Language of document : ECLI:EU:C:2007:105

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

YVES BOT

apresentadas em 15 de Fevereiro de 2007 1(1)

Processo C‑386/05

Color Drack GmbH

contra

LEXX International Vertrieb GmbH

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Oberster Gerichtshof (Áustria)]

«Regulamento (CE) n.° 44/2001 – Artigo 5.°, n.° 1, alínea b) – Competência especial em matéria contratual – Venda de bens – Pluralidade de lugares de entrega num Estado‑Membro»





1.        O presente processo de decisão prejudicial tem por objecto, pela primeira vez, a interpretação do artigo 5.°, n.° 1, do Regulamento (CE) n.° 44/2001 do Conselho (2) que instituiu as regras de competência especiais em matéria contratual, derrogatórias do princípio de que em geral a competência tem por base o domicílio do requerido.

2.        Esta disposição prevê, na alínea b), que, quando o litígio está relacionado com um contrato internacional de venda de bens, o requerente pode demandar o requerido perante o tribunal do lugar onde, nos termos do contrato, os bens foram ou deviam ser entregues.

3.        No caso em apreço, está em causa saber se a referida disposição é aplicável e, em caso afirmativo, de que forma, quando o pedido diz respeito a bens que foram fornecidos em vários locais do território de um Estado‑Membro.

4.        Nas presentes conclusões, defenderemos que o artigo 5.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 44/2001 é aplicável no caso de pluralidade de lugares de entrega, desde que estes estejam todos situados no território de um único Estado‑Membro. Explicaremos também que, quando o pedido diz indistintamente respeito a todos os fornecimentos, a questão de saber se o requerente pode demandar o requerido perante o tribunal de qualquer lugar de entrega ou se deve antes deduzir a sua pretensão perante o tribunal de um desses lugares em particular decorre do direito nacional e que, se o direito nacional não contém nenhuma regra a este respeito, o requerente pode demandar o requerido perante o tribunal do lugar de entrega à sua escolha.

I –    Quadro jurídico

5.        O Regulamento n.° 44/2001 foi adoptado com fundamento nas disposições do título IV do Tratado CE, que conferem poderes à Comunidade Europeia para adoptar as medidas decorrentes da cooperação judiciária em matéria civil que sejam necessárias ao bom funcionamento do mercado comum.

6.        O referido regulamento destina‑se a substituir a Convenção de Bruxelas de 27 de Setembro de 1968 relativa à competência judiciária e à execução das decisões em matéria civil e comercial (3) em todos os Estados‑Membros (4). O Regulamento n.° 44/2001 entrou em vigor em 1 de Março de 2002 e apenas se aplica às acções judiciais intentadas e aos actos autênticos exarados posteriormente à sua entrada em vigor (5).

7.        Este regulamento inspira‑se amplamente na Convenção de Bruxelas, com a qual o legislador comunitário entendeu assegurar uma verdadeira continuidade (6), retomando o regime das regras de competência previsto nesta convenção, fundado no princípio da competência dos tribunais do domicílio do requerido, ao qual se juntam as regras de competência exclusiva ou concorrente.

8.        Deste modo, o artigo 2.°, n.° 1, do Regulamento n.° 44/2001 dispõe que:

«Sem prejuízo do disposto no presente regulamento, as pessoas domiciliadas no território de um Estado‑Membro devem ser demandadas, independentemente da sua nacionalidade, perante os tribunais desse Estado.»

9.        O artigo 5.° do Regulamento n.° 44/2001 tem a seguinte redacção:

«Uma pessoa com domicílio no território de um Estado‑Membro pode ser demandada noutro Estado‑Membro:

1.      a)     Em matéria contratual, perante o tribunal do lugar onde foi ou deva ser cumprida a obrigação em questão;

b)      Para efeitos da presente disposição e salvo convenção em contrário, o lugar de cumprimento da obrigação em questão será:

–      no caso da venda de bens, o lugar num Estado‑Membro onde, nos termos do contrato, os bens foram ou devam ser entregues,

–      no caso da prestação de serviços, o lugar num Estado‑Membro onde, nos termos do contrato, os serviços foram ou devam ser prestados;

c)      Se não se aplicar a alínea b), será aplicável a alínea a);

[...]»

II – O litígio no processo principal

10.      O litígio no processo principal opõe a sociedade Color Drack GmbH (7), que tem a sua sede em Schwarzbach (Áustria), à sociedade LEXX International Vertrieb GmbH (8), cuja sede se situa em Nuremberga (Alemanha).

11.      A Color Drack comprou óculos de sol à LEXX International Vertrieb, que pagou integralmente, mas que mandou entregar por esta última aos seus clientes situados em lugares diferentes da Áustria.

12.      Subsequentemente, a Color Drack devolveu à LEXX International Vertrieb os óculos que não foram vendidos e pediu a esta sociedade o reembolso da quantia de 9 291,56 EUR, acrescida dos juros e despesas acessórias. Não tendo este valor sido pago, a Color Drack, em 10 de Maio de 2004, intentou uma acção para obter o pagamento contra a LEXX International Vertrieb no Bezirksgericht St. Johann em Pongau (Áustria), em cuja jurisdição se encontra a sua sede.

13.      Este órgão jurisdicional declarou‑se territorialmente competente para julgar esta acção, nos termos do artigo 5.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 44/2001. O mesmo considerou que o lugar de cumprimento da obrigação que deve ser tomado em consideração no que respeita à devolução dos bens não vendidos é o lugar das instalações da Color Drack. O referido órgão jurisdicional também julgou a acção procedente.

14.      O Landesgericht Salzburg (Áustria), para o qual foi interposto recurso pela LEXX International Vertrieb, anulou esta sentença por entender que o órgão jurisdicional de primeira instância não era territorialmente competente.

15.      Este órgão jurisdicional de recurso considerou que o artigo 5.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 44/2001 prevê um lugar de conexão único para todos os pedidos decorrentes de um contrato de venda, incluindo um pedido de reembolso após devolução dos bens. Segundo o referido órgão jurisdicional, a determinação autónoma desse lugar de conexão, nos termos desta disposição, não é possível quando os bens tiverem sido entregues a vários clientes situados em diferentes lugares da Áustria.

16.      O Landesgericht Salzburg concluiu daí que, uma vez que o artigo 5.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 44/2001 não é aplicável, são as disposições do artigo 5.°, n.° 1, alínea a), do mesmo regulamento que, nos termos do artigo 5.°, n.° 1, alínea c), deste último, se devem aplicar. Nos termos destas últimas disposições, a Color Drack devia ter intentado a sua acção para pagamento perante o Tribunal de Nuremberga, competente por ser o órgão jurisdicional do lugar onde a obrigação que serve de fundamento ao pedido deve ser executada.

17.      O Oberster Gerichtshof (Áustria), para o qual a Color Drack interpôs recurso, decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça um pedido de decisão prejudicial quanto à interpretação do artigo 5.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 44/2001.

18.      Na sua decisão de reenvio, este órgão jurisdicional alega que interpreta esta disposição do modo seguinte. Em primeiro lugar, uma vez que prevê uma competência especial, a referida disposição deve ser objecto de uma interpretação estrita. Além disso, o artigo 5.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 44/2001, contrariamente ao artigo 5.°, n.° 1, da Convenção de Bruxelas, prevê um lugar de conexão único para todas as pretensões que resultem de um contrato de compra e venda ou de prestação de serviços. Por último, é o lugar onde a prestação foi efectivamente fornecida que constitui o critério determinante da competência internacional.

