Language of document : ECLI:EU:T:2005:337

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Terceira Secção)

22 de Setembro de 2005 (*)

«Marca comunitária – Processo de oposição – Marca anterior nominativa nacional TRIVASTAN – Pedido de marca comunitária nominativa TRAVATAN – Motivo relativo de recusa – Risco de confusão – Artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento (CE) n.° 40/94»

No processo T‑130/03,

Alcon Inc., com sede em Hünenberg (Suíça), representada por G. Breen, solicitor, e J. Gleeson, barrister,

recorrente,

contra

Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), representado por S. Palmero Cabezas e S. Laitinen, na qualidade de agentes,

recorrido,

sendo a outra parte no processo na Câmara de Recurso do IHMI, interveniente no Tribunal de Primeira Instância,

Biofarma SA, com sede em Neuilly‑sur‑Seine (França), representada por V. Gil Vega, A. Ruiz Lopez e D. González Maroto, advogados,

que tem por objecto um recurso da decisão da Terceira Câmara de Recurso do IHMI de 30 de Janeiro de 2003 (processo R 968/2001‑3), relativa a um processo de oposição entre a Alcon Inc. e a Biofarma SA,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Terceira Secção),

composto por: M. Jaeger, presidente, V. Tiili e O. Czúcz, juízes,

secretário: C. Kristensen, administradora,

vista a petição entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 17 de Abril de 2003,

vista a contestação do IHMI entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 17 de Outubro de 2003,

vistas as observações da interveniente entradas na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 6 de Outubro de 2003,

após a audiência de 14 de Abril de 2005,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

1        Em 11 de Junho de 1998, a Alcon Inc. apresentou um pedido de marca comunitária no Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), ao abrigo do Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, de 20 de Dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (JO 1994, L 11, p. 1), conforme alterado.

2        A marca cujo registo foi pedido é o sinal nominativo TRAVATAN.

3        Os produtos para os quais o registo foi pedido integram a classe 5 na acepção do Acordo de Nice relativo à Classificação Internacional dos Produtos e dos Serviços para o registo de marcas, de 15 de Junho de 1957, tal como revisto e alterado, e correspondem à seguinte descrição: «Produtos farmacêuticos oftalmológicos».

4        Este pedido foi publicado no Boletim de Marcas Comunitárias n.° 23/99, de 22 de Março de 1999.

5        Em 22 de Junho de 1999, a Biofarma SA deduziu oposição, nos termos do artigo 42.° do Regulamento n.° 40/94, contra o registo dessa marca comunitária. O motivo invocado em apoio da oposição foi o referido no artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94. A oposição fundava‑se na existência da marca nacional nominativa TRIVASTAN, registada em Itália, em 27 de Janeiro de 1986, sob o número 394980.

6        A oposição foi deduzida relativamente a todos os produtos que são objecto do pedido de marca. A mesma referia‑se à totalidade dos produtos abrangidos pela marca anterior, designadamente «produtos farmacêuticos, veterinários e higiénicos; produtos dietéticos para crianças ou doentes; emplastros, material para pensos; matérias para chumbar os dentes e para impressões dentárias; desinfectantes; preparações para destruir ervas e animais nocivos», que integram a classe 5.

7        Por carta de 5 de Maio de 2000, a recorrente pediu que a interveniente provasse, em conformidade com o artigo 43.°, n.os 2 e 3, do Regulamento n.° 40/94, que, nos cinco anos anteriores à publicação do pedido de marca comunitária, a marca anterior tinha sido objecto de uma utilização séria no Estado‑Membro em que essa marca se encontra protegida, em relação a todos os produtos em que se baseia a oposição. Por uma comunicação de 29 de Maio de 2000, a Divisão de Oposição convidou a interveniente a produzir a referida prova num prazo de dois meses.

8        Em 28 de Julho de 2000, a interveniente enviou ao IHMI documentos destinados a provar a utilização séria em Itália da marca anterior. Entre estes documentos figuravam, designadamente, facturas, o folheto informativo relativo ao medicamento da interveniente, um excerto do simpósio italiano L’Informatore Farmaceutico e um excerto do Pharmaceutical Trade Mark Directory.

