Language of document : ECLI:EU:T:2004:339

Arrêt du Tribunal

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quinta Secção)
23 de Novembro de 2004 (1)

«Transparência – Acesso do público aos documentos do Conselho – Recusa parcial de acesso – Regulamento (CE) n.° 1049/2001 – Excepções»

No processo T-84/03,

Maurizio Turco, residente em Pulsano (Itália), representado por O. W. Brouwer, T. Janssens e C. Schillemans, advogados,

recorrente,

apoiado por

República da Finlândia, representada por T. Pynnä e A. Guimaraes‑Purokoski, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

por

Reino da Dinamarca, representado inicialmente por J. Liisberg e em seguida por J. Molde, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

e por

Reino da Suécia, representado por A. Kruse e K. Wistrand, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

intervenientes,

contra

Conselho da União Europeia, representado por J.-C. Piris e M. Bauer, na qualidade de agentes,

recorrido,

apoiado por

Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, representado por C. Jackson, na qualidade de agente, assistida por P. Sales e por J. Stratford, barristers, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

e por

Comissão das Comunidades Europeias, representada por M. Petite, C. Docksey e P. Aalto, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

que tem por objecto um pedido de anulação da decisão do Conselho de 19 de Dezembro de 2002 que recusa parcialmente ao recorrente o acesso a certos documentos que figuram na ordem do dia da reunião do Conselho «Justiça e Assuntos Internos» de 14 e 15 de Outubro de 2002,



O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Quinta Secção),



composto por: P. Lindh, presidente, R. García-Valdecasas e J. D. Cooke, juízes,

secretário: I. Natsinas, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 24 de Junho de 2004,

profere o presente



Acórdão




Quadro jurídico

1
Nos termos do artigo 255.° CE:

«1. Todos os cidadãos da União e todas as pessoas singulares ou colectivas que residam ou tenham a sua sede social num Estado‑Membro têm direito de acesso aos documentos do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão, sob reserva dos princípios e condições a definir nos termos dos n.os 2 e 3.

2. Os princípios gerais e os limites que, por razões de interesse público ou privado, hão‑de reger o exercício do direito de acesso aos documentos serão definidos pelo Conselho, deliberando nos termos do artigo 251.°, no prazo de dois anos a contar da data da entrada em vigor do Tratado de Amesterdão.

[…]»

2
Os considerandos 1, 2, 3, 4, 6 e 11 do Regulamento (CE) n.° 1049/2001 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de Maio de 2001, relativo ao acesso do público aos documentos do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão (JO L 145, p. 43), adoptado ao abrigo do artigo 255.° CE, indicam o seguinte:

«(1) O Tratado da União Europeia consagra a noção de abertura no segundo parágrafo do artigo 1.°, nos termos do qual o Tratado assinala uma nova etapa no processo de criação de uma união cada vez mais estreita entre os povos da Europa, em que as decisões serão tomadas de uma forma tão aberta quanto possível e ao nível mais próximo possível dos cidadãos.

(2) Esta abertura permite assegurar uma melhor participação dos cidadãos no processo de decisão e garantir uma maior legitimidade, eficácia e responsabilidade da Administração perante os cidadãos num sistema democrático. A abertura contribui para o reforço dos princípios da democracia e do respeito dos direitos fundamentais consagrados no artigo 6.° […] UE e na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.

(3) As conclusões das reuniões do Conselho Europeu de Birmingham, Edimburgo e Copenhaga salientaram a necessidade de assegurar uma maior transparência aos trabalhos das instituições da União. O presente regulamento consolida as iniciativas que as instituições já tomaram para aumentar a transparência do processo decisório.

(4) O presente regulamento destina‑se a permitir o mais amplo efeito possível do direito de acesso do público aos documentos e a estabelecer os respectivos princípios gerais e limites, em conformidade com o disposto no n.° 2 do artigo 255.° […] CE.

[...]

(6) Deverá ser concedido maior acesso aos documentos nos casos em que as instituições ajam no exercício dos seus poderes legislativos, incluindo por delegação, embora simultaneamente, preservando a eficácia do processo decisório institucional. O acesso directo a estes documentos deverá ser tão amplo quanto possível.

[...]

(11) Em princípio, todos os documentos das instituições deverão ser acessíveis ao público. No entanto, determinados interesses públicos e privados devem ser protegidos através de excepções. É igualmente necessário que as instituições possam proteger as suas consultas e deliberações internas, se tal for necessário para salvaguardar a sua capacidade de desempenharem as suas funções. Ao avaliar as excepções, as instituições deverão ter em conta os princípios estabelecidos na legislação comunitária relativos à protecção de dados pessoais em todos os domínios de actividade da União.

[...]»

3
O artigo 4.° do referido regulamento dispõe:

«Excepções

1. As instituições recusarão o acesso aos documentos cuja divulgação pudesse prejudicar a protecção:

a)
Do interesse público, no que respeita:

à segurança pública,

à defesa e às questões militares,

às relações internacionais,

à política financeira, monetária ou económica da Comunidade ou de um Estado‑Membro;

b)
Da vida privada e da integridade do indivíduo, nomeadamente nos termos da legislação comunitária relativa à protecção dos dados pessoais.

2. As instituições recusarão o acesso aos documentos cuja divulgação pudesse prejudicar a protecção de:

interesses comerciais das pessoas singulares ou colectivas, incluindo a propriedade intelectual,

processos judiciais e consultas jurídicas,

objectivos de actividades de inspecção, inquérito e auditoria,

excepto quando um interesse público superior imponha a divulgação.

3. O acesso a documentos, elaborados por uma instituição para uso interno ou por ela recebidos, relacionados com uma matéria sobre a qual a instituição não tenha decidido, será recusado, caso a sua divulgação pudesse prejudicar gravemente o processo decisório da instituição, excepto quando um interesse público superior imponha a divulgação.

