Language of document : ECLI:EU:T:2001:279

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Terceira Secção)

6 de Dezembro de 2001 (1)

«Regime de associação dos países e territórios ultramarinos - Decisão 97/803/CE - Importações de açúcar - Recurso de anulação - Pedido de indemnização - Admissibilidade - Irreversibilidade dos resultados conseguidos - Princípio da proporcionalidade - Segurança jurídica»

No processo T-43/98,

Emesa Sugar (Free Zone) NV, com sede em Oranjestad (Aruba), representada por G. van der Wal, advogado, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrente,

contra

Conselho da União Europeia, representado por J. Huber e G. Houttuin, na qualidade de agentes,

recorrido,

apoiado pela

Comissão das Comunidades Europeias, representada por T. Van Rijn, na qualidade de agente, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

pelo

Reino de Espanha, representado por M. López-Monís Gallego e R. Silva de Lapuerta, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

e pela

República Francesa, representada por K. Rispal-Bellanger, na qualidade de agente, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

intervenientes,

que tem por objecto um pedido de anulação da Decisão 97/803/CE do Conselho, de 24 de Novembro de 1997, respeitante à revisão intercalar da Decisão 91/482/CEE relativa à associação dos países e territórios ultramarinos à Comunidade Económica Europeia (JO L 329, p. 50), bem como um pedido de indemnização,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Terceira Secção),

composto por: J. Azizi, presidente, K. Lenaerts e M. Jaeger, juízes,

secretário: J. Plingers, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 15 de Maio de 2001,

profere o presente

Acórdão

Enquadramento jurídico

1.
    Nos termos do artigo 3.°, alínea r), do Tratado CE [que passou, após alteração, a artigo 3.°, n.° 1, alínea s), CE], a acção da Comunidade implica a associação dos países e territórios ultramarinos (PTU), «tendo por objectivo incrementar as trocascomerciais e prosseguir em comum o esforço de desenvolvimento económico e social».

2.
    Aruba faz parte dos PTU.

3.
    A associação destes últimos com a Comunidade rege-se pela parte IV do Tratado CE.

4.
    Nos termos do artigo 131.°, segundo e terceiro parágrafos, do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 182.°, segundo e terceiro parágrafos, CE):

«A finalidade da associação é promover o desenvolvimento económico e social dos países e territórios e estabelecer relações económicas estreitas entre eles e a Comunidade no seu conjunto.

Em conformidade com os princípios enunciados no preâmbulo do presente Tratado, a associação deve servir, fundamentalmente, para favorecer os interesses dos habitantes desses países e territórios e para fomentar a sua prosperidade de modo a conduzi-los ao desenvolvimento económico, social e cultural a que aspiram.»

5.
    Para o efeito, o artigo 132.° do Tratado CE (actual artigo 183.° CE) enuncia um determinado número de objectivos, entre os quais figura a aplicação pelos Estados-Membros «às suas trocas comerciais com os países e territórios [do] regime que aplicam entre si por força do presente Tratado».

6.
    O artigo 133.°, n.° 1, do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 184.°, n.° 1, CE) prevê que as importações originárias dos PTU beneficiarão, ao entrarem nos Estados-Membros, da eliminação total dos direitos aduaneiros que se realizou progressivamente entre os Estados-Membros em conformidade com as disposições do referido Tratado.

7.
    Nos termos do artigo 136.° do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 187.° CE):

«Durante um período inicial de cinco anos a contar da data da entrada em vigor do presente Tratado, uma convenção de aplicação, anexa a este Tratado, fixará as modalidades e o processo de associação entre os países e territórios e a Comunidade.

Antes do termo da vigência da convenção prevista no parágrafo anterior, o Conselho, deliberando por unanimidade, aprovará as disposições a prever para um novo período, com base nos resultados conseguidos e nos princípios enunciados no presente Tratado.»

8.
    Com base no artigo 136.°, segundo parágrafo, do Tratado, o Conselho adoptou, em 25 de Fevereiro de 1964, a Decisão 64/349/CEE relativa à associação dos PTU à Comunidade Económica Europeia (JO 1964, 93, p. 1472). Esta decisão visava substituir, a partir de 1 de Junho de 1964, data da entrada em vigor do acordo interno relativo ao financiamento e à gestão dos auxílios da Comunidade, assinado em Iaundé em 20 de Julho de 1963, a convenção de aplicação relativa à associação dos PTU à Comunidade, anexada ao Tratado e celebrada por um período de cinco anos.

9.
    Na sequência de várias decisões com o mesmo objecto, o Conselho adoptou a Decisão 91/482/CEE, de 25 de Julho de 1991, relativa à associação dos PTU à Comunidade Económica Europeia (JO L 263, p. 1, a seguir «decisão PTU»), que, nos termos do seu artigo 240.°, n.° 1, é aplicável durante um período de dez anos a partir de 1 de Março de 1990. A mesma disposição, n.° 3, alíneas a) e b), prevê, todavia, que, antes do termo do primeiro período de cinco anos, o Conselho, deliberando por unanimidade sob proposta da Comissão, adoptará, se for caso disso, além das contribuições financeiras da Comunidade, para o segundo período de cinco anos, as eventuais alterações a introduzir à associação dos PTU à Comunidade. Foi assim que foi adoptada pelo Conselho a Decisão 97/803/CE, de 24 de Novembro de 1997, respeitante à revisão intercalar da decisão PTU (JO L 329, p. 50, a seguir «decisão impugnada»).

10.
    Na sua versão inicial, o artigo 101.°, n.° 1, da decisão PTU dispunha:

«Os produtos originários dos PTU podem ser importados na Comunidade com isenção de direitos aduaneiros e de encargos de efeito equivalente.»

11.
    O artigo 102.° dessa mesma decisão previa:

«A Comunidade não aplicará à importação de produtos originários dos PTU nem restrições quantitativas nem medidas de efeito equivalente.»

12.
    O artigo 108.°, n.° 1, primeiro travessão, da decisão PTU remete para o seu anexo II (a seguir «anexo II»), para a definição da noção de produtos originários e dos métodos de cooperação administrativa que a eles se referem. Nos termos do artigo 1.° desse anexo, um produto é considerado originário dos PTU, da Comunidade ou dos Estados de África, das Caraíbas e do Pacífico (a seguir «Estados ACP») quando tenha sido aí inteiramente obtido ou suficientemente transformado.

13.
    O artigo 3.°, n.° 3, do anexo II contém uma lista de complementos de fabrico ou transformações considerados insuficientes para conferir o carácter originário a um produto proveniente dos PTU.

14.
    Todavia, o artigo 6.°, n.° 2, do anexo II dispõe:

«Quando produtos inteiramente obtidos [...] nos Estados ACP sejam objecto de complementos de fabrico ou de transformações nos PTU, são considerados como tendo sido inteiramente obtidos nos PTU.»

15.
    Nos termos do artigo 6.°, n.° 4, do anexo II, a regra citada no número anterior, chamada «de cúmulo de origem ACP/PTU», é aplicável a «qualquer complemento de fabrico ou transformação efectuada nos PTU, incluindo as operações enumeradas no n.° 3 do artigo 3.°».

16.
    A decisão impugnada limitou a aplicação da regra de cúmulo de origem ACP/PTU ao açúcar proveniente dos PTU.

17.
    No sétimo considerando da decisão impugnada, o Conselho explica:

«Considerando que a instauração pela [d]ecisão [PTU] do livre acesso de todos os produtos originários dos PTU e a manutenção da acumulação entre produtos originários dos Estados ACP e produtos originários dos PTU permitiu detectar o risco de conflito entre os objectivos de duas políticas comunitárias, isto é, o desenvolvimento dos PTU e a política agrícola comum; que, efectivamente, o surgimento de graves perturbações no mercado comunitário de certos produtos sujeitos a uma organização comum do mercado levaram, por várias vezes, à adopção de medidas de salvaguarda; que importa prevenir novas perturbações, através da adopção de medidas que definam um enquadramento favorável à regularização das trocas comerciais, simultaneamente compatíveis com a política agrícola comum.»

18.
    Para o efeito, a decisão impugnada aditou à decisão PTU, designadamente, o artigo 108.°-B, que admite o cúmulo de origem ACP/PTU para o açúcar, para uma quantidade anual determinada. Este artigo 108.°-B, n.os 1 e 2, estabelece:

«1.    [...] é admitida a cumulação de origem ACP/PTU referida no artigo 6.° do anexo II para uma quantidade anual de 3 000 toneladas de açúcar.

