Language of document : ECLI:EU:T:2006:323

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quinta Secção)

17 de Outubro de 2006 (*)

«Marca comunitária – Processo de oposição – Pedido de marca comunitária nominativa GALZIN – Marca nacional nominativa anterior CALSYN – Motivo relativo de recusa – Risco de confusão – Semelhança dos produtos e dos sinais – Artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento (CE) n.° 40/94 – Artigo 43.°, n.os 2 e 3, do Regulamento n.° 40/94 – Pedidos do IHMI – Admissibilidade»

No processo T‑483/04,

Armour Pharmaceutical Co., com sede em Bridgewater, New Jersey (Estados Unidos), representada por R. Gilbey, advogado,

recorrente,

contra

Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), representado por S. Pétrequin, na qualidade de agente,

recorrido,

sendo a outra parte no processo na Câmara de Recurso do IHMI:

Teva Pharmaceutical Industries Ltd, com sede em Jerusalém (Israel),

que tem por objecto um recurso da decisão da Quarta Câmara de Recurso do IHMI de 7 de Setembro de 2004 (processo R 295/2003‑4), relativo a um processo de oposição entre a Armour Pharmaceutical Co. e a Teva Pharmaceutical Industries Ltd,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Quinta Secção),

composto por: M. Vilaras, presidente, M. E. Martins Ribeiro e K. Jürimäe, juízes,

secretário: K. Pocheć, administradora,

vista a petição entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 8 de Dezembro de 2004,

vista a contestação entregue na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 2 de Maio de 2005,

após a audiência de 31 de Janeiro de 2006,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

1        Em 12 de Abril de 2000, a Teva Pharmaceutical Industries Ltd apresentou, nos termos do Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, de 20 de Dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (JO 1994, L 11, p. 1), conforme alterado, um pedido de registo de marca comunitária ao Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI).

2        A marca cujo registo foi pedido é o sinal nominativo GALZIN.

3        Os produtos para os quais o registo foi pedido integram a classe 5, na acepção do Acordo de Nice relativo à Classificação Internacional dos Produtos e dos Serviços para o registo de marcas, de 15 de Junho de 1957, tal como revisto e alterado, e correspondem à seguinte descrição: «produtos farmacêuticos para o tratamento da doença de Wilson».

4        Em 2 de Janeiro de 2001, o pedido de marca foi publicado no Boletim de Marcas Comunitárias n.° 2/2001.

5        Em 28 de Março de 2001, a Armour Pharmaceutical Co. deduziu oposição, nos termos do artigo 42.° do Regulamento n.° 40/94, ao registo da marca pedida relativamente a todos os produtos abrangidos por esta última, invocando a sua marca nominativa anterior CALSYN, registada em França, em 3 de Fevereiro de 1983, com o n.° 1 226 303 para produtos da classe 5, na acepção do acordo de Nice e correspondentes à seguinte descrição: «produtos farmacêuticos e médicos e, especialmente, preparados à base de cálcio».

6        O fundamento invocado em apoio da oposição foi o risco de confusão previsto no artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94.

7        Por decisão de 28 de Fevereiro de 2003, a Divisão de Oposição do IHMI julgou procedente a oposição e rejeitou integralmente o pedido de marca.

8        Em 17 de Abril de 2003, a outra parte no processo na Câmara de Recurso interpôs recurso para o IHMI da decisão da Divisão de Oposição, ao abrigo dos artigos 57.° a 62.° do Regulamento n.° 40/94.

9        Por decisão de 7 de Setembro de 2004 (a seguir «decisão recorrida»), a Quarta Câmara de Recurso do IHMI concedeu provimento ao recurso e anulou a decisão da Divisão de Oposição, condenando a recorrente nas despesas. No essencial, a Câmara de Recurso considerou que, por força do artigo 43.°, n.° 2, in fine, do Regulamento n.° 40/94, a marca anterior considerava‑se registada para «produtos farmacêuticos à base de cálcio», que essa conclusão da decisão da Divisão de Oposição não tinha sido contestada pelas partes e que compartilhava dessa opinião. Além disso, segundo a decisão recorrida, embora exista um certo grau de semelhança entre os produtos e entre as marcas, essa semelhança é insuficiente para originar no espírito do público francês um risco de confusão entre os produtos postos à venda sob cada uma dessas marcas, tendo em conta, por um lado, as diferenças dos sinais em litígio, designadamente do ponto de vista fonético, e, por outro, o facto de os produtos em causa não se destinarem a tratar os mesmos problemas. Por último, a Câmara de Recurso considerou que, dada a natureza dos produtos, o público, que engloba simultaneamente os consumidores de medicamentos e os profissionais da medicina, presta uma atenção especial aos sinais que identificam os produtos.

 Pedidos das partes

10      A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–        anular a decisão recorrida;

–        confirmar a decisão da Divisão de Oposição;

–        condenar o IHMI nas despesas.