O acesso a documentos que contenham pareceres para uso interno, como parte de deliberações e de consultas preliminares na instituição em causa, será recusado mesmo após ter sido tomada a decisão, caso a sua divulgação pudesse prejudicar gravemente o processo decisório da instituição, excepto quando um interesse público superior imponha a divulgação.

[…]».


Factos na origem do litígio

4
Por correio electrónico de 22 de Outubro de 2002, o recorrente pediu ao Conselho que lhe fosse autorizado o acesso aos documentos constantes da ordem do dia da reunião do Conselho «Justiça e Assuntos Internos», que teve lugar no Luxemburgo em 14 e 15 de Outubro de 2002, entre os quais figurava um parecer do seu Serviço Jurídico relativo a uma proposta de directiva do Conselho que estabelece as normas mínimas em matéria de acolhimento dos requerentes de asilo nos Estados‑Membros.

5
Por correio electrónico de 5 de Novembro de 2002, o Conselho deferiu o pedido do recorrente relativamente a 15 dos 20 documentos solicitados. Recusou autorizar o acesso integral do recorrente a quatro documentos relativos a propostas legislativas (documentos n.os 12903/02, 12616/02, 12616/02 COR 1 e 12619/02), ao abrigo do artigo 4.°, n.° 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.° 1049/2001. Além disso, o Conselho recusou ao recorrente o acesso ao parecer do seu Serviço Jurídico referido no n.° 4 supra (documento n.° 9077/02), ao abrigo do artigo 4.°, n.° 2, do referido regulamento. Quanto a este último documento, o Conselho indicou o seguinte:

«O documento [n.°] 9077/02 é um parecer do Serviço Jurídico do Conselho sobre uma proposta de directiva do Conselho que estabelece as normas mínimas em matéria de acolhimento dos requerentes de asilo nos Estados‑Membros.

Tendo em conta o seu conteúdo, a divulgação desse documento poderia prejudicar a protecção dos pareceres jurídicos internos do Conselho, prevista no artigo 4.°, n.° 2, do regulamento. Não tendo sido invocado qualquer fundamento concreto que indique que um interesse público superior específico impõe a divulgação desse documento, o secretariado‑geral concluiu, após ter procedido a uma ponderação dos interesses em presença, que o interesse da protecção dos pareceres jurídicos internos prima sobre o interesse público decidindo, assim, recusar o acesso a esse documento, de acordo com o artigo 4.°, n.° 2, do regulamento. Esta excepção abrange todo o conteúdo do documento. Consequentemente, não é possível autorizar um acesso parcial a este, ao abrigo do artigo 4.°, n.° 6, do regulamento.»

6
Por carta de 22 de Novembro de 2002, o recorrente apresentou um pedido confirmativo, nos termos do artigo 7.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1049/2001. O recorrente alegou, para o efeito, que o Conselho tinha aplicado erradamente as excepções ao direito de acesso do público aos documentos das instituições previstas no artigo 4.°, n.os 2 e 3, do Regulamento n.° 1049/2001 e indicou que o interesse público superior que justificava a divulgação dos documentos controvertidos era o princípio da democracia e da participação dos cidadãos no processo legislativo.

7
O Conselho, por ofício de 19 de Dezembro de 2002 (a seguir «decisão impugnada»), indeferiu o pedido confirmativo do recorrente. Nos termos desse ofício, quanto aos quatro documentos relativos a propostas legislativas:

«Embora o Conselho tenha feito progressos quanto a essas questões, as deliberações sobre os actos legislativos em causa ainda estão em curso. O Conselho considera, assim, que, nestas circunstâncias, a divulgação integral dos documentos é prematura e considera, após ter ponderado os interesses em causa, que o interesse da protecção do processo decisório da instituição prima sempre sobre o interesse público […] no que respeita à identificação das delegações cujas posições figuram nas actas, na medida em que isso poderia reduzir consideravelmente a flexibilidade das delegações para reconsiderarem a sua posição ou conduzir à reabertura do debate e, portanto, prejudicar seriamente o processo decisório do Conselho.»

8
Quanto ao parecer do seu Serviço Jurídico, o Conselho, através da decisão impugnada, considerou que só o seu primeiro parágrafo podia ser divulgado e que, quanto ao restante, havia que confirmar a decisão de 5 de Novembro de 2002 que recusava o acesso do recorrente a esse parecer. No que respeita à existência de um interesse público superior na acepção desse artigo, o Conselho afirma o seguinte:

«O Conselho considera que o interesse público superior não é constituído apenas pelo facto de a divulgação desses documentos, que contêm o parecer do Serviço Jurídico sobre questões jurídicas que surgiram no debate sobre as iniciativas legislativas, ser no interesse geral do aumento da transparência e da abertura do processo decisório da instituição. De facto, este critério é susceptível de ser aplicado a todas as opiniões escritas ou documentos semelhantes do Serviço Jurídico, o que fazia com que fosse praticamente impossível ao Conselho recusar o acesso a qualquer parecer jurídico a título do Regulamento n.° 1049/2001. O Conselho considera que esse resultado seria manifestamente contrário à vontade do legislador, expressa no artigo 4.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1049/2001, porque privaria a disposição de todo e qualquer efeito útil.»

9
Por ofício de 19 de Maio de 2003, o Conselho informou o recorrente de que os quatro documentos relativos a propostas legislativas a que apenas tivera acesso parcial tinham, em parte, sido integralmente tornados públicos ou, quanto ao mais, tinha‑lhe sido pessoalmente comunicado.


Tramitação processual

10
Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 28 de Fevereiro de 2003, o recorrente interpôs o presente recurso.

