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ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quarta Secção)

12 de Julho de 2001 (1)

«Concorrência - Mercado do açúcar - Infracção ao artigo 85.° do Tratado CE (actual artigo 81.° CE) - Coimas»

Nos processos apensos T-202/98, T-204/98 e T-207/98,

Tate & Lyle plc, estabelecida em Londres (Reino Unido), representada por R. Fowler, QC, e A. L. Morris, solicitors, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrente no processo T-202/98,

British Sugar plc, estabelecida em Peterborough (Reino Unido), representada por T. Sharpe, QC, D. Jowell, barristers, L. R. Lindsay e A. Nourry, solicitors, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrente no processo T-204/98,

Napier Brown & Co. Ltd, estabelecida em Londres, representada por D. Guy, solicitor, e S. Sheppard, barrister, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrente no processo T-207/98,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada por K. Wiedner, na qualidade de agente, assistido por N. Khan, barrister, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrida,

que têm por objecto um pedido de anulação da Decisão 1999/210/CE da Comissão, de 14 de Outubro de 1998, relativa a um processo de aplicação do artigo 85.° do Tratado CE (Processo IV/F-3/33.708 - British Sugar plc, Processo IV/F-3/33.709 - Tate & Lyle plc, Processo IV/F-3/33.710 - Napier Brown & Company Ltd, Processo IV/F-3/33.711 - James Budgett Sugars Ltd (JO 1999, L 76, p. 1),

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Quarta Secção),

composto por: P. Mengozzi, presidente, V. Tiili e R. M. Moura Ramos, juízes,

secretário: J. Palacio González, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 29 de Novembro de 2000,

profere o presente

Acórdão

Regime comunitário do mercado do açúcar e situação do mercado do açúcar na Grã-Bretanha

1.
    O regime comunitário do mercado do açúcar destina-se a apoiar e proteger a produção de açúcar na Comunidade. Compreende um preço mínimo, a que o produtor comunitário poderá sempre vender o seu açúcar às autoridades públicas, e um preço limiar, a que o açúcar não sujeito a quotas pode ser importado de países terceiros.

2.
    O apoio à produção comunitária através de preços garantidos está, porém, limitado às quotas nacionais de produção (quotas A e B) atribuídas pelo Conselho a cada Estado-Membro, que seguidamente as reparte entre os seus produtores. O açúcar abrangido pela quota B está sujeito, comparativamente ao da quota A, a um direito nivelador sobre a produção mais elevado. O açúcar das quotas A e B produzido em excesso é denominado «açúcar C» e não pode ser vendido na Comunidade Europeia, salvo após ter estado armazenado durante doze meses. As exportações extracomunitárias beneficiam, à excepção do açúcar C, de restituições à exportação. O facto de a venda com restituição ser, em princípio, mais vantajosa do que a efectuada no quadro do sistema de intervenção permite escoar os excedentes comunitários para o exterior da Comunidade.

3.
    A British Sugar é o único transformador britânico que produz açúcar a partir de beterraba, tendo-lhe sido atribuída o conjunto da quota de beterrabas britânicas, que se eleva a 1 144 000 toneladas. A Tate & Lyle compra açúcar de cana nos países de África, das Caraíbas e do Pacífico (ACP), que depois transforma.

4.
    O mercado de açúcar na Grã-Bretanha é de natureza oligopolística. Em razão do regime do açúcar na Comunidade, a Tate & Lyle sofre, contudo, de uma desvantagem estrutural relativamente à British Sugar, estando provado que esta domina o mercado na Grã-Bretanha. Juntas, a British Sugar e a Tate & Lyle produzem um volume de açúcar aproximadamente igual à procura total deste produto na Grã-Bretanha.

5.
    Um elemento suplementar que afecta a concorrência no mercado do açúcar na Grã-Bretanha é a existência de comerciantes de açúcar. Estes últimos exercem a sua actividade de duas maneiras, isto é, ou por conta própria, adquirindo o açúcar a granel à British Sugar, à Tate & Lyle ou a importadores e revendendo-o, ou por conta de terceiros, assumindo a responsabilidade pelas encomendas, pela facturação em nome do comitente e pelas cobranças. No caso de negócio por conta de terceiros, os preços e as condições de fornecimento do açúcar são directamente negociadas entre a British Sugar ou a Tate & Lyle e o cliente final, embora os comerciantes estejam quase sempre ao corrente dos preços acordados.

Factos na origem do litígio

6.
    Entre 1984 e 1986, a British Sugar levou a cabo uma guerra de preços que conduziu a preços anormalmente baixos no mercado do açúcar industrial e do açúcar a retalho. Em 1986, a Napier Brown, que é comerciante de açúcar, renovou a queixa que inicialmente apresentara, em 1980, junto da Comissão, denunciando o facto de a British Sugar ter explorado abusivamente a sua posição dominante, em violação do artigo 86.° do Tratado CE (actual artigo 82.° CE).

7.
    Em 8 de Julho de 1986, a Comissão dirigiu à British Sugar uma comunicação de acusações juntamente com medidas provisórias destinadas a pôr termo à violação do artigo 86.° do Tratado. Em 5 de Agosto de 1986, a British Sugar propôs à Comissão compromissos quanto ao seu comportamento futuro, que esta última aceitou por carta de 7 de Agosto de 1986 (a seguir «compromissos»).

8.
    O procedimento desencadeado na sequência da queixa da Napier Brown foi encerrado pela Decisão 88/518/CEE da Comissão, de 18 de Julho de 1988, relativa a um processo de aplicação do artigo 86.° do Tratado CEE (Processo n.° IV/30.178 Napier Brown - British Sugar) (JO L 284, p. 41), que declarava a existência de violação do artigo 86.° do Tratado pela British Sugar e lhe aplicava uma coima.

9.
    Entretanto, em 20 de Junho de 1986, teve lugar uma reunião entre representantes da British Sugar e da Tate & Lyle, durante a qual a British Sugar anunciou o fim da guerra de preços nos mercados do açúcar industrial e do açúcar a retalho no Reino Unido.

10.
    A esta reunião, seguiram-se, nomeadamente, até 13 de Junho de 1990, 18 outras reuniões respeitantes aos preços do açúcar industrial, em que participaram igualmente representantes da Napier Brown e da James Budgett Sugars, principais comerciantes de açúcar no Reino Unido (a seguir «comerciantes»). No decurso destas reuniões, a British Sugar forneceu a todos os participantes informações relativas aos seus futuros preços. Num destes encontros, a British Sugar distribuiu igualmente aos outros participantes uma tabela dos seus preços para o açúcar industrial, em função dos volumes de compras.

11.
    Além disso, até 9 de Maio de 1990, a Tate & Lyle e a British Sugar reuniram-se oito vezes para discutir os preços de açúcar a retalho. Em três ocasiões, a British Sugar entregou as suas tabelas de preços à Tate & Lyle, uma vez, cinco dias, e outra vez, dois dias, antes da respectiva entrada em circulação oficial.

12.
    Em 4 de Maio de 1992, na sequência de duas cartas dirigidas pela Tate & Lyle ao Office of Fair Trading inglês, datadas de 16 de Julho e de 29 de Agosto de 1990, e cuja cópia foi enviada pela Tate & Lyle à Comissão, esta última instaurou um processo contra a British Sugar, a Tate & Lyle, a Napier Brown, a James Budgett Sugars e certos produtores de açúcar da Europa Continental, tendo-lhes enviado, em 12 de Junho de 1992, uma comunicação de acusações onde mencionava a violação dos artigos 85.°, n.° 1, do Tratado CE (actual artigo 81.°, n.° 1, CE) e 86.° do Tratado.

13.
    Em 18 de Agosto de 1995, a Comissão dirigiu à British Sugar, à Tate & Lyle, à James Budgett Sugars e à Napier Brown uma segunda comunicação de acusações cujo conteúdo era mais limitado do que o da comunicação de acusações de 12 de Junho de 1992 na medida em que apenas mencionava a violação do artigo 85.°, n.° 1, do Tratado.

14.
    Em 14 de Outubro de 1998, a Comissão adoptou a Decisão 1999/210/CE relativa a um processo de aplicação do artigo 85° do Tratado CE (Processo IV/F-3/33.708 - British Sugar plc, Processo IV/F-3/33.709 - Tate & Lyle plc, Processo IV/F-3/33.710 - Napier Brown & Company Ltd, Processo IV/F-3/33.711 - James Budgett Sugars Ltd) (JO 1999, L 76, p. 1, a seguir «decisão impugnada»). Nesta decisão, dirigida à British Sugar, à Tate & Lyle, à James Budgett Sugars e à Napier Brown, a Comissão conclui pela existência de uma violação do artigo 85.°, n.° 1, do Tratado, por parte destas últimas, e aplica, nomeadamente no artigo 3.°, uma coima de 39,6 milhões de ecus à British Sugar e de 7 milhões de ecus à Tate & Lyle, por violação do artigo 85.°, n.° 1, nos mercados do açúcar industrial e do açúcar a retalho, e uma coima de 1,8 milhões de ecus à Napier Brown, por violação do artigo 85.°, n.° 1, no mercado do açúcar industrial.

Tramitação processual

15.
    Por petição entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 18 de Dezembro de 1998, a Tate & Lyle instaurou o recurso registado sob o número T-202/98.

16.
    Por petição entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 21 de Dezembro de 1998, a British Sugar instaurou o recurso registado sob o número T-204/98.

17.
    Por acto separado, entrado na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 25 de Janeiro de 1999, a British Sugar apresentou um pedido de medidas provisórias destinado, por um lado, a que seja suspensa a execução do artigo 4.° da decisão impugnada, que fixa as modalidades de pagamento da coima aplicada, e, por outro, a que sejam decretadas todas as medidas provisórias necessárias respeitantes às condições de pagamento da referida coima.

18.
    Por despacho do presidente do Tribunal de Primeira Instância de 11 de Outubro de 2000, o pedido de medidas provisórias da British Sugar foi, na sequência da desistência desta última, cancelado no registo do Tribunal, nos termos do artigo 99.° do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância. Ficou reservada para final a decisão quanto às despesas relativas a este processo.

19.
    Por petição entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 23 de Dezembro de 1998, a Napier Brown instaurou o recurso registado sob o número T-207/98.

20.
    Por despacho de 20 de Julho de 2000, o Tribunal de Primeira Instância (Quarta Secção) decidiu apensar os três processos para efeitos da fase oral e do acórdão.