11      O IHMI remete para a apreciação do Tribunal a determinação da existência ou não de risco de confusão entre as marcas em causa. Caso o Tribunal considere que não existe risco de confusão para os consumidores franceses, o IHMI pede que o Tribunal se digne negar provimento ao recurso e condenar a recorrente nas despesas. Se o Tribunal entender que existe risco de confusão para os consumidores franceses, o IHMI pede que o Tribunal se digne anular a decisão recorrida e condenar a outra parte no processo na Câmara de Recurso, caso esta compareça, nas despesas, ou declarar que cada parte suportará as suas próprias despesas.

 Quanto à admissibilidade dos pedidos do IHMI

12      Nos termos do artigo 113.° do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, este pode, a todo o tempo e oficiosamente, verificar se estão preenchidos os pressupostos processuais.

13      Cumpre recordar a jurisprudência segundo a qual nada se opõe a que o IHMI compartilhe um dos pedidos da parte recorrente ou ainda que se limite a remeter para o critério do Tribunal de Primeira Instância, embora apresentando toda a argumentação que considere adequada para esclarecer o Tribunal [acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 30 de Junho de 2004, GE Betz/IHMI – Atofina Chemicals (BIOMATE), T‑107/02, Colect., p. II‑1845, n.° 36, e de 25 de Outubro de 2005, Peek & Cloppenburg/IHMI (Cloppenburg), T‑379/03, Colect., p. II‑4633, n.° 22]. Diversamente, não pode formular pedidos de anulação ou de alteração da decisão da Câmara de Recurso sobre pontos não suscitados na petição ou apresentar fundamentos não aduzidos na petição (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 12 de Outubro de 2004, Vedial/IHMI, C‑106/03 P, Colect., p. I‑9573, n.° 34, e acórdão Cloppenburg, já referido, n.° 22).

14      Resulta desta jurisprudência que, no caso em apreço, importa examinar a legalidade da decisão recorrida à luz dos fundamentos aduzidos na petição inicial, tendo também em conta os argumentos apresentados pelo IHMI.

 Quanto ao mérito

15      Em apoio do seu recurso, a recorrente invoca dois fundamentos, relativos, respectivamente, à violação do artigo 43.°, n.os 2 e 3, e do artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94.

 Quanto ao primeiro fundamento, relativo à violação do artigo 43.°, n.os 2 e 3, do Regulamento n.° 40/94

 Argumentos das partes

16      A recorrente alega que demonstrou, no processo de oposição, que a sua marca anterior CALSYN era explorada para produtos farmacêuticos à base de cálcio, embora cobrisse os produtos farmacêuticos e médicos em geral classificados na classe 5, na acepção do acordo de Nice. Ao ter apenas em conta, para efeitos da oposição, os produtos farmacêuticos à base de cálcio, a Câmara de Recurso violou o artigo 43.°, n.os 2 e 3, do Regulamento n.° 40/94.

17      No essencial, a recorrente considera concebível que, quando a marca anterior designa um conjunto de produtos e serviços de natureza diferente, a equidade impõe que apenas se tome em consideração, para fins da oposição, o domínio em que a marca com mais de cinco anos é utilizada para evitar a invocação abusiva de marcas que designam o conjunto de uma ou mais classes. No entanto, uma vez que o produto específico em relação ao qual a utilização está provada pertence a uma categoria precisa reivindicada em sede de registo, limitar os produtos considerados ao produto específico teria um efeito restritivo desproporcionado. É o que pode ocorrer no caso em apreço, dado que os produtos farmacêuticos à base de cálcio fazem parte dos produtos farmacêuticos.

18      Segundo a recorrente, uma interpretação tão restritiva do artigo 43.°, n.os 2 e 3, do Regulamento n.° 40/94 como a efectuada pela Câmara de Recurso não é conforme com a definição do direito de propriedade dada pelas legislações harmonizadas sobre as marcas e é discriminatória quanto ao alcance concedido, num processo de oposição, a um registo não utilizado com menos de cinco anos.

19      Antes de mais, o IHMI expõe os princípios que regulam a questão da prova da utilização de uma marca. A este respeito, alega que, quando uma marca é registada para o conjunto das indicações gerais dos títulos de uma dada classe e foi utilizada para produtos ou serviços específicos compreendidos na mesma classe, deve considerar‑se, em princípio, que a marca foi objecto de uma utilização para esses produtos ou estes serviços específicos. Afirma que seria igualmente possível considerar que a marca foi objecto de uma utilização para uma subcategoria distinta, se for possível defini‑la, quando os produtos ou serviços específicos possuam suficientes características comuns. No entanto, o IHMI acrescenta que este tipo de generalização deve ser efectuada com a maior prudência, sem se perder de vista que a protecção da marca anterior só se justifica desde que tenha sido efectivamente utilizada.

20      No caso em apreço, o IHMI observa que a marca anterior está registada para «produtos farmacêuticos e médicos e, especialmente, preparados à base de cálcio» e que apenas foi feita a prova da sua utilização para produtos farmacêuticos à base de cálcio, tendo a própria recorrente identificado, em separado, os preparados à base de cálcio na relação dos produtos da sua marca.

