Language of document : ECLI:EU:T:2004:26

Arrêt du Tribunal

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Segunda Secção)
28 de Janeiro de 2004 (1)

«FEOGA – Supressão de uma contribuição financeira – Artigos 24.° e 25.° do Regulamento (CEE) n.° 4253/88»

No processo T-180/01,

Euroagri Srl, estabelecida em Monte Vidon Combatte (Itália), representada por W. Massucci, advogado,

recorrente,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, inicialmente representada por L. Visaggio, e em seguida por C. Cattabriga, na qualidade de agentes, assistidos por M. Moretto, advogado, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrida,

que tem por objecto um pedido de anulação da Decisão C(2001) 1274 da Comissão, de 6 de Junho de 2001, que suprime a contribuição concedida à Euroagri Srl pela Decisão C(92) 3214 da Comissão, de 3 de Dezembro de 1992, relativa à concessão de uma contribuição do Fundo Europeu de Orientação e de Garantia Agrícola (FEOGA), Secção «Orientação», em conformidade com o Regulamento (CEE) n.° 4256/88 do Conselho, de 19 de Dezembro de 1988, que estabelece disposições de aplicação do Regulamento (CEE) n.° 2052/88 no que respeita ao FEOGA, Secção «Orientação» (JO L 374, p. 25), no âmbito do projecto n.° 92.IT.06.069 intitulado «Projecto-piloto e de demonstração da utilização de uma nova técnica denominada ‘Endovena’ (‘intravenosa’) nas árvores de fruto»,



O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Segunda Secção),



composto por: N. J. Forwood, presidente, J. Pirrung e A. W. H. Meij, juízes,

secretário: J. Palacio González, administrador principal,

vistos os autos e após a audiência de 25 de Março de 2003,

profere o presente



Acórdão




Quadro regulamentar

1
Para reforçar a coesão económica e social na acepção do artigo 158.° CE, o Regulamento (CEE) n.° 2052/88 do Conselho, de 24 de Junho de 1988, relativo às missões dos fundos com finalidade estrutural, à sua eficácia e à coordenação das suas intervenções, entre si, com as intervenções do Banco Europeu de Investimento e com as dos outros instrumentos financeiros existentes (JO L 185, p. 9), confiou por missão aos fundos estruturais, designadamente, promover o desenvolvimento e o ajustamento estrutural das regiões menos desenvolvidas e a aceleração da adaptação das estruturas agrícolas e a promoção do desenvolvimento das zonas rurais, na perspectiva da reforma da política agrícola comum [artigo 1.°, n.° 1, e n.° 5, alíneas a) e b)]. Este regulamento foi alterado pelo Regulamento (CEE) n.° 2081/93, do Conselho, de 20 de Julho de 1993 (JO L 193, p. 5).

2
Na sua versão inicial, o artigo 5.°, n.° 2, alínea e), do Regulamento n.° 2052/88 dispunha que a intervenção financeira dos fundos estruturais podia tomar a forma de apoio à assistência técnica e aos estudos preparatórios da definição das acções. Na redacção dada pelo Regulamento n.° 2081/93, dispõe que a intervenção financeira dos fundos estruturais pode assumir a forma de apoio à assistência técnica, incluindo as medidas de preparação, apreciação, acompanhamento e avaliação das acções e os projectos‑piloto e de demonstração.

3
Em 19 de Dezembro de 1988, o Conselho adoptou o Regulamento (CEE) n.° 4256/88 que estabelece disposições de aplicação do Regulamento (CEE) n.° 2052/88 no que respeita ao Fundo Europeu de Orientação e de Garantia Agrícola (FEOGA), Secção «Orientação» (JO L 374, p. 25). Este regulamento foi alterado pelo Regulamento (CEE) n.° 2085/93 do Conselho, de 20 de Julho de 1993 (JO L 193, p. 44).

4
O artigo 8.° do Regulamento n.° 4256/88 dispunha, na sua versão inicial, que a contribuição do FEOGA para a realização da intervenção referida no artigo 5.°, do n.° 2, alínea e), do Regulamento n.° 2052/88 podia abranger, designadamente, a realização de projectos‑pilotos relativos à promoção do desenvolvimento das zonas rurais, incluindo o desenvolvimento e a valorização das florestas (primeiro travessão) e a realização de projectos de demonstração destinados a mostrar aos agricultores as possibilidades reais de sistemas, métodos e técnicas de produção correspondentes aos objectivos da reforma da política agrícola comum (quarto travessão). Na redacção que lhe foi dada pelo Regulamento n.° 2085/93, este artigo dispõe que, no cumprimento das suas missões, o FEOGA pode financiar, até ao limite de 1% da sua dotação anual, designadamente, a realização de projectos‑pilotos [relativos] à adaptação das estruturas agrícolas e silvícolas e à promoção do desenvolvimento rural, e a realização de projectos de demonstração, incluindo projectos relativos ao desenvolvimento e à valorização das florestas, bem como projectos relativos à transformação e comercialização de produtos agrícolas destinados a demonstrar as possibilidades reais de sistemas, métodos e técnicas de produção e de gestão que correspondam aos objectivos da política agrícola comum.

5
Em 19 de Dezembro de 1988, o Conselho adoptou igualmente o Regulamento (CEE) n.° 4253/88 que estabelece as disposições de aplicação do Regulamento (CEE) n.° 2052/88 no que respeita à coordenação entre as intervenções dos diferentes fundos estruturais, por um lado, e entre estas e as do Banco Europeu de Investimento e dos outros instrumentos financeiros existentes, por outro (JO L 374, p. 1). Este regulamento foi alterado pelo Regulamento (CEE) n.° 2082/93 do Conselho, de 20 de Julho de 1993 (JO L 193, p. 20).

6
O artigo 24.° do Regulamento n.° 4253/88, com a epígrafe «Redução, suspensão e supressão da contribuição», dispõe, na sua versão inicial:

«1.    Se a realização de uma acção ou medida apenas parecer justificar uma parte da contribuição financeira que lhes foi concedida, a Comissão procederá a uma análise adequada do caso, no âmbito da parceria, solicitando nomeadamente ao Estado‑Membro ou às outras autoridades por ele designadas para a execução da acção que apresentem as suas observações num determinado prazo.

2.      Após esta análise, a Comissão pode reduzir ou suspender a contribuição para a acção ou medida em causa, se for confirmada a existência de uma irregularidade ou, designadamente, de uma alteração importante que afecte a natureza ou as condições de execução da acção ou da medida e para a qual não tenha sido solicitada a aprovação da Comissão.

3.      Qualquer soma que dê lugar a reposição deve ser devolvida à Comissão. As somas não devolvidas são susceptíveis de ser acrescidas de juros de mora, de acordo com as disposições do regulamento financeiro e segundo as regras a adoptar pela Comissão, nos termos do disposto no Título VIII.»

7
Na redacção dada pelo Regulamento n.° 2082/93, o artigo 24.° dispõe o seguinte:

«1.    Se a realização de uma acção ou de uma medida parecer não justificar, nem em parte nem na totalidade, a contribuição financeira que lhe foi atribuída, a Comissão procederá a uma análise adequada do caso no âmbito da parceria, solicitando nomeadamente ao Estado‑Membro ou às outras autoridades por ele designadas para a execução da acção que apresentem as suas observações num determinado prazo.

2.      Após essa análise, a Comissão poderá reduzir ou suspender a contribuição para a acção ou para a medida em causa se a análise confirmar a existência de uma irregularidade ou de uma alteração importante que afecte a natureza ou as condições de execução da acção ou da medida, e para a qual não tenha sido solicitada a aprovação da Comissão.

3.      Qualquer verba que dê lugar a reposição deve ser devolvida à Comissão. As verbas não devolvidas são acrescidas de juros de mora, em conformidade com as disposições do Regulamento Financeiro e segundo as regras a adoptar pela Comissão, de acordo com os processos referidos no Título VIII».

8
O artigo 25.° do Regulamento n.° 4253/88, na redacção dada pelo Regulamento n.° 2082/93, prevê, no que diz respeito ao acompanhamento do projecto:

«1.    No âmbito da parceria, a Comissão e os Estados‑Membros assegurarão um acompanhamento eficaz da aplicação da contribuição dos fundos a nível dos quadros comunitários de apoio e das acções específicas (programas, etc.). Esse acompanhamento será assegurado por meio de relatórios elaborados em conformidade com processos aprovados de comum acordo, de controlos por amostragem e de comités constituídos para esse efeito.

2.      O acompanhamento será assegurado por meio de indicadores físicos e financeiros definidos na decisão da Comissão que aprova as acções em causa. Esses indicadores referem‑se ao carácter específico da acção em causa, aos seus objectivos e à forma da intervenção, bem como à situação socioeconómica e estrutural do Estado‑Membro em que a contribuição deverá ser aplicada. Esses indicadores serão estruturados de forma a que possam evidenciar, relativamente às acções em causa:

a evolução da operação, bem como os objectivos a atingir dentro de um prazo determinado,

os progressos da gestão e os eventuais problemas conexos.

3.      Os comités de acompanhamento serão criados, no âmbito da parceria, por força de um acordo entre o Estado‑Membro em causa e a Comissão. A Comissão e, se for caso disso, o BEI podem estar representados nesses comités.

4.      Em relação às acções plurianuais, a autoridade designada para esse efeito pelo Estado‑Membro enviará à Comissão relatórios sobre os progressos realizados, no prazo de seis meses a contar do fim de cada ano completo de execução. Será igualmente enviado à Comissão um relatório final, no prazo de seis meses a contar da data de conclusão da acção. Em relação às acções com uma duração inferior a dois anos, a autoridade designada para esse efeito pelo Estado‑Membro apresentará um relatório à Comissão no prazo de seis meses após a conclusão da acção.

[…]»


Contexto factual

I – Pedido de contribuição comunitária relativo ao projecto Endovena

9
Em 12 de Outubro de 1992, a recorrente dirigiu à Comissão um pedido de contribuição comunitária ao abrigo do artigo 8.° do Regulamento n.° 4256/88 para um projecto‑piloto e de demonstração da utilização de uma nova tecnologia Endovena nas árvores de fruto (projecto n.° 92.IT.06.069, a seguir «projecto» ou «projecto Endovena»). Resulta desse pedido que o projecto Endovena pretendia demonstrar a possibilidade de reduzir os custos de fertilização e de tratamento antiparasita de diversas variedades de árvores de fruto graças a uma técnica baseada na injecção «intravenosa» de elementos nutrientes e anticriptogâmicos sob uma forma já elaborada e, por conseguinte, assimiláveis directamente pelo tronco.

10
Segundo o pedido, o projecto devia desenrolar‑se em três fases. Numa primeira fase, dita «agronómica», o método Endovena devia ser posto em prática aplicando‑o a diferentes árvores de fruto, a saber macieiras, pereiras, ameixieiras, pessegueiros, alpercheiros e actinídias (plantas cujos frutos são os quivis). Estava prevista a colheita de dados sobre o desenrolar desta fase e o controlo dos seus resultados. Durante a segunda fase, dita «agro‑industrial», os frutos produzidos de acordo com o sistema Endovena deviam ser comparados com frutos produzidos tradicionalmente, por um lado, por testes laboratoriais, e, por outro, quanto à sua conservação. A terceira fase, consagrada à divulgação dos resultados dos projectos, devia incluir a concepção e a produção de suportes escritos e audiovisuais. O pedido indicava que a duração de implementação do projecto Endovena seria de 24 meses e o seu custo total de 2 084 000 ecus.

II – Concessão da contribuição comunitária e desenrolar do projecto

11
Através da sua Decisão C (92) 3124, de 3 de Dezembro de 1992 (a seguir «decisão de concessão»), a Comissão atribuiu à recorrente um subsídio do FEOGA, Secção «Orientação», para o projecto Endovena (artigo 1.°). Segundo o artigo 2.° da decisão de concessão, o período de realização do projecto Endovena era fixado em 24 meses, ou seja, de Dezembro de 1992 a Novembro de 1994. Por força do artigo 3.° da decisão de concessão, o custo comparticipável do projecto era de 2 072 000 ecus e a contribuição financeira máxima da Comunidade de 1 036 000 ecus. Essa disposição acrescentava que, se os custos finais demonstrassem uma redução do custo comparticipável em relação ao inicialmente previsto, o montante da ajuda seria reduzido proporcionalmente.

12
Em conformidade com as condições financeiras fixadas no anexo II da decisão de concessão, a Comissão estava autorizada, para efeitos da verificação das relações financeiras relativas às diferentes despesas, a pedir para examinar todo e qualquer documento original ou a sua cópia autenticada e a proceder a este exame directamente no local ou a pedir o envio dos documentos em questão (ponto 5). Precisava‑se igualmente que, se uma das condições mencionadas neste anexo não fosse respeitada ou se fossem desenvolvidas acções não previstas no anexo I, a Comunidade podia suspender, reduzir ou suprimir a contribuição e exigir a restituição do que tivesse sido pago (ponto 10).

13
Em 8 de Dezembro de 1992, a Comissão pagou à recorrente uma primeira fatia de 414 000 ecus, ou seja, 40% da contribuição comunitária. Em 7 de Julho de 1993, ordenou o pagamento de uma segunda fatia, num montante de 310 800 ecus, ou seja, 30% da contribuição, que a recorrente recebeu em 5 de Agosto de 1993. A terceira fatia não foi paga.

14
Em 19 e 22 de Julho de 1993, a Comissão procedeu a um controlo no local do projecto. O relatório elaborado sobre esta missão de controlo não revela quaisquer irregularidades.

15
Por cartas de 29 de Março de 1994 e de 11 de Julho de 1994, a recorrente comunicou o estado de adiantamento dos trabalhos e pediu um adiamento da data fixada para a conclusão do projecto em razão das condições climatéricas desfavoráveis durante a colheita de 1994. Por nota de 15 de Setembro de 1994, a Comissão concedeu o adiamento solicitado e fixou a data de conclusão em 3 de Dezembro de 1995.