11
Por despacho de 20 de Outubro de 2003, o presidente da Quinta Secção do Tribunal de Primeira Instância admitiu a intervenção, por um lado, da República da Finlândia, do Reino da Dinamarca e do Reino da Suécia em apoio dos pedidos do recorrente e, por outro, da Comissão e do Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte em apoio dos pedidos do Conselho.

12
Os intervenientes apresentaram as suas alegações nos prazos fixados.

13
Com base no relatório do juiz‑relator, o Tribunal de Primeira Instância (Quinta Secção) decidiu dar início à fase oral do processo.

14
As partes foram ouvidas em alegações e nas respostas às questões colocadas pelo Tribunal de Primeira Instância na audiência de 24 de Junho de 2004.


Pedidos das partes

15
O recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

anular a decisão impugnada;

condenar o Conselho nas despesas, incluindo as dos intervenientes.

16
O Conselho conclui pedindo que o Tribunal se digne:

declarar que já não tem que se pronunciar sobre o facto de a decisão impugnada recusar o acesso integral aos quatro documentos relativos a propostas legislativas;

decidir quanto às despesas relativas à inutilidade superveniente da lide, nos termos do artigo 87.°, n.° 6, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância;

quanto ao mais, negar provimento ao recurso;

condenar o recorrente nas despesas.

17
A República da Finlândia, em apoio do recorrente, conclui pedindo que o Tribunal se digne anular a decisão impugnada.

18
O Reino da Suécia, em apoio do recorrente, conclui pedindo que o Tribunal se digne anular a decisão impugnada na parte em que recusa o acesso do recorrente ao parecer jurídico do Conselho.

19
A Comissão, em apoio do Conselho, conclui pedindo que o Tribunal se digne:

negar provimento ao recurso;

condenar o recorrente nas despesas, incluindo as relativas à sua intervenção.

20
O Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte, em apoio do Conselho, conclui pedindo que o Tribunal se digne negar provimento ao recurso.


Questão de direito

21
Em apoio do seu recurso, o recorrente afirma, quanto aos quatro documentos relativos a propostas legislativas, que o Conselho violou o artigo 4.°, n.° 3, do Regulamento n.° 1049/2001, assim como o dever de fundamentação que lhe incumbia. No que concerne ao parecer jurídico em causa, o recorrente alega que o Conselho violou o artigo 4.°, n.° 2, do referido regulamento.

Quanto à recusa de acesso integral aos quatro documentos relativos a propostas legislativas

Argumentos das partes

22
O Conselho afirma que, no momento em que o presente recurso foi interposto, os documentos n.° 12616/02 e n.° 12616/02 COR ainda não tinham sido tornados públicos na íntegra, apesar de o regulamento em causa nesses documentos já ter sido adoptado. Estes documentos foram, no entanto, divulgados na íntegra na Internet em 26 de Março de 2003. O Conselho precisa, neste contexto, que, apesar dos seus esforços para disponibilizar esses documentos na Internet, como prevê o artigo 11.°, n.° 6, do anexo II «Disposições específicas relativas ao acesso do público aos documentos do Conselho» da Decisão 2002/682/CE, Euratom do Conselho, de 22 de Julho de 2002, que aprova o seu Regulamento Interno (JO L 230, p. 7), e devido a uma sobrecarga de trabalho administrativo, não foi possível fazê‑lo antes da interposição do presente recurso.

23
Quanto aos documentos n.° 12619/02 e n.° 12903/02 foi decidido, em 19 de Maio de 2003, divulgá‑los na íntegra, embora o procedimento legislativo a que diziam respeito ainda não tivesse conduzido à adopção de um texto final.

24
Tendo, portanto, o pedido do recorrente relativo a esses documentos sido atendido, o Conselho, apoiado pelo Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte, considera que o recurso ficou sem objecto no que respeita à recusa de acesso integral a esses quatro documentos. Não há, pois, que decidir essa parte do recurso (despacho do Tribunal de Primeira Instância de 17 de Setembro de 1997, Antillean Rice Mills/Comissão, T‑26/97, Colect., p. II‑1347, n.° 15).

25
Logo, não é necessário responder aos argumentos do recorrente relativos ao direito de acesso a esses documentos.

26
O recorrente admite que, devido à decisão do Conselho de autorizar o acesso a esses quatro documentos relativos a propostas legislativas, o presente recurso ficou sem objecto no que respeita à recusa de lhe autorizar o acesso integral aos referidos documentos. Sublinha, contudo, que o Conselho não apresentou qualquer explicação para a sua mudança de posição quanto à divulgação.

27
Se, porém, o Conselho afirmasse que não reapreciou a fundamentação contida na decisão impugnada, o presente recurso não ficaria sem objecto. O Conselho não pode, com efeito, escapar à fiscalização jurisdicional ao decidir divulgar os documentos em causa. Além disso, a legalidade de uma decisão deve ser apreciada no momento em que foi adoptada, o que constitui expressão dos princípios da legalidade e do acesso à justiça. O recorrente pede, portanto, que seja negado provimento ao pedido do Conselho de não conhecimento do mérito e considera, de qualquer forma, que este deve ser condenado nas despesas, nos termos do artigo 87.°, n.° 3, segundo parágrafo, do Regulamento de Processo.

Apreciação do Tribunal

28
O Tribunal indica que, por ofício de 19 de Maio de 2003, o Conselho informou o recorrente da divulgação integral dos documentos n.° 12903/02, n.° 12616/02, n.° 12616/02 COR 1 e n.° 12619/02.

29
Tendo o recorrente tido acesso a esses quatro documentos, a anulação da decisão impugnada, na parte em que recusa o acesso parcial do recorrente aos referidos documentos, não acarreta qualquer consequência suplementar relativamente à divulgação integral desses documentos.

30
Tendo o recurso ficado sem objecto no que respeita à categoria de documentos analisada, já não há que decidir esse aspecto.

