Language of document : ECLI:EU:T:2024:292

Edição provisória

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Terceira Secção Alargada)

8 de maio de 2024 (*)

«Desenho ou modelo comunitário — Processo de declaração de nulidade — Desenho ou modelo comunitário registado que representa um sapato — Desenhos ou modelos comunitários anteriores — Causas de nulidade — Caráter singular — Artigos 25.°, n.° 1, alínea b), e 6.°, n.° 1, do Regulamento (CE) n.° 6/2002»

No processo T‑758/22,

Puma SE, com sede em Herzogenaurach (Alemanha), representada por M. Schunke e P. Trieb, avocats,

recorrente,

contra

Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia (EUIPO), representado por J. Ivanauskas, na qualidade de agente,

recorrido,

sendo a outra parte no processo na Câmara de Recurso do EUIPO:

Fujian Daocheng Electronic Commerce Co. Ltd, com sede em Quanzhou (China),

O TRIBUNAL GERAL (Terceira Secção Alargada),

composto por: F. Schalin (relator), presidente, P. Škvařilová‑Pelzl, I. Nõmm, G. Steinfatt e D. Kukovec, juízes,

secretário: A. Juhász‑Tóth, administradora,

vistos os autos,

após a audiência de 18 de outubro de 2023,

profere o presente

Acórdão

1        Por meio do seu recurso interposto ao abrigo do artigo 263.° TFUE, a recorrente, a Puma SE, pede a anulação da Decisão da Terceira Câmara de Recurso do Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia (EUIPO) de 21 de setembro de 2022 (processo R 1876/2021‑3) (a seguir «decisão impugnada»).

 Antecedentes do litígio

2        Em 1 de abril de 2021, a recorrente apresentou ao EUIPO um pedido de declaração de nulidade do desenho ou modelo comunitário registado na sequência de um pedido apresentado pela Fujian Daocheng Electronic Commerce Co. Ltd em 23 de dezembro de 2020 e que é representado nas seguintes imagens:

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3        O produto em que o desenho ou modelo controvertido se destina a ser incorporado pertencia à classe 02.04 na aceção do Acordo de Locarno, de 8 de outubro de 1968, que estabelece uma Classificação Internacional para os Desenhos e Modelos Industriais, conforme alterado, e correspondia à seguinte descrição: «Calçado».

4        A causa invocada em apoio do pedido de declaração de nulidade foi a prevista no artigo 25.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento (CE) n.° 6/2002 do Conselho, de 12 de dezembro de 2001, relativo aos desenhos ou modelos comunitários (JO 2002, L 3, p. 1), lido em conjugação com o artigo 6.°, n.° 1, do mesmo regulamento.

5        O pedido de declaração de nulidade baseou‑se na falta de caráter singular do desenho ou modelo controvertido, tendo em conta, nomeadamente, os desenhos ou modelos anteriores e os produtos a seguir representados:

–        o desenho ou modelo anterior n.° 1286116‑0005 (a seguir «D 1»):

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–        o desenho ou modelo anterior n.° 1286116‑0006 (a seguir «D 2»):

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–        o desenho ou modelo anterior n.° 1286116‑0003 (a seguir «D 3»):

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–        o desenho ou modelo anterior n.° 1286116‑0002 (a seguir «D 4»):

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–        o desenho ou modelo anterior n.° 1286116‑0001 (a seguir «D 5»):

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–        o produto «NRGY v2» da marca PUMA que figura no catálogo «Run/Train/Fit A/W 2016» (a seguir «D 6»):

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–        o produto «Mega NRGY Knit» apresentado no catálogo «Run/Train/Fit A/W 2017» (a seguir «D 7»):

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6        Em 10 de setembro de 2021, a Divisão de Anulação indeferiu o pedido de declaração de nulidade do desenho ou modelo controvertido com o fundamento de que este último apresentava caráter singular.

7        Em 8 de novembro de 2021, a recorrente interpôs recurso no EUIPO contra a decisão da Divisão de Anulação.

8        Através da decisão impugnada, a Câmara de Recurso negou provimento ao recurso. Primeiro, a Câmara de Recurso considerou, em substância, que os desenhos ou modelos anteriores D 1 a D 7 tinham sido divulgados ao público na aceção do artigo 7.°, n.° 1, do Regulamento n.° 6/2002. Segundo, no que respeita à definição de utilizador informado na aceção do artigo 6.° do Regulamento n.° 6/2002, considerou que o utilizador era uma pessoa que comprava habitualmente sapatos e que demonstrava um nível de atenção relativamente elevado. Terceiro, no que respeita à liberdade de criação, salientou que o criador dispunha de um elevado grau de liberdade relativamente à criação de calçado e, mais especificamente, relativamente à estrutura, à forma, ao material, à cor, aos padrões e aos elementos decorativos. Quarto, no que respeita à impressão global, considerou que o desenho ou modelo controvertido e os desenhos ou modelos anteriores D 1 a D 7 suscitavam uma impressão global diferente no utilizador informado. Por conseguinte, a Câmara de Recurso concluiu que não havia que declarar nulo o desenho ou modelo controvertido ao abrigo do artigo 25.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 6/2002, lido em conjugação com o artigo 6.°, n.° 1, do mesmo regulamento.

