbito da comissão PANA é posterior à publicação da obra em causa, importa contudo constatar que corrobora as afirmações constantes do n.o 63, supra, na medida em que dá conta que uma missão de investigação no terreno que efetivamente foi enviada a Malta em 20 de fevereiro de 2017. Por outro lado, resulta igualmente dos elementos juntos aos autos que a página 86 da obra em causa relata o convite a apresentar‑se perante uma comissão do Parlamento recebido por um ministro do Governo maltês, a fim de dar explicações relativas à sociedade que possuiu no Panamá.  Tendo em conta estes elementos, há que constatar que os trabalhos da comissão PANA estavam associados à situação maltesa, designadamente para efeitos de analisar eventuais infrações na aplicação do direito da União em matéria de branqueamento de capitais, de evasão fiscal e de fraude fiscal.

65      Cumpre, pois, constatar que o objeto da obra em causa respeitava precisamente às atribuições da comissão PANA na medida em que esta tinha o dever de avaliar a situação dos Estados‑Membros da União, designadamente de Malta, em matéria de branqueamento de capitais, de evasão fiscal e de fraude fiscal.

66      Além disso, observe‑se que o recorrente não tem razão ao defender que não existe na obra em causa nenhuma referência à atividade da União e que se limita a tratar o objeto de estudo na perspetiva puramente interna.

67      Com efeito, o título da obra em causa, Os melhores na Europa. Os Panama Papers e o poder, inscreve‑a claramente num contexto europeu, tanto mais que figura na capa uma reprodução da bandeira da União. Além disso, a referida obra contém igualmente várias referências a trabalhos e a personalidades ligadas ao quadro institucional da União. Assim, podem designadamente mencionar‑se a este respeito as referências aos trabalhos da comissão PANA,  à presidência maltesa do Conselho da União Europeia, bem como a um deputado europeu. Além disso, um anexo da obra em causa evoca o tema do Brexit e menciona expressamente o mercado interno da União.

68      Tendo em conta o que precede, não se pode, pois, sustentar que a obra em causa respeita pura e simplesmente a um debate relativo à política interna maltesa e que o seu objeto não está de maneira nenhuma associado à atividade da União. Com efeito, ainda que se considerasse que o tema da referida obra é sobretudo tratado numa perspetiva nacional, na medida em que respeita a políticas e políticos malteses, não é menos verdade que estes últimos eram concomitantemente objeto dos trabalhos da comissão PANA. Por conseguinte, há que observar que o objeto da obra em questão está relacionado com a atividade da União. Além disso, a obra em causa contém múltiplas referências concretas a esta atividade, conforme resulta do n.o 67, supra.

69      Assim sendo, há que concluir que, dado que o objeto da obra em causa está relacionado com a atividade da União, não se pode considerar que o Parlamento cometeu um erro manifesto de apreciação ou foi culpado de um desvio de poder ao considerar que o recorrente deveria ter notificado o projeto de publicação à AIPN, em conformidade com o que prevê o artigo 17.o‑A, n.o 2, do Estatuto.

70      Consequentemente, o argumento do recorrente de que o artigo 17.o‑A, n.o 2, do Estatuto foi aplicado de maneira errada na Decisão de 4 de janeiro de 2018, violando assim o seu direito à liberdade de expressão, não pode ser acolhido.

71      Em segundo lugar, no que respeita à argumentação do recorrente que consiste em alegar que a AIPN se atribuiu um poder discricionário superior ao que lhe confere o artigo 17.o‑A (v. n.o 59, supra), cumpre salientar que o presente recurso tem exclusivamente por objeto a legalidade da Decisão de 4 de janeiro de 2018, e, consequentemente, a questão de saber se o Parlamento tinha fundamento para declarar, no relatório de notação do recorrente relativo ao ano de 2016, que este último tinha omitido a informação junto da AIPN da publicação da obra em causa em 2016.

72      Importa igualmente observar que resulta da jurisprudência recordada nos n.os 49 a 51, supra, que é legítimo submeter os funcionários da União a obrigações como as constantes do artigo 17.o‑A do Estatuto. Além disso, nada se opõe a que a AIPN refira, num relatório de notação, um incidente pontual, designadamente quando, como no presente processo, este tem por objeto a violação de uma regra clara e específica diretamente saída do Estatuto. Com efeito, nestas circunstâncias, a formulação de uma observação, como a apreciação controvertida, num relatório de notação não só não é contrária a uma disposição do Estatuto, nomeadamente ao seu artigo 43.o, como pode ter por objetivo legítimo advertir o interessado e evitar uma repetição da violação da regra estatutária em causa (v., neste sentido, Acórdão de 26 de março de 2015, CW/Parlamento, F‑41/14, EU:F:2015:24, n.o 55).

