Language of document : ECLI:EU:T:2018:486

Processo T680/13

Dr. K. Chrysostomides & Co. LLC e o.

contra

Conselho da União Europeia e o.

«Responsabilidade extracontratual — Política económica e monetária — Programa de apoio à estabilidade de Chipre — Decisão do Conselho de Governadores relativa à cedência de liquidez de emergência a pedido do Banco Central de Chipre — Declarações do Eurogrupo de 25 de março, 12 de abril, 13 de maio e 13 de setembro de 2013 sobre Chipre — Decisão 2013/236/UE — Memorando de entendimento de 26 de abril de 2013 sobre as condições específicas de política económica subscrito entre Chipre e o Mecanismo Europeu de Estabilidade — Competência do Tribunal Geral — Admissibilidade — Requisitos formais — Esgotamento dos meios processuais internos — Violação suficientemente caracterizada de uma norma jurídica que confere direitos aos particulares — Direito de propriedade — Confiança legítima — Igualdade de tratamento»

Sumário — Acórdão do Tribunal Geral (Quarta Secção Alargada) de 13 de julho de 2018

1.      Ação de indemnização — Objeto — Pedido de indemnização por danos imputáveis à União — Competência do juiz da União — Pedido de indemnização por danos causados pelas autoridades nacionais — Competência dos tribunais nacionais

(Artigo 13.°, n.° 1, TUE; artigos 268.° TFUE e 340.°, segundo e terceiro parágrafos, TFUE)

2.      Ação de indemnização — Objeto — Pedido de indemnização por danos causados pela Comissão ou pelo Banco Central Europeu na execução de funções confiadas pelo Tratado que institui o Mecanismo Europeu de Estabilidade — Admissibilidade

(Artigos 268.° TFUE e 340.°, segundo parágrafo, TFUE)

3.      Ação de indemnização — Caráter autónomo — Diferença face ao recurso de anulação — Qualidade de demandado — Critérios de determinação

(Artigos 263.° TFUE, 268.° TFUE e 340.°, segundo parágrafo, TFUE)

4.      Ação de indemnização — Objeto — Pedido de indemnização por danos causados pelo Eurogrupo no exercício das competências conferidas pelo direito da União — Admissibilidade

(Artigo 3.° TUE; artigos 119.°, n.° 2, TFUE, 137.° TFUE e 268.° TFUE; Protocolo n.° 14 anexo aos Tratados UE e FUE, artigo 1.°)

5.      Política económica e monetária — Política monetária — Coordenação das políticas monetárias — Reunião informal no Eurogrupo dos Estados‑Membros que têm o euro como moeda — Objeto — Composição

(Artigo 137.° TFUE; Protocolo n.° 14 anexo aos Tratados UE e FUE, artigo 1.°; Tratado que institui o Mecanismo Europeu de Estabilidade, artigo 5.°, n.° 1)

6.      Política económica e monetária — Política económica — Coordenação das políticas económicas — Mecanismo Europeu de Estabilidade — Atribuição de competências em matéria de concessão de assistência financeira — Sujeição ao direito internacional público — Imputabilidade à Comissão e ao Banco Central Europeu de atos praticados por eles ao abrigo de funções conferidas pelo Tratado que Institui o Mecanismo Europeu de Estabilidade — Exclusão

(Tratado que institui o Mecanismo Europeu de Estabilidade, artigo 13.°, n.° 4)

7.      Política económica e monetária — Política monetária — Execução — Medidas específicas para restaurar a estabilidade financeira e um crescimento duradouro em Chipre — Integração das atividades de um banco nacional no banco central nacional e conversão dos depósitos em ações deste último — Inexistência de margem de apreciação do Estado‑Membro em causa

[Artigo 136.°, n.° 1, TFUE; Decisão 2013/236 do Conselho, artigo 2.°, n.° 6, alíneas b) e d)]

8.      Política económica e monetária — Política económica — Coordenação das políticas económicas — Mecanismo Europeu de Estabilidade — Atribuição de novas funções à Comissão e ao Banco Central Europeu — Inexistência de efeito nas atribuições conferidas pelos Tratados UE e FUE a essas instituições — Possibilidade de invocar o caráter ilícito da execução dessas funções numa ação de indemnização

(Artigo 17.°, n.° 1, TUE; artigo 282.°, n.° 2, TFUE; Tratado que institui o Mecanismo Europeu de Estabilidade, artigo 13.°, n.os 3, 4 e 7)

9.      Direito da União Europeia — Princípios — Proteção da confiança legítima — Requisitos — Garantias precisas fornecidas pela Administração — Conceito — Garantias dadas pelo Eurogrupo — Inclusão

10.    Processo judicial — Petição inicial — Requisitos de forma — Identificação do objeto do litígio — Exposição sumária dos fundamentos invocados — Pedido de reparação de danos alegadamente causados por uma instituição da União — Elementos que permitem identificar o comportamento imputado à instituição, o nexo de causalidade e o caráter real e certo do prejuízo causado

[Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, artigo 21.°, primeiro parágrafo; Regulamento de Processo do Tribunal Geral (1991), artigo 44.°, n.° 1, alínea c)]

11.    Ação de indemnização — Caráter autónomo — Esgotamento dos meios processuais internos — Exceção — Possibilidade de o juiz da União identificar o caráter e o quantum do dano alegado