2.    Para a aplicação das regras de cumulação ACP/PTU referida no n.° 1, consideram-se suficientes para conferir o carácter de produtos originários dos PTU a moldagem do açúcar em cubos ou a adição de corantes» [sem que seja também referida a trituração do açúcar («milling»)].

Matéria de facto e tramitação processual

19.
    A recorrente, que se constituiu em 6 de Fevereiro de 1997, explora desde o mês de Abril de 1997 uma fábrica de açúcar na ilha de Aruba e exporta açúcar para a Comunidade. A fábrica da recorrente tem, de acordo com o que afirma, uma capacidade mínima de tratamento de 34 000 toneladas de açúcar por ano. Comoo açúcar não é produzido em Aruba, a recorrente adquire açúcar branco às refinarias de açúcar de cana estabelecidas em Estados ACP. O açúcar adquirido é transportado para Aruba onde, antes de ser exportado para a Comunidade, é objecto de operações de complementos de fabrico e de transformação para beneficiar do cúmulo de origem ACP/PTU.

20.
    Foi neste contexto que, por petição apresentada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 10 de Março de 1998, a recorrente interpôs o presente recurso, que tem por objecto um pedido de anulação da decisão impugnada e um pedido de indemnização.

21.
    Por requerimento separado registado na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 10 de Abril de 1998, a recorrente apresentou, ao abrigo do artigo 185.° do Tratado CE (actual artigo 242.° CE), um pedido de suspensão da execução do artigo 1.°, n.os 28, 30, 32 e 60, da decisão impugnada, até que o Tribunal se pronuncie sobre o mérito da causa e, a título subsidiário, nos termos do artigo 186.° do Tratado CE (actual artigo 243.° CE), um pedido de medidas provisórias adequadas.

22.
    Por despacho de 14 de Agosto de 1998, Emesa Sugar/Conselho (T-43/98 R, Colect., p. II-3055), o presidente do Tribunal de Primeira Instância indeferiu esses pedidos.

23.
    Por requerimentos apresentados na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância, respectivamente, em 7 de Maio, 4 de Junho e 15 de Junho de 1998, o Reino de Espanha, a Comissão e a República Francesa solicitaram, ao abrigo do artigo 115.° do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, autorização para intervir em apoio do Conselho. O pedido do Reino de Espanha foi deferido por despacho de 7 de Julho de 1998 e os da Comissão e da República Francesa foram-no por despachos de 9 de Julho de 1998. O Reino de Espanha e a Comissão apresentaram alegações escritas de intervenção, respectivamente, em 20 de Novembro e 22 de Dezembro de 1998, e as partes principais foram convidadas a apresentar as suas observações sobre essas alegações.

24.
    Na sequência do recurso que a recorrente interpôs, o despacho Emesa Sugar/Conselho, referido no n.° 22 supra, foi anulado por despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 17 de Dezembro de 1998, Emesa Sugar/Conselho [C-363/98 P(R), Colect., p. I-8787], e o processo foi devolvido ao Tribunal de Primeira Instância.

25.
    Em seguida, o presidente do Tribunal de Primeira Instância ordenou medidas provisórias no processo T-44/98 R II (despachos do presidente do Tribunal de Primeira Instância de 30 de Abril de 1999, Emesa Sugar/Comissão, T-44/98 R II, Colect., p. II-1427, e de 29 de Setembro de 1999, Emesa Sugar/Comissão, T-44/98 R II, Colect., p. II-2815). Devido a essas medidas provisórias, decidiu-se que já não havia que tomar uma decisão no processo T-43/98 R II (despacho dopresidente do Tribunal de Primeira Instância de 6 de Abril de 2000, Emesa Sugar/Conselho, T-43/98 R II, não publicado na Colectânea).

26.
    Nos termos do artigo 177.° do Tratado CE (actual artigo 234.° CE), o presidente do Arrondissementsrechtbank te 's-Gravenhage (Países Baixos) solicitou ao Tribunal de Justiça que se pronunciasse sobre a validade da decisão impugnada (processo C-17/98).

27.
    Por despacho de 11 de Fevereiro de 1999, o Tribunal de Primeira Instância suspendeu o presente processo até à prolação da decisão do Tribunal de Justiça que ponha termo à instância no processo C-17/98.

28.
    No seu acórdão de 8 de Fevereiro de 2000, Emesa Sugar (C-17/98, Colect., p. I-675, a seguir «acórdão Emesa»), o Tribunal de Justiça considerou que o exame das questões submetidas não tinha revelado elementos susceptíveis de afectar a validade da decisão impugnada.

29.
    Por ofício de 29 de Fevereiro de 2000, as partes foram convidadas a apresentar observações sobre a prossecução do presente processo.

30.
    A recorrente sustentou, na sua carta de 31 de Março de 2000, que o acórdão Emesa se baseava em erros de facto. Além disso, esse acórdão fora proferido com violação do artigo 6.° da Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, pois, durante o processo que correu os seus trâmites no Tribunal de Justiça, a recorrente não pôde formular observações sobre as conclusões do advogado-geral. A recorrente solicitou ao Tribunal de Primeira Instância que prosseguisse com a fase escrita do processo e que convidasse as partes a apresentar observações sobre o mérito do acórdão Emesa.

31.
    A Comissão e o Conselho alegaram, em cartas datadas, respectivamente, de 24 e 29 de Março de 2000, que o recurso ficara sem objecto por o Tribunal de Justiça ter confirmado, no seu acórdão Emesa, a validade da decisão impugnada.

32.
    Por ofício de 24 de Maio de 2000, a recorrente foi convidada a apresentar alegações complementares sobre o mérito do acórdão Emesa. Em 9 de Outubro de 2000, a recorrente apresentou essas alegações, tendo a Comissão e o Conselho apresentado observações sobre estas em alegações datadas de 21 de Fevereiro de 2001.

33.
    Com base no relatório do juiz-relator, o Tribunal (Terceira Secção) decidiu dar início à fase oral. A título de medidas de organização do processo previstas no artigo 64.° do Regulamento de Processo, foram apresentadas por escrito algumas questões às partes, que responderam dentro do prazo estabelecido.

34.
    As partes foram ouvidas nas suas alegações e nas suas respostas às questões do Tribunal na audiência de 15 de Maio de 2001.

Pedidos das partes

35.
    A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

-    anular a decisão impugnada ou, pelo menos, anulá-la na medida em que, por um lado, modifica os artigos 101.°, 102.° e 108.° da decisão PTU e o artigo 6.° do anexo II e, por outro, prevê aditar um novo artigo 108.°-B à decisão PTU (artigo 1.°, n.os 27 a 32, da decisão impugnada);

-    declarar que a Comunidade é responsável pelo prejuízo que teve de suportar, devido a, desde 1 de Dezembro de 1997, a importação de açúcar originário dos PTU para a Comunidade estar proibida ou ter sido restringida por efeito da decisão impugnada;

-    ordenar às partes que cheguem a acordo sobre esse prejuízo e, caso esse acordo não seja possível, que o processo prossiga, num prazo que determinará, a fim de apurar a dimensão desse prejuízo ou, pelo menos, condenar a Comunidade a pagar o montante do prejuízo provisoriamente avaliado na petição e que ainda deve ser definitivamente determinado ou, a título mais subsidiário, condenar a Comunidade a pagar a indemnização que o Tribunal, no seu douto entendimento, venha a fixar, acrescida de juros de mora;

-    condenar o Conselho nas despesas.

36.
    O Conselho conclui pedindo que o Tribunal se digne:

-    julgar inadmissíveis e, a título subsidiário, improcedentes os pedidos de anulação;

-    julgar improcedentes os pedidos de indemnização;

-    condenar a recorrente nas despesas;

-    para o caso de o Tribunal concluir pela nulidade do artigo 1.°, n.os 27 a 32, da decisão impugnada, indicar quais os efeitos das disposições anuladas que se devem manter até que essa decisão seja alterada em conformidade com o acórdão a proferir.

37.
    A Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne:

-    julgar o recurso de anulação inadmissível ou, pelo menos, improcedente;

-    negar provimento ao pedido de indemnização;

-    condenar a recorrente nas despesas.

38.
    O Reino de Espanha conclui pedindo que o Tribunal se digne:

-    rejeitar o pedido;

-    condenar a recorrente nas despesas.

Quanto à admissibilidade dos pedidos de anulação

Argumentos das partes

39.
    O Conselho e a Comissão contestam a admissibilidade dos pedidos de anulação. A decisão impugnada era uma medida legislativa de carácter geral que se aplicava a todos os operadores económicos em causa. De qualquer modo, a recorrente não era individualmente afectada pela decisão impugnada, na acepção do artigo 173.°, quarto parágrafo, do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 230.°, quarto parágrafo, CE).