9        Por decisão de 26 de Setembro de 2001, a Divisão de Oposição considerou que a utilização da marca anterior estava provada em relação a um produto farmacêutico específico, designadamente um «vasodilatador periférico destinado a tratar problemas vasculares periféricos e cerebrais e perturbações vasculares do aparelho ocular e do aparelho auditivo», e admitiu a oposição em relação a todos os produtos reivindicados. Por conseguinte, recusou o registo da marca pedida com o fundamento de que existia um risco de confusão, incluindo o risco de associação, em Itália, tendo em conta que as marcas eram semelhantes do ponto de vista visual e fonético e que existia uma certa semelhança dos produtos.

10      Em 13 de Novembro de 2001, a recorrente interpôs um recurso para o IHMI, ao abrigo dos artigos 57.° a 62.° do Regulamento n.° 40/94, da decisão da Divisão de Oposição.

11      Por decisão de 30 de Janeiro de 2003 (a seguir «decisão impugnada»), a Terceira Câmara de Recurso negou provimento ao recurso. Considerou, no essencial, que, dado que os produtos designados pelas marcas em causa apresentavam um grau elevado de semelhança e que estas últimas ostentavam parecenças muito fortes do ponto de vista visual e fonético, existia um risco de confusão, incluindo o risco de associação, entre as marcas em questão.

 Pedidos das partes

12      A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–        anular a decisão impugnada;

–        condenar o IHMI nas despesas.

13      O IHMI conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar a recorrente nas despesas.

14      A interveniente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar a recorrente nas despesas.

 Questão de direito

15      Em apoio do seu recurso, a recorrente invoca, no essencial, dois fundamentos na sua petição. O primeiro fundamento é relativo à violação do artigo 43.°, n.os 2 e 3, do Regulamento n.° 40/94, na medida em que a prova da utilização séria produzida pela interveniente não demonstra que a marca anterior tenha efectivamente sido usada para produtos oftalmológicos. O segundo fundamento é relativo à violação do artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do mesmo regulamento.

16      Na audiência, a recorrente invocou igualmente um fundamento relativo à violação do artigo 43.°, n.os 2 e 3, do Regulamento n.° 40/94, na medida em que as condições da utilização séria da marca anterior não estavam preenchidas.

 Quanto à admissibilidade do fundamento apresentado na audiência

17      Na audiência, a recorrente referiu‑se ao acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 8 de Julho de 2004, MFE Marienfelde/IHMI – Vétoquinol (HIPOVITON) (T‑334/01, Colect., p. II‑0000), para alegar que as condições da utilização séria não estavam preenchidas, designadamente devido ao reduzido volume comercial da marca anterior.

18      O IHMI e a interveniente consideram que o fundamento ou o argumento apresentado na audiência é inadmissível, uma vez que foi invocado pela primeira vez no Tribunal.

19      Por força do artigo 48.°, n.° 2, primeiro parágrafo, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, é proibido deduzir novos fundamentos no decurso da instância, a menos que tenham origem em elementos de direito e de facto que se tenham revelado durante o processo.

20      Há que assinalar, em primeiro lugar, que, na sua petição, a recorrente não acusou a Câmara de Recurso de ter violado o artigo 43.°, n.os 2 e 3, do Regulamento n.° 40/94 pelo facto de as condições da utilização séria da marca anterior não estarem preenchidas, mas apenas devido ao facto de a prova da utilização séria produzida pela interveniente não demonstrar que a marca anterior fora efectivamente utilizada para produtos oftalmológicos.

21      Importa referir, seguidamente, que a recorrente não fez prova da existência de um elemento de facto ou de direito novo na acepção do artigo 48.°, n.° 2, primeiro parágrafo, do Regulamento de Processo.

22      Por conseguinte, o fundamento apresentado na audiência deve ser julgado inadmissível.

23      De qualquer modo, ainda que este fundamento deva ser interpretado como um argumento associado ao primeiro fundamento apresentado na petição, importa recordar que o presente recurso tem por finalidade a fiscalização da legalidade da decisão adoptada pela Câmara de Recurso do IHMI [acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 6 de Março de 2003, DaimlerChrysler/IHMI (Calandre), T‑128/01, Colect., p. II‑701, n.° 18, e de 3 de Julho de 2003, Alejandro/IHMI – Anheuser‑Busch (BUDMEN), T‑129/01, Colect., p. II‑2251, n.° 67]. Consequentemente, esta fiscalização exercida pelo Tribunal não pode extravasar o quadro factual e jurídico do litígio tal como foi apresentado à Câmara de Recurso [acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 5 de Março de 2003, Unilever/IHMI (Pastilha oval), T‑194/01, Colect., p. II‑383, n.° 16, e de 22 de Junho de 2004, «Drie Mollen sinds 1818»/IHMI – Nabeiro Silveira (Galáxia), T‑66/03, Colect., p. II‑0000, n.° 45].