16
No entanto o projecto terminou com a demonstração, no caso concreto, da ineficácia da técnica Endovena face aos objectivos fixados.

17
Por carta de 14 de Maio de 1996, a recorrente indicou à Comissão que os trabalhos relativos ao projecto tinham sido regularmente terminados em 31 de Dezembro de 1995. Acrescentou que estava em curso a redacção dos relatórios e que «o relatório final e as avaliações económicas dos resultados obtidos por uma descrição metodológica dos instrumentos utilizados para a sua difusão» seriam enviados o mais rapidamente possível. A Comissão não respondeu a esta carta. O relatório final sobre o projecto foi transmitido à Comissão em 10 de Setembro de 1997.

III – Controlos efectuados no local em Julho de 1997

18
Na sequência de uma auditoria do Tribunal de Contas das Comunidades Europeias efectuada em Janeiro de 1997 sobre um projecto irlandês, a Comissão decidiu proceder a uma série de controlos sobre um determinado número de projectos beneficiando de apoios financeiros ao abrigo do artigo 8.° do Regulamento n.° 4256/88, porque suspeitava da existência de uma rede organizada para obtenção fraudulenta de subsídios comunitários. O projecto Endovena foi submetido a esses controlos.

19
Em 17 e 18 de Julho de 1997, em conformidade com o artigo 23.° do Regulamento n.° 4253/88, foi efectuado junto da recorrente um controlo no local do projecto Endovena. Neste controlo participaram funcionários de diferentes serviços da Comissão, entre os quais a unidade de coordenação da luta antifraude (UCLAF), funcionários do Estado italiano e, pela recorrente, o seu administrador único da altura, L. Biego, bem como os seus advogados. A UCLAF redigiu um relatório com os resultados do controlo.

20
Com base nas conclusões do relatório referido no número anterior, a Comissão considerou dispor de elementos suficientes para desencadear o procedimento de análise na acepção do artigo 24.° do Regulamento n.° 4253/88 e do ponto 10 do anexo II da decisão de concessão.

IV – Procedimento administrativo

21
Por carta de 3 de Abril de 1998, a Comissão comunicou à recorrente os elementos susceptíveis de constituírem irregularidades na acepção do artigo 24.° do Regulamento n.° 4253/88 e convidou‑a a apresentar, no prazo de seis semanas, as explicações e os documentos contabilísticos e administrativos comprovando o integral cumprimento das obrigações que lhe tinham sido impostas pela decisão de concessão.

22
Paralelamente enviou um pedido de observações à República Italiana. No entanto, a Comissão não recebeu nenhuma observação da parte das autoridades italianas.

23
O prazo concedido à recorrente foi várias vezes prorrogado devido à apreensão dos documentos administrativos e contabilísticos relativos ao projecto pela Procura della Repubblica competente, no âmbito de uma instrução penal aberta em relação a L. Biego pelos delitos de burla em detrimento da Comunidade Europeia e de fraude fiscal. Informado pelo juiz nacional da decisão de restituição dos documentos, a Comissão convidou novamente a sociedade beneficiária, por carta de 26 de Abril de 2000, a comunicar‑lhe as suas observações no prazo de seis semanas. Por carta de 12 de Junho de 2000, a recorrente apresentou as suas observações às quais anexou uma peritagem técnica efectuada no âmbito do referido processo penal bem como declarações e relatórios.

24
O processo penal relativo a L. Biego terminou com um acórdão do Giudice per le indagini preliminari del Tribunale di Fermo, de 15 de Janeiro de 2001, ordenando o arquivamento do processo por prescrição da infracção no que respeita ao crime de burla, requalificado de crime de obtenção abusiva de pagamentos em detrimento do Estado, e a absolvição no que respeita à fraude fiscal.

V – Decisão impugnada

25
Mediante Decisão C (2001) 1274, de 6 de Junho de 2001, a Comissão suprimiu, por força do artigo 24.°, n.° 2, do Regulamento n.° 4253/88, a contribuição financeira concedida à Euroagri e exigiu que esta repusesse a quantia de 725 200 euros que tinha recebido como contribuição (a seguir «decisão impugnada»).


Tramitação e pedidos das partes

26
Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 3 de Agosto de 2001, a recorrente interpôs o presente recurso.

27
Em requerimento separado, apresentado na Secretaria do Tribunal no mesmo dia, a recorrente apresentou também um pedido de suspensão da execução da decisão impugnada. Por despacho de 10 de Setembro de 2001, o presidente do Tribunal julgou inadmissível o pedido de medidas provisórias reservando para final a decisão quanto às despesas.

28
No quadro das medidas de organização do processo, o Tribunal convidou as partes a responderem a questões escritas e solicitou à Comissão a apresentação de determinados documentos. As partes transmitiram as suas respostas e os documentos pedidos no prazo fixado.

29
As partes foram ouvidas nas suas alegações e nas respostas às questões colocadas pelo Tribunal na audiência de 25 de Março de 2003.

30
Na audiência, o Tribunal convidou a Comissão a responder por escrito a uma questão, o que ela fez no prazo fixado para o efeito. Tendo a recorrente apresentado as suas observações sobre a resposta da Comissão no prazo fixado, o presidente da Segunda Secção do Tribunal encerrou a fase oral em 14 de Maio de 2003.

31
A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

anular a decisão impugnada;

subsidiariamente, anular parcialmente a decisão impugnada e reduzir, na proporção do investimento efectivamente realizado, a contribuição que lhe foi concedida;

ordenar a apresentação pela Comissão da totalidade dos relatórios por ela enviados relativamente ao projecto Endovena, a audição de determinadas testemunhas e a sua comparência pessoal bem como uma peritagem ou uma verificação no local.

32
Na réplica, pede além disso que o anexo 6 da contestação (relatório de controlo da Direcção‑Geral do Controlo Financeiro da Comissão), de que foram omitidas certas partes, seja desentranhado dos autos, a não ser que o documento integral tenha sido apresentado na Secretaria.

33
A Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne:

negar provimento ao recurso;

condenar a recorrente nas despesas.


Questão de direito

I – Quanto ao pedido principal

34
Nos seus articulados, a recorrente deduz cinco fundamentos em apoio do seu recurso de anulação. O primeiro fundamento assenta na falta de fundamentação e na violação do princípio do contraditório. Os segundo e terceiro fundamentos assentam, respectivamente, na violação do artigo 24.° do Regulamento n.° 4253/88 e na violação do artigo 25.° do mesmo regulamento. Através do quarto fundamento, intitulado «falta de lógica, inadequação e carência absoluta de fundamentação», a recorrente contesta, essencialmente, as verificações da decisão impugnada relativas às irregularidades pelas quais a contribuição foi suprimida. Com o quinto fundamento, a recorrente imputa à Comissão uma violação do princípio da proporcionalidade.

A – Quanto à aplicabilidade das diferentes versões dos Regulamentos n.os 2052/88, 4253/88 e 4256/88

35
Liminarmente, há que determinar qual das sucessivas versões dos Regulamentos n.os 2052/88, 4253/88 e 4256/88 é aplicável no caso vertente. A contribuição comunitária para o projecto Endovena foi concedida em Dezembro de 1992, portanto antes da entrada em vigor, em 3 de Agosto de 1993, dos Regulamentos n.os 2081/93, 2082/93 e 2085/93. As disposições transitórias constantes destes últimos regulamentos, ou seja, o artigo 15.° do Regulamento n.° 2081/93, o artigo 33.° do Regulamento n.° 2082/93 e os artigos 10.° a 11.°‑A do Regulamento n.° 2082/93, não visam expressamente as disposições relativas ao controlo financeiro, à supressão das contribuições e ao acompanhamento dos projectos, mais especialmente pertinentes para o presente litígio.

36
Resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça e do Tribunal de Primeira Instância que as regras processuais se aplicam a todos os litígios pendentes no momento em que as mesmas entram em vigor, ao passo que não é esse o caso das normas substantivas. Estas últimas são habitualmente interpretadas no sentido de apenas se aplicarem a situações estabelecidas anteriormente à sua entrada em vigor na medida em que resulte claramente dos seus termos, finalidade ou economia que um tal efeito lhes deve ser atribuído (acórdão do Tribunal de Justiça de 12 de Novembro de 1981, Salumi e o., 212/80 a 217/80, Recueil, p. 2735, n.° 9, e acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 19 de Fevereiro de 1998, Eyckeler & Malt/Comissão, T‑42/96, Colect., p. II‑401, n.os 54 e segs.). As condições de concessão da contribuição, as obrigações do beneficiário e as condições em que pode ser suprimida uma contribuição pertencem às normas substantivas. Esses aspectos do presente litígio regem‑se portanto, em princípio, pelos Regulamentos n.os 2052/88, 4253/88 e 4256/88 nas suas versões iniciais. Em contrapartida, no que respeita aos controlos efectuados pela Comissão e às obrigações da Comissão e dos Estados‑Membros relativas ao acompanhamento dos projectos, trata‑se de disposições processuais, aplicáveis na sua nova versão, a partir da entrada em vigor dos regulamentos de 1993, às contribuições concedidas anteriormente.

37
Há que precisar que a supressão da contribuição comunitária em razão de irregularidades imputadas ao beneficiário tem carácter de sanção, quando não se limita à restituição dos montantes indevidamente pagos em razão destas irregularidades, e é imposta com uma finalidade dissuasora (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 26 de Setembro de 2002, Sgaravatti Mediterranea/Comissão, T‑199/99, Colect., p. II‑3731, n.° 127). Só é portanto admissível se for justificada tanto à luz da antiga como da nova versão do artigo 24.° do Regulamento n.° 4253/88. Ora, como a Comissão sublinhou acertadamente nas suas respostas às questões do Tribunal, as alterações introduzidas nesta disposição pelo Regulamento n.° 2082/93 são de natureza puramente formal e não têm qualquer incidência sobre o âmbito do mesmo.

B – Quanto ao primeiro fundamento, assente na falta de fundamentação e na violação do princípio do contraditório

1.     Argumentos das partes

38
A recorrente afirma que a Comissão ignorou o dever de fundamentação consagrado no artigo 253.° CE porque não respondeu às observações apresentadas na sua carta de 12 de Junho de 2000 e porque não tomou em consideração os numerosos documentos produzidos nessa ocasião. Segundo a recorrente, o respeito do princípio do contraditório obriga a Comissão a fundamentar uma decisão não só quanto à existência das violações e irregularidades contestadas, mas também quanto à inexistência de fundamento ou de pertinência dos argumentos invocados em defesa. Na réplica, acusa além disso a Comissão de não ter explicado na sua contestação as razões detalhadas por que não considerou fundados certos aspectos das observações apresentadas na sua carta de 12 de Junho de 2000. Invoca, a este respeito, uma violação do direito de defesa.

39
Na audiência, a recorrente acrescentou que a Comissão apresentou, pouco antes da audiência, o relatório final entregue pela recorrente em 10 de Dezembro de 1997. Daqui deduz que esse relatório não foi tomado em consideração quando a Comissão deu início ao procedimento de supressão da contribuição. A recorrente considera que tal constitui uma violação grave do dever de fundamentação.

40
Segundo a Comissão, a decisão impugnada encontra‑se correctamente fundamentada.

2.     Apreciação do Tribunal

41
Segundo jurisprudência constante, por força do artigo 253.° CE, a fundamentação de um acto deve deixar transparecer, de forma clara e inequívoca, o raciocínio seguido pela autoridade comunitária, autora do acto impugnado, por forma a permitir que os interessados conheçam as razões da medida adoptada a fim de poderem defender os seus direitos e ao juiz comunitário exercer o seu controlo. O alcance do dever de fundamentação depende da natureza do acto em causa, do contexto em que o mesmo foi adoptado e do conjunto das normas jurídicas que regem a matéria em causa (acórdão do Tribunal de Justiça de 14 de Fevereiro de 1990, Delacre e o./Comissão, C‑350/88, Colect., p. I‑395, n.os 15 e 16; acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 13 de Março de 2003, Comunità montana della Valnerina/Comissão, T‑340/00, Colect., p. I‑0000, n.° 82).

42
Em especial, tendo em conta o facto de que uma decisão que suprime uma contribuição financeira comunitária acarreta consequências graves para o beneficiário dessa contribuição, a fundamentação desta decisão deve revelar claramente os fundamentos que a justificam (v., por analogia, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 3 de Fevereiro de 2000, CCRE/Comissão, T‑46/98 e T‑151/98, Colect., p. II‑167, n.° 48).

43
No caso vertente, tanto a carta de 3 de Abril de 1998, pela qual a Comissão comunicou à recorrente os elementos susceptíveis de constituírem irregularidades na acepção do artigo 24.° do Regulamento n.° 4253/88, como a decisão impugnada enunciam de forma clara e inequívoca as razões subjacentes à supressão da contribuição. Além disso, a recorrente tinha participado no controlo efectuado em 1997, tendo o seu administrador assinado a acta do mesmo, e tinha pleno conhecimento do relatório da UCLAF elaborado na sequência desse controlo. A recorrente demonstrou ainda, pelos fundamentos deduzidos nos seus articulados, que tinha efectivamente compreendido o raciocínio da Comissão.

44
Nestas condições, a tese da recorrente segundo a qual a Comissão devia ter respondido expressamente a todos os argumentos perante ela invocados antes da adopção da decisão impugnada não pode ser acolhida. Essa obrigação também não pode resultar do princípio do contraditório.