19.      Segundo o Oberster Gerichtshof, a competência do órgão jurisdicional de primeira instância no qual a Color Drack intentou a acção não seria discutível se todos os bens tivessem sido entregues a esta sociedade em Schwarzbach. Contudo, o mesmo tribunal questiona‑se sobre se esta competência pode manter‑se quando os bens não foram entregues apenas na área de competência deste órgão jurisdicional, mas em lugares diferentes do Estado‑Membro do comprador.

20.      Foi com base nestas considerações em mente que o Oberster Gerichtshof decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«O artigo 5.°, n.° 1, alínea b), do [Regulamento n.° 44/2001] deve ser interpretado no sentido de que o vendedor de bens que tem o seu domicílio no território de um Estado‑Membro e que, em conformidade com o que foi convencionado, entregou os bens em diferentes lugares de outro Estado‑Membro, a um comprador aí domiciliado, pode ser demandado pelo comprador perante o tribunal de um destes lugares (do cumprimento) – sendo caso disso, à escolha do demandante – relativamente a um direito decorrente do contrato respeitante a todas as entregas (parciais)?»

III – Análise

21.      O Oberster Gerichtshof, na sua decisão de reenvio, recordou que das suas decisões não cabe recurso jurisdicional segundo o direito interno. Em consequência, o mesmo é competente, nos termos do artigo 68.° CE, para submeter ao Tribunal de Justiça um pedido de decisão prejudicial para interpretação de uma disposição do Regulamento n.° 44/2001.

22.      Também é matéria assente que o Regulamento n.° 44/2001 se aplica ao caso em apreço, uma vez que o contrato no qual a Color Drack baseia a sua acção é uma venda de bens e que esta acção foi intentada na sequência de um pedido de pagamento posterior a 1 de Março de 2002.

23.      A questão submetida pelo órgão jurisdicional de reenvio levanta duas questões. Assim, este órgão jurisdicional pretende saber, em primeiro lugar, se o artigo 5.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 44/2001 é aplicável quando os bens, em conformidade com o que foi convencionado entre as partes, foram entregues em lugares diferentes situados no território de um único Estado‑Membro.

24.      Em seguida, em caso de resposta afirmativa a esta questão, o órgão jurisdicional de reenvio convida o Tribunal de Justiça a precisar se, nos casos em que o pedido diz respeito a todas as entregas, o requerente pode demandar o requerido perante o tribunal de um dos lugares de entrega à sua escolha.

25.      Examinaremos sucessivamente cada um destes pontos.

A –    Quanto à aplicação do artigo 5.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 44/2001, em caso de pluralidade de lugares de entrega no território de um único Estado‑Membro

26.      A LEXX International Vertrieb, assim como os Governos alemão e italiano, defendem que o artigo 5.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 44/2001, não é aplicável em caso de pluralidade de lugares de entrega.

27.      O Governo alemão alega que a aplicação desta disposição, nesta hipótese, seria contrária à sua redacção, que refere um único lugar de entrega (9). Segundo este Governo, essa aplicação seria também contrária à economia daquele regulamento. A este respeito, afirma que a disposição controvertida, enquanto regra de competência especial, deve ser interpretada de forma estrita. O Governo alemão também se baseia no artigo 5.°, n.° 1, alínea c), do referido regulamento, nos termos do qual se aplica o artigo 5.°, n.° 1, alínea a) do mesmo, quando as condições exigidas pela alínea b) desta mesma disposição não estão reunidas.

28.      O Governo alemão, apoiado pelo Governo italiano, também se refere à finalidade do artigo 5.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 44/2001. Afirma que esta disposição tem por objecto permitir às partes num contrato determinar o tribunal competente para julgar as acções baseadas neste último, bem como evitar uma multiplicidade de órgãos jurisdicionais competentes. O Governo alemão sustenta que a referida disposição rege não apenas a competência internacional dos órgãos jurisdicionais de um Estado‑Membro, mas também a sua competência territorial.

29.      Os Governos alemão e italiano salientam que, no caso de entrega em diversos lugares, não é possível determinar um lugar único de cumprimento de acordo com os critérios previstos no artigo 5.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 44/2001 e que permitir ao requerente intentar a sua acção num dos lugares de entrega ou em cada um desses lugares é contrário ao objectivo desta disposição.

30.      Além disso, o Governo italiano recorda que a opção de competência prevista no artigo 5.°, n.° 1, do Regulamento n.° 44/2001 foi adoptada por razões de boa administração da justiça. Ora, segundo o mesmo, em caso de multiplicidade de lugares de cumprimento da obrigação contratual, não é possível determinar o lugar que apresenta o elemento de conexão mais estreito entre o litígio e o órgão jurisdicional competente.

31.      Por último, o Governo alemão alega que a sua análise está em conformidade com a posição adoptada pelo Tribunal de Justiça no acórdão Besix (10), no qual este declarou que a opção de competência em matéria contratual prevista no artigo 5.°, n.° 1, da Convenção de Bruxelas não era aplicável no caso de uma pretensão assente numa obrigação de abstenção que não continha nenhuma limitação geográfica.

32.      Não partilhamos desta análise. Consideramos, tal como o Governo do Reino Unido e a Comissão das Comunidades Europeias, que a opção de competência prevista no artigo 5.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 44/2001, é aplicável quando os bens, em conformidade com a convenção que une as partes, foram entregues em lugares diferentes de um único Estado‑Membro.

33.      Baseamos a nossa posição no regime instituído pelo artigo 5.°, n.° 1, do Regulamento n.° 44/2001, bem como nos objectivos prosseguidos por este regulamento, vistos à luz do regime de competência facultativa em matéria contratual previsto pela Convenção de Bruxelas e dos inconvenientes que este acarreta.

34.      Previamente à exposição destes motivos, devemos começar por indicar as razões pelas quais, em nosso entender, a questão em apreço não encontra resposta na redacção do artigo 5.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 44/2001.

1.      A redacção do artigo 5.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 44/2001

35.      Contrariamente ao Governo alemão, somos da opinião de que a redacção do artigo 5.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 44/2001 não permite resolver a questão de saber se a opção de competência prevista por esta disposição tem ou não vocação para se aplicar em caso de pluralidade de lugares de entrega.

36.      A este respeito, não cremos que a resposta a esta questão possa ser inferida da referência a um único lugar de entrega tal como consta no elemento da frase «o lugar num Estado‑Membro onde, nos termos do contrato, os serviços foram ou devam ser prestados».

37.      Com efeito, a questão a que devemos responder diz respeito ao âmbito de aplicação material da referida disposição. Este âmbito de aplicação está determinado, na disposição controvertida, pelo conceito de «venda de bens» e não pelo período da frase «o lugar num Estado‑Membro onde, nos termos do contrato, os bens foram ou devam ser entregues». Este elemento da frase apenas indica o critério de competência territorial no caso de uma venda de bens, clarificando qual o lugar de cumprimento que deve ser tomado em consideração neste tipo de contrato para determinar o tribunal competente.

38.      Por outro lado, o artigo 5.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 44/2001 prevê que o requerente pode intentar a sua acção perante o «tribunal» do lugar de entrega dos bens. Consoante o alcance da competência territorial dos tribunais do Estado‑Membro em causa, tal como é definida pelas suas regras nacionais, os fornecimentos efectuados em lugares diferentes deste Estado podem situar‑se na área de competência de um mesmo tribunal. Em consequência, a pluralidade de lugares de entrega no território de um mesmo Estado‑Membro não conduz necessariamente à designação de mais de um tribunal competente.

