Language of document : ECLI:EU:T:2003:58

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quinta Secção)

de 6 de Março de 2003 (1)

«Bananas - Organização comum de mercado - Decisão 94/800/CE - Regulamento (CE) n.° 478/95 - Regime dos certificados de exportação - Acção de indemnização»

No processo T-56/00,

Dole Fresh Fruit International Ltd, com sede em San José (Costa Rica), representada por B. O'Connor, solicitor, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

demandante,

contra

Conselho da União Europeia, representado por S. Marquardt e J.-P. Hix, na qualidade de agentes,

e

Comissão das Comunidades Europeias, inicialmente representada por P. Oliver e C. Van der Hauwaert, na qualidade de agentes, e em seguida por L. Visaggio e K. Fitch, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

demandados,

que tem por objecto um pedido de reparação do prejuízo que a demandante teria sofrido por força da instauração do regime dos certificados de exportação pela Decisão 94/800/CE do Conselho, de 22 de Dezembro de 1994, relativa à celebração, em nome da Comunidade Europeia e em relação às matérias da sua competência, dos acordos resultantes das negociações multilaterais do Uruguay Round (1986-1994) (JO L 336, p. 1), e pelo Regulamento (CE) n.° 478/95 da Comissão, de 1 de Março de 1995, que estabelece normas complementares de execução do Regulamento (CEE) n.° 404/93 do Conselho no que respeita ao regime de contingente pautal para as importações de bananas na Comunidade e que altera o Regulamento (CEE) n.° 1442/93 (JO L 49, p. 13),

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Quinta Secção),

composto por: J. D. Cooke, presidente, R. García-Valdecasas e P. Lindh, juízes,

secretário: J. Palacio González, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 12 de Setembro de 2002,

profere o presente

Acórdão

Enquadramento jurídico

1.
    O Regulamento (CEE) n.° 404/93 do Conselho, de 13 de Fevereiro de 1993, que estabelece a organização comum de mercado no sector das bananas (JO L 47, p. 1), no título IV, substituiu os diversos regimes nacionais por um regime comum de trocas com os países terceiros.

2.
    Nos termos do artigo 17.°, primeiro parágrafo, do Regulamento n.° 404/93, na sua versão inicial:

«Todas as importações de bananas para a Comunidade estão sujeitas à apresentação dum certificado de importação passado pelos Estados-Membros aos interessados que o solicitem, seja qual for o local do seu estabelecimento na Comunidade, sem prejuízo das disposições especiais tomadas para a aplicação dos artigos 18.° e 19.°»

3.
    O artigo 18.°, n.° 1, do Regulamento n.° 404/93, na sua versão inicial, dispunha que seria aberto, anualmente, um contingente pautal de dois milhões de toneladas/peso líquido para as importações de bananas de países terceiros diferentes dos Estados ACP (a seguir «bananas de países terceiros») e para as importações não tradicionais de bananas dos Estados ACP (a seguir «bananas não tradicionais ACP»). No âmbito deste contingente, as importações de bananas de países terceiros estavam sujeitas a um direito de 100 ecus por tonelada e as das bananas não tradicionais ACP a um direito nulo.

4.
    O artigo 19.°, n.° 1, do Regulamento n.° 404/93 procedia a uma repartição do contingente pautal, abrindo-o até ao limite de 66,5% para a categoria de operadores que tinham comercializado bananas de países terceiros e/ou bananas não tradicionais ACP (categoria A), 30% para a categoria de operadores que tinham comercializado bananas comunitárias e/ou bananas tradicionais ACP (categoria B) e 3,5% para a categoria de operadores estabelecidos na Comunidade que tinham começado a comercializar bananas que não as bananas comunitárias e/ou tradicionais ACP a partir de 1992 (categoria C).

5.
    O artigo 20.° do Regulamento n.° 404/93 atribuía à Comissão a fixação das modalidades de aplicação do título IV.

6.
    Desse modo, a Comissão adoptou o Regulamento (CEE) n.° 1442/93, de 10 de Junho de 1993, que estabelece normas de execução do regime de importação de bananas na Comunidade (JO L 142, p. 6).

7.
    Em 19 de Fevereiro de 1993, a República da Colômbia, a República da Costa Rica, a República da Guatemala, a República da Nicarágua e a República da Venezuela pediram à Comissão que iniciasse consultas, nos termos do artigo XXII, n.° 1, do Acordo Geral sobre Pautas Aduaneiras e Comércio (GATT), a propósito do Regulamento n.° 404/93. Não tendo as consultas conduzido a um resultado, esses Estados desencadearam em Abril de 1993 o procedimento de resolução de litígios previsto no artigo XXIII, n.° 2, do GATT.

8.
    Em 18 de Janeiro de 1994, o grupo de peritos instituído no quadro desse procedimento apresentou um relatório em que conclui pela incompatibilidade do regime de importação instituído pelo Regulamento n.° 404/93 com as regras do GATT. Este relatório não foi aprovado pelas partes contratantes do GATT.

9.
    Em 28 e 29 de Março de 1994, a Comunidade chegou a um entendimento com a República da Colômbia, a República da Costa Rica, a República da Nicarágua e a República da Venezuela, chamado acordo-quadro sobre as bananas (a seguir «acordo-quadro»).

10.
    No ponto 1 da segunda parte do acordo-quadro, fixa-se o contingente pautal global de base em 2 100 000 toneladas para 1994 e em 2 200 000 toneladas para 1995 e para os anos seguintes, sem prejuízo de qualquer aumento resultante do alargamento da Comunidade.

11.
    No ponto 2, o acordo-quadro fixa as percentagens desse contingente atribuídas respectivamente à Colômbia, à Costa Rica, à Nicarágua e à Venezuela. Estes Estados recebem 49,4% do contingente total, ao passo que à República Dominicana e aos outros Estados ACP são atribuídas 90 000 toneladas para as importações não tradicionais, revertendo o excedente para os outros países terceiros.