[Artigos 268.° TFUE e 340.°, segundo e terceiro parágrafos, TFUE; Regulamento de Processo do Tribunal Geral (1991), artigo 44.°, n.° 1, alínea c)]

12.    Responsabilidade extracontratual — Requisitos — Ilegalidade — Prejuízo — Nexo de causalidade — Falta de um dos requisitos — Improcedência total da ação de indemnização

(Artigo 340.°, segundo parágrafo, TFUE)

13.    Política económica e monetária — Política económica — Coordenação das políticas económicas — Mecanismo Europeu de Estabilidade — Celebração de um memorando de entendimento que prevê a conversão em ações dos depósitos não garantidos de um banco nacional e o congelamento temporário de outros depósitos não garantidos desse banco — Compatibilidade com o direito de propriedade dos depositantes — Apreciação da existência de medidas menos restritivas — Consideração da urgência da situação

(Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, artigos 17.°, n.° 1, e 52.°, n.° 1; Tratado que institui o Mecanismo Europeu de Estabilidade, artigo 12.°)

14.    Direitos fundamentais — Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia — Limitação do exercício dos direitos e liberdades consagrados na Carta — Pressupostos — Pressuposto da inscrição da limitação na lei — Alcance

(Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, artigo 52.°, n.os 1 e 3)

15.    Responsabilidade extracontratual — Requisitos — Ato normativo que implica opções técnicas e apreciações complexas — Violação suficientemente caracterizada de uma norma superior de direito que confere direitos aos particulares — Exigência de violação manifesta e grave dos limites do amplo poder de apreciação do legislador da União

(Artigo 340.° TFUE)

16.    Política económica e monetária — Política económica — Coordenação das políticas económicas — Mecanismo Europeu de Estabilidade — Conclusão de um memorando de entendimento que prevê a conversão em ações dos depósitos não garantidos de um banco nacional e o congelamento temporário de outros depósitos não garantidos desse banco — Compatibilidade com o direito de propriedade dos depositantes — Existência de situações comparáveis — Tratamento diferente dos outros Estados‑Membros da zona euro que beneficiaram de assistência financeira — Violação — Requisitos

(Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, artigo 17.°, n.° 1; Tratado que institui o Mecanismo Europeu de Estabilidade, artigo 12.°)

17.    Recurso de anulação — Fundamentos — Preterição de formalidades essenciais — Falta de fundamentação ou fundamentação insuficiente — Conhecimento oficioso pelo juiz

(Artigos 263.° TFUE e 296.° TFUE)

18.    Atos das instituições — Fundamentação — Dever — Alcance — Apreciação do dever de fundamentação em função das circunstâncias do caso concreto — Necessidade de especificar todos os elementos de facto e de direito pertinentes — Inexistência

(Artigo 296.° TFUE)

19.    Banco Central Europeu — Competências do Sistema Europeu de Bancos Centrais — Determinação das condições de recapitalização e de resolução de instituições financeiras — Exclusão

(Artigo 282.°, n.° 1, TFUE; Protocolo n.° 14 anexo aos Tratados UE e FUE, artigo 14.4.°)

20.    Atos das instituições — Natureza jurídica — Determinação face ao conteúdo do ato — Declaração de intenção não publicada nas séries L ou C do Jornal Oficial da União Europeia — Ausência de valor jurídico

21.    Direito da União Europeia — Princípios — Proteção da confiança legítima — Pressupostos — Concessão de ajuda financeira a um Estado‑Membro em dificuldade subordinada à adoção por este de certas medidas destinadas a restaurar a estabilidade financeira — Inexistência de imposição dessas medidas na concessão de ajuda financeira a outros Estados‑Membros — Violação — Inexistência

(Decisão 2013/236 do Conselho)

22.    Direito da União Europeia — Princípios — Igualdade de tratamento — Conceito — Ónus da prova

(Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, artigos 20.° e 21.°)

23.    Política económica e monetária — Política monetária — Execução — Medidas específicas para restaurar a estabilidade financeira e um crescimento duradouro em Chipre — Desmantelamento de um banco em dificuldade e recapitalização de outro banco em dificuldade através de uma conversão dos depósitos não garantidos do primeiro banco em fundos próprios — Aquisição pelo segundo banco da dívida do primeiro banco proveniente da assistência financeira — Tratamento diferente dos titulares de depósitos não garantidos dos dois bancos face aos credores com reclamações com origem na assistência financeira — Violação do princípio da igualdade de tratamento — Inexistência

(Decisão 2013/236 do Conselho; Memorando de entendimento de 26 de abril de 2013)

24.    Direito da União Europeia — Princípios — Igualdade de tratamento — Discriminação em razão da nacionalidade — Proibição — Inaplicabilidade a uma situação puramente interna de um Estado‑Membro — Limites — Contribuição por uma instituição da União para a manutenção ou aplicação desse tratamento — Inadmissibilidade

(Artigo 18.° TFUE)

25.    Direito da União Europeia — Princípios — Igualdade de tratamento — Violação — Conceito

26.    Política económica e monetária — Política monetária — Execução — Medidas específicas para restaurar a estabilidade financeira e um crescimento duradouro em Chipre — Desmantelamento de um banco em dificuldade e recapitalização de outro banco em dificuldade através de uma conversão dos depósitos não garantidos do primeiro banco em fundos próprios — Tratamento diferente dos titulares de depósitos não garantidos dos dois bancos face aos titulares de depósitos constituídos em sucursais gregas desses bancos — Violação do princípio da igualdade de tratamento — Inexistência

