Language of document : ECLI:EU:C:2015:233

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

MACIEJ SZPUNAR

apresentadas em 16 de abril de 2015 (1)

Processo C‑4/14

Christophe Bohez

contra

Ingrid Wiertz

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Korkein oikeus (Finlândia)]

«Cooperação judiciária em matéria civil — Regulamento (CE) n.° 44/2001 — Competência judiciária e execução de decisões em matéria civil e comercial — Matérias excluídas — Direito da família — Regulamento (CE) n.° 2201/2003 — Competência, reconhecimento e execução de decisões em matéria de responsabilidade parental — Decisão relativa ao direito de visita acompanhada de uma sanção pecuniária compulsória — Execução da sanção pecuniária compulsória»





I –    Introdução

1.        O Korkein oikeus (Supremo Tribunal da Finlândia) interroga o Tribunal de Justiça, por um lado, sobre a aplicação do Regulamento (CE) n.° 44/2001 (2) à execução, num Estado‑Membro, de uma decisão judicial proferida noutro Estado‑Membro, quando essa decisão impõe uma sanção pecuniária compulsória para fazer respeitar um direito de visita e, por outro, sobre as condições de execução dessa sanção pecuniária compulsória.

2.        Analisado numa perspetiva global, este processo evidencia a dificuldade em definir o regime aplicável a uma sanção pecuniária compulsória no quadro do sistema de reconhecimento e de execução das decisões judiciais na União Europeia. Essa dificuldade tem tendência a aumentar na situação específica em que o direito garantido pela sanção pecuniária compulsória é um direito de visita parental. Foi neste contexto que o Tribunal de Justiça foi chamado a pronunciar‑se sobre as questões prejudiciais apresentadas pelo órgão jurisdicional de reenvio.

II – Quadro jurídico

A –    Direito da União

1.      Regulamento n.° 44/2001

3.        O artigo 1.°, n.os 1 e 2, alínea a), do Regulamento n.° 44/2001, relativo ao seu âmbito de aplicação, dispõe:

«1.      O presente regulamento aplica‑se em matéria civil e comercial e independentemente da natureza da jurisdição. O presente regulamento não abrange, nomeadamente, as matérias fiscais, aduaneiras e administrativas.

2.      São excluídos da sua aplicação:

a)       O estado e a capacidade das pessoas singulares, os regimes matrimoniais, os testamentos e as sucessões.»

4.        Os artigos 45.°, n.° 2, e 49.° do Regulamento n.° 44/2001 fazem parte do capítulo III intitulado «Reconhecimento e execução».

5.        O artigo 45.°, n.° 2, deste regulamento prevê:

«2.      As decisões estrangeiras não podem, em caso algum, ser objeto de revisão de mérito.»

6.        O artigo 49.° do referido regulamento está redigido nos seguintes termos:

«As decisões estrangeiras que condenem em sanções pecuniárias compulsórias só são executórias no Estado‑Membro requerido se o respetivo montante tiver sido definitivamente fixado pelos tribunais do Estado‑Membro de origem.»

2.      Regulamento (CE) n.° 2201/2003

7.        O artigo 1.° do Regulamento n.° 2201/2003 (3) define o âmbito de aplicação deste regulamento, nos seguintes termos:

«1.      O presente regulamento é aplicável, independentemente da natureza do tribunal, às matérias civis relativas:

[…]

b)       À atribuição, ao exercício, à delegação, à limitação ou à cessação da responsabilidade parental.

2.      As matérias referidas na alínea b) do n.° 1 dizem, nomeadamente, respeito:

a)       Ao direito de guarda e ao direito de visita;

[…]»

8.        O artigo 26.° deste regulamento enuncia:

«A decisão não pode em caso algum ser revista quanto ao mérito.»

9.        Quanto à força executória das decisões relativas ao direito de visita, o artigo 28.°, n.° 1, do Regulamento n.° 2201/2003 dispõe:

«As decisões proferidas num Estado‑Membro sobre o exercício da responsabilidade parental relativa a uma criança, que aí tenham força executória e que tenham sido citadas ou notificadas, são executadas noutro Estado‑Membro depois de nele terem sido declaradas executórias a pedido de qualquer parte interessada.»

10.      Determinadas decisões relativas ao direito de visita podem beneficiar de um regime específico. O artigo 41.°, n.° 1, primeiro parágrafo, daquele regulamento prevê:

«O direito de visita […], concedido por uma decisão executória proferida num Estado‑Membro, é reconhecido e goza de força executória noutro Estado‑Membro sem necessidade de qualquer declaração que lhe reconheça essa força e sem que seja possível contestar o seu reconhecimento, se essa decisão tiver sido homologada no Estado‑Membro de origem nos termos do n.° 2.»

11.      O artigo 47.° do mesmo regulamento esclarece:

«1.      O processo de execução é regulado pela lei do Estado‑Membro de execução.

2.      Qualquer decisão proferida pelo tribunal de outro Estado‑Membro, e declarada executória nos termos da secção 2 ou homologada nos termos do n.° 1 do artigo 41.° […], é executada no Estado‑Membro de execução como se nele tivesse sido emitida.

[…]»

B –    Direito belga

12.      A sanção pecuniária compulsória é regulada pelos artigos 1385 bis a 1385 nonies do code judiciaire (a seguir «code judiciaire»).

13.      O artigo 1385 bis do code judiciaire dispõe:

«O juiz pode, a pedido de uma parte, condenar a outra parte no pagamento de uma quantia em dinheiro, denominada sanção pecuniária compulsória, no caso de não ser dado cumprimento à obrigação principal, sem prejuízo de eventual indemnização a que haja lugar. […]»

14.      O artigo 1385 ter deste código tem a seguinte redação:

«O juiz pode fixar a sanção pecuniária compulsória quer numa quantia única, quer numa quantia por unidade de tempo ou por contravenção. Nos dois últimos casos, o juiz pode também determinar um montante além do qual a condenação na sanção pecuniária compulsória deixa de produzir efeitos.»

15.      O artigo 1385 quater do referido código prevê:

«Uma vez aplicada, a sanção pecuniária compulsória é devida integralmente à parte que a requereu. Esta parte pode requerer judicialmente a sua cobrança nos termos da própria decisão que a prevê. […]»

16.      O artigo 1385 quinquies do mesmo código está redigido nos termos seguintes:

«O juiz que aplicou a sanção pecuniária compulsória pode, a pedido da parte condenada, decidir anulá‑la, suspender a sua aplicação durante o prazo que fixar ou reduzi‑la, se essa parte estiver impossibilitada, definitiva ou temporariamente, de cumprir, total ou parcialmente, a obrigação principal. O juiz não pode anular nem reduzir a sanção pecuniária compulsória se o seu vencimento tiver ocorrido antes de o seu cumprimento se ter tornado impossível.»

17.      Uma vez que o título executivo que permite a cobrança da sanção pecuniária compulsória é constituído pela decisão judicial que a decreta (artigo 1385 quater do code judiciaire), o beneficiário não pode obter a liquidação da sanção pecuniária compulsória, previamente à execução.

18.      O devedor que conteste deve fazer prova dos alegados incumprimentos. Compete, então, ao juiz de execução verificar se as condições da sanção pecuniária compulsória estão preenchidas.

C –    Direito finlandês

19.      Em direito finlandês, a sanção pecuniária compulsória, aplicada para garantir o respeito de um direito de visita, é regulada pela Lei relativa à execução de decisões sobre a guarda efetiva e o direito de visita (lapsen huoltoa ja tapaamisoikeutta koskevan päätöksen täytäntöönpanosta annettu laki, a seguir «TpL») e pela Lei relativa à sanção pecuniária compulsória (uhkasakkolaki, a seguir «Lei relativa à sanção pecuniária compulsória»), na medida em que esta seja aplicável.

20.      Nos termos do artigo 16.°, n.° 2, da TpL, depois de proferida a decisão relativa ao direito de visita, o tribunal a que é submetida a ação de execução deste direito pode obrigar o executado a dar cumprimento à decisão, sob pena de sanção pecuniária compulsória.

21.      Em princípio, a sanção pecuniária compulsória é fixada numa quantia única. No entanto, se, por uma razão específica, se justificar, o seu montante também pode ser cumulativo (artigo 18.°, n.os 1 e 2, da TpL).

