Language of document : ECLI:EU:F:2011:155

DESPACHO DO TRIBUNAL DA FUNÇÃO PÚBLICA DA UNIÃO EUROPEIA (Tribunal Pleno)

27 de Setembro de 2011 (*)

«Função pública — Processo — Fixação das despesas — Despesas recuperáveis — Despesas indispensáveis ‑ Honorários pagos por uma instituição ao seu advogado — Obrigação de o recorrente vencido suportar esses honorários — Princípio da igualdade de tratamento — Tutela jurisdicional efectiva — Requisitos»

No processo F‑55/08 DEP,

Carlo De Nicola, membro do pessoal do Banco Europeu de Investimento, residente em Strassen (Luxemburgo), representado por L. Isola, advogado,

recorrente,

contra

Banco Europeu de Investimento (BEI), representado por F. Martin, na qualidade de agente, assistido por A. Dal ferro, advogado,

recorrido,

O TRIBUNAL DA FUNÇÃO PÚBLICA (Tribunal Pleno),

composto por P. Mahoney, presidente, H. Tagaras, S. Gervasoni, presidentes de secção, H. Kreppel (relator), I. Boruta, S. Van Raepenbusch e M. I. Rofes i Pujol, juízes,

secretário: W. Hakenberg,

profere o presente

Despacho

1        Por requerimento que deu entrada na Secretaria do Tribunal da Função Pública em 29 de Março de 2010 por telecópia (a apresentação do original teve lugar no mesmo dia), o Banco Europeu de Investimento (BEI) submeteu ao Tribunal um pedido de fixação das despesas na sequência do acórdão do Tribunal de 30 de Novembro de 2009, De Nicola/BEI (F‑55/08, objecto de recurso no Tribunal Geral da União Europeia, processo T‑37/10 P).

 Antecedentes do litígio

2        Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal da Função Pública em 5 de Junho de 2008, C. De Nicola pediu, nomeadamente, em primeiro lugar, a anulação da decisão de 14 de Dezembro de 2007 através da qual o comité de recurso do BEI negou provimento ao seu recurso com vista, por um lado, à reapreciação da classificação que lhe foi atribuída no ano de 2006 e, por outro, à anulação das decisões do BEI, de 13 de Julho de 2007, relativas às promoções efectuadas no ano de 2006, na medida em que estas não o tinham promovido à função D, em segundo lugar, a anulação do seu relatório de notação de 2006 e das decisões de 13 de Julho de 2007, na medida em que não o promoveram a essa função, em terceiro lugar, a declaração de que o recorrente foi vítima de assédio moral, em quarto lugar, a condenação do BEI a indemnizar os danos que o recorrente considerava ter sofrido em virtude desse assédio e, finalmente, a anulação da decisão de recusa de tomada a cargo de determinadas despesas de tratamento médico com laser.

3        Por acórdão de 30 de Novembro de 2009, De Nicola/BEI, já referido, o Tribunal negou provimento ao recurso e condenou C. De Nicola nas despesas efectuadas pelo BEI.

4        Por carta de 14 de Janeiro de 2010, o BEI pediu a C. De Nicola o reembolso do montante de 18 232,25 euros, ou seja, 17 000 euros a título dos honorários pagos ao advogado constituído pelo BEI, 364,05 euros correspondentes às despesas de viagem por ele efectuadas e 868,20 euros a título de «despesas administrativas gerais». Vinham juntas a esta carta duas notas de honorários comprovativas, enviadas ao BEI pelo seu advogado.

5        Por correio electrónico de 15 de Fevereiro de 2010, C. De Nicola informou o BEI de que o montante pedido não era proporcionado nem justificado. Declarou todavia estar disposto a pagar o montante de 4 800 euros.

6        Por ofício de 1 de Março de 2010, enviado a C. De Nicola, o BEI referiu que «com a preocupação de chegar a um compromisso e evitar um processo de fixação de despesas», estava disposto a fixar as despesas recuperáveis em 16 000 euros, precisando todavia que esta proposta devia ser entendida com tendo sido feita «sem ulterior obrigação do [BEI] no quadro de um eventual processo de fixação de despesas».