24      No caso em apreço, a Divisão de Oposição verificou que as condições da utilização séria da marca anterior estavam preenchidas. Ora, resulta dos autos que, no processo no IHMI, quer na Divisão de Oposição quer na Câmara de Recurso, a recorrente não contestou o facto de a prova fornecida pela interveniente demonstrar a utilização séria da marca anterior em relação um determinado produto. Com efeito, na Divisão de Oposição, a recorrente declarou mesmo ter «tomado nota da documentação fornecida para provar a utilização da marca TRIVASTAN em Itália» e ter a intenção de «não contestar este ponto». Em contrapartida, alegou que os documentos fornecidos pela interveniente não indicam que o produto em questão, abrangido pela marca anterior, tenha sido utilizado como produto oftalmológico, mas apenas que podia ser usado para esse fim.

25      Resulta de todas as considerações precedentes que os argumentos da recorrente devem ser rejeitados. Por conseguinte, apenas os fundamentos invocados no IHMI, como foram expostos no n.° 15 supra, serão examinados.

 Quanto ao primeiro fundamento, relativo à violação do artigo 43.°, n.os 2 e 3, do Regulamento n.° 40/94

 Argumentos das partes

26      Segundo a recorrente, a Câmara de Recurso considerou erradamente que a prova da utilização da marca anterior demonstra que esta foi realmente usada em Itália para produtos oftalmológicos. Com efeito, os documentos apresentados pela interveniente indicavam simplesmente que o produto podia ser utilizado no quadro de um tratamento oftalmológico.

27      O IHMI observa que, por força do artigo 43.°, n.os 2 e 3, do Regulamento n.° 40/94, a interveniente não tinha qualquer obrigação de provar a utilização específica da sua marca para designar os produtos objecto do pedido de registo. A utilização de uma marca como marca comercial implica que o sinal foi utilizado para assumir designadamente a função de ligação entre os produtos e serviços abrangidos pela marca e a pessoa ou a sociedade responsável pela sua comercialização, isto é, como indicador de origem. Ora, a recorrente não contesta que os documentos apresentados demonstram a utilização da marca anterior como marca comercial que designa um produto susceptível de ser utilizado no âmbito de um tratamento oftalmológico.

28      A interveniente sustenta que forneceu provas que demonstravam que o tratamento oftalmológico fazia parte das indicações terapêuticas do produto referido pela marca anterior aprovadas pelas autoridades médicas italianas e que o medicamento tinha sido vendido durante vários anos (designadamente, de 1995 a 1999). Não se pode exigir a prova de que o medicamento foi realmente tomado por pacientes que sofriam de perturbações vasculares oculares.

 Apreciação do Tribunal

29      Há que referir, em primeiro lugar, que, embora a recorrente não invoque explicitamente o artigo 43.°, n.os 2 e 3, do Regulamento n.° 40/94, a sua argumentação deve ser entendida no sentido de que invoca um fundamento relativo à violação dessa disposição. Com efeito, na medida em que alega, no essencial, que a prova da utilização produzida pela interveniente não demonstra que esta tenha usado a marca para produtos oftalmológicos, este argumento implica que se examine primeiramente a eventual violação desta disposição e só posteriormente a eventual comparação errada dos produtos, no âmbito do artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do mesmo regulamento.

30      Não foi contestado, no IHMI, que a marca anterior foi utilizada para designar um produto médico. Com efeito, resulta dos autos e, designadamente, do folheto informativo relativo ao medicamento da interveniente e de um excerto do simpósio italiano L’Informatore Farmaceutico que a marca TRIVASTAN designa um vasodilatador periférico utilizado em neurologia, otorrinolaringologia, oftalmologia, angiologia e geriatria e, mais concretamente, que está indicado para o tratamento dos «problemas vasculares periféricos e cerebrais e das perturbações vasculares do aparelho ocular e do aparelho auditivo».