22.      A sanção pecuniária compulsória deve ser sempre paga ao Estado e não à parte contrária.

23.      Na sequência de um novo processo, o tribunal pode ordenar o pagamento da sanção pecuniária compulsória fixada se concluir que esse pedido é justificado. Não pode ser ordenado o pagamento da sanção pecuniária compulsória se a parte obrigada demonstrar que teve uma razão válida para não dar cumprimento à obrigação ou se a obrigação foi cumprida entretanto (artigo 19.°, n.os 1 e 2, da TpL).

24.      O juiz pode reduzir o montante da sanção pecuniária compulsória devida, em relação ao que foi fixado inicialmente, se uma parte substancial da obrigação principal tiver sido cumprida ou se a capacidade de pagamento do obrigado se tiver degradado de maneira significativa ou se houver outro motivo válido para a redução do seu montante (artigo 11.° da Lei relativa à sanção pecuniária compulsória).

25.      O artigo 12.°, n.° 2, da Lei relativa à sanção pecuniária compulsória permite que a autoridade que decretou a sanção pecuniária compulsória revogue essa decisão e proceda a um novo exame do processo, no todo ou em parte, no caso de alteração das circunstâncias, de apresentação de elementos materiais novos ou ainda quando a decisão se baseie numa aplicação manifestamente errada da lei.

III – Factos do litígio no processo principal, questões prejudiciais e tramitação do processo no Tribunal de Justiça

26.      Resulta da decisão de reenvio que Christophe Alfons Adrien Bohez e Ingrid Wiertz casaram na Bélgica, em 16 de maio de 1997 e tiveram dois filhos. O casal divorciou‑se em 2005 e I. Wiertz mudou a residência para a Finlândia.

27.      Em 28 de março de 2007, o Tribunal de primeira instância de Gante (Bélgica) proferiu uma decisão relativa à guarda, à residência, ao direito de visita e à pensão de alimentos dos filhos (a seguir «decisão de 28 de março de 2007»). O Tribunal fez acompanhar a sua decisão de uma sanção pecuniária compulsória para garantir o respeito do direito de visita de C. Bohez. Nos termos desta sanção, devia ser paga a C. Bohez uma quantia de 1 000 euros por filho e por cada dia de não entrega do filho. O montante máximo da sanção pecuniária compulsória foi fixado em 25 000 euros.

28.      C. Bohez pediu nos órgãos jurisdicionais finlandeses a condenação de I. Wiertz no pagamento da sanção pecuniária compulsória decretada pela decisão de 28 de março de 2007, a saber 23 398,69 euros, emergentes das visitas que não tiveram lugar ou a declaração de exequibilidade daquela decisão na Finlândia. Em apoio do seu pedido, alegou no Itä‑Uudenmaan käräjäoikeus (tribunal de primeira instância de Itä Uusimaa) que não foram feitas inúmeras visitas, de tal forma que o montante máximo da sanção pecuniária compulsória fixada naquela decisão já tinha sido atingido. Com base no facto de que, no direito belga, a cobrança da sanção pecuniária compulsória é efetuada diretamente pelas autoridades de execução, sem que seja necessário um novo processo judicial, C. Bohez entendia que se devia considerar o seu pedido destinado à cobrança de um crédito pecuniário exigível e, nesses termos, abrangido pelo âmbito de aplicação do Regulamento n.° 44/2001.

29.      Pelo seu lado, I. Wiertz objetou que a obrigação de pagamento não tinha sido confirmada definitivamente pelo órgão jurisdicional belga e que, em consequência, a decisão não era executória. Nenhuma autoridade tinha demonstrado a existência de incumprimentos suscetíveis de desencadear a obrigação de pagar a sanção pecuniária compulsória. I. Wiertz também alegou que não tinha levantado nenhum obstáculo às visitas previstas na decisão de 28 de março de 2007.

30.      Por decisão de 8 de março de 2012, o Itä‑Uudenmaan käräjäoikeus concluiu que o pedido não respeitava à execução de uma decisão relativa ao direito de visita, mas apenas à execução de uma sanção pecuniária compulsória imposta para garantir o cumprimento da decisão de 28 de março de 2007. Daí deduziu que, na medida em que respeitava à execução de uma decisão que impunha uma obrigação pecuniária, esse pedido enquadrava‑se no âmbito de aplicação do Regulamento n.° 44/2001. Todavia, realçando que a decisão de 28 de março de 2007 previa apenas, contrariamente aos requisitos do artigo 49.° do Regulamento n.° 44/2001, uma sanção pecuniária compulsória periódica cujo montante definitivo não tinha sido fixado, o Itä‑Uudenmaan käräjäoikeus declarou o pedido de C. Bohez inadmissível.

31.      O Helsingin hovioikeus (Tribunal de recurso de Helsínquia), por decisão de 16 de agosto de 2012, confirmou a inadmissibilidade do pedido de C. Bohez. Todavia, na sua fundamentação, desenvolveu uma análise diferente da do tribunal de primeira instância. Tendo considerado que o pedido se inseria no quadro da execução de uma decisão relativa ao direito de visita, declarou que, atendendo ao artigo 1.°, n.° 2, alínea a), do Regulamento n.° 44/2001, o mesmo não era abrangido pelo âmbito de aplicação deste regulamento, mas no do Regulamento n.° 2201/2003. Por conseguinte, em conformidade com o artigo 47.°, n.° 1, do Regulamento n.° 2201/2003, o processo de execução era, neste caso, regulado pelo direito finlandês, isto é, pela TpL.

32.      C. Bohez recorreu para o Korkein oikeus, pedindo a anulação da decisão do Helsingin hovioikeus e reiterando os seus pedidos apresentados em primeira instância.

33.      Foi nestas condições que o Korkein oikeus, por decisão de 31 de dezembro de 2013, que deu entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça, em 6 de janeiro de 2014, decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      Deve o artigo 1.°, n.° 2, do Regulamento [n.° 44/2001] ser interpretado no sentido de que os processos relativos à execução de uma sanção pecuniária compulsória aplicada para garantir o cumprimento da obrigação principal imposta numa decisão relativa ao direito de guarda ou ao direito de visita não são abrangidos pelo âmbito de aplicação do referido regulamento?

2)      Caso os processos referidos na questão anterior sejam abrangidos pelo âmbito de aplicação do Regulamento [n.° 44/2001], deve o artigo 49.° deste regulamento ser então interpretado no sentido de que uma sanção pecuniária compulsória diária que, no Estado de origem, é, enquanto tal, diretamente executória até ao limite do fixado, mas cujo montante definitivo é suscetível de ser alterado a pedido ou perante elementos expostos pela parte condenada na sanção pecuniária, só é executória noutro Estado‑Membro a partir do momento em que o seu montante tiver sido especificamente fixado de maneira definitiva no Estado de origem?

3)      Caso os processos referidos na questão anterior não sejam abrangidos pelo âmbito de aplicação do Regulamento [n.° 44/2001], deve o artigo 47.°, n.° 1, do Regulamento [n.° 2201/2003] ser interpretado no sentido de que as medidas destinadas a fazer respeitar as decisões em matéria de direito de guarda e de direito de visita são abrangidas pelo processo de execução referido nesta disposição, isto é, um processo de execução determinado pelo direito do Estado‑Membro de execução, ou pode considerar‑se que tais medidas fazem parte integrante da decisão relativa ao direito de guarda e de visita que, em aplicação do Regulamento [n.° 2201/2003], é executória nesse outro Estado‑Membro?

4)      Quando a execução da sanção pecuniária compulsória é requerida noutro Estado‑Membro, deve exigir‑se que o montante da referida sanção tenha sido fixado de maneira definitiva no Estado‑Membro de origem, mesmo na hipótese de o Regulamento [n.° 44/2001] não ser aplicável no quadro dessa execução?

5)      Se uma sanção pecuniária compulsória aplicada para garantir o cumprimento do direito de visita for executória noutro Estado‑Membro sem que o montante da sanção a cobrar tenha sido especificamente fixado de maneira definitiva no Estado‑Membro de origem:

a)      a execução da sanção pecuniária obriga todavia a que se examine se o respeito do direito de visita foi impedido por motivos cuja tomada em consideração era indispensável para garantir os direitos da criança, e

b)      qual o órgão jurisdicional competente nesse caso para apurar se tais circunstâncias se verificam, mais concretamente

(i)      a competência da jurisdição de execução está ainda assim exclusivamente limitada a examinar se a pretensa anulação das visitas foi motivada por uma razão expressamente prevista na decisão de mérito; ou

(ii)      os direitos da criança garantidos pela Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia implicam que o órgão jurisdicional do Estado‑Membro de execução tem um direito ou uma obrigação mais amplos de examinar se o respeito do direito de visita foi impedido por motivos cuja tomada em consideração era indispensável para garantir os direitos da criança?»