12.
    O ponto 6 prevê, nomeadamente:

«Os países fornecedores aos quais tenha sido atribuído um contingente específico podem emitir licenças de exportação especiais para uma quantidade que poderá ascender a 70% do seu contingente, sendo estas licenças uma condição prévia da emissão, pela Comunidade, de certificados de importação de bananas provenientes desses países pelos operadores da ‘categoria A’ e da ‘categoria C’.

A autorização para emitir licenças de exportação especiais é concedida pela Comissão de modo a que seja possível melhorar a regularidade e a estabilidade das relações comerciais entre produtores e importadores, e na condição de as licenças de exportação serem emitidas sem qualquer discriminação entre os operadores.»

13.
    O ponto 7 fixa o direito aduaneiro sobre o contingente em 75 ecus por tonelada.

14.
    Nos termos dos pontos 10 e 11:

«O presente acordo será incorporado na lista da Comunidade para o Uruguay Round.

O presente acordo resolve o diferendo entre a Colômbia, a Costa Rica, a Venezuela, a Nicarágua e a Comunidade relativamente ao regime comunitário para as bananas. As partes no presente acordo renunciam a pedir a aprovação do relatório do grupo de peritos do GATT sobre esta questão.»

15.
    Os pontos 1 e 7 do acordo-quadro foram integrados no anexo LXXX do GATT de 1994, que contém a lista das concessões aduaneiras da Comunidade. O GATT de 1994 constitui, por sua vez, o anexo 1 A do Acordo que institui a Organização Mundial do Comércio (OMC). Um anexo do anexo LXXX reproduz o acordo-quadro.

16.
    Em 22 de Dezembro de 1994, o Conselho adoptou por unanimidade a Decisão 94/800/CE relativa à celebração, em nome da Comunidade Europeia e em relação às matérias da sua competência, dos acordos resultantes das negociações multilaterais do Uruguay Round (1986-1994) (JO L 336, p. 1).

17.
    Nos termos do artigo 1.°, n.° 1, dessa decisão, são aprovados em nome da Comunidade Europeia, e em relação às matérias da sua competência, nomeadamente, o Acordo que institui a OMC, bem como os acordos dos anexos 1, 2 e 3 do referido acordo, do qual faz parte o GATT de 1994.

18.
    Em 22 de Dezembro de 1994, o Conselho adoptou o Regulamento (CE) n.° 3290/94, relativo às adaptações e medidas transitórias necessárias no sector da agricultura para a execução dos acordos concluídos no âmbito das negociações comerciais multilaterais do Uruguay Round (JO L 349, p. 105). Este regulamento contém um Anexo XV relativo às bananas que dispõe que o artigo 18.°, n.° 1, do Regulamento n.° 404/93 é alterado no sentido de que, para 1994, o volume do contingente pautal é fixado em 2 100 000 toneladas e, para os anos seguintes, em 2 200 000 toneladas. No âmbito desse contingente pautal, as importações de bananas de países terceiros estão sujeitas à cobrança de um direito aduaneiro de 75 ecus por tonelada.

19.
    Em 1 de Março de 1995, a Comissão aprovou o Regulamento (CE) n.° 478/95 que estabelece normas complementares de execução do Regulamento n.° 404/93 no que respeita ao regime de contingente pautal para as importações de bananas na Comunidade e que altera o Regulamento n.° 1442/93 (JO L 49, p. 13). O Regulamento n.° 478/95 aprovava as medidas necessárias para a aplicação do acordo-quadro numa base que deixasse de ser transitória.

20.
    O Regulamento n.° 478/95 dispunha, no artigo 1.°, n.° 1, que:

«O contingente pautal para as importações de bananas de países terceiros e de bananas não tradicionais ACP, previsto nos artigos 18.° e 19.° do [Regulamento n.° 404/93], é dividido em quotas específicas atribuídas aos países ou grupos de países enumerados no Anexo I [...]»

21.
    O Anexo I continha três quadros: o primeiro reproduzia as percentagens do contingente pautal reservadas aos Estados latino-americanos no acordo-quadro; o segundo procedia a uma repartição do contingente de 90 000 toneladas de bananas não tradicionais ACP e o terceiro dispunha que todos os outros países receberiam 50,6% do contingente total.

22.
    O artigo 3.°, n.° 2, do Regulamento n.° 478/95 dispunha:

«Para as mercadorias originárias da Colômbia, da Costa Rica e da Nicarágua, os pedidos de certificados de importação das categorias A e C, referidas no n.° 4 do artigo 9.° do [Regulamento n.° 1442/93], só são admissíveis se forem ainda acompanhados de um certificado de exportação válido para uma quantidade de mercadorias pelo menos igual e emitido pelas autoridades competentes [...]»

23.
    Por acórdão de 10 de Março de 1998, Alemanha/Conselho (C-122/95, Colect., p. I-973, a seguir «acórdão Alemanha/Conselho»), o Tribunal de Justiça anulou o artigo 1.°, n.° 1, primeiro travessão, da Decisão 94/800 na parte em que o Conselho aí aprovou a conclusão do acordo-quadro, na medida em que o referido acordo-quadro isenta os operadores da categoria B do regime de certificados de exportação nele previstos.

24.
    Nesse acórdão, o Tribunal de Justiça considerou que, quanto a essa isenção, o fundamento baseado em violação do princípio geral da não discriminação, referido no artigo 34.°, n.° 2, segundo parágrafo, CE, era procedente (n.° 72). Chegou a esta conclusão após constatar, por um lado, que os operadores da categoria B beneficiavam, nos mesmos termos que os das categorias A e C, do aumento do contingente pautal e da concomitante redução dos direitos aduaneiros estipulados no acordo-quadro e, por outro, que as restrições e diferenças de tratamento, em detrimento dos operadores das categorias A e C, que o regime de importação de bananas instituído pelo Regulamento n.° 404/93 comportava, existiam também ao nível da parte do contingente correspondente a esse aumento (n.° 67).