40.
    A recorrente responde que a decisão impugnada é uma decisão na acepção do artigo 173, quarto parágrafo, do Tratado. Acrescenta que é directa e individualmente afectada, na acepção dessa mesma disposição, pela decisão impugnada ou, pelo menos, pelas suas disposições que alteraram os artigos 101.°, 102.° e 108.° da decisão PTU e o artigo 6.° do anexo II e que aditaram um novo artigo 108.°-B a esta última decisão.

41.
    A recorrente era directamente afectada, pois a decisão impugnada ou, pelo menos, as disposições desta, referidas no número anterior, não deixam qualquer margem de apreciação às autoridades nacionais dos Estados-Membros incumbidas da sua aplicação. Além disso, era individualmente afectada pela decisão impugnada ou, pelo menos, pelas disposições referidas, em virtude de se encontrar numa situação que a distinguia de qualquer outra empresa (acórdão do Tribunal de Justiça de 18 de Maio de 1994, Codorniu/Conselho, C-309/89, Colect., p. I-1853). Alega, para o efeito, que é o único produtor de açúcar dos PTU que claramente se manifestou, enquanto parte interessada, durante o procedimento administrativo que antecedeu a adopção da decisão impugnada.

42.
    A recorrente sublinha, em seguida, que faz parte de um número muito restrito de empresas açucareiras estabelecidas nos PTU e cuja situação deveria ter sido examinada pelo Conselho antes de modificar a decisão PTU. Recorda, para o efeito, que fez investimentos consideráveis e assumiu compromissos a longo prazo com fornecedores de açúcar nos Estados ACP (acórdão do Tribunal de Justiça de17 de Janeiro de 1985, Piraiki-Patraiki e o./Comissão, 11/82, Recueil, p. 207, n.° 28, e acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 14 de Setembro de 1995, Antillean Rice Mills e o./Comissão, T-480/93 e T-483/93, Colect., p. II-2305, n.° 74). Numa carta de 18 de Dezembro de 1997, o próprio comissário Fischler reconhecera que as modificações que a decisão impugnada introduziu na decisão PTU foram adoptadas como solução de recurso, em vez das medidas de protecção que poderiam ter sido tomadas ao abrigo do artigo 109.° da decisão PTU. Nestas circunstâncias, cabia ao Conselho atender aos interesses da recorrente (acórdão Antillean Rice Mills e o./Comissão, já referido, n.os 76 e 77). Com efeito, se a Comunidade tivesse formalmente adoptado medidas de protecção, deveria atender às consequências que poderiam ter a nível das empresas estabelecidas nos PTU. A recorrente considera que a diferença formal que distingue as medidas de protecção de uma restrição estrutural não acarreta qualquer diferença no que respeita à medida em que a Comunidade deve atender aos interesses das empresas estabelecidas nos PTU.

43.
    A obrigação da Comunidade de atender às consequências que o acto que pretende adoptar pode ter a nível da situação de determinados particulares resultava, de um modo geral, do preâmbulo do Tratado, da Carta das Nações Unidas e do artigo 131.°, terceiro parágrafo, do Tratado.

44.
    Em seguida, a recorrente observa que a restrição quantitativa às importações de açúcar proveniente dos PTU constante da decisão impugnada e a limitação dos tipos de operações de complemento de fabrico ou de transformação susceptíveis de conferir a origem PTU através da aplicação da regra de cúmulo de origem ACP/PTU ameaçam directamente a sua existência e as suas actividades comerciais. Na audiência, sublinhou que, quando a decisão impugnada foi adoptada, era a única empresa açucareira estabelecida em Aruba. Considera que a sua situação é comparável à da parte que interpôs o recurso no processo que esteve na origem do acórdão do Tribunal de Justiça de 16 de Maio de 1991, Extramet Industrie/Conselho (C-358/89, Colect., p. I-2501).

45.
    Por último, a recorrente, referindo-se ao acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 17 de Junho de 1998, UEAPME/Conselho (T-135/96, Colect., p. II-2335, n.° 89), considera que a decisão impugnada não foi objecto de controlo democrático. Com efeito, nem o Parlamento Europeu nem os PTU foram consultados. Nestas condições, o Conselho deveria ter atendido à posição específica dos PTU (acórdão UEAPME/Conselho, já referido, n.° 90).

Apreciação do Tribunal

46.
    Deve observar-se que a decisão impugnada, embora se intitule «decisão», tem carácter geral, pois aplica-se à generalidade dos operadores económicos interessados. O facto de o artigo 108.°-B, aditado à decisão PTU por força da decisão impugnada, afectar especialmente a recorrente, ao limitar as importações de açúcar para a Comunidade que podem beneficiar do cúmulo de origemACP/PTU, não é susceptível de pôr em causa a natureza regulamentar da decisão impugnada, pois a disposição em questão tem por destinatários a generalidade das empresas que trabalham na área das exportações para a Comunidade de açúcar proveniente dos PTU. Deve-se recordar, a este propósito, que a possibilidade de determinar, com maior ou menor precisão, o número ou mesmo a identidade dos operadores económicos a que um acto se aplica, em determinado momento, não basta para pôr em causa a natureza regulamentar do acto, visto ser pacífico que tal aplicação é feita nos termos de uma situação objectiva de direito ou de facto, definida pelo acto em função do respectivo objectivo (acórdãos Codorniu/Conselho, referido no n.° 41 supra, n.° 18, e Antillean Rice Mills e o./Comissão, referido no n.° 42 supra, n.° 65).

47.
    Contudo, o carácter geral da decisão impugnada não exclui, no entanto, a possibilidade de afectar directa e individualmente determinadas pessoas singulares ou colectivas, na acepção do artigo 173.°, quarto parágrafo, do Tratado (v. acórdãos Codorniu/Conselho, referido no n.° 41 supra, n.° 19, e Antillean Rice Mills e o./Comissão, referido no n.° 42 supra, n.° 66).

48.
    Importa observar que a recorrente é directamente afectada pela decisão impugnada, visto esta não atribuir qualquer margem de apreciação às autoridades nacionais dos Estados-Membros encarregados da sua aplicação (acórdão Antillean Rice Mills e o./Comissão, referido no n.° 42 supra, n.° 63).

49.
    Quanto à questão de saber se a recorrente é individualmente afectada pela decisão impugnada, cabe recordar que, para que uma pessoa singular ou colectiva possa ser considerada individualmente afectada por um acto de carácter geral, é necessário que o acto em causa a atinja em virtude de qualidades que lhe são específicas ou de uma situação de facto que a caracteriza relativamente a qualquer outra pessoa (acórdão do Tribunal de Justiça de 15 de Julho de 1963, Plaumann/Comissão, 25/62, Colect. 1962-1964, pp. 279, 284; despachos do Tribunal de Primeira Instância de 30 de Setembro de 1997, Federolio/Comissão, T-122/96, Colect., p. II-1559, n.° 59, e de 29 de Abril de 1999, Alce/Comissão, T-120/98, Colect., p. II-1395, n.° 19).

50.
    O facto de a decisão impugnada afectar a actividade económica da recorrente não é susceptível de a individualizar, na acepção do artigo 173.°, quarto parágrafo, do Tratado, relativamente a qualquer outro operador, pois encontra-se numa situação objectivamente determinada, comparável à de qualquer outro operador estabelecido ou que venha a estabelecer-se num PTU e que seja ou venha a ser activo no mercado do açúcar (despacho Federolio/Comissão, referido no n.° 49 supra, n.° 67). A este propósito, deve observar-se que a própria recorrente afirmou na sua petição (n.° 207) que, aquando da adopção da decisão impugnada, havia duas ou três outras empresas açucareiras nos PTU (designadamente em Curaçau). Além disso, na audiência, explicou que uma nova empresa açucareira, a Rica Foods, se instalara em Aruba após a adopção da decisão impugnada. Nestascondições, a recorrente não conseguiu provar que sofria um prejuízo excepcional susceptível de a individualizar relativamente aos outros operadores económicos, na acepção do acórdão Extramet Industrie/Conselho, referido no n.° 44 supra.

51.
    Todavia, a recorrente sustenta que o Conselho era, nos termos da lei, obrigado a examinar a sua situação específica antes de adoptar a decisão impugnada.

52.
    Importa recordar que o facto de uma instituição comunitária ter a obrigação, por força de disposições específicas, de atender às consequências que o acto que pretende adoptar pode ter a nível da situação de determinados particulares é bastante para os individualizar (acórdãos do Tribunal de Justiça, Piraiki-Patraiki e o./Comissão, referido no n.° 42 supra, n.os 28 a 31, e de 26 de Junho de 1990, Sofrimport/Comissão, C-152/88, Colect., p. I-2477, n.os 11 a 13; acórdão Antillean Rice Mills e o./Comissão, referido no n.° 42 supra, n.° 67).