21.
    Foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às questões colocadas pelo Tribunal, na audiência de 29 de Novembro de 2000.

Pedidos das partes

22.
    No processo T-202/98, a recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

-    anular o artigo 3.° da decisão impugnada na parte que lhe diz respeito;

-    condenar a Comissão nas despesas.

23.
    A recorrida conclui pedindo que o Tribunal se digne:

-    julgar o recurso improcedente;

-    condenar a recorrente nas despesas.

24.
    No processo T-204/98, a recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

-    anular a decisão impugnada na íntegra, ou, a título subsidiário, em parte;

-    caso a decisão impugnada seja integral ou parcialmente mantida, anular os artigos 3.° e 4.° ou reduzir o montante da coima;

-    condenar a Comissão nas despesas.

25.
    A recorrida conclui pedindo que o Tribunal se digne:

-    julgar o recurso improcedente;

-    condenar a recorrente nas despesas.

26.
    No processo T-207/98, a recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

-    anular a decisão impugnada na parte que lhe diz respeito;

-    anular a coima que lhe foi aplicada nos termos da decisão ou reduzir o respectivo montante;

-    condenar a Comissão nas despesas;

-    condenar a Comissão a reembolsar-lhe as despesas respeitantes à constituição de uma garantia destinada ao pagamento da coima.

27.
    A recorrida conclui pedindo que o Tribunal se digne:

-    julgar o recurso improcedente;

-    condenar a recorrente nas despesas.

Questão de direito

Observações preliminares

28.
    As recorrentes nos processos T-204/98 e T-207/98 baseiam o seu pedido principal de anulação da decisão impugnada em três fundamentos. Em primeiro lugar, entendem que a Comissão cometeu erros manifestos de facto e de direito, ao considerar que as práticas recriminadas constituem um acordo ou uma prática concertada e, em particular, um erro na determinação daquilo que constitui um acordo ou uma prática concertada e um erro na definição do objectivo anticoncorrencial dos factos recriminados. Em segundo lugar, consideram que a Comissão não provou o efeito anticoncorrencial consecutivo aos factos recriminados. Em terceiro lugar, a recorrente no processo T-204/98 alega que a Comissão cometeu um erro manifesto de direito na análise da condição relativa à repercussão da conduta dos participantes nas reuniões controvertidas no comércio entre Estados-Membros.

29.
    Em apoio do seu pedido subsidiário de anulação relativo ao montante da coima que lhes foi aplicada, a British Sugar e a Napier Brown invocam diversos fundamentos. Em especial, contestam o cálculo das referidas coimas, afirmando que a decisão impugnada, por um lado, viola o princípio da proporcionalidade na aplicação das Orientações para o cálculo das coimas aplicadas por força do n.° 2 do artigo 15.° do Regulamento n.° 17 e do n.° 5 do artigo 65.° do Tratado CECA (JO 1998, C 9, p. 3, a seguir «orientações»), e, por outro, não tomou em conta a estrutura do mercado e o contexto económico dos comportamentos em causa. A recorrente no processo T-204/98 acrescenta que a Comissão cometeu uma violação de formalidades essenciais ao não considerar o conjunto dos argumentos dos participantes nas reuniões controvertidas, nomeadamente, no que respeita ao seu tratamento diferenciado relativamente à Tate & Lyle, ao carácter não intencional da infracção, à inutilidade de medidas dissuasivas suplementares e à sua cooperação com a Comissão ao longo do processo. Por fim, as duas recorrentes mantêm que o atraso da Comissão na adopção da decisão impugnada conduziu ao aumento do nível das suas coimas.

30.
    A recorrente no processo T-202/98 só contesta a parte da decisão que respeita ao cálculo da coima. Pelo seu primeiro fundamento, afirma que a decisão impugnada aplica de forma errada a Comunicação da Comissão sobre a não aplicação ou a redução de coimas nos processos relativos a acordos, decisões e práticas concertadas (JO 1996, C 207, p. 4, a seguir «comunicação sobre a cooperação») e, pelo segundo, invoca a não fundamentação da decisão quanto a este ponto.

Quanto aos fundamentos apresentados em apoio do pedido principal de anulação da decisão impugnada nos processos T-204/98 e T-207/98

Quanto ao primeiro fundamento, baseado em erros de factos e de direito na determinação daquilo que constitui um acordo ou uma prática concertada

- Argumentação das partes

31.
    A British Sugar e a Napier Brown afirmam que a decisão impugnada é consequência de uma análise incorrecta da Comissão no que toca quer à estrutura do mercado quer aos factos ocorridos entre 1986 e 1990.

32.
    Em primeiro lugar, uma apreciação correcta dos factos por parte da Comissão teria evidenciado que os participantes nas reuniões controvertidas não agiram de forma coordenada no mercado do açúcar na Grã-Bretanha. Com efeito, este mercado é especial na medida em que, por um lado, a sua própria natureza obriga os outros produtores a seguir a política de preços praticada pela British Sugar. Por outro lado, o carácter insular do país, ao aumentar os custos de transporte, permite que os produtores ingleses beneficiem de um nível mínimo de importações. Por conseguinte, as características deste mercado limitam naturalmente a concorrência entre as empresas nele presentes. Por outro lado, o Tribunal de Justiça reconheceu no acórdão de 16 de Dezembro de 1975, Suiker Unie/Comissão (40/73 a 48/73, 50/73, 54/73 a 56/73, 111/73, 113/73 e 114/73, Colect., p. 563, a seguir «acórdão Suiker Unie»), que a indústria do açúcar na Comunidade está fortemente regulamentada e que o regime comunitário do açúcar deixa apenas um domínio de aplicação residual às regras da concorrência. Por fim, a afirmação da Comissão, no considerando 72 da decisão impugnada, segundo a qual os participantes nas reuniões controvertidas combinaram elevar os preços e abster-se de aumentar as suas quotas de mercado através de uma redução dos preços, é desmentida pelo facto de a quota de mercado da British Sugar ser determinada pelas suas quotas A e B.

33.
    Em segundo lugar, a British Sugar e a Napier Brown afirmam que as reuniões controvertidas tiveram lugar a fim de dar cumprimento aos compromissos assumidos pela British Sugar perante a Comissão e de garantir aos comerciantes e à Tate & Lyle que a British Sugar deixaria de prosseguir uma política de preços agressiva.

34.
    Em terceiro lugar, a British Sugar e a Napier Brown afirmam não ter implementado qualquer acordo ou prática concertada na acepção do artigo 85.°, n.° 1, do Tratado, pois o seu comportamento no mercado não era influenciado pelas informações obtidas no decurso daquelas reuniões. A British Sugar, que é líder em matéria de preços, limitou-se a fazer declarações unilaterais acerca da sua futura política de preços. Aliás, estas informações já eram conhecidas no mercado, uma vez que, além da natural transparência do mercado, a British Sugar comunicou aos seus clientes, informal e sistematicamente, as alterações dos seuspreços antes das reuniões controvertidas. Assim, a Tate & Lyle teve conhecimento dos preços da British Sugar antes da sua divulgação «oficial» no mercado, mas não antes de os clientes desta última terem sido informados. Além disso, na medida em que estavam vinculados por determinados contratos celebrados com a British Sugar, os comerciantes tinham sido informados dos preços por ela praticados antes das reuniões controvertidas.

35.
    Segundo a British Sugar e a Napier Brown, o facto de as informações serem fornecidas unilateralmente por uma empresa a outra é insuficiente para constituir uma violação do artigo 85.°, n.° 1, do Tratado. Com efeito, para que se verifique uma prática concertada, a Comissão deve demonstrar que houve uma troca de informações entre as empresas em causa acerca, no caso vertente, da sua futura política de preços.

36.
    Por sua vez, a Napier Brown sustenta igualmente que a sua participação nas reuniões deve ser distinguida da dos produtores de açúcar. Com efeito, a mesma não só é concorrente mas também cliente dos dois produtores britânicos. Enquanto cliente, é afectada pela política de preços dos produtores ao mesmo título que qualquer outro cliente. Em vez de apreciar as justificações individualmente fornecidas por cada participante nas reuniões controvertidas, a Comissão examinou essas justificações em conjunto, deduzindo que, visto os participantes não apresentarem explicações plausíveis para a presença comum dos produtores e dos comerciantes nessas reuniões, podia agir desse modo. Além disso, as provas reunidas pela Comissão demonstram que a intenção dos comerciantes era competir o máximo possível com os produtores.

37.
    A Comissão reconhece que o mercado é muito específico, mas contrapõe que a concorrência em matéria de preços continua a ser possível entre o preço mínimo oferecido pelo regime comunitário do açúcar e os preços decididos pela British Sugar. A Tate & Lyle e os comerciantes são seguidores («price followers»), isto é, são obrigados a reduzir os preços se a British Sugar reduzir os seus, não sendo, porém, obrigados a aumentá-los se a British Sugar o fizer. Ora, a Tate & Lyle e os comerciantes decidiram não competir com a British Sugar em matéria de preços, não obstante tal ter sido possível, preferindo seguir uma estratégia de colaboração conducente ao aumento dos preços.

38.
    No que respeita aos compromissos, a Comissão contrapõe que uma interpretação dos mesmos não pode, em qualquer dos casos, ir ao ponto de incluir as reuniões bilaterais entre a British Sugar e a Tate & Lyle, para as quais os comerciantes não foram convidados. Acresce que as primeiras reuniões tiveram lugar em Junho de 1986, enquanto os compromissos foram propostos pela primeira vez à Comissão em Agosto do mesmo ano.

39.
    Por outro lado, a Comissão alega que, embora as informações respeitantes às intenções futuras da British Sugar em matéria de preços pudessem ter sido doconhecimento dos operadores do mercado em causa, não é menos verdade que os participantes nas reuniões controvertidas receberam informações mais rapidamente e de modo mais fiável do que se tivessem sido obrigados a vigiar, eles mesmos, o mercado. O resultado foi que, quando tiveram de fixar os seus próprios preços, foram influenciados pelos preços anunciados pela British Sugar.

40.
    Além disso, a Comissão alega que uma troca de informações não é uma componente indispensável de uma infracção ao artigo 85.°, n.° 1, do Tratado num caso como o vertente. A Comissão considera que um operador económico deixa de determinar a sua política de forma autónoma se assistir a reuniões regulares no decurso das quais é informado dos preços que o seu principal concorrente procura obter, em circunstâncias em que não pode deixar de ter em conta estas informações.