21      Por conseguinte, a recorrente não pode censurar à Divisão de Oposição e à Câmara de Recurso terem considerado, para fins de apreciação da oposição, que a sua marca estava registada apenas para produtos farmacêuticos à base de cálcio. Segundo o IHMI, o facto de se entender que a marca anterior é utilizada para todas as categorias de produtos farmacêuticos, quando, na verdade, só é utilizada para um produto muito específico, confere uma protecção indevida à marca anterior e é contrário aos princípios fixados no artigo 43.°, n.° 2, do Regulamento n.° 40/94.

22      Em qualquer caso, o IHMI afirma que a decisão recorrida não apresenta qualquer lacuna uma vez que a recorrente não impugnou este aspecto no recurso que interpôs da decisão da Divisão de Oposição e não invocou este argumento na Câmara de Recurso.

 Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

23      Como decorre do nono considerando do Regulamento n.° 40/94, o legislador considerou que apenas se justifica proteger a marca anterior na medida em que essa marca seja efectivamente utilizada. Em conformidade com esse considerando, o artigo 43.°, n.os 2 e 3, do Regulamento n.° 40/94 prevê que o requerente de uma marca comunitária pode requerer a prova de que a marca anterior foi objecto de uma utilização séria no território em que é protegida nos cinco anos anteriores à publicação do pedido de marca comunitária que foi objecto de oposição [acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 12 de Dezembro de 2002, Kabushiki Kaisha Fernandes/IHMI – Harrison (HIWATT), T‑39/01, Colect., p. II‑5233, n.° 34, e de 6 de Outubro de 2004, Vitakraft‑Werke Wührmann/IHMI – Krafft (VITAKRAFT), T‑356/02, Colect., p. II‑3445, n.° 25].

24      Por força da regra 22, n.° 2, do Regulamento (CE) n.° 2868/95 da Comissão, de 13 de Dezembro de 1995, relativo à execução do Regulamento n.° 40/94 (JO L 303, p. 1), a prova da utilização deve consistir em indicações relativas ao local, ao período, à extensão e à natureza da utilização que foi feita da marca anterior [acórdão VITAKRAFT, já referido, n.° 27].

25      No caso em apreço, é pacífico que a marca anterior foi registada para «produtos farmacêuticos e médicos e, especialmente, preparados à base de cálcio», pertencentes à classe 5, na acepção do acordo de Nice. Também não é contestado que, a pedido da outra parte no processo na Câmara de Recurso, a recorrente apresentou prova da utilização séria da marca anterior através de documentos que comprovam a sua utilização efectiva na comercialização de produtos farmacêuticos e, mais precisamente, dos à base de cálcio.

26      Nesta perspectiva, há que interpretar o artigo 43.°, n.° 2, último período, do Regulamento n.° 40/94, bem como o artigo 43.°, n.° 3, deste mesmo regulamento, que aplica as disposições do artigo 43.°, n.° 2, ao caso das marcas nacionais anteriores, no sentido de que se destina a evitar que uma marca utilizada de modo parcial goze de protecção alargada pelo simples motivo de ter sido registada para uma larga gama de produtos ou serviços. Assim, quando da aplicação dessas disposições, há que ter em conta o âmbito das categorias de produtos ou serviços para os quais a marca anterior foi registada, nomeadamente a generalidade dos termos utilizados para esse fim para descrever as referidas categorias, e isto à luz dos produtos ou serviços cuja utilização séria foi, por hipótese, efectivamente demonstrada [acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 14 de Julho de 2005, Reckitt Benckiser (España)/IHMI – Aladin (ALADIN), T‑126/03, Colect., p. II‑2861, n.° 44].

27      Resulta das disposições acima referidas que, embora uma marca tenha sido registada para uma categoria de produtos ou serviços suficientemente ampla para que nela possam distinguir‑se várias subcategorias susceptíveis de ser autonomamente consideradas, a prova do uso sério da marca para uma parte desses produtos ou serviços só implica protecção, num processo de oposição, no que respeita à ou às subcategorias em que se englobam os produtos ou serviços para os quais a marca foi efectivamente utilizada. Em contrapartida, se uma marca tiver sido registada para produtos ou serviços definidos de um modo tão preciso e circunscrito que não é possível efectuar divisões significativas no interior da categoria em causa, então, a prova do uso sério da marca quanto aos referidos produtos ou serviços cobre necessariamente toda essa categoria para efeitos da oposição (acórdão ALADIN, já referido, n.° 45).

28      A este respeito, importa recordar que a marca anterior foi registada para «produtos farmacêuticos e médicos e, especialmente, preparados à base de cálcio». Esta descrição compreende manifestamente uma categoria de produtos suficientemente vasta, ou seja, os produtos farmacêuticos em geral, para que seja possível distinguir no seu seio diferentes subcategorias susceptíveis de serem consideradas de maneira autónoma. Com efeito, o conceito de produto farmacêutico compreende produtos suficientemente diferentes quanto ao seu destino e aos seus consumidores finais, em função das suas indicações terapêuticas específicas, bem como quanto aos seus canais de distribuição, segundo estejam sujeitos a receita médica ou possam ser vendidos livremente, para que nele se possam definir diversas subcategorias. Além disso, a própria recorrente identificou, em separado, a subcategoria correspondente aos «preparados à base de cálcio» na relação dos produtos da sua marca.