7        Em resposta a este ofício, C. De Nicola, por correio electrónico de 8 de Março de 2010, mostrou‑se igualmente disposto a evitar o recurso a um novo processo judicial e propôs pagar ao BEI a soma de 6 000 euros, ou seja, um montante superior ao que tinha declarado estar disposto a pagar no correio electrónico de 15 de Fevereiro de 2010.

8        Por requerimento que deu entrada na Secretaria do Tribunal em 29 de Março de 2010, o BEI submeteu ao Tribunal o presente pedido de fixação das despesas.

9        O processo foi distribuído à Primeira Secção do Tribunal.

10      Por articulado que deu entrada na Secretaria do Tribunal em 19 de Maio de 2010, C. De Nicola apresentou as suas alegações sobre o pedido de fixação das despesas.

 Tramitação processual e pedidos das partes

11      O BEI conclui pedindo que o Tribunal se digne fixar em 18 214,50 euros o montante das despesas devidas por C. De Nicola no processo F‑55/08.

12      C. De Nicola conclui pedindo que o Tribunal se digne declarar o pedido inadmissível ou, a título subsidiário, julgá‑lo improcedente.

13      O processo foi remetido ao Tribunal Pleno.

14      Como medida de organização do processo, o Tribunal solicitou às partes que respondessem às seguintes questões principais:

¾        quando uma instituição recorre à assistência de um advogado, os honorários pagos a este devem ser considerados, atendendo à singularidade do contencioso da função pública e ao princípio da igualdade de acesso à justiça, «indispensáveis para efeitos do processo», na acepção do artigo 91.°, alínea b), do Regulamento de Processo, quando a assistência de um advogado constitui uma mera faculdade à disposição da instituição e não uma obrigação imposta a esta?

¾        o facto de se considerar que os honorários pagos por uma instituição a um advogado são «indispensáveis para efeitos do processo», é susceptível de gerar uma discriminação entre os recorrentes vencidos, consoante a instituição recorrida tenha ou não recorrido à assistência de um advogado, uma vez que os recorrentes não têm qualquer influência sobre os motivos pelos quais a instituição decide constituir um advogado (opção da instituição por não dispor de um Serviço Jurídico que possa ocupar‑se dos processos de função pública, organização e dimensão do referido serviço, volume de trabalho dos agentes, incapacidade por parte destes de trabalhar na língua do processo, etc.)?

¾        De qualquer modo, no caso em apreço, era estritamente necessária a constituição de um advogado pelo BEI, tendo em conta, nomeadamente, o trabalho previamente efectuado pelos seus serviços internos no litígio que o opunha a C. De Nicola?

¾        Que incidência sobre o resultado do litígio se pode extrair do despacho do presidente do Tribunal de Justiça, de 26 de Novembro de 2004, BEI/De Nicola (C‑198/02 P (R) DEP)?

15      As partes deram seguimento a estas medidas de organização do processo.

 Argumentos das partes

16      O BEI alega que o montante de 18 214,50 euros pedido a título de despesas recuperáveis — ou seja, 17 000 euros correspondentes aos honorários do seu advogado, 364,50 euros correspondentes às despesas de viagem por ele efectuadas para se deslocar ao Tribunal e 850 euros correspondentes às suas «despesas gerais» — é razoável e conforme às indicações da jurisprudência.

17      No que se refere mais especificamente aos honorários de advogado no montante de 17 000 euros, o BEI recorda antes de mais que, segundo a jurisprudência, estes integram o conceito de despesas indispensáveis efectuadas para efeitos do processo. O BEI observa em seguida que embora as problemáticas jurídicas suscitadas no processo principal não fossem novas, o importante número de páginas do recurso, ao qual foi junto um número considerável de anexos, assim com a formulação de numerosos pedidos por C. De Nicola, necessitaram de um grande número de horas de trabalho por parte do seu advogado. Acresce que a própria extensão do acórdão — 276 números — testemunha a complexidade do litígio no processo principal. Finalmente, o BEI sublinha que o montante de 17 000 euros a título de honorários de advogado, de entre os quais 1 000 euros de despesas de preparação do presente pedido de fixação das despesas, corresponde, face a uma tarifa horária média de 220 euros, a cerca de 77 horas de trabalho, o que se afigura adequado tendo em conta as prestações fornecidas.