 Pedidos das partes

9        A recorrente conclui pedindo ao Tribunal Geral que se digne:

–        anular a decisão impugnada e declarar nulo o desenho ou modelo controvertido;

–        condenar o EUIPO nas despesas, incluindo nas despesas efetuadas na Câmara de Recurso.

10      O EUIPO conclui pedindo ao Tribunal Geral que se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar a recorrente nas despesas em caso de realização de uma audiência.

 Questão de direito

 Quanto à segunda parte do primeiro pedido da recorrente

11      Com a segunda parte do primeiro pedido, a recorrente pede ao Tribunal Geral que declare nulo o desenho ou modelo controvertido.

12      A este respeito, há que considerar que, com este pedido, a recorrente formulou, ao abrigo do artigo 61.°, n.° 3, do Regulamento n.° 6/2002, um pedido de reforma para que o Tribunal Geral adotasse a decisão que a Câmara de Recurso deveria ter tomado [v., neste sentido, Acórdão de 7 de fevereiro de 2018, Şölen Çikolata Gıda Sanayi ve Ticaret/EUIPO — Zaharieva (Embalagens para cones de gelados), T‑794/16, não publicado, EU:T:2018:70, n.° 84 e jurisprudência referida].

 Quanto ao mérito

13      A recorrente invoca um fundamento único, relativo à violação do artigo 25.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 6/2002, lido em conjugação com o artigo 6.°, n.° 1, do mesmo regulamento, uma vez que, em substância, a Câmara de Recurso não respeitou o âmbito da proteção dos desenhos ou modelos anteriores e concluiu, erradamente, pelo caráter singular do desenho ou modelo controvertido.

14      Por força do artigo 25.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 6/2002, um desenho ou modelo comunitário pode ser declarado nulo se não preencher os requisitos dos artigos 4.° a 9.° deste regulamento e, designadamente, os requisitos relativos à novidade e à singularidade.

15      Segundo o artigo 6.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 6/2002, considera‑se que o desenho ou modelo comunitário registado possui caráter singular se a impressão global que suscita no utilizador informado diferir da impressão global suscitada nesse utilizador por qualquer desenho ou modelo divulgado ao público antes da data de depósito do pedido de registo.

16      A apreciação do caráter singular de um desenho ou modelo comunitário resulta, em substância, de um exame de quatro fases. Este exame consiste em determinar, primeiro, o setor dos produtos nos quais o desenho ou modelo se destina a ser incorporado ou aos quais se destina a ser aplicado; segundo, o utilizador informado dos referidos produtos consoante a sua finalidade e, com referência a este utilizador informado, o grau de conhecimento técnico anterior e o nível de atenção às semelhanças e diferenças na comparação dos desenhos ou modelos; terceiro, o grau de liberdade do criador na elaboração do desenho ou modelo, cuja influência é inversamente proporcional; e, quarto, o resultado da comparação, direta se possível, das impressões globais suscitadas no utilizador informado pelo desenho ou modelo controvertido e por qualquer desenho ou modelo anterior divulgado ao público, considerado individualmente [v. Acórdão de 13 de junho de 2019, Visi/one/EUIPO — EasyFix (Suporte de cartazes para veículos), T‑74/18, EU:T:2019:417, n.° 66 e jurisprudência referida].

17      É à luz destes princípios que importa examinar se, no caso em apreço, a Câmara de Recurso considerou corretamente que o desenho ou modelo controvertido apresentava caráter singular.

 Quanto à divulgação dos desenhos ou modelos anteriores, ao utilizador informado e ao grau de liberdade do criador

18      Antes de mais, no que respeita à divulgação dos desenhos ou modelos anteriores, a Câmara de Recurso considerou, em substância, no n.° 25 da decisão impugnada, que resultava, por um lado, das impressões da base de dados do EUIPO «eSearch», relativamente aos desenhos ou modelos anteriores D 1 a D 5, e, por outro, de excertos de catálogos, relativamente aos desenhos ou modelos anteriores D 6 e D 7, que tinham sido suficientemente divulgados para ser tidos em conta na apreciação da validade do desenho ou modelo controvertido.

19      Em seguida, a Câmara de Recurso observou, no n.° 27 da decisão impugnada, que o desenho ou modelo controvertido se destinava a ser aplicado em sapatos e que, por conseguinte, devido ao seu interesse nestes últimos, o utilizador informado demonstrava um nível de atenção relativamente elevado no momento da sua utilização.

20      Por último, no n.° 30 da decisão impugnada, a Câmara de Recurso considerou que o grau de liberdade do criador era elevado uma vez que só era limitado pelo facto de o calçado ter de seguir a ergonomia dos pés, ser robusto, permitir manter uma postura estável e ser confortável e seguro para o utilizador. No entanto, o criador é livre para escolher, designadamente, a forma, o material, a cor, os padrões e os elementos decorativos.

21      Há que confirmar estas conclusões da Câmara de Recurso, que parecem corretas à luz dos elementos que figuram nos autos do processo e que, além disso, não são contestadas pelas partes.