73      Por outro lado, resulta da análise dos autos que o recorrente não aduz nenhum elemento concreto suscetível de demonstrar que lhe foi aplicada qualquer sanção paralelamente à manutenção desta apreciação controvertida no referido relatório de notação, a qual figura na parte denominada «Conduta», no título «3. Cumprimento de regras e procedimentos». Ora, observou‑se no n.o 69, supra, que o Parlamento tinha fundamento para recusar retirar a apreciação controvertida do relatório de notação do recorrente relativo ao ano de 2016, uma vez que este último omitiu o cumprimento do artigo 17.o‑A, n.o 2, primeiro parágrafo, do Estatuto.

74      Por conseguinte, o argumento do recorrente segundo o qual a AIPN se atribuiu um poder discricionário superior ao que lhe confere o artigo 17.o‑A, n.o 2, do Estatuto, não pode ser acolhido.

75      Em terceiro lugar, no que respeita à argumentação do recorrente segundo a qual o dever de notificação deveria ser circunscrito às publicações estritamente relativas à atividade da União, tendo em conta os prazos cumulativos previstos pelo artigo 17.o‑A, n.o 2, do Estatuto, e pelo artigo 90.o, n.o 2, do Estatuto (v. n.o 60, supra), cumpre observar que não é suscetível de pôr em causa a conclusão constante do n.o 70, supra, da qual resulta que, no caso em apreço, o recorrente omitiu a informação junto da AIPN da sua intenção de publicar um livro cujo objeto, no entanto, estava relacionado com a atividade da União, desrespeitando assim o artigo 17.o‑A, n.o 2, do Estatuto. Ora, é precisamente essa a afirmação do Parlamento na Decisão de 4 de janeiro de 2018, à luz da qual deve ser apreciada a legalidade desta última.

76      Por conseguinte, este argumento não é pertinente para efeitos da apreciação da legalidade da Decisão de 4 de janeiro de 2018 e, por essa razão, não pode ser acolhido.

77      Tendo sido refutadas todas as alegações apresentadas em apoio dos dois fundamentos invocados a fim de obter a anulação da Decisão de 4 de janeiro de 2018, daí resulta que há que negar provimento ao pedido de anulação.

 Quanto aos pedidos indemnizatórios

78      O recorrente argumenta que, dado que a decisão de indeferimento da reclamação se baseava numa aplicação incorreta do Estatuto dos Funcionários pela AIPN e que o uso de um poder discricionário excedia o que permitia o referido estatuto, sofreu danos morais tanto no seu local de trabalho como na sua vida pessoal. Os referidos danos tiveram designadamente repercussão na sua atividade literária. Considera igualmente que sofreu danos materiais na medida em que, por um lado, perdeu o benefício de uma promoção e, por outro, poderia agora ser objeto de processos disciplinares em consequência da Decisão de 4 de janeiro de 2018. Assim, o recorrente pede que o Parlamento seja condenado a pagar‑lhe um montante determinado pelo Tribunal Geral a título de reparação dos danos morais que considera ter sofrido. Precisa, além disso, que a decisão do Parlamento, pela qual este último considerou que a sua notificação prévia da publicação de uma segunda edição da obra em causa era inadmissível, teve um efeito dissuasor relativamente à referida publicação.

79      O Parlamento contesta os argumentos do recorrente.

80      Em primeiro lugar, na medida em que a argumentação do recorrente possa ser entendida no sentido de que este último pede que lhe seja atribuída uma indemnização a título de danos materiais, cabe recordar que, para responder às exigências estabelecidas no artigo 76.o, alínea d), do Regulamento de Processo, um pedido de reparação dos danos causados por uma instituição da União deve conter elementos que permitam identificar, designadamente, o prejuízo que a parte demandante alega ter sofrido, bem como o caráter e o alcance desse prejuízo (v., neste sentido, Acórdão de 5 de outubro de 1999, Apostolidis e o./Comissão, C‑327/97 P, EU:C:1999:482, n.o 37). Além disso, um recurso deve ser julgado inadmissível se o recorrente não provou, nem mesmo alegou, a existência de circunstâncias específicas que justificassem a omissão de quantificar, na petição, o prejuízo alegado (v., neste sentido, Acórdão de 23 de setembro de 2004, Hectors/Parlamento, C‑150/03 P, EU:C:2004:555, n.o 62).