(Decisão 2013/236 do Conselho; Memorando de entendimento de 26 de abril de 2013)

27.    Política económica e monetária — Política monetária — Execução — Medidas específicas para restaurar a estabilidade financeira e um crescimento duradouro à Chipre — Desmantelamento de um banco em dificuldade e recapitalização de outro banco em dificuldade através de uma conversão dos depósitos não garantidos do primeiro banco em fundos próprios — Transferência dos depósitos para o segundo banco com um limite de 100 000 euros por depositante — Violação do princípio da igualdade de tratamento — Inexistência

(Diretiva 94/19 do Parlamento Europeu e do Conselho, conforme alterada pelas Diretivas 2005/1 e 2009/14, considerando 16 e artigo 7.°, n.° 1A; Decisão 2013/236 do Conselho; Memorando de entendimento de 26 de abril de 2013)

28.    Processo judicial — Prova — Ónus da prova

[Regulamento de Processo do Tribunal Geral (2015), artigo 85.°]

29.    Política económica e monetária — Política monetária — Execução — Medidas específicas para restaurar a estabilidade financeira e um crescimento duradouro em Chipre — Desmantelamento de um banco em dificuldade e recapitalização de outro banco em dificuldade através de uma conversão dos depósitos não garantidos do primeiro banco em fundos próprios — Tratamento diferente dos titulares de depósitos não garantidos dos dois bancos face às sociedades do setor bancário cooperativo que não foi objeto de resgate interno — Violação do princípio da igualdade de tratamento — Inexistência

(Decisão 2013/236 do Conselho)

1.      Nos termos do artigo 268.o e do artigo 340.o, segundo e terceiro parágrafos, TFUE, o juiz da União em matéria de responsabilidade extracontratual, só tem competência para conhecer de litígios relativos à reparação de danos causados pelas instituições, pelos órgãos ou pelos organismos da União ou pelos seus agentes quando atuem no exercício das suas funções. O termo «instituição», utilizado no artigo 340.o, segundo parágrafo, TFUE não deve ser entendido no sentido de que só abrange as instituições da União enumeradas no artigo 13.o, n.o 1, TUE. Esse termo abrange igualmente, à luz do sistema de responsabilidade extracontratual instituído pelo Tratado FUE, todos os outros órgãos e organismos da União instituídos pelos Tratados e destinados a contribuir para a realização dos objetivos da União. Consequentemente, os atos praticados por esses órgãos e organismos no exercício das competências que lhes são conferidas pelo direito da União são imputáveis à União, de acordo com os princípios gerais comuns aos Estados‑Membros previstos no artigo 340.o, segundo parágrafo, TFUE.

Daí resulta que o Tribunal Geral não pode conhecer de um pedido de indemnização dirigido contra a União e fundado na ilicitude de um ato ou de um comportamento cujo autor não seja uma instituição, um órgão ou um organismo da União ou um dos seus agentes no exercício das suas funções. Assim, os danos causados pelas autoridades nacionais no exercício das suas próprias competências só podem envolver a sua responsabilidade e só os tribunais nacionais têm competência para assegurar a respetiva reparação. Em contrapartida, não está excluída a possibilidade de o juiz da União conhecer de uma ação de reparação de danos causados por um ato ou comportamento, pelo qual uma autoridade nacional assegura a execução de uma regulamentação da União. Nesse caso, para analisar a competência do juiz da União, há que verificar se o ilícito alegado em suporte da ação emana efetivamente de uma instituição, de um órgão ou de um organismo da União ou de um dos seus agentes no exercício das suas funções e, na realidade, não pode ser considerado imputável à autoridade nacional em causa. É o que sucede quando as autoridades nacionais não dispõem de nenhuma margem de apreciação para aplicarem uma regulamentação da União ferida dessa ilegalidade.

(cf. n.os 81‑84)

2.      V. texto da decisão.

(cf. n.os 85)

3.      A competência que o juiz da União exerce no contencioso da legalidade nos termos do artigo 263.o TFUE é diferente da que lhe é conferida no contencioso da responsabilidade extracontratual nos termos dos artigos 268.o e 340.o TFUE. Com efeito, a ação de indemnização ligada à responsabilidade extracontratual da União por ações ou omissões das suas instituições foi instituída como um meio processual autónomo face a outras ações judiciais, com a sua função específica no âmbito do sistema dos meios processuais e sujeita a pressupostos de exercício concebidos à luz do seu objeto específico. Enquanto o recurso de anulação previsto no artigo 263.o TFUE se dirige à eliminação de uma medida determinada, a ação de indemnização com base no artigo 340.o TFUE tem por objeto a reparação do dano causado por uma instituição.

Assim, independentemente da sua qualidade de ato recorrível em sede de recurso de anulação nos termos do artigo 263.o TFUE, qualquer ato de uma instituição, de um órgão ou de um organismo da União ou de um dos seus agentes quando atue no exercício das suas funções é, em princípio, suscetível de ser objeto de uma ação de indemnização nos termos do artigo 268.o TFUE. Do mesmo modo, um comportamento não decisório suscetível de dar origem à responsabilidade extracontratual da União pode fundar uma ação de indemnização, mesmo embora não possa ser objeto de recurso de anulação. Daí resulta que, no sistema dos meios processuais instituído pelo Tratado FUE, a ação de responsabilidade extracontratual prossegue uma finalidade compensatória, nomeadamente destinada a garantir ao particular uma tutela jurisdicional efetiva igualmente contra atos e comportamentos das instituições, dos órgãos ou dos organismos da União ou de um dos seus agentes quando atuam no exercício das suas funções, que não possam ser objeto de recurso de anulação a título do artigo 263.o TFUE. Assim, em face das finalidades diferentes e complementares desses dois tipos de meio processual, não se pode considerar que o conteúdo do conceito de «instituição», na aceção do artigo 340.o, segundo parágrafo, TFUE, se limita necessariamente às instituições, órgãos e organismos da União previstos no artigo 263.o, primeiro parágrafo, TFUE.