39.      Por conseguinte, se nos devemos basear apenas na redacção do artigo 5.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 44/2001, bem como na referência que este faz a um lugar único de entrega, coloca‑se ainda a questão de saber se esta disposição é aplicável quando todas as entregas se situam na área de competência de um único tribunal.

40.      Em nossa opinião, estas considerações revelam que não é possível inferir da letra do artigo 5.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 44/2001 indicações claras e precisas que permitam responder à questão de saber se esta disposição se aplica e, se assim for, de que forma, em caso de pluralidade de lugares de entrega.

41.      Segundo jurisprudência constante, quando a letra de uma disposição de direito comunitário não permite, por si só, determinar com certeza a forma como a mesma deve ser entendida e aplicada numa determinada situação, há que interpretá‑la tendo em conta a sistemática e os objectivos da legislação de que ela faz parte (11). A resposta à questão em apreço deve, pois, ser determinada tendo em conta a economia e os objectivos do Regulamento n.° 44/2001.

2.      O regime instituído pelo artigo 5.°, n.° 1, do Regulamento n.° 44/2001 e os objectivos prosseguidos por este regulamento

42.      Conforme referimos, o Regulamento n.° 44/2001, que substituiu a Convenção de Bruxelas, inspira‑se amplamente nesta convenção e inscreve‑se na sua continuidade. Também vimos que o artigo 5.°, n.° 1, do Regulamento n.° 44/2001 constitui uma inovação relativamente ao teor do artigo 5.°, n.° 1 da referida convenção.

43.      Para compreender bem o alcance desta inovação e as consequências que se devem retirar da mesma no que respeita às condições de aplicação do artigo 5.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 44/2001, afigura‑se‑nos necessário recordar o teor do regime de competência facultativa em matéria contratual previsto pela Convenção de Bruxelas e as dificuldades colocadas pelo mesmo, que o legislador comunitário pretendeu corrigir neste regulamento.

a)      O regime de competência facultativa em matéria contratual previsto pela Convenção de Bruxelas e a sua interpretação pela jurisprudência

44.      A Convenção de Bruxelas foi adoptada pelos Estados‑Membros com fundamento no artigo 220.° do Tratado CE (12), nos termos do qual estes são convidados a entabular entre si negociações destinadas a garantir, em benefício dos seus nacionais, a simplificação das formalidades a que se encontram subordinados o reconhecimento e a execução recíprocos tanto das decisões judiciais como das decisões arbitrais.

45.      A referida convenção tem por objectivo, segundo o seu preâmbulo, adoptar regras simples destinadas a favorecer a livre circulação das decisões judiciais. Segundo o Tribunal de Justiça, ela consiste igualmente na «uniformização das regras de competência dos órgãos jurisdicionais dos Estados contratantes, evitando [...] a multiplicação da titularidade da competência judiciária a respeito de uma mesma relação jurídica, e em reforçar a protecção jurídica das pessoas domiciliadas na Comunidade, permitindo, simultaneamente, ao requerente identificar facilmente o órgão jurisdicional a que se pode dirigir e ao requerido prever razoavelmente aquele perante o qual pode ser demandado» (13).

46.      A Convenção de Bruxelas tem, pois, por objectivo, evitar a multiplicação dos nexos de competência para uma mesma relação jurídica, unificando as regras de competência internacional dos órgãos jurisdicionais dos Estados‑Membros, por via de disposições simples que permitam às partes identificar facilmente o órgão jurisdicional competente.

47.      Estes objectivos são concretizados no artigo 2.° desta convenção que enuncia a regra de princípio segundo a qual o tribunal competente é o do domicílio do requerido.

48.      As partes contratantes da referida convenção previram que o referido princípio de competência podia ser derrogado. Instituíram várias regras de competência especial, umas com carácter vinculativo, tais como em matéria imobiliária, de seguros ou de contratos celebrados pelos consumidores, outras com carácter facultativo, no artigo 5.° da Convenção de Bruxelas, nomeadamente, em matéria contratual, de obrigação alimentar ou em matéria extra‑contratual.

49.      Estas regras de competência especial foram adoptadas para cumprir um objectivo preciso. No que diz respeito às regras previstas neste artigo 5.°, as partes contratantes pretenderam permitir ao demandante intentar a sua acção perante o tribunal que fosse fisicamente mais próximo dos elementos do litígio e que, deste modo, se encontrasse mais bem colocado para apreciar aqueles elementos. Segundo o relatório Jenard (14), as referidas regras justificam‑se «pela razão de que existe um estreito elemento de ligação entre o diferendo e o tribunal chamado a conhecer dele».

50.      Deste modo, o artigo 5.° da Convenção de Bruxelas também previa, na sua versão inicial, que o requerido podia ser demandado, em matéria contratual, perante o tribunal do «lugar onde a obrigação foi ou deva ser cumprida».

51.      O Tribunal de Justiça precisou, por um lado, qual a obrigação que deve ser tomada em consideração e, por outro, a forma como o lugar de cumprimento dessa obrigação deve ser determinado.

52.      Assim, no acórdão de 6 de Outubro de 1976, De Bloos (15), o Tribunal de Justiça declarou que a obrigação que deve ser tomada em consideração é a que corresponde ao direito contratual no qual se baseia a acção do requerente (16). Por conseguinte, trata‑se da obrigação contratual que, em concreto, serve de base à acção judicial ou, por outras palavras, da obrigação cujo incumprimento é invocado.

53.      Na mesma data, no acórdão Tessili (17), o Tribunal de Justiça declarou que o lugar onde a obrigação que serve de base ao pedido foi ou devia ser cumprida deve ser determinado em conformidade com a lei que regula a obrigação controvertida segundo as normas de conflitos de leis do órgão jurisdicional demandado.

b)      Os problemas levantados pelo artigo 5.°, n.° 1, da Convenção de Bruxelas

54.      O artigo 5.°, n.° 1, da Convenção de Bruxelas, tal como foi interpretado pela jurisprudência, deu lugar a diversos comentários críticos. Entre as dificuldades colocadas por esta disposição, parecem‑nos pertinentes no quadro do presente litígio três insuficiências, tendo em vista os objectivos desta convenção.

55.      A primeira insuficiência refere‑se ao risco de multiplicação dos tribunais competentes para julgar litígios relacionados com o mesmo contrato.

56.      A Convenção de Bruxelas visa, conforme vimos, evitar, na medida do possível, a multiplicação dos órgãos jurisdicionais competentes relativamente ao mesmo contrato, a fim de prevenir o risco de decisões contraditórias e de facilitar, assim, o reconhecimento e a execução das decisões judiciais fora do Estado onde foram proferidas (18).

57.      Contudo, a aplicação conjugada dos acórdãos, já referidos, De Bloos e Tessili pode ter como consequência que as acções baseadas em obrigações distintas, mas emergentes do mesmo contrato, sejam da competência de órgãos jurisdicionais de Estados‑Membros diferentes. Com efeito, esta jurisprudência conduz à cisão das obrigações decorrentes de um mesmo contrato e à determinação do lugar de cumprimento da obrigação que serve de base ao pedido, em conformidade com a lei que regula a obrigação controvertida, segundo as normas de conflitos de leis do órgão jurisdicional demandado.