 Quanto aos elementos relevantes dos desenhos ou modelos em causa

22      A recorrente alega que os desenhos ou modelos anteriores D 1 a D 5 estão registados com a indicação «solas de calçado» e que a representação gráfica do resto do sapato, que aparece a tracejado nestes desenhos ou modelos anteriores, está presente apenas para indicar ao observador de que forma a sola está ligada ao resto do sapato. Por conseguinte, a comparação do desenho ou modelo controvertido com os desenhos ou modelos anteriores D 1 a D 5 só pode ser feita com base nas solas do calçado que são o seu elemento essencial, uma vez que, de outro modo, a proteção destes elementos ficaria sem efeito.

23      O EUIPO contesta os argumentos da recorrente.

24      No caso em apreço, a recorrente contesta o facto de, no âmbito da comparação das impressões globais dos desenhos ou modelos em causa, a parte superior do desenho ou modelo controvertido, por um lado, e os elementos a tracejado presentes nos desenhos ou modelos anteriores D 1 a D 5, por outro, terem sido tomados em consideração. Importa examinar sucessivamente estas duas alegações para determinar os elementos relevantes a ter em conta no âmbito da comparação das impressões globais dos desenhos ou modelos em causa.

–       Quanto aos elementos relevantes a ter em conta no desenho ou modelo controvertido

25      Importa recordar que, ao abrigo do artigo 6.° do Regulamento n.° 6/2002, a comparação da impressão global produzida pelos desenhos ou modelos em conflito deve ser efetuada à luz da aparência geral de cada um desses desenhos ou modelos (Acórdão de 28 de outubro de 2021, Ferrari, C‑123/20, EU:C:2021:889, n.° 46).

26      No entanto, nos termos do artigo 25.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 6/2002, lido em conjugação com o artigo 6.° do referido regulamento, a comparação das impressões globais suscitadas pelos desenhos ou modelos em conflito deve ter por base as características divulgadas do desenho ou modelo controvertido e deve incidir unicamente sobre as características protegidas desse desenho ou modelo, sem tomar em consideração as características, nomeadamente técnicas, excluídas da proteção [v., neste sentido, Acórdão de 10 de novembro de 2021, Eternit/EUIPO — Eternit Österreich (Painel de construção), T‑193/20, EU:T:2021:782, n.° 72 e jurisprudência referida].

27      A este respeito, o facto de o desenho ou modelo anterior divulgar elementos suplementares que não estão presentes no desenho ou modelo controvertido é irrelevante para a comparação dos desenhos ou modelos em causa [v., neste sentido, Acórdãos de 21 de junho de 2018, Haverkamp IP/EUIPO — Sissel (Motivos em relevo de uma praia de seixos), T‑228/16, não publicado, EU:T:2018:369, n.° 38, e de 10 de novembro de 2021, Painel de construção, T‑193/20, EU:T:2021:782, n.° 82 e jurisprudência referida].

28      Assim, para efetuar a comparação entre os desenhos ou modelos em conflito, há que determinar quais são os elementos efetivamente protegidos pelo desenho ou modelo controvertido e que são, por conseguinte, relevantes a este respeito (Acórdão de 21 de junho de 2018, Motivos em relevo de uma praia de seixos, T‑228/16, não publicado, EU:T:2018:369, n.° 37).

29      No caso em apreço, há que constatar que o desenho ou modelo controvertido foi registado com a indicação «calçado» e que apresenta diferentes perspetivas de um modelo completo do sapato, como resulta do n.° 2, supra.

30      Por conseguinte, tendo em conta a jurisprudência referida nos n.os 25 a 28, supra, importa, a título da comparação entre o desenho ou modelo controvertido e os desenhos ou modelos anteriores, ter em conta todos os elementos efetivamente protegidos pelo desenho ou modelo controvertido, que representa um sapato completo composto simultaneamente pela sola e pela parte superior do sapato.

31      Assim, uma comparação entre os desenhos ou modelos em causa não se pode limitar apenas à comparação da aparência da sola do desenho ou modelo controvertido com a sola presente nos desenhos ou modelos anteriores D 1 a D 5, que é a única parte protegida dos mesmos.

32      A recorrente alega que tal solução tem como consequência pôr em causa a proteção como desenho ou modelo de apenas uma parte de um produto. No entanto, há que salientar que a apreciação da causa de nulidade referida no artigo 25.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 6/2002, contrariamente ao previsto no artigo 25.°, n.° 1, alínea e), do mesmo regulamento ou contrariamente a um processo por contrafação, não se inscreve numa lógica de proteção de um direito anterior. Com efeito, a causa de nulidade prevista no artigo 25.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 6/2002 consiste apenas em determinar se o desenho ou modelo controvertido preenche os requisitos de registo previstos nos artigos 4.° a 9.° do mesmo regulamento.

33      Ora, ter por base as características protegidas do desenho ou modelo anterior, como desejaria a recorrente, em vez das do desenho ou modelo controvertido, equivaleria a excluir da comparação elementos do desenho ou modelo controvertido que estão protegidos. Isso teria como consequência a não verificação de que o referido desenho ou modelo preenche, no seu conjunto, os requisitos de proteção, o que, por conseguinte, é contrário ao artigo 4.° do Regulamento n.° 6/2002.