Quanto à recusa de acesso ao parecer do Serviço Jurídico do Conselho

Argumentos das partes

31
O recorrente afirma que a recusa do Conselho em lhe autorizar o acesso ao parecer do seu Serviço Jurídico constitui uma violação do artigo 4.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1049/2001. Invoca a este respeito três argumentos.

32
A título principal, o recorrente considera que o artigo 4.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1049/2001 não é aplicável a pareceres jurídicos relativos a projectos legislativos. Observa que a excepção ao princípio do acesso do público aos documentos, prevista neste artigo, se refere a «processos judiciais e consultas jurídicas [pareceres jurídicos]». Esta excepção não pretende, portanto, abranger todos os pareceres jurídicos internos ou externos do Conselho, destinando‑se a assegurar que os pareceres jurídicos, elaborados no contexto de processos judiciais actuais ou potenciais, que são análogos à correspondência trocada entre um advogado e um cliente, não serão divulgados, a menos que exista um interesse público superior que justifique a sua divulgação. O provedor de justiça europeu chegou, aliás, a esta mesma conclusão num dos seus relatórios para o Parlamento.

33
Por conseguinte, os pareceres jurídicos relativos às propostas legislativas não são abrangidos pelo artigo 4.°, n.° 2, segundo travessão, do Regulamento n.° 1049/2001. O artigo 4.°, n.° 3, do referido regulamento é a disposição adequada, que pode justificar que seja recusado o acesso a pareceres jurídicos elaborados no contexto do exame de propostas legislativas. Ora, o Conselho cometeu um erro de direito ao não invocar esta disposição na decisão impugnada.

34
Além disso, nos termos de jurisprudência consolidada, todas as excepções ao princípio do maior acesso possível a documentos detidos por uma instituição devem ser interpretadas e aplicadas em termos estritos e numa base individual. A este respeito, o recorrente afirma que os elementos suscitados pelo Conselho corroboram sobretudo a tese segundo a qual a intenção do legislador era precisamente limitar o sentido da expressão «consultas jurídicas [pareceres jurídicos]» aos pareceres jurídicos elaborados no contexto de processos judiciais, actuais ou potenciais. De onde resulta que a excepção do artigo 4.°, n.° 2, segundo travessão, do Regulamento n.° 1049/2001 relativa aos «processos judiciais e consultas jurídicas [pareceres jurídicos]» não abrange, simultaneamente, os pareceres jurídicos elaborados no âmbito de procedimentos legislativos e os pareceres jurídicos elaborados no âmbito de processos judiciais. Apesar da incerteza das medidas legislativas anteriores relativamente ao acesso aos documentos e da interpretação dada a este respeito pelo Tribunal no seu acórdão de 7 de Dezembro de 1999, Interporc/Comissão (T‑92/98, Colect., p. II‑3521), do Regulamento n.° 1049/2001 passou a resultar claramente que os «processos judiciais» não incluem somente os articulados e outros documentos apresentados neste contexto, mas também as «consultas jurídicas» redigidas no contexto dos referidos processos, actuais ou potenciais.

35
A título subsidiário, supondo que o artigo 4.°, n.° 2, segundo travessão, do Regulamento n.° 1049/2001 é aplicável no caso em apreço, o recorrente, apoiado pelo Reino da Suécia, pelo Reino da Dinamarca e pela República da Finlândia, recorda que esta excepção deve ser interpretada e aplicada em termos estritos.

36
Ora, segundo o recorrente e a República da Finlândia, a interpretação que o Conselho faz desta excepção é demasiado ampla e leva‑o a recusar o acesso a quase todos os documentos redigidos pelo seu Serviço Jurídico. A República da Finlândia indica, de resto, que a posição adoptada pelo Conselho não respeita o princípio da proporcionalidade.

37
Embora o Conselho possa recusar o acesso aos pareceres do seu Serviço Jurídico, só o pode fazer após ter examinado cada parecer jurídico e ter determinado as razões concretas que justificam a recusa de acesso (acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 17 de Junho de 1998, Svenska Journalistförbundet/Conselho, T‑174/95, Colect., p. II‑2289, n.° 112, e de 7 de Fevereiro de 2002, Kuijer/Conselho, T‑211/00, Colect., p. II‑485, n.° 56). Contudo, no caso em apreço, o Conselho não demonstrou que a divulgação do parecer jurídico em causa prejudicava a protecção dos pareceres jurídicos.

38
O Reino da Dinamarca precisa, a este respeito, que o Conselho não examinou se o parecer jurídico em causa podia ser divulgado, porque considera que todos os pareceres elaborados pelo seu Serviço Jurídico no âmbito de um procedimento legislativo constituem uma categoria que não está sujeita à transparência. Ora, em sua opinião, e no entender da República da Finlândia, incumbe ao Conselho proceder, caso a caso, à ponderação dos interesses enunciados no artigo 4.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1049/2001. A República da Finlândia acrescenta ainda que a apreciação da excepção referida no mesmo artigo requer que seja também tido em consideração o tempo que decorreu entre a redacção do parecer jurídico e o pedido de acesso ao mesmo.

