Language of document : ECLI:EU:T:2021:527

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção alargada)

1 de setembro de 2021 (*)

«Marca da União Europeia — Pedido de marca nominativa da União Europeia Limbic® Types — Motivos absolutos de recusa — Decisão adotada na sequência da anulação de uma decisão anterior pelo Tribunal Geral — Remessa à Grande Câmara de Recurso — Artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 207/2009 [atual artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento 2017/1001] — Erro de direito — Exame oficioso dos factos — Artigo 95.°, n.° 1, do Regulamento 2017/1001 — Autoridade de caso julgado — Artigo 72.°, n.° 6, do Regulamento 2017/1001 — Composição da Grande Câmara de Recurso»

No processo T‑96/20,

Gruppe Nymphenburg Consult AG, com sede em Munique (Alemanha), representada por R. Kunze, advogado,

recorrente,

contra

Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia (EUIPO), representado por D. Hanf, na qualidade de agente,

recorrido,

que tem por objeto um recurso da Grande Câmara de Recurso do EUIPO de 2 de dezembro de 2019 (processo R 1276/2017‑G), relativo a um pedido de registo do sinal nominativo Limbic® Types como marca da União Europeia,

O TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção alargada),

composto por: S. Papasavvas, presidente, D. Spielmann (relator), U. Öberg, O. Spineanu‑Matei e R. Mastroianni, juízes,

secretário: R. Ūkelytė, administradora,

vista a petição entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 20 de fevereiro de 2020,

vista a contestação apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 22 de maio de 2020,

vista a questão escrita do Tribunal Geral às partes de 18 de novembro de 2020,

após a audiência de 16 de março de 2021,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

1        Em 15 de novembro de 2013, a recorrente, Gruppe Nymphenburg Consult AG, apresentou um pedido de registo de marca da União Europeia no Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia (EUIPO), ao abrigo do Regulamento (CE) n.° 207/2009 do Conselho, de 26 de fevereiro de 2009, sobre a marca da União Europeia (JO 2009, L 78, p. 1), conforme alterado [substituído pelo Regulamento (UE) 2017/1001 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 14 de junho de 2017, sobre a marca da União Europeia (JO 2017, L 154, p. 1)].

2        A marca cujo registo é pedido é o sinal nominativo Limbic® Types.

3        Os produtos e serviços para os quais foi pedido o registo pertencem às classes 16, 35 e 41, na aceção do Acordo de Nice relativo à Classificação Internacional dos Produtos e dos Serviços para o registo de marcas, de 15 de junho de 1957, conforme revisto e alterado, e correspondem nomeadamente, para cada uma destas classes, à seguinte descrição:

–        classe 16: «Produtos de impressão, em especial livros, revistas, jornais e brochuras na área da consultadoria empresarial e da consultadoria de gestão de recursos humanos, bem como de manuais de marcas»;

–        classe 35: «Publicidade; Consultadoria empresarial e consultadoria na gestão de recursos humanos, em especial na área do desenvolvimento e posicionamento de marcas, desenvolvimento da cultura empresarial e de ideais, seleção e motivação de pessoal, publicidade e marketing, apresentação de produtos e estudos de mercado»;

–        classe 41: «Educação; Formação; Divertimento; Atividades desportivas e culturais; Palestras, formação e treino na área do desenvolvimento e posicionamento de marcas, desenvolvimento da cultura empresarial e de ideais, seleção e motivação de pessoal, publicidade e marketing, apresentação de produtos e estudos de mercado; publicação de livros, revistas, jornais e brochuras na área da consultadoria empresarial e da consultadoria de gestão de recursos humanos, bem como de manuais de marcas».

4        Por Decisão de 30 de maio de 2014, o examinador indeferiu o pedido de registo com fundamento no artigo 7.°, n.° 1, alíneas b) e c), do Regulamento n.° 207/2009 [atual artigo 7.°, n.° 1, alíneas b) e c), do Regulamento 2017/1001], lido em conjugação com o artigo 7.°, n.° 2, do mesmo regulamento (atual artigo 7.°, n.° 2, do Regulamento 2017/1001), no que respeita aos produtos e serviços acima referidos no n.° 3.

5        Em 29 de julho de 2014, a recorrente interpôs recurso no EUIPO da decisão do examinador, nos termos dos artigos 58.° a 64.° do Regulamento n.° 207/2009 (atuais artigos 66.° a 71.° do Regulamento 2017/1001).

6        Por Decisão de 23 de junho de 2015, a Primeira Câmara de Recurso do EUIPO negou provimento ao recurso. Considerou que o sinal Limbic® Types era descritivo dos produtos e serviços em causa, na aceção do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 207/2009.

7        Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 7 de setembro de 2015, a recorrente interpôs recurso da Decisão de 23 de junho de 2015, registado sob o número T‑516/15.

8        Por Acórdão de 16 de fevereiro de 2017, Gruppe Nymphenburg Consult/EUIPO (Limbic® Types) (T‑516/15, não publicado, a seguir «acórdão de anulação», EU:T:2017:83), o Tribunal Geral deu provimento ao recurso da recorrente e anulou a Decisão de 23 de junho de 2015, com fundamento em apreciações erradas da Câmara de Recurso relativas ao caráter descritivo da marca pedida, na aceção do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 207/2009.

9        Por Decisão do Praesidium das Câmaras de Recurso de 16 de junho de 2017, o processo foi remetido à Grande Câmara de Recurso, sob a referência R 1276/2017‑G, para nova decisão. A recorrente foi informada desta remissão por comunicação da Secretaria das Câmaras de Recurso de 2 de agosto de 2017.

10      Por comunicação de 29 de maio de 2018, a Grande Câmara de Recurso informou a recorrente que considerava que os motivos absolutos referidos no artigo 7.°, n.° 1, alíneas b) e c), do Regulamento 2017/1001 obstavam ao registo da marca pedida para os produtos e serviços em causa e solicitou que apresentasse as suas observações. A recorrente deu cumprimento a este pedido em 21 de setembro de 2018.