34      Por outro lado, no que respeita ao argumento da recorrente segundo o qual a sola é o elemento essencial de um sapato, importa recordar que, segundo a jurisprudência, não está excluído que, no momento da comparação de desenhos ou modelos, a impressão global suscitada por cada um deles possa ser dominada por determinadas características dos produtos ou das partes dos produtos em causa. Para verificar se uma determinada característica domina um produto, ou uma parte dele, é necessário avaliar a influência mais ou menos acentuada que as diferentes características do produto ou da parte em causa exercem sobre a aparência desse produto ou dessa parte [v., neste sentido, Acórdão de 25 de outubro de 2013, Merlin e o./IHMI — Dusyma (Jogos), T‑231/10, não publicado, EU:T:2013:560, n.° 36].

35      Ora, importa salientar, à semelhança do EUIPO, que a recorrente não indicou por que razão a sola devia ser considerada o elemento essencial de um sapato, que, por si só, podia constituir a base da comparação. Além disso, admitindo que, de um ponto de vista puramente técnico, seja esse o caso, esta constatação é irrelevante no âmbito da proteção de um desenho ou modelo, uma vez que, contrariamente às patentes, é apenas a aparência que está protegida.

36      No caso em apreço, não há razão para considerar que, de um ponto de vista puramente visual, a sola constitui para o utilizador informado uma característica predominante em relação ao resto do sapato. No máximo, a sola tem tanta importância como a parte superior na impressão visual do sapato no seu todo.

37      Assim, à luz da jurisprudência referida no n.° 34, supra, não há que considerar que a impressão global entre os desenhos ou modelos em causa é dominada pela aparência das solas.

–       Quanto aos elementos relevantes a ter em conta nos desenhos ou modelos anteriores D 1 a D 5

38      Embora não sejam vinculativas, as orientações do EUIPO relativas ao exame dos pedidos de desenhos ou modelos comunitários registados constituem uma fonte de referência sobre a prática do EUIPO em matéria de desenho ou modelo [v., por analogia, Acórdão de 8 de junho de 2022, Muschaweck/EUIPO — CONZE (UM), T‑293/21, EU:T:2022:345, n.° 38]. A este respeito, o ponto 5.4 das referidas diretivas, na sua versão aplicável em 31 de março de 2023, dispõe o seguinte:

«[O]s identificadores indicam que não foi reivindicada proteção nem foi concedido registo para algumas características do desenho ou modelo mostrado na representação. Indicam, portanto, aquilo que não se pretende proteger. Isto pode ser obtido[, nomeadamente,] excluindo com linhas tracejadas, imagem desfocada ou sombreado de cores as características do desenho ou modelo para o qual a proteção não é reivindicada [....]»

39      No caso em apreço, os desenhos ou modelos anteriores D 1 a D 5 estão registados com a indicação do produto «solas de calçado» e reproduzem, como resulta do n.° 5, supra, a aparência de uma sola do sapato com, a tracejado, a aparência de uma parte superior do sapato. Há que observar que não foi reivindicada nenhuma proteção para a parte superior que figura a tracejado.

40      Ora, como resulta da jurisprudência referida no n.° 26, supra, a comparação das impressões globais suscitadas pelos desenhos ou modelos em conflito deve ter como base as características divulgadas e protegidas do desenho ou modelo controvertido, as quais incluem a aparência de uma sola e de uma parte superior do sapato.

41      Por conseguinte, há que determinar se a aparência da parte superior do sapato dos desenhos ou modelos anteriores D 1 a D 5 pode também ser tida em consideração no momento da comparação das impressões globais suscitadas pelos desenhos ou modelos em conflito, apesar de não se tratar de características para as quais foi reivindicada uma proteção.

42      A este respeito, resulta do considerando 14 do Regulamento n.° 6/2002 que a apreciação do caráter singular de um desenho ou modelo ao abrigo do artigo 25.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 6/2002, lido em conjugação com o artigo 6.° do mesmo regulamento, deve basear‑se na diferença clara entre a impressão global suscitada pelo desenho ou modelo num utilizador informado que o observe e a impressão nele suscitada pelo património de desenhos ou modelos [Acórdão de 16 de junho de 2021, Davide Groppi/EUIPO — Viabizzuno (Candeeiro de mesa), T‑187/20, EU:T:2021:363, n.° 25].

43      Com efeito, no âmbito do exame da causa de nulidade referida no artigo 25.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 6/2002, lido em conjugação com o artigo 6.° do mesmo regulamento, o desenho ou modelo anterior tem por única função revelar o estado da arte anterior. Este corresponde ao património de desenhos ou modelos relativos ao produto em causa que foram divulgados na data do depósito do desenho ou modelo em questão. Ora, a pertença de um desenho ou modelo anterior ao referido património decorre unicamente da sua divulgação (v. Acórdão de 16 de junho de 2021, Candeeiro de mesa, T‑187/20, EU:T:2021:363, n.° 26 e jurisprudência referida).

44      Assim, para determinar se os elementos de um desenho ou modelo anterior podem ser tidos em conta, não é necessário ter em consideração o objeto da proteção desse desenho ou modelo, mas apenas a questão de saber se estes elementos foram divulgados.

45      A este respeito, o artigo 7.°, n.° 1, do Regulamento n.° 6/2002 dispõe que se considera que um desenho ou modelo foi divulgado ao público se tiver sido divulgado na sequência do depósito do pedido de registo ou em qualquer outra circunstância, apresentado numa exposição e utilizado no comércio ou divulgado de qualquer outro modo, antes da data mencionada no artigo 6.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 6/2002, exceto se estes factos não puderem razoavelmente ter chegado ao conhecimento dos meios especializados do setor em causa que operam na União Europeia pelas vias normais e no decurso da sua atividade corrente.

