Language of document : ECLI:EU:T:2009:356

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Primeira Secção)

23 de Setembro de 2009 (*)

«Marca comunitária – Marcas comunitárias nominativa DANELECTRO e figurativa QWIK TUNE – Inobservância do prazo para a apresentação do pedido de renovação das marcas – Requerimento de restitutio in integrum – Reformatio in pejus – Direitos de defesa – Direito de ser ouvido – Artigo 61.°, n.° 2, artigo 73.°, segundo período, e artigo 78.° do Regulamento (CE) n.° 40/94 [actuais artigo 63.°, n.° 2, artigo 75.°, segundo período, e artigo 81.° do Regulamento (CE) n.° 207/2009]»

Nos processos apensos T‑20/08 e T‑21/08,

Evets Corp., com sede em Irvine, Califórnia (Estados Unidos), representada por S. Ryan, solicitor,

recorrente,

contra

Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), representado por A. Folliard‑Monguiral, na qualidade de agente,

recorrido,

que têm por objecto recursos interpostos de duas decisões da Quarta Câmara de Recurso do IHMI, de 5 de Novembro de 2007 (processos R 603/2007‑4 e R 604/2007‑4), relativas ao requerimento de restitutio in integrum apresentado pela recorrente,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Primeira Secção),

composto por: V. Tiili (relatora), presidente, F. Dehousse e I. Wiszniewska‑Białecka, juízes,

secretário: N. Rosner, administrador,

vistas as petições entradas na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 8 de Janeiro de 2008,

vistas as contestações apresentadas na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 22 de Maio de 2008,

visto o despacho de 5 de Maio de 2009 que decidiu a apensação dos processos T‑20/08 e T‑21/08 para efeitos da fase oral e do acórdão,

após a audiência de 3 de Junho de 2009,

profere o presente

Acórdão

 Factos na origem do litígio

1        Em 1 de Abril de 1996, a recorrente, Evets Corp., apresentou dois pedidos de registo de marca comunitária ao Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), ao abrigo do Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, de 20 de Dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (JO 1994, L 11, p. 1), conforme alterado [substituído pelo Regulamento (CE) n.° 207/2009 do Conselho, de 26 de Fevereiro de 2009, sobre a marca comunitária (JO L 78, p. 1)].

2        As marcas cujo registo foi pedido são a marca nominativa DANELECTRO e a marca figurativa QWIK TUNE, cujos produtos estão incluídos nas classes 9 e 15 na acepção do Acordo de Nice relativo à Classificação Internacional dos Produtos e dos Serviços para o registo de marcas, de 15 de Junho de 1957, conforme revisto e alterado.

3        A marca QWIK TUNE foi registada em 30 de Abril de 1998 e a marca DANELECTRO, em 25 de Maio de 1998.

4        Nos dias 7 e 14 de Setembro de 2005, o IHMI informou o representante da recorrente, em conformidade com o artigo 47.°, n.° 2, do Regulamento n.° 40/94 (actual artigo 47.°, n.° 2, do Regulamento n.° 207/2009) e a regra 29 do Regulamento (CE) n.° 2868/95 da Comissão, de 13 de Dezembro de 1995, relativo à execução do Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, sobre a marca comunitária (JO L 303, p. 1), da expiração do registo, respectivamente, das marcas QWIK TUNE e DANELECTRO. Nos termos destas notificações, os pedidos de renovação deviam ser apresentados e as taxas pagas antes de 30 de Abril de 2006. Os pedidos podiam ainda ser apresentados e as taxas pagas, num prazo suplementar de seis meses que expirava em 1 de Novembro de 2006.

5        Nos dias 21 e 23 de Novembro de 2006, o IHMI notificou ao representante da recorrente, em conformidade com o artigo 47.° do Regulamento n.° 40/94 (actual artigo 47.° do Regulamento n.° 207/2009) e com a regra 30, n.° 5, a regra 84, n.° 3, alínea l), e a regra 84, n.° 5, do Regulamento n.° 2868/95, o facto de os registos das marcas QWIK TUNE e DANELECTRO terem sido cancelados do registo das marcas comunitárias, em 1 de Outubro de 2006, com efeitos a contar de 1 de Abril de 2006. Indicava‑se, em cada notificação, que, em caso de desacordo, o representante da recorrente podia pedir uma decisão por escrito, num prazo de dois meses a contar da data de recepção da notificação.