11      Por Decisão de 2 de dezembro de 2019 (a seguir «decisão impugnada»), a Grande Câmara de Recurso negou provimento ao recurso. Em primeiro lugar, considerou que, no acórdão de anulação, o Tribunal Geral tinha declarado que as provas em que a Primeira Câmara de Recurso se baseou, na sua Decisão de 23 de junho de 2015, não eram suficientes para concluir pelo caráter descritivo da marca pedida. Por conseguinte, na medida em que considerou que existiam factos e provas suplementares, deduziu que lhe competia, por força do artigo 95.°, n.° 1, do Regulamento 2017/1001, pronunciar‑se de novo sobre o caráter descritivo da marca pedida. Em segundo lugar, para apreciar o referido caráter descritivo, salientou, antes de mais, que os produtos e serviços em causa se destinavam ao grande público e aos profissionais da consultadoria empresarial, da consultadoria de gestão de recursos humanos, da publicidade, do marketing, dos recursos humanos, da gestão de empresas, da formação profissional, do desporto profissional, do coaching, do divertimento e da cultura. Em seguida, constatou que a marca pedida se traduzia por «tipos límbicos» e considerou que esta marca seria entendida pelo público pertinente anglófono como designando, em substância, uma classificação dos indivíduos segundo perfis ou tipos de personalidade estabelecidos com base em informações relativas ao sistema límbico. Por último, deduziu das suas conclusões que a marca pedida era descritiva dos produtos e serviços em causa. Em terceiro lugar, considerou que a marca pedida era desprovida de caráter distintivo. Consequentemente, negou provimento ao recurso.

 Pedidos das partes

12      A recorrente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        anular a decisão impugnada;

–        condenar o EUIPO nas despesas.

13      O EUIPO conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar a recorrente nas despesas.

 Questão de direito

14      Em apoio do seu recurso, a recorrente invoca seis fundamentos relativos, o primeiro, a violações de formalidades essenciais, o segundo, à violação do artigo 72.°, n.° 6, do Regulamento 2017/1001, o terceiro, à violação do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do referido regulamento, o quarto, à violação do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do mesmo regulamento, o quinto, à violação do artigo 94.°, n.° 1, deste regulamento e, o sexto, à violação do artigo 96.° do referido regulamento.

 Observações preliminares

15      Tendo em conta a data de apresentação do pedido de registo em causa, nomeadamente 15 de novembro de 2013, que é determinante para efeitos de identificação do direito substantivo aplicável, o presente litígio é regulado pelas disposições substantivas do Regulamento n.° 207/2009 (v., neste sentido, Despacho de 5 de outubro de 2004, Alcon/IHMI, C‑192/03 P, EU:C:2004:587, n.os 39 e 40, e Acórdão de 23 de abril de 2020, Gugler France/Gugler e EUIPO, C‑736/18 P, não publicado, EU:C:2020:308, n.° 3 e jurisprudência referida).

16      Por conseguinte, no caso em apreço, no que respeita às regras substantivas, há que entender as referências feitas pela Câmara de Recurso na decisão impugnada e pela recorrente na argumentação invocada no artigo 7.°, n.° 1, alíneas b) e c), do Regulamento 2017/1001, no sentido de que se referem ao artigo 7.°, n.° 1, alíneas b) e c), de conteúdo idêntico, do Regulamento n.° 207/2009.

17      Por outro lado, na medida em que, segundo jurisprudência constante, as regras processuais são geralmente aplicáveis à data em que entram em vigor (v. Acórdão de 11 de dezembro de 2012, Comissão/Espanha, C‑610/10, EU:C:2012:781, n.° 45 e jurisprudência referida), o litígio é regulado, consoante a data dos acontecimentos em causa, pelas disposições processuais dos Regulamentos n.° 207/2009 e 2017/1001.

 Quanto ao primeiro fundamento, relativo à violação de formalidades essenciais

18      Em apoio deste fundamento, a recorrente apresenta três alegações.

 Quanto à primeira e segunda alegações, relativas à falta de comunicação e à insuficiência de fundamentação da decisão de reenvio para a Grande Câmara de Recurso

19      Com a primeira alegação, a recorrente sustenta que a Decisão de 16 de junho de 2017 do Praesidium das Câmaras de Recurso, pela qual o processo foi remetido à Grande Câmara de Recurso, não lhe foi comunicada enquanto tal, mas apenas foi informada dessa decisão por comunicação de 2 de agosto de 2017, em violação do artigo 165.°, n.° 3, alínea a), do artigo 166.°, n.° 4, alínea a), do Regulamento 2017/1001, do artigo 35.°, n.os 1 e 4, e do artigo 37.°, n.° 2, do Regulamento Delegado (UE) 2018/625 da Comissão, de 5 de março de 2018, que completa o Regulamento n.° 2017/1001 e revoga o Regulamento Delegado (UE) 2017/1430 (JO 2018, L 104, p. 1).

20      Com a segunda alegação, a recorrente sustenta que a Decisão do Praesidium das Câmaras de Recurso de 16 de junho de 2017 viola o dever de fundamentação, instituído pelo artigo 94.° do Regulamento 2017/1001, uma vez que as razões da referida remissão, previstas no artigo 165.° do referido regulamento, não foram aí mencionadas. Acrescenta que tal fundamentação era ainda mais necessária uma vez que, por um lado, a Primeira Câmara de Recurso, que tinha adotado a decisão de 23 de junho de 2015, referida no n.° 6, supra, era composta por um único membro e que, por outro, não era possível saber com que fundamento o processo tinha sido submetido à Grande Câmara de Recurso.

21      O EUIPO contesta a admissibilidade destas alegações, por não serem dirigidas contra a decisão impugnada, mas contra a Decisão do Praesidium das Câmaras de Recurso de 16 de junho de 2017, que não lesa a recorrente. Contesta igualmente a sua procedência e no que respeita à segunda alegação, o caráter operante, uma vez que as razões da remissão do processo à Grande Câmara de Recurso tinham sido levadas ao conhecimento da recorrente na comunicação de 29 de maio de 2018 e de esta ter sido convidada a formular observações em resposta à referida comunicação.