Pelo contrário, a identificação das entidades da União que podem ser qualificadas de «instituições», na aceção do artigo 340.o, segundo parágrafo, TFUE, deve ser feita segundo critérios específicos dessa disposição, diferentes dos que regem a identificação dos órgãos e organismos previstos no artigo 263.o, primeiro parágrafo, TFUE. Para efeitos do artigo 263.o TFUE, o critério relevante diz respeito à faculdade de a entidade recorrida praticar atos destinados a produzir efeitos jurídicos para terceiros. Pelo contrário, para efeitos do artigo 340.o, segundo parágrafo, TFUE, há que determinar se a entidade da União à qual é imputável o ato ou o comportamento em causa foi instituída pelos Tratados e se destina contribuir para a realização dos objetivos da União.

(cf. n.os 109‑112)

4.      São imputáveis à União os atos e comportamentos do Eurogrupo no exercício das competências que lhe são conferidas pelo direito da União. Com efeito, o artigo 1.o do protocolo n.o 14 relativo ao Eurogrupo, anexo ao Tratado FUE, dispõe que o Eurogrupo reúne para debater questões relacionadas com as responsabilidades específicas que os ministros que o compõem partilham em matéria de moeda única. Estas questões, nos termos do artigo 119.o, n.o 2, TFUE, fazem parte da ação da União com vista aos objetivos enunciados no artigo 3.o TUE, entre os quais figura a criação de uma união económica e monetária cuja moeda é o euro. Daí resulta que o Eurogrupo é uma entidade da União formalmente instituída pelos Tratados e destinada a contribuir para a realização dos objetivos da União.

(cf. n.° 113)

5.      V. texto da decisão.

(cf. n.os 123‑125)

6.      Ao criar o Mecanismo Europeu de Estabilidade, os Estados‑Membros cuja moeda é o euro optaram por atribuir a essa organização internacional, que tem personalidade jurídica, competências concretas e exclusivas em matéria de concessão de assistência financeira a esses Estados‑Membros em dificuldade. O exercício dessas competências está sujeito a normas de direito internacional público, próprias de uma organização de cooperação intergovernamental, sendo aplicável o direito da União unicamente na medida em que o Tratado que institui o Mecanismo Europeu de Estabilidade o preveja especificamente. Assim, os Estados‑Membros cuja moeda é o euro situaram claramente a concessão de um instrumento de assistência financeira tanto fora da esfera de atividade da União como do seu quadro normativo.

É certo que os Estados‑Membros cuja moeda é o euro recorrem a instituições da União, a saber, a Comissão e o Banco Central Europeu, para o desempenho de certas missões no interesse do Mecanismo Europeu de Estabilidade. Contudo, as funções confiadas a essas instituições no âmbito do Tratado que institui o Mecanismo Europeu de Estabilidade não incluem qualquer poder decisório próprio e as atividades exercidas por essas instituições no âmbito do mesmo Tratado só vinculam o Mecanismo Europeu de Estabilidade. Assim, no caso de um memorando de entendimento celebrado entre o Mecanismo Europeu de Estabilidade e um Estado‑Membro cuja moeda é o euro, as exigências inscritas nesse memorando só são imputáveis ao Mecanismo Europeu de Estabilidade e não à Comissão.

(cf. n.os 128, 129, 167)

7.      V. texto da decisão.

(cf. n.os 178‑181, 186, 191)

8.      As missões confiadas à Comissão e ao Banco Central Europeu pelo Tratado que institui o Mecanismo Europeu de Estabilidade não desvirtuam as competências que os Tratados UE e FUE lhes conferem. Em particular, quanto à Comissão, o artigo 13.o, n.os 3 e 4, do Tratado que institui o Mecanismo Europeu de Estabilidade impõe‑lhe a obrigação de cuidar da compatibilidade dos memorandos de entendimento celebrados pelo Mecanismo Europeu de Estabilidade com o direito da União, de modo que ela mantém, no âmbito do Tratado que institui o Mecanismo Europeu de Estabilidade, o seu papel de guardiã dos Tratados, conforme resulta do artigo 17.o, n.o 1, TUE. Consequentemente, não pode assinar um memorando de entendimento sobre cuja compatibilidade com o direito da União tenha dúvidas.