45
Quanto à acusação suscitada na audiência segundo a qual os serviços da Comissão não tiveram em conta, quando da decisão de suprimir a contribuição, o relatório final apresentado pela recorrente em 10 de Setembro de 1997, não respeita, na essência, à fundamentação da decisão, mas sim ao processo que precedeu a adopção desse acto. A mesma será examinada infra no âmbito do segundo fundamento (v., infra, n.os 64 a 67).

46
Daqui resulta que o primeiro fundamento da recorrente não é procedente.

C – Quanto ao segundo fundamento, assente na violação do artigo 24.° do Regulamento n.° 4253/88

1.     Argumentos das partes

47
Com este fundamento, dividido em três partes, a recorrente alega que a decisão impugnada não foi precedida de uma análise adequada do caso conforme previsto no artigo 24.°, n.° 1, do Regulamento n.° 4253/88.

48
No âmbito da primeira parte do fundamento, a recorrente tinha acusado a Comissão, na petição, de ter violado a obrigação, constante do artigo 24.°, n.° 1, do Regulamento n.° 4253/88, de solicitar ao Estado‑Membro ou às autoridades por ele designadas para a execução da acção que apresentem as suas observações num determinado prazo. Tendo sabido, pela contestação da Comissão, que as autoridades italianas tinham sido avisadas da abertura do procedimento administrativo e que não tinham apresentado observações, a recorrente critica a Comissão por não ter sido informada desse facto.

49
No âmbito da segunda parte do fundamento, a recorrente sustenta que a obrigação de proceder a uma análise adequada do caso foi igualmente violada pelo facto de a Comissão se ter baseado, na decisão impugnada, essencialmente nos resultados do controlo efectuado em 1997. Por um lado, alega que a Comissão, depois de ter efectuado um primeiro controlo do projecto em 1993, não podia proceder a um segundo controlo em 1997. Por outro, critica as modalidades desse controlo que se opõem, em sua opinião, à tomada em consideração dos seus resultados.

50
Segundo a recorrente, a Comissão não pode justificar o segundo controlo pelo facto de terem surgido, posteriormente ao primeiro controlo de 1993, elementos susceptíveis de pôr em dúvida a regularidade das despesas declaradas ao abrigo do projecto. A auditoria feita pelo Tribunal de Contas em 1997 disse respeito a factos alheios ao projecto Endovena e à recorrente de onde não se pode deduzir que o financiamento no presente projecto tem igualmente carácter fraudulento. A recorrente critica a Comissão por ter seguido a hipótese de que ela era culpada e de ter procurado elementos de prova em apoio dessa hipótese. Tal forma de actuação não permite à Comissão apreciar correctamente os factos.

51
Quanto à validade dos resultados do controlo de 1997, a recorrente alega que os mesmos contradizem, na sua essência, os do controlo precedente de 1993. Assim, considera que a Comissão violou o seu direito de defesa. Precisa que o controlo de 1997, realizado numa data relativamente afastada da conclusão do projecto, só durou dois dias. Segundo a recorrente, é impossível examinar de forma adequada uma questão tão complexa em tão pouco tempo e apenas com três funcionários. A recorrente contesta o conteúdo do relatório elaborado na sequência deste controlo afirmando que as críticas que lhe são feitas não assentam em nenhum elemento de prova a não ser as declarações dos controladores. Na audiência, acrescentou que o relatório relativo a este controlo junto como anexo 6 à contestação não era válido em razão de numerosas omissões que contém e porque não está datado. Pensa que o desentranhamento dos autos deste documento, por ela solicitado, privaria de validade a prova das violações que lhe são imputadas.

52
No âmbito da terceira parte do fundamento, desenvolvida na audiência, a recorrente alega que a obrigação de proceder a uma análise adequada do caso foi também violada porque o relatório final preparado por ela não foi tomado em consideração. Em resposta a uma questão do Tribunal, a recorrente explicou que não podia invocar a existência desse relatório final antes da sua apresentação pela Comissão, porque a documentação relativa ao projecto Endovena de que dispunha tinha sido apreendida pelo Ministério Público no âmbito do processo penal instaurado em Itália e porque essa documentação não lhe tinha sido integral e correctamente restituída no termo do mesmo.

53
Quanto à primeira parte do fundamento, a Comissão indica que tinha pedido às autoridades italianas que apresentassem as suas observações, em conformidade com a obrigação prevista no artigo 24.°, n.° 1, do Regulamento n.° 4253/88. Considera que não existe qualquer obrigação de informar o particular de tal consulta.

54
No que diz respeito à segunda parte do fundamento, a Comissão replica que o controlo realizado em Julho de 1997 era um controlo aprofundado, efectuado por seis funcionários no espaço de dois dias e incluindo uma ida ao local, com visita dos terrenos em causa. Esse exame ter‑se‑á desenrolado em várias fases e terá tido uma duração superior à estimada pela recorrente. A Comissão considera que a recorrente não pode alegar que este controlo foi efectuado muito antes da conclusão do projecto, porque este não foi concluído regularmente. Segundo a Comissão, as divergências eventuais entre os resultados dos dois controlos, realizados em 1993 e em 1997, não são determinantes e o controlo realizado em 1997 era legítimo, tendo a superveniência de elementos novos feito surgir dúvidas quanto à regularidade das despesas declaradas. Na tréplica, a Comissão precisa que controlou, na sequência da auditoria do Tribunal de Contas, todos os projectos ainda em curso financiados ao abrigo do artigo 8.° do Regulamento n.° 4256/88, ou seja, 107 projectos, e não apenas o projecto da recorrente. Não teria assim qualquer ideia preconcebida contra a recorrente.

2.     Apreciação do Tribunal

55
Com o presente fundamento, a recorrente critica, em suma, o processo que conduziu à adopção da decisão impugnada. O mesmo deve portanto ser examinado à luz do Regulamento n.° 4253/88, alterado.

56
A primeira parte do fundamento limita‑se assim à acusação de que a Comissão não informou a recorrente do facto de ter dado às autoridades italianas a possibilidade de apresentarem as suas observações sobre a eventual supressão da contribuição e de as mesmas não a terem utilizado. No entanto, da regulamentação aplicável não resulta qualquer obrigação neste sentido. Por conseguinte, a primeira parte do fundamento não é procedente.

57
No que diz respeito à segunda parte do fundamento, o artigo 23.°, n.° 2, último parágrafo, do Regulamento n.° 4253/88, alterado, dispõe que «a Comissão providenciará no sentido de que os controlos por si realizados sejam efectuados de maneira coordenada, por forma a evitar a repetição de controlos em relação a um mesmo objecto e num mesmo período». Esta disposição visa, na realidade, evitar controlos repetitivos do mesmo projecto. Obriga assim a Comissão a organizar as suas actividades de controlo segundo os princípios de uma boa administração. No entanto, não proíbe controlos repetitivos enquanto tais (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 7 de Novembro de 2002, Vela e Tecnagrind/Comissão, T‑141/99, T‑142/99, T‑150/99 e T‑151/99, Colect., p. II‑4547, n.os 99 a 102).

58
É nomeadamente legítimo que a Comissão reitere os controlos quando existam elementos novos que demonstrem ser oportunos controlos mais aprofundados de determinados projectos. No caso vertente, esses elementos novos resultavam das auditorias do Tribunal de Contas. As irregularidades detectadas por este no desenrolar de certos projectos constituíam uma justificação suficiente para controlar outros projectos similares, seja sistematicamente, seja por amostragem, mesmo se estes projectos já tinham sido controlados anteriormente.

59
O facto de os resultados do segundo controlo serem diferentes dos do controlo efectuado em 1993 não se opõe à sua tomada em consideração. Como a Comissão assinalou acertadamente, o relatório de 1993 não contém verificações expressas, assentes nos controlos efectivamente realizados pelos funcionários da Comissão, que estejam em contradição com os resultados do controlo de 1997. De qualquer forma, é normal que um controlo feito em razão de elementos novos, que deram origem à suspeita de que existem fraudes respeitantes a certos projectos, seja mais aprofundado e dê resultados diferentes de um controlo de rotina, realizado na ausência de qualquer suspeita.

60
Quanto à acusação segundo a qual o tempo consagrado ao controlo de 1997 não era suficiente para conduzir a resultados fiáveis, decorre do relatório de missão que constitui o anexo 5 da petição que três funcionários da Comissão e três funcionários do Estado italiano participaram no controlo efectuado, em 17 e 18 de Julho de 1997, junto da recorrente. Ora, a intervenção de seis funcionários durante dois dias deve ser considerada suficiente para recolher os elementos em que assenta a decisão impugnada. A Comissão assinala igualmente com razão que a «análise adequada do caso» não consistiu apenas no controlo efectuado em Julho de 1997, mas incluiu igualmente a análise dos resultados do controlo pelos serviços da Comissão, o convite dirigido ao beneficiário e ao Estado‑Membro em causa para apresentarem as suas observações e a análise pela Comissão destas observações e dos documentos que as acompanham.

61
A acusação segundo a qual o controlo se teria realizado numa data muito afastada da conclusão do projecto também não é procedente. O período de cerca de um ano entre a comunicação da conclusão do projecto e o controlo não pode ser qualificado de excessivo, nomeadamente porque o artigo 23.°, n.° 3, do Regulamento n.° 4253/88, tanto na antiga versão, aplicável ao caso vertente, como na versão alterada, dispõe que, «durante os três anos subsequentes ao último pagamento relativo a uma acção, o organismo e as autoridades responsáveis devem manter à disposição da Comissão todos os documentos comprovativos relativos às despesas referentes a essa acção». Além disso, o ponto 6 do anexo II da decisão de concessão obriga o beneficiário a manter à disposição da Comissão, durante cinco anos a partir do último pagamento da contribuição, os originais de todos os documentos comprovando as despesas efectuadas. Esta circunstância demonstra que o beneficiário de uma contribuição comunitária não deve estranhar controlos nos três, ou até nos cinco, anos subsequentes ao pagamento da última fatia do financiamento. Além disso, o controlo ocorreu antes de a recorrente ter apresentado, em 10 de Setembro de 1997, o relatório final respeitante ao projecto.

62
Quanto às acusações deduzidas pela recorrente em relação ao controlo apresentado como anexo 6 da contestação, há que assinalar que esse documento não é o único que comprova resultados do controlo efectuado em 1997. Nomeadamente, a própria recorrente apresentou, como anexo 5 da petição, um relatório de missão, com data de 19 de Agosto de 1997, relativo ao mesmo controlo, a que vem anexada uma acta assinada, entre outros, por L. Biego, então administrador da recorrente. Há que acrescentar que a questão de saber se as irregularidades imputadas à recorrente pela decisão impugnada se podem considerar provadas não é abrangida pelo presente fundamento e será examinada a seguir, no âmbito do quarto fundamento.

63
Por conseguinte, a segunda parte do fundamento não é procedente.

64
No que diz respeito à terceira parte do fundamento, assente na circunstância de a Comissão não ter tomado em consideração o relatório final, assinale‑se que, nos termos do artigo 48.°, n.° 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, é proibido deduzir novos fundamentos no decurso da instância, a menos que tenham origem em elementos de direito e de facto que se tenham revelado durante o processo.

65
Há portanto que verificar se a apresentação, pela Comissão, do relatório final sobre o projecto Endovena, pouco tempo antes da audiência no presente processo, pode ser considerada um elemento novo, susceptível de permitir à recorrente deduzir novos fundamentos. Cabe sublinhar que esse relatório é um documento elaborado pela própria recorrente, tendo, com os seus anexos, cerca de 300 páginas.

66
A recorrente não explicou de forma convincente por que razão não invocou a existência desse relatório durante a fase escrita, nomeadamente, para contestar a afirmação da Comissão segundo a qual o relatório final sobre o projecto Endovena nunca tinha sido apresentado. É um facto que a recorrente alegou a apreensão de toda a documentação relativa ao projecto pelo Ministério Público italiano. No entanto tal documentação tinha sido restituída antes da adopção da decisão impugnada. Além disso a recorrente afirmou, na audiência, que o Ministério Público não lhe tinha restituído integralmente a documentação apreendida. Mesmo supondo que esta alegação, não apoiada por nenhum elemento probatório, é exacta, tal circunstância não explica que os responsáveis pela gestão da recorrente, e nomeadamente L. Biego, que era o seu único administrador para o período de 20 de Novembro de 1996 a 14 de Dezembro de 2000, não tenham podido informar o advogado da recorrente da elaboração deste relatório e da sua apresentação à Comissão. O facto de a recorrente não ter invocado a existência do relatório durante a fase escrita só pode portanto explicar‑se por uma falta de diligência dos responsáveis pela sua gestão. Por conseguinte, a apresentação desse relatório pela Comissão depois do termo da fase escrita, por lamentável que seja essa comunicação intempestiva, não pode ser qualificada de elemento novo, susceptível de justificar a apresentação de fundamentos novos.

67
Assim, a terceira parte do presente fundamento é inadmissível.

68
Por conseguinte, o segundo fundamento, assente no facto de que a Comissão não teria procedido a uma análise adequada do caso da recorrente, deve ser afastado.

D – Quanto ao terceiro fundamento, assente na violação do artigo 25.° do Regulamento n.° 4253/88

1.     Argumentos das partes

69
A recorrente alega, no âmbito da primeira parte deste fundamento, que a Comissão e o Estado italiano não respeitaram a obrigação de acompanhamento constante do artigo 25.° do Regulamento n.° 4253/88 e que, em especial, não elaboraram os relatórios sobre os progressos realizados, previstos pelo n.° 4 dessa disposição.

70
No âmbito da segunda parte do fundamento, a recorrente alega que o silêncio dos serviços encarregados da vigilância do projecto criou nela a convicção de que podia dispensar a realização da fase de divulgação e de publicidade.

71
A Comissão considera que o artigo 25.° do Regulamento n.° 4253/88 não se aplica aos projectos‑pilotos e de demonstração que beneficiam de financiamentos directos da Comissão ao abrigo do artigo 8.° do Regulamento n.° 4256/88.