18      Contestando, C. De Nicola conclui em primeiro lugar pela inadmissibilidade do pedido de fixação de despesas, alegando que, nos termos do artigo 41.° do Regulamento do pessoal do BEI, este pedido devia ter sido precedido de um procedimento de conciliação.

19      Subsidiariamente, C. De Nicola conclui pela improcedência do pedido.

20      Relativamente aos honorários de advogado, C. De Nicola contesta a afirmação segundo a qual estes eram indispensáveis para efeitos do processo. Sublinha que incumbia ao BEI, dado que tinha a faculdade de se fazer representar no Tribunal unicamente pelos seus agentes, demonstrar que, no caso concreto, tinha necessidade de recorrer aos serviços de um advogado externo, em virtude, nomeadamente, da complexidade das questões tratadas. Ora, segundo C. De Nicola, o BEI, que se limitou a fixar antecipada e forfetariamente os honorários do seu advogado, não fez tal prova e não citou qualquer acto específico cuja dificuldade de elaboração tivesse tornado necessária a assistência de um profissional externo. Finalmente, C. De Nicola recorda que o próprio BEI admitiu, no seu pedido, que as questões suscitadas no processo principal não eram novas e acrescenta que os numerosos documentos juntos à sua petição no processo principal emanaram do próprio BEI e que já tinham sido juntos em processos anteriores.

21      Quanto às despesas de deslocação efectuadas pelo advogado do BEI para se dirigir ao Tribunal, C. De Nicola contesta a sua realidade e observa além disso que o montante de 364,50 euros pedido a esse título corresponde exactamente ao que o mesmo advogado tinha facturado ao BEI a título de uma deslocação para uma reunião em 17 de Setembro de 2008.

22      No que se refere às despesas administrativas gerais cujo reembolso é solicitado num montante de 850 euros, C. De Nicola alega que o BEI também não fez prova de ter efectuado tais despesas.

23      Em resposta às observações de C. De Nicola, o BEI contesta a afirmação de que os honorários pagos ao seu advogado não eram indispensáveis. Alega que os recursos do seu Serviço Jurídico estão essencialmente consagrados às missões para as quais este foi criado, concretamente, a concessão de empréstimos e garantias a fim de contribuir para o desenvolvimento do mercado interno, não lhe permitindo instruir e acompanhar o contencioso que o opõe aos membros do seu pessoal. O BEI deduz daí que a sua prática sistemática de recurso a um advogado perante todos os órgãos jurisdicionais da União, independentemente da língua do processo, deve ser considerada indispensável para assegurar a sua defesa.

 Apreciação do Tribunal

 Quanto à admissibilidade do pedido de fixação das despesas

24      Importa realçar que o pedido de fixação das despesas apresentado pelo BEI resulta do direito que lhe é conferido pelo acórdão De Nicola/BEI, já referido, proferido no processo principal e, portanto, não depende dos direitos e obrigações estatutários de C. De Nicola na sua qualidade de membro do pessoal do BEI (v., neste sentido, despacho do Tribunal de Primeira Instância de 4 de Agosto de 1998, Eppe/Comissão, T‑77/98, n.° 11). Nestas condições, C. De Nicola não tem razão ao alegar que, para ser admissível, o pedido de fixação de despesas devia ter sido precedido do procedimento de conciliação previsto no artigo 41.° do Regulamento do pessoal do BEI, procedimento cujo carácter facultativo foi aliás recordado pela jurisprudência (acórdão do Tribunal de Primeira Instância, de 17 de Junho de 2003, Seiller/BEI, T‑385/00, n.° 73).

25      Daqui resulta que o pedido de fixação das despesas é admissível.

 Quanto à procedência do pedido de fixação das despesas

 Sobre os honorários de advogado no processo principal

26      Importa recordar a título liminar que, nos termos do artigo 19.° do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, as instituições da União são representadas perante o juiz da União por um agente nomeado para cada causa, podendo o agente ser assistido por um consultor ou por um advogado. Decorre da jurisprudência que o termo «instituição», empregue neste artigo, não deve ser entendido como visando exclusivamente as instituições enumeradas no artigo 13.°, n.° 1, do TUE, abrangendo igualmente os outros órgãos e organismos da União, como o BEI (v. neste sentido, acórdão do Tribunal da Função Pública de 8 de Março de 2011, De Nicola/BEI, F‑59/09, n.° 116, objecto de recurso pendente no Tribunal Geral da União Europeia, processo T‑264/11 P).