25.
    O Tribunal de Justiça considerou que, nestas condições, para justificar o recurso a uma medida como a isenção dos operadores da categoria B do regime de certificados de exportação, cabia ao Conselho demonstrar que o equilíbrio entre as diferentes categorias de operadores, estabelecido pelo Regulamento n.° 404/93 e desfeito pelo aumento do contingente pautal e pela correspondente redução dos direitos aduaneiros, só tinha podido ser restabelecido através da concessão de uma vantagem substancial aos operadores da categoria B e, portanto, com uma nova diferença de tratamento em detrimento das outras categorias de operadores (n.° 68). O Tribunal de Justiça entendeu que, no caso, ao invocar uma ruptura do referido equilíbrio e ao limitar-se a alegar que a referida isenção se justificava pela necessidade de restabelecer esse equilíbrio, o Conselho não tinha feito essa prova (n.° 69).

26.
    No seu acórdão de 10 de Março de 1998, T. Port (C-364/95 e C-365/95, Colect., p. I-1023, a seguir «acórdão T. Port»), o Tribunal de Justiça, depois de seguir no essencial um raciocínio idêntico ao do acórdão Alemanha/Conselho, declarou:

«O [Regulamento n.° 478/95] é inválido na medida em que, no seu artigo 3.°, n.° 2, apenas sujeita os operadores das categorias A e C à obrigação de obter certificados de exportação para a importação de bananas originárias da Colômbia, da Costa Rica ou da Nicarágua» (n.° 2 da parte decisória).

27.
    Em 28 de Outubro de 1998, a Comissão adoptou o Regulamento (CE) n.° 2362/98 que estabelece normas de execução do Regulamento n.° 404/93 no que respeita ao regime de importação de bananas na Comunidade (JO L 293, p. 32). Por força do artigo 31.° do Regulamento n.° 2362/98, o Regulamento n.° 478/95 foi revogado a partir de 1 de Janeiro de 1999.

Matéria de facto e tramitação processual

28.
    A demandante é uma sociedade do grupo Dole. Este grupo exerce actividades a nível mundial na produção, tratamento, distribuição e comercialização, designadamente, de frutas e produtos hortícolas frescos, incluindo bananas.

29.
    A demandante refere que entre 1995 e 1998 comercializou na Comunidade bananas originárias da Colômbia, da Costa Rica, da Nicarágua e da Venezuela por intermédio dos seus comissionistas Comafrica SpA (a seguir «Comafrica») e Dole Fresh Fruit Europe Ltd & Co. (a seguir «DFFE»), registados, respectivamente, em Itália e na Alemanha como operadores da categoria A. Afirma ter tido, para o efeito, que adquirir certificados de exportação.

30.
    Por petição registada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 14 de Março de 2000, a demandante intentou a presente acção de indemnização.

31.
    Com base no relatório do juiz-relator, o Tribunal de Primeira Instância (Quinta Secção) decidiu iniciar a fase oral e, como medidas de organização do processo, convidou a demandante a responder por escrito a algumas questões. Esta satisfez esse pedido no prazo fixado.

32.
    Foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às questões colocadas pelo Tribunal na audiência de 12 de Setembro de 2002.

Pedidos das partes

33.
    A demandante conclui pedindo que o Tribunal se digne:

-    julgar a acção admissível;

-    condenar o Conselho e a Comissão a indemnizá-la pelo prejuízo sofrido com a adopção da Decisão 94/800 e do Regulamento n.° 478/95;

-    acompanhar a indemnização de juros à taxa adequada;

-    condenar o Conselho e/ou a Comissão nas despesas.

34.
    O Conselho e a Comissão concluem pedindo que o Tribunal se digne:

-    julgar a acção inadmissível ou, a título subsidiário, improcedente;

-    condenar a demandante nas despesas.

Quanto à admissibilidade

Argumentos das partes

35.
    O Conselho e a Comissão, sem suscitarem formalmente uma questão prévia de inadmissibilidade nos termos do artigo 114.°, n.° 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, contestam a admissibilidade da acção por a petição não satisfazer as condições do artigo 19.° do Estatuto (CE) do Tribunal de Justiça e do artigo 44.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância.

36.
    O Conselho e a Comissão alegam que a demandante não fez prova suficiente da realidade e da extensão do dano alegado nem da existência de um nexo de causalidade entre o comportamento ilegal invocado e esse dano. Acusam-na, mais exactamente, de não ter fornecido indicações sobre as autoridades que venderam os certificados de exportação em causa, sobre as sociedades que compraram esses certificados, sobre as datas das transacções e sobre a utilização que foi «realmente» feita desses mesmos certificados. Consideram, além disso, que a demandante não forneceu precisões suficientes quanto ao seu estatuto jurídico bem como quanto às relações jurídicas e comerciais com a Comafrica, DFFE e outras sociedades do grupo Dole.

37.
    A demandante refere que as indicações que constam da sua petição, e designadamente do anexo 4 da mesma, fazem prova suficiente do respeito dessas duas condições da responsabilidade extracontratual da Comunidade. Na réplica, adianta algumas precisões quanto ao seu estatuto jurídico bem como quanto às suas relações com outras sociedades do grupo Dole.

Apreciação do Tribunal

38.
    Recorde-se que, nos termos do artigo 19.° do Estatuto (CE) do Tribunal de Justiça e do artigo 44.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, a petição deve conter a indicação do objecto do litígio e a exposição sumária dos fundamentos invocados.

39.
    Esta indicação deve ser suficientemente clara e precisa para permitir à parte demandada preparar a sua defesa e ao Tribunal decidir o recurso, eventualmente, sem outras informações. Para garantir a segurança jurídica e uma boa administração da justiça, é necessário, para que uma acção seja admissível, que os elementos essenciais de facto e de direito em que esta se baseia resultem, pelo menos sumariamente, mas de um modo coerente e compreensível, do texto da própria petição (despacho do Tribunal de Primeira Instância de 28 de Abril de 1993, De Hoe/Comissão, T-85/92, Colect., p. II-523, n.° 20, e acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 29 de Janeiro de 1998, Dubois et Fils/Conselho e Comissão, T-113/96, Colect. p. II-125, n.° 29).