41.
    No que respeita, especificamente, à Napier Brown, a Comissão sublinha que esta última reconhece que a decisão impugnada fornece provas de uma prática concertada entre a British Sugar e a Tate & Lyle. Ora, quando uma empresa assiste a uma reunião com carácter anticoncorrencial, partilha da responsabilidade do resultado da reunião, salvo se provar ter indicado aos seus concorrentes que participava nessas reuniões numa óptica diferentes da deles (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 10 de Março de 1992, Solvay/Comissão, T-12/89, Colect., p. II-907).

- Apreciação do Tribunal

42.
    Desde logo, deve concluir-se que a British Sugar não contesta ter participado, entre 1986 e 1990, em reuniões bilaterais com a Tate & Lyle e multilaterais com os comerciantes. A Napier Brown reconhece igualmente a sua participação nas reuniões multilaterais. A British Sugar e a Napier Brown reconhecem também que estas reuniões davam lugar a uma comunicação dos preços da British Sugar aos outros participantes, embora contestem a interpretação que a Comissão fez desta comunicação.

43.
    Por conseguinte, há apenas que examinar se tais reuniões tinham um objectivo anticoncorrencial.

44.
    A este respeito, no que toca à natureza do mercado comunitário do açúcar, deve salientar-se que, contrariamente ao que a British Sugar e a Napier Brown afirmam, no acórdão Suiker Unie, embora reconheça que o regime comunitário tende a consagrar uma compartimentação dos mercados nacionais, o Tribunal de Justiça afirma que «não deixa de subsistir um domínio residual, mas efectivo, dependente das regras da concorrência» (n.° 24). Além disso, o Tribunal de Justiça afirma que «'preços' fixados ou previstos pelo regime comunitário não são preços de venda aos negociantes, aos utilizadores ou aos consumidores e, portanto, deixam aos produtores uma certa liberdade para determinar eles próprios o preço a que entendem vender os seus produtos» (n.° 21).

45.
    Por conseguinte, foi a justo título que a Comissão considerou que a concorrência em matéria de preços continua a ser possível entre o preço mínimo oferecido pelo regime comunitário do açúcar e os preços decididos pela British Sugar (considerandos 86 a 88 da decisão impugnada).

46.
    Por outro lado, no que toca à natureza oligopolística do mercado do açúcar na Grã-Bretanha, há que ter em conta a afirmação da Comissão segundo a qual, embora, num mercado oligopolístico, cada operador possa dispor de toda a informação necessária para compreender a posteriori a política comercial dos outros, não é menos verdade que a incerteza quanto às políticas de preços que os outros operadores têm intenção de praticar no futuro constitui, num mercado dessa natureza, o principal incentivo da concorrência (considerando 87 da decisão impugnada).

        

47.
    A British Sugar e a Napier Brown sustentam igualmente que os compromissos assumidos pela British Sugar perante a Comissão obrigavam à realização das reuniões controvertidas, cujo objectivo era perfeitamente legítimo na medida em que visavam corrigir um anterior comportamento anticoncorrencial.

48.
    Em primeiro lugar, refira-se que os compromissos previam:

«(C) A British Sugar admite a necessidade da existência dos comerciantes de açúcar e considera que têm um papel útil a desempenhar no mercado britânico. A British Sugar não tenciona, nem agora nem no futuro, realizar uma política de fixação de preços susceptível de prejudicar, de qualquer forma, a manutenção da presença dos comerciantes no mercado.

A British Sugar compromete-se, face à Comissão, a praticar uma política de preços normal e razoável, que não poderá de modo algum ser comparada a uma política predatória. A British Sugar reconhece as preocupações da Comissão de que uma margem insuficiente entre o seu preço para o açúcar industrial e o seu preço para o açúcar a retalho possa ser considerada como uma prática de fixação de preços não razoável.»

49.
    Ora, deve considerar-se que o teor destes compromissos não justifica, de modo algum, a necessidade de a British Sugar discutir ou até apenas informar regularmente os seus concorrentes das suas intenções em matéria de preços. Além disso, deve ter-se em conta a observação da Comissão segundo a qual estes compromissos poderiam dificilmente justificar encontros bilaterais entre a British Sugar e a Tate & Lyle, uma vez que tais compromissos apenas respeitavam a comportamentos abusivos face aos comerciantes.

50.
    Acresce que, como a Comissão salientou, a British Sugar propôs-lhe pela primeira vez um projecto de compromissos em Agosto de 1986, ao passo que a primeira reunião com a Tate & Lyle datava de 20 de Junho de 1986. Ora, mesmo admitindoque a British Sugar podia prever as consequências da investigação a seu respeito levada a cabo pela Comissão e que tinha conhecimento do pedido de medidas provisórias apresentado pela Napier Brown, a mesma não conseguiu explicar por que motivo, ao apresentar o projecto de compromissos à Comissão, não mencionou que decidira reunir-se com os seus concorrentes para pôr termo à infracção anteriormente recriminada.

51.
    Além disso, se as reuniões se tivessem ficado a dever apenas à necessidade de dar cumprimento aos compromissos, os concorrentes da British Sugar poderiam ter continuado a competir com esta última, fixando os seus preços a um nível inferior aos dela, o que nunca aconteceu.

52.
    Por fim, o argumento segundo o qual a British Sugar não teria tido qualquer interesse em coordenar o seu comportamento com o dos seus concorrentes, uma vez que lhe seria impossível aumentar a sua quota de mercado, não pode ser aceite. Em qualquer dos casos, a British Sugar tinha interesse em escoar a totalidade das suas quotas de produção no mercado britânico, o que poderia ter sido impedido pela Tate & Lyle e pelos comerciantes.

53.
    Por conseguinte, foi a justo título que a Comissão considerou que estas reuniões tinham por objectivo restringir a concorrência através da coordenação das políticas de preços.

54.
    Por outro lado, o facto de apenas um dos participantes nas reuniões controvertidas ter revelado as suas intenções não é suficiente para excluir a existência de um acordo ou de uma prática concertada.

55.
    Com efeito, os critérios de coordenação e de cooperação estabelecidos pela jurisprudência em matéria de acordos e práticas concertadas, longe de exigir a elaboração de um verdadeiro «plano», devem ser entendidos à luz da concepção inerente às disposições do Tratado relativas à concorrência e segundo a qual todos os operadores económicos devem determinar autonomamente a política que pretendem seguir no mercado comum (acórdão Suiker Unie, n.° 173).

56.
    Embora seja exacto que esta exigência de autonomia não exclui o direito dos operadores económicos de se adaptarem inteligentemente ao comportamento conhecido ou previsto dos seus concorrentes, a mesma opõe-se, porém, rigorosamente, a qualquer contacto, directo ou indirecto, entre esses operadores, que tenha por objectivo ou por efeito quer influenciar o comportamento no mercado de um concorrente actual ou potencial quer revelar a esse concorrente o comportamento que se decidiu ou se pretende seguir no mercado (acórdão Suiker Unie, n.° 174).

57.
    No caso vertente, está provado que houve contactos directos entre as três recorrentes, por meio dos quais a British Sugar informou as suas concorrentes, Tate& Lyle e Napier Brown, da conduta que tencionava adoptar no mercado do açúcar na Grã-Bretanha.

58.
    Ora, deve sublinhar-se que, a propósito do processo que deu lugar ao acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 24 de Outubro de 1991, Rhône-Poulenc/Comissão (T-1/89, Colect., p. II-867), onde a recorrente era acusada de ter participado em reuniões no decurso das quais eram trocadas, entre concorrentes, informações acerca dos preços que os mesmos desejavam ver praticar no mercado, o Tribunal de Primeira Instância concluiu que uma empresa, ao participar numa reunião com um objectivo anticoncorrencial, não só prosseguiu a finalidade de eliminar antecipadamente a incerteza relativa ao futuro comportamento dos seus concorrentes como teve também necessariamente em conta, directa ou indirectamente, as informações aí obtidas para determinar a política que tencionava adoptar no mercado (acórdão Rhône-Poulenc/Comissão, já referido, n.os 122 e 123). O Tribunal de Primeira Instância entende que esta conclusão é igualmente aplicável quando, à semelhança do caso vertente, a participação de uma ou várias empresas em reuniões com um objectivo anticoncorrencial se limita apenas à recepção de informações relativas ao comportamento futuro dos seus concorrentes no mercado.

59.
    É certo que a British Sugar e a Napier Brown alegam que as informações sobre os preços previstos pela British Sugar eram do conhecimento dos clientes desta última antes da sua comunicação aos participantes nas reuniões controvertidas e que, por este motivo, nas referidas reuniões, a British Sugar não revelou aos seus concorrentes informações que estes não tivessem já podido obter no mercado.

60.
    Este facto, admitindo que está provado, não teve, nas circunstâncias do caso vertente, qualquer relevância. Com efeito, em primeiro lugar, mesmo pressupondo que a British Sugar tenha comunicado previa, individual e regularmente aos seus clientes os preços que tencionava praticar, tal facto não implica que, nesse momento, esses preços constituíssem um dado objectivo do mercado, imediatamente detectável. Por outro lado, está demonstrado que as reuniões em causa precediam a divulgação no mercado das informações nelas comunicadas. Em segundo lugar, a organização das reuniões controvertidas permitia aos participantes ter conhecimento destas informações de um modo mais simples, rápido e directo do que através do mercado. Em terceiro lugar, como a Comissão concluiu no considerando 72 da decisão impugnada, a participação sistemática das empresas recorrentes nas reuniões em causa permitia-lhes criar um clima de certeza mútua quanto às suas futuras políticas de preços.

61.
    Face ao que precede, o argumento da British Sugar e da Napier Brown segundo o qual as suas reuniões não constituíam nem um acordo nem uma prática concertada nos termos do artigo 85.°, n.° 1, do Tratado não pode ser aceite.

62.
    No que respeita ao argumento da Napier Brown segundo o qual esta era não apenas concorrente mas também cliente dos produtores, deve observar-se que, ao fazer esta afirmação, a mesma pretende sustentar que a sua participação nas reuniões era desprovida de qualquer espírito anticoncorrencial, uma vez que, enquanto cliente, precisava de recolher informações sobre as políticas de preços dos seus fornecedores e, enquanto comerciante, pretendia, na realidade, fazer concorrência feroz aos produtores.