29      Nestas circunstâncias, deve considerar‑se que a prova da utilização séria da marca anterior foi feita apenas para uma parte dos produtos ou serviços pertencentes a uma vasta categoria de produtos susceptível de compreender diferentes subcategorias autónomas.

30      Consequentemente, ao ter em conta, para fins da apreciação da oposição, apenas os «produtos farmacêuticos à base de cálcio», a Câmara de Recurso aplicou correctamente o artigo 43.°, n.os 2 e 3, do Regulamento n.° 40/94.

31      Esta conclusão não é posta em causa pelos argumentos da recorrente.

32      Em primeiro lugar, a recorrente observa, no essencial, que, embora seja equitativo, nos casos em que a marca anterior designa um conjunto de produtos e serviços de natureza diferente, tomar em consideração, para efeitos da oposição, o âmbito no qual é utilizada a marca com mais de cinco anos, para evitar a invocação abusiva de marcas que designam o conjunto de uma ou mais classes, é contudo desproporcionado limitar essa tomada em consideração unicamente ao produto específico no interior de uma categoria.

33      A este respeito, antes de mais, o Tribunal entende que o artigo 43.°, n.° 2, do Regulamento n.° 40/94 se refere aos produtos e aos serviços, e não às categorias ou classes de produtos para os quais a marca é registada. Em segundo lugar, a expressão «produtos farmacêuticos à base de cálcio», tidos em conta para efeitos de apreciação da oposição, não contempla apenas um produto específico, mas uma subcategoria autónoma e suficientemente vasta, o que não pode ser qualificado de restrição desproporcionada no caso em apreço. Como resulta dos n.os 29 e 30 supra, esta posição é conforme com a jurisprudência do Tribunal.

34      Em seguida, quanto ao argumento da recorrente segundo o qual uma interpretação tão restritiva do artigo 43.°, n.° 2, do Regulamento n.° 40/94 é discriminatória quanto ao alcance concedido, num processo de oposição, a um registo não utilizado com menos de cinco anos, o Tribunal considera que é suficiente declarar que não se detecta qualquer discriminação porquanto as duas situações não são comparáveis. Com efeito, a prova da utilização séria de uma marca registada há menos de cinco anos não é exigida precisamente porque este período de cinco anos se destina a permitir a exploração comercial da marca. Em conformidade com o artigo 50.° do Regulamento n.° 40/94, só após o decurso de um período ininterrupto de cinco anos durante o qual a marca não seja objecto de utilização séria na Comunidade em relação aos produtos ou serviços para que foi registada pode ser declarada a extinção da mesma por falta de utilização séria.

35      À luz das considerações precedentes, o primeiro fundamento deve ser julgado improcedente.

 Quanto ao segundo fundamento, relativo à violação do artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94

 Argumentos das partes

36      Em primeiro lugar, a recorrente contesta a conclusão da Câmara de Recurso segundo a qual não existe um grau de semelhança suficiente entre os produtos em causa.

37      Segundo a recorrente, os dois tipos de produtos em presença são produtos farmacêuticos semelhantes, provenientes do mesmo tipo de fabricantes e produzidos e distribuídos nos mesmos circuitos. Um é descrito por referência ao princípio activo e o outro por referência à indicação terapêutica. Cabia à outra parte na Câmara de Recurso demonstrar que, não obstante esta semelhança a priori, a realidade das condições de prescrição e consumo dos dois produtos afasta qualquer risco de o consumidor ser confrontado simultaneamente com os dois. Ora, não foi apresentada qualquer prova neste sentido. Do mesmo modo, também não foi feita a prova de que a forma galénica e o modo de administração dos produtos excluem qualquer risco de confusão.

38      A recorrente acrescenta que, para afastar o risco de confusão, não bastava concluir que os dois produtos farmacêuticos se destinavam a tratar patologias diferentes. Cabe à outra parte no processo na Câmara de Recurso demonstrar, e a esta assegurar‑se, que não pode ser prescrito ao mesmo doente, nem este pode receber, os dois tratamentos em simultâneo, o que não foi realizado.

39      Em segundo lugar, a recorrente alega que a Câmara de Recurso se absteve de definir o público a ter em conta e de apreciar o risco de confusão em relação a este. Recorda que, no domínio do medicamento, o público a ter em conta é constituído pelo conjunto da população, incluindo, por um lado, os profissionais da saúde, como os médicos, farmacêuticos e enfermeiros, e, por outro, todas as pessoas susceptíveis de consumir produtos farmacêuticos, incluindo as que já têm as faculdades visuais, cognitivas ou intelectuais reduzidas e que podem ainda estar debilitadas pela doença.