53.
    Todavia, forçoso é observar que, no momento da adopção da decisão impugnada, nenhuma disposição de direito comunitário obrigava o Conselho a ter em atenção a situação específica da recorrente. Cabe sublinhar, para o efeito, que a decisão impugnada não pode ser considerada uma medida de protecção que integra o âmbito do artigo 109.° da decisão PTU (v. n.os 107 a 112 infra). A obrigação que esta disposição impõe à instituição que adopta uma medida de protecção, ou seja, atender à situação específica das empresas interessadas (acórdão Antillean Rice Mills e o./Comissão, referido no n.° 42 supra, n.° 72), não é, portanto, aplicável no caso em apreço. De qualquer modo, deve sublinhar-se que a Proposta de Decisão 96/C 139/01 do Conselho respeitante à revisão intercalar da decisão PTU (JO 1996, C 139, p. 1) foi apresentada pela Comissão ao Conselho, em 16 de Fevereiro de 1996, e previa, no início, a abolição total da regra de cúmulo de origem ACP/PTU para o açúcar originário dos Estados ACP (v. n.° 94 infra). Mesmo que o pretendesse, a Comissão não podia ter tomado em consideração a situação específica da recorrente, pois, então, a recorrente, que se constituiu em 6 de Fevereiro de 1997, não existia.

54.
    O facto de a recorrente ter procedido a investimentos e ter celebrado contratos de fornecimento resulta de uma escolha económica que efectuou em função dos seus próprios interesses comerciais (despacho do Tribunal de Primeira Instância de 30 de Janeiro de 2001, Iposea/Comissão, T-49/00, Colect., p. II-163, n.° 34). Esta situação, resultante da actividade normal de qualquer empresa activa na transformação do açúcar, não é susceptível de individualizar a recorrente, na acepção do artigo 173.°, quarto parágrafo, do Tratado.

55.
    Quanto à intervenção da recorrente ao longo do processo que antecedeu a adopção da decisão impugnada, cabe observar que nenhuma das disposições de direito comunitário impunha ao Conselho, aquando da revisão da decisão PTU, que adoptasse um procedimento em cujo quadro a recorrente tivesse o direito de ser ouvida. Assim, as intervenções referidas pela recorrente não lhe podiam conferir a qualidade para agir a título do artigo 173.°, quarto parágrafo, do Tratado(acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 7 de Fevereiro de 2001, Sociedade Agrícola dos Arinhos e o./Comissão, T-38/99 a 50/99, Colect., p. II-585, n.° 48).

56.
    Por último, o facto de a decisão impugnada não ter sido sujeita a qualquer controlo democrático não permite afastar a aplicação dos critérios de admissibilidade fixados pelo artigo 173.°, quarto parágrafo, do Tratado (v., neste sentido, despacho do Tribunal de Justiça de 10 de Maio de 2001, FNAB e o./Conselho, C-345/00 P, Colect., p. I-3811, n.° 40).

57.
    Com base em tudo quanto precede, há que declarar que os pedidos de anulação são inadmissíveis.

Quanto ao pedido de indemnização

Observações preliminares

58.
    A recorrente sustenta que as violações do direito comunitário, identificadas nos seus fundamentos de anulação, lhe causaram prejuízo e implicam a responsabilidade extracontratual da Comunidade.

59.
    Deve recordar-se que, em matéria de responsabilidade extracontratual da Comunidade, se reconhece um direito à reparação desde que se encontrem satisfeitas três condições cumulativas, ou seja, que a regra de direito violada tenha por objecto conferir direitos aos particulares, que a violação seja suficientemente caracterizada e, por último, que exista um nexo de causalidade directo entre a violação da obrigação que incumbe à Comunidade e o prejuízo sofrido pelas pessoas lesadas (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 4 de Julho de 2000, Bergaderm e Goupil/Comissão, C-352/98 P, Colect., p. I-5291, n.° 42).

60.
    Há que, portanto, examinar se os fundamentos de anulação da petição estão associados a violações de regras de direito que conferem direitos aos particulares.

61.
    A recorrente invoca cinco fundamentos em apoio dos seus pedidos de anulação. O primeiro decorre de uma violação do «mecanismo de bloqueio» segundo o qual as vantagens atribuídas aos PTU no quadro da realização faseada da sua associação à Comunidade já não podiam ser postas em causa por esta. O segundo, de uma violação do princípio da proporcionalidade. O terceiro, de uma violação do artigo 240.° da decisão PTU, e o quarto, de uma violação do princípio da segurança jurídica e da protecção da confiança legítima. Por último, o quinto fundamento baseia-se numa violação do artigo 190.° do Tratado CE (actual artigo 253.° CE).

62.
    A recorrente nem sequer alega que as violações do direito comunitário invocadas no âmbito dos terceiro e quinto fundamentos são relativas a regras de direito que conferem direitos aos particulares. Apenas alega na sua petição (n.° 180) que o«mecanismo de bloqueio» (primeiro fundamento), o princípio da proporcionalidade (segundo fundamento) e o princípio da segurança jurídica ou da protecção da confiança legítima (quarto fundamento) são regras desse tipo.

63.
    Quanto ao quinto fundamento, já se declarou que a violação do artigo 190.° do Tratado não é susceptível de determinar a responsabilidade extracontratual da Comunidade (acórdãos do Tribunal de Justiça de 15 de Setembro de 1982, Kind/CEE, 106/81, Recueil, p. 2885, n.° 14, e de 6 de Junho de 1990, AERPO e o./Comissão, C-119/88, Colect., p. I-2189, n.° 20; acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 15 de Dezembro de 1994, Unifruit Hellas/Comissão, T-489/93, Colect., p. II-1201, n.° 41). No que respeita ao terceiro fundamento, decorrente da alegada violação do artigo 240.° da decisão PTU, na medida em que o Conselho não era, por força dessa disposição, competente ratione temporis para adoptar a decisão impugnada, dificilmente se pode conceber que essa disposição constitui uma regra de direito que confere direitos aos particulares (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 13 de Março de 1992, Vreugdenhil/Comissão, C-282/90, Colect., p. I-1937, n.os 20 a 25). De qualquer modo, o Tribunal de Justiça já declarou, no seu acórdão Emesa (n.° 33), que a decisão impugnada não fora adoptada com violação do artigo 240.° da decisão PTU, e a recorrente nada disse a respeito dessa passagem do acórdão do Tribunal de Justiça nas alegações complementares que apresentou em 9 de Outubro de 2000.

64.
    Em contrapartida, o princípio da proporcionalidade, a que se refere o segundo fundamento (acórdão Unifruit Hellas/Comissão, referido no n.° 63 supra, n.° 42), e o princípio da protecção da confiança legítima, a que se refere o quarto fundamento (acórdão do Tribunal de Justiça de 19 de Maio de 1992, Mulder e o./Conselho e Comissão, C-104/89 e C-37/90, Colect., p. I-3061, n.° 15), constituem regras de direito que conferem direitos aos particulares. Quanto ao «mecanismo de bloqueio» que foi objecto do primeiro fundamento, há que examinar, antes de mais, se se trata de um princípio de direito comunitário e, em seguida, verificar, eventualmente, se se trata de uma regra de direito que confere direitos aos particulares.

65.
    Segue-se que, no quadro do pedido de indemnização, apenas há que examinar os primeiro, segundo e quarto fundamentos da petição.

Quanto ao fundamento decorrente da violação do «mecanismo de bloqueio»

66.
    A recorrente sustenta que as disposições conjugadas da parte IV do Tratado, em especial os seus artigos 132.°, 133.° e 136.°, bem como o acervo comunitário que as sucessivas decisões PTU transformaram em realidade, estabelecem um «princípio de bloqueio». Este princípio obstava a que as vantagens já atribuídas aos PTU no quadro da realização faseada da associação fossem postas em causa por uma decisão posterior da Comunidade.

67.
    No seu acórdão Emesa (n.os 38 e 39), o Tribunal de Justiça declarou:

«38    [...] [E]mbora o processo dinâmico e progressivo no qual se insere a associação dos PTU à Comunidade exija que sejam tomados em consideração pelo Conselho os resultados conseguidos graças às suas decisões anteriores, também é um facto [...] que o Conselho, quando adopta medidas nos termos do artigo 136.°, segundo parágrafo, do Tratado, deve simultaneamente ter em conta os princípios que figuram na quarta parte do Tratado e outros princípios do direito comunitário, incluindo os que se referem à política agrícola comum.