31      Importa concluir que, se uma das indicações terapêuticas de um medicamento é tratar as perturbações vasculares do aparelho ocular e está provado que foi vendido durante vários anos, o que não é contestado, este pôde ser utilizado para o tratamento destes problemas. Nestas circunstâncias, seria supérfluo, e mesmo difícil, exigir a prova de que este medicamento foi realmente tomado por pacientes que sofriam de perturbações vasculares oculares.

32      Consequentemente, deve considerar‑se que a Câmara de Recurso não violou o artigo 43.°, n.os 2 e 3, do Regulamento n.° 40/94 ao concluir que a prova fornecida pela interveniente demonstrava a utilização séria da marca anterior para um «vasodilatador periférico destinado a tratar problemas vasculares periféricos e cerebrais e perturbações vasculares do aparelho ocular e do aparelho auditivo».

33      Por conseguinte, há que julgar improcedente o primeiro fundamento da recorrente.

 Quanto ao segundo fundamento, relativo à violação do artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94

 Argumentos das partes

34      A recorrente sustenta que os produtos em causa não apresentam semelhanças suficientes para fundar a conclusão do IHMI, que as marcas em conflito não são semelhantes, atendendo às suas diferenças visuais e fonéticas, e que, portanto, não há qualquer risco de confusão ou de associação entre as marcas.

35      Quanto à semelhança dos produtos, a recorrente considera que o IHMI não teve correctamente em conta a forma dos produtos. Com efeito, o produto da interveniente é uma pastilha ingerida por via oral, ao passo que o produto da recorrente se apresenta sob a forma de gotas oftalmológicas.

36      Além disso, como estes produtos apenas estão disponíveis na farmácia e mediante receita, o consumidor compra um produto que já foi escolhido e identificado para ele por um médico. Segundo a recorrente, como a marca TRAVATAN é utilizada para um produto oftalmológico usado no tratamento do glaucoma, o tratamento apropriado é receitado por um oftalmologista, ao passo que o medicamento TRIVASTAN é receitado por um especialista em matéria de problemas vasculares. Estes dois produtos são, portanto, receitados por médicos especialistas e as respectivas receitas são preparadas e executadas por farmacêuticos. É muito improvável que um farmacêutico confunda a forma dos produtos ou as suas indicações (isto é, as gotas oftalmológicas destinadas ao tratamento do glaucoma por oposição a um vasodilatador sob a forma de pílula utilizada geralmente no tratamento dos problemas venosos). A recorrente sublinha que o produto da interveniente parece ser um produto destinado ao tratamento geral dos problemas vasculares.

37      Por outro lado, a recorrente limitou deliberadamente a especificação do seu produto aos «produtos farmacêuticos oftalmológicos para o tratamento do glaucoma», reduzindo ainda qualquer semelhança entre os produtos. Em sua opinião, a Câmara de Recurso não apreciou correctamente este elemento.

38      Quanto à semelhança dos sinais, a recorrente sustenta, relativamente à semelhança visual, que a impressão de conjunto produzida é a de que as parecenças, ainda que presentes, não são suficientes para tornar os sinais semelhantes. Ao contrário do que concluiu a Câmara de Recurso, as duas primeiras letras de cada palavra, «t» e «r», não constituem a parte dominante do prefixo de cada marca, na medida em que o prefixo «tr» é desprovido de qualquer significado sem a vogal à qual está ligado e é precisamente esta vogal que permite ao consumidor pronunciar a sílaba. Por conseguinte, a comparação correcta deve fazer‑se com base em cada sílaba no seu conjunto, isto é, o prefixo «tra» e o prefixo «tri».

39      No que respeita à semelhança fonética, a recorrente sustenta que as diferenças são suficientes para distinguir as marcas, tanto mais que estas diferenças se combinam com as diferenças visuais. Com efeito, existe uma diferença muito perceptível na pronúncia italiana de «tri» e de «tra». Além disso, a adição da consoante «s» concede à TRIVASTAN uma maior particularidade fonética.