2.     Apreciação do Tribunal

72
No que respeita à primeira parte do presente fundamento, basta assinalar que um incumprimento da Comissão ou das autoridades italianas de eventuais obrigações de acompanhamento não impede a aplicação, pela Comissão, dos artigos 23.° e 24.° do Regulamento n.° 4253/88 a um projecto individual. A acusação deduzida pela recorrente não tem assim qualquer incidência sobre a apreciação da legalidade da decisão impugnada.

73
A segunda parte deste fundamento, no âmbito da qual a recorrente alega que o comportamento da Comissão provocou nela uma confiança legítima ao criar a impressão que a Comissão tinha renunciado à realização da fase de divulgação dos resultados do projecto é abrangida, essencialmente, pelo quarto fundamento, no âmbito do qual a recorrente contesta que a não realização dessa fase do projecto possa ser qualificada de irregularidade. Será portanto examinada no âmbito desse fundamento.

74
Daqui resulta que o terceiro fundamento deve ser afastado.

E – Quanto ao quarto fundamento, assente na inexistência das irregularidades assinaladas na decisão impugnada

75
Com este fundamento, intitulado «falta de lógica, inadequação e carência absoluta de fundamentação», a recorrente alega, essencialmente, que as condições de supressão da contribuição exigidas pelo artigo 24.° do Regulamento n.° 4253/88 não se encontram reunidas porque os factos que lhe são imputados pela decisão impugnada não estão provados ou não podem ser qualificados de irregularidades.

76
Antes de abordar os argumentos das partes relativos às diferentes irregularidades mencionadas na decisão impugnada, há que examinar algumas questões de ordem geral, suscitadas pela recorrente.

1.     Generalidades

a)     Argumentos das partes

77
A recorrente critica, antes de mais, a Comissão por esta ter considerado diversas circunstâncias «incumprimentos», «irregularidades» ou outras «modificações do projecto» apenas porque não correspondiam ao conteúdo do pedido de contribuição. Em sua opinião, o conteúdo desse pedido não é pertinente para controlar a boa execução das suas obrigações. As suas obrigações enquanto beneficiária da contribuição resultam apenas da decisão de concessão, que lhe impõe a adopção de comportamentos determinados, objectivos específicos a alcançar e certos métodos a seguir deixando‑lhe a liberdade de escolher os meios para chegar a estes objectivos quanto ao que a mesma não regula expressamente.

78
A recorrente contesta em seguida a afirmação da Comissão segundo a qual L. Biego admitiu ter comunicado, quando do pedido de contribuição, informações inexactas à Comissão.

79
Afirma além disso que a Comissão não pode invocar, em apoio da decisão impugnada, os resultados dos controlos efectuados a partir de 1997, segundo os quais existiria uma relação entre diferentes projectos financiados com base no artigo 8.° do Regulamento n.° 4256/88 e redes constituídas com o objectivo de desvio fraudulento dos fundos comunitários obtidos, não tendo tal fundamento sido deduzido no decurso das fases que precederam a abertura do processo de supressão da contribuição.

80
Por fim, alega, na audiência, que o Tribunal de Primeira Instância julgou, no acórdão Sgaravatti Mediterranea/Comissão, referido no n.° 37 supra, que os resultados de controlos efectuados por autoridades nacionais no quadro de um processo penal podem ser elementos susceptíveis de justificar a supressão de uma contribuição. No caso vertente, tais verificações teriam igualmente ocorrido e o Ministério Público teria declarado que a recorrente tinha satisfeito todas as obrigações essenciais relativas ao projecto.

81
A Comissão afirma que o pedido assume uma importância fundamental para efeitos da aprovação do projecto e da concessão da contribuição. Precisa que, tratando‑se de um subsídio público e não de uma adjudicação de empreitada, a recorrente não tem uma autonomia total quanto à escolha dos meios a pôr em prática para alcançar os objectivos do projecto. Na audiência, a Comissão acrescentou que a recorrente não era acusada de não ter executado o projecto.

b)     Apreciação do Tribunal

82
Há que recordar, antes de mais, que o sistema de subvenções elaborado pela regulamentação comunitária assenta, nomeadamente, no cumprimento pelo beneficiário de uma série de obrigações que lhe dão direito a receber a contribuição financeira prevista. Se o beneficiário não cumprir todas essas obrigações, o artigo 24.°, n.° 2, do Regulamento n.° 4253/88, tanto na sua versão inicial como na sua versão alterada, autoriza a Comissão a reconsiderar o alcance das obrigações que assume nos termos da decisão que concede a referida contribuição (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 24 de Abril de 1996, Industrias Pesqueras Campos e o./Comissão, T‑551/93 e T‑231/94 a T‑234/94, Colect., p. II‑247, n.° 161, e de 12 de Outubro de 1999, Conserve Italia/Comissão, T‑216/96, Colect., p. II‑3139, n.os 71 e 90 a 94).

83
Do mesmo modo, os requerentes e os beneficiários de contribuições comunitárias são obrigados a fornecer à Comissão informações suficientemente precisas, sem o que o sistema de controlo e de prova instituído e que tem por fim verificar se as condições de concessão da contribuição estão preenchidas não pode funcionar correctamente. Com efeito, por falta de informações suficientemente precisas, projectos que não preenchessem as condições requeridas poderiam beneficiar de uma contribuição. Daqui resulta que a obrigação de informação e de lealdade que incumbe aos requerentes e aos beneficiários de contribuições financeiras é inerente ao sistema de participação do FEOGA e essencial para o seu bom funcionamento. A violação destas obrigações deve assim ser considerada uma irregularidade na acepção do artigo 24.° do Regulamento n.° 4253/88, alterado (v., neste sentido, acórdãos Conserve Italia/Comissão, citado no n.° 82 supra, n.° 71, Vela e Tecnagrind/Comissão, citado no n.° 57 supra, n.° 322, e Comunità montana della Valnerina/Comissão, citado no n.° 41 supra, n.° 97).

84
Há que salientar em seguida que a concessão de uma contribuição financeira está subordinada ao respeito não apenas das condições enunciadas pela Comissão na decisão de aprovação da contribuição mas também ao respeito dos termos do pedido de contribuição que foi objecto da referida decisão (acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 14 de Julho de 1997, Interhotel/Comissão, T‑81/95, Colect., p. II‑1265, n.° 42, e CCRE/Comissão, citado no n.° 42 supra, n.° 68).

85
Com efeito, a recorrente pediu a contribuição comunitária para um projecto específico que descreveu de modo detalhado no seu pedido. Essa descrição teve um papel decisivo para a decisão de concessão. Assim, a tese da recorrente segundo a qual o pedido de contribuição não é pertinente para avaliar se o projecto foi regularmente executado não pode ser acolhida.

86
Quanto à incidência do conteúdo do pedido sobre eventuais irregularidades do projecto, há que distinguir dois aspectos.

87
Por um lado, o pedido contém indicações factuais quanto à situação existente e aos antecedentes do projecto proposto. Tais indicações têm um importante papel na avaliação da validade do projecto. Se posteriormente vier a revelar‑se que as mesmas não correspondiam à realidade, a decisão de concessão da contribuição está viciada por um erro de facto e de direito devendo, por conseguinte, ser considerada ilegal. Ora, tal ilegalidade pode, em certas condições, justificar a revogação retroactiva da decisão de concessão da contribuição (acórdão do Tribunal de Justiça de 24 de Janeiro de 2002, Conserve Italia/Comissão, C‑500/99 P, Colect., p. I‑867, n.° 90). Além disso, a prestação, no pedido de contribuição, de informações erradas susceptíveis de induzir a Comissão em erro sobre circunstâncias passíveis de influenciar a decisão de concessão constitui a violação de uma obrigação essencial que incumbe aos requerentes de contribuições comunitárias e, deste modo, uma irregularidade na acepção do artigo 24.°, n.° 2, do Regulamento n.° 4253/88, tanto na sua versão inicial, como na sua versão alterada (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 6 de Março de 2003, APOL e AIPO/Comissão, T‑61/00 e T‑62/00, Colect., p. I‑0000, n.os 118 a 120).

88
Por outro lado, o pedido contém indicações quanto às acções previstas no quadro do projecto. Se estas não forem executadas do modo previsto no pedido, trata‑se de uma modificação do projecto, que, se for importante, precisa de ser aprovada pela Comissão para que o projecto possa continuar a beneficiar da contribuição (v. artigo 24.°, n.° 2, do Regulamento n.° 4253/88, na sua versão inicial, cujo sentido não foi afectado pela alteração ocorrida em 1993).

89
É um facto que a decisão de concessão da contribuição pode prever a modificação de certos aspectos do projecto relativamente ao pedido e, nesse caso, a decisão é determinante para apreciar se o projecto foi regularmente executado. Daí não pode no entanto deduzir‑se que o beneficiário não se encontra vinculado pelos termos do seu próprio pedido de contribuição na medida em que este foi aceite sem modificação expressa.

90
É portanto legítimo que a Comissão se tenha referido ao pedido de contribuição para verificar se a concessão do auxílio era justificada e se o projecto tinha sido correctamente executado.

91
Em seguida, cabe assinalar que é irrelevante em sede de resultado do presente litígio que L. Biego tenha admitido, ou não, ter comunicado informações inexactas à Comissão no âmbito do pedido de contribuição. Importa antes verificar se o pedido de contribuição continha, efectivamente, indicações inexactas.

92
A este respeito, incumbe ao beneficiário demonstrar a exactidão das indicações constantes do pedido de contribuição. Enquanto autor do pedido é ele quem está em melhores condições para o fazer, devendo comprovar que se justifica a obtenção de meios provenientes de fundos públicos (v., por analogia, acórdão Interhotel/Comissão, citado no n.° 84 supra, n.° 47).

93
Quanto ao argumento da recorrente segundo o qual a Comissão não pode invocar a existência de uma pretensa rede constituída com o objectivo de obtenção fraudulenta de contribuições comunitárias para justificar a decisão impugnada, basta assinalar que a decisão impugnada não se funda na existência de tal rede, mas em verificações especificamente respeitantes ao projecto Endovena, cuja validade será examinada no âmbito do presente fundamento. O facto de a Comissão ter feito referência, na contestação, a tal rede, a fim de descrever o contexto em que se insere o presente processo, não é portanto pertinente para apreciar a validade da decisão impugnada.

94
A recorrente também não pode contestar a decisão impugnada porque a Comissão fundou a sua decisão nos resultados dos controlos efectuados pelos seus serviços e não nos das verificações efectuadas no âmbito do processo penal nacional. A este respeito, o artigo 23.°, n.° 2, do Regulamento n.° 4253/88, alterado, autoriza a Comissão a controlar inloco, nomeadamente por amostragem, as acções financiadas pelos fundos estruturais «sem prejuízo dos controlos efectuados pelos Estados‑Membros, de acordo com as disposições […] nacionais». É um facto, conforme foi indicado no acórdão Sgaravatti Mediterrânea/Comissão, citado no n.° 37 supra (n.os 42 a 49), que a Comissão pode legitimamente fundar‑se nos resultados de um controlo efectuado por autoridades nacionais a fim de determinar se está provada a existência de irregularidades justificando uma sanção nos termos do artigo 24.° do Regulamento n.° 4253/88. Esta possibilidade não implica no entanto que a Comissão esteja vinculada pelos resultados de tais verificações nacionais. Com efeito, as verificações efectuadas no âmbito de um processo penal nacional têm uma finalidade diferente e o facto de elas chegarem à conclusão de que não existe comportamento constitutivo de um delito na acepção do direito penal nacional não permite concluir que não existe irregularidade, na acepção do artigo 24.° do Regulamento n.° 4253/88, susceptível de dar lugar a medidas no plano administrativo, nos termos dessa disposição.

95
A aplicação do artigo 24.° do Regulamento n.° 4253/88 também não pode ser aqui afastada com base em que as sanções previstas por essa disposição só se aplicariam no caso de a acção financiada não ter sido realizada no todo ou em parte. Não basta com efeito que a recorrente demonstre a correcta execução material do projecto conforme aprovado pela Comissão na decisão de concessão. A recorrente deve igualmente poder provar que todo e qualquer elemento da contribuição comunitária corresponde a uma prestação efectiva que era indispensável para a realização do projecto (v., neste sentido, acórdão Vela e Tecnagrind/Comissão, citado no n.° 57 supra, n.° 201).

2.     Quanto às diferentes irregularidades assinaladas na decisão impugnada

96
A recorrente contesta as verificações da decisão impugnada à luz de cada uma das onze irregularidades nela assinaladas.

a)     Quanto à crítica de que a técnica Endovena não foi objecto de qualquer experiência prévia

97
A decisão impugnada assinala, no considerando 8, primeiro travessão

«[…] No pedido de contribuição, indica‑se que testes utilizando a técnica ‘Endovena’ foram realizados em numerosas variedades de frutos, utilizando‑se diferentes produtos e que os resultados desses testes estão disponíveis. Os inspectores da Comissão verificaram que não tinha sido realizada nenhuma experiência prévia relativa à técnica ‘Endovena’ e que não estava disponível nenhum resultado;

[…]»

–     Argumentos das partes

98
A recorrente considera que esta crítica não é procedente. Em primeiro lugar, assinala que a Comissão teve oportunidade de apreciar as experiências efectuadas anteriormente antes de conceder a contribuição e que as julgou suficientes para aprovar e financiar o projecto Endovena.

99
Em segundo lugar, as afirmações feitas a este propósito quando do controlo de 1997 estão em contradição manifesta com as conclusões do primeiro controlo efectuado em 1993, no decurso do qual foi verificado que «foram efectuadas confrontações, análises e registos relativos aos resultados dos [do método Endovena e do método tradicional] e que os dados obtidos foram registados em fichas informatizadas».