63.
    A este respeito, deve observar-se que a Napier Brown participou em reuniões com um objectivo anticoncorrencial e que, pelo menos, deu a impressão de que a sua participação foi levada a cabo na mesma óptica do que a dos seus concorrentes.

64.
    Nestas condições, é à Napier Brown que compete apresentar indícios de natureza a provar que a sua participação nas reuniões controvertidas era desprovida de qualquer espírito anticoncorrencial, demonstrando que tinha referido aos seus concorrentes que participava nessas reuniões numa óptica diferente da deles (acórdão Solvay/Comissão, já referido, n.° 99).

65.
    Ora, há que sublinhar que os argumentos da Napier Brown baseados na sua qualidade de cliente não constituem indícios de natureza a provar que, da sua parte, houve ausência de espírito anticoncorrencial, na medida em que não apresenta qualquer elemento susceptível de provar que tinha informado os seus concorrentes de que o seu comportamento no mercado seria independente do conteúdo das reuniões.

66.
    Por outro lado, mesmo admitindo que os seus concorrentes tenham sido informados, o mero facto de ter obtido nessas reuniões informações respeitantes aos seus concorrentes, informações estas que um operador independente preserva como segredo comercial, é suficiente para revelar a existência, da sua parte, de um espírito anticoncorrencial (v., neste sentido, acórdão Solvay/Comissão, já referido, n.° 100).

67.
    Com efeito, ao participar numa destas reuniões, cada um dos presentes sabia que, nas reuniões seguintes, o seu concorrente mais importante, chefe de fila da indústria em causa, ia revelar as suas intenções futuras em matéria de preços. Independentemente de qualquer outro motivo para participar nelas, existia pelo menos um, que era eliminar antecipadamente a incerteza relativa ao futuro comportamento dos concorrentes. Além disso, graças à mera participação nas referidas reuniões, cada participante teve necessariamente em conta, directa ou indirectamente, as informações aí obtidas, para determinar a política que tencionava adoptar no mercado.

68.
    À luz do que precede, o primeiro fundamento deve ser rejeitado.

Quanto ao segundo fundamento, baseado na ausência de efeito anticoncorrencial das reuniões controvertidas

- Argumentação das partes

69.
    A British Sugar e a Napier Brown afirmam que a sua participação nas reuniões controvertidas não teve qualquer efeito sobre os preços que praticavam relativamente aos seus clientes. Além disso, o aumento de preços durante o período em causa nunca tinha ultrapassado 1% ao ano. Este dado opõe-se à conclusão segundo a qual esses aumentos de preços eram o resultado de uma prática concertada. Por outro lado, a análise dos preços ao longo do período que se seguiu aos comportamentos recriminados, em Julho de 1990, não revela qualquer alteração substancial. Tal sugere que aquelas reuniões não se repercutiram no nível de preços.

70.
    A Comissão não nega que não existem elementos de prova suficientes para demonstrar um efeito anticoncorrencial dos factos recriminados, pelo que, na decisão impugnada, se concentra apenas no objectivo anticoncorrencial do comportamento dos participantes nas reuniões controvertidas (considerandos 75 e 116 a 118 da decisão impugnada). A jurisprudência ilustra claramente que um acordo ou uma prática concertada infringem igualmente o artigo 85.°, n.° 1, do Tratado se tiverem por objectivo (e não necessariamente por efeito) restringir a concorrência.

- Apreciação do Tribunal

71.
    O artigo 85.°, n.° 1, do Tratado proíbe todos os conluios entre empresas que tenham por objectivo ou por efeito restringir a concorrência.

72.
    Resulta da jurisprudência que, para efeitos da aplicação do artigo 85.°, n.° 1, do Tratado, a consideração dos efeitos concretos dos acordos é supérflua, desde que se conclua, como no caso vertente, que estes têm por objectivo impedir, restringir ou falsear a concorrência no interior do mercado comum (acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 6 de Abril de 1995, Böel/Comissão, T-142/89, Colect., p. II-867, n.° 89, e ILRO/Comissão, T-152/89, Colect., p. II-1197, n.° 32).

73.
    Uma vez, portanto, que a natureza anticoncorrencial do objectivo das reuniões ficou demonstrada, já não é necessário verificar se o acordo ou a prática concertada tiveram efeitos sobre o mercado.

74.
    Por conseguinte, o argumento da British Sugar e da Napier Brown não pode ser aceite.

Quanto ao terceiro fundamento, baseado numa apreciação errada da incidência das reuniões controvertidas no comércio entre Estados-Membros

- Argumentação das partes

75.
    A British Sugar alega que os comportamentos recriminados pela Comissão não tiveram qualquer efeito sensível sobre o comércio entre Estados-Membros. Em particular, afirma que a decisão impugnada não contém qualquer crítica contra os participantes nas reuniões controvertidas relativa a um conluio em matéria de importações ou exportações. Aliás, a mesma não teria qualquer motivo nem interesse em travar as importações enquanto pudesse escoar as suas quotas A e B na Grã-Bretanha. Pelo contrário, conseguira afastar a ameaça que as importações representavam para a realização do seu objectivo legítimo, através de uma política coerente que consistiu em fixar os preços na Grã-Bretanha a um nível tal que a rentabilidade das vendas de açúcar neste Estado-Membro não fizesse aumentar as importações.

76.
    Segundo a British Sugar, de forma mais significativa, o regime comunitário do açúcar cria incentivos à exportação não para os outros Estados-Membros, mas sim para o mercado mundial, através do sistema de restituição à exportação. Daqui resulta que a interpenetração do mercado do açúcar da União Europeia não constitui um dos objectivos do regime do açúcar previsto pela política agrícola comum. Como o Tribunal de Justiça observou no acórdão Suiker Unie, o regime do açúcar destina-se a compartimentar os mercados nacionais.

77.
    Por sua vez, a Comissão afirma que, na decisão impugnada, demonstra que o acordo e/ou a prática concertada eram susceptíveis de afectar as trocas comerciais entre Estados-Membros, na acepção do artigo 85.° do Tratado. Por outro lado, não é necessário que o comportamento recriminado tenha efectivamente afectado o comércio entre Estados-Membros de forma sensível. Basta demonstrar que esse comportamento é de natureza a produzir tal efeito. No caso vertente, é evidente que o mercado é permeável às importações na medida em que a própria British Sugar pôde escolher uma política de preços destinada a impedi-las.

- Apreciação do Tribunal

78.
    Segundo jurisprudência constante, para que um acordo entre empresas, ou uma prática concertada, seja susceptível de afectar o comércio entre Estados-Membros, deve, com base num conjunto de elementos objectivos de direito ou de facto, permitir considerar, com um grau de probabilidade suficiente, que pode exercer uma influência, directa ou indirecta, actual ou potencial, nas correntes de trocas comerciais entre Estados-Membros, de uma forma susceptível de prejudicar a realização dos objectivos de um mercado único entre os Estados-Membros (acórdãos do Tribunal de Justiça de 9 de Julho de 1969, Völk, 5/69, Colect. 1969-1970, p. 95, n.° 5; de 29 de Outubro de 1980, Van Landewick e o./Comissão, 209/78 a 215/78 e 218/78, Recueil, p. 3125, n.° 171; e de 31 de Março de 1993, Ahlström Osakeytihö, C-89/85, C-104/85, C-114/85, C-116/85, C-117/85 e C-125/85 a C-129/85, Colect., p. I-1307, n.° 143; acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 22 de Outubro de 1997, SCK et FNK/Comissão, T-213/95 e T-18/96, Colect., p. II-1739, n.° 175; e de 8 de Outubro de 1996, Compagnie maritime belge transports e o./Comissão, T-24/93 a T-26/93 e T-28/93, Colect., p. II-1201, n.° 201).Deste modo, não é necessário que o comportamento recriminado tenha, de facto, afectado o comércio entre Estados-Membros de modo sensível, bastando demonstrar que o mesmo seja susceptível de produzir esse efeito (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 21 de Fevereiro de 1995, SPO e o./Comissão, T-29/92, Colect., p. II-289, n.° 235).

79.
    Além disso, o facto de um acordo ou de uma prática concertada terem apenas por objectivo a comercialização de produtos num único Estado-Membro não é suficiente para excluir a possibilidade de o comércio entre Estados-Membros poder ser afectado. Uma vez que se trata de um mercado permeável às importações, os membros de um acordo de preços nacional só podem conservar a sua quota de mercado se se protegerem contra a concorrência estrangeira (acórdão do Tribunal de Justiça de 11 de Julho de 1989, Belasco e o./Comissão, 246/86, Colect., p. 2117, n.os 33 e 34).

80.
    No caso vertente, não é contestado que o mercado do açúcar na Grã-Bretanha é permeável às importações, e isso não obstante o facto de a regulamentação comunitária do mercado do açúcar e os custos de transporte contribuírem para as dificultar.

81.
    Por outro lado, resulta da decisão impugnada e do conjunto do dossier que uma das maiores preocupações da British Sugar e da Tate & Lyle era limitar o nível das importações na medida em que estas não lhes permitiam escoar a sua produção no interior do mercado nacional (considerandos 16 e 17 da decisão impugnada). Com efeito, por um lado, foi a própria British Sugar a declarar ter adoptado conscientemente, durante o período de referência, uma política de preços destinada a impedir as importações, uma vez que a sua prioridade era escoar a totalidade das suas quotas A e B no mercado da Grã-Bretanha (petição, n.os 257 e 258). Por outro lado, resulta do considerando 17 da decisão impugnada que a Tate & Lyle tinha levado activamente a cabo, durante o período de referência, uma política destinada a reduzir o risco de um aumento do nível das importações.

82.
    Por conseguinte, nestas circunstâncias, não foi erradamente que a Comissão entendeu que o acordo em causa, que cobria a quase totalidade do território nacional e tinha sido posto em prática por empresas que representavam cerca de 90% do mercado pertinente, era susceptível de afectar o comércio entre Estados-Membros.

83.
    A British Sugar alega que o efeito potencial sobre as correntes de trocas comerciais entre Estados-Membros não era sensível.