40      Quanto à semelhança conceptual, a recorrente alega que as marcas são diferentes. O prefixo «tri» da marca anterior significa «triplo» ou «três vezes» e a sílaba «vas» refere‑se a «vascular». Portanto, o significado da marca anterior TRIVASTAN é facilmente discernível por profissionais como os médicos e os farmacêuticos, na medida em que significa que o produto tem uma acção tripla e é utilizado para os problemas vasculares. O sufixo «tan» é desprovido de significado e não distintivo, e, embora seja comum às duas marcas, também é comum a muitas marcas de produtos da classe 5. A marca requerida TRAVATAN não tem qualquer significado, uma vez que se trata de uma palavra inventada, ainda que as quatro primeiras letras derivem do termo «Travoprost», que é a denominação comum internacional do produto da recorrente.

41      Consequentemente, ainda que se deva considerar que existe uma certa semelhança visual e fonética entre os sinais, o efeito dessa semelhança não deve ser exagerado, atendendo especialmente à diferença entre as formas dos dois produtos e ao contexto médico no qual são vendidos.

42      Além disso, a recorrente alega que a marca anterior não tem carácter intrinsecamente distintivo e que não foi apresentada qualquer prova da sua reputação ou da sua notoriedade. Com efeito, quando uma marca anterior não goza de uma notoriedade particular junto do público e consiste numa imagem que apresenta poucos elementos imaginários, a mera semelhança entre as marcas não basta para criar um risco de confusão (acórdão do Tribunal de Justiça de 11 de Novembro de 1997, SABEL, C‑251/95, Colect., p. I‑6191, n.° 25).

43      Por outro lado, a Agência Europeia de Avaliação dos Medicamentos concedeu uma autorização de comercialização em todo o território da União Europeia do produto da recorrente com a marca TRAVATAN.

44      O IHMI e a interveniente apoiam as apreciações da Câmara de Recurso.

 Apreciação do Tribunal

45      Nos termos do artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, após oposição do titular de uma marca anterior, o pedido de registo de marca será recusado quando, devido à sua identidade ou semelhança com a marca anterior e devido à identidade ou semelhança dos produtos ou serviços designados pelas duas marcas, exista risco de confusão no espírito do público do território onde a marca anterior está protegida. O risco de confusão compreende o risco de associação com a marca anterior. Por outro lado, por força do artigo 8.°, n.° 2, alínea a), ii), do Regulamento n.° 40/94, devem ser consideradas marcas anteriores, designadamente, as marcas registadas num Estado‑Membro, cuja data de depósito seja anterior à do pedido de marca comunitária.

46      Segundo jurisprudência assente, constitui um risco de confusão o risco de que o público possa crer que os produtos ou os serviços em causa provêm da mesma empresa ou, eventualmente, de empresas ligadas economicamente.

47      Segundo esta mesma jurisprudência, o risco de confusão no espírito do público deve ser apreciado globalmente, segundo a percepção que o público pertinente tem dos sinais e dos produtos ou serviços em causa e atendendo a todos os factores relevantes do caso em apreço, designadamente à interdependência entre a semelhança dos sinais e dos produtos ou serviços designados [acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 9 de Julho de 2003, Laboratorios RTB/IHMI – Giorgio Beverly Hills (GIORGIO BEVERLY HILLS), T‑162/01, Colect., p. II‑2821, n.os 31 a 33, e a jurisprudência referida].

48      No caso em apreço, a marca anterior TRIVASTAN está registada em Itália, que constitui, portanto, o território pertinente para fins de aplicação do artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94.

49      É pacífico que os produtos em causa são medicamentos que requerem uma receita do médico antes da sua venda aos consumidores finais nas farmácias. Por conseguinte, o público pertinente é constituído não apenas por consumidores finais mas também por profissionais, isto é, por médicos que receitam o medicamento e por farmacêuticos que vendem o medicamento receitado.

50      À luz das considerações precedentes, há que proceder à comparação, por um lado, dos produtos em causa e, por outro, dos sinais em conflito.