58.      O processo que esteve na origem do acórdão Leathertex (19) ilustra bem as consequências desta jurisprudência. Neste caso, uma sociedade belga que tinha exercido funções de agente comercial por conta da sociedade Leathertex, com sede em Itália, exigiu judicialmente a esta, na Bélgica, o pagamento, por um lado, de comissões em dívida e, por outro, de uma indemnização compensatória por falta de pré‑aviso para resolução do contrato. Nos termos das normas belgas de conflitos de leis, a obrigação de pagar uma indemnização compensatória por falta de pré‑aviso devia ser cumprida na Bélgica, enquanto a obrigação de pagar as comissões devia ser cumprida em Itália. Neste acórdão, o Tribunal de Justiça declarou que, tendo em consideração a jurisprudência reflectida pelos acórdãos, já referidos, De Bloos e Tessili, o órgão jurisdicional belga só podia conhecer do pedido de pagamento da indemnização compensatória por falta de pré‑aviso, sendo o outro pedido da competência dos órgãos jurisdicionais italianos.

59.      O Tribunal de Justiça tentou limitar os efeitos desta jurisprudência. No acórdão Shenavai (20), declarou que, no caso particular de um litígio que assenta em várias obrigações resultantes do mesmo contrato e que servem de base à acção intentada pelo autor, o juiz, para determinar a sua competência, pode orientar‑se pelo princípio de que o acessório segue o principal (21).

60.      No entanto, o risco de multiplicação dos tribunais competentes mantém‑se totalmente quando, como no acórdão Leathertex, já referido, as obrigações em causa são consideradas equivalentes. Neste caso, o mesmo juiz não é competente, nos termos do artigo 5.°, n.° 1, da Convenção de Bruxelas, para conhecer de um pedido no seu conjunto, fundado em duas obrigações equivalentes que decorrem de um mesmo contrato quando, segundo as regras de conflitos do Estado deste juiz, uma dessas obrigações deve ser cumprida naquele Estado e a outra noutro Estado contratante.

61.      A segunda insuficiência do artigo 5.°, n.° 1, da Convenção de Bruxelas refere‑se à dificuldade da sua aplicação e, por conseguinte, à falta de previsibilidade do seu resultado para as partes.

62.      Conforme referimos, a Convenção de Bruxelas visa permitir que um requerido normalmente prudente preveja razoavelmente em que órgão jurisdicional, para além dos do Estado do seu domicílio, pode ser demandado (22). Esta convenção visa, deste modo, reforçar na Comunidade a protecção jurídica das pessoas singulares e colectivas aí estabelecidas, prevendo regras comuns de competência que garantam uma certeza quanto à repartição de competências entre os diferentes órgãos jurisdicionais nacionais a que pode ser submetido um litígio determinado (23).

63.      Para que da aplicação destas regras se possa obter um resultado previsível para os operadores económicos, aquelas devem ser de grande simplicidade. Ora, o método de determinação do tribunal competente, tal como foi definido pela jurisprudência já referida De Bloos e Tessili, necessita, por parte do juiz nacional a quem o litígio foi submetido, várias análises complexas cujo resultado não é facilmente previsível pelas partes num contrato.

64.      Deste modo, o juiz a quem o litígio foi submetido deve começar por qualificar a obrigação contratual que está na base da acção. Eventualmente, se o requerente baseia a sua acção em diversas obrigações, este juiz deverá determinar se existe uma hierarquia entre elas que lhe permita conhecer do litígio no seu conjunto, em conformidade com o acórdão Shenavai, já referido.

65.      Em seguida, o juiz a quem o litígio foi submetido deve procurar a lei que, segundo a sua norma de conflitos de leis, é aplicável à obrigação que serve de fundamento ao pedido. Deste modo, deverá, eventualmente, referir‑se à convenção sobre a lei aplicável às obrigações contratuais, aberta para assinatura em Roma, em 19 de Junho de 1980 (24).

66.      Segundo o regime instituído por esta convenção, a lei aplicável ao contrato é a lei escolhida pelas partes. Na falta desta, a referida convenção estabelece o princípio de que o contrato deve ser regulado pela lei do Estado com o qual apresenta os laços mais estreitos e presume que, salvo casos excepcionais, este Estado é aquele onde a parte que deve fornecer a prestação característica tem a sua residência habitual no momento da celebração do contrato.

67.      A lei material escolhida deste modo também pode assumir a forma de uma convenção internacional assinada e ratificada pelo Estado‑Membro em causa, tal como a Convenção das Nações Unidas sobre os contratos de venda internacional de bens, assinada em Viena em 11 de Abril de 1980.

68.      Por último, com base na lei material aplicável, o juiz deve determinar o lugar do cumprimento da obrigação contratual controvertida. Só pode concluir pela sua competência se esse lugar se situar no domínio da sua competência territorial.

69.      Por conseguinte, este método é complexo e passa pela aplicação de convenções internacionais cada uma das quais pode suscitar dificuldades sérias de interpretação (25).

70.      A terceira insuficiência do artigo 5.°, n.° 1, da Convenção de Bruxelas está relacionada com o facto de as regras tomadas em consideração para determinar o tribunal competente não serem as melhores para designar directamente a jurisdição que apresenta a relação de proximidade mais estreita com o litígio que deve ser dirimido.

71.      Já vimos que a possibilidade de derrogar o princípio geral da competência dos tribunais do domicílio do requerido conferida ao requerente por esta disposição tem por objecto permitir‑lhe intentar a sua acção perante o tribunal que se encontre mais próximo dos elementos do litígio.

72.      Com efeito, este objectivo deve ser conjugado com o objectivo da segurança jurídica e, mais particularmente, com o da certeza jurídica, que também são prosseguidos pela Convenção de Bruxelas e cujo primado relativamente ao objectivo da proximidade foi reconhecido pelo Tribunal de Justiça. Além disso, a existência de um nexo entre o tribunal e o litígio não constitui, por si só, o critério de competência previsto no artigo 5.°, n.° 1, da Convenção de Bruxelas, uma vez que o critério de competência expressamente enunciado nesta disposição é o lugar do cumprimento da obrigação (26).

73.      Em consequência, o primado do objectivo da segurança jurídica sobre o da proximidade pode justificar que, numa situação concreta, o tribunal a que recorre o requerente, nos termos do artigo 5.°, n.° 1, da Convenção de Bruxelas, não seja o que apresenta a relação de proximidade mais estreita com o litígio.

74.      Todavia, o problema que se coloca no quadro da concretização desta disposição é mais geral. Este problema prende‑se com o facto de os critérios que devem ser aplicados por força da jurisprudência De Bloos e Tessili, já referida, não terem sido fixados em função do objectivo da proximidade.

75.      Com efeito, segundo o método de determinação do lugar de cumprimento estabelecido pela jurisprudência do Tribunal de Justiça, esse lugar deve ser determinado aplicando o direito material dos Estados‑Membros ou de uma convenção internacional que unifique esse direito material, e estes textos não têm por objectivo determinar a competência judiciária. Resulta do exposto que, no que respeita ao pagamento de uma quantia em dinheiro, o tribunal cuja competência é reconhecida nos termos deste método é o do domicílio do devedor ou do credor, consoante, no direito nacional aplicável, o pagamento seja considerado exigível no domicílio do devedor ou transferível para o domicílio do credor.

76.      Ora, pode pensar‑se que, em todos os casos, o objectivo da proximidade só faz realmente sentido e só pode verdadeiramente ser cumprido quando o tribunal competente é o tribunal em cuja jurisdição tem lugar o cumprimento material ou em espécie do contrato. A competência deste tribunal justifica‑se desta forma, porque, em razão da sua proximidade com o lugar de realização da prestação característica do contrato, é o que está mais bem posicionado para apreciar os elementos de prova materiais ou testemunhais invocados pelas partes, bem como, eventualmente, para constatar ele próprio os factos.

