Language of document : ECLI:EU:T:2012:58

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Quarta Secção)

7 de fevereiro de 2012 (*)

«Marca comunitária — Processo de declaração de nulidade — Marca figurativa comunitária que representa elefantes no interior de um retângulo — Marcas figurativas internacional e nacional anteriores que representam um elefante e marca nominativa nacional anterior elefanten — Motivo relativo de recusa — Risco de confusão — Semelhança dos sinais — Artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento (CE) n.° 207/2009 — Caráter distintivo das marcas anteriores»

No processo T‑424/10,

Dosenbach‑Ochsner AG Schuhe und Sport, com sede em Dietikon (Suíça), representada por O. Rauscher, advogado,

recorrente,

contra

Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), representado por G. Mannucci, na qualidade de agente,

recorrido,

sendo a outra parte no processo na Câmara de Recurso do IHMI, interveniente no Tribunal Geral,

Sisma SpA, com sede em Mantova (Itália), representada por F. Caricato, advogado,

interveniente,

que tem por objeto um recurso da decisão da Quarta Câmara de Recurso do IHMI de 15 de julho de 2010 (processo R 1638/2008‑4), relativa a um processo de declaração de nulidade entre a Dosenbach‑Ochsner AG Schuhe und Sport e a Sisma SpA,

O TRIBUNAL GERAL (Quarta Secção),

composto por: I. Pelikánová (relatora), presidente, K. Jürimäe e M. van der Woude, juízes,

secretário: E. Coulon,

vista a petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 18 de setembro de 2010,

vista a contestação do IHMI apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 23 de fevereiro de 2011,

vista a resposta da interveniente apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 4 de fevereiro de 2011,

vista a decisão de 28 de abril de 2011, que indefere o pedido de apresentação de réplica,

visto não haver pedido de fixação de audiência apresentado pelas partes no prazo de um mês a contar da notificação do encerramento da fase escrita e tendo, por isso, decidido, com base em relatório do juiz‑relator e em aplicação do artigo 135.°‑A do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, julgar o recurso prescindindo da fase oral,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

1        A interveniente, Sisma SpA, é titular da marca figurativa comunitária registada sob o número 4279295 (a seguir «marca contestada»), cujo pedido de registo foi apresentado ao Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI) em 9 de fevereiro de 2005, de harmonia com o disposto no Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, de 20 de dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (JO 1994, L 11, p. 1), conforme alterado [substituído pelo Regulamento (CE) n.° 207/2009 do Conselho, de 26 de fevereiro de 2009, sobre a marca comunitária (JO L 78, p. 1)]. A marca contestada foi registada em 30 de novembro de 2006, nomeadamente para os produtos incluídos nas classes 24 e 25 na aceção do Acordo de Nice relativo à Classificação Internacional dos Produtos e dos Serviços para o registo de marcas, de 15 de junho de 1957, conforme revisto e alterado, e que correspondem, em relação a cada uma dessas classes, à seguinte descrição:

¾        classe 24: «Têxteis; tecidos elásticos; tecidos adesivos coláveis a quente; tecidos imitando peles de animais; tecidos de lã; cobertores; mantas de viagem; coberturas de mesa; artigos têxteis; tapeçaria em tecido; lenços de bolso (em matérias têxteis); bandeiras; lenços de tecido e não tecido; guardanapos em tecido; guardanapos em matérias têxteis; resguardos sintéticos para mudar fraldas a bebés»;

¾        classe 25: «Vestuário para homem, senhora e jovens em geral, incluindo vestuário em pele; camisas; blusas; saias; saias‑casaco; jaquetas; calças; calções; camisolas de malha; t‑shirts; pijamas; meias; camisetas desportivas de alças; espartilhos; ligas; cuecas; soutiens; combinações; chapéus; lenços de pescoço; gravatas; gabardines; sobretudos; casacos; fatos de banho; fatos de treino; anoraques; calças de esqui; cintos; peliças; cachecóis; luvas; roupões; calçado em geral, incluindo chinelos, sapatos, sapatos de desporto, botas e sandálias; fraldas para bebé em matérias têxteis; babetes para bebés».