–       Quanto à comparação dos produtos

51      A título preliminar, há que apreciar a eventual limitação da lista dos produtos reivindicados aos «produtos farmacêuticos oftalmológicos para o tratamento do glaucoma» à qual a recorrente alega ter procedido. A este respeito, importa recordar que, para efeitos de aplicação do artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, a apreciação do risco de confusão deve incidir sobre a totalidade dos produtos que o pedido de marca designa. Para que possa ser tida em consideração, uma limitação da lista dos produtos ou serviços designados num pedido de marca comunitária deve ser realizada segundo determinadas regras particulares, mediante pedido de modificação do pedido inicial em conformidade com o artigo 44.° do Regulamento n.° 40/94 e com a regra 13 do Regulamento (CE) n.° 2868/95 da Comissão, de 13 de Dezembro de 1995, relativo à execução do Regulamento (CE) n.° 40/94 (JO L 303, p. 1) [acórdão Pastilha oval, já referido, n.° 13, e acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 25 de Novembro de 2003, Oriental Kitchen/IHMI – Mou Dybfrost (KIAP MOU), T‑286/02, Colect., p. II‑4953, n.° 30]. Além disso, a limitação dos produtos contidos num pedido de marca deve ser realizada de forma expressa e não condicional [v., nesta acepção, acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 27 de Fevereiro de 2002, Ellos/IHMI (ELLOS), T‑219/00, Colect., p. II‑753, n.os 61 e 62, e de 10 de Novembro de 2004, Storck/IHMI (Forma de um bombom), T‑396/02, ainda não publicado na Colectânea, n.° 20].

52      No caso em apreço, a recorrente declarou, nas suas alegações com os fundamentos do recurso de 28 de Janeiro de 2002, o seguinte:

«Com o intuito de facilitar a tarefa [da Câmara de Recurso], os recorrentes confirmam a sua disposição de limitar a indicação das mercadorias que são objecto do pedido n.° 847590 [aos] ‘produtos farmacêuticos oftalmológicos para o tratamento dos glaucomas’.»

53      Importa referir que as regras da limitação não foram respeitadas pela formulação «confirmam a sua disposição», uma vez que a recorrente não apresentou neste sentido um pedido de modificação do pedido de marca, em conformidade com as disposições já referidas.

54      Nestas condições, não se pode censurar à Câmara de Recurso não ter tido em conta a alegada limitação dos produtos contidos no pedido de marca comunitária.

55      Portanto, os produtos a comparar são os «produtos farmacêuticos oftalmológicos» e o «vasodilatador periférico destinado a tratar problemas vasculares periféricos e cerebrais e perturbações vasculares do aparelho ocular e do aparelho auditivo».

56      Para apreciar a semelhança entre os produtos ou serviços em causa, importa ter em conta todos os factores pertinentes que caracterizam a relação entre os produtos ou serviços. Estes factores incluem, em especial, a sua natureza, destino, utilização, bem como o seu carácter concorrente ou complementar (v., por analogia, acórdão do Tribunal de Justiça de 29 de Setembro de 1998, Canon, C‑39/97, Colect., p. I‑5507, n.° 23).

57      No caso em apreço, como sustenta correctamente o IHMI, os produtos têm a mesma natureza (produtos farmacêuticos), a mesma finalidade ou destino (tratamento das perturbações oculares de origem vascular ou não), dirigem‑se aos mesmos consumidores (profissionais, incluindo médicos e farmacêuticos, e verdadeiros utilizadores finais, isto é, pacientes que padecem de problemas oculares), usam os mesmos canais de distribuição (regra geral, as farmácias) e apresentam um carácter potencialmente complementar. Não há, portanto, qualquer dúvida de que podem ser fabricados ou comercializados pelos mesmos operadores económicos.

58      Deve rejeitar‑se o argumento da recorrente segundo o qual os produtos não são semelhantes, porque o produto da interveniente é uma pastilha ingerida por via oral enquanto o produto da recorrente se apresenta sob a forma de gotas oftalmológicas. Com efeito, esta diferença no modo de administração do medicamento não pode prevalecer, no caso em apreço, sobre a natureza e o destino comum dos dois produtos.

59      Além disso, o argumento da recorrente segundo o qual o seu medicamento é receitado por um oftalmologista, ao passo que o medicamento da interveniente é receitado por um especialista em matéria de problemas vasculares, não é pertinente. Com efeito, na medida em que o medicamento da interveniente pode ser utilizado para o tratamento de perturbações vasculares do aparelho ocular, não se pode excluir que seja antes um oftalmologista e não um especialista em matéria de problemas vasculares a tratar o paciente que padece deste tipo de problema.