40.
    Para preencher estas condições, uma petição destinada a obter a reparação de prejuízos alegadamente causados por uma instituição comunitária deve conter os elementos que permitam identificar o comportamento que o demandante censura à instituição, as razões por que considera que existe um nexo de causalidade entre o comportamento e o prejuízo que alega ter sofrido, bem como o carácter e a extensão deste prejuízo (acórdão Dubois et Fils/Conselho e Comissão, já referido, n.° 30).

41.
    No caso vertente, resulta expressamente da petição que a demandante acusa o Conselho e a Comissão de terem adoptado, respectivamente, a Decisão 94/800, cujo artigo 1.° foi parcialmente anulado pelo Tribunal de Justiça no acórdão Alemanha/Conselho, e o artigo 3.°, n.° 2, do Regulamento n.° 478/95, declarado inválido pelo Tribunal de Justiça no acórdão T. Port. Por outro lado, encontra-se claramente exposto na petição que a demandante sofreu um prejuízo que consistiu no facto de, entre 1995 e 1998, ter pago a quantia total de 91 705 271 dólares dos Estados Unidos (USD) para adquirir certificados de exportação de bananas originárias da Colômbia, da Costa Rica, da Nicarágua e da Venezuela. Por último, indica-se na petição que a demandante adquiriu esses certificados porque, nos termos do acordo-quadro e do artigo 3.°, n.° 2, do Regulamento n.° 478/95, a sua apresentação era, no que respeita à categoria de operadores a que pertenciam os seus comissionistas Comafrica e DFFE, condição prévia à emissão pela Comunidade de certificados de importação de bananas originárias desses países.

42.
    Desse modo, a demandante descreveu suficientemente a natureza e a extensão do prejuízo alegado bem como as razões pelas quais entende que existe um nexo de causalidade entre o comportamento ilegal imputado ao Conselho e à Comissão e esse prejuízo. As objecções levantadas por estas instituições a elementos de prova apresentados pela demandante integram-se na apreciação do mérito da causa, devendo, portanto, ser analisadas no âmbito desta.

43.
    Daí resulta que a petição responde aos requisitos formais do artigo 19.° do Estatuto (CE) do Tribunal de Justiça e do artigo 44.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância e que a acção deve ser julgada admissível.

Quanto ao mérito

44.
    A responsabilidade extracontratual da Comunidade nos termos do artigo 288.°, segundo parágrafo, CE pressupõe a verificação de uma série de condições respeitantes à ilegalidade do comportamento censurado às instituições comunitárias, à efectividade do dano e à existência de um nexo de causalidade entre o comportamento alegado e o prejuízo invocado (acórdãos do Tribunal de Justiça de 7 de Maio de 1992, Pesquerias De Bermeo e Naviera Laida/Comissão, C-258/90 e C-259/90, Colect., p. I-2901, n.° 42, e do Tribunal de Primeira Instância de 18 de Setembro de 1995, Blackspur e o./Conselho e Comissão, T-168/94, Colect., p. II-2627, n.° 38).

Argumentos das partes

45.
    Quanto à condição relativa ao comportamento ilegal, a demandante alega, em primeiro lugar, que a instauração do regime dos certificados de exportação pelo acordo-quadro, conforme aprovado pela Decisão 94/800, e pelo artigo 3.°, n.° 2, do Regulamento n.° 478/95 constitui violação de uma regra de direito que protege os particulares.

46.
    Por um lado, baseia-se na violação do princípio da não discriminação declarada pelo Tribunal de Justiça nos acórdãos Alemanha/Conselho e T. Port.

47.
    Por outro lado, adianta que, segundo jurisprudência constante, este princípio é uma regra de direito que protege os particulares (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 27 de Junho de 1991, Stahlwerke Peine-Salzgitter/Comissão, T-120/89, Colect., p. II-279, n.° 92).

48.
    Na réplica, a demandante acrescenta que o Conselho e a Comissão agiram violando obrigações internacionais assumidas pela Comunidade no quadro da OMC. Estas obrigações constituem uma «regra superior de direito» e a sua violação basta para dar origem à responsabilidade extracontratual da Comunidade relativamente à demandante.

49.
    Em segundo lugar, a demandante pretende que a violação verificada no caso concreto é suficientemente caracterizada.

50.
    Em primeiro lugar, sublinha que o princípio da não discriminação assume particular importância entre as regras de direito comunitário destinadas à protecção dos interesses dos particulares (acórdão do Tribunal de Justiça de 4 de Outubro de 1979, DGV e o./Conselho e Comissão, 241/78, 242/78 e 245/78 a 250/78, Recueil, p. 3017, n.° 10).

51.
    Em segundo lugar, sustenta que a violação desse princípio no caso concreto atingiu um grupo restrito, determinável e claramente delimitado de operadores económicos (acórdão DGV e o./Conselho e Comissão, já referido, acórdãos do Tribunal de Justiça de 4 de Outubro de 1979, Dumortier frères e o./Conselho, 64/76 e 113/76, 167/78 e 239/78, 27/79, 28/79 e 45/79, Recueil, p. 3091, e de 19 de Maio de 1992, Mulder e o./Conselho e Comissão, C-104/89 e C-37/90, Colect., p. I-3061). Com efeito, só os operadores das categorias A e C que estavam registados junto das autoridades competentes dos Estados-Membros e que tinham importado, na Comunidade, bananas originárias da Colômbia, da Costa Rica, da Nicarágua ou da Venezuela durante o período de aplicação do regime dos certificados de exportação foram afectados pela Decisão 94/800 e pelo Regulamento n.° 478/95.