46      Além disso, para que a divulgação ao público de um desenho ou modelo implique a divulgação de todos os seus elementos, é indispensável que estes se revelem de forma clara e precisa no momento dessa divulgação (v., neste sentido, Acórdão de 28 de outubro de 2021, Ferrari, C‑123/20, EU:C:2021:889, n.os 38 e 39).

47      No caso em apreço, a recorrente não contestou que os elementos não reivindicados dos desenhos ou modelos anteriores D 1 a D 5, a saber, a aparência a tracejado de uma parte superior do sapato, tinham também sido divulgados ao mesmo tempo que a parte protegida dos referidos desenhos ou modelos. Além disso, há que observar que os elementos não reivindicados dos desenhos ou modelos anteriores D 1 a D 5 aparecem de forma suficientemente clara e precisa para se perceber, sem esforço de interpretação, a aparência de uma parte superior do sapato e das suas várias partes como, nomeadamente, o contraforte, os atacadores ou ainda a gáspea.

48      Por conseguinte, a Câmara de Recurso considerou corretamente, no n.° 32 da decisão impugnada, que os elementos não reivindicados dos desenhos ou modelos anteriores D 1 a D 5 podiam ser tidos em consideração para apreciar o caráter singular do desenho ou modelo controvertido.

 Quanto à impressão global

49      A recorrente sustenta, por um lado, que o desenho ou modelo controvertido e os desenhos ou modelos anteriores apresentam as mesmas características relativamente à sola e, por outro, que as características da entressola do desenho ou modelo controvertido são idênticas às do desenho ou modelo anterior D 7.

50      A título subsidiário, a recorrente alega que uma comparação de todos os desenhos ou modelos em causa só é possível com os desenhos ou modelos anteriores D 6 a D 7, os quais suscitam a mesma impressão global que o desenho ou modelo controvertido. A este respeito, a recorrente contesta a tomada em consideração, no n.° 42 da decisão impugnada, da faixa na parte lateral com uma base larga que se estreita até ao calcanhar, que se encontra no desenho ou modelo anterior D 6, uma vez que se trata de uma marca da União Europeia. Do mesmo modo, a recorrente contesta a tomada em consideração, no n.° 43 da decisão impugnada, da disposição dos atacadores nos desenhos ou modelos em causa, uma vez que estes são elementos amovíveis.

51      Além disso, a recorrente alega que, contrariamente ao que a Câmara de Recurso declarou, os desenhos ou modelos anteriores D 6 e D 7 também apresentam, à semelhança do desenho ou modelo controvertido, uma tira para fixar os atacadores à língua do sapato.

52      Por último, a recorrente também contesta a apreciação da Câmara de Recurso segundo a qual a parte superior do desenho ou modelo controvertido é mais volumosa e mais curvada do que a parte superior mais fina dos desenhos ou modelos anteriores D 6 e D 7. Estas diferenças não são visíveis nas ilustrações e não podem originar uma impressão global diferente.

53      O EUIPO contesta os argumentos da recorrente.

54      Segundo jurisprudência constante, o caráter singular de um desenho ou modelo resulta de uma impressão global de diferença, ou de inexistência de «déjà vu», do ponto de vista do utilizador informado, relativamente ao património dos desenhos ou modelos existente, não tendo em conta diferenças que continuem a ser insuficientemente marcadas para afetar a referida impressão global, apesar de serem mais do que pormenores insignificantes, mas tendo em conta diferenças suficientemente marcadas para criar impressões globais distintas [v. Acórdão de 16 de fevereiro de 2017, Antrax It/EUIPO — Vasco Group (Termossifões para radiadores), T‑828/14 e T‑829/14, EU:T:2017:87, n.° 53 e jurisprudência referida].

55      Além disso, resulta da jurisprudência que a comparação das impressões globais suscitadas pelos desenhos ou modelos deve ser sintética e não se pode limitar à comparação analítica de uma enumeração de semelhanças e de diferenças [Acórdão de 29 de outubro de 2015, Roca Sanitario/IHMI — Villeroy & Boch (Torneira monocomando), T‑334/14, não publicado, EU:T:2015:817, n.° 58].

56      Por outro lado, uma vez que os elementos nominativos e figurativos que figuram nos desenhos ou modelos em causa são marcas ou sinais distintivos apostos no produto para indicar a sua proveniência, os quais não têm uma função ornamental ou decorativa e não constituem características do produto que conferem a sua aparência aos produtos em causa, na aceção do artigo 3.°, alíneas a) e b), do Regulamento n.° 6/2002, estes elementos são irrelevantes no âmbito da comparação das impressões globais para efeitos de demonstrar o caráter singular do desenho ou modelo controvertido [v., neste sentido, Acórdão de 10 de novembro de 2021, Sanford/EUIPO — Avery Zweckform (Etiquetas), T‑443/20, EU:T:2021:767, n.° 80].

57      A título preliminar, importa salientar que, como resulta dos n.os 31 e 48, supra, há que ter em conta os elementos de renúncia presentes nos desenhos ou modelos anteriores D 1 a D 5, uma vez que estes foram divulgados e surgem de forma clara e precisa e que a comparação dos desenhos ou modelos em causa não se pode limitar, contrariamente ao que afirma a recorrente, a comparar as duas solas.