100
Em terceiro lugar, a recorrente recorda que apresentou, em anexo à sua carta de 12 de Junho de 2000, relatórios técnicos relativos a tal experimentação que demonstram, em sua opinião, que a decisão impugnada é errada a este respeito.

101
A Comissão sublinha que não pode examinar, antes da concessão de uma contribuição, a veracidade de todas as informações constantes do pedido. Na audiência, acrescentou que o projecto se destinava a favorecer o desenvolvimento das zonas rurais, o que pressupõe que o mesmo era baseado em métodos que tinham sido objecto de experimentações suficientes permitindo a sua transposição para a escala real. Em sua opinião, a contribuição comunitária não teria sido concedida se a Comissão tivesse disposto de informações correctas relativas às experimentações prévias. Daí a Comissão deduz que esta irregularidade viciou à partida a sua decisão de concessão, de modo que a mesma basta para justificar a supressão da contribuição.

–     Apreciação do Tribunal

102
Segundo as indicações relativas às experimentações prévias constantes das páginas 4, 6 e 11 do pedido de contribuição, dois professores, um do Instituto técnico agrícola do Estado da cidade de Ascoli Piceno, e outro da Universidade de Perugia, deram a sua colaboração para as experimentações da técnica Endovena. O sistema foi testado com diferentes árvores e os resultados dessas experimentações terão sido «entusiasmantes». No pedido, a recorrente afirmou além disso dispor de uma série de dados, entre os quais figuram:

os resultados da utilização experimental do sistema em diferentes árvores de fruto, tendo sido efectuados testes trianuais em actinídias bem como em pereiras e macieiras,

resultados dos testes de diversos fertilizantes,

resultados de testes de certos anticriptogâmicos,

resultados de um sistema Endovena de várias árvores relacionados entre si.

103
Na página 11 do pedido, indica‑se além disso que dos objectivos do projecto faz parte a melhoria dos elementos já disponíveis sobre o método de cultura.

104
O pedido de contribuição refere portanto uma experimentação prévia relativamente importante do método em causa.

105
A fim de contestar a crítica de que essas indicações não eram exactas, a recorrente refere‑se à sua carta de 12 de Junho de 2000, na qual tinha apresentado as suas observações sobre as irregularidades verificadas pela Comissão. Essa carta refere, por um lado, três experimentações que ocorreram, segundo a recorrente, na sua empresa e, por outro, que tinha acompanhado atentamente as experimentações efectuadas na faculdade de agricultura da Universidade de Perugia.

106
Em anexo a esta carta, a recorrente apresentou três documentos. Os dois primeiros referem‑se a uma experimentação efectuada por investigadores da Universidade de Perugia na exploração da recorrente em 1990. Esta experimentação tinha sido feita em actinídeas atingidas por um problema específico de carência em ferro e tinha consistido na injecção de uma substância directamente nos caules das plantas a fim de suprir tal carência. O terceiro documento refere‑se a uma experimentação similar, efectuada pelos mesmos investigadores em vinhas atingidas pelo mesmo problema.

107
Em contrapartida, nem durante o procedimento administrativo nem perante o Tribunal, a recorrente forneceu documentos comprovativos susceptíveis de apurar a exactidão das suas declarações segundo as quais tinham sido efectuadas experimentações mais gerais do sistema Endovena antes da apresentação do pedido de contribuição.

108
À luz destes dados, a afirmação na decisão impugnada de que não tinha sido realizada qualquer experiência prévia relativa à técnica Endovena pode, na realidade, parecer exagerada. No entanto, as experimentações muito específicas e pontuais relativamente às quais a recorrente forneceu documentos comprovativos não são comparáveis às que estão em causa no pedido de contribuição.

109
O argumento da recorrente segundo o qual a Comissão teve oportunidade de apreciar as experimentações prévias antes de conceder a contribuição e as considerou suficientes não é pertinente para afastar a presente crítica. Por um lado, o facto de a Comissão não ter tido dúvidas quanto à veracidade das alegações constantes do pedido no momento da concessão da contribuição não prova que as mesmas eram efectivamente exactas. Por outro, a recorrente não pode invocar o facto de a Comissão não ter procedido a um exame aprofundado dessas alegações antes da concessão da contribuição para escapar às consequências das suas próprias indicações inexactas.

110
As verificações resultantes do controlo efectuado em 1993, segundo as quais «foram efectuadas confrontações, análises e registos relativos aos resultados [do método Endovena e do método tradicional] e […]os dados obtidos foram registados em fichas informatizadas», também não demonstram que as indicações relativas às experimentações prévias, constantes do pedido de contribuição, correspondiam à realidade. Com efeito, essas verificações não se referem às experimentações efectuadas antes do pedido de contribuição, mas à própria execução do projecto.

111
Por conseguinte, os argumentos adiantados pela recorrente não são susceptíveis de afectar a verificação, constante da decisão impugnada, segundo a qual o pedido de contribuição continha indicações não verídicas no que diz respeito às experimentações prévias. Esse facto é constitutivo de uma violação da obrigação de informação e de lealdade que incumbia à recorrente e, deste modo, de uma irregularidade na acepção do artigo 24.° do Regulamento n.° 4253/88.

112
De igual modo, devido às indicações inexactas constantes do pedido, a decisão de concessão está viciada por erros de facto relativos a circunstâncias importantes para avaliar se o projecto tinha direito à concessão de uma contribuição. É, portanto, ilegal. Ora, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que a administração pode revogar, com efeito retroactivo, um acto administrativo favorável ferido de ilegalidade, sem prejuízo do respeito do princípio da segurança jurídica e do da protecção da confiança legítima. Esta possibilidade, admitida quando o beneficiário do acto não tenha contribuído para a sua ilegalidade, é‑o por maioria de razão quando, como no caso em apreço, a ilegalidade tem na sua origem um comportamento deste (acórdão de 24 de Janeiro de 2002, Conserve Italia/Comissão, citado no n.° 87 supra, n.° 90).

113
Assim, foi com razão que a Comissão se baseou nas indicações não verídicas, constantes do pedido de contribuição, para fundamentar a decisão impugnada.

b)     Quanto à crítica de que os recursos humanos mencionados no pedido de contribuição eram inexistentes

114
A decisão impugnada assinala, no considerando 8, segundo travessão:

«[…] os recursos humanos mencionados nos pontos 6.1.3. e 6.2.3. do pedido de contribuição são inexistentes;

[…]»

–     Argumentos das partes

115
A recorrente alega que existe uma contradição manifesta entre esta crítica e as verificações feitas pelos inspectores em 1993 no que respeita à competência das pessoas envolvidas no projecto. Assinala que o anexo do relatório deste primeiro controlo continha os nomes dos responsáveis pelo projecto. Insiste em que, quando do primeiro controlo, as pessoas interessadas tinham sido julgadas suficientemente qualificadas. Em sua opinião, resulta igualmente de uma peritagem ordenada pela Procura della Repubblica de Fermo e enviada à Comissão, em anexo à sua carta de 12 de Junho de 2000, que o projecto foi efectivamente executado e que no mesmo participaram pessoas qualificadas.

116
A Comissão assinala que as pessoas envolvidas no projecto que a recorrente tinha declarado querer empregar para efeitos do mesmo eram mais qualificadas e numerosas do que as que efectivamente empregou.

–     Apreciação do Tribunal

117
No que respeita aos «meios humanos» que deviam ser empregues no âmbito do projecto, o pedido de contribuição fazia referência, para a primeira fase, a um «grupo de direcção e de management» composto por accionistas da sociedade recorrente e à participação da «presidente de uma associação naturalista», perita na implementação e na gestão de instalações de árvores de fruto, bem como do pessoal docente e dos estudantes da escola técnica agrícola de Ascoli Piceno, do decano do instituto de arboricultura da faculdade de agricultura de Perugia e de um director técnico, perito agrícola, que se tinha ocupado durante os anos anteriores da gestão de instalações de árvores de fruto e da frigo‑conservação. Quanto à segunda fase, o pedido fazia referência à participação de um químico da Universidade de Ancona especializado em produtos de árvores de fruto, de um professor universitário especializado em frigo‑conservação bem como de um responsável pela gestão e pela coordenação do projecto.

118
A recorrente não afirma que todas as pessoas mencionadas no pedido trabalharam efectivamente no âmbito do projecto. Sublinha, em contrapartida, que as pessoas que participaram no projecto eram suficientemente qualificadas. Ora, da lista anexa ao relatório de controlo de 1993, a que a recorrente se refere, constam os nomes de onze pessoas. A lista não precisa quais são as suas qualificações mas indica as suas funções, a saber três «coordenadores do projecto», dois «peritos científicos», dois «administradores», um agrónomo, um informático, um contabilista e um consultor fiscal. Supondo que todas estas pessoas possam ser consideradas «responsáveis» pelo projecto Endovena, nada permite concluir que as suas qualificações eram de nível tão elevado como as de algumas das pessoas, como os professores universitários, mencionados no pedido de contribuição.

119
A execução efectiva do projecto – que a própria recorrente afirma não ter produzido os resultados esperados – também não demonstra que as qualificações das pessoas que contribuíram para o mesmo correspondiam às que constavam do pedido de contribuição. Por fim, o relatório de peritagem invocado pela recorrente chega, é um facto, à conclusão de que «a experimentação afigura‑se plenamente conforme ao programa originalmente apresentado» à Comissão, mas o perito não se pronuncia sobre as qualificações das pessoas que trabalharam no âmbito do projecto.

120
Ora, ao substituir, para a execução do projecto, pessoas excepcionalmente qualificadas, mencionadas no pedido, por outras pessoas relativamente às quais não está provado que tinham qualificações de nível equivalente, a recorrente procedeu a uma modificação importante que afecta as condições da realização do projecto. No entanto, não resulta dos autos que tenha pedido a aprovação da Comissão para esta modificação.

121
Assim, foi com razão que a Comissão considerou esta circunstância para fundamentar a decisão impugnada.

c)     Quanto à crítica de que o Ispettorato Provinciale dell'Agricoltura não participou no projecto

122
A decisão impugnada assinala, no considerando 8, terceiro travessão:

«[…] Contrariamente ao que foi indicado no pedido de contribuição, o ispettorato provinciale dell'agricoltura não tem qualquer relação com este projecto, não tendo sido feito nenhum contacto oficial com a referida entidade e não foi prevista nenhuma participação financeira da mesma;

[…]»

–     Argumentos das partes

123
A recorrente alega que na fase do pedido de contribuição, e ainda menos na decisão de concessão, não tinha previsto nenhuma participação financeira do Ispettorato Provinciale dell'Agricoltura, dado que esta entidade não dispõe dos meios financeiros necessários. O pedido de contribuição fez simplesmente alusão a iniciativas futuras do organismo, sem as precisar, e à probabilidade (que não é equivalente à certeza) de uma participação financeira. Acrescenta que tinha contactos informais com essa entidade e que esperava a conclusão positiva da fase de demonstração antes de a implicar activamente no projecto.

124
A Comissão afirma que o pedido de contribuição deixava entender claramente que a recorrente previa contactos oficiais desde as fases iniciais do projecto e que estava efectivamente prevista uma participação financeira dessa entidade, só sendo incerta a proporção da sua participação.

–     Apreciação do Tribunal

125
No pedido de contribuição, a recorrente tinha indicado:

«A sociedade Euroagri deixará à inspecção agrícola a validação e a escolha da localidade que essa entidade considere mais indicada para aí arrendar cerca de 18 hectares de terras para as demonstrações da cultura de árvores de fruto segundo o método ‘Endovena’.»

126
Além disso, o pedido de contribuição expunha o seguinte:

«9. programa de financiamento

A inspecção agrícola de Ascoli Piceno, interessada no projecto, com a coordenação do Dr. Armellini, responsável pelo serviço, faz as diligências necessárias para o financiamento local de uma parte do projecto. É provável que o referido financiamento seja de 5% do custo total.»

127
A recorrente não apresentou nenhum documento comprovativo susceptível de estabelecer uma participação do Ispettorato Provinciale dell'Agricoltura no projecto controvertido. Afirma, é certo, que teve contactos informais com essa entidade, mas não apresentou nenhum documento corroborando esta alegação. Ora, a participação dessa autoridade no projecto, conforme prevista no pedido, não era meramente informal. Nomeadamente, essa autoridade devia intervir quando da escolha do terreno em que se devia desenrolar uma das fases do projecto. Ora, a recorrente não sustenta que a referida entidade tivesse estado envolvida na escolha do terreno.

128
No que diz respeito, em seguida, à participação financeira da inspecção, é verdade que o pedido não a apresenta como uma certeza. No entanto, a afirmação segundo a qual «a inspecção agrícola faz as diligências necessárias para o financiamento local de uma parte do projecto» implica que foram feitas diligências oficiais para obter esse financiamento. Ora, a recorrente não sustenta que tenha sido esse o caso.

129
Por conseguinte, os argumentos da recorrente não são susceptíveis de contrariar a verificação segundo a qual a inspecção agrícola não foi associada ao projecto do modo previsto no pedido de contribuição. Verifica‑se portanto que a recorrente procedeu a uma modificação importante do projecto, na acepção do artigo 24.°, n.° 2, do Regulamento n.° 4253/88, sem pedir a aprovação da Comissão.

d)     Quanto à crítica de que nenhuma das pessoas citadas na lista de referências técnicas e científicas participou na realização do projecto

130
A decisão impugnada assinala, no considerando 8, quarto travessão:

«[…] Nenhuma das pessoas indicadas na lista das referências técnicas e científicas junta ao pedido de contribuição participou directa ou indirectamente na realização do projecto;

[…]»

–     Argumentos das partes

131
A recorrente afirma que se baseou em publicações científicas redigidas por especialistas e que recorreu, para a implementação do projecto, aos seus próprios técnicos, o que o controlo de 1993 pôde verificar. De qualquer forma, a decisão de concessão não continha qualquer indicação a este respeito.