84.
    A este respeito, a jurisprudência reconheceu que a Comissão não tem a obrigação de demonstrar que um acordo ou uma prática concertada tem um efeito sensível sobre as trocas comerciais entre Estados-Membros. Efectivamente, o artigo 85.°, n.° 1, do Tratado exige apenas que os acordos e as práticas concertadas restritivosda concorrência sejam susceptíveis de afectar o comércio entre Estados-Membros (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 17 de Dezembro de 1991, Hercules Chemicals/Comissão, T-7/89, Colect., p. II-1711, n.° 279).

85.
    Face ao que precede, foi, portanto, a justo título que a Comissão considerou que o acordo recriminado era susceptível de afectar as trocas comerciais intracomunitárias.

86.
    Por conseguinte, o terceiro fundamento deve ser rejeitado na íntegra.

Quanto aos fundamentos apresentados em apoio do pedido subsidiário de anulação nos processos T-204/98 e T-207/98 relativo ao montante da coima

Quanto ao fundamento relativo à proporcionalidade das coimas e à tomada em consideração da estrutura do mercado

- Argumentação das partes

87.
    A British Sugar e a Napier Brown afirmam que, ao fixar a coima, a Comissão não respeitou nem o princípio da proporcionalidade, nem teve em conta a gravidade e a duração das alegadas infracções em matéria de concorrência, violando, desta forma, as orientações. A Comissão violou igualmente o direito comunitário ao não tomar em consideração o contexto legislativo relativo ao regime comunitário do açúcar e o contexto económico que enquadra cada uma das alegadas infracções.

88.
    No que respeita à violação do princípio da proporcionalidade, a British Sugar e a Napier Brown observam que, segundo as orientações, uma infracção grave se caracteriza por restrições à concorrência aplicadas de forma rigorosa e cujo impacto no mercado é mais lato do que nos casos de infracções pouco graves. Ora, no caso vertente, a Comissão limitou-se a descrever o comportamento dos participantes nas reuniões controvertidas, que consistiu em estes se reunirem periodicamente, mas não identificou um acordo destinado a restringir a concorrência e, ainda menos, restrições da concorrência aplicadas de forma rigorosa. Além disso, estas duas recorrentes sublinham que, como resulta do considerando 193 da decisão impugnada, a infracção recriminada não teve qualquer efeito real ou impacto sobre a concorrência no mercado pertinente. O único elemento capaz de fazer com que os comportamentos recriminados sejam classificados na categoria de infracções graves é o facto de se tratar de restrições horizontais, em vez de verticais. A este respeito, estas duas recorrentes salientam, por um lado, que os comerciantes participavam nas reuniões enquanto clientes dos produtores de açúcar e, por outro, que, embora seja verdade que as orientações declaram que as infracções «pouco graves» são, normalmente, restrições verticais, em princípio, uma restrição horizontal que não teve impacto no mercado e estava limitada a uma parte de um Estado-Membro deve ser classificada como infracção pouco grave.

89.
    A British Sugar contesta igualmente a majoração do montante da coima por a duração da infracção ter sido qualificada de média. Em particular, uma majoração de 40% é excessiva se se considerar que, na ausência de efeitos sobre o mercado, a duração da infracção não afectou o alcance do prejuízo causado aos objectivos comunitários prosseguidos pelas regras da concorrência do Tratado.

90.
    Por fim, a British Sugar contesta a majoração do montante de base da coima em razão da aplicação de circunstâncias agravantes. Em seu entender, a noção de circunstâncias agravantes introduzida pelas orientações não está em conformidade com o Regulamento n.° 17 do Conselho, de 6 de Fevereiro de 1962, Primeiro Regulamento de execução dos artigos 85.° e 86.° do Tratado (JO 1962, 13, p. 204; EE 08 F1 p. 22), nos termos do qual este tipo de circunstâncias deve ser avaliado aquando da apreciação da gravidade da infracção.

91.
    A Napier Brown alega que, ao aplicar coimas, a Comissão devia ter em consideração as circunstâncias específicas de cada empresa em causa. A este respeito, sublinha que a própria Comissão declara expressamente, no considerando 198 da decisão impugnada, que a influência da Napier Brown e da James Budgett Sugars no mercado em causa e, portanto, a possibilidade que tinham de nele exercer qualquer poder, era limitada.

92.
    No que toca à avaliação do mercado, a British Sugar e a Napier Brown afirmam que o Tribunal de Justiça reconheceu no acórdão Suiker Unie que a Comissão não tinha tido suficientemente em consideração as limitações à concorrência causadas pela organização comum do mercado do açúcar (n.os 612 a 621). Além disso, o Tribunal de Justiça considerou que, em virtude da muito limitada autonomia deixada aos operadores económicos pelo regime comunitário do açúcar, os comportamentos dos referidos operadores não deviam ser julgados com a mesma severidade. Segundo a British Sugar e a Napier Brown, o acórdão Suiker Unie sugere que a Comissão devia avaliar os efeitos reais das condutas anticoncorrenciais à luz do contexto legislativo e económico. O mercado do açúcar na Grã-Bretanha é de uma natureza tal que qualquer efeito sobre o mesmo só pode ser limitado. Este factor deve conduzir a uma redução, e não a um agravamento, da sanção das condutas recriminadas, pois limita os efeitos destas sobre o mercado e, em particular, junto dos clientes e dos consumidores.

93.
    A Comissão contrapõe que o Regulamento n.° 17 a autoriza a aplicar coimas até 1 milhão de ecus ou até 10% do volume de negócios da empresa em causa, em função da gravidade e da duração da violação. Na decisão impugnada, tem em conta estes dois critérios para determinar uma coima de base, que majora ou reduz segundo as circunstâncias agravantes ou atenuantes.

94.
    Afirma igualmente que as orientações não têm ligação directa com a decisão impugnada, que nem sequer as menciona. Em qualquer dos casos, o texto das orientações precisa claramente que estas últimas se destinam a fornecer indicaçõesacerca da abordagem seguida pela Comissão para determinar o montante das coimas, mas que não fornecem um método automático para calcular a coima a aplicar num caso concreto. Os exemplos dados pelas orientações são meramente indicativos e estão precedidos das expressões «pode tratar-se», «trata-se frequentemente» ou «trata-se essencialmente».

95.
    Os exemplos de infracções «muito graves» incluem «restrições horizontais de tipo 'cartel' de preços e quotas de repartição dos mercados», que caem certamente na alçada do artigo 85.°, n.° 1, do Tratado. No caso vertente, as infracções são horizontais, pois os comerciantes eram igualmente concorrentes, e não apenas clientes, da British Sugar e a relação entre esta e a Tate & Lyle é só do tipo horizontal.

96.
    Além disso, a Comissão explica que teve em conta a ausência de efeito sobre o mercado, quando qualificou as infracções de «graves». Por outro lado, a referência, nas orientações, à não aplicação dos acordos ou práticas ilícitas tem por finalidade cobrir as situações em que uma parte se retira de um cartel, e não o caso em que os comportamentos recriminados não tiveram efeitos sobre o mercado.

97.
    Por último, segundo a Comissão, no processo que deu lugar ao acórdão Suiker Unie, a distinção entre objectivo e efeito nos termos do artigo 85.°, n.° 1, do Tratado não entrava em linha de conta. Isso explica o motivo pelo qual, neste acórdão, o Tribunal de Justiça mencionou os efeitos junto dos utilizadores e dos consumidores. No caso vertente, em contrapartida, a decisão da Comissão não se baseia nos efeitos sobre o mercado, limitando-se a demonstrar o objectivo anticoncorrencial do acordo.

- Apreciação do Tribunal

98.
    Nos termos do artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento n.° 17, a Comissão pode aplicar coimas de 1 000 euros, no mínimo, e de 1 milhão de euros, no máximo, podendo este último montante ser elevado até 10% do volume de negócios realizado no decurso do exercício social precedente por cada uma das empresas que participaram na infracção. Para determinar o montante da coima, dentro destes parâmetros, a referida disposição estabelece que seja tida em consideração a gravidade e a duração da infracção.

99.
    É jurisprudência constante que o montante da coima deve ser graduado em função das circunstâncias da violação e da gravidade da infracção e que a apreciação da gravidade da infracção para efeitos da fixação do montante da coima deve ser efectuada tendo em conta, nomeadamente, a natureza das restrições à concorrência (v., nomeadamente, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 14 de Julho de 1994, Parker Pen/Comissão, T-77/92, Colect., p. II-549, n.° 92).

100.
    Além disso, deve recordar-se que o poder da Comissão de aplicar coimas às empresas que, deliberadamente ou por negligência, cometem uma infracção àsdisposições do artigo 85.°, n.° 1, ou do artigo 86.° do Tratado constitui um dos meios que lhe foram atribuídos com vista a permitir-lhe cumprir a missão de vigilância que o direito comunitário lhe confere. Esta missão compreende, certamente, a tarefa de instruir e reprimir infracções individuais, mas inclui igualmente o dever de prosseguir uma política geral destinada a aplicar, em matéria de concorrência, os princípios fixados pelo Tratado e a orientar o comportamento das empresas nesse sentido (acórdão do Tribunal de Justiça de 7 de Junho de 1983, Musique Diffusion française e o./Comissão, 100/80 a 103/80, Recueil, p. 1825, n.° 105).

101.
    Daqui decorre que, para apreciar a gravidade de uma infracção com vista a determinar o montante da coima, a Comissão deve ter em consideração não apenas as circunstâncias particulares do caso concreto mas igualmente o contexto no qual a infracção se situa e zelar pelo carácter dissuasivo da sua acção, sobretudo para os tipos de infracções particularmente nocivas à realização dos objectivos da Comunidade (acórdão Musique Diffusion française e o./Comissão, já referido, n.° 106).

102.
    Ora, no que respeita à proporcionalidade das coimas aplicadas, as recorrentes nos processos T-204/98 e T-207/98 afirmam, no essencial, que o carácter desproporcionado das coimas é a consequência da qualificação da infracção de «grave». Com efeito, a sua argumentação pode ser resumida no sentido de que, à luz das orientações, o seu acordo, embora do tipo horizontal, deveria ser qualificado de «pouco grave», dada a ausência de efeitos anticoncorrenciais substanciais sobre o mercado.