60      Por conseguinte, uma vez que o produto abrangido pela marca anterior pode ser utilizado para o tratamento das perturbações vasculares do aparelho ocular, mesmo que este produto se destine ao tratamento geral de problemas vasculares, como alega a recorrente, este deve ser considerado análogo a um produto farmacêutico oftalmológico, dado que está em causa, nos dois casos, o tratamento de perturbações do aparelho ocular.

61      Consequentemente, a Câmara de Recurso não cometeu um erro ao concluir que existia um grau elevado de semelhança entre os produtos em questão.

–       Quanto à comparação dos sinais em causa

62      Como resulta de jurisprudência assente, a apreciação global do risco de confusão deve, em matéria de semelhança visual, fonética ou conceptual dos sinais em conflito, basear‑se na impressão de conjunto produzida por estes, atendendo, designadamente, aos seus elementos distintivos e dominantes [acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 14 de Outubro de 2003, Phillips‑Van Heusen/IHMI – Pash Textilvertrieb und Einzelhandel (BASS), T‑292/01, Colect., p. II‑4335, n.° 47, e a jurisprudência referida].

63      Os sinais nominativos a comparar são os seguintes:

–        TRAVATAN: marca requerida;

–        TRIVASTAN: marca anterior.

64      A recorrente alega que as semelhanças existentes entre estes sinais não são suficientes para provar a sua identidade visual e que a Câmara de Recurso isolou, erradamente, as duas primeiras letras dos sinais em causa como elemento dominante do prefixo de cada marca em vez de considerar a primeira sílaba na sua totalidade.

65      O argumento da recorrente não pode ser acolhido. A Câmara de Recurso concluiu, correctamente, que, no plano visual, os dois sinais tinham quase a mesma extensão e apresentavam sete letras, «t», «r», «v», «a», «t», «a» e «n», em comum, colocadas na mesma ordem. Indicou também com pertinência que estes começavam pelas mesmas letras «t» e «r» e tinham a mesma terminação em «tan». Importa referir que o facto de as duas primeiras letras não formarem inteiramente a primeira sílaba não reveste importância, no caso em apreço, quanto à comparação visual. Há, portanto, que concluir que a impressão de conjunto criada pelas parecenças visuais é a de que os sinais são semelhantes. A Câmara de Recurso tinha razão ao concluir que as diferenças entre os sinais em questão, resultantes do facto de a terceira letra de cada sinal ser diferente (as vogais «i» e «a») e da presença de uma letra suplementar na marca anterior (a consoante «s»), não eram susceptíveis de neutralizar esta impressão, dado estes elementos serem visualmente pouco perceptíveis.

66      Por conseguinte, há que considerar que a Câmara de Recurso não cometeu um erro ao concluir que os sinais eram semelhantes no plano visual.

67      Quanto à semelhança fonética, a recorrente alega que a Câmara de Recurso não teve suficientemente em conta o impacto fonético das diferentes características das marcas, que considerou insignificantes. As divergências entre os sinais bastam, portanto, para os distinguir foneticamente, uma vez que conduzem a uma pronúncia claramente distinta pelos locutores italianos.

68      A este respeito, a Câmara de Recurso concluiu que, uma vez que o consumidor médio só raramente tem a possibilidade de proceder a uma comparação directa das diferentes marcas, devendo confiar na impressão fonética imperfeita destas que guardou na sua memória, tendo em conta a sonoridade muito parecida das duas primeiras sílabas dos sinais em conflito e a sonoridade idêntica da última sílaba destes sinais, estes criam no consumidor médio uma impressão fonética de conjunto semelhante.

69      Há que concluir, como a interveniente, que os dois sinais consistem em palavras com a mesma extensão fonética, o mesmo som inicial («tr»), o mesmo som final (a sílaba «tan»), sons intermediários quase semelhantes («va»/«vas») e a mesma cadência, sendo a maioria dos fonemas idênticos e aparecendo na mesma ordem. Importa referir que a existência de um número tão importante de elementos comuns impede o consumidor italiano de perceber claramente as pequenas diferenças entre estes sinais, o que é susceptível de lhe provocar uma certa confusão.

70      Por conseguinte, a Câmara de Recurso não cometeu um erro ao concluir que existia uma semelhança fonética entre os sinais em conflito.