39    Ao efectuar a ponderação dos diferentes objectivos fixados pelo Tratado, tomando globalmente em consideração os resultados obtidos com fundamento nas suas decisões anteriores, o Conselho, que dispõe para esse efeito de um vasto poder de apreciação, correspondente às responsabilidades políticas que lhe são conferidas pelos artigos 40.° do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 34.° CE), 41.° e 42.° do Tratado CE (actuais artigos 35.° CE e 36.° CE), 43.° do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 37.° CE) e 136.° do Tratado, pode ser levado, em caso de necessidade, a diminuir certas vantagens anteriormente concedidas aos PTU.»

68.
    Segue-se, portanto, que não existe «mecanismo ou princípio de bloqueio» absoluto nas relações entre a Comunidade e os PTU. Com efeito, o Conselho pode ser levado, «em caso de necessidade», a diminuir determinadas vantagens anteriormente concedidas aos PTU (acórdão Emesa, n.° 39).

69.
    Forçoso é observar, em seguida, que, com base nos elementos do processo de que dispunha, o Tribunal de Justiça examinou se, no caso em apreço, o Conselho pudera razoavelmente considerar, após ter confrontado os objectivos da associação dos PTU com os da política agrícola comum, que era necessário limitar a aplicação da regra de cúmulo de origem ACP/PTU.

70.
    Assim, o Tribunal de Justiça declarou no seu acórdão Emesa (n.os 40 a 42):

«40    No caso concreto, é um facto que a redução para 3 000 toneladas anuais da quantidade de açúcar susceptível de beneficiar da cumulação de origem ACP/PTU constitui uma restrição em relação à decisão PTU. Todavia, uma vez que está provado que a aplicação da regra da cumulação de origem no sector do açúcar era susceptível de ocasionar importantes perturbações no funcionamento de uma organização comum de mercado [...] o Conselho, depois de ter ponderado os objectivos da associação dos PTU com os da política agrícola comum, tinha o direito de adoptar, cumprindo os princípios do direito comunitário que enquadram o exercício do seu poder de apreciação, qualquer medida susceptível de pôr fim ou atenuar as referidas perturbações, incluindo a supressão ou a limitação de vantagens anteriormente concedidas aos PTU.

41    Por maioria de razão deve ser assim [...] quando as vantagens em causa têm um carácter extraordinário em relação às regras de funcionamento do mercado comunitário. Tal é o caso da regra que permite, após determinadas operações, conceder uma origem PTU a determinados produtos provenientes dos Estados ACP.

42    Deve acrescentar-se que a revisão da decisão PTU não apenas introduziu restrições ou limitações em relação ao regime anteriormente em vigor dado que, como a Comissão o sustenta, sem ser contradita quanto a este aspecto, foram atribuídas diferentes vantagens aos PTU em matéria de estabelecimento no interior da Comunidade (artigos 232.° e 233.°-A da decisão PTU alterada), de reconhecimento mútuo das qualificações profissionais (artigo 233.°-B), de acesso a programas comunitários (artigo 233.°-C). Além disso, a ajuda financeira da Comunidade aos PTU aumentou 21% (artigo 154.°-A).»

71.
    Desta passagem do acórdão Emesa resulta que o Tribunal de Justiça considera que, nas circunstâncias do caso em apreço, o Conselho não só tinha o direito de limitar a aplicação da regra de cúmulo de origem ACP/PTU como o fez, como também podia ter suprimido integralmente essa vantagem no que respeita ao açúcar proveniente dos PTU.

72.
    Todavia, segundo a recorrente, o Tribunal de Justiça reconheceu nos n.os 40 a 42 do acórdão que, mesmo «em caso de necessidade» (acórdão Emesa, n.° 39), o Conselho só podia reduzir uma vantagem anteriormente concedida aos PTU caso essa vantagem fosse de natureza extraordinária e se fossem concedidas compensações noutros domínios. Ora, a regra de cúmulo de origem ACP/PTU nada tinha de extraordinário. Havia que apreciar o seu carácter alegadamente excepcional não «por referência às regras de funcionamento do mercado comunitário» mas por referência às regras de origem usuais, aos diferentes regimes de importação e à posição privilegiada dos PTU. Além disso, a recorrente critica o facto de o Tribunal de Justiça não ter examinado se as compensações nos outros domínios contrabalançavam realmente a paralisia da indústria açucareira dos PTU, provocada pela decisão impugnada.

73.
    Como a recorrente nem sequer alega que o Tribunal de Justiça baseou a sua apreciação em dados factuais inexactos ou incompletos, não cabe ao Tribunal de Primeira Instância pôr essa apreciação em causa.

74.
    Além disso, importa sublinhar que a argumentação da recorrente assenta numa interpretação errónea dos n.os 40 a 42 do acórdão Emesa. Com efeito, o Tribunal de Justiça não considerou que o Conselho apenas podia reduzir uma vantagem concedida aos PTU caso essa vantagem fosse de natureza extraordinária e se fossem concedidas compensações noutros domínios. Do acórdão resulta que o Conselho podia reduzir, ou mesmo suprimir, uma vantagem anteriormente concedida aos PTU, no caso em apreço, a aplicação da regra de cúmulo de origemACP/PTU, desde que «a aplicação d[ess]a regra [...] no sector do açúcar [fosse] susceptível de ocasionar importantes perturbações no funcionamento de uma organização comum de mercado» (n.° 40 do acórdão).

75.
    A fim de sublinhar o carácter justificado e equilibrado da decisão impugnada, o Tribunal de Justiça acrescenta que, de qualquer modo, a vantagem concedida tinha natureza extraordinária e que o Conselho, na decisão impugnada, concedeu diversas vantagens noutros domínios (acórdão Emesa, n.os 41 e 42).

76.
    Todavia, no seu acórdão Emesa, o Tribunal de Justiça nunca faz referência a «compensações». O Tribunal de Justiça indica, no n.° 42 desse acórdão, que «foram atribuídas diferentes vantagens aos PTU», sem que a recorrente tenha contestado a existência dessas vantagens.

77.
    Em seguida, quanto à questão de saber se a regra de cúmulo de origem ACP/PTU confere uma vantagem extraordinária aos operadores económicos dos PTU, deve recordar-se que, de acordo com as regras de origem usuais, um produto considera-se originário de um país se aí tiver sido inteiramente obtido ou suficientemente transformado [artigos 4.° e 5.° do Regulamento (CEE) n.° 802/68 do Conselho, de 27 de Junho de 1968, relativo à definição comum da noção de origem das mercadorias (JO L 148, p. 1; EE 02 F1 p. 5), e artigos 1.° a 3.° do anexo II].

78.
    Ora, as partes não contestam que o açúcar exportado pela recorrente não foi inteiramente obtido nos PTU. Trata-se, com efeito, de açúcar importado dos países ACP. Além disso, não se contesta que o açúcar exportado pela recorrente não sofre, em Aruba, uma transformação suficiente para conferir uma origem PTU ao produto em causa, ao abrigo das regras de origem usuais.

79.
    É apenas através da regra de cúmulo de origem ACP/PTU que o açúcar exportado pela recorrente pode ser considerado açúcar de origem PTU. Com efeito, por força dessa regra, transformações mínimas - mesmo as explicitamente referidas no artigo 3.°, n.° 3, do anexo II como insuficientes para conferir carácter originário a um produto proveniente dos PTU - efectuadas nos PTU nos produtos de origem ACP conferem, excepcionalmente, origem PTU aos produtos em causa. Como os produtos que beneficiam do cúmulo de origem ACP/PTU podem ser importados para a Comunidade com isenção de direitos aduaneiros, deve considerar-se que esta regra confere, como o Tribunal de Justiça sublinha, uma vantagem extraordinária aos operadores económicos dos PTU (acórdão Emesa, n.° 41).

80.
    No quadro do primeiro fundamento, a recorrente sustenta ainda que o Conselho violou o artigo 133.°, n.° 1, do Tratado, ao limitar a 3 000 toneladas as importações de açúcar que beneficia do cúmulo de origem ACP/PTU. O limite previsto no artigo 108.°-B, n.° 1, da decisão PTU, após as modificações introduzidas, constituía, com efeito, uma restrição quantitativa proibida por essa disposição. Além disso,mesmo que o regime resultante da decisão PTU pusesse em causa outros interesses comunitários, o Conselho tinha, por força do artigo 136.°, segundo parágrafo, do Tratado, a obrigação de respeitar os «resultados conseguidos».