6        Em 26 de Janeiro de 2007, o representante da recorrente apresentou, a respeito das marcas em causa, em aplicação do artigo 78.° do Regulamento n.° 40/94 (actual artigo 81.° do Regulamento n.° 207/2009), um requerimento de restitutio in integrum, no qual pedia que fossem restabelecidos os seus direitos, a fim de poder proceder à renovação dos registos em causa, afirmando que estes não tinham sido renovados por causa de um erro devido a circunstâncias alheias ao seu controlo e ao da recorrente. Com efeito, a responsabilidade pela renovação terá sido transferida para um terceiro, que não tinha o endereço correcto da recorrente na sua base de dados. O representante da recorrente pediu que o IHMI cobrasse as taxas de restitutio in integrum e de renovação, na sua conta corrente aberta junto deste último. Indicou que a recorrente só tomou conhecimento da perda dos seus direitos, em 26 de Novembro de 2006, na data em que lhe transmitiu as notificações do IHMI.

7        Em 22 de Fevereiro de 2007, o Departamento «Marcas e Registo» do IHMI indeferiu o requerimento de restitutio in integrum. Considerou que o requerimento tinha sido apresentado dentro dos prazos e era admissível, mas que a recorrente não tinha feito prova de toda a diligência inerente às circunstâncias. Efectivamente, em seu entender, o representante da recorrente sabia que as marcas em causa deviam ser renovadas, mas não tinha tomado as medidas necessárias para se assegurar, junto da recorrente, do terceiro para o qual a responsabilidade pela renovação tinha sido transferida e do IHMI, que a renovação tinha sido efectuada ou, conforme o caso, que ia ser feita. Por conseguinte, os registos das marcas DANELECTRO e QWIK TUNE deviam considerar‑se cancelados em aplicação da regra 30, n.° 6, do Regulamento n.° 2868/95.

8        Em 21 de Junho de 2007, a recorrente interpôs recurso para o IHMI, nos termos dos artigos 57.° a 62.° do Regulamento n.° 40/94 (actuais artigos 58.° a 64.° do Regulamento n.° 207/2009), contra as decisões do Departamento «Marcas e Registo» de 22 de Fevereiro de 2007.

9        Por decisões de 5 de Novembro de 2007 (a seguir «decisões impugnadas»), a Quarta Câmara de Recurso do IHMI negou provimento ao recurso e declarou que o requerimento de restitutio in integrum era considerado como não tendo sido apresentado, em conformidade com o artigo 78.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94 (actual artigo 81.°, n.° 3, do Regulamento n.° 207/2009), por ter sido apresentado após o termo do prazo de dois meses previsto no artigo 78.°, n.° 2, do Regulamento n.° 40/94 (actual artigo 81.°, n.° 2, do Regulamento n.° 207/2009) e por a taxa de restitutio in integrum ter sido paga fora deste prazo. Considerou que, uma vez que as datas da cessação do impedimento eram 21 de Novembro de 2006, para a marca QWIK TUNE, e 23 de Novembro de 2006, para a marca DANELECTRO, datas em que o IHMI tinha informado o representante da recorrente de que as marcas tinham sido canceladas, o requerimento apresentado em 26 de Janeiro de 2007 estava fora deste prazo.

 Pedidos das partes

10      A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–        anular as decisões impugnadas;

–        declarar que o requerimento de restitutio in integrum foi apresentado nos prazos previstos no artigo 78.°, n.° 2, do Regulamento n.° 40/94;

–        remeter os processos à Câmara de Recurso, para que esta se pronuncie sobre o mérito da questão de saber se foi feita prova de toda a diligência necessária para renovar as marcas em causa;

–        condenar o IHMI nas despesas.

11      O IHMI conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–        negar provimento aos recursos;

–        condenar a recorrente nas despesas.