27      Nos termos do artigo 91.°, alínea b), do Regulamento de Processo, são consideradas despesas recuperáveis «as despesas suportadas pelas partes para efeitos do processo, nomeadamente as despesas de deslocação e de estada e a remuneração do representante, se forem indispensáveis». Decorre desta disposição que as despesas recuperáveis são limitadas, por um lado, às suportadas para efeitos do processo no Tribunal e, por outro, às que foram indispensáveis para estes efeitos (despacho do Tribunal da Função Pública de 26 de Abril de 2010, Schönberger/Parlamento, F‑7/08 DEP, n.° 23).

28      A questão que se coloca é a de saber se, e em que condições, na hipótese de uma instituição, nos termos do artigo 19.°, terceiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça, ter recorrido a um advogado, os honorários pagos a este último constituem «despesas recuperáveis» na acepção do artigo 91.°, alínea b), do Regulamento de Processo.

29      Neste contexto, não merece acolhimento a tese segundo a qual os honorários pagos por uma instituição ao advogado a quem recorreu no âmbito de um processo perante um órgão jurisdicional, nunca podem ser considerados despesas recuperáveis, com base no argumento de que a referida instituição não era obrigada a fazer‑se assistir por um advogado. Com efeito, embora seja certo que o recurso a um advogado por parte de uma instituição é uma mera faculdade deixada à livre disposição desta, tal recurso constitui contudo uma prerrogativa inerente ao exercício dos direitos da defesa. Nestas condições, os honorários pagos por uma instituição ao advogado que constituiu devem sempre ser considerados despesas.

30      Não obstante, o carácter recuperável dos honorários pagos por uma instituição ao advogado que constituiu está dependente, conforme prevê expressamente o artigo 91.°, alínea b), do Regulamento de Processo, da produção de prova do seu carácter «indispensável» para efeitos do processo, por parte da instituição.

31      É certo que já foi decidido que quando uma instituição recorre à assistência de um advogado, a remuneração deste último é abrangida pelo conceito de despesas indispensáveis suportadas para efeitos do processo (v., neste sentido, despachos do Tribunal de Justiça de 21 de Junho de 1976, Dietz/Comissão, 126/76 DEP, n.os 5 e 6; de 7 de Setembro de 1999, Comissão/Sveriges Betodlares e Henrikson, C‑409/96 P‑DEP, n.° 1; e de 26 de Novembro de 2004, BEI/De Nicola, C‑198/02 P‑DEP, n.° 18; despachos do Tribunal de Primeira Instância de 6 de Fevereiro de 1995, Tête e o./BEI, T‑460/93 P‑DEP, e de 24 de Março de 1998, International Procurement Services/Comissão, T‑175/94 DEP, n.° 9).

32      Não se pode contudo deduzir dos despachos citados no número anterior que para o juiz da União os honorários pagos por uma instituição ao seu advogado constituem, em todos os casos, despesas recuperáveis, cujo carácter indispensável a instituição está dispensada provar, em conformidade com o artigo 91.°, alínea b), do Regulamento de Processo. Com efeito, ao precisar nalguns dos referidos despachos que a remuneração dos advogados entra «no conceito de despesas indispensáveis para efeitos do processo», o juiz da União limitou‑se a indicar que, contrariamente a outras despesas, excluídas por natureza das despesas recuperáveis, como a remuneração dos agentes incumbidos de representar as instituições em juízo, os honorários de advogado são susceptíveis, desde que seja feita prova do seu carácter indispensável, de ser reembolsados às instituições. Sendo certo que, posteriormente à prolação dos despachos mencionados no número anterior, o Conselho da União Europeia, na sua decisão de 2 de Novembro de 2004 que institui o Tribunal da Função Pública (JO L 333, p.7) inseriu no Estatuto do Tribunal De Justiça um anexo I, cujo artigo 7.°, n.° 5, segundo período, prevê que, sob reserva de disposições específicas do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido, daí resultou apenas uma alteração das regras que regem o encargo das despesas recuperáveis e não a definição destas.