22      Nos termos do artigo 72.°, n.° 1, do Regulamento 2017/1001, o recurso perante o juiz da União Europeia só pode ser interposto das decisões das Câmaras de Recurso. Em sede desse tipo de recurso, só são admissíveis fundamentos que ponham em causa a decisão da própria Câmara de Recurso [v., neste sentido, Acórdãos de 7 de junho de 2005, Lidl Stiftung/IHMI — REWE‑Zentral (Salvita), T‑303/03, EU:T:2005:200, n.° 59, e de 16 de maio de 2019, KID‑Systeme/EUIPO — Sky (SKYFi), T‑354/18, não publicado, EU:T:2019:333, n.° 99 e jurisprudência referida].

23      Não se pode deixar de observar que as irregularidades invocadas pela recorrente são suscetíveis de afetar a Decisão do Praesidium das Câmaras de Recurso de 16 de junho de 2017, mas não a decisão impugnada.

24      Por conseguinte, as primeira e segunda alegações do primeiro fundamento são inadmissíveis.

 Quanto ao terceiro fundamento, relativo à violação do artigo 169.°, n.° 1, do Regulamento 2017/1001

25      A recorrente sustenta que a composição da Grande Câmara de Recurso que adotou a decisão impugnada violava as disposições do artigo 169.°, n.° 1, do Regulamento 2017/1001, pelo facto de um membro da referida Câmara ser o único membro da Câmara de Recurso que adotou a decisão de 23 de junho de 2015.

26      O EUIPO contesta a argumentação da recorrente.

27      Nos termos do artigo 169.°, n.° 1, do Regulamento 2017/1001, os membros das Câmaras de Recurso não podem participar num processo de recurso caso tenham participado na decisão que é objeto de recurso.

28      Além disso, importa recordar que um acórdão de anulação opera ex tunc e tem por efeito eliminar retroativamente da ordem jurídica o ato anulado [v. Acórdão de 25 de março de 2009, Kaul/IHMI — Bayer (ARCOL), T‑402/07, EU:T:2009:85, n.° 21 e jurisprudência referida].

29      No caso em apreço, importa recordar que o registo da marca pedida foi recusado pela decisão do examinador do EUIPO de 30 de maio de 2014 e que, em sede de recurso interposto pela recorrente, a Primeira Câmara de Recurso confirmou o indeferimento do pedido de registo por decisão de 23 de junho de 2015. Ora, esta última decisão foi anulada pelo acórdão de anulação, que se tornou definitivo, pelo que foi retroativamente eliminada da ordem jurídica. Por conseguinte, a decisão objeto do recurso, na aceção do artigo 169.°, n.° 1, do Regulamento 2017/1001, perante a Grande Câmara não é a decisão de 23 de junho de 2015, mas a decisão do examinador de 30 de maio de 2014.

30      Além disso, o artigo 35.°, n.° 4, do Regulamento Delegado 2018/625 dispõe:

«Se uma decisão de uma Câmara de Recurso sobre um processo tiver sido anulada ou alterada por uma decisão final do Tribunal Geral [...], o Presidente das Câmaras de Recurso, a fim de dar cumprimento a essa decisão em conformidade com o artigo 72.°, n.° 6, do Regulamento (UE) 2017/1001, reatribuirá o processo, nos termos do n.° 1 do presente artigo, a uma Câmara de Recurso, a qual não inclui os membros que adotaram a decisão anulada, salvo se o processo for submetido à Câmara de Recurso alargada [...]»

31      Por conseguinte, na medida em que, no caso em apreço, o processo foi remetido à Grande Câmara de Recurso, esta podia incluir o único membro da Câmara de Recurso que adotou a decisão de 23 de junho de 2015.

32      Resulta do exposto que a composição da Grande Câmara de Recurso que adotou a decisão impugnada não padecia de nenhum vício suscetível de ferir de ilegalidade a referida decisão. Por conseguinte, a terceira alegação e, consequentemente, o primeiro fundamento devem ser julgados improcedentes.

 Quanto ao segundo fundamento, relativo a uma violação da autoridade de caso julgado

33      A recorrente sustenta, em substância, que a decisão impugnada foi adotada em violação da autoridade do caso julgado, à luz do artigo 72.°, n.° 6, do Regulamento 2017/1001, na medida em que a Grande Câmara de Recurso não cumpriu a sua obrigação de tomar as medidas necessárias à execução do acórdão de anulação e que, por conseguinte, violou a autoridade absoluta de caso julgado associada aos fundamentos e ao dispositivo desse acórdão. Com efeito, nesse acórdão, o Tribunal Geral teria concluído que a marca pedida não era descritiva dos produtos em causa, na aceção do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 207/2009, e não que a Câmara de Recurso não tinha feito prova bastante do caráter descritivo dessa marca. Tendo o Tribunal Geral decidido quanto ao mérito, a recorrente conclui que a Grande Câmara de Recurso não podia validamente proceder a uma nova apreciação do referido caráter descritivo.

34      O EUIPO contesta a argumentação da recorrente. Em primeiro lugar, sustenta que a Decisão de 23 de junho de 2015 foi anulada, e não reformada, pelo acórdão de anulação, pelo que o referido acórdão não obrigava o EUIPO a autorizar o registo da marca pedida. No respeito da repartição das competências que incumbem, respetivamente, ao Tribunal Geral e ao EUIPO, o acórdão de anulação não contém uma declaração definitiva relativa à aptidão da marca pedida para o registo, à existência ou à inexistência do motivo absoluto de recusa previsto no artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 207/2009. Resulta unicamente do acórdão de anulação que as provas em que assentavam as apreciações feitas pela Primeira Câmara de Recurso na Decisão de 23 de junho de 2015 eram insuficientes para concluir que a marca era descritiva dos produtos e dos serviços em causa.