77.      É com estas considerações em mente que se deve analisar o novo sistema de competência facultativa em matéria contratual instituído pelo Regulamento n.° 44/2001 e os objectivos prosseguidos por este.

c)      O novo regime de competência facultativa em matéria contratual, instituído pelo Regulamento n.° 44/2001

78.      Ao analisarmos os objectivos prosseguidos pelo Regulamento n.° 44/2001, verificamos que, tal como o conjunto das medidas adoptadas no domínio da cooperação judiciária em matéria civil, este tem por objecto, nos termos do artigo 65.° CE, melhorar e simplificar as regras existentes.

79.      Para este efeito, e tal como resulta dos seus segundo e décimo primeiro considerandos, o referido regulamento visa unificar as regras de conflitos de jurisdição em matéria civil e comercial através de regras de competência que apresentem um «elevado grau de certeza jurídica».

80.      No que respeita ao conteúdo destas normas, as mesmas articulam‑se, tal como na Convenção de Bruxelas, em redor do princípio da competência do domicílio do requerido e esta competência, conforme é referido no décimo primeiro considerando do Regulamento n.° 44/2001, deve ficar sempre disponível. Do mesmo modo, tal como na referida convenção, este princípio de competência deve ser completado por outros foros permitidos.

81.      A este respeito, o legislador comunitário afirma expressamente que é a proximidade do juiz em relação ao litígio que fundamenta essas competências especiais. Tal como resulta do décimo segundo considerando do Regulamento n.° 44/2001, estas competências especiais são permitidas em razão do vínculo estreito entre a jurisdição e o litígio ou com vista a facilitar uma boa administração da justiça.

82.      Para pôr em prática estes diversos objectivos, o regime de competência facultativa em matéria contratual, previsto pelo Regulamento n.° 44/2001, distingue‑se muito claramente do da Convenção de Bruxelas.

83.      Assim, o artigo 5.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 44/2001 fixa um critério de competência autónoma para os dois tipos de contrato mais frequentes nas relações comerciais internacionais, que são os contratos de compra e venda de bens e de fornecimento de serviços.

84.      Além disso, em ambos os casos, este critério de competência autónoma é o lugar de realização da prestação característica do contrato, ou seja, o lugar de entrega dos bens relativamente ao contrato de compra e venda e o lugar de fornecimento dos serviços para o contrato de prestação de serviços.

85.      Neste estádio da nossa análise, podemos inferir os seguintes ensinamentos do regime instituído pelo artigo 5.°, n.° 1, do Regulamento n.° 44/2001 e dos objectivos prosseguidos por este regulamento.

86.      Em primeiro lugar, no que respeita aos contratos de venda de bens e de fornecimento de serviços, as disposições do artigo 5.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 44/2001, constituem, por assim dizer, a regra de competência especial «de princípio». A disposição enunciada no artigo 5.°, n.° 1, alínea a) deste regulamento, que retoma a antiga regra da Convenção de Bruxelas (27), já só tem, para estes dois tipos de convenções, um papel puramente subsidiário. Com efeito, tal como indica expressamente o artigo 5.°, n.° 1, alínea c), do referido regulamento, a alínea a) desta mesma disposição só é aplicável se a sua alínea b) não se aplicar.

87.      Em segundo lugar, a regra de competência especial prevista no artigo 5.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 44/2001 é aplicável a todas as acções baseadas num contrato. Por outras palavras, conforme o demonstra a exposição de motivos pelos quais a Comissão propôs este texto ao Conselho da União Europeia, em 14 de Julho de 1999 (28), o legislador comunitário pretendeu pôr fim à multiplicação de tribunais competentes para julgar acções baseadas no mesmo contrato.

88.      O lugar de entrega dos bens e o lugar de fornecimento dos serviços passam a constituir o critério de competência para todas as acções que possam ser intentadas com fundamento num contrato de venda de bens ou num contrato de fornecimento de serviços. O mesmo aplica‑se independentemente da obrigação que serve de base ao pedido e nos casos em que o pedido diz respeito a várias obrigações.

89.      Em consequência, o artigo 5.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 44/2001 é aplicável a uma acção que, como no caso em apreço, visa o reembolso de bens em cumprimento de uma cláusula de retoma. Esta análise é, aliás, partilhada pelo órgão jurisdicional de reenvio, segundo o qual o artigo 5.°, n.° 1, do Regulamento n.° 44/2001 previu um elemento de conexão único para todos os pedidos decorrentes de um contrato, incluindo, por conseguinte, todas as pretensões contratuais secundárias como as do caso em apreço.

90.      Em terceiro lugar, tal como no regime instituído pela Convenção de Bruxelas, a existência de um elemento de conexão entre o tribunal e o litígio não constitui, por si só, o critério de competência previsto no artigo 5.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 44/2001. Este elemento de conexão constitui apenas a razão que fundamenta esta competência especial. O critério de competência é o lugar de entrega dos bens ou o do fornecimento dos serviços.

91.      Resulta do exposto que o objectivo principal desta disposição é a segurança jurídica, nos termos da qual as regras comuns de competência devem apresentar um elevado grau de certeza jurídica. Ao estabelecer um critério autónomo como critério de competência, o legislador comunitário abandona o regime complexo de determinação do lugar de cumprimento do contrato, elaborado pelo acórdão Tessili, já referido. Do mesmo modo, ao estabelecer como critério autónomo um elemento que, a maior parte das vezes, será puramente factual e, por conseguinte, facilmente identificável pelas partes, permite‑lhes prever razoavelmente qual a jurisdição, para além da do Estado do domicílio do requerido, a que se pode submeter um litígio resultante do contrato.

92.      No regime instituído pelo artigo 5.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 44/2001, a certeza jurídica é, assim, assegurada, porque as partes no contrato sabem que todas as acções decorrentes deste contrato podem ser intentadas perante o tribunal do lugar de entrega dos bens ou o do lugar do fornecimento dos serviços.

93.      Além disso, neste regime, o motivo que está na base desta competência especial é tomado em consideração de uma melhor forma, porque o tribunal competente é o tribunal em cuja jurisdição deve ter lugar a realização da prestação característica do contrato. Por conseguinte, se o contrato foi cumprido ou teve um início de cumprimento material, o juiz designado será efectivamente, na maioria dos casos, o que está fisicamente mais próximo dos elementos de prova que poderão ser pertinentes para a solução do litígio.

94.      Deve agora analisar‑se se tal regime pode ser aplicado aos objectivos do Regulamento n.° 44/2001 e satisfazê‑los, em caso de pluralidade de lugares de cumprimento num único Estado‑Membro.

d)      Quanto à aplicação do artigo 5.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 44/2001, em caso de pluralidade de lugares de entrega num único Estado‑Membro

95.      Tendo em consideração os elementos precedentes, a questão de saber se o artigo 5.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 44/2001 é aplicável em caso de pluralidade de lugares de entrega conduz, na realidade, a averiguar se, num caso desses, o objectivo de assegurar um elevado grau de certeza jurídica pode ser cumprido.

96.      Em nosso entender, é esse o caso quando todas as entregas ocorreram no território de um único Estado‑Membro.

97.      Para determinar o grau de certeza jurídica que o requerido tem o direito de exigir nos termos do Regulamento n.° 44/2001, deve, na nossa opinião, referir‑se o objecto principal deste regulamento.

98.      O referido regulamento tem por objectivo principal, de acordo com o seu segundo considerando, unificar as regras de conflito de jurisdição em matéria civil e comercial, bem como simplificar as formalidades com vista ao reconhecimento e a execução num Estado‑Membro de decisões judiciais proferidas noutro Estado‑Membro.