132
A Comissão refuta estes argumentos.

–     Apreciação do Tribunal

133
Em anexo ao pedido de contribuição, a recorrente tinha apresentado uma lista de dez pessoas como «referências técnicas e científicas». O papel dessa lista no âmbito do pedido de contribuição não resulta claramente deste último. Nomeadamente, o pedido não indica que as pessoas constantes desta lista deviam participar activamente no projecto.

134
Nestas condições, o facto de estas pessoas não terem participado no projecto não pode ser qualificado de irregularidade cometida quando da execução do projecto nem de modificação importante deste, na acepção do artigo 24.°, n.° 2, do Regulamento n.° 4253/88.

e)     Quanto à crítica relativa às despesas com mão‑de‑obra

135
A decisão impugnada assinala, no considerando 8, quinto travessão:

«[…] As despesas com mão‑de‑obra e respectivos encargos foram imputadas de modo fixo ao projecto à razão de 50% do total das despesas com pessoal da sociedade Euroagri, beneficiária do projecto, sem que tenha sido fornecido à Comissão um justificativo detalhado respeitante às pessoas empregues para o projecto e aos trabalhos efectuados;

[…]»

–     Argumentos das partes

136
A recorrente considera que agiu correctamente ao imputar de modo fixo ao projecto 50% do total das suas despesas com pessoal. Afirma que as despesas feitas correspondem exactamente às despesas previstas pela decisão de financiamento adoptada pela Comissão. Assim, esta não as pode considerar a priori injustificadas. Recorda que, quando do controlo de 1993, tinha sido já realizado um trabalho considerável e que os relatórios dirigidos à Comissão continham uma justificação detalhada das modalidades de cálculo das despesas com pessoal, uma análise detalhada das horas consagradas ao projecto, uma descrição específica dos sistemas e dos indicadores de cálculo da mão‑de‑obra bem como uma exposição das razões técnicas pelas quais era necessária a presença constante do pessoal na zona de projecto. Na réplica, alega que o número de 471 horas de trabalho por hectare que tinha calculado para o projecto era inferior ao de 800 horas por hectare resultante de um quadro determinando as horas de trabalho necessárias para as árvores de fruto, estabelecido pelas autoridades italianas. Considera que tal demonstra que não sobrestimou os custos com mão‑de‑obra.

137
A Comissão assinala que o fundo só financia uma certa percentagem dos custos efectivamente suportados para efeitos da realização do projecto e precisa que a acusação feita à recorrente na decisão impugnada é a de não ter fornecido qualquer justificativo detalhado e fundamentado do número de pessoas efectivamente empregues e dos seus trabalhos nos terrenos afectos ao projecto.

–     Apreciação do Tribunal

138
A tese da recorrente, segundo a qual as despesas com mão‑de‑obra que imputou ao projecto eram justificadas porque correspondem às previstas pela decisão de concessão, não pode ser acolhida. Embora tanto o pedido de contribuição como a decisão de concessão tenham um importante papel para apreciar se a execução do projecto é correcta, os números que daí constam quanto aos custos do projecto têm carácter de uma estimativa ex ante. O beneficiário pode pedir o pagamento da contribuição apenas para as despesas que efectivamente fez e que, ex post, se podem considerar justificadas pelo projecto. Ora, a recorrente não afirma que forneceu documentos comprovativos, como contratos de trabalho ou fichas de salário dos seus empregados, bem como a descrição detalhada das actividades de cada uma das pessoas envolvidas na realização do projecto, que teriam permitido à Comissão verificar quais eram as despesas com mão‑de‑obra efectivamente feitas com o mesmo. Tais documentos comprovativos não podem ser substituídos pelos cálculos efectuados pela recorrente quanto ao número anual de horas de trabalho por hectare necessário para efeitos do projecto, dado que esses cálculos não demonstram que essas horas de trabalho foram realmente efectuadas e que as mesmas foram pagas pela recorrente.

139
Daqui resulta que a recorrente não adiantou elementos susceptíveis de afastar a crítica de que faltava um justificativo detalhado das despesas com mão‑de‑obra relativas ao projecto.

140
Ora, conforme exposto no n.° 83 supra, os beneficiários de contribuições comunitárias são obrigados a fornecer à Comissão informações suficientemente precisas, para que esta possa verificar se são justificadas as despesas para cuja cobertura é utilizada a contribuição comunitária. Ao não fornecer tais informações justificadas, relativas às despesas com mão‑de‑obra, a recorrente violou a obrigação de informação e de lealdade que incumbe aos requerentes e beneficiários de contribuições financeiras, o que deve ser considerado uma irregularidade na acepção do artigo 24.°, n.° 2, do Regulamento n.° 4253/88, tanto na sua versão inicial como na sua versão alterada (v., neste sentido, acórdão Comunità montana della Valnerina/Comissão, citado no n.° 41 supra, n.° 97).

f)     Quanto à crítica relativa à imputação de uma parte da amortização do hangar e das células frigoríficas aos custos do projecto

141
A decisão impugnada assinala, no considerando 8, sexto travessão:

«[…] O projecto previa a locação de um hangar e de câmaras de frio. A Euroagri mandou construir o hangar e adquiriu câmaras de frio em 1993 no âmbito do projecto n.° 92.CT.IT.05.016, ao abrigo do Regulamento (CEE) n.° 866/90 [do Conselho, de 29 de Março de 1990, relativo à melhoria das condições de transformação e comercialização dos produtos agrícolas (JO L 91, p. 46)], subsidiado pela Comissão e pelas autoridades regionais. A amortização desses bens foi imputada, em 30%, ao projecto Endovena. Trata‑se, por conseguinte, de um duplo financiamento;

[…]»

–     Argumentos das partes

142
A recorrente é de opinião que a imputação ao projecto de 30% da amortização das células frigoríficas e do hangar era justificada. Reconhece ter obtido, em 1999, uma contribuição comunitária, ao abrigo do Regulamento n.° 866/90, para a sua construção e aquisição, mas sublinha que esse financiamento tinha sido concedido para a construção das estruturas enquanto o custo aqui imputado ao projecto é o da sua utilização temporária.

143
Ao colocar as suas próprias infra‑estruturas à disposição do projecto, em vez de arrendar instalações pertencentes a terceiros, a recorrente suportou efectivamente o custo da sua utilização temporária. Com efeito, renunciou à utilização, para efeitos da produção normal, de uma área correspondente a quase um terço dessas infra‑estruturas. A fatia de amortização de 30% imputada ao projecto, só constitui uma base de referência para determinar o valor de utilização do bem e corresponde à renda normal que a recorrente teria pago em caso de locação.

144
A Comissão refuta estes argumentos e alega que a recorrente calculou a quota‑parte da amortização das instalações relativamente ao custo total da sua aquisição, incluindo a parte financiada pelo fundo, e não relativamente ao custo da aquisição efectivamente suportado por ela.

–     Apreciação do Tribunal

145
Ao afectar um terço do hangar e das células frigoríficas ao projecto Endovena, a recorrente renunciou parcialmente à utilização dessas instalações para as suas actividades de produção e de comercialização normais. A Comissão não sustenta que tal reafectação das estruturas era incompatível com a finalidade da contribuição concedida para a sua construção e aquisição ao abrigo do Regulamento n.° 866/90. Nestas condições, há que considerar que a recorrente podia imputar ao projecto Endovena o custo que efectivamente suportou em razão da reafectação destas construções.

146
Para o cálculo deste custo, a recorrente não pode, no entanto abstrair do financiamento comunitário que obteve ao abrigo do Regulamento n.° 866/90. Com efeito, ao reduzir os custos da construção e da aquisição das instalações, este financiamento reduz igualmente os custos da sua exploração pela recorrente.

147
Assim, ao imputar ao projecto 30% da amortização das referidas estruturas, sem ter em conta o financiamento comunitário que tinha obtido para a sua criação, a recorrente imputou ao projecto custos superiores aos efectivamente suportados. A apreciação da Comissão segundo a qual a recorrente tentou assim obter um duplo financiamento para os mesmos bens é portanto procedente.

148
 A imputação de despesas superiores às efectivamente feitas deve ser considerada uma violação grave das condições de concessão da contribuição financeira, bem como da obrigação de lealdade que incumbe ao beneficiário dessa contribuição. Trata‑se, consequentemente, de uma irregularidade na acepção do artigo 24.°, n.° 2, do Regulamento n.° 4253/88, tanto na sua versão inicial como na sua versão alterada (v., neste sentido, acórdão Comunità montana della Valnerina/Comissão, citado no n.° 41 supra, n.° 81).

g)     Quanto à crítica relativa à imputação de uma parte da amortização do material agrícola aos custos do projecto

149
A decisão impugnada assinala, no considerando 8, sétimo travessão:

«[…] A amortização do material agrícola utilizado para a realização do projecto foi imputada de modo fixo a este último à razão de 30% da amortização anual total do material agrícola da sociedade. Esta amortização foi igualmente imputada à rubrica despesas do projecto ‘gasóleo agrícola’, o que constitui uma dupla imputação;

[…]»

–     Argumentos das partes

150
A recorrente contesta que tenha havido uma dupla imputação da amortização do material agrícola. Precisa que a rubrica de despesas «gasóleo agrícola» diz respeito às despesas relativas ao consumo de combustível relacionado com a utilização dos veículos no âmbito do projecto, ao passo que o custo relativo à amortização do material agrícola representa o custo de utilização dos equipamentos.

151
Segundo a Comissão, a amortização dos equipamentos foi imputada duas vezes ao projecto, uma vez enquanto tal e uma segunda vez por a recorrente ter imputado ao projecto, para os anos de 1994 e 1995, o custo fixo da utilização destes equipamentos ao quilómetro ou à hora. Ora, os custos fixos abrangem não só os custos com combustível, mas também a amortização dos equipamentos, as despesas de manutenção, bem como os impostos, os seguros e as outras despesas conexas.

–     Apreciação do Tribunal

152
Resulta dos documentos apresentados pela Comissão em resposta às questões do Tribunal, cuja autenticidade não é contestada pela recorrente, que esta imputou ao projecto Endovena 30% da amortização das máquinas agrícolas para os anos de 1993, 1994 e 1995. Além disso, a recorrente imputou ao projecto, para o ano de 1993, 30% das suas despesas com combustível e lubrificante. Em contrapartida, para os anos de 1994 e 1995, calculou o número de quilómetros percorridos pelos seus veículos, e até o número de horas de funcionamento das máquinas agrícolas, do qual imputou 30% ao projecto. Calculou o custo do quilómetro, e mesmo da hora de funcionamento, de modo fixo. No que diz respeito ao custo do quilómetro, baseou‑se em números do Automóvel Clube italiano, não tendo indicado nenhuma fonte no que se refere ao custo fixo da hora de utilização das máquinas agrícolas. Ora, a recorrente não adiantou argumentos susceptíveis de contrariar a tese da Comissão segundo a qual tanto o custo fixo do quilómetro para os veículos como o custo fixo da hora para as máquinas agrícolas incluem a amortização destes equipamentos. Por conseguinte, não demonstrou que a crítica de que, para os anos de 1994 e 1995, a amortização dos referidos equipamentos foi imputada duas vezes ao projecto não é procedente.

153
Conforme exposto no n.° 148 supra, a imputação de despesas superiores às efectivamente feitas constitui uma irregularidade na acepção do artigo 24.°, n.° 2, do Regulamento n.° 4253/88, tanto na sua versão inicial como na sua versão alterada.

h)     Quanto à crítica relativa à imputação de uma parte da amortização da rede de irrigação tradicional

154
A decisão impugnada assinala, no considerando 8, oitavo travessão:

«[…] A amortização da rede de irrigação tradicional existente na propriedade em causa foi imputada de modo fixo ao projecto à razão de 30%. Uma vez que foi instalada uma nova rede e utilizada especialmente para o sistema ‘Endovena’, com imputação dos custos ao projecto, a imputação da amortização da instalação de irrigação tradicional não é justificada;

[…]»

–     Argumentos das partes

155
A recorrente sustenta que a rede tradicional foi efectivamente utilizada para efeitos do projecto, dado que a rede de irrigação destinada ao projecto Endovena não podia funcionar de maneira autónoma se não fosse alimentada pela rede tradicional.

156
Na réplica, a recorrente afirma que a Comissão, ao censurá‑la, na contestação, por ter calculado a amortização para toda a rede tradicional e não apenas para a parte alimentando a rede destinada ao projecto, deduz um fundamento inadmissível, por ser novo relativamente às acusações anteriores. Sublinha que a amortização deve ser considerada em relação a toda a rede de irrigação da empresa agrícola, localizando‑se os terrenos utilizados para o projecto em locais diferentes no interior da empresa e estando a empresa ligada a uma só rede. Além disso, alega que a utilização da rede existente permitiu uma redução do custo total do projecto.

157
A Comissão precisa que a decisão de concessão previa o custo de uma nova rede completa e específica e assinala que a percentagem de amortização imputada ao projecto a este título foi calculada para a totalidade da rede tradicional e não para a parte utilizada para o projecto.

–     Apreciação do Tribunal

158
A título preliminar, há que assinalar que, na sua contestação, a Comissão precisou e limitou o alcance da crítica formulada na decisão impugnada relativa à imputação da amortização da rede de irrigação tradicional. A tese da recorrente segundo a qual a Comissão formulou uma crítica nova relativamente à formulada no âmbito do procedimento administrativo não pode portanto ser acolhida.

159
Quanto à procedência da crítica, recorde‑se que, na descrição do orçamento necessário à implementação do projecto feita no pedido de contribuição, a recorrente tinha indicado um montante de 97 000 ecus para «irrigação rede completa fixa». Em contrapartida, não se encontrava previsto qualquer custo para a utilização da rede tradicional.