81.
    Todavia, deve observar-se que o Tribunal de Justiça já rejeitou esse argumento no seu acórdão Emesa, nos termos seguintes:

«45    Sem que seja necessário decidir a questão de saber se o contingente pautal fixado no artigo 108.°-B da decisão PTU alterada pode ser considerado uma restrição quantitativa nem a de saber se o regime de cumulação ACP/PTU confere às mercadorias consideradas uma origem PTU para a aplicação do regime de importação referido no artigo 132.°, n.° 1, do Tratado, é necessário declarar que os produtos em causa só podem ser importados para além do contingente mediante pagamento dos direitos aduaneiros.

46    Ora, o artigo 133.°, n.° 1, do Tratado prevê, no que diz respeito às importações originárias dos PTU na Comunidade, que beneficiem da eliminação total dos direitos aduaneiros que, 'nos termos do presente Tratado, se deve progressivamente realizar entre os Estados-Membros'.

47    A este respeito, há que salientar, como fez a Comissão, que, tratando-se do comércio do açúcar, o desmantelamento pautal intracomunitário só ocorreu após o estabelecimento de uma organização comum de mercado desse produto, o qual implicou a criação de uma pauta externa comum paralelamente à fixação de um preço mínimo aplicável em todos os Estados-Membros, a fim de, nomeadamente, eliminar as distorções de concorrência. Também, na ausência de qualquer política agrícola comum entre os PTU e a Comunidade, as medidas destinadas a evitar distorções de concorrência ou perturbações do mercado comunitário, que podem tomar a forma de um contingente pautal, não podem, pelo simples facto da sua adopção, ser consideradas contrárias ao artigo 133.°, n.° 1, do Tratado.

48    Quanto à questão de saber se o contingente pautal fixado pelo artigo 108.°-B da decisão PTU alterada é compatível com o artigo 136.°, segundo parágrafo, do Tratado, basta declarar que esta disposição prevê expressamente que a acção do Conselho deve prosseguir 'com base nos resultados conseguidos e nos princípios enunciados no presente Tratado'. Entre estes princípios figuram, como o Tribunal de Justiça já decidiu no acórdão [de 11 de Fevereiro de 1999] Antillean Rice Mills e o./Comissão [...], [C-390/95 P, Colect., p. I-769], n.° 37, os que se referem à política agrícola comum.

49    Por conseguinte, o Conselho não pode ser censurado por ter tomado em conta, no âmbito da aplicação do artigo 136.°, segundo parágrafo, do Tratado, as exigências da política agrícola comum.

50    Decorre das considerações precedentes que a validade da medida prevista no artigo 108.°-B da decisão PTU não pode ser posta em causa em relação aos artigos 133.°, n.° 1, e 136.°, segundo parágrafo, do Tratado, porque fixa um contingente nas importações de açúcar beneficiário do regime de cumulação de origem ACP/PTU.»

82.
    Resulta do que antecede que o primeiro fundamento deve ser julgado improcedente na íntegra.

83.
    Sem que haja ainda necessidade de se pronunciar sobre a questão de saber se o primeiro fundamento é relativo a uma regra de direito que confere direitos aos particulares, deve declarar-se que o exame do fundamento não revelou a existência de um comportamento da Comunidade que pudesse determinar a sua responsabilidade.

Quanto ao fundamento decorrente da violação do princípio da segurança jurídica e da protecção da confiança legítima

84.
    A recorrente alega que a decisão impugnada viola o princípio da segurança jurídica e da protecção da confiança legítima. Recorda que, ao aditar o artigo 108.°-B, n.° 1, à decisão PTU, o Conselho limitou a 3 000 toneladas por ano as importações de açúcar que podem beneficiar do cúmulo de origem ACP/PTU. A recorrente não podia contar com uma tal modificação da decisão PTU. Sublinha, para o efeito, que a decisão PTU fora adoptada para um período de dez anos e que, por força do seu artigo 240.°, n.° 3, a única modificação prevista devia ser efectuada até 1 de Março de 1995. Além disso, em caso de alteração, esta só podia efectuar-se, de acordo com a recorrente, no sentido do objectivo enunciado no artigo 132.°, n.° 1, do Tratado.

85.
    A recorrente sustenta ainda que os princípios gerais do direito comunitário obrigam o Conselho a ter em atenção os interesses das empresas que realizaram investimentos e desenvolveram actividades com base nas regras de direito em vigor (acórdãos do Tribunal de Justiça de 27 de Abril de 1978, Stimming/Comissão, 90/77, Recueil, p. 995, Colect., p. 353; de 16 de Maio de 1979, Tomadini, 84/78, Recueil, p. 1801; de 28 de Abril de 1988, Mulder, 120/86, Colect., p. 2321; e de 11 de Julho de 1991, Crispoltoni, C-368/89, Colect., p. I-3695).

86.
    O Tribunal recorda, antes de mais, que o Conselho, quando aprova medidas ao abrigo do artigo 136.°, segundo parágrafo, do Tratado, deve atender tanto aos princípios que figuram na parte IV deste, designadamente os enunciados no artigo 132.° do Tratado, como aos outros princípios do direito comunitário, incluindo os relativos à política agrícola comum (acórdão Emesa, n.° 38). Deve ainda recordar-se que o Conselho, que dispõe de um amplo poder de apreciação quando efectua arbitragens entre os objectivos da associação dos PTU e os da política agrícola comum (acórdão Emesa, n.os 39 e 53), está no direito de reduzir, oumesmo suprimir, uma vantagem anteriormente concedida aos PTU, desde que a sua aplicação seja passível de perturbar seriamente o funcionamento de uma organização comum de mercado (acórdão Emesa, n.° 40).

87.
    Ora, embora o respeito da confiança legítima se inscreva entre os princípios fundamentais da Comunidade, os operadores económicos não podem depositar uma confiança legítima na manutenção de uma situação existente que pode ser alterada no âmbito do poder de apreciação das instituições comunitárias (v., designadamente, acórdão do Tribunal de Justiça de 17 de Setembro de 1998, Pontillo, C-372/96, Colect., p. I-5091, n.os 22 e 23, e acórdão Emesa, n.° 34).

88.
    Assim, um operador económico diligente deveria prever que a decisão PTU podia ser modificada e que uma modificação podia, eventualmente, suprimir ou limitar vantagens anteriormente concedidas aos PTU. Esta análise impõe-se, por maioria de razão, no caso em apreço, em que as vantagens possuíam um carácter extraordinário (acórdão Emesa, n.os 40 e 41). Além disso, nenhuma disposição de direito comunitário obrigava o Conselho a tomar em consideração os interesses das empresas já presentes no mercado (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 5 de Outubro de 1994, Alemanha/Conselho, C-280/93, Colect., p. I-4973, n.° 79).

89.
    A recorrente não podia retirar argumentos do artigo 240.°, n.° 3, da decisão PTU, que prevê que, antes do termo do primeiro período de cinco anos, o Conselho adoptará, se for caso disso, as eventuais alterações a aplicar à associação dos PTU à Comunidade. Com efeito, esta disposição não priva o Conselho da competência, que retira directamente do Tratado, de alterar os actos que adoptou nos termos do artigo 136.° a fim de alcançar o conjunto dos objectivos enunciados no artigo 132.° do referido Tratado (acórdão Emesa, n.° 33).

90.
    Em seguida, a recorrente observa que a sua decisão de instalar em Aruba uma fábrica de açúcar só foi tomada após concertação, em 1995 e 1996, com as autoridades de Aruba e a representação permanente do Reino dos Países Baixos na União Europeia.

91.
    A recorrente não pudera prever que o Conselho ia limitar quantitativamente as importações de açúcar que beneficiavam do cúmulo de origem ACP/PTU. A este propósito, a recorrente insiste no facto de que o processo decisório no Conselho não é público. Só a partir de Julho de 1997 fora informada, pelas autoridades de Aruba, dos elementos do debate.

92.
    Todavia, o Tribunal de Primeira Instância observa que a recorrente não aduz qualquer elemento de que resulte que as instituições comunitárias lhe deram garantias precisas susceptíveis de lhe permitir ter esperanças fundadas quanto à manutenção do regime existente do cúmulo de origem ACP/PTU relativamente às exportações de açúcar que pretendia realizar.

93.
    Pelo contrário, como justamente sublinha o Tribunal de Justiça no acórdão Emesa, «resulta dos autos que a [recorrente], na altura de iniciar investimentos em Aruba, dispunha de elementos de informação suficientes para prever, enquanto operador normalmente diligente, que o regime liberal da cumulação de origem era susceptível de ser objecto de uma alteração no sentido restritivo» (n.° 36 do acórdão). O Tribunal de Justiça observa, a este propósito, «que a proposta [96/C 139/01] [...] foi publicada no Jornal Oficial das Comunidades Europeias de 10 de Maio de 1996, isto é, quase um ano antes do início da produção da [recorrente] em Aruba» (n.° 36 do acórdão).