Consequentemente, um demandante tem o direito de opor à Comissão os comportamentos ilícitos ligados à adoção de um memorando de entendimento em nome do Mecanismo Europeu de Estabilidade no âmbito de uma ação de indemnização. A esse respeito, os comportamentos ilícitos da Comissão ligados à adoção de um memorando de entendimento não são os únicos comportamentos ilícitos de uma instituição da União no âmbito do Tratado que institui o Mecanismo Europeu de Estabilidade a poder dar origem à responsabilidade extracontratual desta. Com efeito, os comportamentos ilícitos ligados ao acompanhamento da aplicação das medidas previstas num memorando de entendimento pelo Banco Central Europeu e pela Comissão são‑lhe oponíveis em sede de ação de indemnização. A negociação e a assinatura de um memorando de entendimento pela Comissão e o acompanhamento da aplicação das medidas previstas por esta, pelo Banco Central Europeu e pela Comissão nos termos do artigo 13.o, n.o 7, do Tratado que institui o Mecanismo Europeu de Estabilidade são, portanto, suscetíveis de dar origem à responsabilidade da União.

(cf. n.os 201‑204)

9.      O princípio da proteção da confiança legítima é um princípio geral de direito da União, de grau superior, que visa a proteção dos particulares, cuja violação por uma instituição da União pode dar origem à responsabilidade da União. O direito de o invocar pressupõe que tenham sido fornecidas ao interessado garantias precisas, incondicionais e concordantes, provenientes de fontes autorizadas e fiáveis, pelas autoridades competentes da União. Com efeito, este direito pertence a qualquer sujeito de direito no qual uma instituição, um órgão, um organismo da União, ao fornecer‑lhe garantias precisas, tenha gerado esperanças fundadas.

Consequentemente, a transmissão pelo Eurogrupo de garantias precisas quanto a medidas previstas num memorando de entendimento celebrado entre o Mecanismo Europeu de Estabilidade e um Estado‑Membro cuja moeda é o euro é suscetível de dar origem a responsabilidade da União. Contudo, no caso das garantias quanto à concessão de um instrumento de assistência financeira a esse Estado‑Membro, uma vez que a concessão dessa facilidade faz parte das competências do Mecanismo Europeu de Estabilidade, e não do Eurogrupo, essas garantias não tinham origem numa autoridade competente.

(cf. n.os 205, 206, 404, 427)

10.    V. texto da decisão.

(cf. n.os 215, 216)

11.    A ação de indemnização a título do artigo 268.o TFUE e do artigo 340.o, segundo e terceiro parágrafos, TFUE deve ser apreciada à luz do conjunto do sistema de tutela jurisdicional dos particulares e a sua admissibilidade pode, pois, estar sujeita, em certos casos, ao esgotamento de meios processuais internos que existem para obter a anulação de uma decisão da autoridade nacional, desde que esses meios processuais internos assegurem de forma eficaz a proteção dos particulares interessados e possam levar à reparação do dano alegado.

Os casos de inadmissibilidade por não esgotamento dos meios processuais internos se limitavam àqueles em que esse não esgotamento desses meios processuais impede o juiz da União de identificar o caráter e o quantum do dano aí alegado, ficando por preencher os pressupostos do artigo 44.o, n.o 1, alínea c), do Regulamento de Processo. Se o juiz da União está em condições de identificar o caráter e o quantum do dano alegado, não se pode considerar que a ação é inadmissível, unicamente por o demandante não ter esgotado os meios processuais internos, sem que seja necessário determinar se os atos e os comportamentos em causa podem ser objeto de uma ação nos tribunais nacionais.

Quando muito, poder‑se‑ia considerar, nestas condições, que a propositura, por um ou mais demandantes, de uma ação num tribunal nacional com vista à indemnização do mesmo dano da presente ação nos tribunais da União pode ter influência na análise do mérito dessa ação. A esse respeito, quando, em primeiro lugar, alguém propõe duas ações de indemnização por um e mesmo dano, uma dirigida contra uma autoridade nacional, num tribunal nacional, a outra dirigida contra uma instituição da União, nos tribunais da União, e, em segundo lugar, exista um risco de, por causa de apreciações diferentes desse dano pelos dois tribunais, essa pessoa ser insuficiente ou abusivamente indemnizada, o juiz da União deve, antes de conhecer do dano, aguardar que o tribunal nacional decida da ação que lhe é submetida através de uma decisão que ponha fim à instância. Nesse caso, o juiz da União tem que aguardar que o julgador nacional tenha decidido, antes de se pronunciar sobre a existência e o quantum do dano. Nesse caso, o juiz da União deve aguardar que o juiz nacional tenha decidido antes de conhecer da existência e do quantum do dano. Em contrapartida, mesmo antes de o juiz nacional decidir, pode determinar se o comportamento imputado à instituição demandada é suscetível de dar origem a responsabilidade extracontratual da União.

(cf. n.os 238‑241)

12.    V. texto da decisão.

(cf. n.° 245)

13.    Uma restrição do direito de propriedade não pode ser excessiva. Por um lado, a restrição deve responder ao objetivo de interesse geral prosseguido e ser necessária e proporcionada para esse fim. Por outro, o conteúdo essencial, isto é, a substância, do direito de propriedade não pode ser lesado.

No caso de um memorando de entendimento celebrado pelo Mecanismo Europeu de Estabilidade com um Estado‑Membro em dificuldade financeira resulta do artigo 12.o do Tratado que institui o Mecanismo Europeu de Estabilidade que a adoção desse memorando corresponde a um objetivo de interesse geral prosseguido pela União, a saber, o de assegurar a estabilidade do sistema bancário da zona euro no seu conjunto. Com efeito, os serviços financeiros desempenham um papel central na economia da União. Na medida em que os bancos, fonte essencial de financiamento para as empresas, estão frequentemente interconectados, o incumprimento de um ou mais bancos pode propagar‑se rapidamente aos outros bancos, tanto no Estado‑Membro em causa como noutros Estados‑Membros e, consequentemente, produzir efeitos de arrastamento negativos a outros setores da economia.

