Language of document : ECLI:EU:T:2003:202

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quarta Secção)

9 de Julho de 2003 (1)

«Marca comunitária - Cores - Combinação de laranja e de cinzento - Motivo absoluto de recusa - Carácter distintivo - Artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento (CE) n.° 40/94»

No processo T-234/01,

Andreas Stihl AG & Co. KG, com sede em Waiblingen (Alemanha), representada por S. Völker e A. Klett, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrente,

contra

Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), representado por G. Schneider, na qualidade de agente,

recorrido,

que tem por objecto um recurso de anulação interposto da decisão da Primeira Câmara de Recurso do Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) de 24 de Julho de 2001 (R 477/2000-1), que recusa o registo de uma combinação de cores laranja e cinzenta como marca comunitária,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Quarta Secção),

composto por: V. Tiili, presidente, P. Mengozzi e M. Vilaras, juízes,

secretário: B. Pastor, secretária-adjunta,

vista a petição apresentada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 28 de Setembro de 2001,

vista a contestação do Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) apresentada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 20 de Dezembro de 2001,

após a audiência de 19 de Março de 2003,

profere o presente

Acórdão

     Antecedentes do litígio

1.
    Em 9 de Julho de 1996, a recorrente apresentou, nos termos do Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, de 20 de Dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (JO 1994, L 11, p. 1), tal como foi alterado, um pedido de registo de marca comunitária ao Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI).

2.
    A marca cujo registo foi pedido é uma combinação de duas cores, como tal, efectuada por um rectângulo laranja, correspondente à referência pantone 164c, encimando um rectângulo cinzento, correspondente à referência pantone 428u.

3.
    Os produtos para os quais o registo foi pedido integram-se na classe 7 na acepção do Acordo de Nice relativo à Classificação Internacional dos Produtos e Serviços aos quais se aplicam as marcas de Fábrica ou de Comércio, de 15 de Junho de 1957, tal como foi revisto e alterado, e correspondem à seguinte descrição:

- Classe 7: «Motos(s)erras, separadores-afiadores mecânicos com dispositivos de comando, máquinas de corte livre, motogadanheiras, tesouras mecânicas e manuais para aparar sebes, trados de sondagem mecânic(a), também enquanto aparelhos montados, pulverizadores mecânicos, aparelhos mecânicos de sopro (também aqueles com acção de aspiração por comutação), cortadores de relva eléctricos, cultivadores de solos enquanto aparelhos montados, aparelhos de limpeza a alta pressão e aparelhos de limpeza por aspiração com utilização doméstica e industrial, aparelhos de corte longitudinal, aparelhos para cortar os ramos das árvores, peças, peças sobresselentes e acessórios dos referidos aparelhos».

4.
    Por decisão de 7 de Abril de 2000, o examinador indeferiu esse pedido com fundamento no n.° 1, alínea b), do artigo 7.° do Regulamento n.° 49/94, pela razão de que nenhuma das duas cores que compõem a marca cujo registo foi pedido era uma cor inabitual para os produtos indicados na lista reivindicada, nem os matizes de cores considerados nem a combinação das cores podia conferir à marca o carácter distintivo requerido. Em 8 de Maio de 2000, a recorrente interpôs recurso no IHMI, de harmonia com o disposto no artigo 59.° do Regulamento n.° 40/94, da decisão do examinador.

5.
    Por decisão de 24 de Julho de 2001 (a seguir «decisão impugnada»), notificada à recorrente em 3 de Agosto de 2001, a Primeira Câmara de Recurso negou provimento ao recurso. Em substância, a Câmara considerou que a clientela a tomar em consideração não perceberia a combinação de cores como sendo, em si, uma indicação da origem comercial dos produtos em questão.

Pedidos das partes

6.
    A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

-    anular a decisão impugnada;

-    condenar o IHMI nas despesas.

7.
    O IHMI conclui pedindo que o Tribunal se digne:

-    negar provimento ao recurso;

-    condenar a recorrente nas despesas.