52.
    Em terceiro lugar, a demandante adianta que o prejuízo que sofreu ultrapassa o limite dos riscos económicos inerentes às actividades no sector das bananas. Observa, a este propósito, que a sujeição dos operadores das categorias A e C ao regime dos certificados de exportação implicou, para esses operadores, um aumento do preço de aquisição das bananas originárias dos países terceiros em causa da ordem de 33% relativamente ao preço pago pelos operadores da categoria B. Por outro lado, contesta o argumento segundo o qual os países terceiros em causa teriam podido repartir as suas quotas nacionais respectivas entre os seus próprios operadores ou introduzir unilateralmente um sistema de certificados de exportação. Com efeito, por um lado, esses países não estavam em condições de verificar a que categoria de operadores as bananas eram destinadas e, por outro lado, receavam uma deslocação dos fluxos comerciais para outros países da América Latina.

53.
    Em quarto lugar, a demandante afirma que a violação do princípio da não discriminação verificada no caso vertente não pode ser justificada por um interesse público superior prevalecente sobre os interesses particulares dos operadores das categorias A e C. Referindo-se ao n.° 68 do acórdão Alemanha/Conselho e aos n.os 87 e 88 do acórdão T. Port, observa que a clara diferença de tratamento com prejuízo dos operadores das categorias A e C não encontra justificação na necessidade de compensar um pretenso desequilíbrio concorrencial entre as diferentes categorias de operadores. Acrescenta que o Tribunal de Justiça concluiu que um dos objectivos do Regulamento n.° 478/95 era fornecer uma ajuda financeira aos países terceiros partes contratantes no acordo-quadro mas considerou que este objectivo geral não podia prevalecer sobre os interesses particulares dos operadores das categorias A e C, principalmente porque não podia «ser realizado através da imposição de um ónus financeiro apenas a uma parte dos operadores económicos que efectuam importações provenientes desses países» (acórdão Alemanha/Conselho, n.° 71).

54.
    Em quinto lugar, a demandante sustenta que o Conselho e a Comissão cometeram um erro relativamente a um acto normativo, «o que instituições razoáveis não podem fazer».

55.
    Em sexto lugar, considera que essas instituições não podem invocar como argumento as conclusões do advogado-geral M. B. Elmer no processo Alemanha/Conselho (Colect., p. I-978), uma vez que a sua opinião não foi seguida pelo Tribunal. Realça, no essencial, que este declarou que o acordo-quadro não implicava qualquer desvantagem em detrimento dos operadores da categoria B. Acrescenta que não se pode deduzir da declaração do advogado-geral M. B. Elmer segundo a qual a diferença de tratamento criticada era «perfeitamente razoável» que a mesma não constituía uma violação suficientemente caracterizada de uma regra de direito. Tal equivaleria, com efeito, a sugerir, de modo totalmente inaceitável, que a autoridade de um advogado-geral pode ser superior à do Tribunal de Justiça.

56.
    O Conselho e a Comissão, remetendo para os acórdãos Alemanha/Conselho e T. Port, reconhecem que o comportamento que a demandante lhes imputa constitui uma violação de uma regra de direito. Ao invés, contestam o carácter protector da mesma e o carácter suficientemente caracterizado da violação ocorrida.

57.
    Em primeiro lugar, o Conselho e a Comissão assinalam que, nos acórdãos Alemanha/Conselho e T. Port, o Tribunal de Justiça concluiu pela violação do princípio da não discriminação quanto aos operadores das categorias A e C. Ora, a demandante não pertence a nenhuma dessas categorias.

58.
    Em segundo lugar, consideram que a argumentação baseada no facto de que agiram violando as obrigações internacionais assumidas pela Comunidade no quadro da OMC deve ser julgada inadmissível nos termos do artigo 48.°, n.° 2, do Regulamento de Processo. De qualquer modo, esta argumentação é irrelevante dado que o acordo OMC e os seus anexos não figuram, em princípio, entre as normas à luz das quais o Tribunal de Justiça fiscaliza a legalidade dos actos das instituições comunitárias (acórdão do Tribunal de Justiça de 23 de Novembro de 1999, Portugal/Conselho, C-149/96, Colect., p. I-8395, n.° 47).

59.
    Em terceiro lugar, o Conselho e a Comissão sustentam que não violaram de modo manifesto e grave os limites impostos ao seu amplo poder de apreciação.

60.
    Em primeiro lugar, consideram que o facto de uma medida ser - ainda que manifestamente - incompatível com o princípio da não discriminação não basta para dar origem à responsabilidade extracontratual da Comunidade. Entendem que não se pode deduzir da importância particular desse princípio entre as normas do direito comunitário que toda e qualquer violação do mesmo deva necessariamente ser qualificada de «suficientemente caracterizada» na acepção da jurisprudência.

61.
    Em segundo lugar, o Conselho e a Comissão adiantam que a demandante não tem razão ao afirmar que a violação do princípio da não discriminação atingiu um grupo restrito e claramente delimitado de operadores económicos, ou seja, os operadores das categorias A e C, uma vez que não pertence a nenhuma dessas categorias. Além disso, a Comissão contesta a natureza «restrita e claramente delimitada» desse grupo, sublinhando que, em 1996, por exemplo, 704 operadores faziam parte da categoria A e 2 981 da categoria C e que a composição destas categorias estava em constante evolução. O Conselho entende, por outro lado, que as remissões feitas pela demandante para os acórdãos DGV e o./Conselho e Comissão, já referido, Dumortier frères e o./Conselho, já referido, e Mulder e o./Conselho e Comissão, já referido, são irrelevantes para o caso concreto. Em seu entender, com efeito, nos processos que deram lugar aos dois primeiros acórdãos o número de operadores em causa era efectivamente muito restrito, o que não acontece no caso vertente. No acórdão Mulder e o./Conselho e Comissão, já referido, o Tribunal de Justiça não utilizou o critério do número de operadores para apreciar a gravidade da violação alegada.