35      Em segundo lugar, o EUIPO sustenta que a obrigação de exame oficioso dos factos que lhe incumbe por força do artigo 95.°, n.° 1, do Regulamento 2017/1001 se aplica, no que respeita aos motivos absolutos de recusa de registo, até à data do registo e que, por força do artigo 45.°, n.° 3, do Regulamento 2017/1001, pode proceder novamente à apreciação de um motivo absoluto de recusa por sua própria iniciativa em qualquer momento antes do registo, se factos novos resultantes de observações de terceiros, de constatações feitas no decurso de um processo de oposição subsequente ou, como no caso em apreço, na sequência de uma sentença de anulação que se tenha tornado definitiva, o justificarem.

36      Em terceiro lugar, o EUIPO sustenta que a recorrente acusa erradamente a Grande Câmara de Recurso de ter reexaminado o caráter descritivo da marca pedida, uma vez que o exame realizado pela referida câmara tinha por objeto elementos de facto e provas diferentes daqueles em que se baseou a Decisão de 23 de junho de 2015.

37      A título preliminar, importa recordar que, uma vez que o acórdão de anulação não foi objeto de recurso, o mesmo transitou em julgado.

38      Além disso, o Tribunal de Justiça já sublinhou a importância que reveste, tanto na ordem jurídica da União como nas ordens jurídicas nacionais, o princípio da autoridade de caso julgado. Com efeito, a fim de garantir tanto a estabilidade do direito e das relações jurídicas como uma boa administração da justiça, é necessário que as decisões judiciais que se tornaram definitivas após o esgotamento das vias de recurso disponíveis ou depois de terminados os prazos previstos para esses recursos já não possam ser postas em causa (v. Acórdão de 19 de abril de 2012, Artegodan/Comissão, C‑221/10 P, EU:C:2012:216, n.° 86 e jurisprudência referida).

39      Por outro lado, por força do artigo 72.°, n.° 6, do Regulamento 2017/1001, o EUIPO é obrigado a adotar as medidas que a execução do acórdão do juiz da União implica.

40      É pacífico que, por Decisão de 23 de junho de 2015, a Câmara de Recurso tinha recusado o registo da marca pedida devido ao caráter descritivo desta marca em relação aos produtos e serviços em causa. No acórdão de anulação, o Tribunal Geral julgou procedente o primeiro fundamento do recurso, relativo à violação do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 207/2009. No n.° 1 do dispositivo desse acórdão, o Tribunal Geral anulou a Decisão da Câmara de Recurso de 23 de junho de 2015.

41      Os motivos pelos quais o Tribunal Geral julgou procedente o primeiro fundamento do recurso, que figuram nos n.os 34 a 52 do acórdão de anulação são os seguintes:

«34            Há que constatar que a Câmara de Recurso não demonstrou que o público pertinente no caso em apreço estabelecerá imediatamente e sem reflexão uma relação concreta e direta entre os produtos e serviços em causa, por um lado, e o sinal Limbic® Types, por outro.

35            É certo que o símbolo “®” e o termo “types” poderão ser compreendidos pelo público em causa, uma vez que o primeiro representa o sinal que designa uma marca registada e o segundo constitui um termo corrente inglês que remete para a forma geral, estrutura ou caráter que distingue um tipo, um grupo ou uma classe determinada de organismos vivos ou de objetos. O significado destes dois elementos à luz do público pertinente, tal como admitido pela Câmara de Recurso, não é contestado pela recorrente e deve ser confirmado pelas mesmas razões que as expostas na decisão impugnada.

36            No entanto, não basta que um ou vários dos elementos que compõem um sinal sejam descritivos; o caráter descritivo deve ser estabelecido em relação ao sinal no seu conjunto, incluindo, no caso em apreço, o terceiro termo, a saber, a palavra “limbic” [v., neste sentido, Acórdão de 26 de fevereiro de 2016, provima Warenhandels/IHMI — Renfro (HOT SOX), T‑543/14, não publicado, EU:T:2016:102, n.° 29].

37            A este respeito, como salientou o EUIPO à semelhança do examinador e da Câmara de Recurso, o termo “limbic”, tal como confirmado nomeadamente pelo Oxford English Dictionary, refere‑se ao “sistema límbico” (limbic system em inglês) que designa uma região do cérebro que influencia a regulação hormonal e o sistema neurovegetativo. A recorrente subscreveu esta definição no decurso do processo.

38            Todavia, há que considerar, em primeiro lugar, que, como a recorrente alega com razão, a combinação dos três termos que compõem a marca pedida é inabitual no que respeita aos produtos e serviços em causa.

39            Com efeito, resulta das diferentes definições do dicionário citadas pelo examinador e pela Câmara de Recurso que o termo “limbic” é normalmente utilizado em inglês como fazendo parte das expressões conhecidas “limbic system” ou “limbic lobe” que descrevem uma determinada parte do cérebro.

40            Ora, no que respeita à marca pedida, por um lado, o termo “limbic” foi retirado da expressão que normalmente lhe confere o seu sentido. Assim, o termo “limbic” foi privado do seu significado claro e direto.

41            Por outro lado, figura na marca pedida em combinação com o símbolo “®” e o termo “types”, ou seja, uma combinação que não é corrente ou habitual na estrutura do inglês.

42            Assim, devido ao caráter inabitual da combinação relativa aos produtos e serviços em causa, a formulação da marca proposta para o registo cria uma impressão que se afasta da que é produzida pela simples reunião dos elementos que a compõem, o que é adequado para conferir à marca pedida um caráter não descritivo dos produtos e dos serviços em causa (v., neste sentido, a jurisprudência referida no n.° 21, supra).

43            Em segundo lugar, há que constatar, como a recorrente também alega com razão, que o termo “limbic” que remete para o sistema límbico constitui um termo médico relacionado com a neurologia e, portanto, um termo altamente especializado.