34.      As partes no processo principal, os Governos finlandês, espanhol e lituano e a Comissão Europeia apresentaram observações escritas.

35.      C. Bohez, o Governo finlandês e a Comissão também apresentaram alegações orais na audiência realizada em 8 de janeiro de 2015.

IV – Análise

36.      O pedido de decisão prejudicial do Korkein oikeus suscita, no essencial, dois problemas relacionados com a execução, num Estado‑Membro, de uma decisão judicial proferida noutro Estado‑Membro, quando, para garantir a execução do direito de visita, conforme estabelecido pelo juiz de origem, essa decisão aplica uma sanção pecuniária compulsória, cujo montante é fixado de forma cumulativa (4). O primeiro problema diz respeito ao regulamento aplicável a essa sanção pecuniária compulsória, e o segundo às condições da sua execução.

37.      Neste contexto, parece‑me necessário analisar, previamente, a questão, sempre delicada, da qualificação da sanção pecuniária compulsória no direito finlandês e no direito belga para definir, no caso em apreço, o regime aplicável a uma medida deste tipo no quadro do sistema de reconhecimento e de execução das decisões judicias na União.

A –    Observações preliminares relativas à natureza jurídica da sanção pecuniária compulsória

38.      Antes de mais, quero recordar que o órgão jurisdicional de reenvio tem competência exclusiva para verificar e apreciar os factos do litígio que lhe foi submetido, assim como para interpretar e aplicar o direito nacional (5).

39.      Nestas circunstâncias, importa observar, em primeiro lugar, que a sanção pecuniária compulsória é um sistema conhecido em diversos Estados‑Membros (6), incluindo a sanção pecuniária compulsória que garante o direito de visita (7). Uma comparação dos direitos nacionais que regulam a sanção pecuniária compulsória revela numerosos pontos de convergência, mas também grandes disparidades (8). É o caso, designadamente, dos direitos finlandês e belga, em causa no litígio do processo principal (9).

40.      Em segundo lugar, relativamente aos pontos de convergência entre estes dois direitos nacionais, resulta da decisão de reenvio que a sanção pecuniária compulsória tem um caráter acessório em relação à obrigação principal, que deve ser autorizada por um juiz (10) e que exerce uma pressão financeira sobre o devedor para que cumpra a decisão judicial a que está obrigado. Com efeito, em direito finlandês e em direito belga (11) a sanção pecuniária compulsória tem um caráter coercivo e é devida apenas pelo facto do incumprimento da decisão judiciária. Por conseguinte, é este caráter coercivo que a aproxima de uma medida de execução (12).

41.      Em terceiro lugar, quanto aos pontos de divergência, resulta da decisão de reenvio que as disparidades entre as legislações finlandesa e belga dizem, sobretudo, respeito, por um lado, ao processo que conduz à decisão e à execução de uma sanção pecuniária compulsória e, por outro, à determinação do beneficiário das quantias em dinheiro devidas por força da mesma (13).

42.      Em primeiro lugar, no que respeita ao processo que conduz à decisão e à execução de uma sanção pecuniária compulsória, as diferenças respeitam essencialmente à exigência e às modalidades de liquidação. Com efeito, resulta da decisão de reenvio que, em direito belga, o mecanismo da sanção pecuniária compulsória, igualmente aplicável em matéria de direito de visita, exclui qualquer processo de liquidação (14). Por outras palavras, o beneficiário não deve obter, previamente à execução, a liquidação judicial da sanção pecuniária compulsória (15). Com efeito, nos termos do artigo 1385 quater do code judiciaire, a sanção pecuniária compulsória é definitiva e a sua exigibilidade tem como fundamento a decisão judicial que a decretou. Por força dessa decisão, quando, após a sua citação, estiverem preenchidas as condições que estabelece, a sanção pecuniária compulsória é devida na íntegra e pode ser cobrada sem necessidade de uma nova decisão judicial (16), inclusive nos casos em que o seu montante deva ser determinado por unidade de tempo, por exemplo, por dia, ou por infração (17). Por força do artigo 1385 quinquies do code judiciaire, a revisão da sanção pecuniária compulsória é regulada pelo princípio segundo o qual esta só pode ser revogada, alterada ou reduzida pelo juiz que conhece do mérito que a decretou e o montante fixado na decisão que aplicou a sanção pecuniária compulsória não pode ser reduzido retroativamente (18).

43.      Em contrapartida, em direito finlandês, de acordo com as afirmações do órgão jurisdicional de reenvio e do Governo finlandês, a sanção pecuniária compulsória prevista no artigo 16.° da TpL tem por objetivo incentivar a organização de encontros entre a criança e o demandante em conformidade com a decisão relativa ao direito de visita. A decisão que ordena o pagamento da sanção pecuniária compulsória ocorre depois de a decisão principal ter sido proferida e pressupõe que o demandante intente um novo processo (19). Com efeito, só em caso de contestação da sanção pecuniária compulsória pelo devedor é que o juiz de execução verifica a existência de um incumprimento total ou parcial deste último da sua obrigação principal (20) e de eventuais causas justificativas. Nos termos do artigo 19.°, n.° 2, da TpL, o pagamento da sanção pecuniária compulsória não pode ser ordenado se o devedor demonstrar a existência de uma razão válida que o impeça de cumprir a obrigação ou quando a obrigação tenha sido cumprida entretanto (21). Contrariamente ao direito belga, o direito finlandês permite que o juiz reexamine o montante da sanção pecuniária compulsória e o reduza se uma parte substancial da obrigação principal tiver sido cumprida, se a capacidade de pagamento da pessoa obrigada se tiver degradado de maneira significativa ou se houver outro motivo válido para reduzir o montante da sanção pecuniária compulsória (22).

44.      Em segundo lugar, no que respeita à determinação do beneficiário da quantia devida a título da sanção pecuniária compulsória, resulta da decisão de reenvio que, no direito belga, essa quantia reverte a favor do credor em conformidade com o artigo 1385 quater do code judiciaire (23), ao passo que, no direito finlandês, reverte para o Estado (24).

45.      Passo agora à análise dos dois problemas suscitados pelo presente pedido de decisão prejudicial e mencionados no n.° 36 das presentes conclusões: qual é o regulamento aplicável ao litígio no processo principal e quais são as condições de execução da sanção pecuniária compulsória?

B –    Quanto à aplicabilidade do Regulamento n.° 44/2001

46.      Em relação à primeira questão prejudicial, com a qual se pretende saber se uma decisão judicial proferida na Bélgica e acompanhada de uma sanção pecuniária compulsória, como a que está em causa no processo principal, para fazer respeitar a execução de um direito de visita, pode ser executada na Finlândia com base no Regulamento n.° 44/2001, I. Wiertz, todos os governos dos Estados‑Membros intervenientes e a Comissão defendem a inaplicabilidade deste regulamento.

47.      Resulta da decisão de reenvio que, em relação ao regulamento aplicável, as dúvidas expressas pelo Korkein oikeus assentam no facto de a obrigação cuja execução é pedida, a saber, o pagamento de uma sanção pecuniária compulsória, ser um crédito pecuniário respeitante ao direito de visita. Embora aquele órgão jurisdicional considere que uma sanção pecuniária compulsória deste tipo não entra, em princípio, no âmbito de aplicação do Regulamento n.° 44/2001, levanta, todavia, dúvidas no que respeita à sua execução no âmbito do Regulamento n.° 2201/2003.

48.      Para responder a esta primeira questão prejudicial, parece‑me necessário verificar se, no âmbito da interpretação do artigo 1.° do Regulamento n.° 44/2001, uma sanção pecuniária compulsória, como a que está em causa no processo principal, está em conformidade com os critérios identificados pela jurisprudência do Tribunal de Justiça.

49.      A este respeito, importa recordar, antes de mais, que, na medida em que a Convenção de Bruxelas foi substituída pelo Regulamento n.° 44/2001 (25) nas relações entre os Estados‑Membros (26), a interpretação que o Tribunal de Justiça fez da Convenção de Bruxelas continua válida para as disposições correspondentes deste regulamento (27). Além disso, decorre do considerando 19 do Regulamento n.° 44/2001 que deve ser assegurada a continuidade na interpretação entre a Convenção de Bruxelas e este regulamento.