39
O recorrente considera que uma proibição geral de divulgação de todos os pareceres do Serviço Jurídico não pode ser inferida da jurisprudência. Efectivamente, a jurisprudência não se opõe a que se distinga entre os pareceres jurídicos elaborados no decurso do processo legislativo e os pareceres jurídicos elaborados no contexto de processos judiciais. Além disso, os acórdãos invocados pelo Conselho não são relevantes no caso em apreço, uma vez que a problemática suscitada nos processos que deram lugar a esses acórdãos dizia respeito à questão de saber se os pareceres do Serviço Jurídico do Conselho podiam ser apresentados, sem autorização específica, no âmbito de processos no Tribunal de Primeira Instância. De resto, o recorrente, o Reino da Dinamarca e a República da Finlândia indicam que esses processos não diziam respeito à aplicação do Regulamento n.°ᅠ1049/2001. O recorrente refere‑se, a este propósito, ao acórdão do Tribunal de Justiça de 13 de Julho de 1995, Espanha/Conselho (C‑350/92, Colect., p. I‑1985, n.° 35), às conclusões do advogado‑geral F. G. Jacobs neste processo (Colect., p. I‑1988) e ao acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 8 de Novembro de 2000, Ghignone e o./Conselho (T‑44/97, ColectFP, pp. I‑A‑223 e II‑1023, n.° 48).

40
Quanto ao despacho do presidente do Tribunal de Primeira Instância de 3 de Março de 1998, Carlsen e o./Conselho (T‑610/97 R, Colect. p. II‑485), invocado pelo Conselho na decisão impugnada, o recorrente afirma que a decisão de proibir a divulgação do parecer jurídico em causa nesse processo foi tomada num contexto de providências cautelares, o que implica uma análise menos aprofundada dos factos e das questões de direito colocadas. Aliás, nesse processo, o Tribunal dificilmente poderia chegar a outra conclusão, a não ser que antecipasse a decisão do processo principal.

41
Quanto à necessária independência dos pareceres do seu Serviço Jurídico, invocada pelo Conselho em apoio da sua recusa em divulgar o parecer jurídico em causa, o recorrente, apoiado pelo Reino da Dinamarca, considera que, nos termos do artigo 22.° do Regulamento Interno do Conselho, o referido serviço defende os interesses da instituição a que organicamente pertence e a que está hierarquicamente subordinado e desempenha um papel claro na função legislativa dessa instituição. A divulgação dos pareceres do Serviço Jurídico contribui, portanto, para proteger este último das influências externas ilegítimas, designadamente, das dos Estados‑Membros, e para garantir a sua imparcialidade.

42
Por outro lado, como afirmam o recorrente e a República da Finlândia, os agentes dos serviços jurídicos das instituições comunitárias e os próprios serviços jurídicos têm uma missão diferente da dos advogados exteriores à instituição. Não gozam, assim, do mesmo tipo de independência que caracteriza a profissão jurídica.

43
O Reino da Suécia afirma, neste contexto, que, embora certas informações que constam dos pareceres jurídicos possam incluir‑se na excepção prevista pelo artigo 4.°, n.° 2, segundo travessão, do Regulamento n.° 1049/2001, incumbe à instituição apreciar a possibilidade de as divulgar à luz das informações que contêm e verificar se essa divulgação prejudica a sua protecção. Não se pode, portanto, considerar, de maneira geral, que os pareceres jurídicos são confidenciais.

44
O Reino da Suécia acrescenta que o legislador não pretendeu que a divulgação dos pareceres jurídicos ficasse excluída do âmbito do Regulamento n.° 1049/2001. Considera também que outros factores devem ser tidos em consideração para efeitos dessa análise. Assim, o artigo 207.°, n.° 3, CE preconiza uma maior transparência no âmbito do processo legislativo. Do mesmo modo, a fase concreta do procedimento legislativo e a natureza do acto a adoptar são susceptíveis de influenciar essa apreciação.

45
A título eminentemente subsidiário, o recorrente considera que, mesmo que o Conselho pudesse aplicar o artigo 4.°, n.° 2, segundo travessão, do Regulamento n.° 1049/2001, não podia ter considerado que a divulgação do parecer do seu Serviço Jurídico prejudicava a protecção dos pareceres jurídicos.

46
Censura, em primeiro lugar, o Conselho por não ter explicado em que medida a divulgação do parecer jurídico em causa entravava a protecção dos pareceres jurídicos. O Conselho limitou‑se, com efeito, a indicar que a existência de pareceres jurídicos independentes era essencial ao seu funcionamento e que a sua divulgação criaria incertezas quanto à legalidade dos actos legislativos.

47
Ora, segundo o recorrente, o argumento do Conselho segundo o qual a divulgação dos pareceres jurídicos podia afectar a sua independência não pode proceder. Efectivamente, o Conselho não demonstrou em que medida a divulgação dos pareceres jurídicos obrigaria o Serviço Jurídico a alterá‑los. A sua divulgação levaria, sobretudo, o Serviço Jurídico a actuar com diligência, independência e objectividade, uma vez que terceiros poderiam examinar tais pareceres. O recorrente acrescenta que muitos pareceres jurídicos se limitam a uma breve análise da base legal da legislação proposta, sem conter argumentos detalhados e confidenciais do Serviço Jurídico. Por fim, o recorrente indica que em muitos Estados‑Membros, como a Itália ou os Países Baixos, os pareceres jurídicos relativos a propostas legislativas elaborados por serviços ou comissões jurídicas e destinados aos governos estão acessíveis ao público. Tendo em conta a importância atribuída a nível nacional ao acesso a esses pareceres jurídicos, o recorrente podia, legitimamente, esperar obter essas informações do Conselho.

48
Quanto ao argumento do Conselho baseado no facto de a divulgação dos pareceres jurídicos relativos a procedimentos legislativos poder contribuir para a colocação em causa da legalidade dos actos legislativos que vieram a ser adoptados, o recorrente assinala que só a excepção prevista no artigo 4.°, n.° 3, do Regulamento n.° 1049/2001 é aplicável. O Conselho não invocou, contudo, esta disposição e os seus argumentos a este respeito devem ser, portanto, ignorados.

49
De qualquer modo, a divulgação de um parecer jurídico não podia, por si só, afectar a legalidade do acto legislativo em causa uma vez que os actos das instituições comunitárias se presumem legais até à sua eventual anulação pelos órgãos jurisdicionais comunitários.