44            A este respeito, há que salientar que a Câmara de Recurso se limitou a constatar que o público pertinente compreendia a marca no sentido de que remete para os diferentes tipos de personalidade, que reagiam de forma diferente às estimulações do sistema límbico.

45            Ora, não está demonstrado, em conformidade com a jurisprudência referida no n.° 22, supra, que o público pertinente, que não inclui as profissões médicas, compreenderá imediatamente o termo “limbic”, sem mais reflexão, no sentido de que se refere a uma parte do cérebro ou, pelo menos, à parte do cérebro que influencia a regulação hormonal e o sistema neurovegetativo. Também não está demonstrado que o público pertinente entenderá, sem mais reflexão, que a combinação dos três elementos constitutivos da marca pedida veicula o sentido de diferentes tipos de personalidade, que reagem diferentemente às estimulações da parte do cérebro que influencia a regulação hormonal e o sistema neurovegetativo e, portanto, como uma indicação descritiva dos produtos e dos serviços em causa ou de uma das suas características.

46            Por último, o facto de os serviços em causa (pertencentes às classes 35 e 41) poderem ter por objetivo informar os diferentes tipos límbicos e permitirem às empresas determinar a sua melhor estratégia de publicidade e de venda em função dos diferentes tipos de personalidade, como a Câmara de Recurso considera nos n.os 22 e 23 da decisão impugnada, não basta para considerar a marca pedida descritiva dos referidos serviços.

47            Com efeito, além do facto de a marca pedida utilizar um termo que é usado numa combinação inabitual e que não tem sentido claro e direto, não está demonstrado que o profissional médio, nomeadamente no domínio da publicidade, da gestão comercial e da gestão dos recursos humanos e de empresas, perante um termo especializado de medicina, não deverá, pelo menos, comprometer‑se num processo de interpretação, que implique um prazo de reflexão, para compreender o sentido da marca proposta para os serviços em causa. Ora, tal processo de interpretação é incompatível com o reconhecimento do caráter descritivo cujo significado deve ser imediatamente percebido sem outra reflexão [v., neste sentido, Acórdão de 7 de junho de 2011, Psytech International/IHMI — Institute for Personality & Ability Testing (16PF), T‑507/08, não publicado, EU:T:2011:253, n.° 40].

48            De igual modo, por razões idênticas (v. n.° 47, supra), há que salientar que, admitindo que os produtos em causa no domínio da consultadoria empresarial e da consultadoria de gestão de recursos humanos (pertencentes à classe 16) possam informar sobre os diferentes tipos límbicos e o seu comportamento e sobre a melhor forma de os visar, como a Câmara de Recurso considera no n.° 21 da decisão impugnada, esta constatação não basta para considerar a marca pedida descritiva dos referidos produtos.

49            Por outro lado, quanto à apreciação do caráter descritivo da marca pedida no que respeita à compreensão que dela tem o grande público, basta salientar que, à luz das considerações precedentes, implicará ainda mais um processo de interpretação que é incompatível com o caráter descritivo de uma marca (v., neste sentido, Acórdão de 7 de junho de 2011, 16PF, T‑507/08, não publicado, EU:T:2011:253, n.° 43).

50            No que respeita à jurisprudência invocada pelo EUIPO segundo a qual deve ser recusado o registo de um sinal nominativo, em aplicação do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 207/2009, se, em pelo menos um dos seus significados potenciais, designar uma característica dos produtos e dos serviços em causa (Acórdão de 23 de outubro de 2003, IHMI/Wrigley, C‑191/01 P, EU:C:2003:579, n.° 32), basta salientar, à luz do que precede, que a marca pedida não veicula um significado suficientemente claro e direto para que possa ser considerada pelo público pertinente como descritiva dos bens e serviços em causa.

51            Há que concluir que a apreciação da Câmara de Recurso segundo a qual o sinal Limbic® Types será compreendido pelo público pertinente na aceção de diferentes tipos de personalidade que reagem diferentemente às estimulações do sistema límbico está errada.

52            Do mesmo modo, a Câmara de Recurso cometeu um erro de apreciação ao considerar que o referido sinal apresentava uma relação suficientemente direta e concreta com os produtos e serviços em causa nas classes 16, 35 e 41.»

42      Como foi recordado no n.° 28, supra, um acórdão de anulação opera ex tunc e tem, portanto, por efeito eliminar retroativamente da ordem jurídica o ato anulado.

43      Além disso, foi declarado que a autoridade de caso julgado apenas diz respeito aos elementos de facto e de direito que foram efetiva ou necessariamente objeto da decisão jurisdicional em causa (v. Acórdão de 19 de abril de 2012, Artegodan/Comissão, C‑221/10 P, EU:C:2012:216, n.° 87 e jurisprudência referida).

44      Assim, para dar cumprimento ao acórdão de anulação e executá‑lo plenamente, a instituição de que emana o ato anulado deve respeitar não só o dispositivo do acórdão, mas igualmente os fundamentos que a ele conduziram e que constituem a sua base necessária. São, com efeito, esses fundamentos que, por um lado, identificam a disposição exata considerada ilegal e, por outro, revelam as razões exatas da ilegalidade declarada no dispositivo, e que a instituição em questão deverá ter em consideração ao substituir o ato anulado [v. Acórdão de 1 de março de 2018, Shoe Branding Europe/EUIPO — adidas (Posição de duas listas paralelas num sapato), T‑629/16, EU:T:2018:108, n.° 102 e jurisprudência referida].