33      Se o artigo 91.°, alínea b), do Regulamento de Processo fosse interpretado no sentido de que implicaria, em todos os casos, e sem justificação objectiva particular, que os honorários pagos por uma instituição ao seu advogado fossem considerados «despesas indispensáveis» na acepção deste artigo, tal interpretação poderia conduzir a uma inobservância do princípio da igualdade de tratamento no caso particular de dois funcionários pertencentes à mesma instituição interporem recurso contra ela e de esta decidir, no primeiro destes recursos, fazer‑se assistir por um advogado e não o fazer no segundo. Com efeito, no caso de ser negado provimento a ambos os recursos e de condenação de cada um dos funcionários recorrentes nas despesas suportadas pela instituição recorrida, o montante das referidas despesas revelar‑se‑ia sensivelmente mais elevado em relação ao primeiro dos funcionários do que em relação ao segundo. Ora decorre da jurisprudência que, numa matéria incluída no exercício de um poder discricionário, o princípio da igualdade de tratamento é violado quando uma instituição procede a uma diferenciação arbitrária ou manifestamente inadequada em relação ao objectivo prosseguido (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 13 de Dezembro de 2004, E/Comissão, T‑251/02, n.° 124).

34      A circunstância, como no caso presente, de uma instituição ter recorrido sistematicamente a um advogado nos litígios que a opõem aos seus agentes não basta para afastar o risco de violação do princípio da igualdade, na medida em que os agentes desta instituição serão tratados de modo diferente dos funcionários e outros agentes das instituições que não têm ou têm pouco o hábito de se fazer assistir por um advogado nos litígios abrangidos pelo contencioso da função pública. É certo que o juiz da União tem sublinhado a importância da autonomia de cada instituição na acepção do artigo 19.°, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça, afastando argumentos baseados na unidade da função pública (v. acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 16 de Setembro de 1997, Gimenez/Comité das Regiões, T‑220/95, n.° 72). Todavia, o benefício deste princípio da autonomia só foi reconhecido às instituições na qualidade de empregadoras, na gestão do respectivo pessoal. Este princípio também não pode justificar que os agentes da União, seja qual for a instituição a que pertencem, não estejam na mesma situação no que respeita ao acesso à justiça para dirimirem os litígios que os opõem ao seu empregador. Por conseguinte, mesmo que cada instituição disponha de um amplo poder de apreciação na organização dos seus serviços e no cumprimento das missões que lhe são confiadas, todos os agentes da União devem poder aceder à justiça em condições equivalentes, não podendo o grau de efectividade do seu direito de acção variar em função da escolha do seu empregador no que diz respeito à organização dos seus serviços.

35      Acresce que a diferença de tratamento referida nos números anteriores é igualmente susceptível, caso a escolha entre recorrer ou não a um advogado se baseie na escolha da língua do processo, de implicar uma discriminação indirecta em razão da nacionalidade, dado que penalizaria os nacionais dos Estados‑Membros cuja língua não figura entre as utilizadas mais correntemente nos Serviços Jurídicos das instituições.

36      Finalmente, importa recordar que antes da entrada em vigor do Regulamento de Processo, em 1 de Novembro de 2007, as despesas efectuadas pelas instituições nos processos de função pública instaurados no Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias ficavam em princípio a cargo destas, em aplicação do artigo 88.° do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância. Através da decisão de 2 de Novembro de 2004 que institui o Tribunal da Função Pública, o Conselho decidiu, conforme foi acima recordado, que a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Caso se optasse pela interpretação do artigo 91.°, alínea b), do Regulamento de Processo segundo a qual a totalidade ou parte dos honorários de advogado pagos por uma instituição deveriam, em todos os casos, ser considerados despesas indispensáveis, esta nova regra sobre as despesas seria susceptível, quando o recorrente é vencido e a instituição recorrida que constituiu um advogado pede a condenação daquele nas despesas, de onerar sensivelmente o custo do processo no que se refere ao recorrente. Com efeito, o recorrente vencido ficaria obrigado a suportar, para além dos honorários pagos ao seu próprio advogado, uma parte, ou mesmo a totalidade, dos honorários pagos pela instituição ao advogado desta, podendo então o custo do processo atingir um montante igual ou superior a dez vezes o vencimento mensal de um funcionário do grau AST 1, sem relação com o interesse económico do seu recurso. Tendo em conta esse risco de contencioso, o funcionário ou agente em causa poderia ser levado a renunciar à interposição de um recurso, em particular nos processos em que os interesses financeiros em jogo fossem pouco importantes ou mesmo inexistentes. Tal consequência, devido à desproporção entre os interesses financeiros em jogo no processo e as despesas processuais, seria susceptível de lesar a efectividade do direito de acção dos funcionários e agentes da União e de violar assim o princípio da tutela jurisdicional efectiva que decorre da jurisprudência e que está consagrado no artigo 47.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.