50.      O Tribunal de Justiça declarou no acórdão Realchemie Nederland (28) que o âmbito de aplicação do Regulamento n.° 44/2001 é, como o da Convenção de Bruxelas, limitado ao conceito de «matéria civil e comercial», conforme estabelecido no seu artigo 1.°, n.° 1 (29). Assim, nos termos do n.° 2, alínea a), do mesmo artigo, os regimes matrimoniais estão excluídos do seu âmbito de aplicação. A este respeito, os Governos finlandês, espanhol e lituano e a Comissão salientam que foi precisamente para colmatar em parte essa lacuna que foi adotado o Regulamento n.° 2201/2003 que é aplicável às decisões proferidas em matéria de responsabilidade parental (30), o qual, nos termos do seu artigo 1.°, n.° 2, alínea a), integra o direito de visita (31).

51.      Quanto à questão de saber se um litígio se enquadra ou não no âmbito de aplicação do Regulamento n.° 44/2001, o Tribunal de Justiça considerou que esse âmbito de aplicação deve ser determinado essencialmente mercê de elementos que caracterizam a natureza das relações jurídicas entre as partes no litígio ou o objeto do mesmo (32). No que mais particularmente diz respeito às medidas cautelares, o Tribunal de Justiça considera que a sua inclusão no âmbito de aplicação do Regulamento n.° 44/2001 é determinada não pela sua própria natureza, mas pela natureza dos direitos para cuja salvaguarda foram decretadas (33).

52.      No caso em apreço, segundo o artigo 1385 bis do code judiciaire, a sanção pecuniária compulsória em causa no litígio do processo principal reveste, conforme expliquei no n.° 40 das presentes conclusões, um caráter acessório em relação à obrigação principal. Neste caso, a obrigação principal impõe a I. Wiertz que permita que C. Bohez exerça o direito de visita que lhe foi concedido.

53.      No âmbito da execução de uma decisão de um órgão jurisdicional, que inclui uma condenação no pagamento de uma coima para fazer respeitar uma decisão judicial proferida em matéria civil e comercial, o Tribunal de Justiça esclareceu que a natureza desse direito de execução depende da do direito subjetivo por força de cuja violação a execução foi ordenada (34), ou seja, neste caso, o direito de visita de C. Bohez.

54.      Daqui decorre, na minha opinião, que a cobrança de uma sanção pecuniária compulsória, como a que está em causa no processo principal, não se enquadra no âmbito de aplicação do Regulamento n.° 44/2001. Com efeito, por um lado, essa sanção pecuniária compulsória tem um caráter acessório e está estreitamente ligada ao direito de visita cujo cumprimento garante e, por outro, as questões relativas ao direito de visita estão excluídas do Regulamento n.° 44/2001.

55.      Por conseguinte, proponho ao Tribunal de Justiça que responda à primeira questão prejudicial no sentido de que uma decisão judicial proferida num Estado‑Membro e acompanhada de uma sanção pecuniária compulsória para fazer respeitar o cumprimento de um direito de visita, não é suscetível de execução noutro Estado‑Membro com fundamento no Regulamento n.° 44/2001.

56.      Atendendo à resposta que proponho que seja dada à primeira questão prejudicial, não é necessário responder à segunda questão.

C –    Quanto às condições de execução da sanção pecuniária compulsória no âmbito do Regulamento n.° 2201/2003

57.      Com a sua terceira questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, ao Tribunal de Justiça se a sanção pecuniária compulsória, enquanto garantia do cumprimento de uma decisão judicial sobre o direito de visita, deve ser considerada uma medida de execução e a este título, se se inscreve no âmbito do processo de execução do direito de visita, o qual, nos termos do artigo 47.°, n.° 1, do Regulamento n.° 2201/2003, é regulado pelo direito nacional, ou se a sanção pecuniária compulsória faz parte integrante da decisão relativa ao direito de visita e, a esse título, é diretamente exequível com fundamento no Regulamento n.° 2201/2003.

58.      Para responder a esta questão, analisarei, em primeiro lugar, a natureza jurídica da sanção pecuniária compulsória à luz do sistema de reconhecimento e de execução das decisões judiciais na União. Em segundo lugar, examinarei se uma sanção pecuniária compulsória, como a que está em causa no processo principal, faz parte integrante da decisão relativa ao direito de visita ou se, pelo contrário, pode ser isolada enquanto obrigação autónoma.

1.      Quanto à natureza jurídica da sanção pecuniária compulsória à luz do sistema de reconhecimento e de execução das decisões judiciais na União

59.      De uma maneira geral, como referido no n.° 39 das presentes conclusões, a sanção pecuniária compulsória é um instrumento aplicado em diversos Estados‑Membros. Tem por objetivo assegurar o cumprimento de uma obrigação que, no presente processo principal, consiste no respeito do direito de visita. Por conseguinte, tem um caráter acessório e assenta na premissa de que a perspetiva de pagar uma quantia importante deve incentivar o devedor a cumprir voluntariamente a sua obrigação. Com efeito, como já referi, este aspeto da sanção pecuniária compulsória aproxima‑a de uma medida de execução.

60.      As diferentes fases da execução da sanção pecuniária compulsória revelam claramente a sua complexidade e permitem compreender melhor a sua natureza. Com efeito, cada uma dessas fases, a saber, a pronúncia da condenação principal que aplica a sanção pecuniária compulsória, a liquidação da quantia efetivamente calculada e a sua execução, voluntária ou força, pode ser sujeita a regras e a procedimentos distintos (35). Ora, a complexidade da sanção pecuniária compulsória acentua‑se tanto mais quanto a medida deva ser adotada num contexto transfronteiriço (36).

61.      Este último elemento, o aspeto transfronteiriço, explica, designadamente, a dificuldade de definir o regime aplicável à sanção pecuniária compulsória no quadro do sistema de reconhecimento e de execução das decisões judiciárias na União, situação encontrada no processo principal.

62.      Tendo em conta as considerações precedentes, a questão determinante é a da natureza jurídica de uma sanção pecuniária compulsória, como a que está em causa no processo principal.

2.      A sanção pecuniária compulsória enquanto parte integrante da decisão relativa ao direito de visita

63.      Permitam‑me começar a minha análise com uma questão: deve considerar‑se que a sanção pecuniária compulsória em causa no processo principal faz parte integrante da decisão relativa ao direito de visita ou, pelo contrário, pode ser isolada enquanto obrigação autónoma?

64.      Em relação ao processo principal, sou da opinião que uma sanção pecuniária compulsória deste tipo faz parte integrante da decisão relativa ao direito de visita.

65.      A este respeito, quero esclarecer, antes de mais, que resulta da decisão de reenvio que a sanção pecuniária compulsória aplicada pelo órgão jurisdicional belga se destina a assegurar o cumprimento de uma decisão relativa ao direito de visita. Foi fixada pelo juiz do Estado‑Membro de origem em simultâneo com a decisão de mérito e reveste, por conseguinte, um caráter acessório. Trata‑se aqui da primeira fase da execução da sanção pecuniária compulsória, conforme referida no n.° 60 das presentes conclusões, a saber, a pronúncia da condenação principal que aplica esta sanção pecuniária compulsória.

66.      A Comissão salientou, na audiência, com razão, que o caso ora em apreço, a saber a execução de uma decisão relativa ao direito de visita acompanhada de uma sanção pecuniária compulsória noutro Estado‑Membro, não deve ser confundido com a situação em que o órgão jurisdicional do Estado‑Membro de origem adota uma decisão relativa ao direito de visita, mas sem a acompanhar de uma sanção pecuniária compulsória (37). Nesta situação hipotética, a aplicação a posteriori de uma sanção pecuniária compulsória pelo órgão jurisdicional do Estado‑Membro de execução seria certamente regulada pelo artigo 47.°, n.° 1, do Regulamento n.° 2201/2003 e estaria sujeita à legislação do Estado‑Membro de execução. Todavia, o artigo 26.° deste regulamento proíbe a revisão de mérito da decisão relativa ao direito de visita.