62.
    Em terceiro lugar, o Conselho e a Comissão sustentam que o prejuízo alegado não ultrapassa os limites dos riscos económicos inerentes às actividades no sector das bananas. Observam, a propósito, que a introdução do regime dos certificados de exportação constituía uma medida destinada a permitir aos países terceiros em causa repartirem as suas quotas nacionais respectivas entre os seus próprios operadores e que esses países teriam podido, de qualquer modo, introduzir unilateralmente tal sistema. Em resposta aos elementos invocados pela demandante para contestar estas últimas afirmações (v. n.° 52 supra), o Conselho afirma que os referidos países podiam ter aplicado medidas de controlo adequadas e fixado o preço dos certificados de exportação num nível tal que «o suplemento de receitas resultantes da venda desses certificados compensa o risco hipotético da perda de exportações para outros países exportadores». O Conselho e a Comissão acrescentam que o acordo-quadro não obrigava os países terceiros partes no mesmo a criar um regime de certificados de exportação e que a Venezuela se tinha, aliás, abstido de adoptar tal medida.

63.
    Em quarto lugar, o Conselho e a Comissão sublinham que a introdução do regime dos certificados de exportação fazia parte de um «pacote» negociado com determinados países da América Latina para resolver um litígio comercial no quadro do GATT. Assinalam igualmente que a Comunidade estava obrigada a respeitar as obrigações previstas na Convenção de Lomé e, designadamente, a proibição de tratar mais desfavoravelmente que no passado um Estado fornecedor de bananas tradicionais ACP no que se refere ao acesso ao mercado comunitário e às condições de comercialização.

64.
    O Conselho e a Comissão acrescentam que a instauração da obrigação, unicamente para os operadores das categorias A e C, de obterem certificados de exportação visava compensar os benefícios que resultavam para esse operadores das outras medidas previstas no acordo-quadro, a saber, o aumento do contingente pautal global e a redução dos direitos aduaneiros. O Conselho explica que a vantagem que os operadores da categoria B retiravam destas últimas medidas era limitada uma vez que a mesma apenas consistia na possibilidade, para cada um desses operadores, de obterem aproximadamente 10% dos certificados de importação da categoria B suplementares e de importarem, ao abrigo desses certificados, bananas de países terceiros pagando menos 25 ecus que anteriormente. Reproduzindo os n.os 72 a 74 das conclusões do advogado-geral M. B. Elmer no processo Alemanha/Conselho, já referidas, afirma que o acordo-quadro, em compensação, desfavoreceu consideravelmente os operadores da categoria B. O aumento sensível do contingente pautal e a redução substancial dos direitos de importação a que as bananas dos países terceiros estavam sujeitas afectou, na realidade, negativamente o aspecto concorrencial das bananas comunitárias e das bananas tradicionais ACP. Assim, por um lado, o aumento do contingente pautal gerou um crescimento da oferta global e, em consequência, exerceu uma pressão no sentido da baixa dos preços de mercado. Esta baixa afectou principalmente as bananas comunitárias e as bananas tradicionais ACP que são, devido a um conjunto de factores, as mais caras no mercado comunitário. Por outro lado, a diminuição dos direitos aduaneiros sobre as importações de bananas de países terceiros no quadro do contingente pautal teria diminuído sensivelmente «o nivelamento dos preços». Os operadores da categoria B foram os principais afectados por esta degradação da sua capacidade concorrencial, uma vez que o seu acesso ao mercado das bananas de países terceiros estava, por força do Regulamento n.° 404/93, limitado a 30% do contingente global.

65.
    Subscrevendo a opinião expressa pelo advogado-geral M. B. Elmer no n.° 74 das suas conclusões no processo Alemanha/Conselho, já referidas, o Conselho e a Comissão concluem que a instauração do regime dos certificados de exportação assentava, assim, em considerações «perfeitamente razoáveis». Esclarecem que essas considerações traduziam interesses gerais importantes e legítimos da Comunidade e que as instituições comunitárias dispunham de um amplo poder de apreciação para ponderar esses interesses e os interesses particulares de determinados grupos de operadores económicos do sector das bananas. Reconhecem que, nos acórdãos Alemanha/Conselho e T. Port, o Tribunal de Justiça não seguiu a opinião do advogado-geral nesse processo, mas sublinham que baseou as suas conclusões na circunstância de o Conselho não lhe ter apresentado elementos de prova suficientes de modo a demonstrar que tinha sido efectivamente quebrado o equilíbrio entre os diferentes grupos de operadores. Não pode pois deduzir-se desses acórdãos que o Conselho e a Comissão tinham ignorado totalmente o princípio da não discriminação. A Comissão considera que a existência de uma divergência de opiniões entre o advogado-geral e o Tribunal nos processos que deram lugar aos acórdãos já referidos confirma que os problemas jurídicos em causa eram consideráveis e complexos e que a violação imputada às instituições não pode ser qualificada de manifesta e grave.

66.
    Quanto à condição relativa ao prejuízo, a demandante pretende que este consiste no facto de se ter visto obrigada a adquirir, na Colômbia, na Costa Rica, na Nicarágua e na Venezuela, certificados de exportação para poder importar, na Comunidade, bananas originárias desses países ao abrigo de certificados de importação da categoria A. No que se refere à avaliação do prejuízo, remete para o anexo 4 da petição, onde se indicam os montantes pagos, de 1995 a 1998, pela aquisição de certificados de exportação em cada um dos referidos países, ou seja, um montante total de 91 705 271 USD. Além disso, contesta a pertinência dos dados que constam do quadro apresentado pelo Conselho na contestação e nega ter podido repercutir o custo de aquisição dos certificados de exportação sobre o consumidor final.