40      Além disso, a recorrente sustenta que o risco de confusão no espírito do público não existe apenas no momento da compra e que a confusão pós‑venda já há muito tempo é tida em conta nos países do outro lado do Atlântico. Com efeito, o medicamento é tomado geralmente durante um determinado período e o paciente, quando selecciona um medicamento do seu armário de medicamentos, já não é orientado por um profissional da saúde.

41      Em terceiro lugar, a recorrente efectua uma comparação dos sinais em conflito.

42      Antes de mais, alega que, como foi reconhecido pela Câmara de Recurso, os sinais CALSYN e GALZIN são desprovidos de significado conceptual para o consumidor médio, pelo que as duas marcas em conflito são fortemente distintivas. A recorrente invoca a jurisprudência do Tribunal de Justiça e do Tribunal de Primeira Instância segundo a qual o risco de confusão é tanto maior quanto o carácter distintivo do sinal é importante. Ao reconhecer que a marca CALSYN é arbitrária e distintiva, a Câmara de Recurso devia ter atribuído mais importância às semelhanças globais do que às diferenças de pormenores. Ora, a Câmara de Recurso procedeu exactamente ao contrário.

43      A este respeito, a recorrente censura à Câmara de Recurso ter incorrectamente centrado a sua análise nas diferenças de pormenores, visuais e fonéticas, entre as duas marcas, quando devia ter comparado o impacto visual, fonético e conceptual das duas marcas no seu conjunto.

44      Quanto à comparação visual, a recorrente observa que os dois sinais partilham do mesmo número de letras e apresentam uma semelhança manifesta, na medida em que as letras em comum «a», «l» e «n» se encontram na mesma ordem. A este respeito, acusa a Câmara de Recurso de não ter tido em conta as semelhanças visuais entre as letras maiúsculas «C» e «G», que apenas se diferenciam por um pequeno traço horizontal que pode ser facilmente ocultado quando a letra «G» é manuscrita. Do mesmo modo, as letras «s» e «z» são visualmente muito semelhantes, na medida em que têm simplesmente a forma geométrica invertida.

45      Quanto à comparação fonética, a recorrente acusa a Câmara de Recurso por esta ter efectuado uma análise subtil das diferenças de pormenores entre os dois sinais, que o público de referência não é capaz de distinguir. Considera que a sonoridade das letras «c» e «g» é muito próxima e não é necessariamente perceptível, designadamente por públicos que não possuem faculdades auditivas normais ou por públicos idosos ou estrangeiros. O mesmo acontece com as letras «s» e «z».

46      Por outro lado, a recorrente acusa a Câmara de Recurso de ter concluído arbitrariamente que os fonemas «yn» e «in» se pronunciam de forma diferente. Observa que a combinação «yn» é pouco conhecida na língua francesa, em que a letra «y» é equiparada, foneticamente, à letra «i», pelo que o público, excepto a minoria que conhece a língua inglesa ou as regras fonéticas invocadas pelo IHMI, pronuncia instintivamente «yn» como «in». Assim, as únicas diferenças de «pressão de ar» entre, respectivamente, as letras «c» e «g» e «z» e «s» e, eventualmente, de pronúncia entre «yn» e «in» não eliminam as semelhanças fonéticas globais entre as duas marcas.

47      Por último, a recorrente afirma que a comparação global deve ter em conta o facto de as percepções visuais e fonéticas não poderem ser examinadas separadamente uma da outra na medida em que a mente humana, para pronunciar uma palavra, sobretudo uma palavra arbitrária, se esforça por visualizá‑la mentalmente, sendo o contrário igualmente verdadeiro. Assim, a sua grande semelhança fonética conduz a uma memorização visual e, portanto, a uma reprodução muito próxima da grafia das duas marcas pelo consumidor que não as tenha simultaneamente à sua frente. Do mesmo modo, uma forte semelhança visual conduz a uma pronúncia próxima quando o consumidor recorre à sua memória visual.

48      Em conclusão, a recorrente alega que a Câmara de Recurso devia ter concluído que as semelhanças entre os dois sinais prevaleciam sobre as diferenças e que, não obstante as indicações terapêuticas diferentes, os produtos deviam ser considerados semelhantes.

49      Em primeiro lugar, o IHMI indica que partilha da opinião da recorrente e da Câmara de Recurso quanto à determinação do público‑alvo, a saber, os profissionais da saúde e o público em geral em França.

50      Em segundo lugar, o IHMI analisa a semelhança dos produtos. A este respeito, refere que, em conformidade com as directivas relativas ao processo de oposição, os produtos farmacêuticos são, de um modo geral, considerados como sendo muito semelhantes aos outros produtos farmacêuticos, ainda que o grau de semelhança possa ser inferior se as indicações farmacêuticas forem claramente diferentes.

51      No caso em apreço, os produtos designados pela marca anterior CALSYN para os quais foi demonstrada a utilização são produtos farmacêuticos à base de cálcio. Resulta das provas da utilização que o produto CALSYN é uma solução injectável à base de calcitonina, vendida unicamente mediante receita («Lista II») e ministrada aos pacientes, em particular, em caso de hipercalcémia (deficiências de cálcio e descalcificação progressiva dos ossos) e para tratar as doenças que atacam os ossos (em particular, a doença de Paget, uma doença do esqueleto humano que provoca a deformação dos ossos).