 Questão de direito

12      A recorrente invoca, essencialmente, três fundamentos de recurso, relativos, em primeiro lugar, à violação do princípio da proibição da reformatio in pejus, em segundo, à violação dos direitos de defesa e do direito de ser ouvido e, em terceiro, à violação do artigo 78.° do Regulamento n.° 40/94.

13      Importa começar pelo exame do fundamento relativo à violação do artigo 78.° do Regulamento n.° 40/94.

 Quanto ao fundamento relativo à violação do artigo 78.° do Regulamento n.° 40/94

14      Segundo a recorrente, a Câmara de Recurso calculou mal o prazo de dois meses a contar da cessação do impedimento ocorrida a 21 e 23 de Novembro de 2006, datas em que o IHMI informou o representante da recorrente da caducidade dos direitos em causa, pois a data a ter em conta é aquela em que a própria recorrente tomou conhecimento da perda dos seus direitos.

15      O IHMI refuta os argumentos avançados pela recorrente.

16      Nos termos do artigo 78.°, n.os 2 e 3, do Regulamento n.° 40/94, o requerimento de restitutio in integrum deve ser apresentado por escrito, num prazo de dois meses, a contar da cessação do impedimento na origem da inobservância de um prazo que tenha tido por consequência directa a perda de um direito ou de um fundamento de recurso. O requerimento só é admissível se for apresentado no prazo de um ano a contar do termo do prazo não observado. O requerimento deve ser fundamentado e indicar os factos e as justificações invocadas em seu apoio. Só será considerado apresentado após pagamento da taxa de restitutio in integrum.

17      No caso em apreço, as partes estão de acordo, em princípio, quanto ao facto de a «cessação do impedimento» corresponder à data na qual a recorrente foi informada da perda dos direitos em causa.

18      Está assente que o representante da recorrente recebeu, respectivamente, em 21 e 23 de Novembro de 2006, as notificações do IHMI que visavam informá‑lo de que os registos das marcas QWIK TUNE e DANELECTRO tinham sido cancelados do registo das marcas comunitárias em 1 de Outubro de 2006, com efeitos a contar de 1 de Abril de 2006.

19      A Câmara de Recurso entendeu que o requerimento de restitutio in integrum, apresentado em 26 de Janeiro de 2007, devia ser considerado como não tendo sido apresentado, em conformidade com o artigo 78.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94, visto o requerimento ter sido apresentado e a taxa de restitutio in integrum ter sido paga após o termo do prazo de dois meses previsto no artigo 78.°, n.° 2, do Regulamento n.° 40/94, o qual terminava, respectivamente, na segunda‑feira, dia 22 de Janeiro de 2007, para a marca QWIK TUNE, e na terça‑feira, dia 23 de Janeiro de 2007, para a marca DANELECTRO.

20      Ora, a recorrente sustenta que o prazo de dois meses só podia começar a correr na data em que ela própria, e não o seu representante, tinha tomado conhecimento da perda dos direitos em causa, pois assumiu as suas responsabilidades, agindo como seu próprio representante, para efeitos da renovação dos registos em causa, por intermédio do terceiro, e que o erro que conduziu à inobservância do prazo foi cometido nos seus escritórios. Esta data foi 26 de Novembro de 2006 e, portanto, o requerimento de restitutio in integrum foi apresentado dentro dos prazos.

21      Esta argumentação não pode ser aceite. Com efeito, como correctamente sustenta o IHMI, deve considerar‑se que a data em que a perda de um direito é dada a conhecer ao representante é a data em que a pessoa representada, a saber, a recorrente, tomou conhecimento de tal.

22      A este respeito, importa lembrar que, por força da regra 77 do Regulamento n.° 2868/95, qualquer notificação ou outra comunicação dirigida pelo IHMI a um representante devidamente autorizado produzirá os mesmos efeitos que uma comunicação dirigida à pessoa representada. O mesmo vale para qualquer comunicação dirigida ao IHMI por um representante devidamente autorizado, a qual produzirá os mesmos efeitos que uma comunicação emanada da pessoa representada.