67.
    O Conselho e a Comissão sustentam que a demandante não provou ter sofrido um prejuízo pelo facto da instauração do regime dos certificados de exportação. Contestam a avaliação do prejuízo consignada no anexo 4 da petição e alegam, essencialmente, que o aumento do contingente pautal e a redução dos direitos aduaneiros acordados no acordo-quadro compensaram em larga medida o ónus imposto por este regime aos operadores das categorias A e C, que a demandante facturou os custos de aquisição de parte dos certificados de exportação aos clientes do seu grupo e que, de qualquer modo, esses custos puderam ser repercutidos sobre o consumidor final.

68.
    Quanto à condição relativa ao nexo de causalidade, a demandante afirma que o prejuízo que sofreu é consequência directa da Decisão 94/800, porquanto na mesma o Conselho aprovou a conclusão do acordo-quadro, e do Regulamento n.° 478/95. Tais actos forçaram-na, atendendo à qualidade de operadores da categoria A de Comafrica e de DFFE, a adquirir certificados de exportação na Colômbia, na Costa Rica, na Nicarágua e na Venezuela para poder importar as bananas originárias desses países na Comunidade. Esclarece que, na prática, não teve outra opção que não fosse abastecer-se nos referidos países.

69.
    O Conselho e a Comissão sustentam que a demandante não faz prova da existência de um nexo de causalidade directa entre o comportamento ilegal que lhes imputa e o prejuízo alegado.

Apreciação do Tribunal

70.
    Importa lembrar, liminarmente, que quando não esteja preenchida uma das três condições de que depende a responsabilidade extracontratual da Comunidade, a acção deve ser julgada improcedente na sua integralidade, sem que seja necessário analisar as outras condições (acórdão do Tribunal de Justiça de 15 de Setembro de 1994, KYDEP/Conselho e Comissão, T-146/91, Colect., p. I-4199, n.° 81).

71.
    No caso vertente, importa examinar a acção na óptica da primeira condição, ou seja, a relativa ao comportamento ilegal. Quanto a esta condição, a jurisprudência exige que seja provada uma violação suficientemente caracterizada de uma regra de direito protegendo os particulares (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 4 de Julho de 2000, Bergaderm e Goupil/Comissão, C-352/98 P, Colect., p. I-5291, n.° 42, e acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 11 de Janeiro de 2002, Biret e Cie/Conselho, T-210/00, Colect., p. II-47, n.° 52). Quanto à exigência de que a violação deve ser suficientemente caracterizada, o critério decisivo para se considerar que a mesma se encontra satisfeita, quando, designadamente, a instituição em causa dispõe de um amplo poder de apreciação, é o da violação manifesta e grave, por essa instituição, dos limites que se impõem ao seu poder de apreciação (acórdão Mulder e o./Conselho e Comissão, já referido, n.° 12, e acórdão Bergaderm e Goupil/Comissão, já referido, n.os 40 e 43).

72.
    No caso vertente, deve considerar-se provada a existência de uma violação de uma regra de direito, uma vez que o Tribunal de Justiça declarou, no acórdão Alemanha/Conselho, a ilegalidade do artigo 1.°, n.° 1, primeiro travessão, da Decisão 94/800 porquanto na mesma o Conselho aprovou o acordo-quadro, na medida em que este último isenta os operadores da categoria B do regime dos certificados de exportação nele previstos e, no acórdão T. Port, a invalidade do artigo 3.°, n.° 2, do Regulamento n.° 478/95.

73.
    Do mesmo modo, no que respeita à exigência relativa à violação de uma regra de direito que protege os particulares, recorde-se que, nos dois acórdãos já referidos, o Tribunal de Justiça declarou que as disposições controvertidas tinham sido aprovadas com violação do princípio da não discriminação, que é um princípio geral de direito comunitário destinado à protecção dos particulares.

74.
    A argumentação da demandante de que o Conselho e a Comissão agiram com violação das obrigações internacionais assumidas pela Comunidade no quadro da OMC foi adiantada pela primeira vez na réplica e deve, assim, ser considerada um fundamento novo e, por conseguinte, julgada inadmissível nos termos do artigo 48.°, n.° 2, do Regulamento de Processo. De qualquer modo, esta argumentação é irrelevante. Resulta, com efeito, de jurisprudência bem assente que o acordo OMC e seus anexos não são susceptíveis de criar direitos a favor dos particulares que estes possam invocar nos órgãos jurisdicionais e que a sua eventual violação não é, portanto, susceptível de desencadear a responsabilidade extracontratual da Comunidade (acórdão Biret e Cie/Conselho, já referido, n.° 71, e jurisprudência aí citada).

75.
    Falta portanto examinar se, perante o amplo poder de apreciação de que dispõem as instituições no caso concreto atenta a dimensão internacional e as apreciações económicas complexas subjacentes à instauração ou à modificação do regime comunitário de importação de bananas, ao adoptar as disposições controvertidas, o Conselho e a Comissão violaram de modo manifesto e grave os limites do seu poder de apreciação.

76.
    A este propósito, recorde-se, antes de mais, que o regime dos certificados de exportação constituía uma das quatro vertentes do acordo-quadro, sendo as três restantes um aumento de 200 000 toneladas do contingente pautal global de base, uma redução de 25 ecus por tonelada do direito aduaneiro contingentário e a atribuição de quotas nacionais específicas aos países terceiros que eram partes contratantes no acordo-quadro. Este acordo tinha por objectivo resolver um diferendo entre determinados Estados terceiros e a Comunidade susceptível de afectar a globalidade do regime de importação de bananas na Comunidade instituído pelo Regulamento n.° 404/93. Constituía o resultado de uma negociação internacional complexa e delicada, no quadro da qual a Comunidade teve de conciliar interesses divergentes. Esta, com efeito, teve não só que atender aos interesses dos produtores comunitários, mas também às suas obrigações para com os Estados ACP nos termos da Convenção de Lomé e das suas obrigações internacionais resultantes do GATT.