52      Os produtos farmacêuticos para o tratamento da doença de Wilson designados no pedido em causa destinam‑se ao tratamento de uma doença genética hereditária rara que provoca uma acumulação de cobre no organismo. Estes produtos são prescritos pelos médicos e fornecidos mediante receita devido às suas indicações terapêuticas muito especiais.

53      Em conclusão, o IHMI afirma que os produtos em causa são semelhantes devido à sua natureza de produtos farmacêuticos, mas num grau atenuado tendo em conta as suas indicações terapêuticas diferentes. A apreciação que, a este respeito, a Câmara de Recurso efectuou é, portanto, correcta.

54      Em terceiro lugar, o IHMI efectua uma comparação dos sinais nos planos visual, fonético e conceptual.

55      Quanto à comparação visual, observa que existem semelhanças visuais entre os sinais em conflito, uma vez que partilham o mesmo número de letras (seis), das quais três são idênticas e estão colocadas na mesma ordem e na mesma posição («a», «l» e «n»), e que as letras maiúsculas «G» e «C» e as letras «z» e «s» apresentam semelhanças. Todavia, a letra «y» da marca anterior diferencia os sinais, como refere a Câmara de Recurso.

56      No plano fonético, o IHMI alega que os dois sinais são dissilábicos e que as sílabas «cal» e «gal», bem como «zin» e «syn», são muito próximas. As desinências «in» e «yn» podem ser indiferentemente pronunciadas em francês [in] (como em «sinistre», «sinusite», ou «synonyme», «synergie») ou ainda [ë] (como em «sincère», «singe», «lapin» ou «synthèse», «syndicat»), dado que a vogal «y» segue as mesmas regras que a vogal «i». O IHMI remete para o Tribunal de Primeira Instância a tarefa de se pronunciar sobre a análise fonética efectuada pela Câmara de Recurso.

57      No que respeita, à comparação conceptual dos sinais, o IHMI afirma que, como refere a Câmara de Recurso, as marcas não têm significado para o público pertinente, pelo que não se pode retirar qualquer conclusão a este respeito.

58      Devido às semelhanças visuais e fonéticas referidas, o IHMI conclui pela semelhança global dos sinais.

59      Em quarto lugar, o IHMI procede a uma apreciação global do risco de confusão. A este respeito, refere, antes de mais, a jurisprudência segundo a qual um reduzido grau de semelhança entre os produtos ou serviços designados pode ser compensado por um elevado grau de semelhança entre as marcas, e inversamente. Segundo o IHMI, para fins da apreciação do risco de confusão, o consumidor médio que se deve tomar em consideração presume‑se estar normalmente informado e ser razoavelmente atento e avisado. No entanto, deve ter‑se em conta o facto de o nível de atenção do consumidor médio ser susceptível de variar em função da categoria de produtos ou serviços em causa.

60      A seguir, o IHMI expõe que, em regra, o consumidor médio é mais atento em relação a produtos farmacêuticos sujeitos a receita do que quanto aos de venda livre, dependendo, além disso, a sua atenção da indicação terapêutica do produto. No caso em apreço, o IHMI alega que os produtos farmacêuticos em causa estão sujeitos a receita, pelo que se pode considerar, com a Câmara de Recurso, que o grau de atenção dos consumidores é bastante elevado.

61      Em conclusão, o IHMI remete para o Tribunal de Primeira Instância a tarefa de apreciar se a semelhança dos sinais e dos produtos é susceptível de produzir um risco de confusão no espírito dos consumidores em França.

 Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

62      Nos termos do artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, após oposição do titular de uma marca anterior, o pedido de registo de marca será recusado «[q]uando, devido à sua identidade ou semelhança com a marca anterior e devido à identidade ou semelhança dos produtos ou serviços designados pelas duas marcas, exista risco de confusão no espírito do público do território onde a marca anterior está protegida; o risco de confusão compreende o risco de associação com a marca anterior». Por outro lado, por força do artigo 8.°, n.° 2, alínea a), ii), do Regulamento n.° 40/94, consideram‑se marcas anteriores as marcas registadas num Estado‑Membro cuja data de depósito seja anterior à do pedido de marca comunitária.

63      O risco de confusão no espírito do público, que se define como o risco de que o público possa crer que os produtos ou serviços em causa provêm da mesma empresa ou, eventualmente, de empresas ligadas economicamente, deve ser apreciado globalmente, atentos todos os factores relevantes do caso em apreço [acórdãos do Tribunal de Justiça de 29 de Setembro de 1998, Canon, C‑39/97, Colect., p. I‑5507, n.os 16 e 29, e de 22 de Junho de 1999, Lloyd Schuhfabrik Meyer, C‑342/97, Colect., p. I‑3819, n.os 17 e 18; acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 23 de Outubro de 2002, Oberhauser/IHMI – Petit Liberto (Fifties), T‑104/01, Colect., p. II‑4359, n.os 25 e 26].