160
No entanto, o projecto previa que os resultados da técnica Endovena seriam comparados com os resultados dos métodos tradicionais e que certas parcelas consagradas ao projecto seriam cultivadas de maneira tradicional. Para estas parcelas era portanto necessária a utilização da rede tradicional no quadro do projecto.

161
Nestas condições, parece justificado imputar ao projecto a amortização da rede tradicional para as parcelas cultivadas tradicionalmente e utilizadas para efeitos de comparação no âmbito do projecto. Em contrapartida, o mesmo não sucede com a imputação fixa de 30% da amortização desta rede. Com efeito, a superfície da empresa da recorrente era de 81 hectares, dos quais 24 eram utilizados para o projecto. Destes 24 hectares, 10,5 deviam ser cultivados com a técnica Endovena. Assim, a imputação da rede de irrigação tradicional só podia ser justificada para 13,5 hectares, ou seja, cerca de 17% da superfície da empresa.

162
A recorrente não demonstrou que a eventual distância entre as diferentes parcelas abrangidas pelo projecto podia justificar a imputação ao mesmo de uma parte mais importante dos custos da rede de irrigação tradicional. Com efeito, este podia ser utilizado igualmente para as culturas tradicionais que se encontravam nas outras parcelas destinadas à produção normal.

163
A recorrente não adiantou assim argumentos susceptíveis de afastar a crítica de que a imputação fixa ao projecto de 30% da amortização da rede de irrigação tradicional não era justificada.

164
A este respeito igualmente, imputou portanto ao projecto custos superiores aos que demonstrou ter efectivamente suportado, o que constitui uma irregularidade na acepção do artigo 24.°, n.° 2, do Regulamento n.° 4253/88, tanto na sua versão inicial como na sua versão alterada.

i)     Quanto à crítica relativa à compensação anual por perda de rendimentos paga a L. Biego

165
A decisão impugnada assinala, no considerando 8, nono travessão:

«[…] O terreno onde foram realizadas as culturas é propriedade da Euroagri e estava arrendado a L. Biego. Para compensar a colocação à disposição do terreno, a Euroagri pagou a L. Biego uma compensação por perda de lucros de cerca de 300 000 000 liras por ano relativamente aos anos de 1993 e 1994. Não foi apresentado qualquer contrato, nem qualquer extracto justificando o montante da compensação anual paga a L. Biego. Além disso, o contrato de arrendamento terminava em 1993;

[…]»

–     Argumentos das partes

166
A recorrente alega que o montante da compensação de 300 milhões de liras italianas (ITL) por ano, paga, relativamente aos anos de 1993 e 1994, a L. Biego era justificado. Apresenta uma cópia do contrato de arrendamento rural com data de 31 de Dezembro de 1990, pelo qual arrendou a sua exploração a L. Biego. A afirmação da Comissão segundo a qual este contrato terminava em 1993 não tem em conta que, segundo a regulamentação italiana, tais contratos têm uma duração mínima de quinze anos.

167
O montante da compensação em causa foi julgado adequado pelo perito técnico designado pela Procura della Repubblica de Fermo. Quanto aos cálculos efectuados a este respeito pela Comissão, baseados na renda acordada entre L. Biego e a recorrente, esta alega que a compensação paga a L. Biego tinha em conta os lucros cessantes e sublinha a enorme quantidade de frutos que os 24 hectares de terreno em causa podiam produzir.

168
A Comissão assinala que a apresentação do contrato de arrendamento rural era intempestiva, dado que ocorreu depois da adopção da decisão impugnada. Assinala que esse contrato tinha fixado a renda para a locação de toda a exploração pertencente à recorrente em 100 milhões de ITL por ano. Este montante corresponde, em suma, ao de 110 887 000 ITL por ano resultante da peritagem invocada pela recorrente. Dado que as áreas utilizadas para o projecto correspondiam apenas a uma parte da exploração, considera que a compensação anual paga a L. Biego não devia ter sido superior a 32,8 milhões de ITL. Mesmo se a compensação fosse calculada com base no rendimento registado, segundo a recorrente, pela empresa agrícola de L. Biego em 1991 e em 1992 (cerca de 332 milhões de ITL por ano), a compensação anual pagável a L. Biego não podia ser superior a 98,4 milhões de ITL, porque apenas 24 dos 81 hectares da empresa tinham sido destinados ao projecto e só 10,5 hectares tinham sido cultivados segundo a técnica Endovena. A recorrente não forneceu qualquer explicação plausível sobre o montante da compensação.

–     Apreciação do Tribunal

169
Cabe assinalar liminarmente que o montante da compensação pago a L. Biego excede o montante de 238 000 ecus, ou seja 119 000 ecus por ano, previsto pela decisão de concessão como compensações a pagar aos agricultores para obviar aos seus lucros cessantes durante a realização do projecto. Com efeito, uma compensação de 300 milhões de ITL por ano correspondia, em 1993, a cerca de 169 000 ecus e, em 1994, a cerca de 157 000 ecus. De qualquer modo, os números constantes da decisão de concessão têm o carácter de uma estimativa ex ante do custos necessários para a execução do projecto e não demonstram que os montantes indicados são efectivamente justificados.

170
A crítica essencial formulada pela decisão impugnada a este respeito é a de que a recorrente não forneceu documentos comprovativos em apoio do cálculo desta compensação e, nomeadamente, que não foi apresentado nenhum contrato com L. Biego relativo à colocação à disposição de uma parte da exploração e à correspondente compensação.

171
A este respeito, a recorrente apresentou, em anexo à sua petição, o contrato pelo qual deu de arrendamento, por uma renda anual de 100 milhões de ITL, a sua exploração a L. Biego. Além disso, a Comissão apresentou, como anexo 7 à sua contestação, uma factura emitida por L. Biego, em 12 de Janeiro de 1993, num montante de 600 milhões de ITL como compensação pelos lucros cessantes sofridos em razão da colocação à disposição da recorrente dos frutos colhidos nos 24 hectares afectos ao projecto.

172
Nenhum desses dois documentos permite avaliar se o montante dessa compensação era justificado. Por um lado, a recorrente não apresentou qualquer elemento de prova concreto de que se possa deduzir que um rendimento de 300 milhões de ITL por ano correspondia ao rendimento normal que um agricultor podia retirar dos 24 hectares de terreno em causa. Por outro lado, não apresentou o contrato celebrado com L. Biego do qual resultasse o modo de cálculo e a eventual justificação dessa compensação.

173
É um facto que a factura passada por L. Biego pode ser entendida no sentido de que ele tinha acordado com a recorrente uma compensação fixa de 300 milhões de ITL por ano. Supondo que tenha sido esse o caso, tal estipulação não basta todavia para demonstrar que o montante assim fixado era justificado à luz dos rendimentos que L. Biego pode ter efectivamente perdido ao colocar o terreno à disposição do projecto. Tal justificação era aqui ainda mais necessária porque as relações existentes entre L. Biego e a recorrente podiam suscitar dúvidas quanto à questão de saber se o conteúdo das estipulações com base nas quais foi paga a compensação corresponde ao que podia ter tido um acordo comparável concluído em condições normais de mercado e porque, além disso, o montante da compensação era muito elevado relativamente à renda que, segundo a peritagem técnica invocada pela recorrente e apresentada em anexo à petição, se podia considerar adequada para este terreno.

174
Por fim, tal peritagem limita‑se a avaliar a renda adequada para a exploração da recorrente e não contém qualquer indicação permitindo avaliar uma compensação adequada dos lucros cessantes.

175
Ao imputar ao projecto um montante de 600 milhões de ITL como compensação para L. Biego, sem fornecer uma justificação do seu montante, a recorrente violou portanto a obrigação de informação e de lealdade que incumbe aos requerentes e beneficiários de contribuições financeiras, o que deve ser considerado uma irregularidade na acepção do artigo 24.°, n.° 2, do Regulamento n.° 4253/88.

j)     Quanto à não execução das acções de comunicação e de difusão

176
A decisão impugnada assinala, no considerando 8, décimo travessão:

«[…] As acções de comunicação e de difusão previstas na decisão, nomeadamente, a realização e a produção dos ‘suportes audiovisuais destinados à difusão de todos os 'conhecimentos' abrangidos pelo projecto’ bem como dos ‘suportes escritos e audiovisuais destinados à estratégia de comunicação e de difusão’ não foram realizadas;

[…]»

–     Argumentos das partes

177
A recorrente não contesta que a última fase do projecto, destinada à difusão dos resultados, não foi integralmente realizada. Considera que no entanto este facto não lhe pode ser imputado. Por um lado, os resultados finais negativos do projecto justificam, em sua opinião, que não tenha procedido à fase de divulgação que apenas constitui um objectivo ulterior e eventual relativamente aos objectivos que se referem estritamente à produçᆪo. Por outro lado, sublinha que não pediu o financiamento desta fase da acção e que a Comissão não tentou saber por que razão não tinha pedido o pagamento do saldo. Nestas circunstâncias, o comportamento da Comissão fez nascer na recorrente a convicção de não dever proceder a esta última fase. De qualquer modo, teria havido uma actividade de difusão dos métodos e dos resultados da experiência.

178
A Comissão considera que os resultados negativos do projecto não autorizavam a recorrente a modificar o mesmo de forma significativa sem comunicação prévia à Comissão. Afirma que a sua pretensa passividade se devia exclusivamente à expectativa do envio pela recorrente do relatório final que só chegou às suas mãos depois do controlo efectuado em 1997 e que, por conseguinte, o seu comportamento não podia gerar qualquer expectativa, quanto à aceitação, mesmo tácita, da decisão da recorrente de não proceder à última fase do projecto.

–     Apreciação do Tribunal

179
Quanto à tese da recorrente segundo a qual não era obrigada a realizar a fase de comunicação e de difusão, reconhece‑se que a realização desta fase não tinha muito sentido, dado que a fase de «demonstração» tinha falhado. No entanto, a supressão de uma fase do projecto constitui uma modificação importante do mesmo. A este respeito, resulta claramente do artigo 24.°, n.° 2, do Regulamento n.° 4253/88, na sua versão inicial e na versão alterada, que tais modificações podem dar lugar à redução ou à suspensão da contribuição se não tiver sido pedida a aprovação da Comissão.

180
É aqui irrelevante que a recorrente não tenha pedido o pagamento da última fatia da contribuição. Com efeito, a aprovação do seu pedido incidiu sobre o projecto no seu conjunto e ela não podia decidir, de forma unilateral, realizá‑lo apenas parcialmente, mesmo renunciando a uma parte do financiamento.

181
De igual modo, a tese da recorrente, segundo a qual o comportamento da Comissão e a inexistência de acompanhamento do seu projecto ao abrigo do artigo 25.° do Regulamento n.° 4253/88 provocaram nela a confiança legítima de que já não era necessário realizar a última fase do projecto, não pode ser acolhida. A este respeito, recorde‑se nomeadamente que a recorrente, por carta de 14 de Maio de 1996, tinha anunciado à Comissão o envio dos relatórios relativos ao projecto, sem fornecer a menor indicação de que este tinha falhado e de que a última fase não seria realizada. Ora, os relatórios anunciados nessa carta só foram enviados à Comissão depois do controlo efectuado em 1997. Assim, a recorrente não tinha qualquer razão para considerar um dado adquirido a aprovação pela Comissão da modificação unilateral do projecto.

182
Por conseguinte, a recorrente não rebateu a verificação, constante da decisão impugnada, segundo a qual tinha procedido a uma modificação importante do projecto sem pedir a aprovação da Comissão.

k)     Quanto à crítica relativa à falsificação de duas assinaturas por L. Biego

183
A decisão impugnada assinala, no considerando 8, último travessão:

«[…] As cartas de 26 de Março de 1994 e de 11 de Julho de 1994 enviadas à Comissão são assinadas pela Sr.a Forlenza, administradora da Euroagri. L. Biego declarou por escrito ter imitado essa assinatura;

[…]»

–     Argumentos das partes

184
A recorrente não contesta que L. Biego tenha aposto em duas cartas dirigidas à Comissão a assinatura apócrifa da sua mulher, na altura administradora da recorrente. Contesta todavia que se trate de uma irregularidade porque L. Biego dispunha, por força de uma procuração geral, dos poderes para assinar todo e qualquer acto relativo à recorrente em nome da sua mulher.

185
A Comissão alega que a falsificação de assinaturas constitui um comportamento repreensível. Em sua opinião o referido comportamento viola a obrigação de lealdade que incumbe aos beneficiários de uma contribuição.

–     Apreciação do Tribunal

186
Na ausência de disposições expressas destinadas a proibi‑lo, o beneficiário de uma contribuição comunitária pode‑se fazer representar, nas suas relações com a Comissão, por outras pessoas. A fim de assegurar o desenrolar regular do projecto, é todavia importante que toda e qualquer representação seja tornada transparente e, nomeadamente, que a identidade do mandatário seja correctamente indicada de modo que a instituição possa, se o considerar necessário, pedir que o mandatário demonstre que está devidamente autorizado para praticar o acto em causa em nome do beneficiário. Com efeito, se a representação não for transparente, podem surgir dúvidas ulteriormente quanto à validade dos actos praticados pelo representante, o que pode pôr em risco a realização correcta do projecto em causa.