O direito

8.
    Em apoio do seu recurso, a recorrente invoca dois fundamentos assentes na violação do n.° 1, alínea b), do artigo 7.° e do n.° 1, alínea c), do artigo 7.°, do Regulamento n.° 40/94. O Tribunal considera que deve examinar-se o primeiro fundamento, assente na violação do n.° 1, alínea b), do artigo 7.° do referido regulamento.

Argumentos das partes

9.
    A título preliminar, a recorrente sustenta que as cores, em abstracto, podem ser objecto de registo como marcas. Com efeito, no quadro de uma concepção moderna da marca, o grande público é cada vez mais confrontado com sinais não tradicionais, tais como cores ou sinais sonoros utilizados de maneira deliberada e sistemática, e não para fins puramente decorativos ou estéticos. Essa utilização permite ao público estabelecer uma ligação entre uma cor ou uma combinação de cores e os produtos de uma empresa. As cores chamam imediatamente a atenção do público à distância para o orientar para a gama de produtos da empresa, enquanto outros sinais característicos, tais como uma marca nominativa, permitem a identificação final do produto. A recorrente acrescenta, a esse propósito, que o consumidor pode apreender diferentes matizes de cores.

10.
    Por outro lado, a recorrente alega que uma verdadeira necessidade prática e económica de proteger esses sinais implicam grandes investimentos. A protecção, por si só, no quadro de uma dada representação gráfica (círculo, quadrado, rectângulo, etc.) revela-se insuficiente, podendo as cores revestir dimensões diferentes no próprio produto, no seu acondicionamento e na publicidade.

11.
    No caso em apreço, a recorrente especifica, referindo-se ao seu catálogo de produtos junto como prova, que, concretamente, a combinação de cores cujo registo foi pedido é constituída por matizes de cores, isto é, as cores laranja (pantone 164c) e cinzenta (pantone 428u), que obedecem a um esquema de repartição preciso, sendo a parte superior da caixa de cor laranja e a parte inferior de cor cinzento claro.

12.
    Reconhece que a repartição das cores, tal como a superfície ocupada por cada uma delas, pode variar de um produto para outro consoante a natureza e a função dos produtos.

13.
    Não obstante essas possíveis diferenças, a recorrente sustenta que a utilização generalizada da combinação cria uma impressão visual identificável e homogénea para a gama dos seus produtos. Essa utilização sistemática, para a qual existem instruções internas destinadas às pessoas encarregadas da concepção, não tem um papel puramente decorativo, mas permite igualmente identificar os produtos.

14.
    A recorrente invoca jurisprudência recente, nomeadamente do Bundesgerichtshof alemão, que reconhece a aptidão das cores ou das combinações de cores (abstractas), salvo circunstâncias de facto particulares, para distinguir produtos ou serviços.

15.
    Quanto ao fundamento da decisão impugnada de falta de carácter inabitual da combinação, a recorrente alega que o respeito de tal critério não pode ser exigido. Com efeito, em sua opinião, se uma empresa utiliza já, desde há algum tempo, uma combinação de cores com sucesso, esta perde, por essa razão, o seu carácter inabitual; o mesmo acontece se a empresa fizer uso da marca após o seu registo e ela conhecer em breve algum sucesso.

16.
    No que respeita à cor cinzenta, a recorrente especifica que a cor reivindicada é um cinzento claro, nitidamente diferente da cor das partes metálicas dos produtos designados; considera que pouco importa saber se o plástico é, ou não, cinzento, pois o consumidor encontra o plástico apenas no estado colorido e resulta facilmente do catálogo que o matiz em causa não cria a impressão de que as peças assim coloridas sejam compostas de plástico em estado bruto.

17.
    No que respeita à cor laranja, a recorrente sustenta que não é necessário exigir um elemento de fantasia e que o facto de essa cor ser uma cor de base ou uma cor primária não tem influência no seu carácter distintivo.