A esse respeito, no caso de um memorando de entendimento que prevê nomeadamente a recapitalização de um banco por meio de uma conversão dos depósitos não garantidos em fundos próprios, para se analisar a existência de medidas memos restritivas do direito de propriedade, há que ter em conta a necessidade de as autoridades nacionais, agirem rapidamente na adoção das medidas previstas no memorando de entendimento. Longe de constituir uma indicação da inobservância do direito a uma boa administração, a rapidez com que essas medidas são adotadas demonstra a urgência da situação em que se encontra o Estado‑Membro em causa. Com efeito, trata‑se de evitar um risco iminente de colapso dos bancos visados para preservar a estabilidade do sistema financeiro nacional e, desse modo, evitar o contágio a outros Estados‑Membros da zona euro. Elaborar um sistema diferenciado de corte nesse contexto exigiria que as autoridades nacionais levassem a cabo uma iniciativa particularmente delicada e incerta para garantir que as percentagens e limiares escolhidos permitissem ao banco recapitalizado atingir o nível mínimo de capitais próprios previsto no memorando de entendimento, assim expondo a recapitalização desse banco a grandes riscos.

Por outro lado, quanto à necessidade de proporcionar às pessoas em causa uma ocasião adequada de expor as suas causas às autoridades competentes, essa exigência não pode ser interpretada no sentido de que as pessoas interessadas devem, em todas as circunstâncias, poder fazer valer o seu ponto de vista junto das autoridades competentes previamente à adoção das medidas que violam o seu direito de propriedade. É o que acontece, nomeadamente, quando as medidas em causa não constituem uma sanção e se integram num contexto de emergência específico. A esse respeito, a execução de um processo de consulta prévia, no âmbito do qual os milhares de depositantes e acionistas dos bancos visados pudessem ter feito valer utilmente o seu ponto de vista junto do Banco Central do Estado‑Membro em causa antes da adoção das disposições nacionais de aplicação das medidas previstas no memorando de entendimento teria inevitavelmente atrasado a aplicação das medidas destinadas a prevenir esse colapso. A realização do objetivo de preservar a estabilidade do sistema financeiro nacional e, desse modo, evitar um contágio a outros Estados‑Membros da zona euro teria ficado exposta a grandes riscos.

(cf. n.os 255, 282, 290, 310)

14.    V. texto da decisão.

(cf. n.° 272)

15.    Quando as instituições da União são chamadas, num contexto complexo e evolutivo, a fazer opções técnicas e a efetuar previsões e apreciações complexas, há que reconhecer‑lhes um amplo poder de apreciação quanto à natureza e à extensão das medidas a que dão apoio ou cuja manutenção ou execução contínua exigem. Nesse contexto, o pressuposto da ilegalidade do comportamento imputado exige que se demonstre que a instituição em causa violou manifesta e gravemente os limites que se impõem ao seu poder de apreciação.

(cf. n.° 291)

16.    As medidas a que pode estar sujeita a concessão de assistência financeira pelo Mecanismo Europeu de Estabilidade ou por outras organizações internacionais, órgãos e instituições da União ou Estados) para resolver as dificuldades financeiras de um Estado confrontado com a necessidade de recapitalizar o seu sistema bancário são suscetíveis de variar fundamentalmente de um caso para outro em função da experiência adquirida e de um conjunto de circunstâncias específicas. Entre estas podem figurar nomeadamente a situação económica do Estado beneficiário, a importância da ajuda face à sua economia, as perspetivas de regresso dos bancos em causa à viabilidade económica e as razões que levaram às dificuldades com que estes de depararam, incluindo, sendo caso disso, a excessiva dimensão do setor bancário do Estado beneficiário face à sua economia nacional, à evolução da conjuntura económica internacional ou uma alta probabilidade de intervenções futuras do Mecanismo Europeu de Estabilidade (ou de outras organizações internacionais, órgãos e instituições da União ou Estados) em apoio de outros Estados em dificuldade que possam exigir uma limitação preventiva dos montantes dedicados a cada intervenção.

Consequentemente, quanto à compatibilidade de um memorando de entendimento celebrado entre o Mecanismo Europeu de Estabilidade e um Estado beneficiário de assistência financeira com o direito de propriedade, não se pode validamente fazer uma comparação da importância (absoluta e relativa) da assistência financeira de que beneficiaram, por um lado, esse Estado beneficiário e, por outro, outros Estados beneficiários de assistência financeira, sem demonstrar que os setores financeiros respetivos dos outros Estados cuja moeda é o euro que beneficiaram de assistência financeira se caracterizavam por uma dimensão excessiva face à dimensão das economias nacionais respetivas desses Estados. Há que demonstrar ainda que a experiência adquirida e as diferenças relativas à situação económica dos Estados em causa cuja moeda é o euro ou às perspetivas de regresso à viabilidade dos bancos em causa, a evolução da conjuntura económica internacional ou ainda uma alta probabilidade de intervenções futuras do Mecanismo Europeu de Estabilidade em apoio de outros Estados em dificuldade que pudessem exigir uma limitação preventiva dos montantes dedicados a cada intervenção não podem servir de base a uma diferença de tratamento entre o Estado beneficiário e os outros Estados beneficiários de assistência financeira.