45      No caso em apreço, na sequência do acórdão de anulação, o recurso interposto pela recorrente da decisão do examinador de 30 de maio de 2014 voltou a ficar pendente no EUIPO. A fim de dar cumprimento à sua obrigação, decorrente do artigo 72.°, n.° 6, do Regulamento n.° 2017/1001, de tomar as medidas necessárias à execução do acórdão de anulação, o EUIPO devia agir de modo a que o recurso fosse objeto de uma nova decisão de uma câmara de recurso. A Grande Câmara de Recurso, para a qual o processo foi remetido, informou a recorrente, através da comunicação de 29 de maio de 2018, de que considerava que os motivos absolutos referidos no artigo 7.°, n.° 1, alíneas b) e c), do Regulamento n.° 207/2009 obstavam ao registo da marca pedida para os produtos e serviços em causa e que estava habilitada a examinar novamente esses motivos de recusa.

46      Na decisão impugnada, a Grande Câmara de Recurso, referindo‑se ao artigo 72.°, n.° 6, do Regulamento 2017/1001, considerou, antes de mais, que o EUIPO só estava vinculado pelo dispositivo de um acórdão na medida em que os factos e as questões jurídicas subjacentes fossem idênticos. Afirmou igualmente que, no acórdão de anulação, o Tribunal de Geral tinha considerado que as provas apresentadas «até ao presente» não eram suficientes para demonstrar o motivo absoluto de recusa de registo previsto no artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 207/2009 e citou os fundamentos do acórdão de anulação, extraídos dos seus n.os 34, 45 a 48, que considerava ser suscetível de sustentar esta afirmação. Considerando que se podia basear em novos elementos de prova e nas disposições do artigo 95.°, n.° 1, do Regulamento 2017/1001, deduziu daí que um novo exame da aptidão para o registo da marca pedida era permitido e necessário, na medida em que os motivos decisivos do acórdão de anulação não se opunham a um reexame, com base em novas provas, de um motivo absoluto de recusa. Por conseguinte, considerou que estava obrigada a reexaminar o referido motivo.

47      Importa recordar que, nos termos do artigo 95.°, n.° 1, do Regulamento 2017/1001, os examinadores do EUIPO e, em sede de recurso, as Câmaras de Recurso do EUIPO devem proceder ao exame oficioso dos factos para determinar se a marca pedida é ou não abrangida por um dos motivos de recusa de registo. Por conseguinte, podem ser levados a basear a sua decisão em factos que não foram invocados pelo requerente (Acórdão de 19 de abril de 2007, IHMI/Celltech, C‑273/05 P, EU:C:2007:224, n.° 38).

48      Além disso, nos termos do artigo 45.°, n.° 3, do Regulamento 2017/1001, bem como do artigo 27.°, n.° 1, do Regulamento Delegado 2018/625, a Câmara de Recurso tem o direito de proceder novamente à apreciação dos motivos absolutos por sua própria iniciativa em qualquer momento antes do registo, se o considerar oportuno, incluindo aduzir um fundamento para a recusa do pedido de marca que não tenha ainda sido invocado na decisão objeto de recurso [Acórdão de 12 de dezembro de 2019, Refan Bulgaria/EUIPO (Forma de uma flor), T‑747/18, não publicado, EU:T:2019:849, n.° 21].

49      Todavia, o EUIPO só pode exercer as competências que estas disposições lhe conferem no respeito da sua obrigação, prevista no artigo 72.°, n.° 6, do Regulamento 2017/1001, de tomar as medidas necessárias à execução de um acórdão do juiz da União.

50      Assim, no caso em apreço, a Grande Câmara de Recurso tinha o direito de proceder a um novo exame oficioso dos factos para determinar se a marca pedida era ou não abrangida por um motivo absoluto de recusa de registo. Todavia, no âmbito deste novo exame oficioso, estava obrigada a respeitar não apenas o dispositivo do acórdão de anulação, mas também os fundamentos que a ele conduziu.

51      A este respeito, como salientaram acertadamente a Grande Câmara de Recurso na decisão impugnada e o EUIPO na contestação, o Tribunal Geral considerou, em especial nos n.os 45 a 48 do acórdão de anulação, reproduzidos no n.° 41, supra, que algumas das apreciações feitas pela Primeira Câmara de Recurso na decisão de 23 de junho de 2015 não estavam suficientemente fundamentadas ou não permitiam considerar a marca pedida como descritiva. Ao fazê‑lo, o Tribunal Geral considerou que não apoiavam a conclusão da Primeira Câmara de Recurso relativa ao caráter descritivo da marca pedida.

52      Além disso, pelos motivos que figuram nos n.os 50 a 52 do acórdão de anulação, referidos no n.° 41, supra, o Tribunal Geral pronunciou‑se sobre o caráter descritivo dos produtos e serviços em causa da marca pedida, considerando que era desprovida desse caráter e que, consequentemente, o motivo absoluto de recusa previsto no artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 207/2009 foi erradamente aplicado ao registo dessa marca.

53      Por conseguinte, a questão do caráter descritivo da marca pedida deve ser considerada um elemento de facto e de direito efetivamente dirimido pelo acórdão de anulação, na aceção da jurisprudência recordada no n.° 43, supra. A este respeito, os fundamentos que figuram nos n.os 45 a 48 e 50 a 52 do acórdão de anulação relativos à inexistência desse caráter foram determinantes para sustentar o n.° 1 do dispositivo do referido acórdão, que anulou a decisão de 23 de junho de 2015 e constituíam o seu fundamento necessário. Por conseguinte, estão abrangidos pela autoridade de caso julgado associada a esse acórdão.

54      Esta conclusão não pode ser posta em causa pelos argumentos do EUIPO segundo os quais o Tribunal Geral não identificou taxativamente, no acórdão de anulação, os factos pertinentes para apreciar a aptidão desta marca para o registo, nem pelos argumentos relativos ao alcance do exame oficioso dos factos previsto no artigo 95.°, n.° 1, do Regulamento 2017/1001, segundo os quais o controlo exercido pelo juiz da União se efetua, por princípio, exclusivamente com base nos factos e nas provas estabelecidos pela Câmara de Recurso.