67.      Em seguida, quero sublinhar com especial ênfase que, como resulta da decisão de reenvio e das observações escritas da Comissão, a execução da sanção pecuniária compulsória em causa no litígio do processo principal pressupõe o incumprimento, por parte do progenitor com quem o filho reside da sua obrigação de cooperar para a realização do direito de visita. A este respeito, partilho do argumento dos Governos finlandês, espanhol e lituano e da Comissão, de que a sanção pecuniária compulsória faz parte integrante da decisão relativa ao direito de visita. Consequentemente, é lógico que se considere que, em princípio, a sanção pecuniária compulsória reveste a mesma força executória que a própria decisão relativa ao direito de visita, conforme previsto pelo Regulamento n.° 2201/2003.

68.      Pelo contrário, se se admitisse, neste caso, a interpretação do Governo finlandês de que a sanção pecuniária compulsória se inscreve no quadro do processo de execução na aceção do artigo 47.°, n.° 1, do Regulamento n.° 2201/2003, esta não podia ser nem reconhecida nem executada com fundamento neste regulamento, mas ficaria sujeita ao direito do Estado‑Membro de execução (38), como o próprio Governo finlandês salienta. Nesse caso, a sanção pecuniária compulsória aplicada pelo órgão jurisdicional do Estado‑Membro de origem, no caso em apreço, pelo órgão jurisdicional belga, para garantir o cumprimento do direito de visita, correria o risco de ficar privada de efeito, uma vez que se trata de uma medida que tem por objetivo garantir o cumprimento do direito de visita. Consequentemente, o caráter coercivo da sanção pecuniária compulsória ficaria limitado apenas ao Estado‑Membro de origem.

69.      Por conseguinte, devo concluir que uma sanção pecuniária compulsória que faz parte integrante da decisão relativa ao direito de visita, como a que está em causa no processo principal, é, a esse título, diretamente executória com fundamento no Regulamento (CE) n.° 2201/2003 do Conselho, de 27 de novembro de 2003, relativo à competência, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria matrimonial e em matéria de responsabilidade parental e que revoga o Regulamento n.° 1347/2000, e não pode ser considerada uma medida de execução que se inscreve no quadro do processo de execução na aceção do artigo 47.°, n.° 1, do Regulamento n.° 2201/2003.

D –    Quanto à liquidação da sanção pecuniária compulsória no quadro do Regulamento n.° 2201/2003: aplicação por analogia do artigo 49.° do Regulamento n.° 44/2001

70.      Com a sua quarta questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se, previamente à sua execução no Estado‑Membro requerido, a sanção pecuniária compulsória deve ser objeto de uma nova decisão judicial no Estado‑Membro de origem, para que o seu montante seja definitivamente fixado pelo juiz desse Estado‑Membro.

71.      Resulta das observações escritas dos Governos finlandês e lituano que consideram que uma tal intervenção do juiz do Estado‑Membro de origem é inútil, uma vez que a execução da sanção pecuniária compulsória se enquadra, em todo o caso, nas regras nacionais do Estado‑Membro de execução, no quadro do artigo 47.°, n.° 1, do Regulamento n.° 2201/2003. Em contrapartida, o Governo espanhol e a Comissão alegam, nas suas observações, que se deve preencher a lacuna da inexistência, no Regulamento n.° 2201/2003, de uma regra como a que consta do artigo 49.° do Regulamento n.° 44/2001, através da aplicação por analogia desta disposição.

72.      Estou de acordo com a segunda posição.

73.      Na verdade, o Regulamento n.° 2201/2003 não prevê a exigência da liquidação da sanção pecuniária compulsória; contudo, no caso em apreço, a aplicação por analogia do artigo 49.° do Regulamento n.° 44/2001 merece ser analisada (39). Com efeito, o legislador da União só refere a sanção pecuniária compulsória no quadro do artigo 49.° do Regulamento n.° 44/2001 (40). A intervenção do legislador da União neste domínio tem como efeito que as decisões judiciais proferidas num Estado‑Membro que aplicam essa medida «só são executórias no Estado[‑Membro] requerido se o respetivo montante tiver sido definitivamente fixado pelos tribunais do Estado de origem» (41). Por conseguinte, a aplicação deste artigo está subordinada à liquidação da sanção pecuniária compulsória (42). Por outras palavras, o artigo 49.° do Regulamento n.° 44/2001 não permite que se liquide a sanção pecuniária compulsória num Estado‑Membro diferente daquele onde foi decidida (43). Consequentemente, as decisões judiciais que condenam numa sanção pecuniária compulsória cujo montante não foi «definitivamente fixado» no Estado‑Membro de origem estão excluídas da aplicação do princípio da livre circulação das decisões em matéria civil e comercial, o qual é um dos objetivos fundamentais do Regulamento n.° 44/2001, em conformidade com o seu considerando 6.

74.      Considero que, neste caso, uma aplicação por analogia daquela disposição se revela pertinente. Tal aplicação suscita as seguintes observações da minha parte.

75.      Em primeiro lugar, como já referi anteriormente, a exigência de liquidação da sanção pecuniária compulsória não está prevista em todos os Estados‑Membros (44). Por conseguinte, a fase da liquidação prévia da sanção pecuniária compulsória pode ser sujeita a regras e a procedimentos diferentes nas diversas ordens jurídicas nacionais, como é o caso do presente processo, uma vez que o direito belga não prevê esse procedimento de liquidação. Esta divergência entre os direitos nacionais é a razão por que foi adotada a regra que consta do artigo 49.° do Regulamento n.° 44/2001 (45). Mais especificamente, resulta do relatório elaborado por Schlosser (46) que essa regra foi inserida «para fazer face às dificuldades que pudessem resultar das relações entre os Estados em matéria de execução de decisões relativas à realização de atos individuais, quando a sanção prevista é uma sanção pecuniária compulsória».

76.      A este propósito, segundo a Comissão, embora o Regulamento n.° 2201/2003 não contenha uma disposição equivalente à do artigo 49.° do Regulamento n.° 44/2001, essa questão não foi suscitada durante a negociação nem abordada aquando da redação do Regulamento n.° 2201/2003. Como a Comissão salientou na audiência, não se podia, contudo, deduzir daí que tenha sido intenção do legislador excluir a execução da sanção pecuniária compulsória do âmbito de aplicação deste regulamento.

77.      Em segundo lugar, saliento que a aplicação por analogia do artigo 49.° do Regulamento n.° 44/2001 evitaria qualquer forma de revisão de mérito da decisão proferida pelo juiz do Estado‑Membro de origem, como a que pode resultar da intervenção do juiz do Estado‑Membro de execução (47), proibida pelo artigo 26.° do Regulamento n.° 2201/2003 (48). Com efeito, ao intervir para adaptar a sanção pecuniária compulsória de maneira a integrar os elementos processuais exigidos pelo seu direito nacional, este último não só encontraria as dificuldades próprias da aplicação de regras processuais de outra ordem jurídica, mas sobretudo, e esta é a questão mais importante, atuaria de forma contrária ao regime de execução estabelecido pelo Regulamento n.° 2201/2003 e ao princípio do reconhecimento mútuo das decisões judiciais no qual este último se baseia (49). A este propósito, considero apropriado observar também que resulta dos considerandos 2 e 21 de Regulamento n.° 2201/2003 que o regime do reconhecimento e de execução das decisões judiciais é a pedra angular da criação de um verdadeiro espaço judiciário e tem por base o princípio da confiança mútua.

78.      Além disso, acrescentarei que, tendo em conta o caráter específico do direito de visita no que respeita ao seu exercício prático (50), o único poder de que o órgão jurisdicional do Estado‑Membro de execução dispõe, à luz da decisão relativa ao direito de visita, é o que lhe confere o artigo 48.° do Regulamento n.° 2201/2003 relativo às modalidades práticas do exercício desse direito (51). Com efeito, esta disposição confere uma certa margem de apreciação ao órgão jurisdicional do Estado‑Membro de execução, ao permitir‑lhe intervir para garantir o cumprimento efetivo do direito de visita. Todavia, o órgão jurisdicional do Estado‑Membro de execução não pode rever a decisão quanto ao mérito, deve contentar‑se em analisar se esta comporta disposições práticas relativas ao exercício desse direito e se essas disposições são suficientes (52). A este respeito, a Comissão sublinha, nas suas observações escritas, que os órgãos jurisdicionais deviam utilizar as prerrogativas que lhes confere o artigo 48.° do Regulamento n.° 2201/2003 para assegurarem que o direito de visita seja sempre possível e, se necessário, que possa ser dado à execução. Partilho desta posição.