2        A marca contestada é o seguinte sinal figurativo:

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3        Em 20 de fevereiro de 2007, a recorrente, Dosenbach‑Ochsner AG Schuhe und Sport, apresentou ao IHMI um pedido de declaração de nulidade da marca contestada, em conformidade com o disposto no artigo 52.°, n.° 1, alínea a), do Regulamento n.° 40/94 [atual artigo 53.°, n.° 1, alínea a), do Regulamento n.° 207/2009].

4        O pedido de declaração de nulidade visava o registo da marca contestada para os produtos acima enumerados no n.° 1 e baseava‑se na existência de um risco de confusão, na aceção do artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 [atual artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 207/2009], entre a referida marca e as seguintes marcas anteriores:

¾        a marca nominativa alemã elefanten, pedida em 14 de março de 1987 e registada em 24 de janeiro de 1989, sob o número 1133678, que designa os produtos incluídos na classe 25 e que correspondem à seguinte descrição: «Sapatos»;

¾        a marca figurativa internacional a seguir reproduzida, que abrange, nomeadamente, a República Checa, registada em 29 de maio de 1999, sob o número 715019, que designa os produtos incluídos na classe 25 e que correspondem à seguinte descrição: «Sapatos e artigos de calçado»:

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¾        a marca figurativa alemã, a seguir reproduzida, pedida em 9 de novembro de 2000 e registada em 22 de janeiro de 2001, sob o número 30082400, que designa, nomeadamente, as «mantas para criança, lençóis para criança, toalhas para criança, sacos de dormir para criança; sacos em tecido e sacos de transporte em tecido para criança» incluídos na classe 24 e o «vestuário para criança, chapéus para criança; cintos para criança» incluídos na classe 25:

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5        Por decisão de 9 de setembro de 2008, a Divisão de Anulação do IHMI indeferiu o pedido de declaração de nulidade, por não existir risco de confusão entre a marca contestada e as marcas anteriores. Em 12 de novembro de 2008, a recorrente interpôs recurso da decisão da Divisão de Anulação.

6        Por decisão de 15 de julho de 2010 (a seguir «decisão impugnada»), a Quarta Câmara de Recurso do IHMI negou provimento ao recurso.

7        Em primeiro lugar, a Câmara de Recurso considerou, no n.° 16 da decisão impugnada, que o público relevante era composto pelos utilizadores médios, normalmente informados e razoavelmente atentos e avisados, estabelecidos na Alemanha e na República Checa.

8        Em segundo lugar, a Câmara de Recurso aderiu, no n.° 17 da decisão impugnada, à apreciação da Divisão de Anulação segundo a qual alguns dos produtos visados pela marca contestada, por um lado, e pelas marcas anteriores, por outro, eram idênticos ou semelhantes, enquanto outros eram diferentes.

9        Em terceiro lugar, a Câmara de Recurso considerou, nos n.os 20 a 24 da decisão impugnada, que a marca contestada não era semelhante às marcas anteriores no plano visual, tendo em conta, nomeadamente, as diferenças existentes entre as representações da figura do elefante na marca contestada e nas marcas figurativas anteriores.

10      Em quarto lugar, a Câmara de Recurso concluiu, nos n.os 25 a 27 da decisão impugnada, que as marcas em causa não eram semelhantes no plano fonético, dado que, por um lado, as marcas figurativas, entre as quais a marca contestada, não se pronunciavam e, por outro, as descrições orais das marcas em causa não coincidiam.

11      Em quinto lugar, a Câmara de Recurso constatou, no n.° 28 da decisão impugnada, a existência de uma semelhança conceptual decorrente da referência ao elefante em cada uma das marcas em causa.

12      Em sexto lugar, no quadro da apreciação global da existência do risco de confusão, a Câmara de Recurso considerou, nos n.os 30 a 39 da decisão impugnada, por um lado, que a recorrente não tinha invocado um caráter distintivo particular das marcas anteriores e, por outro, que, em razão das modalidades de comercialização dos produtos visados pela marca contestada, devia ser atribuída uma maior importância à comparação no plano visual. Nestas circunstâncias, a Câmara de Recurso concluiu que a semelhança conceptual verificada não era suficiente para que existisse um risco de confusão entre a marca contestada e as marcas anteriores.