18.
    A recorrente considera, igualmente, que o carácter inabitual da combinação não é pertinente para apreciar o carácter distintivo de uma combinação de cores e que uma protecção concedida à combinação específica pantone 428u e pantone 164c não se opõe a que outros operadores possam utilizar outras cores ou combinações de cores, inclusive em gamas cromáticas vizinhas. Além disso, uma perturbação dos concorrentes poderia ser evitada, limitando a protecção conferida pela marca a uma cor ou a uma combinação de cores precisas.

19.
    Por seu lado, o IHMI reconhece que a utilização frequente, sistemática e direccionada de certas cores visa suscitar, no espírito do público, uma associação dessas cores com os produtos ou os serviços de uma empresa. Isto explica que a aptidão das cores para exercer uma função de marca resulta, em geral, de um carácter distintivo adquirido pelo uso.

20.
    O IHMI admite igualmente, tal como foi já reconhecido pelas Câmaras de Recurso (v., neste sentido, processo R 7/97-3, laranja), que uma cor é, como tal, susceptível de ser protegida como marca comunitária.

21.
    Todavia, o IHMI considera que, para evitar um motivo absoluto de recusa, o carácter distintivo de um dado sinal deve existir anteriormente a qualquer uso da marca e antes de os meios comerciais em causa terem sido informados dela ou estarem habituados a ela. Ora, não preenche esta função um sinal composto de formas ou de cores usuais que o público perceberá unicamente como decoração ou como apresentação publicitária desprovidas de qualquer informação relativa à origem do produto.

22.
    No que respeita à referência à jurisprudência do Bundesgerichtshof, o IHMI especifica que esse órgão jurisdicional fez referência ao processo R 7/97-3, laranja, já referido, o qual, em substância, só permite o reconhecimento do carácter distintivo de uma combinação de cores quando as conclusões de facto põem em evidência a relação entre a referida combinação e os produtos em questão.

23.
    Quanto ao argumento de que a vista humana é capaz de apreender numerosos matizes de cores, o IHMI lembra que, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, há que ter em conta a circunstância de que o consumidor médio tem raramente a possibilidade de proceder a uma comparação directa entre as diferentes marcas, devendo confiar na imagem imperfeita que dela conservou na memória.

24.
    A esse propósito, o IHMI considera que as cores retidas pela memória humana são limitadas a certas cores ideais ou canónicas. Com efeito, segundo o IHMI, embora seja possível que o consumidor distinga um laranja claro e um laranja escuro, na linguagem, não será no entanto capaz, de memória, distingui-los na escala pantone. Isso explica, aliás, o interesse de tal instrumento para compensar a falta de memória objectiva das cores.

25.
    No que respeita à apreciação da combinação no seu conjunto, o IHMI mantém que os matizes de cores reivindicados são correntes, que o cinzento é acromático e intrinsecamente inapto para chamar a atenção do público, sendo, no entanto, também a cor natural de numerosos metais ou ligas antes da sua coloração, e que o matiz de laranja combinado com o matiz de cinzento está muito espalhado, em particular, no sector das ferramentas, para efeitos de advertência quanto ao carácter perigoso de algumas peças.

Apreciação do Tribunal

26.
    Há que salientar, a título prévio, que as cores ou as combinações de cores, como tais, são susceptíveis de constituir marcas comunitárias, na medida em que sejam adequadas para distinguir os produtos ou os serviços de uma empresa dos de uma outra empresa [acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 25 de Setembro de 2002, Viking-Umwelttechnik/IHMI (Justaposição de verde e cinzento), T-316/00, Colect., p. I-3715, n.° 23].

27.
    A aptidão geral de uma categoria de sinais para constituir uma marca não pode, todavia, implicar que todos os sinais pertencentes a essa categoria possuam necessariamente carácter distintivo, na acepção do n.° 1, alínea b) do artigo 7.°, do Regulamento n.° 40/94, em relação a um produto ou a um serviço determinado.