55      Com efeito, embora, como se concluiu, o acórdão de anulação contenha fundamentos segundo os quais certas apreciações da Primeira Câmara de Recurso estavam insuficientemente fundamentadas ou não permitiam considerar a marca pedida como descritiva, este acórdão contém igualmente fundamentos que sancionam apreciações erradas por parte desta câmara sobre o mérito baseadas em factos estabelecidos. Assim, no acórdão de anulação, o Tribunal Geral concluiu que a decisão da Primeira Câmara de Recurso estava viciada por um erro de apreciação no que respeita às condições de aplicação do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 207/2009, quanto ao caráter descritivo da marca pedida.

56      Além disso, a competência conferida ao EUIPO para apreciar oficiosamente os factos não lhe permite pôr em causa um elemento factual e de direito que foi efetivamente dirimido pelo Tribunal Geral, na aceção da jurisprudência recordada no n.° 43, supra. Com efeito, a circunstância de a Grande Câmara de Recurso ter baseado o seu exame do caráter descritivo da marca pedida em elementos de facto que a Primeira Câmara de Recurso não tinha tido em conta para efeitos da sua Decisão de 23 de junho de 2015 não é suscetível de privar da sua autoridade de caso julgado as apreciações feitas pelo Tribunal Geral sobre o caráter descritivo dessa marca nos n.os 50 a 52 do acórdão de anulação.

57      Além disso, o argumento do EUIPO relativo a uma analogia entre o alcance do seu exame oficioso dos factos no âmbito de um pedido de registo e de um processo de declaração de nulidade, por motivo absoluto de recusa, deve ser rejeitado. Com efeito, a circunstância, invocada pelo EUIPO, segundo a qual a possibilidade de declarar a nulidade de uma marca após o seu registo confirma que o legislador tinha consciência da eventualidade de que, no primeiro exame da existência de motivos absolutos de recusa, nem todos os factos pertinentes eram necessariamente conhecidos ou estabelecidos, não implica que o EUIPO possa, no âmbito do processo de registo de uma marca, ignorar a autoridade de caso julgado associada às apreciações feitas pelo juiz da União sobre o caráter descritivo dessa marca, num acórdão que anulou uma decisão de uma Câmara de Recurso que se tinha pronunciado no âmbito do processo de registo.

58      Resulta do exposto que, ao recusar o pedido de registo da marca pedida com o fundamento de que essa marca era descritiva na aceção do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 207/2009, a Grande Câmara de Recurso violou a autoridade do caso julgado associada ao acórdão de anulação e, assim, violou as exigências do artigo 72.°, n.° 6, do Regulamento 2017/1001.

59      Por conseguinte, o segundo fundamento deve ser julgado procedente.

 Quanto ao quarto fundamento, relativo à violação do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 207/2009

60      A recorrente acusa a Câmara de Recurso de ter violado o artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 207/2009, ao ter considerado que a marca pedida não apresentava caráter distintivo relativamente aos produtos e serviços em causa. Em especial, sustenta que o exame do caráter distintivo desta marca assenta em apreciações já feitas no âmbito do exame do caráter descritivo da referida marca e na afirmação de que essa marca é descritiva.

61      O EUIPO contesta a argumentação da recorrente e remete, a este respeito, para os fundamentos da decisão impugnada.

62      A título preliminar, importa recordar que, supondo que, contrariamente ao que foi decidido pelo EUIPO, o Tribunal Geral considera que um sinal, objeto de um pedido de marca da União Europeia, não cai na alçada de um dos motivos absolutos de recusa do registo visados no artigo 7.°, n.° 1, do Regulamento n.° 207/2009, a anulação pelo Tribunal da decisão do EUIPO que recusa o registo da referida marca conduziria necessariamente o EUIPO, ao qual incumbe extrair as consequências do dispositivo e dos fundamentos do acórdão do Tribunal Geral, a reabrir o processo de exame do pedido de marca em questão e a recusá‑lo se considerasse que o sinal em causa cai na alçada de outro motivo absoluto de recusa visado pela mesma disposição [v. Acórdão de 6 de outubro de 2011, Bang & Olufsen/IHMI (Representação de um altifalante), T‑508/08, EU:T:2011:575, n.° 33 e jurisprudência referida].

63      Com efeito, cada um dos motivos de recusa do registo, enumerados no artigo 7.°, n.° 1, do Regulamento n.° 207/2009, é independente dos outros e exige uma análise separada (v. Acórdão de 29 de abril de 2004, Henkel/IHMI, C‑456/01 P e C‑457/01 P, EU:C:2004:258, n.° 45 e jurisprudência referida).

64      Por conseguinte, a Grande Câmara de Recurso podia, como referiu, examinar na decisão impugnada o motivo absoluto de recusa previsto no artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 207/2009, nos termos do qual será recusado o registo das marcas desprovidas de caráter distintivo.

65      Segundo a jurisprudência, há que interpretar os motivos de recusa à luz do interesse geral subjacente a cada um deles. O interesse geral tomado em consideração na análise de cada um desses motivos de recusa pode, ou deve mesmo, refletir considerações diferentes, segundo o motivo de recusa em causa (v., neste sentido, Acórdão de 29 de abril de 2004, Henkel/IHMI, C‑456/01 P e C‑457/01 P, EU:C:2004:258, n.° 46).

66      O caráter distintivo de uma marca significa que essa marca permite identificar o produto para o qual é pedido o registo como proveniente de uma empresa determinada e, portanto, distinguir esse produto dos de outras empresas (v. Acórdão de 21 de janeiro de 2010, Audi/IHMI, C‑398/08 P, EU:C:2010:29, n.° 33 e jurisprudência referida).

67      O conceito de interesse geral subjacente ao artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 207/2009 confunde‑se, de forma evidente, com a função essencial da marca que consiste em garantir ao consumidor ou ao utilizador final a identidade da origem do produto ou do serviço designado pela marca, permitindo‑lhe distinguir, sem confusão possível, esse produto ou esse serviço dos que têm outra proveniência (v., neste sentido, Acórdão de 29 de abril de 2004, Henkel/IHMI, C‑456/01 P e C‑457/01 P, EU:C:2004:258, n.° 48).