 Pedidos das partes

13      A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

¾        anular a decisão impugnada;

¾        condenar o IHMI nas despesas.

14      O IHMI conclui pedindo que o Tribunal se digne:

¾        negar provimento ao recurso;

¾        condenar a recorrente nas despesas.

15      A interveniente conclui pedindo, no essencial, que o Tribunal se digne:

¾        negar provimento ao recurso;

¾        condenar a recorrente nas despesas, incluindo nas relativas ao processo no IHMI.

 Questão de direito

16      A recorrente invoca um fundamento único, relativo à violação do artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 207/2009. Alega, no essencial, que a Câmara de Recurso cometeu erros de direito e erros de apreciação dos factos quando chegou à conclusão de que não existia risco de confusão entre a marca contestada e as marcas anteriores.

17      Por força do artigo 53.°, n.° 1, alínea a), do Regulamento n.° 207/2009, uma marca é declarada nula na sequência de pedido apresentado ao IHMI sempre que exista uma marca anterior, na aceção do n.° 2 do artigo 8.° desse diploma, e que, nomeadamente, se encontrem preenchidas as condições enunciadas na alínea b) do n.° 1 do mesmo artigo. Nos termos destas últimas disposições, após oposição do titular de uma marca anterior, o pedido de registo de uma marca será recusado quando, devido à sua identidade ou semelhança com a marca anterior e devido à identidade ou semelhança dos produtos ou serviços designados pelas duas marcas, exista risco de confusão no espírito do público do território onde a marca anterior está protegida. O risco de confusão compreende o risco de associação com a marca anterior. Por outro lado, por força do artigo 8.°, n.° 2, alínea a), ii) e iii), do Regulamento n.° 207/2009, devem considerar‑se marcas anteriores as marcas registadas num Estado‑Membro e as marcas que tenham sido objeto de registo internacional com efeitos num Estado‑Membro cuja data de depósito seja anterior à do pedido de marca comunitária.

18      Segundo jurisprudência constante, constitui risco de confusão o risco de que o público possa crer que os produtos ou os serviços em causa provêm da mesma empresa ou de empresas ligadas economicamente. Segundo essa mesma jurisprudência, o risco de confusão deve ser apreciado globalmente, segundo a perceção que o público pertinente tem dos sinais e dos produtos ou dos serviços em causa, e tendo em conta todos os fatores pertinentes no caso em apreço, nomeadamente a interdependência da semelhança dos sinais e da dos produtos ou dos serviços designados [v. acórdão do Tribunal Geral de 9 de julho de 2003, Laboratorios RTB/IHMI — Giorgio Beverly Hills (GIORGIO BEVERLY HILLS), T‑162/01, Colet., p. II‑2821, n.os 30 a 33 e jurisprudência aí referida].

19      No caso em apreço, a recorrente não critica a definição do público relevante acolhida pela Câmara de Recurso, como acima exposta no n.° 7, nem o exame da semelhança dos produtos, evocada no n.° 8 supra. Não estando esses elementos feridos de erro, há que tomá‑los em consideração no exame do presente recurso.

20      Em contrapartida, a recorrente contesta, em primeiro lugar, a apreciação da semelhança dos sinais, em seguida, a não tomada em consideração do elevado caráter distintivo das marcas anteriores e, por último, a apreciação global da existência do risco de confusão, tendo em conta, nomeadamente, a relação entre os diferentes elementos atinentes à comparação entre os sinais em conflito.

21      O IHMI e a interveniente contestam a procedência dos argumentos da recorrente.

 Quanto à comparação dos sinais

22      A apreciação global do risco de confusão, no que respeita à semelhança visual, fonética ou conceptual dos sinais em conflito, deve basear‑se na impressão de conjunto produzida por eles, tendo em conta, nomeadamente, os seus elementos distintivos e dominantes. A perceção que o consumidor médio dos produtos ou dos serviços em causa tem das marcas desempenha um papel determinante na apreciação global do referido risco. A esse propósito, o consumidor médio apreende normalmente uma marca como um todo e não se entrega a um exame dos seus diferentes detalhes (v. acórdão do Tribunal de Justiça de 12 de junho de 2007, IHMI/Shaker, C‑334/05 P, Colet., p. I‑4529, n.° 35 e jurisprudência aí referida).