64      Esta apreciação global implica uma certa interdependência entre os factores tomados em conta, nomeadamente a semelhança das marcas e a dos produtos ou serviços designados. Assim, um reduzido grau de semelhança entre os produtos ou serviços designados pode ser compensado por um elevado grau de semelhança entre as marcas, e inversamente (acórdãos Canon, já referido, n.° 17; Lloyd Schuhfabrik Meyer, já referido, n.° 19; e Fifties, já referido, n.° 27).

65      No caso em apreço, a marca anterior está registada em França. Por conseguinte, para efeitos da aplicação do artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, importa tomar como referência a percepção do público francês.

66      Além disso, na medida em que os produtos em causa são produtos farmacêuticos, o público pertinente é constituído, por um lado, por profissionais do sector médico e, por outro, por pacientes, enquanto consumidores finais [acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 22 de Setembro de 2005, Alcon/IHMI – Biofarma (TRAVATAN), T‑130/03, Colect., p. II‑3859, n.° 49, e de 17 de Novembro de 2005, Biofarma/IHMI – Bauch & Lomb Pharmaceuticals (ALREX), T‑154/03, Colect., p. II‑4743, n.° 46].

67      A este respeito, devem rejeitar‑se as alegações da recorrente segundo as quais a Câmara de Recurso se absteve de definir o público‑alvo. Com efeito, resulta claramente do n.° 10 da decisão recorrida que a Câmara de Recurso declarou, após fazer referência ao consumidor francês, que o público inclui «simultaneamente os consumidores de medicamentos e os profissionais da medicina». Por conseguinte, o Tribunal de Primeira Instância considera que a Câmara de Recurso definiu correctamente o público pertinente.

68      Quanto à semelhança dos produtos em causa, importa ter em conta todos os factores pertinentes que caracterizam a relação entre os produtos, incluindo estes factores, em especial, a sua natureza, destino, utilização, bem como o seu carácter concorrente ou complementar (acórdão Canon, já referido, n.° 23).

69      No caso em apreço, importa referir que a Câmara de Recurso considerou, no essencial, que os produtos em conflito eram ambos produtos farmacêuticos e, por isso, semelhantes, residindo as suas diferenças no facto de terem indicações terapêuticas diferentes. Ora, é também o que a recorrente admite ao assinalar, por um lado, que os produtos farmacêuticos deviam, a priori, ser considerados semelhantes e, por outro, que os produtos em causa foram concebidos para patologias diferentes. Resulta dos articulados da recorrente que esta apenas rejeita a apreciação da Câmara de Recurso relativamente ao grau de semelhança existente.

70      A este respeito, basta referir que os produtos em causa têm a mesma natureza (produtos farmacêuticos), a mesma finalidade ou destino (tratamento de problemas de saúde humana), dirigem‑se aos mesmos consumidores (profissionais do sector médico e pacientes), usam os mesmos canais de distribuição (em regra, as farmácias) e apresentam um carácter potencialmente complementar. Em contrapartida, a diferença entre eles reside no facto de terem indicações terapêuticas diferentes.

71      Nestas circunstâncias, deve considerar‑se que os elementos de semelhança entre os produtos primam sobre os elementos de diferença e concluir que existe, como afirmou correctamente a Câmara de Recurso na decisão recorrida, um certo grau de semelhança entre os produtos em causa.

72      No que respeita à semelhança visual, fonética ou conceptual das marcas em causa, a apreciação global do risco de confusão deve basear‑se na impressão de conjunto produzida por estas, atendendo, em especial, aos seus elementos distintivos e dominantes [v. acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 14 de Outubro de 2003, Phillips‑Van Heusen/IHMI – Pash Textilvertrieb und Einzelhandel (BASS), T‑292/01, Colect., p. II‑4335, n.° 47 e jurisprudência aí referida].

73      Antes de mais, quanto à comparação conceptual, deve referir‑se que a Câmara de Recurso considerou que as marcas em conflito eram desprovidas de sentido para o consumidor médio e que esta conclusão não foi posta em causa pela recorrente. A este respeito, o Tribunal de Primeira Instância entende que a análise da Câmara de Recurso está correcta e que os sinais em conflito não possuem qualquer significado.

74      Em seguida, no plano visual, o Tribunal de Primeira Instância assinala que os dois sinais são meramente nominativos e partilham do mesmo número de letras (seis), das quais três são idênticas e se encontram na mesma ordem e posição («a», «l» e «n»). O Tribunal de Primeira Instância observa também que as letras maiúsculas «C» e «G» apresentam semelhanças, pelo que não é certo que a primeira letra de cada um dos sinais possa atrair o olhar do consumidor. Além disso, contrariamente ao considerado pela Câmara de Recurso, o Tribunal de Primeira Instância observa que as letras «s» e «z» também apresentam semelhanças. É certo, como refere a Câmara de Recurso, que a letra «y» da marca anterior atrai a atenção por se tratar de uma letra pouco corrente na língua francesa. No entanto, esta particularidade não permite, por si só, diferenciar de modo significativo os dois sinais. O Tribunal de Primeira Instância conclui, assim, que os dois sinais são globalmente semelhantes no plano visual.