79.      Em terceiro lugar, a aplicação por analogia do artigo 49.° do Regulamento n.° 44/2001 impõe‑se, na minha opinião, enquanto exceção à regra geral do artigo 41.°, n.° 1, do Regulamento n.° 2201/2003. Este último prevê «o reconhecimento e a execução de uma decisão relativa ao direito de visita «noutro Estado‑Membro sem necessidade de qualquer declaração que lhe reconheça essa força e sem que seja possível contestar o seu reconhecimento, se essa decisão tiver sido homologada no Estado‑Membro de origem nos termos do n.° 2». Assim, a eventual alteração de um direito de visita para, por um lado, melhor responder ao superior interesse da criança e, por outro, se adaptar às mudanças eventualmente ocorridas é da competência exclusiva do órgão jurisdicional do Estado‑Membro de origem. O órgão jurisdicional do Estado‑Membro de execução deve poder fundamentar a sua decisão numa sanção pecuniária compulsória cujo montante definitivo esteja fixado.

80.      Em consequência, no processo principal, C. Bohez deve receber do órgão jurisdicional belga a confirmação do montante definitivo da sanção pecuniária compulsória, mesmo se, nos termos do direito belga, não seja exigida nenhuma decisão distinta. A este respeito, parece‑me útil fazer referência à jurisprudência e à doutrina belgas neste domínio. Com efeito, segundo a jurisprudência belga, a interposição de uma ação no tribunal do Estado‑Membro de origem é justificada à luz do Regulamento n.° 44/2001, mesmo se o direito belga não prevê um processo de liquidação da sanção pecuniária compulsória (53). Pelo seu lado, a doutrina belga considera que, no contexto «do espaço europeu», prevalece o Regulamento n.° 44/2001 e o juiz das medidas provisórias belga é competente para liquidar a sanção pecuniária compulsória, mesmo que um processo de execução não tenha sido intentado na Bélgica (54). Em todo o caso, a competência para liquidar a sanção pecuniária compulsória pertence às autoridades competentes do Estado de origem.

81.      Em quarto lugar, parece‑me que a exigência de liquidação da sanção pecuniária compulsória no âmbito do Regulamento n.° 2201/2003 se concilia bem com um domínio tão sensível como o das relações familiares em geral e o do direito de visita em particular. O artigo 24.°, n.° 3, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia prevê que «as crianças têm o direito de manter regularmente relações pessoais e contactos diretos com ambos os progenitores, exceto se isso for contrário aos seus interesses» (55). A este propósito, resulta do considerando 2 do Regulamento n.° 2201/2003 que o direito de visita é considerado uma prioridade. Por conseguinte, para proteger os direitos da criança, é fundamental que ambos os progenitores possam exercer efetivamente o seu direito de visita, que é justamente o objetivo de qualquer sanção pecuniária compulsória.

82.      Neste contexto, a aplicação por analogia do artigo 49.° do Regulamento n.° 44/2001 permitiria uma fiscalização jurisdicional dos incumprimentos alegados pelo credor da obrigação principal. Esta fiscalização é de importância capital para melhor responder ao superior interesse da criança. Com efeito, pressupõe que o juiz do Estado‑Membro de origem verifique não só o número de ausências da criança, mas também as razões dessas ausências, por exemplo se estas se devem a um acidente, à saúde da criança ou de um progenitor, à recusa de um adolescente em querer manter relações com o progenitor que não tem a guarda ou a problemas económicos dos pais.

83.      Por último, como resulta do n.° 79 das presentes conclusões, se, no superior interesse da criança, é imposta uma sanção pecuniária compulsória por uma decisão relativa ao direito de visita e a sua execução é requerida noutro Estado‑Membro, os dois órgãos jurisdicionais envolvidos devem cooperar para garantir a tomada em consideração de todos os elementos do processo. Para tanto, podem usar das prerrogativas que lhes confere o artigo 48.° do Regulamento n.° 2201/2003. Essa cooperação implica uma partilha das competências e das responsabilidades entre o juiz do Estado‑Membro de origem e o juiz do Estado‑Membro de execução para garantir à criança a proteção que lhe reconhece o direito da União. O superior interesse da criança deve ser tido em conta, prioritariamente, pelos órgãos jurisdicionais envolvidos (56).

84.      Consequentemente, atendendo aos elementos precedentes, considero que, previamente à sua execução no Estado‑Membro requerido, a sanção pecuniária compulsória deve ser objeto de uma nova decisão judicial no Estado‑Membro de origem, para que o seu montante definitivo seja fixado pelo juiz deste Estado‑Membro.

85.      Tendo em conta as minhas respostas à terceira e quarta questões, não há que responder à quinta questão prejudicial submetida pelo órgão jurisdicional de reenvio.

V –    Conclusão

86.      Tendo em conta as considerações precedentes, proponho ao Tribunal de Justiça que responda às questões colocadas pelo Korkein oikeus como se segue:

1)         Uma decisão judicial proferida num Estado‑Membro e acompanhada de uma sanção pecuniária compulsória para fazer respeitar a execução de um direito de visita, não pode ser executada noutro Estado‑Membro com fundamento no Regulamento (CE) n.° 44/2001 do Conselho, de 22 de dezembro de 2000, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial.

2)         Uma sanção pecuniária compulsória que faz parte integrante da decisão relativa ao direito de visita, como a que está em causa no processo principal, é, a esse título, diretamente executória com fundamento no Regulamento (CE) n.° 2201/2003 do Conselho, de 27 de novembro de 2003, relativo à competência, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria matrimonial e em matéria de responsabilidade parental e que revoga o Regulamento (CE) n.° 1347/2000, e não pode ser considerada uma medida de execução que se inscreve no quadro do processo de execução na aceção do artigo 47.°, n.° 1, daquele regulamento.

3)         Previamente à sua execução no Estado‑Membro requerido, a sanção pecuniária compulsória deve ser objeto de uma nova decisão judicial no Estado‑Membro de origem, para que o seu montante definitivo seja fixado pelo juiz deste Estado‑Membro.


1 —      Língua original: francês.


2 —      Regulamento do Conselho, de 22 de dezembro de 2000, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial (JO 2001, L 12, p. 1)


3 —      Regulamento do Conselho, de 27 de novembro de 2003, relativo à competência, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria matrimonial e em matéria de responsabilidade parental e que revoga o Regulamento (CE) n.° 1347/2000 (JO L 338, p. 1).


4 —      No caso em apreço, o montante está fixado por incumprimento e por filho, embora sujeito a um valor máximo. V. n.° 27 das presentes conclusões.


5 —      Acórdão Econord (C‑182/11 e C‑183/11, EU:C:2012:758, n.° 21).


6 —      V. artigos 1050 e 10501 do Código de Processo Civil polaco, artigos 709.° e 711.° do Código de Processo Civil espanhol, artigos L 131‑1 a 131‑4 do Código dos Processos Civis de Execução francês, e § 888 do Código de Processo Civil alemão V., nomeadamente, Grzegorczyk, P., «Egzekucja świadczeń polegających na wykonaniu lub zaniechaniu czynności w państwach europejskich», Proces Cywilny. Nauka, kodyfikacja, praktyka, Grzegorczyk, Knoppek, Walasik (Éds), Varsóvia, 2012, pp. 1021 a 1055, e Ramien, O., Rechtsverwirklichung durch Zwangsgeld, J.C.B. Mohr (Paul Siebeck) Tübingen, 1992.


7 —      V. artigos 59815 e 59816 do Código de Processo Civil polaco.


8 —      Exceto para os direitos belga, luxemburguês e neerlandês, que, nesta matéria, são idênticos. V. Payan, G., Droit européen de l’exécution en matière civile et commerciale, Edições Bruylant, Bruxelas, 2012, pp. 172 a 184. Com efeito, as disposições sobre a sanção pecuniária compulsória resultam da Lei de 31 de janeiro de 1980 que aprova a Convenção Benelux sobre a lei uniforme relativa à sanção pecuniária compulsória, e do anexo (lei uniforme relativa à sanção pecuniária compulsória), assinados em Haia, em 26 de novembro de 1973 (Moniteur belge, de 20 de fevereiro de 1980, p. 2181).