23      Assim, relativamente ao IHMI, o que importa são as comunicações com o representante da recorrente, e não as trocadas entre o representante da recorrente e ela própria.

24      Cabe ainda recordar que, por força do artigo 78.°, n.° 5, do Regulamento n.° 40/94 (actual artigo 81.°, n.° 5, do Regulamento n.° 207/2009), o artigo 78.° não é aplicável aos prazos previstos no n.° 2 deste artigo. Assim, se não tiver sido observado o prazo de dois meses, que constitui uma das condições de admissibilidade do requerimento de restitutio in integrum, já não há possibilidade de apresentar um novo requerimento de restitutio in integrum, mesmo justificando a referida inobservância.

25      Por conseguinte, foi de modo juridicamente correcto que a Câmara de Recurso entendeu que o requerimento de restitutio in integrum apresentado em 26 de Janeiro de 2007 devia ser considerado como não tendo sido apresentado.

26      A recorrente alega ainda que, tendo em conta o prazo global de doze meses determinado para iniciar um procedimento de restitutio in integrum, era intenção do legislador que o prazo de dois meses não fosse calculado a contar da data de notificação da expiração ao representante do titular da marca. Em semelhante hipótese, o prazo de doze meses seria supérfluo e teria bastado a fixação de um prazo de dois meses para se iniciar o procedimento de restitutio in integrum. Esta solução foi adoptada pelas Câmaras de Recurso do Instituto Europeu de Patentes (IEP), e, na medida em que o artigo 78.°, n.° 2, do Regulamento n.° 40/94 é substancialmente idêntico ao artigo 122.°, n.° 2, da Convenção sobre a Concessão de Patentes Europeias, de 5 de Outubro de 1973, conforme alterada, deve ser aplicada a mesma solução no presente caso.

27      A título liminar, há que referir que o artigo 122.°, n.° 2, da Convenção sobre a Concessão de Patentes Europeias não contém disposições sobre os prazos, mas remete para a regra 136 do regulamento de execução da Convenção sobre a Concessão de Patentes Europeias, como adoptado por decisão do conselho de administração da Organização Europeia de Patentes, em 7 de Dezembro de 2006. A disposição pertinente é, pois, a regra 136, n.° 1, deste regulamento de execução.

28      No que respeita ao prazo de um ano, basta constatar que o artigo 78.°, n.° 2, do Regulamento n.° 40/94 não diz exclusivamente respeito ao requerimento de restitutio in integrum, nos casos da não apresentação de um pedido de renovação, mas visa igualmente a inobservância do prazo nos casos em que o impedimento teve como consequência directa, por força das disposições do referido regulamento, a perda de um direito ou de um meio de recurso. O impedimento, e sobretudo a sua cessação, pode apresentar‑se de numerosas formas e, portanto, o prazo de um ano foi previsto como um prazo absoluto. Assim, a recorrente não pode sustentar que este prazo se tornaria inútil se o prazo de dois meses fosse calculado a contar da «data cronológica» em causa (no caso em apreço, em 21 e 23 de Novembro de 2006). No caso de o impedimento só cessar um ano após a expiração do prazo inobservado, o requerimento de restitutio in integrum já não é admissível. O prazo de dois meses situa‑se, pois, no interior do prazo de um ano.

29      No tocante à prática das Câmaras de Recurso do IEP, invocada pela recorrente, basta constatar que o regime comunitário das marcas é um sistema autónomo, constituído por um conjunto de regras e que prossegue objectivos que lhe são específicos, sendo a sua aplicação independente de qualquer outro sistema [v., por analogia, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 5 de Dezembro de 2000, Messe München/IHMI (electronica), T‑32/00, Colect., p. II‑3829, n.° 47].

30      Efectivamente, embora as disposições com redacção idêntica ou semelhante em matéria de direito da propriedade intelectual europeu devam, sempre que possível, ser interpretadas de forma coerente, a Convenção sobre a Patente Europeia não é um instrumento comunitário e o IEP não é um órgão comunitário. A jurisprudência das Câmaras de Recurso daquele Instituto não tem força vinculativa no direito comunitário (conclusões da advogada‑geral E. Sharpston, apresentadas no processo no qual foi proferido o acórdão do Tribunal de Justiça de 13 de Março de 2007, IHMI/Kaul, C‑29/05 P, Colect., pp. I‑2213, I‑2215, n.° 40).