94.
    Ora, a proposta 96/C 139/01, que o Tribunal de Justiça refere, previa a abolição da regra de cúmulo de origem ACP/PTU, designadamente, no que respeita ao açúcar originário dos Estados ACP. Com efeito, no que respeita ao anexo II, a Comissão propunha um novo artigo 6.°, que dispunha que a regra de cúmulo de origem ACP/PTU não se aplicava «aos produtos enumerados nos capítulos 1 a 24 do Sistema Harmonizado que [...] são originários [dos] Estados ACP». Ora, o açúcar vem referido no capítulo 17 do Sistema Harmonizado.

95.
    Segue-se que a proposta 96/C 139/01, publicada em Maio de 1996, ou seja, cerca de nove meses antes de a recorrente se ter constituído e onze meses antes de ter começado a sua produção de açúcar (v. n.° 19 supra), previa a introdução de um sistema ainda mais restritivo para a recorrente do que o sistema contido no artigo 108.°-B, n.° 1, da decisão PTU modificada, que admite o cúmulo de origem ACP/PTU relativamente a uma quantidade de 3 000 toneladas de açúcar por ano.

96.
    Por último, a recorrente alega que a decisão impugnada viola o princípio da protecção da confiança legítima, pois não prevê qualquer prazo de transição nem nenhum regime transitório para as actividades existentes nos PTU aquando da revisão da decisão PTU. Não existia, no caso em apreço, nenhum interesse geral peremptório susceptível de justificar que a revisão da decisão PTU não fosse acompanhada de medidas transitórias (acórdão do Tribunal de Justiça de 17 de Julho de 1997, Affish, C-183/95, Colect., p. I-4315, n.° 57).

97.
    O Tribunal já declarou que nenhuma disposição de direito comunitário obrigava o Conselho a ter em consideração os interesses das empresas já presentes no mercado (v. n.° 88 supra).

98.
    O Tribunal observa em seguida que a recorrente nem sequer alega que, no momento da adopção da decisão impugnada, tinha um carregamento de açúcar a ser encaminhado para a Comunidade, que legitimamente acreditara poder ser importado para a Comunidade sem qualquer restrição (v., neste sentido, acórdão Sofrimport/Comissão, referido no n.° 52 supra, n.os 16 e 21, e acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 11 de Julho de 1997, Oleifici Italiani/Comissão, T-267/94, Colect., p. II-1239, n.os 38 a 40).

99.
    Além disso, deve observar-se que a Comissão adoptou, em 17 de Dezembro de 1997, o Regulamento (CE) n.° 2553/97 relativo às regras de emissão dos certificados de importação relativos a determinados produtos dos códigos NC 1701, 1702, 1703 e 1704 que acumulam a origem ACP/PTU (JO L 349, p. 26). Ora, do artigo 8.° do Regulamento n.° 2553/97 resulta que o artigo 108.°-B, n.° 1, da decisão PTU, após as alterações, só era aplicável a partir de 1 de Janeiro de 1998 e que os certificados de importação solicitados a partir de 10 de Dezembro de 1997 e até 31 de Dezembro de 1997 seriam emitidos até à quantidade de 3 000 toneladas. Além disso, não se contesta que os pedidos de certificados de importação apresentados antes de 10 de Dezembro de 1997 foram inteiramente satisfeitos.

100.
    Segue-se portanto que, durante um mês, esteve em vigor um regime transitório que, além disso, era generoso no sentido de que, durante os 21 dias compreendidos entre 10 e 31 de Dezembro de 1997, pôde ser importada uma quantidade «anual» de 3 000 toneladas de açúcar que beneficiou do cúmulo de origem ACP/PTU.

101.
    A acusação relativa a uma pretensa inexistência de um regime transitório também deve, portanto, ser rejeitada.

102.
    De tudo o que precede resulta que o fundamento decorrente da violação do princípio da segurança jurídica e da protecção da confiança legítima não pode ser acolhido. O exame deste fundamento também não revelou, portanto, a existência de uma infracção, por parte da Comunidade, a uma regra de direito que confira direitos aos particulares.

Quanto ao fundamento decorrente de uma violação do princípio da proporcionalidade

103.
    Em primeiro lugar, a recorrente sustenta que o Conselho tem o dever de conciliar a prossecução dos diferentes objectivos enunciados no artigo 3.° do Tratado, sem todavia atribuir prioridade à política agrícola comum (acórdão do Tribunal de Justiça de 23 de Fevereiro de 1988, Reino Unido/Conselho, 68/86, Colect., p. 855, n.° 12, e despacho do Tribunal de Justiça de 12 de Julho de 1996, Reino Unido/Comissão, C-180/96 R, Colect., p. I-3903, n.° 63). No caso em apreço, o Conselho teria violado o princípio da proporcionalidade ao atribuir prioridade à política agrícola comum em detrimento dos interesses dos PTU.

104.
    No seu acórdão Emesa, o Tribunal de Justiça considerou, por um lado, que o Conselho, «quando adopta medidas nos termos do artigo 136.°, segundo parágrafo, do Tratado, deve simultaneamente ter em conta os princípios que figuram na quarta parte do Tratado e outros princípios do direito comunitário, incluindo os que se referem à política agrícola comum» (n.° 38 do acórdão), e, por outro, que, «[a]o efectuar a ponderação dos diferentes objectivos fixados pelo Tratado [...], o Conselho [...] pode ser levado, em caso de necessidade, a diminuir certas vantagens anteriormente concedidas aos PTU» (n.° 39 do acórdão).

105.
    O argumento não pode, portanto, ser acolhido. Será examinado ulteriormente se, no caso em apreço, o Conselho não tiver cometido um erro manifesto na sua apreciação da «necessidade» da limitação das importações de açúcar que beneficia da regra de cúmulo de origem ACP/PTU (v. n.os 117 a 150 infra).

106.
    Em segundo lugar, a recorrente alega que o artigo 108.°-B, n.° 1, da decisão PTU, após as alterações, inclui uma restrição estrutural das importações de açúcar originário dos PTU para a Comunidade. Com efeito, esta disposição limita a 3 000 toneladas a quantidade de açúcar de origem ACP que pode ser importada para a Comunidade com a atribuição de uma origem PTU após operações de complemento de fabrico ou transformação, na acepção do artigo 6.° do anexo II. Ora, segundo a recorrente, relativamente às importações provenientes dos PTU, apenas podem ser adoptadas medidas restritivas temporárias, ao abrigo do artigo 109.° da decisão PTU, desde que essas medidas «apenas limit[em] a título excepcional, parcial e temporário» a livre importação na Comunidade dos produtos provenientes dos PTU (acórdãos do Tribunal de Justiça de 26 de Outubro de 1994, Países Baixos/Comissão, C-430/92, Colect., p. I-5197, e de 22 de Abril de 1997, Road Air, C-310/95, Colect., p. I-2229, n.os 40 e 41; acórdão Antillean Rice Mills e o./Comissão, referido no n.° 42 supra, n.° 95).

107.
    Todavia, do acórdão Emesa (n.° 40) resulta que o Conselho pode reduzir, estruturalmente, uma vantagem anteriormente concedida aos PTU, no caso em apreço a aplicação da regra de cúmulo de origem ACP/PTU no sector do açúcar, se se provar que «a aplicação d[esta] regra [...] n[este] sector [...] [é] susceptível de ocasionar importantes perturbações no funcionamento de uma organização comum de mercado». Examinaremos adiante se a apreciação, efectuada pelo Conselho, do risco que a regra de cúmulo de origem ACP/PTU comportava para a organização comum do mercado do açúcar não está ferida de erro manifesto (v. n.os 117 a 150 infra).

108.
    Em terceiro lugar, a recorrente observa que a carta de 18 de Dezembro de 1997, do comissário Fischler ao seu advogado, e a carta do Sr. Soubestre, da Comissão, ao representante permanente do Reino dos Países Baixos, de 9 de Junho de 1997, revelam que a restrição estrutural do artigo 108.°-B, n.° 1, da decisão PTU, após alterações, foi imposta como solução de recurso. Considera que uma restrição estrutural, em vez de uma medida de protecção, deve, pelo menos, satisfazer os mesmos critérios que as medidas previstas pelo artigo 109.° da decisão PTU. Com efeito, era inaceitável que uma restrição estrutural definitiva pudesse ser mais facilmente aceite do que uma medida de protecção. Ora, no caso em apreço, as condições para adopção de uma medida de protecção nos termos do artigo 109.° da decisão PTU não estavam satisfeitas.