37      Resulta das considerações que antecedem que, no caso de um recorrente ser condenado a pagar total ou parcialmente as despesas efectuadas por uma instituição, incumbe a esta, caso pretenda recuperar os honorários pagos a um advogado, demonstrar que esses honorários constituíram «despesas indispensáveis» para efeitos do processo.

38      Neste contexto, uma instituição poderá fazer prova do carácter necessário do recurso a um advogado demonstrando em particular que, por razões conjunturais e passageiras, ligadas nomeadamente a uma sobrecarga pontual de trabalho ou a ausências imprevistas do pessoal do seu Serviço Jurídico, habitualmente competente para a representar em justiça, se viu obrigada a constituir um advogado. O mesmo sucederá relativamente a uma instituição que, confrontada com um recorrente que interpôs recursos importantes em volume e/ou em número, demonstre que, se não tivesse constituído um advogado, se veria obrigada a consagrar a disponibilidade dos seus serviços numa medida desproporcionada ao tratamento dos mesmo recursos.

39      Em contrapartida, uma instituição não pode pretender ser reembolsada da totalidade ou parte dos honorários pagos ao seu advogado no caso de se limitar a explicar que, por razões orçamentais ou organizacionais, optou por desonerar o seu Serviço Jurídico da gestão do contencioso da função pública. Com efeito, embora uma instituição seja livre de fazer tal opção, as consequências da mesma não podem onerar os seus agentes por via das despesas, criando o risco de originar, conforme acima foi dito, uma violação do princípio da igualdade de acesso à justiça entre o pessoal das instituições cujo Serviço Jurídico assegura a sua representação nos órgãos jurisdicionais da União e o pessoal das instituições que recorrem sistematicamente a um advogado.

40      Uma vez feita a prova do carácter necessário do recurso a um advogado pela instituição, compete ao tribunal determinar o montante até ao qual os honorários de advogado podem ser recuperados à parte condenada nas despesas.

41      A este respeito, o tribunal não tem que tomar em consideração uma tabela nacional que fixe os honorários dos advogados nem um eventual acordo celebrado a este propósito entre a parte interessada e os seus agentes ou consultores (v., por exemplo, despacho do Tribunal de Primeira Instância de 9 de Setembro de 2002, Pannella/Parlamento, T‑182/00 DEP, n.° 28). Na ausência de disposição em matéria de tabelas de honorários no direito da União, compete ao tribunal apreciar livremente os dados da causa, tendo em conta o objecto e a natureza do litígio, a sua importância na perspectiva do direito da União, bem como as dificuldades da causa, a amplitude do trabalho que o processo contencioso pode ter exigido dos agentes ou consultores que intervieram no processo e os interesses económicos que o litígio representou para as partes (despacho Pannella/Parlamento, já referido, n.° 29). O juiz deve igualmente ter em conta, ao fixar o montante dos honorários recuperáveis, a capacidade contributiva da parte condenada nas despesas para que o seu direito à acção, consagrado no artigo 47.° da Carta dos direitos fundamentais, não seja lesado de forma desproporcionada.