31      Por outro lado, mesmo supondo que o artigo 78.° do Regulamento n.° 40/94 tenha sido elaborado com base num modelo abrangido pelo direito das patentes, nada indica que a interpretação das duas disposições deva ser idêntica, uma vez que os interesses em causa nos dois domínios podem divergir. Com efeito, o contexto jurídico do direito das patentes é diferente e as disposições que regem a patente destinam‑se a regulamentar procedimentos diferentes daqueles que são aplicados em matéria de marcas [acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 13 de Maio de 2009, Aurelia Finance/IHMI (AURELIA), T‑136/08, ainda não publicado na Colectânea, n.° 21].

32      Em todo o caso, a decisão da Câmara de Recurso Técnica do IEP, de 16 de Abril de 1985 (T 191/82, JO IEP 7/1985, p. 189), para a qual remete a recorrente, não demonstra minimamente de que modo é que o IEP dá uma interpretação diferente à disposição pertinente. Com efeito, neste processo, considerou que, no caso de um empregado de um mandatário descobrir que a inobservância de um prazo conduziu a uma perda do direito, o impedimento que está na origem desta inobservância, a saber, o facto de não se aperceber de que o prazo não tinha sido observado, deve ser considerado como não tendo cessado, enquanto o mandatário em questão não for pessoalmente informado da situação, pois é a ele que incumbe decidir se há que apresentar um requerimento de restitutio in integrum e, quando opte por apresentar esse requerimento, procurar os motivos e as circunstância que importará alegar perante o IEP.

33      Ora, no caso em apreço, o mandatário, isto é, o representante da recorrente, não invocou não ter sido pessoalmente informado da situação nas datas das notificações. Assim sendo, esta decisão não sustenta de maneira nenhuma os argumentos da recorrente. Acresce que a relação entre o representante e o seu empregado não pode ser equiparada à relação entre um representado e o seu representante.

34      Nestas circunstâncias, há que rejeitar o fundamento relativo à violação do artigo 78.° do Regulamento n.° 40/94.

 Quanto ao fundamento relativo à violação do princípio da proibição da reformatio in pejus

35      A recorrente alega, essencialmente, que, em violação do princípio da proibição da reformatio in pejus, a Câmara de Recurso a colocou, na sequência do seu recurso, numa situação menos favorável do que aquela que seria a sua caso não houvesse recurso, concluindo, pela primeira vez, que o requerimento de restitutio in integrum tinha sido apresentado fora do prazo de dois meses ao Departamento «Marcas e Registo».

36      O IHMI contesta os argumentos avançados pela recorrente.

37      Mesmo admitindo que o princípio que a recorrente invoca possa ser aduzido num processo em que a Câmara de Recurso exerce as competências da instância que tomou a decisão que é objecto do recurso que lhe incumbe apreciar, ou remete o processo à referida instância para que esta aplique a sua decisão, basta observar que, ao negar provimento ao recurso da recorrente, a Câmara de Recurso manteve em vigor a decisão do Departamento «Marcas e Registo». Por conseguinte, no que respeita à decisão do Departamento «Marcas e Registo», na medida em que não deu provimento aos pedidos da recorrente, esta última não se encontra, na sequência do acórdão recorrido, numa posição juridicamente menos favorável do que antes da interposição do recurso.

38      Cabe ainda lembrar que resulta do artigo 62.°, n.° 1, do Regulamento n.° 40/94 (actual artigo 64.°, n.° 1, do Regulamento n.° 207/2009) que, após analisar o mérito do recurso, a Câmara de Recurso delibera sobre o mesmo e, ao fazê‑lo, pode «exercer as competências da instância que tomou a decisão contestada», isto é, no presente caso, pronunciar‑se ela própria sobre o requerimento de restitutio in integrum, rejeitando‑o ou declarando‑o fundado, confirmando ou infirmando nessa medida a decisão tomada em primeira instância. Por conseguinte, por força do recurso nela interposto, a Câmara de Recurso é chamada a proceder a uma nova apreciação integral do mérito do requerimento de restitutio in integrum, tanto quanto à matéria de direito como à matéria de facto (acórdão IHMI/Kaul, já referido, n.os 56 e 57).