81      No presente processo, o recorrente não fez nenhuma especificação quanto ao modo de cálculo do prejuízo material que alega e não justificou essa omissão, pelo que o seu pedido de indemnização por danos materiais deve ser julgado inadmissível.

82      Em segundo lugar, no que respeita ao pedido destinado a obter reparação dos danos morais alegados pelo recorrente, este último sustenta que os referidos danos foram causados por uma aplicação incorreta do Estatuto pela AIPN e pelo uso de um poder discricionário que excedeu o que o referido estatuto permite.

83      Importa, contudo, observar, a este propósito, que, segundo jurisprudência constante, a responsabilidade da União só é desencadeada se estiver reunido um conjunto de requisitos, concretamente a ilegalidade do comportamento imputado à instituição, órgão ou organismo em causa, a realidade do dano alegado e a existência de um nexo de causalidade entre o comportamento alegado e o dano invocado, sendo estes três requisitos cumulativos (v. Acórdão de 10 de abril de 2019, AV/Comissão, T‑303/18 RENV, não publicado, EU:T:2019:239, n.o 104 e jurisprudência referida).

84      Não estando preenchido um desses requisitos, o pedido de reparação deve ser rejeitado na sua totalidade, sem que seja necessário apreciar os outros requisitos da responsabilidade extracontratual (v. Acórdão de 13 de dezembro de 2018, Wahlström/Frontex, T‑591/16, não publicado, EU:T:2018:938, n.o 127 e jurisprudência referida).

85      Ora, no caso em apreço, cumpre observar que o pedido de indemnização formulado pelo recorrente assenta unicamente na alegada ilegalidade que afeta a Decisão de 4 de janeiro de 2018.

86      Uma vez que, pelos motivos expostos no âmbito da apreciação do pedido de anulação formulado pelo recorrente, se verificou que a Decisão de 4 de janeiro de 2018 não enfermava de qualquer ilegalidade, há que observar que o requisito relativo à ilegalidade do comportamento imputado ao Parlamento não está preenchido.

87      Além disso, as considerações relativas à decisão pela qual o Parlamento entendeu que a notificação prévia da publicação de uma segunda edição da obra em causa apresentada pelo recorrente era inadmissível são indiferentes no âmbito do presente recurso, visto que o mesmo é dirigido unicamente contra a Decisão de 4 de janeiro de 2018, pela qual o Parlamento recusou retirar a apreciação controvertida do seu relatório de avaliação relativo ao ano de 2016.

88      Daqui decorre que o pedido de indemnização do recorrente deve ser julgado improcedente.

 Quanto ao pedido de medida de instrução

89      O recorrente pede ao Tribunal Geral que seja ouvido um membro do Parlamento de Malta, bem como um membro do Parlamento, os quais são personalidades com atividade na luta contra a corrupção e pela boa governação em Malta.

90      Segundo jurisprudência constante, as partes que apresentam um pedido de audição de testemunhas devem apresentar indícios precisos e relevantes suscetíveis de explicar em que medida o depoimento pedido pode apresentar interesse para a decisão do litígio (v., neste sentido, Acórdão de 23 de abril de 2018, Verein Deutsche Sprache/Comissão, T‑468/16, não publicado, EU:T:2018:207, n.o 22 e jurisprudência referida).

91      No caso em apreço, o recorrente não apresentou nenhuma indicação específica, acerca do presente processo, para explicar as razões pelas quais a audição das duas testemunhas se podia mostrar necessária ou útil. Também não especificou quais eram os factos ou circunstâncias próprios do referido processo suscetíveis de justificar a realização de tal audição. Por conseguinte, o recorrente não demonstrou que a audição das duas testemunhas que pedia era necessária ou pertinente no presente caso.

92      Além disso, há que observar que os elementos materiais já existentes nos autos são suficientes para conhecer do presente recurso.

93      Como tal, o pedido de instrução formulado pelo recorrente não deve ser deferido.

94      Em face dos elementos precedentes, há que negar integralmente provimento ao recurso.

 Quanto às despesas

95      Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo o recorrente sido vencido, há que condená‑lo nas despesas, nos termos do pedido da Comissão.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção)

decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      Mark Anthony Sammut é condenado nas despesas.

Kanninen

Jaeger

Półtorak

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 10 de junho de 2020.

Assinaturas


*      Língua do processo: maltês.