23      Por outro lado, segundo jurisprudência constante, duas marcas são semelhantes quando, do ponto de vista do público relevante, exista entre elas uma igualdade, pelo menos parcial, no que respeita a um ou vários aspetos pertinentes [acórdãos do Tribunal Geral de 23 de outubro de 2002, Matratzen Concord/IHMI — Hukla Germany (MATRATZEN), T‑6/01, Colet., p. II‑4335, n.° 30, e de 26 de janeiro de 2006, Volkswagen/IHMI — Nacional Motor (Variant), T‑317/03, não publicado na Coletânea, n.° 46].

24      No caso em apreço, a recorrente critica as conclusões da Câmara de Recurso no tocante à comparação visual, fonética e conceptual das marcas em causa.

 Quanto à comparação visual

25      Nos n.os 20 a 22 da decisão impugnada, a Câmara de Recurso declarou que as marcas anteriores eram constituídas, por um lado, pelo termo «elefanten» e, por outro, pela representação estilizada de um elefante asiático atarracado, com patas muito curtas, representado de perfil. A marca contestada, por sua vez, consistia numa etiqueta retangular com os ângulos arredondados e uma série de elefantes africanos de diferentes tamanhos desenhados no seu interior, elefantes esses que se encontravam representados de perfil, com a trompa ligeiramente virada para cima e alinhados em filas diagonais.

26      Baseando‑se nestas conclusões, a Câmara de Recurso concluiu, nos n.os 22 e 24 da decisão impugnada, que as marcas em causa eram diferentes no plano visual, não obstante o facto de tanto na marca contestada como nas marcas figurativas anteriores estarem representados elefantes de perfil, com um só olho desenhado.

27      A recorrente contesta a justeza desta conclusão no tocante à comparação da marca contestada com as marcas figurativas anteriores.

28      Em primeiro lugar, sustenta que foi erradamente que a Câmara de Recurso se apoiou em diferenças relacionadas com elementos das marcas em causa que o público relevante não considera distintivos.

29      A este propósito, a recorrente alega, com razão, que o retângulo arredondado que rodeia a representação dos elefantes na marca contestada será apreendido como uma simples delimitação da marca no espaço. Todavia, essa circunstância não implica que esse elemento não influencie a impressão de conjunto produzida pela marca contestada no plano visual. Com efeito, o retângulo em causa define os contornos do sinal em questão, o que é comprovado pelo facto de as suas linhas «cortarem» a representação de vários elefantes, que só aparecem então parcialmente no referido sinal.

30      Em contrapartida, como a recorrente alega, o exame efetuado pelo público relevante não o levará a interrogar‑se sobre a distribuição exata das diferentes representações de elefantes na marca contestada nem sobre as diferenças entre um elefante asiático e um elefante africano. Por conseguinte, as circunstâncias de, por um lado, a marca contestada incluir linhas em diagonal de elefantes e de, por outro, os elefantes representados na referida marca não pertencerem, eventualmente, à mesma espécie que os representados nas marcas figurativas anteriores são desprovidas de pertinência para efeitos da perceção das marcas em conflito pelo público relevante.

31      Em segundo lugar, no entender da recorrente, a Câmara de Recurso não tomou em consideração elementos de semelhança importantes. Com efeito, tanto a marca contestada como as marcas figurativas anteriores contêm a representação ingénua de um jovem elefante, com uma estatura atarracada e patas curtas esboçadas em forma de dois retângulos.

32      Ora, há que notar, à semelhança do que declarou a Câmara de Recurso nos n.os 22 e 24 da decisão impugnada, que, embora tanto a marca contestada como as marcas figurativas anteriores contenham representações estilizadas de um elefante de perfil, essas representações incluem, todavia, diferenças importantes.