39      Como sustenta o IHMI, as questões relativas à admissibilidade não devem ser excluídas desta «nova apreciação integral» do requerimento de restitutio in integrum. Com efeito, de acordo com jurisprudência assente, as regras em matéria de prazos correspondem a exigências de segurança jurídica e à necessidade de se evitar toda e qualquer discriminação ou tratamento arbitrário (v. despacho do Tribunal de Primeira Instância de 21 de Novembro de 2005, Tramarin/Comissão, T‑426/04, Colect., p. II‑4765, n.° 60 e a jurisprudência referida). Esta constatação geral aplica‑se também aos prazos previstos nos regulamentos sobre a marca comunitária [acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 17 de Setembro de 2008, Neurim Pharmaceuticals (1991)/IHMI – Eurim‑Pharm Arzneimittel (Neurim PHARMACEUTICALS), T‑218/06, ainda não publicado na Colectânea, n.° 44].

40      A este respeito, a recorrente não pode invocar o acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 16 de Fevereiro de 2000, Procter & Gamble/IHMI (Forma de um sabão) (T‑122/99, Colect., p. II‑265), na medida em que este Tribunal tinha considerado que a Câmara de Recurso não era competente para proceder a um novo exame das condições de depósito do pedido de registo e para decidir pela inadmissibilidade do pedido de registo (n.os 29 a 34). Com efeito, tendo decidido oficiosamente, a posteriori, pela existência de irregularidade formal não considerada pelo examinador, a Câmara de Recurso tinha privado a recorrente da opção de apresentar ao IHMI um novo pedido de registo que lhe permitisse beneficiar de uma data de depósito anterior àquela que teria podido obter após a adopção da decisão impugnada em questão (acórdão Forma de um sabão, já referido, n.os 29 e 30).

41      Ora, no presente caso, a inobservância do prazo em questão não teria podido ser rectificada de maneira nenhuma, pelo que a Câmara de Recurso não privou a recorrente de uma qualquer opção.

42      No tocante à prática das Câmaras de Recurso do IEP, invocada pela recorrente, basta recordar que as decisões deste Instituto não têm valor de jurisprudência em direito comunitário.

43      Em todo o caso, a decisão da Grande Câmara de Recurso do IEP, de 14 de Julho de 1994 (G 9/92, JO IEP 12/1994, p. 875), invocada pela recorrente, não é transponível para o caso em apreço, pois não respeitava à inobservância de um prazo, mas à questão de saber se o texto de uma patente, como aprovado na decisão intermédia, podia ser contestado.

44      Nestas circunstâncias, há que rejeitar o fundamento relativo à violação do princípio da proibição da reformatio in pejus.

 Quanto ao fundamento relativo à violação dos direitos de defesa e do direito de ser ouvido

45      A recorrente alega, essencialmente, que a Câmara de Recurso, em violação dos artigos 61.°, n.° 2, e 73.°, segundo período, do Regulamento n.° 40/94 (actuais artigos 63.°, n.° 2, e 75.°, segundo período, do Regulamento n.° 207/2009), não lhe deu a possibilidade de, antes da adopção das decisões impugnadas, apresentar as suas observações sobre as razões pelas quais a Câmara de Recurso negou provimento ao seu recurso, concluindo, pela primeira vez, que o requerimento de restitutio in integrum tinha sido apresentado fora do prazo ao Departamento «Marcas e Registo».