50
Em segundo lugar, existe um interesse público superior que justifica o acesso do público aos pareceres jurídicos relativos a iniciativas legislativas. O Conselho, de resto, considerou erradamente que o interesse público superior que justifica a divulgação não pode consistir nos princípios da transparência e da abertura. O Reino da Dinamarca defende, a este respeito, que o interesse da transparência do processo decisório é superior aos interesses invocados pelo Conselho para recusar a divulgação dos pareceres jurídicos.

51
Em conclusão, o recorrente considera que o Conselho violou o artigo 4.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1049/2001 e não respeitou os direitos civis e políticos fundamentais dos cidadãos, garantidos, designadamente, pelo artigo 6.° UE.

52
O Conselho, o Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte e a Comissão opõem‑se à argumentação do recorrente.

Apreciação do Tribunal

53
O Regulamento n.° 1049/2001, adoptado em aplicação do artigo 255.° CE, estabelece os princípios, condições e limites que regem o exercício do direito de acesso do público aos documentos do Parlamento, do Conselho e da Comissão a fim de assegurar uma melhor participação dos cidadãos no processo decisório, de garantir uma maior legitimidade, eficácia e responsabilidade da administração relativamente aos cidadãos num sistema democrático e de contribuir para o reforço dos princípios da democracia e do respeito pelos direitos fundamentais.

54
Nos termos do artigo 4.°, n.° 2, segundo travessão, do Regulamento n.° 1049/2001, as instituições recusarão o acesso aos documentos cuja divulgação pudesse prejudicar a protecção de processos judiciais e pareceres jurídicos, excepto quando um interesse público superior imponha a divulgação.

55
Em primeiro lugar, o recorrente afirma que os pareceres jurídicos a que se refere este artigo são apenas os elaborados pelos serviços jurídicos no contexto de processos judiciais e não os elaborados no âmbito da actividade legislativa das instituições. Sendo o parecer jurídico em causa relativo a uma proposta de directiva do Conselho que estabelece as normas mínimas em matéria de acolhimento dos requerentes de asilo nos Estados‑Membros, não lhe pode ser aplicada a excepção prevista no artigo 4.°, n.° 2, segundo travessão, do Regulamento n.° 1049/2001.

56
Contudo, a leitura desta disposição não permite concluir que esta só se refere aos documentos susceptíveis de prejudicar a protecção dos pareceres jurídicos elaborados no contexto de processos judiciais.

57
Por outro lado, importa observar que nem o código de conduta em matéria de acesso do público aos documentos do Conselho e da Comissão, aprovado por estas duas instituições em 6 de Dezembro de 1993 [93/730/CE (JO L 340, p. 41)], nem as decisões das instituições relativas ao acesso do público aos seus documentos, adoptadas anteriormente ao Regulamento n.° 1049/2001 [Decisão 93/731/CE do Conselho, de 20 de Dezembro de 1993 (JO L 340, p. 43), Decisão 94/90/CECA, CE, Euratom da Comissão, de 8 de Fevereiro de 1994 (JO L 46, p. 58), e Decisão 97/632/CE, CECA, Euratom do Parlamento Europeu, de 10 de Julho de 1997 (JO L 263, p. 27), se referiam especificamente, a título de excepções ao direito de acesso do público a esses documentos, à protecção dos pareceres jurídicos dessas instituições. Estes diplomas referiam‑se contudo à protecção dos processos judiciais.

58
De onde se conclui que o legislador comunitário pretendeu, no Regulamento n.° 1049/2001, consagrar uma excepção relativa aos pareceres jurídicos diferente da relativa aos processos judiciais.

59
A este propósito, a interpretação proposta pelo recorrente, segundo a qual os pareceres jurídicos a que se refere o artigo 4.°, n.° 2, segundo travessão, do Regulamento n.° 1049/2001 são os elaborados no âmbito de processos judiciais acompanhados pelos serviços jurídicos das instituições, exigia que o legislador o indicasse especificamente, dispondo, por exemplo, que a protecção em causa respeitava «aos processos judiciais e designadamente aos pareceres jurídicos». Não é isso, no entanto, que se verifica.

60
É verdade que, segundo jurisprudência constante, as excepções ao acesso aos documentos devem ser interpretadas e aplicadas restritivamente, de forma a não pôr em xeque a aplicação do princípio geral que consiste em conferir ao público o acesso mais amplo possível aos documentos em poder das instituições (v., por analogia, relativamente à Decisão 94/90, acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 14 de Outubro de 1999, Bavarian Lager/Comissão, T‑309/97, Colect., p. II‑3217, n.° 39, e de 11 de Dezembro de 2001, Petrie e o./Comissão, T‑191/99, Colect. p. II‑3677, n.° 66).

61
O princípio exposto pela jurisprudência só se aplica, contudo, à definição do alcance de uma excepção caso esta possa dar lugar a várias interpretações diferentes. No caso em apreço, a expressão «consultas jurídicas» não apresenta em si mesma qualquer dificuldade de interpretação, de modo que não há que considerar que só abrange os pareceres elaborados no contexto de processos judiciais. Por outro lado, a interpretação contrária proposta pelo recorrente teria por consequência privar de qualquer efeito útil a menção dos pareceres jurídicos entre as excepções previstas pelo Regulamento n.° 1049/2001.

62
Assim, a expressão «consultas jurídicas» deve ser entendida no sentido de que a protecção do interesse público se pode opor à divulgação do conteúdo dos documentos redigidos pelo Serviço Jurídico do Conselho no âmbito de processos judiciais, mas também para quaisquer outros fins.