33      Com efeito, enquanto a figura de elefante representada na marca contestada tem um caráter quase infantil, as marcas figurativas anteriores apresentam um desenho abstrato e depurado, que recorre a contornos minimalistas. Da mesma forma, a marca contestada inclui elefantes brancos com contornos pretos, ao passo que as marcas figurativas anteriores consistem num elefante preto com contornos brancos.

34      Em terceiro lugar, contrariamente ao que afirma a recorrente, o facto de a marca contestada conter a representação de vários elefantes não é desprovido de pertinência para efeitos da perceção do público em causa e, portanto, da impressão visual global produzida pela referida marca. Com efeito, como a Câmara de Recurso salientou no n.° 21 da decisão impugnada, a marca contestada, na forma como é globalmente apreendida em termos visuais, é caraterizada pela representação de vários elefantes numa etiqueta retangular com os ângulos arredondados. Portanto, a representação de múltiplos elefantes constitui uma parte inerente à referida marca.

35      Na medida em que a recorrente invoca, a este propósito, a jurisprudência dos órgãos jurisdicionais alemães, há que salientar que o regime comunitário das marcas é um sistema autónomo, constituído por um conjunto de regras e que prossegue objetivos que lhe são específicos, uma vez que a sua aplicação é independente de qualquer sistema nacional. Por isso, o IHMI e, eventualmente, o juiz da União não estão vinculados pelas decisões tomadas a nível dos Estados‑Membros [v. acórdão do Tribunal Geral de 27 de fevereiro de 2002, Streamserve/IHMI (STREAMSERVE), T‑106/00, Colet., p. II‑723, n.° 47 e jurisprudência aí referida], que mais não são do que um elemento que, sem ser determinante, apenas pode ser tomado em consideração no quadro de um processo de declaração de nulidade que vise uma marca comunitária [v., por analogia, acórdão do Tribunal Geral de 19 de setembro de 2001, Henkel/IHMI (Pastilha redonda vermelha e branca), T‑337/99, Colet., p. II‑2597, n.° 58 e jurisprudência aí referida].

36      Ora, as decisões invocadas pela recorrente dizem respeito à multiplicação de um elemento nominativo numa marca, quando o elemento em causa no caso em apreço é figurativo. Dado que a multiplicação desses dois tipos de elementos não tem, regra geral, o mesmo impacto na impressão global produzida por uma marca, há que considerar que as decisões dos órgãos jurisdicionais alemães que invoca não são transponíveis para o caso em apreço e não podem, portanto, ser tomadas em consideração pelo Tribunal.

37      A recorrente sustenta igualmente, neste contexto, que lhe é permitido reproduzir as marcas figurativas anteriores várias vezes e com diferentes tamanhos nos seus produtos. Refere‑se, neste contexto, aos usos no setor da moda e, em particular, aos «produtos monogramas» de certas marcas de luxo.

38      Todavia, esse argumento ultrapassa o quadro da comparação da marca contestada com as marcas anteriores, uma vez que diz respeito à utilização destas últimas marcas. Por outro lado, como resulta do n.° 29 supra, a marca contestada não consiste na representação de um número indeterminado de elefantes, mas numa superfície delimitada que inclui a representação total ou parcial de vários elefantes.

39      De qualquer forma, a recorrente não escora as suas alegações relativas aos usos no setor da moda e também não explica a pertinência do exemplo dos «produtos monogramas», dado que as marcas em causa no caso em apreço não se apresentam como monogramas.

40      Como nenhum dos argumentos da recorrente relativos à representação de vários elefantes na marca contestada pode ser acolhido, há que considerar que esse elemento diferencia, no plano visual, a marca contestada das marcas figurativas anteriores, que apenas contêm uma única representação do referido animal.

41      Em face do exposto, há que declarar que a Câmara de Recurso não cometeu qualquer erro ao concluir, no n.° 24 da decisão impugnada, que, consideradas no seu conjunto, a marca contestada e as marcas figurativas anteriores são diferentes no plano visual.

 Quanto à comparação fonética

42      A título preliminar, há que notar que é com razão que a recorrente invoca uma incoerência nos fundamentos da decisão impugnada no tocante à semelhança fonética. Com efeito, o n.° 25 da decisão impugnada, segundo o qual as marcas figurativas não se pronunciam, é, à primeira vista, inconciliável com o n.° 26 da mesma decisão, segundo o qual, de qualquer forma, a descrição oral da marca contestada se diferencia da das marcas anteriores.