99.      O mesmo regulamento visa resolver conflitos de competência no quadro de litígios internacionais. Conforme alega, com razão, o Governo do Reino Unido, o Regulamento n.° 44/2001 determina a competência internacional dos órgãos jurisdicionais dos Estados‑Membros. Deste modo, destina‑se a evitar que sejam intentados processos concorrentes em vários Estados‑Membros e que sejam proferidas decisões incompatíveis em dois desses Estados‑Membros.

100. Esta aplicabilidade do Regulamento n.° 44/2001 está claramente expressa no artigo 2.° do mesmo, nos termos do qual as pessoas domiciliadas no território de um Estado‑Membro devem ser demandadas «perante os tribunais desse Estado». Do mesmo modo, o artigo 5.°, n.° 1, alínea b), deste regulamento refere as condições nas quais, por derrogação do seu artigo 2.°, essa pessoa «pode ser demandada noutro Estado‑Membro». Por conseguinte, o Regulamento n.° 44/2001, tal como a Convenção de Bruxelas (29), regula os conflitos de competência internacional entre as ordens jurisdicionais dos Estados‑Membros.

101. Por isso, a circunstância de haver vários lugares de entrega no interior de um mesmo Estado‑Membro e, eventualmente, vários tribunais desse Estado competentes para conhecer do litígio, não põe em causa o cumprimento do objectivo prosseguido pelo Regulamento n.° 44/2001. Com efeito, mesmo pressupondo que vários tribunais do Estado‑Membro em causa pudessem ser competentes em razão da pluralidade de lugares de entrega, não deixa de ser verdade que todos esses tribunais se situam no mesmo Estado‑Membro. Por consequência, não há nenhum risco de serem proferidas decisões incompatíveis por órgãos jurisdicionais de Estados‑Membros diferentes.

102. É certo que poderia contrapor‑se a esta análise o facto de o Regulamento n.° 44/2001 não ter apenas alcance internacional, mas de que também tem, em certa medida, um alcance «territorial». Deste modo, o tribunal competente por força do artigo 5.°, n.° 1, alínea b), deste regulamento não é qualquer órgão jurisdicional do Estado‑Membro. O legislador comunitário quis que o tribunal chamado a conhecer do litígio fosse o órgão jurisdicional nacional materialmente competente na jurisdição territorial em que os bens foram entregues ou os serviços foram prestados.

103. No entanto, esta precisão visa apenas garantir que o tribunal nacional competente é, de facto, o que, de uma forma geral, apresenta a conexão mais estreita com os elementos materiais do litígio. Este objectivo não é ignorado em caso de pluralidade de lugares de entrega dentro de um mesmo Estado‑Membro. Quando, tal como no presente caso, o pedido diz indistintamente respeito a todas as entregas, todos os tribunais em cuja área de competência territorial foram realizadas uma ou mais dessas entregas apresentam, de facto, a mesma conexão de proximidade com os elementos materiais do litígio. Por conseguinte, o objectivo de proximidade está preenchido, independentemente do tribunal a que recorre o requerente de entre esses órgãos jurisdicionais perante o qual todas as acções baseadas no contrato entre as partes devem ser intentadas.

104. Daqui decorre que, conforme a Comissão referiu, com razão, a aplicação do artigo 5.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 44/2001 em caso de pluralidade de lugares de entrega num único Estado‑Membro está em conformidade com o objectivo de proximidade que serve de base a esta regra de competência especial.

105. Por último, quando analisamos agora a questão do ponto de vista da situação concreta do requerido, também não cremos que a aplicação da opção em causa em caso de pluralidade de lugares de entrega no território de um Estado‑Membro seja contrária à protecção que ele tem o direito de esperar do Regulamento n.° 44/2001.

106. O requerido, parte num contrato de venda internacional, em virtude da opção conferida ao requerente pelo artigo 5.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 44/2001, deve esperar ser demandado, se for caso disso, perante um órgão jurisdicional de um Estado‑Membro que não o do seu domicílio. O requerido sabe que o requerente, em conformidade com esta disposição, tem a faculdade de o demandar perante o tribunal do lugar da realização da prestação característica do contrato. No presente caso, a LEXX International Vertrieb, que entregou os bens em causa na Áustria, devia saber que, em caso de litígio, a Color Drack poderia demandá‑la perante um órgão jurisdicional austríaco.

107. Não se nos afigura que, para o requerido, haja uma diferença significativa entre uma entrega única e uma pluralidade de entregas que possam conduzir a uma pluralidade de órgãos jurisdicionais competentes num único Estado‑Membro. A dificuldade principal para uma sociedade ou um particular envolvido num litígio internacional, é a de providenciar a defesa dos seus interesses num Estado que não é o seu. Esta sociedade ou este particular são, deste modo, forçados a escolher um advogado com o qual lhes seja possível comunicar e que conheça a língua, as regras de processo e o funcionamento dos tribunais desse outro Estado. Logo que o requerido tenha encontrado esse advogado e que tenha decidido confiar nele, a questão de saber se este último deve representá‑lo no referido Estado perante o tribunal de uma cidade ou de outra, apenas tem verdadeiramente influência sobre o montante das suas despesas.

108. Além disso, em caso de pluralidade de lugares de entrega num mesmo Estado‑Membro, o requerido, que conhece esses lugares, dado que estão contratualmente determinados, está em situação de prever perante que tribunais desse Estado pode eventualmente ser demandado, tomando conhecimento das regras nacionais aplicáveis.

109. Por último, na apreciação do alcance do artigo 5.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 44/2001, deve recordar‑se que as partes no contrato têm a faculdade de restringir ou de excluir a possibilidade de utilizar a opção de competência prevista por esta disposição. Assim, podem fixar de comum acordo, entre os diferentes lugares de entrega, qual o que deve ser considerado como critério de competência. Com efeito, o artigo 5.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 44/2001 prevê que os critérios de competência autónoma são aplicáveis «salvo convenção em contrário».

110. Do mesmo modo, as partes no contrato também podem designar o ou os tribunais competentes para conhecer dos litígios com origem neste contrato através de um pacto atributivo de jurisdição celebrado nas formas exigidas pelo artigo 23.° do Regulamento n.° 44/2001.

111. É tendo em conta as considerações precedentes que entendemos que a opção de competência prevista no artigo 5.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 44/2001 é aplicável em caso de pluralidade de lugares de entrega, quando esses lugares se situem no território de um único Estado‑Membro.

112. Esta posição não nos parece contrária à solução definida pelo Tribunal de Justiça, no acórdão Besix, já referido.

113. No processo que deu lugar a este acórdão, estava em causa saber se a opção de competência prevista no artigo 5.°, n.° 1, da Convenção de Bruxelas era aplicável num caso em que a obrigação que servia de base ao pedido consistia numa cláusula de exclusividade, mediante a qual duas empresas se tinham comprometido reciprocamente a agir em conjunto no quadro de um concurso público e a não se ligar a outros parceiros.

114. O Tribunal de Justiça declarou que esta opção de competência não era aplicável num caso desses, porque a obrigação contratual controvertida consistia numa obrigação de abstenção que não tinha nenhuma limitação geográfica. Por isso, o Tribunal de Justiça reconheceu que não era possível determinar um lugar único de cumprimento, já que a obrigação em causa devia ser cumprida em todos os Estados‑Membros.

115. Em nosso entender, esta solução não é transponível quando todos os lugares de cumprimento do contrato se situam num único Estado‑Membro (30).

116. Deve agora analisar‑se se, nos termos do Regulamento n.° 44/2001, o requerente pode intentar a sua acção perante o tribunal do lugar de entrega à sua escolha ou perante o tribunal de um lugar de cumprimento em particular.