58      Além disso, como resulta do n.° 37, supra, a título da impressão global entre os desenhos ou modelos em causa, não há que atribuir maior importância a uma das partes do sapato em específico.

–       Quanto à comparação entre o desenho ou modelo controvertido e os desenhos ou modelos anteriores D 1 e D 2

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59      A Câmara de Recurso observou, no n.° 34 da decisão impugnada, que os desenhos ou modelos em causa coincidem apenas nos cinco pares de ilhós para os atacadores e numa sola com textura e de espessura decrescente e que as suas diferenças eram suficientes para suscitar impressões globais diferentes no utilizador informado.

60      A este respeito, a Câmara de Recurso considerou, no n.° 35 da decisão impugnada, que o desenho ou modelo controvertido se distingue dos desenhos ou modelos anteriores D 1 e D 2, nomeadamente, através de uma parte superior com um aro baixo, de uma pala subida, de uma língua proeminente, de uma tira para auxiliar o calçar, de uma tira para fixar os atacadores à língua do sapato e de uma decoração numa gradação de cor, da mais escura na ponta do sapato à mais clara no calcanhar, com vários elementos alongados nos lados. Além disso, o desenho ou modelo controvertido apresenta atacadores cruzados que lhe conferem um aspeto mais desportivo do que o dos desenhos ou modelos anteriores D 1 e D 2.

61      A Câmara de Recurso também salientou, nos n.os 35 e 36 da decisão impugnada, que, ao contrário do desenho ou modelo controvertido, os desenhos ou modelos anteriores D 1 e D 2 apresentam duas partes distintas no contraforte e na biqueira e que a sola é composta apenas por uma camada, que não tem uma saliência no calcanhar e que não parece ser mais estreita na biqueira.

62      As conclusões da Câmara de Recurso expostas acima devem ser consideradas corretas.

63      É certo que os desenhos ou modelos em causa podem partilhar determinadas características visuais, nomeadamente, no que diz respeito à textura sola do desenho ou modelo anterior D 1. No entanto, o desenho ou modelo controvertido distingue‑se principalmente dos desenhos ou modelos anteriores D 1 e D 2 através da decoração da parte superior, do aro baixo, da sola exterior, da sola espessa no calcanhar que se estreita em direção da ponta do sapato e, por último, da entressola com uma saliência no calcanhar e composta por duas camadas com uma linha pronunciada entre as duas. Ora, estas principais diferenças são suficientes para conferir aos desenhos ou modelos em causa uma impressão global distinta que não escapará a um utilizador informado que demonstre um elevado nível de atenção.

64      Os argumentos da recorrente não permitem pôr em causa o que precede.

65      Com efeito, a recorrente baseou‑se unicamente numa comparação entre as solas nos desenhos ou modelos em causa, alegando que estes partilham as mesmas características, entre as quais, nomeadamente, uma sola que se estreita ligeiramente da zona do calcanhar até à ponta do sapato com uma curvatura ligeiramente ascendente, uma superfície que tem uma estrutura comparável à do poliestireno, diferentes módulos individuais colocados uns ao lado dos outros de cor branca, uma estrutura uniforme ao longo de toda a parte lateral da sola e uma sola que é revestida por uma sola exterior.

66      No entanto, as diferenças identificadas no n.° 63, supra, são mais significativas do que as características comuns identificadas pela recorrente e são suficientes para criar impressões globais diferentes entre os desenhos ou modelos em causa. Esta conclusão assenta, nomeadamente, no facto de as apreciações da Câmara de Recurso, contrariamente às da recorrente, não se basearem apenas na comparação das solas e de a parte superior dos desenhos ou modelos em causa apresentarem diferenças significativas que permitem suscitar impressões globais diferentes no utilizador informado.

67      Além disso, no que respeita ao argumento da recorrente segundo o qual a Câmara de Recurso teve erradamente em conta a disposição dos atacadores na impressão global suscitada pelos desenhos ou modelos em causa, há que constatar que este argumento, mesmo que fosse demonstrado, não é suscetível de pôr em causa as conclusões precedentes, uma vez que a diferente disposição dos atacadores entre os referidos desenhos ou modelos apenas afeta ligeiramente a impressão global que daí resulta.

–       Quanto à comparação entre o desenho ou modelo controvertido e os desenhos ou modelos anteriores D 3 a D 5

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68      A Câmara de Recurso observou, no n.° 39 da decisão impugnada, que o desenho ou modelo controvertido se distingue dos desenhos ou modelos anteriores em causa, nomeadamente, através de uma decoração numa gradação de cor, da mais escura na ponta do sapato à mais clara no calcanhar, com vários elementos alongados nos lados, de uma tira para auxiliar o calçar, de uma tira para fixar os atacadores à língua do sapato e de atacadores atados de forma cruzada. Além disso, o desenho ou modelo controvertido apresenta uma pala subida e a zona dos ilhós é mais ampla e mais espessa do que nos desenhos ou modelos anteriores D 3 a D 5.

69      A Câmara de Recurso também salientou, no mesmo número, que, contrariamente ao desenho ou modelo controvertido, os desenhos ou modelos anteriores apresentam duas partes distintas no contraforte e na biqueira e atacadores atados em linha.