63
Aliás, quanto aos «processos judiciais» na acepção da Decisão 94/90, o Tribunal considerou que esta noção abrange não apenas as alegações ou requerimentos apresentados, os documentos internos respeitantes à instrução do processo em curso, mas também as comunicações relativas ao processo entre a direcção‑geral em causa e o Serviço Jurídico ou um gabinete de advogados (acórdão Interporc/Comissão, já referido, n.° 41).

64
Ora, tendo o conceito de «processos judiciais», no contexto do direito de acesso do público aos documentos das instituições, sido já interpretada, deve considerar‑se que essa definição, desenvolvida no âmbito da interpretação da Decisão 94/90, é pertinente no âmbito do Regulamento n.° 1049/2001.

65
Assim, dado que os pareceres jurídicos redigidos no contexto de processos judiciais já estão incluídos na excepção relativa à protecção dos processos judiciais, na acepção do artigo 4.°, n.° 2, segundo travessão, do Regulamento n.° 1049/2001, a menção expressa dos pareceres jurídicos entre as excepções tem necessariamente um alcance diferente do da excepção relativa aos processos judiciais.

66
De onde resulta que o recorrente não tem razão ao afirmar que um parecer jurídico sobre a actividade legislativa de uma instituição, como o em causa no presente caso, não pode estar abrangido pela excepção relativa aos pareceres jurídicos na acepção do artigo 4.°, n.° 2, segundo travessão, do Regulamento n.° 1049/2001.

67
Perante o exposto, foi correctamente que o Conselho se baseou na excepção prevista no artigo 4.°, n.° 2, segundo travessão, do Regulamento n.° 1049/2001 para determinar se devia autorizar o acesso do recorrente ao parecer do seu Serviço Jurídico.

68
Em segundo lugar, o recorrente alega que o Conselho não analisou o parecer jurídico em causa porque os pareceres jurídicos são, por natureza, confidenciais. Contesta também a relevância do argumento do Conselho baseado na necessidade de o seu Serviço Jurídico preservar a sua independência.

69
Importa indicar que a instituição tem de apreciar, em cada caso, se os documentos cuja divulgação é solicitada estão efectivamente abrangidos pelas excepções enumeradas no Regulamento n.° 1049/2001 (v., por analogia, quanto à Decisão 94/90, acórdão do Tribunal de Justiça de 11 de Janeiro de 2000, Países Baixos e Van der Wal/Comissão, C‑174/98 P e C‑189/98 P, Colect., p. I‑1, n.° 24).

70
No caso em apreço, há que observar que o documento em causa é um parecer do Serviço Jurídico do Conselho relativo a uma proposta de directiva do Conselho que estabelece as normas mínimas em matéria de acolhimento dos requerentes de asilo nos Estados‑Membros.

71
Todavia, a circunstância de o documento em causa ser um parecer jurídico não basta, por si só, para justificar a aplicação da excepção invocada. Com efeito, como já foi recordado, qualquer excepção ao direito de acesso aos documentos das instituições prevista no Regulamento n.° 1049/2001 deve ser interpretada e aplicada em termos estritos (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 13 de Setembro de 2000, Denkavit Nederland/Comissão, T‑20/99, Colect., p. II‑3011, n.° 45).

72
Incumbe assim ao Tribunal verificar se, no caso em apreço, o Conselho não cometeu qualquer erro de apreciação ao considerar, em aplicação do artigo 4.°, n.° 2, segundo travessão, do Regulamento n.° 1049/2001, que a divulgação do parecer jurídico em causa prejudicava a protecção de que este tipo de documento pode beneficiar.

73
A fim de justificar a sua recusa de divulgação da totalidade do parecer jurídico em causa, o Conselho afirma, em suma, na decisão impugnada, que os pareceres do seu Serviço Jurídico constituem um instrumento importante que lhe permite estar certo da compatibilidade dos seus actos com o direito comunitário e progredir no debate dos aspectos jurídicos em causa. Afirma também que dessa divulgação pode resultar uma incerteza quanto à legalidade dos actos legislativos adoptados na sequência desses pareceres. O Conselho refere‑se também às conclusões do advogado‑geral F. G. Jacobs no processo que deu lugar ao acórdão Espanha/Conselho, já referidas, ao despacho Carlsen e o./Conselho, já referido, e ao acórdão Ghignone e o./Conselho, já referido.

74
É verdade que esta fundamentação, relativa à necessidade de protecção invocada, parece respeitar a todos os pareceres jurídicos do Conselho sobre actos legislativos e não especificamente ao parecer jurídico em causa. No entanto, a generalidade da fundamentação do Conselho é justificada pelo facto de a evocação de informações suplementares, fazendo, designadamente, referência ao conteúdo do parecer jurídico em causa, privar a excepção invocada da sua finalidade.

75
Por outro lado, embora o Conselho, num primeiro momento, tenha recusado o acesso do recorrente ao parecer jurídico em causa, resulta da decisão impugnada que acabou por aceitar apenas divulgar o parágrafo introdutório do referido parecer. Nos termos desse parágrafo introdutório, indicou que o parecer em causa contém as opiniões do Serviço Jurídico do Conselho sobre a questão da competência comunitária em matéria de acesso de nacionais de países terceiros ao mercado de trabalho.

76
De onde se conclui que a acusação segundo a qual o Conselho não examinou o conteúdo do parecer jurídico em causa a fim de se pronunciar sobre o pedido de acesso controvertido não procede.

77
Quanto à relevância da necessidade de protecção desse parecer identificada pelo Conselho na decisão impugnada, o Tribunal considera que a divulgação do parecer jurídico em causa teria por efeito tornar públicos os debates internos do Conselho relativos à questão da competência comunitária em matéria de acesso de nacionais de países terceiros ao mercado de trabalho e, em termos gerais, à questão da legalidade do acto legislativo a que diz respeito.