43      Ademais, contrariamente ao que afirma, no essencial, o IHMI, não se afigura que o argumento exposto no n.° 26 da decisão impugnada seja puramente supérfluo. Com efeito, no n.° 37 da decisão impugnada, consagrado à apreciação global da existência do risco de confusão, a Câmara de Recurso referiu‑se explicitamente às diferenças fonéticas que se apurou existir entre as marcas em causa.

44      Assim, há que considerar que a decisão impugnada está viciada de uma contradição de fundamentos no tocante à apreciação da semelhança fonética.

45      Acresce que também é verdade que, contrariamente ao que afirma a recorrente, uma comparação fonética não é pertinente no quadro do exame da semelhança de uma marca figurativa desprovida de elementos nominativos com outra marca [v., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 25 de março de 2010, Nestlé/IHMI — Master Beverage Industries (Golden Eagle e Golden Eagle Deluxe), T‑5/08 a T‑7/08, Colet., p. II‑1117, n.° 67].

46      Com efeito, uma marca figurativa desprovida de elementos nominativos não é, em si mesma, pronunciável. No máximo, pode descrever‑se oralmente o seu conteúdo visual ou conceptual. Ora, essa descrição coincide necessariamente ou com a perceção visual ou com a perceção conceptual da marca em causa. Por conseguinte, não há que examinar, de forma autónoma, a perceção fonética de uma marca figurativa desprovida de elementos nominativos e compará‑la com a perceção fonética de outras marcas.

47      Nestas circunstâncias, e atendendo ao facto de que a marca contestada é uma marca figurativa desprovida de elementos nominativos, não há que concluir pela semelhança nem pela dissemelhança fonética desta última marca com as marcas anteriores.

 Quanto à comparação conceptual

48      No n.° 28 da decisão impugnada, a Câmara de Recurso declarou, por um lado, que a marca nominativa anterior significava «elefantes» em alemão, língua do território em que foi registada. Por outro lado, segundo a Câmara de Recurso, as marcas figurativas em causa referiam‑se todas claramente ao conceito de «elefante». Todavia, na medida em que nas marcas anteriores só aparece um único elefante e na marca contestada surgem vários elefantes, de diferentes tamanhos, dispostos de forma especial e enquadrados por uma etiqueta retangular com os ângulos arredondados, a Câmara de Recurso chegou à conclusão de que existe uma semelhança conceptual, mas não identidade.

49      A recorrente sustenta que a semelhança conceptual é mais elevada do que aquela que a Câmara de Recurso concluiu existir. Assim, considera existir uma particular identidade conceptual entre a marca contestada e a marca nominativa anterior.

50      No tocante, neste contexto, à perceção conceptual da marca contestada, declarou‑se, desde logo, no n.° 30 supra, que a circunstância de a marca contestada incluir linhas em diagonal de elefantes era desprovida de pertinência para efeitos da perceção do público relevante. Portanto, o público relevante não apreenderá uma qualquer disposição particular na série de elefantes representada na marca contestada. Em seguida, resulta do n.° 29 supra que o retângulo com ângulos arredondados que rodeia a representação dos elefantes na marca contestada será apreendido como uma delimitação da marca no espaço. Ora, por essa razão, nenhum conteúdo conceptual especial será atribuído a esse elemento. Finalmente, tendo em conta que o consumidor médio deve, regra geral, confiar na imagem imperfeita das marcas que retém na memória (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 22 de junho de 1999, Lloyd Schuhfabrik Meyer, C‑342/97, Colet., p. I‑3819, n.° 26), a perceção conceptual da marca contestada não será afetada pela presença de elefantes de diferentes tamanhos.

51      Nestas circunstâncias, há que considerar que o público relevante apreenderá a marca contestada, no plano conceptual, como referindo‑se apenas aos elefantes. Portanto, é com razão que a recorrente alega a existência de uma identidade conceptual entre a marca contestada e a marca nominativa anterior.