70      No que respeita mais especificamente à sola, a Câmara de Recurso observou, no n.° 40 da decisão impugnada, que o desenho ou modelo controvertido tem uma sola composta por duas camadas distintas, com uma saliência considerável no calcanhar e que se une à parte superior através de uma linha uniforme. Em contrapartida, as solas dos desenhos ou modelos anteriores D 3 a D 5 são compostas por uma única camada e a sua saliência, no calcanhar, é menor do que a do desenho ou modelo controvertido. Além disso, a sola exterior do desenho ou modelo controvertido abrange toda a base da sola e tem um relevo dentado, ao passo que a sola exterior do desenho ou modelo anterior D 4 abrange apenas uma parte e a sola exterior do desenho ou modelo anterior D 3 tem menos relevo. Por sua vez, o desenho ou modelo anterior D 5 não tem uma sola exterior com relevo dentado.

71      Consequentemente, a Câmara de Recurso considerou, no n.° 41 da decisão impugnada, que a impressão global suscitada pelo desenho ou modelo controvertido no utilizador informado era diferente da suscitada pelos desenhos ou modelos anteriores D 3 a D 5.

72      As conclusões da Câmara de Recurso expostas acima devem ser consideradas corretas.

73      É certo que os desenhos ou modelos em causa podem partilhar determinadas características visuais. No entanto, o desenho ou modelo controvertido distingue‑se principalmente dos desenhos ou modelos anteriores D 3 e D 5 através da decoração da parte superior, do aro baixo, da sola espessa no calcanhar que se estreita na direção da ponta do sapato e, por último, da entressola composta por duas camadas com uma linha pronunciada entre as duas. Ora, estas principais diferenças são suficientes para conferir aos desenhos ou modelos em causa uma impressão global distinta que não escapará a um utilizador informado que demonstre um elevado nível de atenção.

74      Os argumentos da recorrente não permitem pôr em causa o que precede.

75      Com efeito, as características comuns dos desenhos ou modelos em causa que são salientadas pela recorrente, conforme expostas mutatis mutandis no n.° 65, supra, não permitem contrabalançar a impressão global diferente dos referidos desenhos ou modelos. Esta conclusão assenta, nomeadamente, no facto de as apreciações da Câmara de Recurso não se basearem apenas na comparação das solas e de a parte superior dos desenhos ou modelos em causa apresentarem diferenças significativas que permitem produzir impressões globais diferentes no utilizador informado.

76      Além disso, como constatado no n.° 67, supra, a tomada em consideração da disposição dos atacadores nos referidos desenhos ou modelos não é suscetível de pôr em causa a conclusão da impressão global diferente que o desenho ou modelo controvertido suscita relativamente aos desenhos ou modelos anteriores D 3 a D 5.

–       Quanto à comparação entre o desenho ou modelo controvertido e os desenhos ou modelos anteriores D 6 e D 7

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77      No n.° 42 da decisão recorrida, a Câmara de Recurso salientou que os desenhos ou modelos em causa apresentam diferenças na decoração da parte superior. Concretamente, salientou que o desenho ou modelo anterior D 6 apresenta uma faixa na parte lateral com uma base larga que se estreita até ao calcanhar e que o desenho ou modelo anterior D 7 apresenta um triângulo contrastante no lado formado pela zona posterior da parte superior e delimitado por várias linhas paralelas. Em contrapartida, o desenho ou modelo controvertido apresenta uma gradação de cor, da mais escura na ponta do sapato à mais clara no calcanhar, com vários elementos alongados nos lados e um elemento nominativo presente na língua.

78      No que respeita à configuração da parte superior, a Câmara de Recurso observou, no n.° 43 da decisão impugnada, que o desenho ou modelo controvertido apresenta cinco pares de ilhós, atacadores atados de forma cruzada e uma tira para fixar os atacadores à língua do sapato. Em contrapartida, salientou que os desenhos ou modelos anteriores D 6 e D 7 apresentam apenas três pares de ilhós e atacadores diferentes, uma vez que o desenho ou modelo anterior D 6 tem uma banda espessa na parte frontal da língua e que o desenho ou modelo anterior D 7 não tem nenhuma tira, e que têm também uma tira para auxiliar o calçar no topo da língua. Além disso, a parte superior do desenho ou modelo controvertido é mais volumosa e curvada do que a dos desenhos ou modelos anteriores D 6 e D 7, que é mais fina e estreita.

79      Por último, no que respeita à parte exterior da sola, a Câmara de Recurso observou, no n.° 44 da decisão impugnada, que o desenho ou modelo controvertido apresenta um padrão característico composto por figuras retangulares contrastantes, ao passo que os desenhos ou modelos anteriores D 6 e D 7 apresentam, respetivamente, várias faixas e linhas e um padrão esparso de figuras triangulares contrastantes. Por conseguinte, a Câmara de Recurso considerou que, devido a esses padrões, o desenho ou modelo controvertido apresenta uma sola exterior com um relevo dentado, ao passo que o desenho ou modelo anterior D 7 parece ter um relevo menos acentuado e mais liso e o desenho ou modelo anterior D 6 não apresenta nenhum relevo.

80      Por conseguinte, a Câmara de Recurso concluiu, no n.° 45 da decisão impugnada, que o desenho ou modelo controvertido suscita uma impressão global diferente no utilizador informado.