78
A divulgação desse parecer poderia assim, tendo em conta a natureza especial desses documentos, suscitar dúvidas sobre a legalidade do acto legislativo em causa.

79
Além disso, há que observar que o Conselho tem razão ao considerar que a independência dos pareceres do seu Serviço Jurídico, elaborados a pedido de outros serviços dessa instituição ou que, pelo menos, lhes são destinados, pode constituir um interesse a proteger. A este respeito, o recorrente não explicou em que medida, nas circunstâncias do caso em apreço, a divulgação do parecer jurídico em causa contribuiria para proteger o Serviço Jurídico do Conselho de influências externas ilegítimas.

80
Tendo em conta o que precede, o Conselho não cometeu qualquer erro de apreciação ao considerar que existia um interesse na protecção do parecer jurídico em causa.

81
Em terceiro lugar, quanto à existência de um interesse público superior, na acepção do artigo 4.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1049/2001, que justificasse a divulgação do parecer jurídico em causa, o recorrente alega que o Conselho não verificou a existência de um interesse desse tipo. O recorrente considera, a este respeito, que os princípios da transparência, da abertura e da democracia ou da participação dos cidadãos no processo decisório constituem interesses públicos superiores que justificam a divulgação do parecer jurídico em causa.

82
Contudo, importa sublinhar que estes princípios são postos em prática por todas as disposições do Regulamento n.° 1049/2001, como atestam os considerandos 1 e 2 do referido regulamento, que fazem explicitamente referência aos princípios da abertura, da democracia e da mais ampla participação dos cidadãos no processo decisório (v. n.° 2 supra).

83
O interesse público superior, referido no artigo 4.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1049/2001, susceptível de justificar a divulgação de um documento que viole a protecção dos pareceres jurídicos deve, portanto, em princípio, ser diferente dos princípios indicados que subjazem ao referido regulamento. Na sua falta, incumbe, pelo menos, ao demandante demonstrar que, tendo em conta as circunstâncias específicas do caso, a invocação desses mesmos princípios apresenta uma acuidade tal que ultrapassa a necessidade de protecção do documento controvertido. Não é o que se verifica, contudo, neste processo.

84
Além disso, embora seja possível que a própria instituição em causa identifique um interesse público superior susceptível de justificar a divulgação desse documento, incumbe ao demandante que tencione prevalecer‑se desse interesse invocá‑lo no âmbito do seu pedido a fim de convidar a instituição a pronunciar‑se sobre esse ponto.

85
No caso em apreço, não tendo o Conselho cometido qualquer erro de apreciação ao considerar que os interesses públicos superiores invocados pelo recorrente não eram susceptíveis de justificar a divulgação do parecer jurídico em causa, não pode ser censurado por não ter identificado outros interesses públicos superiores.

86
Tendo em conta o que precede, há que negar provimento ao presente recurso na parte relativa à recusa de acesso ao parecer jurídico do Conselho.

Quanto ao pedido de medidas de organização do processo

87
O Tribunal considera que não há que deferir o pedido de medidas de organização do processo que o recorrente apresentou nos seus articulados, pelo qual pretendia que se pedisse ao Conselho que transmitisse ao Tribunal todos os documentos cuja divulgação é requerida.

88
Relativamente à parte deste pedido destinada à apresentação ao Tribunal dos quatro documentos sobre propostas legislativas, ficou sem objecto uma vez que o recorrente teve acesso aos referidos documentos.

89
Quanto à parte do pedido destinada à apresentação ao Tribunal do parecer jurídico em causa, não há que a acolher pois o Tribunal considera‑se suficientemente esclarecido pelas informações contidas nos autos.


Quanto às despesas

90
Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. O artigo 87.°, n.° 6, do referido regulamento prevê que, se não houver lugar a decisão de mérito, o Tribunal decide livremente quanto às despesas.

91
Como o Tribunal observou, o recurso ficou sem objecto no que respeita à recusa de acesso integral aos quatro documentos do Conselho sobre propostas legislativas (documentos n.° 12616/02, n.° 12616/02 COR 1, n.° 12903/02 e n.° 12619/02).

92
Nos seus articulados, o Conselho admitiu que os documentos n.° 12616/02 e n.° 12616/02 COR 1 deviam ter sido comunicados ao recorrente antes da interposição do presente recurso. Assim sendo, o comportamento do Conselho favoreceu o surgimento do litígio no que respeita a estes dois documentos e conduziu o recorrente a despesas inúteis.

93
Quanto aos documentos n.° 12619/02 e n.° 12903/02, o Conselho acabou por decidir comunicá‑los ao recorrente, posteriormente à interposição do presente recurso, apesar de os actos legislativos a que dizem respeito não terem ainda sido adoptados, sem explicar as razões justificativas dessa mudança de atitude.

94
O Conselho deverá, portanto, suportar metade das suas despesas relativas ao recurso e metade das despesas suportadas pelo recorrente.

95
Por outro lado, tendo o recorrente sido vencido na parte do recurso relativa à recusa de acesso ao parecer jurídico do Conselho, há que condená‑lo a suportar metade das suas despesas e metade das despesas suportadas pelo Conselho.

96
Nos termos do artigo 87.°, n.° 4, primeiro parágrafo, do Regulamento de Processo, os Estados‑Membros e as instituições que intervenham no processo devem suportar as respectivas despesas.


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quinta Secção)

decide:

1)
É negado provimento ao recurso na parte relativa à recusa de acesso ao parecer jurídico do Conselho.

2)
Não há que decidir quanto ao mais.

3)
O recorrente e o Conselho suportarão cada um metade das despesas relativas ao recurso.

4)
Os intervenientes suportarão as suas próprias despesas.

Lindh

García-Valdecasas

Cooke

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 23 de Novembro de 2004.

O secretário

O presidente

H. Jung

P. Lindh


1
Língua do processo: inglês.