103.
    A este respeito, basta concluir, por um lado, que o acordo recriminado deve ser considerado horizontal, na medida em que os comerciantes participaram nele enquanto concorrentes dos produtores, e, por outro, que o mesmo respeitava à fixação de preços. Ora, um acordo desta natureza sempre foi considerado particularmente nocivo e é qualificado de «muito grave» nas orientações. Além disso, como a Comissão sublinha nos seus articulados, a qualificação do acordo em questão de «grave», dado o seu limitado impacto no mercado, representa já uma qualificação atenuada relativamente aos critérios geralmente aplicados na fixação das coimas em caso de cartel de preços, critérios esses que deveriam tê-la conduzido a qualificar o acordo de muito grave.

104.
    No que respeita à crítica suscitada pela British Sugar acerca da proporcionalidade da majoração da coima em função da duração da infracção, deve recordar-se que o artigo 15.°, n.° 2, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 17 prevê que, «para determinar o montante da multa, deve tomar-se em consideração, além da gravidade da infracção, a duração da mesma». A duração da infracção constitui, por conseguinte, nos termos desta disposição, um dos elementos a considerar para fixar o montante da sanção pecuniária a aplicar às empresas que cometeram infracções às regras da concorrência (acórdão do Tribunal de Primeira Instânciade 7 de Julho de 1994, Dunlop Slazenger/Comissão, T-43/92, Colect., p. II-441, n.° 154). Foi, portanto, a justo título que a Comissão procedeu, na fixação das coimas aplicadas, à apreciação da duração da infracção.

105.
    Nesta apreciação, a Comissão concluiu estar em presença de uma infracção de duração média e, consequentemente, aplicou uma majoração de cerca de 40% do montante apurado em função da gravidade. A este respeito, deve recordar-se que é jurisprudência constante que, ao fixar o montante de cada coima, a Comissão dispõe de poder de apreciação e não pode ser obrigada a aplicar, para esse efeito, uma fórmula matemática precisa (acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 6 de Abril de 1995, Martinelli/Comissão, T-150/89, Colect., p. II-1165, n.° 59, e de 14 de Maio de 1998, Mo och Domsjö/Comissão, T-352/94, Colect., p. II-1989, n.° 268, confirmado em recurso da decisão do Tribunal de Primeira Instância pelo acórdão do Tribunal de Justiça de 16 de Novembro de 2000, Mo och Domsjö/Comissão, C-283/98 P, Colect., p. I-9855, n.° 45).

106.
    Incumbe, porém, ao juiz comunitário controlar se o montante da coima aplicada é proporcionado relativamente à duração e aos outros elementos de natureza a influir na apreciação da gravidade da infracção (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 21 de Outubro de 1997, Deutsche Bahn/Comissão, T-229/94, Colect., p. II-1689, n.° 127). A este respeito, é impossível partilhar da opinião da British Sugar, segundo a qual a Comissão poderia proceder à majoração de uma coima em função da duração da infracção apenas se, e na medida em que, exista uma relação directa entre a duração e um prejuízo acrescido causado aos objectivos comunitários visados pelas regras da concorrência, relação esta que seria excluída na ausência de efeitos da infracção sobre o mercado. Pelo contrário, deve considerar-se que o impacto da duração da infracção no cálculo do montante da coima deve ser igualmente apreciado em função dos outros elementos que caracterizam a infracção em questão (v., neste sentido, acórdão Dunlop Slazenger/Comissão, já referido, n.° 178). No caso vertente, há que considerar que a majoração de 40% aplicada pela Comissão ao montante calculado em função da gravidade da infracção não tem carácter desproporcionado.

107.
    O argumento invocado pela British Sugar, segundo o qual a noção de circunstâncias agravantes que figura nas orientações é contrária ao artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento n.° 17, carece igualmente de qualquer fundamento.

108.
    Em primeiro lugar, deve proceder-se à análise das disposições pertinentes das orientações. O ponto 1 A enuncia que «a avaliação do grau de gravidade da infracção deve ter em consideração o carácter da própria infracção, o seu impacto concreto no mercado quando este for quantificável e a dimensão do mercado geográfico de referência». O ponto 2, sob o título de circunstâncias agravantes, estabelece uma lista não exaustiva de circunstâncias que podem levar a um aumento do montante de base calculado em função da gravidade e da duração da infracção, como a reincidência, a recusa de cooperação, o papel de instigador dainfracção, a prática de medidas de retaliação e a necessidade de ter em conta ganhos ilícitos obtidos graças à infracção.

109.
    Ora, resulta das disposições acima citadas que a apreciação da gravidade da infracção é efectuada em duas etapas. Numa primeira fase, a gravidade é apreciada apenas em função dos elementos próprios da infracção, como a sua natureza e o seu impacto no mercado e, numa segunda fase, a apreciação da gravidade é articulada com as circunstâncias específicas da empresa em causa, o que, por outro lado, leva a que a Comissão considere não só eventuais circunstâncias agravantes mas também, sendo caso disso, circunstâncias atenuantes (v. ponto 3 das orientações). Este procedimento, longe de contrariar a letra e o espírito do artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento n.° 17, permite, no quadro, nomeadamente, de infracções que impliquem várias empresas, ter em conta, na apreciação da gravidade da infracção, os diferentes papéis desempenhados por cada empresa e a sua atitude perante a Comissão no decurso do processo.

110.
    Em segundo lugar, no que respeita à proporcionalidade da majoração aplicada à coima infligida à British Sugar em função de circunstâncias agravantes, deve concluir-se que, tendo em conta as circunstâncias invocadas pela Comissão nos n.os 207 a 209 da decisão impugnada, uma majoração de 75% não deve ser considerada desproporcionada.

111.
    Por fim, no que respeita às observações da recorrente no processo T-207/98, segundo as quais a Comissão não distinguiu suficientemente o papel dos comerciantes do papel dos produtores, deve observar-se que, no considerando 195 da decisão impugnada, a Comissão reconhece claramente que deve ser levada a cabo uma distinção nítida entre as contribuições de cada participante na infracção. Esta afirmação reflecte-se no considerando 198 da decisão impugnada, onde a Comissão fixa a coima dos comerciantes de forma a ter em conta o papel limitado destes.

112.
    O fundamento invocado pela British Sugar e pela Tate & Lyle no que respeita ao carácter alegadamente desproporcionado das coimas deve, por conseguinte, ser rejeitado.

113.
    No que toca ao fundamento relativo à não tomada em consideração da estrutura do mercado pertinente, deve salientar-se que o Tribunal de Justiça, no acórdão Suiker Unie, considera que o contexto regulamentar e económico no mercado do açúcar é de natureza a justificar um tratamento menos severo das práticas potencialmente anticoncorrenciais. Contudo, a Comissão sublinhou, correctamente, que os acordos objecto do acórdão Suiker Unie não respeitam a uma alta de preços, mas à repartição dos mercados segundo determinadas quotas. Além disso, o próprio Tribunal de Justiça sublinhou, no acórdão Suiker Unie, que, em caso de acordo ou prática concertada sobre os preços, as suas conclusões teriam sido diferentes. A este respeito, acrescenta que «o prejuízo que o comportamentoarguido possa ter causado aos utilizadores ou aos consumidores foi limitado, pois a própria Comissão não imputou aos interessados um aumento concertado ou abusivo dos preços praticados e os entraves colocados à livre escolha de fornecedores devido à partilha dos mercados, não deixando de merecer censura, tem um peso menor quando se trata de um produto fundamentalmente homogéneo como o açúcar» (n.° 621). Uma vez que, no presente caso concreto, se trata justamente de um acordo ou prática concertada sobre os preços, foi a justo título que a Comissão se afastou das conclusões do acórdão Suiker Unie.

114.
    Por conseguinte, há que concluir igualmente que a acusação baseada na não tomada em consideração da estrutura do mercado que envolve as infracções deve ser rejeitada.

115.
    O fundamento deve, portanto, ser rejeitado na íntegra.

Quanto ao fundamento relativo à alegada violação do princípio da igualdade de tratamento

- Argumentação das partes

116.
    A British Sugar considera que a coima de 18 milhões de ecus que lhe foi aplicada se deve mais à sua posição no mercado do que à gravidade da violação. O montante desta coima aproxima-se do limite previsto para as infracções em matéria de concorrência. Entretanto, a Tate & Lyle, apesar de deter no mercado uma posição idêntica à da British Sugar, viu ser-lhe aplicada uma coima de apenas 10 milhões de ecus.

117.
    A Comissão contrapõe que a British Sugar era o chefe de fila na coordenação dos preços e que, sem ela, não teria havido acordo ou prática concertada.

- Apreciação do Tribunal

118.
    É jurisprudência constante que uma violação do princípio da igualdade de tratamento pressupõe que situações comparáveis tenham sido tratadas de maneira diferente (v., nomeadamente, acórdão Hercules Chemicals/Comissão, já referido, n.° 295).

119.
    Ora, no caso vertente, impõe-se concluir que as diferenças entre a situação da British Sugar e a da Tate & Lyle, sublinhadas pela Comissão, são suficientes para justificar uma diferença de tratamento entre estas duas empresas.

120.
    Está provado que as reuniões controvertidas tiveram início e foram organizadas por iniciativa da British Sugar e está igualmente provado que, durante as referidas reuniões, esta última informava os seus concorrentes da sua política de preços. Por outro lado, a British Sugar não apresentou qualquer elemento que contrarie as provas produzidas pela Comissão para demonstrar o papel activo e principal quedesempenhou no acordo ou prática concertada, tendo-se limitado a contestar a respectiva natureza anticoncorrencial.

121.
    Daqui decorre que o fundamento deve ser rejeitado.

Quanto ao fundamento relativo à alegada falta de intenção aquando da prática dos actos recriminados

- Argumentação das partes

122.
    A British Sugar afirma que, na fixação da coima, a Comissão não teve em consideração a ausência de intenção aquando da prática dos actos recriminados.

123.
    Em particular, ao tentar respeitar os compromissos assumidos e assegurar que as suas relações com os comerciantes fossem conformes com o artigo 86.° do Tratado, a British Sugar tinha, na pior das hipóteses e por inadvertência, cometido uma infracção ao artigo 85.°, n.° 1, do Tratado.

124.
    Os contactos diários entre comprador e vendedor, impostos pelos compromissos, tinham conduzido, forçosamente, a contactos regulares a nível dos responsáveis das diferentes empresas. Os comerciantes eram compradores importantes de açúcar para revenda. Por consequência, tinha sido impossível não terem discutido preços.