B –    Quanto à questão de saber se, por força do artigo 5.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 44/2001, o requerente pode intentar a sua acção perante o tribunal do lugar de entrega à sua escolha ou perante o tribunal de um lugar de cumprimento em particular

117. A Comissão defende que se, entre as diferentes entregas, houver uma que revista um carácter principal, enquanto as outras surgem como entregas secundárias, o requerente deve intentar a sua acção perante o tribunal do lugar da realização da entrega principal. Na falta de entrega principal, o requerente pode demandar o requerido perante o tribunal de um dos lugares de entrega à sua escolha.

118. Deste modo, a Comissão propõe que se transponha, no quadro do artigo 5.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 44/2001, a distinção entre obrigação principal e obrigação acessória, retirada do acórdão Shenavai, já referido.

119. Não concordamos com a proposta da Comissão pelas seguintes razões.

120. Em primeiro lugar, consideramos que esta proposta não encontra fundamento no Regulamento n.° 44/2001.

121. O artigo 5.°, n.° 1, alínea b), deste regulamento, conforme vimos, visa atribuir a um único tribunal todas as acções fundadas num mesmo contrato. Além disso, prevê que este tribunal é o do lugar do cumprimento da prestação característica do contrato, para que o mesmo possa ser facilmente determinado pelas partes e que corresponde, em geral, à jurisdição que apresenta a conexão de proximidade mais estreita com os elementos do litígio.

122. Já referimos que o objectivo de certeza jurídica prosseguido pelo Regulamento n.° 44/2001 é preenchido a partir do momento em que todos os lugares de cumprimento se situam no mesmo Estado‑Membro, sabendo o requerido que, na falta de convenção em contrário, pode ser demandado perante o tribunal de um desses lugares de cumprimento.

123. Também vimos que, desde que a acção diga indistintamente respeito a todas as entregas, todos os tribunais em cuja área de competência territorial ocorreu uma entrega apresentam a mesma proximidade com os elementos do litígio. Por consequência, o objectivo da proximidade que está subjacente ao artigo 5.°, n.° 1, do Regulamento n.° 44/2001 é cumprido do mesmo modo se o requerente demandar o requerido no tribunal de qualquer dos lugares de entrega (31).

124. Perante estas considerações, não encontramos no Regulamento n.° 44/2001 nenhuma boa razão para introduzir critérios novos destinados a determinar qual o tribunal que deve ser demandado em caso de pluralidade de lugares de entrega quando a acção diz respeito a todas as entregas.

125. Em segundo lugar, somos de opinião de que a tese da Comissão, se fosse seguida, teria como consequência a reintrodução, no sistema de competência facultativa em matéria contratual previsto pelo Regulamento n.° 44/2001, de critérios complexos que o legislador comunitário quis manifestamente abandonar. Com efeito, seria muito difícil para as partes num contrato determinar claramente a partir de quando uma entrega reveste um carácter principal. Uma tal qualificação ficaria novamente dependente de precisões que só poderiam ser fornecidas pela jurisprudência.

126. É por isso que não cremos que o Regulamento n.° 44/2001 justifique que se prevejam critérios como os que foram considerados pela Comissão para determinar perante que tribunal de que lugar de entrega o requerido deverá ser demandado.

127. Por essa razão, também não cremos que o Regulamento n.° 44/2001 confira ao requerente um direito de intentar a sua acção perante o tribunal de um qualquer lugar de entrega. Não entendemos que este regulamento vise garantir ao requerente uma tal liberdade de escolha. O que o artigo 5.°, n.° 1, alínea b), do referido regulamento exige é, em nosso entender, que o requerente possa demandar o requerido perante o tribunal de um dos lugares de entrega dos bens e que esse tribunal conheça de todos os litígios relativos ao mesmo contrato. Por outras palavras, esta disposição impõe que o requerente possa demandar o requerido perante um tribunal em cuja área de competência territorial tenha sido feita uma entrega e que esse tribunal seja o único órgão jurisdicional nacional competente para conhecer de todos os litígios referentes ao contrato de venda de bens que vincula as partes.

128. No entanto, a questão de saber se todos os tribunais em cuja área de competência foi realizada uma entrega são competentes para conhecer dessa acção que diz respeito a todas as entregas, ou ainda se este tipo de litígio é da competência de um desses tribunais em particular, resulta, na nossa opinião, da autonomia processual do Estado‑Membro em cujo território os bens foram entregues.

129. Por consequência, quando o direito desse Estado‑Membro não prevê regras de competência especial e quando a acção diz respeito a todas as entregas, é que o requerido pode ser demandado perante o tribunal de um dos lugares de entrega, à escolha do requerente.

130. À luz destes elementos, propomos ao Tribunal de Justiça que responda à questão colocada pelo Oberster Gerichtshof que o artigo 5.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 44/2001 é aplicável em caso de pluralidade de lugares de entrega, quando os bens, em conformidade com o que foi convencionado entre as partes, foram entregues em lugares diferentes situados no território de um único Estado‑Membro. Quando a acção diz respeito a todas as entregas, a questão de saber se o requerente pode demandar o requerido perante o tribunal do lugar de entrega à sua escolha ou apenas perante o tribunal de um desses lugares é dirimida pelo direito do Estado‑Membro em cujo território os bens foram entregues. Se o direito desse Estado não prevê regras de competência especial, o requerente pode demandar o requerido perante o tribunal do lugar de entrega à sua escolha.

IV – Conclusão

131. Tendo em conta as considerações precedentes, propomos ao Tribunal de Justiça que responda à questão prejudicial colocada pelo Oberster Gerichtshof do seguinte modo:

«O artigo 5.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento (CE) n.° 44/2001 do Conselho, de 22 de Dezembro de 2000, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial é aplicável em caso de pluralidade de lugares de entrega, quando os bens, em conformidade com o que foi convencionado entre as partes, foram entregues em lugares diferentes situados no território de um único Estado‑Membro. Quando a acção diz respeito a todas as entregas, a questão de saber se o requerente pode demandar o requerido perante o tribunal do lugar de entrega à sua escolha ou apenas perante o tribunal de um desses lugares é dirimida pelo do direito do Estado‑Membro em cujo território os bens foram entregues. Se o direito desse Estado não prevê regras de competência especial, o requerente pode demandar o requerido perante o tribunal do lugar de entrega à sua escolha.»


1 – Língua original: francês.


2 – Regulamento de 22 de Dezembro de 2000 relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial (JO 2001, L 12, p. 1).


3 – (JO 1972, L 299, p. 32). Convenção na redacção que lhe foi dada pela Convenção de 9 de Outubro de 1978 relativa à adesão do Reino da Dinamarca, da Irlanda e do Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte (JO L 304, p. 1, e – texto modificado – p. 77) pela Convenção de 25 de Outubro de 1982 relativa à adesão da República Helénica (JO L 388, p. 1) pela Convenção de 26 de Maio de 1989 relativa à adesão do Reino da Espanha e da República Portuguesa (JO L 285, p. 1) e pela Convenção de 29 de Novembro de 1996 relativa à adesão da República da Áustria, da República da Finlândia e do Reino da Suécia (JO 1997, C 15, p. 1). Foi publicada uma versão consolidada da Convenção de Bruxelas, na redacção que lhe foi dada por estas quatro convenções de adesão (JO 1998, C 27, p. 1, a seguir «Convenção de Bruxelas»).