(cf. n.os 311‑313)

17.    V. texto da decisão.

(cf. n.° 390)

18.    V. texto da decisão.

(cf. n.os 392‑395)

19.    Os bancos centrais nacionais exercem dois tipos de funções, a saber, primeiro, as que estão previstas nos Estatutos do Sistema Europeu de Bancos Centrais e do Banco Central Europeu e, segundo, as que não o estão. As segundas não podem ser imputadas ao Sistema Europeu de Bancos Centrais nem ao Euro‑Sistema. Com efeito, como acertadamente salienta o BCE, o artigo 14.o‑4 dos Estatutos do Sistema Europeu de Bancos Centrais e do Banco Central Europeu dispõe que os bancos centrais nacionais podem exercer outras funções para além das especificadas nesses Estatutos, a menos que o Conselho de Governadores do Banco Central Europeu decida, por maioria de dois terços dos sufrágios expressos, que interferem com os objetivos e missões do Sistema Europeu de Bancos Centrais. As funções que os bancos centrais nacionais exercem sob a sua própria responsabilidade e por sua conta e risco não são consideradas pertencentes às funções do Sistema Europeu de Bancos Centrais.

A esse respeito, os Estatutos do Sistema Europeu de Bancos Centrais e do Banco Central Europeu não mencionam, entre as missões do Banco Central Europeu ou do Sistema Europeu de Bancos Centrais, a determinação das condições de recapitalização ou de resolução das instituições financeiras. São, portanto, funções que os bancos centrais nacionais exercem sob a sua própria responsabilidade e por sua conta e risco. Nestas condições, um leitor prudente e avisado não podia razoavelmente considerar que uma afirmação efetuada por um Banco Central nacional a propósito da determinação das condições de recapitalização ou de resolução de instituições financeiras era imputável ao Euro‑Sistema e o vinculava. Nem o artigo 282.o, n.o 1, TFUE, nem a declaração de missão do Euro‑Sistema põem esta conclusão em causa. Consequentemente, não podem inferir razoavelmente do artigo 282.o, n.o 1, TFUE que o Euro‑Sistema garantiria a manutenção do valor dos depósitos confiados aos bancos nacionais em caso de recapitalização ou de resolução destes.

(cf. n.os 415‑417, 419)

20.    A declaração de missão do Banco Central Europeu e do Euro‑Sistema assemelha‑se a uma simples declaração de intenções desprovida de qualquer valor jurídico e não foi, a esse título, publicada na série L do Jornal Oficial da União Europeia, que tem por objeto a publicação de atos juridicamente vinculativos, nem na sua série C, que publica informações, recomendações e pareceres relativos à União. Com efeito, essa declaração tem, pela sua própria natureza, um caráter de pura manifestação de uma aspiração e não tem por objeto impor obrigações aos seus autores nem repertoriar de forma taxativa todas as missões e competências dos membros do Euro‑Sistema.

(cf. n.° 420)

21.    O simples facto de, em fases anteriores de uma crise financeira internacional, a concessão de assistência financeira pelo Mecanismo Europeu de Estabilidade não ter sido sujeita à adoção de medidas comparáveis às medidas impostas a um Estado beneficiário não pode, enquanto tal, ser considerada uma garantia precisa, incondicional e concordante capaz de gerar a confiança legítima dos acionistas e dos depositantes dos bancos visados em que a concessão de assistência financeira a esse Estado não o seria.

A esse respeito, as medidas a que pode ser sujeita a concessão de assistência financeira pelo Mecanismo Europeu de Estabilidade (ou por outras organizações internacionais, órgãos e instituições da União ou Estados) para solucionar as dificuldades financeiras de um Estado confrontado com a necessidade de recapitalizar o seu sistema bancário podem variar fundamentalmente de um caso para outro em função da experiência adquirida e de um conjunto de circunstâncias específicas. Nestas condições, na falta de um compromisso claro e explícito das autoridades competentes, não é possível considerar que os acionistas e os depositantes dos bancos visados pelas medidas em causa poderiam legitimamente esperar que a concessão de um instrumento de assistência financeira seria sujeita a condições idênticas ou mesmo semelhantes àquelas a que foi sujeita a concessão de assistência financeira a outros Estados‑Membros cuja moeda é o euro.

(cf. n.os 432, 433)

22.    V. texto da decisão.

(cf. n.os 440‑442)

23.    Encontram‑se em situação diferente para efeitos de aplicação do princípio da igualdade de tratamento, por um lado, um operador privado, que, como os titulares de depósitos não garantidos dos bancos nacionais visados por medidas previstas num memorando de entendimento celebrado pelo Mecanismo Europeu de Estabilidade e os acionistas de outro banco nacional que tenha sido recapitalizado por meio desses depósitos não garantidos, agiram unicamente no seu interesse patrimonial privado, e, por outro, um banco central do Euro‑Sistema, cujas decisões se guiavam exclusivamente por objetivos de interesse público. O simples facto de os depositantes e um banco central do Euro‑Sistema cujas decisões são guiadas por esses objetivos deterem um mesmo título de crédito de um mesmo banco não permite desmentir esta conclusão, pelo que o princípio da igualdade de tratamento não pode exigir que essas duas categorias de pessoas sejam tratadas de forma indiferenciada.