125.
    Não existe qualquer prova de que as empresas em causa tenham participado nas reuniões com a consciência de estarem a violar o artigo 85.° do Tratado ou a gerar quaisquer problemas em matéria de concorrência. Os participantes nas reuniões controvertidas não fizeram segredo das mesmas e está provado que nelas foram discutidos outros assuntos.

126.
    A Comissão sustenta que, se o Tribunal concluir que as reuniões tinham por objectivo violar a concorrência, deve também concluir que essas reuniões não foram exclusivamente concebidas para aplicar os compromissos. As orientações estabelecem que a Comissão pode ter em conta o facto de uma empresa de grande dimensão dispor dos conhecimentos jurídicos e económicos que lhe permitem apreciar o carácter de infracção dos seus comportamentos e as consequências que deles decorrem do ponto de vista do direito da concorrência.

- Apreciação do Tribunal

127.
    É jurisprudência constante que, para que uma infracção às regras de concorrência do Tratado possa ser considerada como tendo sido cometida deliberadamente, não é necessário que a empresa tenha tido consciência de infringir essas regras, bastando que não tenha podido ignorar que a sua conduta tinha por objectivo restringir a concorrência (acórdãos do Tribunal de Justiça de 8 de Novembro de 1983, IAZ e o./Comissão, 96/82 a 102/82, 104/82, 105/82, 108/82, 110/82, Recueil,p. 3369, n.° 45, e Belasco e o./Comissão, já referido, n.° 41; acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 6 de Abril de 1995, Tréfileurope/Comissão, T-141/89, Colect., p. II-791, n.° 176, e de 14 de Maio de 1998, Gruber + Weber/Comissão, T-310/94, Colect., p. II-1043, n.° 259).

128.
    No caso vertente, atendendo a que a British Sugar é uma empresa de grande dimensão que dispõe dos conhecimentos jurídicos e económicos necessários para conhecer o carácter de infracção da sua conduta e as consequências que dela decorrem do ponto de vista do direito da concorrência, e a que acabara de ser objecto de uma investigação por parte da Comissão por violação do artigo 86.° do Tratado, deve considerar-se que a mesma não pode alegar ter agido por negligência e sem propósito deliberado.

129.
    O fundamento deve, por conseguinte, ser rejeitado.

Quanto ao fundamento relativo à tomada em consideração do efeito dissuasivo das coimas

- Argumentação das partes

130.
    A British Sugar afirma que não havia necessidade de aumentar o nível da sua coima, para fins dissuasivos. A partir de 1991, tornou-se uma filial, controlada a 100%, da Associated British Foods plc (a seguir «ABF»). Desde então, os seus compromissos foram revistos e reforçados. A British Sugar submete relatórios anuais à Comissão e o respeito dos seus compromissos é da responsabilidade pessoal do director jurídico da ABF, que é um dos membros do seu conselho de administração.

131.
    Por outro lado, a decisão impugnada respeita apenas a factos verificados na Grã-Bretanha. No que respeita ao açúcar industrial, as autoridades nacionais decidiram, em 1991, não tomar qualquer medida com base no Restrictive Trade Practices Act 1976. No que toca ao açúcar a retalho, a Restrictives Practices Court declarou que o memorando redigido conjuntamente pela British Sugar e pela Tate & Lyle, enviado ao Office of Fair Trading em 15 de Abril de 1991, não devia ser rectificado. Consequentemente, face às circunstâncias, foram emitidas injunções contra a British Sugar e a Tate & Lyle e qualquer violação destas injunções poderia conduzir à aplicação de coimas e, até, a medidas de prisão para os particulares seus responsáveis. Era, portanto, inútil aumentar a coima da British Sugar para reforçar o seu efeito dissuasivo.

132.
    A Comissão contrapõe que uma coima simbólica não teria qualquer efeito dissuasivo junto de empresas com a intenção de repetir as mesmas acções. Uma vez que, no seu recurso para o Tribunal de Primeira Instância, a British Sugar insiste no facto de que o seu comportamento era legítimo e necessário para respeitar as regras da concorrência, não se pode excluir a hipótese de esta empresa pretender prosseguir as mesmas acções no futuro.

- Apreciação do Tribunal

133.
    Como já foi recordado, o poder da Comissão de aplicar coimas às empresas que, deliberadamente ou por negligência, cometem uma infracção às disposições do artigo 85.°, n.° 1, ou do artigo 86.° do Tratado constitui um dos meios que lhe foram atribuídos com vista a permitir-lhe cumprir a missão de vigilância que o direito comunitário lhe confere. Esta missão compreende, certamente, a tarefa de instruir e reprimir infracções individuais, mas inclui igualmente o dever de prosseguir uma política geral destinada a aplicar, em matéria de concorrência, os princípios fixados pelo Tratado e a orientar o comportamento das empresas nesse sentido (acórdão Musique Diffusion française e o./Comissão, já referido, n.° 105).

134.
    Daqui decorre que a Comissão tem o poder de decidir do nível das coimas, com vista a reforçar o seu efeito dissuasivo, quando infracções de determinado tipo são ainda relativamente frequentes, não obstante a sua ilegalidade já ter ficado demonstrada desde o início da política comunitária em matéria de concorrência, em razão do benefício que algumas das empresas interessadas podem retirar delas (acórdão Musique Diffusion française e o./Comissão, já referido, n.° 108).

135.
    No caso vertente, onde está em causa um tipo de infracção clássica ao direito da concorrência cuja ilegalidade foi afirmada pela Comissão em diversas ocasiões e desde as suas primeiras intervenções na matéria, é lícito que a Comissão considerasse necessário fixar o montante da coima tendo em atenção o efeito dissuasivo da mesma.

136.
    O fundamento deve, por conseguinte, ser rejeitado.

Quanto ao fundamento relativo à cooperação durante o processo administrativo

- Argumentação das partes

137.
    A British Sugar alega ter cooperado totalmente com a Comissão desde 1990 e afirma que as orientações estabelecem que a cooperação é uma circunstância atenuante. Tinha empregue uma grande quantidade dos seus recursos para responder a acusações da Comissão que, seguidamente, esta última retirou.

138.
    A Comissão contrapõe que a cooperação da British Sugar não foi além do que se espera de uma empresa que é parte de um processo de aplicação das regras da concorrência (considerando 214 da decisão impugnada).

- Apreciação do Tribunal

139.
    Este fundamento deve igualmente ser rejeitado. Resulta do dossier e da leitura da decisão impugnada que a British Sugar não fez mais do que fornecer informações que era obrigada a dar à Comissão ao longo de uma investigação em matéria deconcorrência. Por outro lado, no considerando 214 da decisão impugnada, afirma-se que as coimas aplicadas neste processo foram reduzidas em 10% pelo facto de as interessadas terem admitido alguns dos factos recriminados.

140.
    O fundamento deve, por conseguinte, ser rejeitado.

Quanto ao fundamento baseado no alegado prejuízo decorrente do atraso incorrido pela Comissão na adopção da decisão

- Argumentação das partes

141.
    A British Sugar e a Napier Brown alegam que o facto de a decisão impugnada ter sido adoptada oito anos após a descoberta da infracção teve como consequência que as mesmas sofreram a mudança de política da Comissão em matéria de concorrência e conduziu esta última a aumentar o nível das coimas aplicadas às empresas.

142.
    A Comissão contrapõe, por um lado, que as recorrentes não têm razão quando afirmam que o nível geral das coimas aumentou após adopção das orientações e, por outro, que, independentemente destas, está habilitada a majorar o montante das coimas conforme os casos, pelo que não se pode falar de confiança legítima na matéria.

- Apreciação do Tribunal

143.
    Segundo jurisprudência constante, o facto de a Comissão ter aplicado, no passado, coimas de determinado nível a certos tipos de infracções não pode privá-la da possibilidade de elevar esse nível dentro dos limites indicados pelo Regulamento n.° 17, se tal for necessário para garantir a prossecução da política comunitária da concorrência. A aplicação eficaz das regras comunitárias da concorrência exige, pelo contrário, que a Comissão possa, em qualquer momento, adaptar o nível das coimas às necessidades desta política (acórdão Musique Diffusion française e o./Comissão, já referido, n.° 109, e acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 10 de Março de 1992, Montedipe/Comissão, T-14/89, Colect., p. 1155, n.° 346).

144.
    Por outro lado, na sua apreciação do nível geral das coimas, a Comissão tem o direito de tomar em conta o facto de as infracções manifestas às regras comunitárias da concorrência serem ainda relativamente frequentes e, portanto, é legítimo que aumente o nível das coimas a fim de reforçar o seu efeito dissuasivo (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 14 de Maio de 1998, Stora Kopparbergs Bergslags/Comissão, T-354/94, Colect., p. II-2111, n.° 167).

145.
    Por último, quando fixa o nível geral das coimas, a Comissão pode, nomeadamente, ter em conta a longa duração e o carácter manifesto de uma infracção ao artigo 85.°, n.° 1, do Tratado, cometida apesar da advertência que a prática decisóriaanterior da Comissão deveria ter constituído (acórdão Stora Kopparbergs Bergslags/Comissão, já referido, n.° 169).

146.
    Daqui decorre que, tal como a Comissão alega, não pode existir, em matéria de coimas, uma confiança legítima das empresas sujeitas a um processo de infracção às regras da concorrência na aplicação, por parte daquela, de um certo nível de coima, desde que o limite enunciado no artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento n.° 17 seja respeitado.

147.
    O fundamento deve, por conseguinte, ser rejeitado.

148.
    À luz do que precede, o pedido da Napier Brown destinado a obter a condenação da Comissão no reembolso, a seu favor, das despesas respeitantes à constituição de uma garantia para o pagamento da coima deve igualmente ser rejeitado.

149.
    Face ao conjunto das considerações acima expostas, os recursos nos processos T-204/98 e T-207/98 devem ser julgados improcedentes.

Quanto ao pedido de anulação no processo T-202/98

Quanto ao primeiro fundamento do processo T-202/98, baseado na aplicação errada da comunicação sobre a cooperação

- Argumentação das partes

150.
    A Tate & Lyle afirma ter cooperado plenamente com a Comissão ao longo do processo. Segundo a comunicação sobre a cooperação, uma cooperação permanente e total permite reduzir a coima entre 75% e 100%, ao passo que a Comissão apenas reduziu a coima em 14 milhões de ecus, isto é, em 50%.