42      Finalmente, o montante dos honorários recuperáveis do advogado da instituição em causa não pode ser avaliado abstraindo do trabalho realizado mesmo antes do recurso ao Tribunal pelos serviços daquela. Com efeito, dado que a admissibilidade do recurso está dependente da apresentação de uma reclamação e do indeferimento desta pela autoridade investida do poder de nomeação, os serviços da instituição estão em princípio implicados no tratamento dos litígios antes mesmo de estes serem presentes ao Tribunal. Daqui resulta que, nos processos em que por um dos motivos expostos no n.° 38 do presente despacho, uma instituição recorreu a um advogado, o número total de horas de trabalho deste advogado que podem revelar‑se objectivamente indispensáveis para efeitos do processo deve ser avaliado, em princípio, num terço das horas que teriam sido necessárias a esse advogado caso não tivesse podido apoiar‑se no trabalho anteriormente desenvolvido pelo Serviço Jurídico da instituição.

43      Esta proporção pode não obstante ser fixada a um nível mais elevado, nomeadamente na hipótese de uma instituição, confrontada com um recorrente que interpôs um grande número de recursos com carácter manifestamente abusivo, ter sido obrigada a confiar a um advogado a totalidade ou parte da gestão desses litígios, incluindo na fase pré‑contenciosa, a fim de evitar a mobilização das disponibilidades do seu Serviço Jurídico numa medida desproporcionada.

44      É à luz das considerações que antecedem que importa decidir o presente pedido de fixação das despesas no que se refere aos honorários de advogado suportados pelo BEI no âmbito do processo principal.

45      No caso em apreço, o BEI alega que o contencioso da função pública não se integra de modo algum na actividade corrente do seu Serviço Jurídico, dado que este está antes de mais consagrado às missões para as quais foi criado, concretamente, a concessão de empréstimos e garantias a fim de contribuir para o desenvolvimento do mercado interno. Todavia, conforme foi dito acima, tal circunstância não basta para demonstrar que os honorários pagos ao advogado a quem o BEI recorreu devem ser considerados despesas indispensáveis para efeitos do processo.

46      Não obstante, tendo em conta as circunstâncias específicas do caso em apreço, o Tribunal considera que era necessária a constituição de um advogado pelo BEI. Com efeito, ainda que o litígio no processo principal não suscitasse dificuldades especiais e que as questões jurídicas nele colocadas, respeitantes, no essencial, à legalidade de um relatório de notação e a uma decisão de não promoção, bem como à alegada existência de assédio moral, não fossem novas no direito da União, não pode deixar de se constatar que a petição inicial de 42 páginas era de uma extensão superior às petições habitualmente apresentadas no Tribunal, que os seus anexos ultrapassavam as 700 páginas, que os fundamentos aduzidos eram muito numerosos, sendo alguns deles desprovidos de carácter sério. Além disso, previamente a este recurso, C. De Nicola já tinha apresentado um número significativo de outras petições no Tribunal de Primeira Instância e no Tribunal de Justiça, cada uma das quais exigira, em virtude da extensão dos articulados, um trabalho particularmente importante do Serviço Jurídico do BEI (processos apensos T‑7/98, T‑208/98 e T‑109/99, processos apensos T‑120/01 e T‑300/01, processos apensos T‑7/98 DEP, T‑208/98 DEP e T‑109/99 DEP e processo C‑198/02 P‑DEP).

47      Dado que não se pode considerar que o recurso de C. De Nicola no processo principal apresenta um carácter manifestamente abusivo, será feita uma justa apreciação do trabalho objectivamente indispensável para efeitos do processo fixando o número de horas de trabalho em 25 horas, ou seja, um terço do que teria sido necessário ao advogado se este não tivesse podido apoiar‑se no trabalho anteriormente efectuado pelo Serviço Jurídico do BEI (75 horas).

48      Daqui resulta que, considerando que a tarifa horária de 220 euros reflecte a remuneração razoável devida a um advogado experiente num processo desta natureza, os honorários de advogado indispensáveis suportados pelo BEI no quadro do processo principal devem ser avaliados em 5 500 euros (ou seja, 25 horas x 220 euros).