52      No tocante à comparação conceptual entre a marca contestada e as marcas figurativas anteriores, não é contestado que estas serão percebidas como remetendo para o conceito de «elefante». Ora, dada a proximidade entre o conceito de «elefante» e o de «elefantes», há que concluir, na esteira da Câmara de Recurso, que existe uma semelhança conceptual entre a marca contestada e as marcas figurativas anteriores.

53      Em conclusão, há que reconhecer que a decisão impugnada enferma de erros no que respeita à apreciação da semelhança fonética e da semelhança conceptual.

54      Todavia, o impacto que esses erros têm na justeza da conclusão da Câmara de Recurso no que respeita à inexistência de risco de confusão e, portanto, também no que respeita ao bem‑fundado do dispositivo da decisão impugnada só pode ser apreciado na fase do exame global do conjunto dos fatores pertinentes. Para efeitos desse exame, há que considerar que as marcas em causa são diferentes no plano visual, que a sua comparação fonética é desprovida de pertinência e que, no plano conceptual, a marca contestada é idêntica à marca nominativa anterior e semelhante às marcas figurativas anteriores.

 Quanto à não tomada em consideração do elevado caráter distintivo das marcas anteriores

55      No n.° 30 da decisão impugnada, a Câmara de Recurso declarou que a recorrente não reivindicou expressamente, na Divisão de Anulação, o caráter distintivo acrescido das marcas anteriores devido à sua utilização intensiva. Com efeito, as observações e provas apresentadas pela recorrente na Divisão de Anulação diziam exclusivamente respeito à questão do uso sério das referidas marcas, suscitada pela interveniente. Por conseguinte, a Câmara de Recurso não examinou se as marcas anteriores tinham adquirido um caráter distintivo acrescido devido à sua utilização, antes tendo considerado, no n.° 31 da decisão impugnada, que eram dotadas de um grau normal de caráter distintivo.

56      A recorrente contesta não ter reivindicado o caráter distintivo acrescido das marcas anteriores. Remete, a este propósito, para as observações que apresentou à Divisão de Anulação em 11 de outubro de 2007.

57      A página 11 dessas observações, na sua tradução para a língua do processo no IHMI, conforme apresentada à Divisão de Anulação em 7 de novembro de 2007, inclui a seguinte passagem:

«3.      Contrariamente à opinião da oponente, as [marcas anteriores] também não têm um fraco caráter distintivo. Pelo contrário: [d]evido à sua utilização intensa e durável anterior no mercado alemão, têm um caráter distintivo superior à média.»

58      Resulta desta passagem que a recorrente invocou expressamente o caráter distintivo acrescido das marcas anteriores devido à sua utilização anterior. Por conseguinte, tanto a Divisão de Anulação, por força do artigo 74.°, n.° 1, do Regulamento n.° 40/94, em vigor à data da sua decisão, como a Câmara de Recurso, por força do artigo 76.°, n.° 1, do Regulamento n.° 207/2009, eram obrigadas a examinar a justeza dessa reivindicação nas suas decisões.

59      Os argumentos invocados pelo IHMI não são suscetíveis de pôr em causa essa conclusão.

60      Assim, em primeiro lugar, o IHMI alega que a recorrente não invocou o caráter distintivo acrescido das marcas anteriores no formulário‑tipo do pedido de declaração de nulidade, apresentado em 20 de fevereiro de 2007, nem nas observações que acompanham esse formulário.

61      Porém, por um lado, o formulário‑tipo não contém uma secção consagrada ao caráter distintivo das marcas anteriores, mas unicamente ao seu eventual prestígio, que não foi reivindicado no presente caso.

62      Por outro lado, não resulta do Regulamento n.° 40/94 nem do Regulamento n.° 207/2009 que, para ser admissível, a reivindicação do caráter distintivo acrescido da marca anterior deve ser formulada no momento da apresentação do pedido de declaração de nulidade.

63      Em segundo lugar, segundo o IHMI, a passagem acima citada no n.° 57 constitui uma única e breve afirmação apresentada em resposta às observações da interveniente no quadro da discussão sobre a questão da prova do uso sério das marcas anteriores.