28.
    As marcas desprovidas de carácter distintivo visadas no n.° 1, alínea b), do artigo 7.° do Regulamento n.° 40/94 consideram-se incapazes de desempenhar a função essencial da marca, ou seja, a de identificar a origem comercial do produto ou do serviço e, como o Tribunal já considerou, permitir, assim, ao público relevante repetir uma experiência de compra, se ela se revelar positiva, ou evitá-la, se ela se revelar negativa, na ocasião da aquisição futura dos produtos ou dos serviços em questão [acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 27 de Fevereiro de 2002, Rewe-Zentral/IHMI (LITE), T-79/00, Colect., p. II-705, n.° 26].

29.
    Além disso, há que referir que o n.° 1, alínea b) do artigo 7.° do Regulamento n.° 40/94 não distingue consoante a natureza dos sinais. No entanto, a percepção do público relevante não é necessariamente a mesma no caso de um sinal constituído por uma cor ou uma combinação de cores, como tais, que no de uma marca nominativa ou figurativa que consiste num sinal independente do aspecto dos produtos que designa. Com efeito, embora o público tenha o hábito de perceber, imediatamente, marcas nominativas ou figurativas como sinais identificadores da origem comercial do produto, assim não sucede necessariamente quando o sinal se confunde com o aspecto do produto para o qual o registo do sinal é pedido (acórdão Justaposição de verde e cinzento, já referido, n.° 27).

30.
    Esclarecido isso, o carácter distintivo de um sinal apenas pode ser apreciado, por um lado, por referência aos produtos ou aos serviços relativamente aos quais o registo é solicitado e, por outro, por referência à percepção que dele tem o público relevante.

31.
    No caso em apreço, refira-se, em primeiro lugar, que a lista dos produtos em causa, isto é, aparelhos mecânicos, compreende as ferramentas destinadas principalmente a uso profissional, tais como os aparelhos de limpeza a alta pressão para uso industrial, e igualmente máquinas destinadas ao consumidor final, tais como tesouras manuais. Por isso, há que considerar público relevante os consumidores em geral, tal como foi decidido, com razão, pela Câmara de Recurso no ponto 18 da decisão impugnada. Por conseguinte, há que apreciar o carácter distintivo da marca pedida tendo em consideração a expectativa presumida de um consumidor médio, normalmente informado e razoavelmente atento e avisado. No entanto, há que tomar em conta a circunstância de que o consumidor médio deve confiar na imagem imperfeita que dela conservou na memória. Há igualmente que tomar em consideração o facto de que o nível de atenção do consumidor médio é susceptível de variar em função da categoria dos produtos em causa (v. por analogia, acórdão do Tribunal de Justiça de 22 de Junho de 1999, LLoyd Schuhfabrik Meyer, C-342/97, Colect., p. I-3819, n.° 26).

32.
    Em segundo lugar, no que respeita à apreciação do carácter distintivo da marca pedida, tratando-se, no caso em apreço, de uma marca complexa, deve ser considerada no seu conjunto. Contudo, isso não se opõe ao exame prévio de cada elemento de que a marca é composta (v., neste sentido, acórdão Justaposição de verde e cinzento, já referido, n.os 29 a 31).

33.
    No que respeita, por um lado, à cor laranja, tal como o IHMI alega com razão, esse elemento podia servir para advertir da perigosidade das peças das ferramentas, o que não lhe confere, de imediato, uma função de indicação da origem comercial dos produtos em questão. Além disso, o matiz especificado, isto é, o laranja pantone 164c, não apresenta uma diferença perceptível pelo público em causa, em relação às cores normalmente utilizadas ou susceptíveis de ser utilizadas nos produtos designados, nomeadamente, na medida em que, tal como foi recordado no n.° 31 supra, conserva uma imagem imperfeita dela.

34.
    No que respeita, por outro lado, à cor cinzenta, a Câmara de Recurso considerou, no ponto 15 da decisão impugnada, que essa cor se confundia com as matérias, metálica ou plástica, que compõem os produtos em causa. A esse propósito, mesmo quando o consumidor puder distinguir, num exame mais detalhado, o cinzento inerente à matéria bruta do resultante de uma coloração voluntária, a cor cinzenta será antes de tudo percebida, inclusive no matiz cinzento pantone 428u, como o resultado de um processo de fabrico ou como um simples acabamento de revestimento em cor.