75      Por último, relativamente à comparação fonética, o Tribunal de Primeira Instância sublinha que os dois sinais são dissilábicos e que as primeiras sílabas «cal» e «gal» de cada um destes são pronunciadas de forma semelhante, uma vez que a sonoridade das consonantes «c» e «g» é muito próxima. Além disso, contrariamente às afirmações da Câmara de Recurso, o Tribunal de Primeira Instância observa que, em francês, os fonemas «yn» e «in» são frequentemente pronunciados da mesma forma. Por conseguinte, o Tribunal de Primeira Instância considera que a Câmara de Recurso cometeu um erro de apreciação ao concluir que os sinais em conflito diferiam no plano fonético.

76      Atendendo às considerações precedentes, o Tribunal de Primeira Instância considera que os dois sinais são globalmente semelhantes e, consequentemente, que a Câmara de Recurso cometeu um erro de apreciação ao admitir que os sinais em conflito eram diferentes, em particular no plano fonético.

77      No que respeita à apreciação global do risco de confusão, o Tribunal de Primeira Instância observa que a Câmara de Recurso considerou que, embora exista um certo grau de semelhança entre os produtos e entre as marcas, este é insuficiente para criar um risco de confusão entre os produtos postos à venda sob cada uma dessas marcas. Para chegar a esta conclusão, a Câmara de Recurso considerou, designadamente, que, dada a natureza dos produtos, o público, que engloba tanto os consumidores de medicamentos como os profissionais da medicina, presta uma atenção especial aos sinais que identificam os produtos.

78      A este respeito, importa recordar que decorre de uma jurisprudência constante que, para efeitos desta apreciação global, é suposto que o consumidor médio da categoria de produtos em causa esteja normalmente informado e razoavelmente atento e avisado. Segundo esta mesma jurisprudência, importa igualmente tomar em consideração o facto de que o nível de atenção do consumidor médio é susceptível de variar em função da categoria de produtos ou serviços em causa (acórdão Lloyd Schuhfabrik Meyer, já referido, n.° 26).

79      O Tribunal de Primeira Instância entende que o nível de atenção do consumidor médio de produtos farmacêuticos deve ser determinado caso a caso, em função das circunstâncias do caso e, designadamente, das indicações terapêuticas dos produtos em questão. Do mesmo modo, o Tribunal de Primeira Instância considera que, no caso dos medicamentos sujeitos a receita médica, como os examinados no caso em apreço, esse nível de atenção é geralmente mais elevado na medida em que os mesmos são receitados por um médico e, em seguida, verificados por um farmacêutico que os fornece aos consumidores.

80      No entanto, a circunstância de o público pertinente ser composto por pessoas cujo grau de atenção pode ser considerado elevado não é suficiente, tendo em conta a semelhança existente entre os produtos e os sinais em conflito, para excluir que o público possa crer que estes produtos provêm da mesma empresa ou, eventualmente, de empresas ligadas economicamente. O Tribunal de Primeira Instância sublinha que a conclusão relativa à ausência de risco de confusão, a que a Câmara de Recurso chegou, assenta numa premissa errada, a saber, a de que os sinais apresentavam diferenças significativas, designadamente de um ponto de vista fonético, e essas diferenças eram susceptíveis de compensar o grau de semelhança existente entre os produtos. Ora, esta apreciação não pode ser aceite dado que, como se expôs nos n.os 74 e 75 supra, os sinais em conflito apresentam fortes semelhanças visuais e fonéticas.

81      Nestas circunstâncias, o Tribunal de Primeira Instância considera, contrariamente à solução adoptada na decisão recorrida, que, do ponto de vista da impressão global, atenta a semelhança dos produtos em causa e as semelhanças visuais e fonéticas das duas marcas, as diferenças existentes entre estas não são suficientes para afastar a existência de um risco de confusão na percepção do público pertinente.

82      Decorre do conjunto das considerações precedentes que o segundo fundamento da recorrente, destinado a obter a declaração de que a Câmara de Recurso violou o artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, deve ser acolhido. Consequentemente, há que anular a decisão recorrida.

 Quanto às despesas

Por força do disposto no artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo o IHMI sido vencido, na medida em que a decisão recorrida é anulada, há que o condenar nas despesas efectuadas pela recorrente, em conformidade com o pedido desta.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quinta Secção)

decide:

1)      A decisão da Quarta Câmara de Recurso do Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI) de 7 de Setembro de 2004 (processo R 295/2003‑4) é anulada.

2)      O IHMI suportará as suas próprias despesas, bem como as da recorrente.

Vilaras

Martins Ribeiro

Jürimäe

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 17 de Outubro de 2006.

O secretário

 

      O presidente

E. Coulon

 

      M. Vilaras


* Língua do processo: francês.