(cf. n.° 449)

24.    O direito da União não se opõe, em situações que não apresentem qualquer fator de ligação a uma das situações previstas por esse direito e cujos elementos relevantes estejam todos confinados ao interior de um único Estado‑Membro, a que os nacionais desse Estado‑Membro dele recebam um tratamento menos favorável do que o tratamento dado aos cidadãos de outro Estado‑Membro. Contudo, essa solução não se aplica em atos ou omissões pelos quais uma ou mais instituições da União contribuam para esse tratamento ou exijam a sua manutenção ou a sua execução contínua.

Assim, no caso de um memorando de entendimento celebrado pelo Mecanismo Europeu de Estabilidade que prevê nomeadamente a recapitalização de um banco nacional através dos depósitos não garantidos de outro banco nacional, mesmo admitindo que as alegações de discriminação entre os depositantes de bancos do Estado‑Membro em causa e os titulares de depósitos constituídos nas sucursais desses mesmos bancos noutro Estado‑Membro pudessem ser consideradas relativas a uma situação cujos elementos relevantes estivessem todos confinados ao interior de um único Estado‑Membro, não se pode validamente alegar que qualquer discriminação sofrida pelos acionistas e pelos depositantes dos bancos visados deveria ser considerada uma «discriminação inversa», não proibida pelo direito da União.

(cf. n.os 461‑463)

25.    V. texto da decisão.

(cf. n.° 465)

26.    Uma diferença de tratamento é justificada quando, por um lado, se baseia num critério objetivo e razoável, isto é, quando tem uma relação com um objetivo legalmente admissível prosseguido pela legislação em causa, e, por outro, é proporcionada ao objetivo prosseguido pelo tratamento em causa.

Quanto à questão de saber se a diferença de tratamento num memorando de entendimento celebrado pelo Mecanismo Europeu de Estabilidade entre os titulares de depósitos constituídos nos bancos nacionais visados pelas medidas inscritas nesse memorando e os titulares de depósitos constituídos nas sucursais desses bancos noutro Estado‑Membro se baseia num critério objetivo e razoável, o objetivo de evitar uma desestabilização geral do sistema financeiro do segundo Estado‑Membro através de um contágio pelo sistema bancário do primeiro Estado‑Membro deve ser considerado objetivo e razoável. Quanto à proporcionalidade desta diferença de tratamento, há que considerar que é apta a realizar os objetivos prosseguidos e não vai além do necessário para o efeito.

Consequentemente, o facto de o instrumento de assistência financeira, por um lado, ter sido sujeito, no memorando de entendimento, à adoção pelas autoridades nacionais do segundo Estado‑Membro de uma medida de corte dos depósitos nos bancos visados constituídos nesse Estado‑Membro e, por outro, não ter sido sujeito a uma condição semelhante no que respeita aos depósitos constituídos no primeiro Estado‑Membro é objetivamente justificada, pelo que não constitui uma violação do princípio da igualdade de tratamento.

(cf. n.os 469‑473)

27.    No caso de uma medida prevista num memorando de entendimento celebrado pelo Mecanismo Europeu de Estabilidade que prevê que serão transferidas para um banco nacional em dificuldade as dívidas de outro banco nacional para com cada um dos seus depositantes no limite de 100 000 euros, mantendo‑se no segundo banco os montantes superiores a esse, até à sua liquidação, não se pode deixar de observar que essa medida se aplica indistintamente a todos os depositantes do segundo banco, pelo que não há qualquer diferença de tratamento entre esses depositantes em função do montante dos depósitos que confiaram a esse banco.

O simples facto de a transferência para o primeiro banco dos depósitos confiados ao segundo banco ser acompanhado de um limite uniforme de 100 000 euros por depositante e, por isso, ser suscetível de ter repercussões diferentes nesses depositantes em função do montante dos seus depósitos não pode pôr essa conclusão em causa. Com efeito, qualquer diferença dessa natureza resulta da aplicação do limite de garantia de 100 000 euros previsto no artigo 7.o, n.o 1‑A, da Diretiva 94/19, relativa aos sistemas de garantia de depósitos, conforme alterada pelas Diretivas 2005/1 e 2009/14. Ora, esse é um critério simultaneamente objetivo e adaptado às necessidades do funcionamento do sistema bancário da União.

No caso de uma medida de conversão de ações do primeiro banco prevista no memorando de entendimento segundo a qual o corte dos depósitos não garantidos desse banco se aplica unicamente aos seus depositantes cujos depósitos excedam 100 000 euros, daí resulta uma diferença de tratamento entre os depositantes desse banco consoante o montante dos depósitos que lhe confiaram exceda ou não 100 000 euros. Contudo, essa diferença de tratamento de modo nenhum é constitutiva de uma desigualdade de tratamento proibida pelo direito da União, na medida em que os depositantes cujos depósitos nos bancos visados excedam 100 000 euros estão numa situação juridicamente distinta dos depositantes cujos depósitos nos bancos visados não excedem esse montante. Com efeito, de acordo com o artigo 7.o, n.o 1‑A, da Diretiva 94/19, os depósitos dos segundos estão, em caso de indisponibilidade dos depósitos, integralmente cobertos pelo sistema nacional de garantia dos depósitos, ao passo que os dos primeiros só o estavam até ao montante de 100 000 euros.

(cf. n.os 482‑485)

28.    Em princípio, cabe a quem alega factos em apoio de um pedido fazer prova da respetiva realidade.

(cf. n.° 501)

29.    V. texto da decisão.

(cf. n.os 504‑508)