9 —      As convergências e as divergências existentes entre as legislações nacionais aplicáveis à sanção pecuniária compulsória já foram evidenciadas em diversos relatórios explicativos apresentados a propósito da Convenção de 27 de setembro de 1968 relativa à competência judiciária e à execução de decisões em matéria civil e comercial (JO 1972, L 299, p. 32, a seguir «Convenção de Bruxelas») e do Regulamento n.° 44/2001. V., a este respeito, relatório elaborado por Schlosser sobre a Convenção relativa à adesão do Reino da Dinamarca, da Irlanda e do Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte à Convenção relativa à competência judiciária e à execução de decisões em matéria civil e comercial, bem como ao Protocolo relativo à sua interpretação pelo Tribunal de Justiça, assinada no Luxemburgo, em 9 de outubro de 1978 (JO 1979, C 59, p. 132), e relatório sobre a aplicação do Regulamento n.° 44/2001 nos Estados‑Membros (relatório Heidelberg) redigido por Hess, B., Pfeiffer, T., e Schlosser, P., Munique, 2007. A este respeito, v., também, relatório explicativo sobre a Convenção relativa à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial, assinada em Lugano, em 30 de outubro de 2007 (JO 2009, C 319, p. 46).


10 —      V. artigo 1385 bis do code judiciaire e artigo 16.°, n.° 2, da TpL.


11 —      O direito belga define sanção pecuniária compulsória como uma «condenação no pagamento de uma quantia em dinheiro, proferida a título acessório pelo juiz, para exercer uma pressão sobre o devedor, para que este último execute a condenação que lhe foi aplicada». V. Van Ommeslaghe, P., «Les obligations — Examen de jurisprudence (1974‑1982) — Les obligations», Revue critique de jurisprudence belge, 1986, n.° 94, p. 198, e van Compernolle, J., L’astreinte, Ed. Larcier, 2007, p. 33. Por conseguinte, segundo a doutrina belga, a sanção pecuniária compulsória consiste num «meio de coação reservado ao juiz para fazer o destinatário respeitar a ordem que lhe é dirigida». V. Moreau‑Margrève, I., «L’astreinte», Annuaire de droit de Liège, 1982, p. 14.


12 —      A doutrina francesa qualifica a sanção pecuniária compulsória de medida de execução «indireta» ou «amigável». Com efeito, distingue‑se das medidas de execução forçada pelo facto de estas últimas permitirem ao credor obter o seu crédito independentemente de qualquer colaboração do devedor, ao passo que a pressão financeira exercida pela sanção pecuniária compulsória sobre o devedor tem por objetivo incentivá‑lo a proceder voluntariamente ao cumprimento. A este respeito, a falta de pagamento das quantias devidas em consequência da sanção pecuniária compulsória pode levar os credores a utilizar medidas de execução forçada para obter a cobrança. V., neste sentido, Payan, G., op. cit., p. 172. Alguns autores qualificam a sanção pecuniária compulsória como norma que, por conseguinte, não se enquadra no âmbito da coação que carateriza o regime específico da execução forçada. V. Cuniberti, G., «Quelques observations sur le régime de l’astreinte en droit international privé», Gazette du Palais, 2009, n.° 332, pp. 2 e segs.


13 —      Também há uma disparidade entre os direitos nacionais em relação ao âmbito de aplicação da sanção pecuniária compulsória. Em algumas legislações, designadamente em direito belga, em direito luxemburguês e em direito neerlandês, se a obrigação principal for uma obrigação de pagamento de uma quantia em dinheiro, não pode ser decretada uma sanção pecuniária compulsória. A este respeito, em relação ao direito belga, v. artigo 1385 bis do code judiciaire. Em contrapartida, em direito francês, a sanção pecuniária compulsória pode, em princípio, ser decretada quando a obrigação resultante do título for não só uma obrigação de ação ou de omissão, mas também uma obrigação de pagamento de uma quantia em dinheiro. V. Payan, G., op. cit., p. 177.


14 —      Em direito interno, essa exclusão diz respeito tanto ao juiz que conhece do mérito como ao juiz das medidas provisórias. V. van Compernolle, J., op. cit., pp. 38 e 77.


15 —      No entanto, a parte demandada pode contestar a aplicação da sanção pecuniária compulsória perante o juiz das medidas provisórias, em conformidade com o artigo 1498 do code judiciaire. Ibidem, p. 78.


16 —      V. acórdão, de 25 de setembro de 2000, do Tribunal de Cassação belga. V. também, van Compernolle, J., op. cit., p. 38.


17 —      O beneficiário da sanção pecuniária compulsória tem o ónus da prova do preenchimento dos requisitos da sua exigibilidade. Essa prova, em caso de contestação, deverá ser a maior parte das vezes feita perante o juiz das medidas provisórias. Este fiscaliza a posteriori a existência de um incumprimento em relação à obrigação principal e a regularidade da medida de execução através da análise das condições de exigibilidade da sanção pecuniária compulsória. V. van Compernolle, J., op. cit., pp. 38 e 78.


18 —      V. artigo 59816, n.° 1, segundo período, do Código de Processo Civil polaco: «um tribunal pode, em casos excecionais, alterar o montante da sanção pecuniária compulsória referido no artigo 59815, por alteração das circunstâncias».


19 —      Resulta da decisão de reenvio que compete ao demandante fazer a prova dos obstáculos levantados ao direito de visita pela parte contrária.


20 —      V. artigo 19.°, n.° 1, da TpL.


21 —      Resulta da decisão de reenvio que constituem motivos válidos na aceção daquela disposição, nomeadamente, a doença do filho que impeça o direito de visita, a omissão do pai que tem o direito de visita de ir buscar o filho da forma acordada ou o facto de um filho, que atingiu uma maturidade suficiente, se opor à visita. O tribunal ter deve conhecer, oficiosamente as circunstâncias pertinentes à luz do superior interesse da criança.


22 —      V. artigo 11.° da Lei relativa à sanção pecuniária compulsória.


23 —      V. também Payan, G., op. cit., p. 181.


24 —      É também o caso do direito alemão, em que o produto da sanção pecuniária compulsória é entregue ao Tesouro público. V. Bundesgerichtshof (Tribunal Federal de Justiça, Alemanha), acórdão de 2 de março de 1983 ‑ IVb ARZ 49/82. V., também, Hüßtege, R., Zivilprozessordnung, Thomas. Putzo (ed.), 29.ª edição, Munique 2008, § 888, n.° 15; Stöber, K., em Zöller (ed.), Zivilprozessordnung, 28.ª edição, Colónia 2010, § 888, n.° 13.


25 —      V. artigo 68.°, n.° 1, do Regulamento n.° 44/2001.


26 —      Para o Reino da Dinamarca, v. Acordo entre a Comunidade Europeia e o Reino da Dinamarca relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial, assinado em Bruxelas, em 19 de outubro de 2005 (JO L 299, p. 62).


27 —      Acórdãos Draka NK Cables e o. (C‑167/08, EU:C:2009:263, n.° 20); SCT Industri (C‑111/08, EU:C:2009:419, n.° 22); German Graphics Graphische Maschinen (C‑292/08, EU:C:2009:544, n.° 27); Realchemie Nederland (C‑406/09, EU:C:2011:668, n.° 38); Sapir e o. (C‑645/11, EU:C:2013:228, n.° 31); e Sunico e o. (C‑49/12, EU:C:2013:545, n.° 32).


28 —      C‑406/09, EU:C:2011:668, n.° 39.


29 —      Ibidem, n.° 39.


30 —      Artigo 1.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 2201/2003.


31 —      Em relação às razões que justificaram a exclusão das questões que diziam respeito ao estado das pessoas singulares da Convenção de Bruxelas, no relatório elaborado por P. Jenard sobre a Convenção de 27 de setembro de 1968 relativa à competência judiciária e à execução de decisões em matéria civil e comercial (JO 1979, C 59, p. 10), diz‑se que «[q]uaisquer que tivessem sido as regras de competência escolhidas ‑ na suposição de que o comité conseguisse alcançar a unificação das regras nesse domínio ‑ a disparidade dos sistemas legislativos em presença nessas matérias, designadamente das regras de conflito de leis, era tal que era difícil abdicar da fiscalização das referidas regras, na fase do processo de exequatur».


32 —      Realchemie Nederland (C‑406/09, EU:C:2011:668, n.° 39 e jurisprudência referida).


33 —      Ibidem, n.° 40.


34 —      V., por analogia, acórdão Realchemie Nederland (C‑406/09, EU:C:2011:668, n.° 42).