35.
    Quanto à percepção do sinal no seu conjunto, há que salientar que o sinal é composto da simples combinação de matizes laranja e cinzento, tal como representada no pedido de registo. A esse propósito, a Câmara de Recurso sublinhou, com razão, no ponto 17 da decisão impugnada, a ausência de repartição concreta das cores no sinal reivindicado.

36.
    Quanto a este ponto, há que salientar que o sinal apreciado no seu conjunto apresenta um carácter abstracto e impreciso em relação aos produtos em causa e não revela arranjo sistemático nem repartição das referidas cores. Por isso, a impressão de conjunto que resulta da combinação das cores em relação aos produtos em causa é mais uma simples coloração das peças de revestimento do que uma organização sistemática que permita, para além da função puramente estética, gerar um sinal indicador da origem comercial de produtos (v., neste sentido, acórdão Justaposição de verde e cinzento, já referido, n.° 33).

37.
    Além disso, essa combinação de cores não poderá ser percebida e reconhecida como sinal, na medida em que uma repartição assistemática das cores nos produtos em causa pode levar a numerosos arranjos diferentes que não permitem ao consumidor apreender e memorizar uma combinação especial, que ele possa utilizar para reiterar uma experiência de compra de modo imediato e certo (v., neste sentido, acórdão Justaposição de verde e cinzento, já referido, n.° 34).

38.
    Essa apreciação não poderá ser posta em causa pelo argumento da recorrente de que a repartição das cores sobre os produtos obedeceria a um esquema preciso, isto é, o laranja para a sua parte superior e o cinzento para a parte inferior em conformidade com instruções internas destinadas às pessoas encarregadas da concepção. Com efeito, para ser identificado sobre os produtos designados, e tal como representado no pedido de registo, esse esquema de repartição deveria implicar, de forma constante, uma coloração laranja da parte superior e uma coloração cinzenta da parte inferior. Ora, mesmo que se olhe unicamente à coloração das peças de revestimento e se tenha em conta uma possível variação nas proporções entre as duas cores, não se poderia deixar de considerar que a diversidade e a irregularidade das formas e dos volumes dos produtos em causa não permitem obter uma coloração que reproduza, de maneira sistemática, o esquema de repartição supra-referido.

39.
    Essa apreciação é confirmada em relação aos produtos apresentados na audiência. Com efeito, verifica-se que a coloração dos produtos referidos no pedido, segundo o esquema de repartição invocado, em duas partes mais ou menos iguais, é impossível ou não é efectuada quando as peças de revestimento ou de carroçaria não tiverem uma configuração que permita colori-las segundo tal esquema. É, portanto, impossível para o público relevante encontrar sobre esses produtos um sinal permanente associando as cores de modo homogéneo e pré-determinado.

40.
    No que se refere ao argumento da recorrente de que o consumidor tem consciência da identificação dos produtos por meio de cores, as quais permitem chamar a sua atenção à distância para o orientar para a gama dos produtos, refira-se que, ao avançar este argumento, a recorrente admite precisamente que a identificação final da origem comercial do produto é realizada por outros elementos característicos, tais como uma marca nominativa.

41.
    Além disso, o carácter distintivo de um sinal não poderá deduzir-se somente do «efeito de gama», que consiste em sugerir ao consumidor que vários produtos têm a mesma origem comercial porque são geralmente apresentados sob um revestimento que reproduz cores comuns. Com efeito, tal análise procede de um conceito de comercialização que não poderá ter incidência na apreciação do carácter registável de um sinal [v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 20 de Março de 2002, DaimlerChrysler/IHMI (TRUCKCARD), T-358/00, Colect., p. II-1993, n.° 47], pois, nomeadamente, o produto comercializado isoladamente não permitiria perceber nas cores uma indicação da origem comercial, estando ausente o efeito de gama.