64      Ora, por um lado, embora a passagem em causa seja breve, o seu sentido é suficientemente claro e preciso.

65      Por outro lado, não se pode afirmar que a reivindicação da recorrente tenha sido formulada no quadro da discussão relativa à prova do uso sério das marcas anteriores. Com efeito, esta última problemática foi abordada nos pontos I e II, das observações da recorrente de 11 de outubro de 2007, e a passagem acima citada no n.° 57 foi retirada do ponto III do mesmo documento, atinente aos outros argumentos apresentados pela interveniente. Como o próprio IHMI admite, esses argumentos incluíam a questão do caráter distintivo das marcas anteriores.

66      Em terceiro lugar, o IHMI sustenta que a recorrente não indicou provas específicas para escorar o pretenso caráter distintivo acrescido das marcas anteriores. Além disso, segundo o IHMI, as provas apresentadas em anexo às observações da recorrente de 11 de outubro de 2007 visavam demonstrar o uso sério das marcas anteriores.

67      A este propósito, resulta de uma leitura contextual da passagem acima citada no n.° 57 que a recorrente remeteu, para escorar a alegação do caráter distintivo acrescido das marcas anteriores, para o conjunto dos elementos que apresentou para provar o uso sério das referidas marcas.

68      Além disso, esses elementos, a saber, material publicitário no qual figuravam as marcas anteriores e declarações sob juramento relativas aos volumes de venda dos produtos com essas marcas, eram pertinentes, à primeira vista, não só no tocante ao uso sério das marcas anteriores mas também no que respeita ao seu eventual caráter distintivo adquirido pela utilização.

69      Nestas circunstâncias, deve considerar‑se que a recorrente identificou as provas em que se apoiava com uma precisão suficiente para que a justeza das suas alegações pudesse ter sido examinada pelo IHMI e para que a interveniente pudesse ter apresentado as suas observações a esse respeito.

70      Tendo em conta o exposto, há que concluir que foi sem razão que a Câmara de Recurso declarou que a recorrente não tinha expressamente reivindicado o caráter distintivo acrescido das marcas anteriores devido à sua utilização. Foi, por isso, igualmente sem razão que não examinou a justeza das alegações da recorrente a esse respeito.

71      Esse erro implica que a Câmara de Recurso não examinou um fator potencialmente pertinente na apreciação global da existência de risco de confusão entre a marca contestada e as marcas anteriores (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal de Justiça de 11 de novembro de 1997, SABEL, C‑251/95, Colet., p. I‑6191, n.° 24; de 29 de setembro de 1998, Canon, C‑39/97, Colet., p. I‑5507, n.° 18; e de 22 de junho de 1999, Lloyd Schuhfabrik Meyer, C‑342/97, Colet., p. I‑3819, n.° 20).

72      Nestas circunstâncias, o Tribunal Geral não dispõe de todos os elementos necessários para verificar a justeza da apreciação global da existência de risco de confusão que a Câmara de Recurso efetuou na decisão impugnada.

73      Por conseguinte, deve acolher‑se o fundamento único e, portanto, anular‑se a decisão impugnada, sem que seja necessário examinar os argumentos relativos à referida apreciação, nomeadamente no que diz respeito à relação entre os diferentes elementos respeitantes à comparação dos sinais em conflito.

 Quanto às despesas

74      Por força do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

75      No caso em apreço, o IHMI e a interveniente foram vencidos. Portanto, por um lado, há que condenar o IHMI a suportar, além das suas próprias despesas, as efetuadas pela recorrente, em conformidade com o pedido desta.

76      Por outro lado, há que decidir que a interveniente suportará as suas próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Quarta Secção)

decide:

1)      A decisão da Quarta Câmara de Recurso do Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI) de 15 de julho de 2010 (processo R 1638/2008‑4) é anulada.

2)      O IHMI suportará, além das suas próprias despesas, as efetuadas pela Dosenbach‑Ochsner AG Schuhe und Sport.

3)      A Sisma SpA suportará as suas próprias despesas.

Pelikánová

Jürimäe

Van der Woude

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 7 de fevereiro de 2012.

Assinaturas


* Língua do processo: italiano.