71      No que respeita à comparação dos sinais do ponto de vista conceptual, a recorrente alega que os sinais se distinguem no plano conceptual, uma vez que a marca requerida TRAVATAN não é dotada de sentido, ao passo que a primeira sílaba da marca anterior TRIVASTAN significa «triplo» e que a sua segunda sílaba «vas» faz alusão ao adjectivo «vascular». A única sílaba comum aos dois sinais não possui um sentido especial ou carácter distintivo para os produtos da classe 5.

72      A Câmara de Recurso concluiu que as palavras «trivastan» e «travatan» não tinham qualquer significado para o consumidor italiano.

73      A apreciação da Câmara de Recurso não pode deixar de ser seguida. Com efeito, não é provável que a marca anterior TRIVASTAN tenha o significado para o público pertinente, ainda que este inclua também profissionais, de que o produto tem uma acção tripla e é utilizado para problemas vasculares. Ainda que o público possa compreender «tri» como fazendo referência a «triplo», não seria evidente determinar a que «triplo» se faz referência. Além disso, como constatou o IHMI, embora existam em italiano palavras que começam por «tri», nestas, este «tri» não tem, de forma alguma, o sentido de «triplo» [por exemplo «tributario» (fiscal ou tributário) ou «tribolare» (provocar sofrimento)].

74      Por conseguinte, deve considerar‑se que as palavras «travatan» e «trivastan» não revestem um significado especial para o consumidor italiano e que, portanto, não existe semelhança conceptual entre os sinais em questão.

75      Consequentemente, importa concluir por uma semelhança visual importante e por uma semelhança fonética dos sinais em conflito e pela inexistência de semelhança conceptual entre esses sinais.

76      Verificando‑se uma semelhança importante dos produtos, bem como a semelhança visual e fonética dos sinais, há que referir que existe um risco de confusão entre estes sinais.

77      Quanto ao argumento da recorrente segundo o qual a marca anterior não possuía reputação, importa observar que a interveniente nunca invocou a reputação da sua marca.

78      Além disso, no que respeita ao argumento da recorrente segundo o qual a marca anterior não tem carácter intrinsecamente distintivo, há que concluir que a mesma não fez prova disso. Além do mais, a Câmara de Recurso não baseou a sua argumentação relativa ao risco de confusão no carácter distintivo elevado da marca anterior. Com efeito, se o carácter distintivo da marca anterior deve ser tomado em consideração para apreciar o risco de confusão (v., por analogia, acórdão Canon, já referido, n.° 24), é apenas um elemento de entre outros que intervêm nesta apreciação. Assim, mesmo na presença de uma marca anterior com um fraco carácter distintivo, pode existir um risco de confusão, designadamente, devido à semelhança dos sinais e dos produtos ou serviços a que se referem [v., nesta acepção, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 16 de Março de 2005, L’Oréal/IHMI – Revlon (FLEXI AIR), T‑112/03, Colect., p. II‑0000, n.° 61].

79      Por outro lado, no que respeita à menção pela recorrente do facto de a Agência Europeia de Avaliação dos Medicamentos lhe ter concedido uma autorização de colocação no mercado do seu produto sob a marca TRAVATAN, basta referir que, uma vez que a recorrente não invocou esse facto e não apresentou nenhuma prova a esse respeito no IHMI, este argumento é inadmissível. Além disso, não é relevante no caso em apreço, dado que esta eventual autorização é estranha à avaliação do risco de confusão no âmbito da aplicação do Regulamento n.° 40/94.

80      Nestas circunstâncias, há que concluir que o grau de semelhança entre os produtos e os sinais em causa é suficientemente elevado para se poder considerar que o público poderia crer que os produtos em questão provêm da mesma empresa ou, eventualmente, de empresas ligadas economicamente.

81      Consequentemente, há que julgar improcedente o segundo fundamento da recorrente e, portanto, negar provimento à totalidade do recurso.

 Quanto às despesas

82      Por força do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a recorrente sido vencida, há que condená‑la nas despesas efectuadas pelo IHMI e pela interveniente, em conformidade com os pedidos destes.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Terceira Secção)

decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      A recorrente é condenada nas despesas.

Jaeger

Tiili

Czúcz

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 22 de Setembro de 2005.

O secretário

 

      O presidente

H. Jung

 

      M. Jaeger


* Língua do processo: inglês.