81      As conclusões da Câmara de Recurso expostas acima devem ser consideradas corretas.

82      É certo que os desenhos ou modelos em causa podem partilhar determinadas características visuais, nomeadamente, no que respeita à textura da sola do desenho ou modelo anterior D 6. No entanto, o desenho ou modelo controvertido distingue‑se principalmente do desenho ou modelo anterior D 6 através da sola exterior, da decoração da parte superior, do aro baixo, da inexistência de língua proeminente e, por último, da entressola com uma saliência no calcanhar e composta por duas camadas com uma linha pronunciada entre as duas. No que respeita ao desenho ou modelo anterior D 7, o desenho ou modelo controvertido distingue‑se, principalmente, através da decoração da parte superior, de uma língua reduzida, da presença de ilhós e, por último, de um aro com um corte menos acentuado. Ora, estas principais diferenças são suficientes para conferir aos desenhos ou modelos em causa uma impressão global distinta que não escapará a um utilizador informado que demonstre um elevado nível de atenção.

83      Os argumentos da recorrente não permitem pôr em causa o que precede.

84      Com efeito, as características comuns dos desenhos ou modelos em causa que são salientadas pela recorrente, conforme expostas mutatis mutandis no n.° 65, supra, não permitem contrabalançar a impressão global diferente suscitada pelos referidos desenhos ou modelos. A este respeito, a recorrente também alegou que a sola exterior do desenho ou modelo controvertido apresenta as mesmas características que a sola exterior do desenho ou modelo anterior D 7, uma vez que ambas apresentam pequenos padrões brancos na parte dianteira e na parte traseira da sola. No entanto, embora seja verdade que uma impressão de déjàvu possa surgir da comparação da parte inferior do sapato, há que observar que esta impressão é compensada pelas diferenças existentes entre os desenhos ou modelos em causa, conforme mencionadas no n.° 82, supra.

85      Por outro lado, contrariamente ao que alega a recorrente, há que salientar que a Câmara de Recurso não cometeu um erro de apreciação ao ter em conta a «faixa na parte lateral com uma base larga que se estreita até ao calcanhar» e que corresponde a uma marca da União Europeia, uma vez que este sinal figurativo contribui em grande medida, nomeadamente devido ao seu tamanho, para a aparência do desenho ou modelo anterior D 6 e, mais especificamente, da respetiva ornamentação (v., neste sentido, Acórdão de 10 de novembro de 2021, Etiquetas, T‑443/20, EU:T:2021:767, n.° 80).

86      A recorrente também contestou o facto de a Câmara de Recurso ter considerado que os desenhos ou modelos anteriores D 6 e D 7 não tinham uma tira para fixar os atacadores à língua do sapato. Ora, no que respeita ao desenho ou modelo anterior D 6, contrariamente ao que alega a recorrente, a Câmara de Recurso salientou, no n.° 43 da decisão impugnada, que, no que respeita à tira para os atacadores, o desenho ou modelo controvertido apresenta efetivamente uma banda espessa na parte frontal da língua. No que respeita ao desenho ou modelo anterior D 7, a Câmara de Recurso indicou que este não parecia ter uma tira. Ora, ainda que se deva observar, como a recorrente alega, que esta tira está efetivamente presente no desenho ou modelo anterior D 7, esta é em larga medida diferente da que está presente no desenho ou modelo controvertido. Por conseguinte, o facto de não ter sido tomada em consideração não é suscetível de pôr em causa a conclusão da impressão global diferente suscitada pelo desenho ou modelo controvertido aos olhos do utilizador informado.

87      Por último, contrariamente ao que alega a recorrente, a Câmara de Recurso não cometeu um erro de apreciação ao declarar, no n.° 43 da decisão impugnada, que o desenho ou modelo controvertido apresenta uma parte superior mais volumosa e mais curvada do que a parte superior dos desenhos ou modelos anteriores D 6 e D 7. Com efeito, a sua parte superior parece mais fina e estreita do que a do desenho ou modelo controvertido. Além disso, estas características são suficientemente evidentes nos desenhos ou modelos em causa e contribuem para a sua diferente impressão global.

88      Por conseguinte, a Câmara de Recurso considerou corretamente que o desenho ou modelo controvertido suscitava uma impressão global diferente da suscitada pelos desenhos ou modelos anteriores D 1 a D 7.

89      Resulta do que precede que nenhum dos desenhos ou modelos anteriores invocados pela recorrente suscita a mesma impressão global que a suscitada pelo desenho ou modelo controvertido e que a decisão impugnada não está ferida de nenhum fundamento de anulação ou de reforma.

90      Assim, há que julgar improcedente o fundamento único invocado pela recorrente e, por conseguinte, negar provimento ao recurso na sua totalidade.

 Quanto às despesas

91      Nos termos do artigo 134.°, n.° 1, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

92      Tendo sido realizada uma audiência e tendo a recorrente sido vencida, há que condená‑la nas despesas, em conformidade com o pedido do EUIPO.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Terceira Secção Alargada),

decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      A Puma SE é condenada nas despesas.

Schalin

Škvařilová‑Pelzl

Nõmm

Steinfatt

 

      Kukovec

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 8 de maio de 2024.

Assinaturas


*      Língua do processo: inglês.