187
Ora, a utilização da assinatura apócrifa do representante legal do beneficiário por um mandatário é contrária a esta necessidade de transparência nas relações entre o beneficiário e a Comissão, porque é susceptível de induzir a Comissão em erro quanto à oportunidade de pedir ao mandatário que faça a prova dos seus poderes. A este respeito, pouco importa saber se o representante tinha ou não uma procuração no momento em que praticou os actos em nome do beneficiário quando a representação, enquanto tal, não tenha sido comunicada à Comissão. Com efeito, na medida em que a Comissão não dispõe da prova dos poderes de representação da pessoa que agiu em nome do beneficiário, este pode reservar‑se o direito de ratificar ou de contestar, posteriormente, o conteúdo dos actos praticados pelo seu representante. Um comportamento susceptível de criar tal insegurança jurídica não é, em princípio, compatível com o dever de informação e de lealdade que incumbe ao beneficiário da contribuição.

188
Quanto às consequências de tal comportamento, é no entanto necessário ter em conta que a supressão da contribuição em razão de uma irregularidade tem o carácter de uma sanção na medida em que conduz ao reembolso de quantias superiores às ilegitimamente obtidas em razão desta irregularidade (v. n.° 37 supra). Só pode portanto ser aplicada quando se funda numa base legal clara e não ambígua (acórdãos do Tribunal de Justiça de 25 de Setembro de 1984, Könecke, 117/83, Recueil, p. 3291, n.° 11, e de 12 de Dezembro de 1990, Vandemoortele/Comissão, C‑172/89, Colect., p. I‑4677, n.° 9).

189
Ora, se é evidente que a apresentação de informações susceptíveis de induzir a Comissão em erro quanto às condições de concessão da contribuição, quanto à execução correcta do projecto ou quanto às despesas necessárias para o efeito constitui uma irregularidade na acepção do artigo 24.°, n.° 2, do Regulamento n.° 4253/88, não é assim tão claro que haja violação das obrigações do beneficiário em caso de utilização de uma assinatura apócrifa pelo seu mandatário, quando existe uma procuração ou quando o acto em causa é ratificado, de modo que este comportamento não foi susceptível de ter qualquer incidência na concessão da contribuição, no desenrolar do projecto e nos montantes pagos.

190
Nestas condições, não existe base legal suficientemente clara e inequívoca para qualificar de irregularidade a assinatura das duas cartas por L. Biego com o nome da Sr.a Forlenza. Assim, este facto não pode ser validamente tido em conta para fundar a supressão da contribuição (v., para um resultado similar motivado pelo princípio da proporcionalidade, acórdão Comunità montana della Valnerina/Comissão, citado no n.° 41 supra, n.os 65 e 66).

3.     Conclusão relativa ao quarto fundamento

191
Resulta das considerações que precedem que dois dos factos imputados à recorrente pela decisão impugnada não podem ser tidos em conta para a aplicação do artigo 24.°, n.° 2, do Regulamento n.° 4253/88. Trata‑se, por um lado, da crítica constante do considerando 8, quarto travessão, da decisão impugnada, relativa ao facto de as pessoas citadas na lista de referências técnicas e científicas não terem participado na realização do projecto e, por outro, do constante do último travessão desse considerando, relativo à aposição da assinatura apócrifa da Sr.a Forlenza, por L. Biego, em duas cartas dirigidas à Comissão.

192
Em contrapartida, nove factos entre os onze imputados à recorrente na decisão impugnada foram acertadamente qualificados de irregularidades ou de modificações importantes do projecto. A decisão impugnada registou assim violações graves da obrigação de informação e de lealdade que incumbe ao beneficiário de uma contribuição comunitária, nomeadamente a inserção de indicações não verídicas no pedido de contribuição e a imputação ao projecto de certos custos superiores aos efectivamente suportados. Estas irregularidades são plenamente suficientes para considerar, sem prejuízo do exame do fundamento assente numa violação do princípio da proporcionalidade, que as condições de uma supressão da contribuição, previstas no artigo 24.°, n.° 2, do Regulamento n.° 4253/88, se encontram reunidas no caso vertente e para concluir que a Comissão só podia, razoavelmente, decidir a supressão integral da contribuição. Com efeito, comparadas com tais irregularidades, as duas outras críticas visadas no número anterior são de menor importância, e o facto de não poderem ser tidas em conta não pode alterar a apreciação feita sobre a gravidade das irregularidades que foram acertadamente verificadas pela Comissão.

193
Por conseguinte, o facto de o quarto fundamento ser parcialmente procedente não pode implicar a anulação da decisão impugnada.

F – Quanto ao quinto fundamento, assente na violação do princípio da proporcionalidade

1.     Argumento das partes

194
Em apoio deste fundamento, a recorrente insiste em que os incumprimentos que lhe são imputados não constituem uma inexecução das condições de concessão da contribuição, só não tendo sido realizada a fase de divulgação e de difusão do saber‑fazer. O facto de esta fase não ter sido objecto de um pedido expresso por parte da Comissão criou na sua esfera a convicção de que a mesma não era indispensável. A recorrente alega que as despesas que fez se revelaram largamente superiores ou, pelo menos, proporcionais ao financiamento concedido. Em sua opinião, a supressão total da contribuição é desproporcionada em relação ao objectivo do artigo 24.° do Regulamento n.° 4253/88 na medida em que prejudica o beneficiário de modo mais grave que o necessário.

195
A Comissão considera que a supressão da contribuição era plenamente fundada tendo em conta o número e a gravidade das irregularidades.

2.     Apreciação do Tribunal

196
O princípio da proporcionalidade exige que os actos das instituições comunitárias não ultrapassem os limites do adequado e necessário para a realização do objectivo pretendido (acórdão de 12 de Outubro de 1999, Conserve Italia/Comissão, citado no n.° 82 supra, n.° 101).

197
Em especial, à luz deste princípio, à violação das obrigações cujo respeito assuma importância fundamental para o bom funcionamento de um sistema comunitário pode ser aplicada a sanção da perda de um direito concedido pela regulamentação comunitária, como o direito a uma contribuição financeira (acórdão do Tribunal de Justiça de 12 de Outubro de 1995, Cereol Italia, C‑104/94, Colect., p. I‑2983, n.° 24, e jurisprudência referida; acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 12 de Outubro de 1999, Conserve Italia/Comissão, citado no n.° 82 supra, n.° 103, e de 14 de Junho de 2001, Hortiplant/Comissão, T‑143/99, Colect., p. II‑1665, n.° 118).

198
Conforme resulta da apreciação do quarto fundamento, a Comissão podia verificar, na decisão impugnada, que a recorrente tinha apresentado informações não verídicas no quadro do seu pedido de contribuição, que tinha cometido várias irregularidades sérias e que tinha procedido a modificações importantes do projecto sem informar a Comissão desse facto. Estes incumprimentos das suas obrigações pela recorrente enquanto beneficiária da contribuição induziram a Comissão em erro quanto a circunstâncias importantes para avaliar se o projecto merecia a concessão de uma contribuição (v., supra, n.° 112) e demonstram que o projecto não foi executado como previsto no pedido. Nestas circunstâncias, e tendo nomeadamente em conta a imputação ao projecto de certos custos superiores aos efectivamente suportados, a Comissão pôde razoavelmente considerar que qualquer outra sanção que não fosse a supressão total da contribuição e a restituição das verbas pagas pelo FEOGA corria o risco de constituir um convite à fraude (v., neste sentido, acórdão Industrias Pesqueras Campos e o./Comissão, citado no n.° 82 supra, n.° 163; Vela e Tecnagrind/Comissão, citado no n.° 57 supra, n.° 402; e Comunità montana della Valnerina/Comissão, citado no n.° 41 supra, n.° 149).

199
Por conseguinte, o quinto fundamento não é procedente.

II – Quanto ao pedido subsidiário

200
O pedido com vista à redução do montante da subvenção a restituir é, em qualquer circunstância, inadmissível na medida em que não compete ao Tribunal de Primeira Instância, no quadro de um recurso de anulação, substituir a decisão impugnada por outra decisão ou reformar a decisão impugnada (acórdão Sgaravatti Mediterranea/Comissão, citado no n.° 37 supra, n.° 141).

III – Quanto ao pedido de retirada de um documento

201
A recorrente considera que o documento apresentado pela Comissão como anexo 6 à contestação deve ser desentranhado dos autos porque a omissão de certas passagens na cópia apresentadas ao Tribunal é contrária ao artigo 43.°, n.° 5, do Regulamento de Processo. Além disso, tal documento não se encontra datado. No entanto, uma vez que o Tribunal não se baseou no documento em causa para decidir o presente litígio, não há que decidir sobre o pedido da recorrente (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 15 de Setembro de 1998, Branco/Comissão, T‑142/97, Colect., p. II‑3567, n.os 116 e 117, e de 3 de Abril de 2003, Vieira e o./Comissão, T‑44/01, T‑119/01 e T‑126/01, Colect., p. I‑0000, n.° 223).

IV – Quanto às medidas de instrução

202
Como medidas de instrução a recorrente pede que o Tribunal se digne:

ordenar à Comissão que apresente todos os relatórios e documentos apensos, enviados por ela, respeitantes ao projecto Endovena;

ordenar a audição, como testemunhas, de Franco Passamonti e Paolo Manocchi e de Cinzia Mancini, a respeito das circunstâncias descritas na exposição dos factos;

ordenar a sua comparência na pessoa de L. Biego;

ordenar uma peritagem técnica e/ou uma verificação no local.

203
Na audiência, a recorrente indicou que existiam contradições entre os resultados do controlo efectuado pelo UCLAF e os das investigações feitas pelo Ministério Público italiano. Por esta razão, insistiu no pedido de instrução, nomeadamente através de uma inspecção in loco e de uma peritagem.

204
A recorrente não precisou, no âmbito dos fundamentos examinados supra, os factos concretos, divergentes dos considerados pela Comissão na decisão impugnada e susceptíveis de contrariar as verificações em que se funda a decisão, que pretende provar através das medidas de instrução solicitadas.

205
Nestas condições não há que proceder à realização de tais medidas.


Quanto às despesas

206
Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a recorrente sido vencida, há que condená‑la nas despesas, incluindo as referentes ao processo de medidas provisórias, conforme o pedido da recorrente.


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Segunda Secção)

decide:

1)
É negado provimento ao recurso.

2)
A recorrente suportará as despesas, incluindo as referentes ao processo de medidas provisórias.

Forwood

Pirrung

Meij

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 28 de Janeiro de 2004.

O secretário

O presidente

H. Jung

J. Pirrung

Índice

Quadro regulamentar

Contexto factual

    I –  Pedido de contribuição comunitária relativo ao projecto Endovena

    II –  Concessão da contribuição comunitária e desenrolar do projecto

    III –  Controlos efectuados no local em Julho de 1997

    IV –  Procedimento administrativo

    V –  Decisão impugnada

Tramitação e pedidos das partes

Questão de direito

    I –  Quanto ao pedido principal

        A –  Quanto à aplicabilidade das diferentes versões dos Regulamentos n.os 2052/88, 4253/88 e 4256/88

        B –  Quanto ao primeiro fundamento, assente na falta de fundamentação e na violação do princípio do contraditório

            1.  Argumentos das partes

            2.  Apreciação do Tribunal

        C –  Quanto ao segundo fundamento, assente na violação do artigo 24.° do Regulamento n.° 4253/88

            1.  Argumentos das partes

            2.  Apreciação do Tribunal

        D –  Quanto ao terceiro fundamento, assente na violação do artigo 25.° do Regulamento n.° 4253/88

            1.  Argumentos das partes

            2.  Apreciação do Tribunal

        E –  Quanto ao quarto fundamento, assente na inexistência das irregularidades assinaladas na decisão impugnada

            1.  Generalidades

                a)  Argumentos das partes

                b)  Apreciação do Tribunal

            2.  Quanto às diferentes irregularidades assinaladas na decisão impugnada

                a)  Quanto à crítica de que a técnica Endovena não foi objecto de qualquer experiência prévia

                        –  Argumentos das partes

                        –  Apreciação do Tribunal

                b)  Quanto à crítica de que os recursos humanos mencionados no pedido de contribuição eram inexistentes

                        –  Argumentos das partes

                        –  Apreciação do Tribunal

                c)  Quanto à crítica de que o Ispettorato Provinciale dell'Agricoltura não participou no projecto

                        –  Argumentos das partes

                        –  Apreciação do Tribunal

                d)  Quanto à crítica de que nenhuma das pessoas citadas na lista de referências técnicas e científicas participou na realização do projecto

                        –  Argumentos das partes

                        –  Apreciação do Tribunal

                e)  Quanto à crítica relativa às despesas com mão‑de‑obra

                        –  Argumentos das partes

                        –  Apreciação do Tribunal

                f)  Quanto à crítica relativa à imputação de uma parte da amortização do hangar e das células frigoríficas aos custos do projecto

                        –  Argumentos das partes

                        –  Apreciação do Tribunal

                g)  Quanto à crítica relativa à imputação de uma parte da amortização do material agrícola aos custos do projecto

                        –  Argumentos das partes

                        –  Apreciação do Tribunal

                h)  Quanto à crítica relativa à imputação de uma parte da amortização da rede de irrigação tradicional

                        –  Argumentos das partes

                        –  Apreciação do Tribunal

                i)  Quanto à crítica relativa à compensação anual por perda de rendimentos paga a L. Biego

                        –  Argumentos das partes

                        –  Apreciação do Tribunal

                j)  Quanto à não execução das acções de comunicação e de difusão

                        –  Argumentos das partes

                        –  Apreciação do Tribunal

                k)  Quanto à crítica relativa à falsificação de duas assinaturas por L. Biego

                        –  Argumentos das partes

                        –  Apreciação do Tribunal

            3.  Conclusão relativa ao quarto fundamento

        F –  Quanto ao quinto fundamento, assente na violação do princípio da proporcionalidade

            1.  Argumento das partes

            2.  Apreciação do Tribunal

    II –  Quanto ao pedido subsidiário

    III –  Quanto ao pedido de retirada de um documento

    IV –  Quanto às medidas de instrução

Quanto às despesas



1
Língua do processo: italiano.