4 – Três Estados‑Membros, o Reino da Dinamarca, a Irlanda e o Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte, conseguiram não participar em princípio nas medidas adoptadas com fundamento no título IV do Tratado CE. Contudo, a Irlanda e o Reino Unido aceitaram vincular‑se através do Regulamento n.° 44/2001 (v. o vigésimo considerando do mesmo). O Reino da Dinamarca também aceitou aplicar o Regulamento n.° 44/2001, nos termos de um acordo de 19 de Outubro de 2005, aprovado pela Decisão 2005/790/CE do Conselho, de 20 de Setembro de 2005, relativa à assinatura do acordo, em nome da Comunidade, entre a Comunidade Europeia e o Reino da Dinamarca relativo à competência jurisdicional, o reconhecimento e a execução de decisões em matéria civil e comercial (JO L 299, p. 61). Nos termos do artigo 68.° do Regulamento n.° 44/2001, a Convenção de Bruxelas continua a aplicar‑se à parte do território dos Estados‑Membros que não é abrangida pelo âmbito de aplicação do Tratado, tal como definido no seu artigo 299.° Por último, o Regulamento n.° 44/2001 é aplicável, a partir de 1 de Maio de 2004, aos dez novos Estados‑Membros da União Europeia.


5 – Artigo 66.° do regulamento.


6 – Décimo nono considerando do Regulamento n.° 44/2001.


7 – A seguir «Color‑Drack».


8 – A seguir «LEXX International Vertrieb».


9 – O Governo alemão refere‑se, a este respeito, à versão alemã («der Ort in einem Mitgliedstaat»), à versão inglesa («the place in a Member State») e à versão francesa («le lieu d’un État membre»).


10 – Acórdão de 19 de Fevereiro de 2002 (C‑256/00, Colect., p. I‑1699).


11 – Acórdãos de 16 de Maio de 2002, Schilling e Nehring (C‑63/00, Colect., p. I‑4483, n.° 24), bem como de 10 de Dezembro de 2002, British American Tobacco (Investments) e Imperial Tobacco (C‑491/01, Colect., p. I‑11453, n.os 203 a 206 e jurisprudência nele referida). V., para uma aplicação recente, acórdão de 14 de Dezembro de 2006, ASML (C‑283/05, Colect., p. I‑0000, n.os 6 e 22).


12 – Actual artigo 293.° CE.


13 – Acórdão de 13 de Julho de 1993, Mulox IBC (C‑125/92, Colect., p. I‑4075, n.° 11).


14 – JO 1979, C 59, pp. 1 e 22; JO 1990, C 189, p. 142.


15 – 14/76, Colect., p. 605, n.os 11 e 13.


16 – Esta interpretação foi confirmada aquando da celebração da Convenção de 9 de Outubro de 1978 relativa à adesão do Reino da Dinamarca, da Irlanda e do Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte, que alterou, em determinadas versões linguísticas, o artigo 5.°, n.° 1, da Convenção de Bruxelas, de modo a precisar que a obrigação cujo lugar de cumprimento determina o tribunal competente em matéria contratual é «a obrigação que serve de base ao pedido». A mesma fórmula foi retomada no artigo 5.°, n.° 1, alínea a), do Regulamento n.° 44/2001.


17 – Acórdão de 6 de Outubro de 1976 (12/76, Colect., p. 585, n.° 13).


18 – Acórdão Besix, já referido, n.° 27 e jurisprudência nele referida.


19 – Acórdão de 5 de Outubro de 1999 (C‑420/97, Colect., p. I‑6747).


20 – Acórdão de 15 de Janeiro de 1987 (266/85, Colect., p. 239).


21 – Ibidem (n.° 19).


22 – Acórdão Besix, já referido, n.° 26 e jurisprudência nele referida.


23 – Ibidem (n.° 25).


24 – JO L 266, p. 1, a seguir a «Convenção de Roma». Na medida em que a Convenção de Bruxelas contém opções de competência que permitem ao requerente escolher entre os tribunais de Estados‑Membros diferentes, os Estados‑Membros podiam recear que o requerente escolhesse intentar a sua acção perante um tribunal pela única razão de que a lei aplicável no mesmo lhe fosse mais favorável. A Convenção de Roma tem por objecto reduzir este risco, comummente designado por «forum shopping», determinando a lei nacional material aplicável pelo juiz que decide o litígio. Ela visa, deste modo, que a solução de mérito seja a mesma, seja qual for o tribunal escolhido pelas partes em litígio. Esta convenção é aplicável nos quinze Estados‑Membros da União, antes do alargamento de 1 de Maio de 2004. Os dez Estados‑Membros que naquela data aderiram à União também assinaram a Convenção de Roma em 14 de Abril de 2005. Em 14 de Janeiro de 2003, a Comissão iniciou diligências para transformar esta convenção num regulamento. Em 15 de Dezembro de 2005, apresentou uma proposta de regulamento neste sentido [proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho sobre a lei aplicável às obrigações contratuais (Roma I), COM (2005) 650 parte final].


25 – V., nomeadamente, no que respeita à Convenção de Roma, o problema da articulação do seu artigo 4.°, n.° 2, que prevê uma presunção a favor da lei da residência habitual da parte que está obrigada a fornecer a prestação característica do contrato com o seu artigo 4.°, n.° 5, que dispõe que esta presunção deve ser afastada sempre que do conjunto das circunstâncias resulte que o contrato apresenta uma conexão mais estreita com outro Estado.


26 – Acórdão de 29 de Junho de 1994, Custom Made Commercial (C‑288/92, Colect., p. I‑2913, n.os 14 e 15).


27 – Recordamos que o artigo 5.°, n.° 1, alínea a), do Regulamento n.° 44/2001 prevê que, «em matéria contratual [uma pessoa com domicílio no território de um Estado‑Membro pode ser demandada noutro Estado‑Membro], perante o tribunal do lugar onde foi ou deva ser cumprida a obrigação em questão».


28 – Proposta de Regulamento (CE) do Conselho relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e execução das decisões em matéria civil e comercial [COM (1999) 348 parte final].


29 – V., a este respeito, acórdão Besix, já referido, n.° 25.


30 – A solução encontrada no acórdão Besix, já referido, seria transponível, na nossa opinião, se os lugares de entrega se situassem em Estados‑Membros diferentes. Nesse caso, somos de opinião de que a opção de competência prevista no artigo 5.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 44/2001, não seria aplicável, uma vez que o objectivo da certeza jurídica não podia ser cumprido, dado que os tribunais eventualmente competentes por força dessa disposição se situariam no território de diversos Estados‑Membros. Também somos de opinião de que, nesse caso, tendo em conta o objectivo de previsibilidade das regras de competência prosseguido pelo Regulamento n.° 44/2001 e as dificuldades de aplicação do artigo 5.°, n.° 1, alínea a) deste regulamento, esta última disposição também não seria aplicável. A aplicação desta última disposição, em razão do seu carácter puramente subsidiário, devia ser limitada à hipótese encarada pela Comissão na sua proposta de Regulamento de 1999, ou seja, quando o lugar de entrega dos bens ou o do fornecimento dos serviços se situe num Estado terceiro. Quando os bens são entregues ou quando os serviços são fornecidos em vários Estados‑Membros, o tribunal competente só poderá ser, na nossa opinião, o do domicílio do requerido, em conformidade com o princípio enunciado no artigo 2.° do Regulamento n.° 44/2001.


31 – A situação seria diferente se a acção dissesse especialmente respeito aos bens de uma ou de mais entregas em particular. Nesse caso, entendemos que o objectivo de proximidade subjacente ao artigo 5.°, n.° 1, do Regulamento n.° 44/2001 obrigaria o requerente a intentar a sua acção perante o tribunal ou um dos tribunais do lugar de entrega desses bens.