 Quanto às outras despesas ligadas ao processo principal

49      O BEI solicita antes de mais o reembolso do montante de 364,50 euros, correspondente às despesas de deslocação alegadamente efectuadas pelo seu advogado para comparecer na audiência. Todavia, este pedido não merece acolhimento. Com efeito, embora seja ponto assente que o advogado constituído pelo BEI lhe facturou efectivamente uma deslocação profissional ao Luxemburgo (Luxemburgo) no montante de 364,50 euros, não ficou provado através dos documentos juntos pelo BEI em apoio do seu pedido de fixação das despesas que esta deslocação, que se refere a uma reunião que decorreu na sede do BEI, em 17 de Setembro de 2008, e não à audiência que teve lugar em 24 de Março de 2009, foi necessária para a preparação desta última.

50      Por outro lado, no que respeita às outras despesas solicitadas pelo BEI no montante de 850 euros e correspondentes a «despesas gerais» por este efectuadas, tais despesas não são destacáveis da actividade interna do BEI, pelo que não podem dar lugar a qualquer reembolso, mesmo forfetário (v., neste sentido, despacho BEI/De Nicola, já referido, n.° 19).

 Quanto às despesas efectuadas no processo de fixação das despesas

51      O artigo 92.° do Regulamento de Processo relativo ao procedimento de contestação das despesas não prevê, diferentemente do artigo 86.° do mesmo regulamento, que se decida quanto às despesas no acórdão ou no despacho que ponha termo à instância. Com efeito, se o Tribunal, ao decidir no âmbito de um recurso apresentado com fundamento no artigo 92.° do Regulamento de Processo sobre a contestação das despesas de uma instância principal decidisse sobre as despesas objecto de contestação e, separadamente, sobre as novas despesas suportadas no quadro de um recurso de contestação das despesas, poderia, eventualmente ser ulteriormente chamado a decidir sobre uma nova contestação das novas despesas.

52      Daqui decorre que não há que decidir separadamente sobre as despesas e honorários suportados para efeitos do presente processo (despacho do Tribunal de 10 de Novembro de 2009, X/Parlamento, F‑14/08 DEP, n.° 40).

53      Não obstante, incumbe ao Tribunal, ao fixar as despesas recuperáveis, ter em conta todas as circunstâncias do processo até ao momento de proferir o despacho de fixação das despesas. Neste contexto, o Tribunal pode determinar o montante das despesas ligadas ao processo respeitante a estas e que foram indispensáveis na acepção do artigo 91.° do Regulamento de Processo (v. despacho Schönberger/Parlamento, já referido, n.° 48).

54      No caso em apreço, o Tribunal não pode deixar de declarar o carácter manifestamente desproporcionado, quanto ao seu montante, do pedido de fixação das despesas, dado que o BEI, que tinha pedido que os honorários recuperáveis suportados no âmbito do processo principal fossem avaliados em 16 000 euros, apenas obteve a este título uma soma de 5 500 euros, ou seja, um montante inferior a 6 000 euros que C. De Nicola tinha proposto pagar‑lhe no correio electrónico de 8 de Março de 2010. Por outro lado, o advogado do BEI aproveitou necessariamente, também no âmbito do presente pedido de fixação das despesas, a assistência fornecida pelos serviços do BEI.

55      Todavia, importa ter em conta que as modalidades de avaliação do montante recuperável dos honorários pagos por uma instituição ao seu advogado foram definidas com precisão no presente despacho. Além disso, decorre dos documentos juntos aos autos que o advogado do BEI não se limitou a redigir o pedido de fixação das despesas, tendo igualmente formulado as respostas escritas circunstanciadas a diversas questões colocadas às partes pelo Tribunal.

56      Nestas condições, o Tribunal entende que, da soma de 1 000 euros pedida pelo BEI a título de despesas ligadas ao processo de fixação das despesas, apenas um montante de 500 euros pode ser considerado relativo a despesas indispensáveis na acepção do artigo 91.° do Regulamento de Processo.

57      Resulta de tudo o que antecede que o montante das despesas a reembolsar por C. De Nicola deve ser fixado em 6 000 euros.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DA FUNÇÃO PÚBLICA (Tribunal Pleno)

decide:

O montante das despesas recuperáveis pelo Banco Europeu de Investimento no processo F‑55/08, De Nicola/BEI, é fixado em 6 000 euros.

Feito no Luxemburgo, em 27 de Setembro de 2011.

O secretário

 

      O presidente

W. Hakenberg

 

      P. Mahoney


* Língua do processo: italiano.