42.
    Por conseguinte, o público relevante não perceberá na combinação das cores laranja e cinzenta um sinal que indique que os produtos assim coloridos provêm de uma mesma empresa, mas percebê-la-á antes como um simples elemento de acabamento dos produtos em causa (v., neste sentido, acórdão Justaposição de verde e cinzento, já referido, n.° 37).

43.
    Assim, a marca cujo registo foi pedido é desprovida de carácter distintivo em relação aos produtos referidos.

44.
    Esta conclusão não poderá ser infirmada pelos argumentos da recorrente de que o critério ligado ao carácter inabitual da combinação cromática é inoperante na medida em que, se uma empresa utilizar essa combinação há muito tempo, esta deixa de ser inabitual. Com efeito, o carácter inabitual de uma cor ou de uma combinação de cores, enquanto critério de apreciação, designadamente, do carácter distintivo de um sinal cromático, visa avaliar a aptidão de tal cor ou de tal combinação de cores para distinguir, aos olhos do público relevante, os produtos ou os serviços em causa dos de outra proveniência comercial. De resto, à semelhança de qualquer outro sinal, uma cor ou uma combinação de cores que, em si mesma, não tem, na origem, carácter distintivo na acepção do n.° 1, alínea b), do artigo 7.° do Regulamento n.° 40/94 pode adquiri-lo, em relação aos produtos ou os serviços reivindicados, na sequência do seu uso em conformidade com o n.° 3 do mesmo artigo (v., por analogia, acórdão do Tribunal de Justiça de 4 de Maio de 1999, Windsurfing Chiemsee, C-108/97 e C-109/97, Colect., p. I-2779, n.° 47). Assim, o uso que uma empresa que pediu o registo de uma marca faz da cor ou da combinação de cores que compõem a marca, longe de constituir um elemento que exclui o seu carácter distintivo, pode, em certas circunstâncias, nomeadamente após um processo de familiarização do público em causa, permitir ao sinal cromático em causa adquirir o carácter distintivo de que estava desprovido à partida.

45.
    No que respeita à jurisprudência alemã invocada pela recorrente, há que recordar que o regime comunitário das marcas é um sistema autónomo [acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 5 de Dezembro de 2000, Messe München/IHMI (electronica), T-32/00, Colect., p. II-3829, n.° 47]. Além disso, há que salientar que, nas decisões invocadas pela recorrente, o Bundesgerichtshof se limitou a reconhecer o eventual carácter distintivo das cores à luz das circunstâncias concretas que dependem da situação em cada caso em apreço.

46.
    Por isso, o fundamento extraído da violação do n.° 1, alínea b), do artigo 7.° do Regulamento n.° 40/94 deve ser julgado improcedente.

47.
    Além disso, não há que examinar o fundamento relativo à violação do n.° 1, alínea c), do artigo 7.° do Regulamento n.° 40/94. Com efeito, segundo jurisprudência assente, basta que um dos motivos absolutos de recusa se aplique para que um sinal não possa ser registado como marca comunitária [v. acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 8 de Julho de 1999, Procter & Gamble/IHMI (BABY-DRY), T-163/98, Colect., p. II-2383, n.° 29, e de 12 de Janeiro de 2000, DKV/IHMI (COMPANYLINE), T-19/99, Colect., p. II-1, n.° 30].

48.
    Por isso, há que negar provimento ao recurso.

Quanto às despesas

49.
    Nos termos do n.° 2 do artigo 87.° do Regulamento de Processo do Tribunal, a parte vencida deve ser condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a recorrente sido vencida, há que condená-la nas despesas efectuadas pelo IHMI, em conformidade com os pedidos deste.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quarta Secção)

decide:

1.
    É negado provimento ao recurso.

2.
    A recorrente é condenada nas despesas.

Tiili
Mengozzi
Vilaras

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 9 de Julho de 2003.

O secretário

O presidente

H. Jung

V. Tiili


1: Língua do processo: alemão.