77.
    Há que recordar, em seguida, que a isenção dos operadores da categoria B do regime dos certificados de exportação se deveu principalmente à necessidade de restaurar entre estes operadores e os das categorias A e C o equilíbrio concorrencial que o Regulamento n.° 404/93 se propunha alcançar (v. n.° 64 supra). Embora tal justificação, nos acórdãos Alemanha/Conselho e T. Port, tivesse sido considerada insuficientemente demonstrada pelo Tribunal de Justiça, a mesma não pode contudo ser qualificada de manifestamente desrazoável. A este respeito, sublinhe-se que a questão de saber em que medida o aumento de 200 000 toneladas do contingente pautal global e a redução de 25 ecus por tonelada do direito aduaneiro contingentário afectam os dados concorrenciais no mercado das bananas e, mais exactamente, o equilíbrio prosseguido pelo Regulamento n.° 404/93 implica uma apreciação económica particularmente complexa. O mesmo acontece no que se refere ao carácter adequado e necessário das medidas a adoptar para restabelecer este equilíbrio, constituindo o mesmo um objectivo cuja legitimidade não pode, em qualquer hipótese, ser contestada. O facto de, nos processos que deram lugar aos acórdãos já referidos, o advogado-geral M. B. Elmer e o Tribunal de Justiça terem chegado a conclusões diametralmente opostas quanto à justificação adiantada ilustra aliás até que ponto não era manifesto o carácter incorrecto da apreciação feita pelo Conselho e pela Comissão no caso em apreço.

78.
    Além disso, contrariamente ao que a demandante alegou na audiência, nada demonstra que a medida controvertida foi adoptada com a intenção de fazer recair um ónus indevido sobre os operadores das categorias A e C.

79.
    Por último, há que declarar que esta medida atingiu categorias muito amplas de operadores económicos, a saber, os operadores das categorias A e C (v., por analogia, acórdão do Tribunal de Justiça de 25 de Maio de 1978, HNL/Conselho e Comissão, 83/76, 94/76, 4/77, 15/77 e 40/77, Recueil, p. 1209, n.° 7; Colect., p. 421). Assim, é pacífico entre as partes que, em 1996 por exemplo, existiam 704 operadores da categoria A e 2 981 da categoria C.

80.
    Por outro lado, não se pode considerar que o prejuízo alegado, a existir, ultrapassa os limites dos riscos económicos inerentes às actividades no sector das bananas (v., neste sentido, acórdão HNL/Conselho e Comissão, já referido, n.° 7). Com efeito, embora o Tribunal de Justiça tenha assinalado, no n.° 61 do acórdão Alemanha/Conselho e no n.° 80 do acórdão T. Port, que a sujeição ao regime dos certificados de exportação implicava, para os operadores das categorias A e C, um aumento do preço de aquisição das bananas originárias dos países terceiros em causa da ordem de 33% em relação ao preço pago pelos da categoria B, é de concluir, contudo, que a demandante reconheceu expressamente na audiência que tinha podido «absorver» os custos de aquisição dos certificados de exportação e «continuar a obter um determinado lucro».

81.
    Resulta do exposto que o princípio da não discriminação não foi aqui violado de modo suficientemente caracterizado.

82.
    Não tendo a demandante conseguido demonstrar a violação manifesta e grave do poder de apreciação de que dispunham as instituições demandadas no caso vertente, a acção deve ser julgada improcedente, sem haver necessidade de examinar as outras condições de que depende a responsabilidade extracontratual da Comunidade, nem decidir do pedido de pagamento de juros.

83.
    A título subsidiário, há contudo que assinalar que a diligência feita no caso concreto pela demandante para tentar demonstrar a existência e a extensão do prejuízo alegado não pode ser aceite.

84.
    Resulta dos articulados da demandante e das declarações por ela feitas na audiência que baseia o seu pedido unicamente na circunstância de ter ficado sujeita a custos pela aquisição de certificados de exportação e que equipara o seu prejuízo a esses custos. Assim, no anexo 4 da petição, limitou-se a indicar, para cada um dos quatro Estados latino-americanos em causa e para os anos de 1995 a 1998, os montantes que pretensamente pagou pela aquisição desses certificados.

85.
    Ora, admitindo que tais montantes sejam correctos, é impossível que a totalidade ou parte dos custos correspondentes não tenham, no fim de contas, sido suportados pelos outros operadores económicos além da demandante o que excluiria o seu prejuízo. Assim, no caso vertente, a demandante teve precisamente que admitir, na sequência de observações feitas pela Comissão face às facturas anexas à réplica e na sequência das questões colocadas pelo Tribunal (v. n.° 31 supra), que tinha revendido parte dos certificados de exportação em causa a clientes da Comafrica e da DFFE na Comunidade. Na audiência, reduziu assim o seu pedido de 91 705 271 USD para 26 773 547 USD.

86.
    Além disso, o simples facto, se verdadeiro, de a demandante ter suportado determinados custos de aquisição de certificados de exportação que não teria seguidamente repercutido sobre os clientes do seu grupo, não implica necessariamente que tenha sofrido uma perda correspondente. Importa, designadamente, ter em conta os efeitos no mercado das outras medidas que constam do acordo-quadro, e, mais exactamente, do aumento de 200 000 toneladas do contingente pautal e da redução de 25 ecus por tonelada do direito aduaneiro contingentário, bem como da possibilidade de os operadores em causa repercutirem parte dos custos de aquisição sobre os próprios preços de venda.

87.
    Daqui resulta que não foi demonstrada a existência da segunda condição de que depende a responsabilidade extracontratual da Comunidade (v. n.° 44 supra).

Quanto às despesas

88.
    Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a demandante sido vencida, há que condená-la nas despesas, em conformidade com o pedido feito nesse sentido pelo Conselho e pela Comissão.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quinta Secção)

decide:

1.
    A acção é julgada improcedente.

2.
    A demandante suportará as suas próprias despesas e as despesas feitas pelo Conselho e pela Comissão.

Cooke
García-Valdecasas
Lindh

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 6 de Março de 2003.

O secretário

O presidente

H. Jung

J. D. Cooke


1: Língua do processo: inglês.