46      O IHMI contesta os argumentos avançados pela recorrente.

47      Cabe salientar que, nos termos do artigo 73.°, segundo período, do Regulamento n.° 40/94, as decisões do IHMI só se podem basear em motivos a respeito dos quais as partes se tenham podido pronunciar. Esta disposição consagra, no âmbito do direito das marcas comunitárias, o princípio geral da protecção dos direitos de defesa. Por força deste princípio geral de direito comunitário, os destinatários das decisões das autoridades públicas que afectem de maneira sensível os seus interesses devem ter a possibilidade de dar a conhecer utilmente o seu ponto de vista. O direito de ser ouvido abrange todos os elementos de facto ou de direito que constituem o fundamento do acto decisório, mas não a posição final que a administração pretende adoptar [v. acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 7 de Fevereiro de 2007, Kustom Musical Amplification/IHMI (Forma de uma guitarra), T‑317/05, Colect., p. II‑427, n.os 24, 26 e 27 e jurisprudência referida].

48      Além disso, decorre da jurisprudência que os direitos de defesa só são violados devido a uma irregularidade processual, se e na medida em que esta tenha tido uma incidência concreta na possibilidade de as empresas em causa se defenderem. Assim, o desrespeito das regras em vigor destinadas a proteger os direitos de defesa só pode viciar o procedimento administrativo, se se demonstrar que este teria podido conduzir a um resultado diferente se esse desrespeito não se tivesse verificado [v. acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 12 de Maio de 2009, Jurado Hermanos/IHMI (JURADO), T‑410/07, ainda não publicado na Colectânea, n.° 32 e jurisprudência referida].

49      Ora, como se constatou no exame do fundamento relativo à violação do artigo 78.° do Regulamento n.° 40/94, foi de modo juridicamente correcto que a Câmara de Recurso entendeu que o requerimento de restitutio in integrum tinha sido apresentado fora do prazo de dois meses e, portanto, devia ser considerado como não tendo sido apresentado.

50      Assim, mesmo admitindo que a Câmara de Recurso tenha incorrido numa violação do direito de ser ouvida da recorrente, essa violação não poderia afectar a legalidade das decisões impugnadas [v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 20 de Abril de 2005, Krüger/IHMI – Calpis (CALPICO), T‑273/02, Colect., p. II‑1271, n.° 68].

51      Por outro lado, no presente caso, em resposta a uma questão do Tribunal para saber o que é que a recorrente teria dito se tivesse tido a possibilidade de apresentar as suas observações a esse respeito, esta contentou‑se em invocar que tinha havido uma divergência a propósito da personalidade do representante e que a prática do IHMI era diferente da do IEP. Ora, relativamente ao IHMI, o seu representante era aquele que recebeu as notificações e que, além disso, apresentou o requerimento de restitutio in integrum. Admitindo que assim não fosse, este representante não teria podido apresentar este requerimento, o qual deveria ser considerado, por maioria de razão, como nunca tendo sido apresentado. Acresce que, como já antes se constatou, a prática do IEP não vincula o IHMI. Por conseguinte, a resposta da recorrente corrobora a constatação de que o seu direito ser ouvida não foi violado.

52      Nestas circunstâncias, a recorrente não pode invocar o acórdão Forma de um sabão, já referido, segundo o qual a Câmara de Recurso tinha violado os direitos de defesa da recorrente, ao não lhe dar a oportunidade de se pronunciar sobre dois novos motivos absolutos de recusa que ela oficiosamente teve em consideração (acórdão Forma de um sabão, já referido, n.° 47).

53      Por conseguinte, há que rejeitar o fundamento relativo à violação dos direitos de defesa e do direito de ser ouvido.

54      Resulta do exposto que há que negar provimento aos recursos da recorrente.

55      Nestas circunstâncias, não há que se pronunciar sobre a admissibilidade do segundo e terceiro pedidos da recorrente.

 Quanto às despesas

56      Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a recorrente sido vencida, há que condená‑la nas despesas, em conformidade com os pedidos do IHMI.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Primeira Secção)

decide:

1)      É negado provimento aos recursos.

2)      A Evets Corp. é condenada nas despesas.

Tiili

Dehousse

Wiszniewska‑Białecka

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 23 de Setembro de 2009.

Assinaturas


* Língua do processo: inglês.