68      Além disso, há que recordar que é certo que os sinais descritivos referidos no artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 207/2009 são também, sem prejuízo da possibilidade de aquisição de caráter distintivo pela utilização, desprovidos de caráter distintivo e que, segundo a jurisprudência, se pelo menos um dos significados potenciais do sinal designar uma característica dos produtos em causa, o sinal é qualificado de descritivo, na aceção do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 207/2009 e, por conseguinte, recusado o registo (v., neste sentido, Acórdão de 23 de outubro de 2003, IHMI/Wrigley, C‑191/01 P, EU:C:2003:579, n.os 30 e 32).

69      Todavia, esta jurisprudência estabelecida no âmbito do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 207/2009 não é transponível por analogia para a aplicação do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), deste regulamento quando o caráter distintivo da marca pedida, na aceção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 207/2009, é posto em causa por razões diferentes do seu caráter descritivo (Acórdão de 3 de setembro de 2020, achtung!/EUIPO, C‑214/19 P, não publicado, EU:C:2020:632, n.° 36).

70      No caso em apreço, a Grande Câmara de Recurso salientou que o público pertinente especializado considerava a marca pedida como transmitindo uma mensagem factual puramente informativa, e não como um sinal comercial, para publicações das classes 16 e 41, serviços nos domínios do entretenimento, do desporto e da cultura, bem como da formação e da formação contínua, pertencentes à classe 41, e serviços nos domínios do marketing, da consultadoria de empresas e da consultadoria de gestão de recursos humanos, da classe 35, nos quais estão em causa a criação ou utilização de perfis de personalidade baseados no sistema límbico.

71      A Grande Câmara de Recurso acrescentou que o mesmo se aplicava ao público profissional nos domínios da cultura, do desporto e do entretenimento, o qual presume simplesmente que os serviços em causa têm em conta os conhecimentos mais recentes sobre os diferentes tipos límbicos e representam, por conseguinte, um valor acrescentado relativamente aos serviços tradicionais do mesmo tipo.

72      Além disso, a Grande Câmara de Recurso rejeitou um argumento da recorrente baseado no Acórdão de 5 de julho de 2012, Deutscher Ring/IHMI (Deutscher Ring Sachversicherungs‑AG) (T‑209/10, não publicado, EU:T:2012:347), pelo facto de o processo que conduziu a esse acórdão dizer respeito a um sinal e a produtos e serviços diferentes e de o referido sinal ser entendido como uma denominação de fantasia, ao passo que o sinal pedido tinha um significado claramente descritivo.

73      Por último, a Grande Câmara de Recurso considerou que a sequência de palavras que compõem a marca pedida não comportava qualquer modificação gráfica ou semântica, pelo que não apresenta nenhuma característica suscetível de tornar a marca pedida, considerada no seu conjunto, apta a distinguir os seus produtos e serviços dos de outras empresas.

74      Deve notar‑se que os fundamentos referidos nos n.os 70 e 71, supra, pelos quais a Grande Câmara de Recurso considerou que a marca pedida seria entendida como uma mensagem factual de caráter puramente informativo visam demonstrar, sendo caso disso, um eventual caráter descritivo dessa marca, na aceção do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 207/2009, na medida em que a marca pedida pode servir, no comércio, para designar, em especial, a qualidade, o destino ou outras características dos produtos e dos serviços em causa, na aceção desta disposição.

75      Além disso, a Grande Câmara de Recurso recordou que considerava que a marca pedida tinha um significado claramente descritivo.

76      Quanto ao fundamento recordado no n.° 73, supra, por um lado, assenta nas conclusões erradas da Grande Câmara de Recurso segundo as quais a marca pedida tem caráter descritivo na aceção do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 207/2009. Por outro lado, demonstra a utilização de um critério errado para avaliar se a marca pedida podia ser registada, critério segundo o qual um sinal composto por elementos descritivos poderia reunir as condições de registo se existir uma diferença percetível entre o sinal e a simples soma dos elementos que o compõem. Com efeito, embora esse critério permita excluir a utilização de uma marca para descrever um produto ou serviço, contudo, não permite determinar se uma marca pode garantir ao consumidor ou ao utilizador final a identidade de origem do produto ou do serviço que designa.

77      Resulta do exposto que a Grande Câmara de Recurso não procedeu a um exame do motivo de recusa previsto no artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 207/2009 independente do motivo de recusa previsto no artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do mesmo regulamento, baseando o seu raciocínio na premissa do caráter descritivo da marca pedida na aceção desta última disposição, e, por conseguinte, não teve em conta o interesse geral que o artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 207/2009 visa especificamente proteger. Ao fazê‑lo, cometeu um erro de direito na aplicação desta última disposição.

78      Por conseguinte, há que julgar procedente o quarto fundamento.

79      Resulta de tudo o que precede que há que anular a decisão impugnada na sua totalidade, sem que seja necessário decidir quanto ao quinto e sexto fundamentos, relativos, respetivamente, à violação do artigo 94.°, n.° 1, do Regulamento n.° 2017/1001 e à violação do artigo 96.° do referido regulamento. Também não é necessário decidir sobre o terceiro fundamento, relativo à violação do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 207/2009, uma vez que, como foi salientado no n.° 53, supra, as apreciações feitas pelo Tribunal Geral sobre o caráter descritivo da marca em causa no acórdão de anulação tinham autoridade de caso julgado.

 Quanto às despesas

80      Nos termos do artigo 134.°, n.° 1, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo o EUIPO sido vencido, há que condená‑lo a suportar as suas próprias despesas, bem como as despesas efetuadas pela recorrente, em conformidade com o pedido desta última.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção alargada)

decide:

1)      A Decisão da Grande Câmara de Recurso do Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia (EUIPO) de 2 de dezembro de 2019 (processo R 1276/2017G) é anulada.

2)      O EUIPO é condenado nas despesas.

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 1 de setembro de 2021.



*      Língua do processo: alemão.