151.
    Segundo a Tate & Lyle, as conclusões da Comissão não respeitam os factos, que demonstram, pelo contrário, uma cooperação total da sua parte. Não só expôs a situação à Comissão por escrito em duas cartas, de Julho e Agosto de 1990, mas também cooperou de forma constante com a Comissão, respondendo-lhe imediatamente a qualquer pedido de informação ao longo de todo o processo.

152.
    Na ausência de uma fundamentação explícita na decisão impugnada, a Tate & Lyle deduz que as conclusões da Comissão se devem à sua convicção de que esta recorrente se retractou das declarações que fizera ao longo do processo.

153.
    A este respeito, a Tate & Lyle entende que a Comissão qualificou como retractações meras correcções ou clarificações de interpretações dos factos feitas pela Comissão. Após ter levado os factos ao conhecimento desta última, a Tate & Lyle tinha o direito de se assegurar de que os mesmos eram compreendidos correctamente. Tal não podia ser razoavelmente considerado como a expressão deuma reduzida cooperação. Na sua resposta à segunda comunicação de acusações, a Tate & Lyle não se retractou nem dos factos revelados anteriormente no processo nem da interpretação que deles fizera. A segunda resposta limitou-se a clarificar ou corrigir a interpretação da Comissão acerca dos factos.

154.
    A Comissão sustenta que a comunicação sobre a cooperação foi publicada após os factos pertinentes e, por consequência, foi aplicada apenas por analogia. A decisão impugnada refere o papel da Tate & Lyle na descoberta do cartel e menciona que esta última satisfaz alguns dos critérios que lhe permitem obter uma redução da coima segundo a referida comunicação (considerandos 216 e 218 da decisão impugnada). Por estes motivos, a decisão impugnada menciona uma redução de 50%. Contudo, para que haja cooperação plena, uma entidade não se deve limitar a fornecer informações que está obrigada a dar à Comissão. Após ter transmitido a informação da existência do cartel, a Tate & Lyle mais não fez do que satisfazer as suas obrigações ou os seus interesses comerciais.

155.
    Duas retractações da Tate & Lyle permitem concluir pela ausência de cooperação permanente. Em primeiro lugar, os considerandos 82 e 83 da decisão impugnada evidenciam uma mudança nas respostas desta recorrente às duas comunicações de acusações. A princípio, admitiu fazer parte de um acordo com a British Sugar, em violação do artigo 85.°, n.° 1, do Tratado. Mais tarde, declarou não existir necessidade de acordo, pois, de qualquer forma, era obrigada a seguir a política da British Sugar. Concretamente, entre a primeira e a segunda comunicação de acusações, a Tate & Lyle tentou retractar-se relativamente à sua posição inicial e que fosse reconhecido que a prática concertada não tinha como objectivo a restrição da concorrência.

156.
    Em segundo lugar, a Comissão alega que uma segunda retractação está assinalada no considerando 116 da decisão impugnada. Na sua primeira carta dirigida ao Office of Fair Trading, de 16 de Julho de 1990, a Tate & Lyle admitiu ter havido uma troca de informações a respeito dos descontos a conceder a determinados clientes, quando, mais tarde, no memorando redigido conjuntamente com a British Sugar e enviado àquela entidade em 15 de Abril de 1991, afirmou não ter sido veiculada qualquer informação relativa a descontos concedidos a determinados clientes. Em virtude destas mudanças de posição, a Comissão não pôde provar a existência de trocas de informações respeitantes a descontos aplicados a clientes individuais (v. considerandos 116 e 193 da decisão impugnada).

- Apreciação do Tribunal

157.
    Deve recordar-se que, nos termos da comunicação sobre a cooperação, beneficiam de uma redução de, pelo menos, 75% do montante da coima que teria sido aplicado na ausência de cooperação ou de isenção total da coima as empresas que satisfaçam as condições previstas no ponto B, alíneas a) a e), da comunicação. Em particular, o ponto B, alínea d), estabelece que, a fim de poder beneficiar da redução prevista no ponto B, a empresa em causa deve ter cooperado de formapermanente e total durante a investigação. Por conseguinte, há que verificar se a cooperação da Tate & Lyle pode ser qualificada de permanente e total a título do ponto B, alínea d), desta comunicação.

158.
    A Comissão teve em conta a cooperação da Tate & Lyle nos considerandos 216 e 218 da decisão impugnada. Em particular, refere o papel desta na descoberta do cartel e reconhece que a mesma satisfaz alguns dos critérios que lhe permitem obter uma redução da coima segundo a referida comunicação. O considerando 217 da decisão impugnada enuncia, em termos gerais, que a Tate & Lyle não cooperou com a Comissão de forma permanente e total, enquanto os n.os 82, 83 e 116 da mesma decisão impugnada indicam os comportamentos que a Comissão considerou serem retractações da Tate & Lyle, que a impedem de qualificar a sua cooperação de permanente e total na acepção do ponto B, alínea d), da comunicação sobre a cooperação. Daqui a Comissão conclui que a Tate & Lyle não preenche as condições para a aplicação da redução da coima prevista no ponto B da referida comunicação.

159.
    A este respeito, deve salientar-se que, contrariamente ao que a Tate & Lyle alega, esta alterou, com efeito, as suas declarações ao longo das investigações da Comissão.

160.
    Contudo, no que toca à primeira dessas alterações, contida nas respostas da Tate & Lyle à segunda comunicação de acusações, deve concluir-se que a mesma se limitou a fornecer uma qualificação diferente dos factos, mas nem contestou os factos anteriormente admitidos nem se retractou da afirmação segundo a qual as reuniões controvertidas caíam na alçada do artigo 85.°, n.° 1, do Tratado.

161.
    No que toca à segunda alteração, relativa à circulação de informações respeitantes aos descontos a conceder a clientes especiais, há que salientar que a Comissão não conseguiu provar, na decisão impugnada, este elemento da infracção. Ora, embora a Comissão afirme que foi precisamente em virtude da retractação da Tate & Lyle que não pôde demonstrar esse elemento, impõe-se concluir que a existência de tais informações não ficou provada pela Comissão e, por conseguinte, não foi imputada às recorrentes. Nestas circunstâncias, a Comissão não pode imputar à Tate & Lyle falta de cooperação a propósito de um elemento da infracção cuja efectividade não ficou demonstrada.

162.
    À luz do que precede, deve entender-se que a Comissão qualificou erradamente a cooperação da Tate & Lyle como não sendo permanente e total na acepção do ponto B, alínea d), da comunicação e que, consequentemente, o alcance desta cooperação não foi correctamente apreciado na decisão impugnada.

163.
    Nestas circunstâncias, o Tribunal deve, no quadro do seu poder de plena jurisdição, proceder à reforma da decisão no que respeita ao montante da coima aplicada à Tate & Lyle.

164.
    Para este efeito, cabe ao Tribunal, no quadro da sua competência na matéria, apreciar ele mesmo as circunstâncias do caso concreto a fim de determinar o montante da coima (acórdão do Tribunal de Justiça de 9 de Novembro de 1983, Michelin/Comissão, 322/81, Colect., p. 3461, n.° 111).

        

165.
    Por um lado, deve considerar-se que, face à importância e ao carácter permanente e total da cooperação da Tate & Lyle, uma redução de 50% da coima que lhe teria sido aplicada na ausência de cooperação não é suficiente. Por outro, embora a Tate & Lyle não se tenha retractado das suas declarações iniciais, na sua resposta à segunda comunicação de acusações, como foi concluído no n.° 160, supra, não é menos certo que alterou em parte a qualificação dos factos que relatara anteriormente. Há que considerar que esta circunstância, bem como a importância do papel desempenhado pela Tate & Lyle no seio do acordo ou da prática concertada, não permite conceder-lhe uma redução superior a 60%.

166.
    Face ao conjunto das considerações precedentes, o Tribunal, decidindo no exercício da sua competência de plena jurisdição na acepção dos artigos 172.° do Tratado CE (actual artigo 229.° CE) e 17.° do Regulamento n.° 17, deve reduzir o montante da coima, fixado em euros por aplicação do artigo 2.°, n.° 1, do Regulamento (CE) n.° 1103/97 do Conselho, de 17 de Junho de 1997, relativo a certas disposições respeitantes à introdução do euro (JO L 162, p. 1), para 5,6 milhões de euros.

167.
    Por conseguinte, não há que examinar o segundo fundamento invocado pela Tate & Lyle, baseado em falta de fundamentação.

Quanto às despesas

168.
    Por força do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo as recorrentes nos processos T-204/98 e T-207/98 sido vencidas nos seus pedidos e tendo a recorrida concluído nesse sentido, há que condenar cada uma das recorrentes no conjunto das despesas respeitantes ao recurso que cada uma instaurou, incluindo as da Comissão. A recorrente no processo T-204/98 é condenada igualmente nas despesas respeitantes ao pedido de medidas provisórias neste processo, nos termos do pedido da recorrida. Tendo a Comissão sido vencida, no essencial, no seu pedido no processo T-202/98, há que condená-la no conjunto das despesas respeitantes a este processo, nos termos do pedido da recorrente neste processo.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quarta Secção)

decide:

1)    O artigo 3.° da Decisão 1999/210/CE da Comissão, de 14 de Outubro de 1998, relativa a um processo de aplicação do artigo 85.° do Tratado CE (Processo IV/F-3/33.708 - British Sugar plc, Processo IV/F-3/33.709 - Tate & Lyle plc, Processo IV/F-3/33.710 - Napier Brown & Company Ltd, Processo IV/F-3/33.711 - James Budgett Sugars Ltd), é anulado na parte em que respeita à recorrente no processo T-202/98.

2)    O montante da coima aplicada no artigo 3.° da Decisão 1999/210 à recorrente no processo T-202/98 é fixado em 5,6 milhões de euros.

3)    No processo T-202/98, a Comissão suportará as suas próprias despesas bem como as da recorrente.

4)    Os recursos nos processos T-204/98 e T-207/98 são julgados improcedentes.

5)    A recorrente no processo T-204/98 suportará as suas próprias despesas bem como as da Comissão neste processo, incluindo as que respeitam ao pedido de medidas provisórias.

6)    A recorrente no processo T-207/98 suportará as suas próprias despesas bem como as da Comissão neste processo.

Mengozzi
Tiili
Moura Ramos

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 12 de Julho de 2001.

O secretário

O presidente

H. Jung

P. Mengozzi


1: Língua do processo: inglês.