35 —      V., neste sentido, conclusões do advogado‑geral Cruz Villalón no processo DHL Express France (C‑235/09, EU:C:2010:595, n.os 47 e 48).


36 —      Ibidem (n.os 47 e 48).


37 —      Importa salientar que, em princípio, quando uma sanção pecuniária compulsória é decidida pelo órgão jurisdicional do Estado de origem para garantir uma obrigação principal, a saber, o direito de visita, numa decisão posterior àquela que decreta esse direito, o caráter acessório da sanção pecuniária compulsória persiste. Consequentemente, não pode ser regulada pelo artigo 47.°, n.° 1, do Regulamento n.° 2201/2003.


38 —      Atendendo ao facto de o Governo finlandês considerar que a sanção pecuniária compulsória faz parte integrante da decisão relativa ao direito de visita, parece‑me que essa argumentação se revela contraditória.


39 —      V. Magnus, U., e Mankowski, P., «Introduction», Brussels II bis Regulation, Magnus e Mankowski (editores), Sellier European Law Publishers, 2012, p. 32: «[it] ought to be stressed again that it would be foolish to dispose lightly of the treasure contained in the Brussels I regime and the experiences made in that realm. Prospective adventure trips might turn into entertainment journeys where Brussels I has already paved the ways».


40 —      As dificuldades respeitantes à interpretação do artigo 49.° do Regulamento n.° 44/2001 relativo ao conceito de «sanção pecuniária compulsória» nos diferentes direitos nacionais levou alguns autores a considerarem que este conceito deve ter uma «interpretação autónoma», centrada na função deste instrumento, a saber, «a condenação, ou a ameaça de condenação, de uma parte no pagamento de uma quantia em dinheiro para fazer respeitar uma decisão judicial proferida em matéria civil ou comercial». V., Guinchard, E., «Procédures civiles d’exécution en droit international privé», Guinchard e Moussa (dir.), Droit et pratique des voies d’exécution, Dalloz, 7.ª ed., 2012, pp. 2172 e 2192.


41 —      Esta condição tinha sido fixada pelo artigo 43.° da Convenção de Bruxelas. V. relatório elaborado por P. Jenard (op. cit., p. 54). Esta solução também tinha sido fixada na Convenção de Lugano, de 16 de setembro de 1988, e foi retomada no artigo 49.° da [nova] Convenção de Lugano, de 30 de outubro de 2007, relativa à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial (JO 2007, L 339, p. 1).


42 —      Esta solução foi criticada, designadamente no relatório elaborado por Hess, B., Pfeiffer, T., e Schlosser, P., op. cit., pp. 271 a 275, que destacava as dificuldades de interpretação do artigo 49.° do Regulamento n.° 44/2001. V., também, Hess, B., Pfeiffer, T. e Schlosser, P., The Brussels I. Regulation (EC) No 44/2001, Beck München, 2008, pp. 156 a 159. No seguimento desta linha, o artigo 67.° da proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial (Reformulação), [COM(2010) 748 final, de 14 de dezembro de 2010, pp. 271 a 275], estava redigido nos seguintes termos: «[a]s decisões estrangeiras proferidas nos Estados‑Membros que condenem em sanções pecuniárias compulsórias só são executórias no Estado‑Membro de execução nos termos das secções 1 ou 2, consoante os casos. O tribunal ou autoridade competente do Estado‑Membro de execução deve fixar o montante do pagamento [da sanção pecuniária compulsória] se este não tiver sido definitivamente fixado pelos tribunais do Estado‑Membro de origem.». Como a Comissão salientou nas suas observações escritas, concluiu‑se, todavia, na sequência de negociações, que a condição relativa à fixação do montante definitivo da sanção pecuniária compulsória era o único meio concreto que permitia garantir a execução das sanções pecuniárias compulsórias no estrangeiro, e a disposição manteve‑se inalterada na reformulação do Regulamento n.° 44/2001. V. também o meu comentário na nota de pé de página seguinte.


43 —      V. artigo 55.° do Regulamento n.° 1215/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2012, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial (reformulação) (JO 2012, L 351, p. 1). Embora a formulação deste artigo difira da do artigo 49.° do Regulamento n.° 44/2001, a exigência de uma liquidação judicial da sanção pecuniária compulsória consta destes dois artigos. V., também, artigo 66.° do Regulamento n.° 1215/2012: «1. [o] presente regulamento aplica‑se apenas às ações judiciais intentadas, aos instrumentos autênticos formalmente redigidos ou registados e às transações judiciais aprovadas ou celebradas em 10 de janeiro de 2015 ou em data posterior. 2. Não obstante o artigo 80.°, o Regulamento (CE) n.° 44/2001 continua a aplicar‑se às decisões proferidas em ações judiciais intentadas, aos instrumentos autênticos formalmente redigidos ou registados e às transações judiciais aprovadas ou celebradas antes de 10 de janeiro de 2015 e abrangidas pelo âmbito de aplicação daquele regulamento».


44 —      V. n.° 38 das presentes conclusões.


45 —      V. Gaudemet‑Tallon, H., Compétence et exécution des jugements en Europe. Réglement n.° 44/2001. Conventions de Bruxelles et de Lugano, 4.ª édition, L.G.D.J., 2010, p. 487.


46 —      Op. cit., p. 132.


47 —      V., McEleavy, P., «Article 48», Brussels II bis Regulation, Magnus e Mankowski (editores), op. cit., pp. 398 a 402, p. 399: «It was clearl[y] […] that courts in the State of enforcement were afforded a limited power through Art. 48 to review the foreign order to assess the modalities of its operation».


48 —      A este respeito, v., também, artigo 45.°, n.° 2, do Regulamento n.° 44/2001.


49 —      V., por analogia, acórdão Aguirre Zarraga (C‑491/10 PPU, EU:C:2010:828, n.os 69 e 70).


50 —      O direito de visita depende muitas vezes de elementos externos, como a saúde da criança ou a distância que a separa o progenitor, elementos que são mais sensíveis num contexto transfronteiriço.


51 —      Segundo o artigo 48.° do Regulamento n.° 2201/2003, com a condição de que «as disposições necessárias não tenham sido previstas ou não tenham sido suficientemente previstas na decisão proferida pelos tribunais do Estado‑Membro competentes para conhecer do mérito e desde que os elementos essenciais dessa decisão sejam respeitados».


52 —      V. McEleavy, P., op. cit., p. 398.


53 —      V. despacho presidencial, de 17 de setembro de 2003, proferido pelo Presidente do Tribunal de primeira instância de Liège: «[…] trata‑se de uma ação preventiva admissível no caso em que o comportamento do devedor revela claramente que contesta a liquidação da sanção pecuniária compulsória. Além disso, esta determinação prévia do montante da sanção pecuniária compulsória é exigida pelo Regulamento CE n.° 44/2001, art. 49.° […], o que, nos termos do regulamento, justifica a ação no tribunal do Estado de origem mesmo se o Regulamento Benelux não prevê processo de liquidação da sanção pecuniária compulsória».


54 —      V. de Leval, G. e van Compernolle, J., Saisies et astreinte, Édition de la Formation permanente CUP ‑ outubro de 2003, Universidade de Liège, p. 272, e van Compernolle, J., op. cit., p. 47: «[c]ontrariamente ao que está previsto no espaço Benelux, no espaço europeu deve intentar‑se nova ação no tribunal do Estado de origem para obter um novo título de liquidação da sanção pecuniária compulsória, com base no qual poderá ter lugar um processo de cobrança forçada. Por conseguinte, o regulamento europeu prevalece e o juiz das medidas provisórias é competente para liquidar a sanção pecuniária compulsória, mesmo que não tenha sido intentado um processo de execução».


55 —      V. considerando 33 do Regulamento n.° 2201/2003. V., também, Lenaerts, K., «The Interpretation of the Brussels II Bis Regulation by the European Court of Justice», En hommage à Albert Weitzel L’Europe des droits fondamentaux, Mélanges, Sob a direção de Luc Weitzel, Pedone, A., 2013, pp. 129 a 152, p. 132: «The Regulation must be interpreted in compliance with the fundamental rights of the child concerned, notably with Articles 7 and 24 of the Charter of Fundamental Rights of the European Union».


56 —      V. Lenaerts, K., op. cit., p. 151: «When interpreting the provisions of the Brussels II bis Regulation relating to matters of parental responsibility, the ECJ always takes into account the best interests of the child».