109.
    Todavia, o Tribunal observa que as duas cartas da Comissão, que a recorrente refere, não apoiam a sua argumentação.

110.
    Por um lado, na carta assinada pelo Sr. Soubestre, a Comissão rejeita uma proposta das autoridades neerlandesas. Estas haviam proposto um sistema de preços de exportação mínimos para o açúcar proveniente dos PTU e um alinhamento do procedimento relativo às medidas de protecção pelas regras aplicáveis no quadro da Organização Mundial do Comércio (OMC). Todavia, de forma alguma resulta dessa carta que a restrição estrutural imposta ulteriormente pelo Conselho, na decisão impugnada, constituía uma medida de protecção disfarçada.

111.
    Por outro lado, a carta do comissário Fischler, de 18 de Dezembro de 1997, é uma resposta a uma carta do advogado da recorrente, em que este último expôs as razões por que considerava não ser necessária a adopção de medidas de protecção para o açúcar de origem PTU. O comissário Fischler subscreve essa análise. Explica que, para a Comissão, em virtude da adopção da decisão impugnada, «não parecia ser necessário, então, adoptar medidas de protecção» («safeguard measures seem, for the time being, unnecessary»). Todavia, de forma alguma pretende que a decisão impugnada seja uma solução de recurso, adoptada em substituição de uma medida de protecção. Da carta apenas resulta que a solução estrutural introduzida pela decisão impugnada pôs termo às perturbações no mercado comunitário, pelo que não há que adoptar medidas de protecção.

112.
    Assim, as duas cartas referidas pela recorrente não demonstram que a restrição do cúmulo de origem ACP/PTU imposta pelo artigo 108.°-B, n.° 1, da decisão PTU, após alterações, constitui uma medida de protecção disfarçada ou uma solução de recurso adoptada em substituição dessa medida.

113.
    De qualquer modo, o Tribunal de Justiça já declarou, no seu acórdão Emesa, que «a medida contida no artigo 108.°-B, n.° 1, da decisão PTU alterada não constitui uma medida de salvaguarda destinada a responder, a título excepcional e temporário, ao surgimento de dificuldades excepcionais às quais o regime de trocas comerciais normalmente aplicável não permite obviar, mas altera o próprio regime comum segundo os mesmos critérios que aqueles por força dos quais a decisão foi adoptada», e que, nestas circunstâncias, as «condições de adopção das medidas de salvaguarda ao abrigo do artigo 109.° da decisão PTU [...] não são relevantes para apreciar a validade da decisão [impugnada]» (n.° 61 do acórdão). O Tribunal de Justiça concluiu que, «[p]or conseguinte, ao inserir o artigo 108.°-B da decisão PTU alterada, o Conselho não era obrigado a respeitar as exigências especiais ligadas à adopção das medidas de salvaguarda nos termos do artigo 109.° da decisão PTU» (n.° 62 do acórdão).

114.
    O terceiro argumento também não pode, portanto, ser acolhido.

115.
    Em quarto lugar, a recorrente sustenta que o artigo 108.°-B, n.° 2, da decisão PTU alterada é incompatível com o princípio da proporcionalidade na medida em que a trituração do açúcar («milling») se encontra excluída das operações de complemento de fabrico ou de transformação consideradas suficientes para aconcessão do cúmulo de origem ACP/PTU. Sublinha, para o efeito, que, nos termos do artigo 108.°-B, n.° 2, da decisão PTU alterada, a coloração do açúcar, que é um complemento de fabrico ou uma transformação de menor importância que o «milling», basta para conferir a origem PTU.

116.
    Todavia, este argumento assenta numa interpretação errónea da decisão impugnada. Com efeito, como o Tribunal de Justiça sublinha no seu acórdão Emesa (n.os 59 e 60), «o artigo 108.°-B, n.° 2, limita-se a mencionar dois exemplos de operações que podem ser consideradas suficientes para conferir o carácter de produtos originários dos PTU, sem, no entanto, conter uma enumeração exaustiva para esse efeito», pelo que a recorrente «não tem fundamento para invocar que [esse] artigo [...] suprimiu o «milling» das operações pertinentes para a atribuição da cumulação de origem».

117.
    Este argumento também não pode, portanto, ser acolhido.

118.
    Em quinto lugar, a recorrente sustenta que a situação do mercado do açúcar comunitário não obrigava a limitar as importações de açúcar que beneficia do cúmulo de origem ACP/PTU a 3 000 toneladas por ano.

119.
    A este propósito, o Tribunal de Justiça considerou no seu acórdão Emesa (n.os 53 a 58):

«53    Há que salientar que, num domínio onde, como no caso em apreço, as instituições comunitárias dispõem de um largo poder de apreciação, só o carácter manifestamente inadequado de uma medida relativamente ao objectivo prosseguido pode afectar a legalidade dessa medida. A limitação da fiscalização do Tribunal de Justiça impõe-se particularmente se o Conselho for levado a efectuar arbitragens entre interesses divergentes e a fazer opções no âmbito das decisões políticas que se prendem com as suas responsabilidades próprias (v. acórdãos [...] Alemanha/Conselho [já referido], n.os 90 e 91; de 17 de Outubro de 1995, Fishermen's Organisations e o., C-44/94, Colect., p. I-3115, n.° 37, e de 19 de Novembro de 1998, Reino Unido/Conselho, C-150/94, Colect., p. I-7235, n.° 87).

54    [...] não se pode considerar, nesse contexto, que a introdução do contingente fixado pelo artigo 108.°-B da decisão PTU alterada excedia manifestamente o que era necessário para atingir os objectivos prosseguidos pelo Conselho.

55    A este respeito, resulta do sétimo considerando da [d]ecisão [impugnada] que o Conselho introduziu o artigo 108.°-B, por um lado, porque tinha sido levado a verificar que o 'livre acesso de todos os produtos originários dos PTU e a manutenção da cumulação entre produtos originários dos Estados ACP e produtos originários dos PTU' envolviam um 'risco de conflito' entre os objectivos da política comunitária relativa ao desenvolvimento dosPTU e os da política agrícola comum e, por outro, para ter em conta o facto de que 'graves perturbações no mercado comunitário de certos produtos sujeitos a uma organização comum do mercado levaram, por várias vezes, à adopção de medidas de salvaguarda'.

56    Ora, há que salientar que resulta dos autos que, na data da [d]ecisão [impugnada], por um lado, existia um excedente da produção comunitária de açúcar de beterraba em relação à quantidade consumida na Comunidade, ao qual se juntavam as importações de açúcar de cana provenientes dos Estados ACP para fazer face ao pedido específico deste produto e a obrigação de a Comunidade importar uma certa quantidade de açúcar de países terceiros, devido aos acordos celebrados no seio da OMC. Por outro, a Comunidade era igualmente obrigada a subvencionar as exportações de açúcar, sob a forma de restituições à exportação e nos limites dos acordos celebrados na OMC. Nestas condições, o Conselho pôde considerar, justificadamente, que qualquer quantidade suplementar de açúcar, mesmo mínima relativamente à produção comunitária, que aceda ao mercado da Comunidade obrigaria as instituições desta última a aumentar o montante das subvenções à exportação, dentro dos limites supra invocados, ou a reduzir as quotas dos produtores europeus, o que perturbaria a organização comum do mercado do açúcar, cujo equilíbrio era precário, e seria contrário aos objectivos da política agrícola comum.

57    Por outro lado, resulta tanto do despacho de reenvio como dos números comunicados pelo Conselho e pela Comissão que o contingente anual de 3 000 toneladas não é inferior ao nível das importações tradicionais de açúcar provenientes dos PTU, não produzindo eles próprios esse produto. Além disso, recebendo a mercadoria proveniente dos Estados ACP apenas um baixo valor acrescentado no território dos PTU, a indústria afectada pela [d]ecisão [impugnada] só podia contribuir de modo reduzido para o desenvolvimento destes últimos. De resto, não podia ser excluído que a aplicação ilimitada da regra de cumulação de origem envolve um risco de desvio artificial dos produtos provenientes dos Estados ACP, pelo território dos PTU, com vista a entrarem no mercado comunitário quantidades de açúcar superiores àquelas em relação às quais esses Estados beneficiavam convencionalmente de um acesso garantido a esse mercado com isenção de direitos.

58    Por conseguinte, a medida relativa à importação de açúcar que beneficia da cumulação de origem ACP/PTU, inserida no artigo 108.°-B, n.° 1, da decisão PTU alterada, não pode ser considerada contrária ao princípio da proporcionalidade.»

120.
    Nas suas alegações de 9 de Outubro de 2000, a recorrente tece grandes críticas a essa passagem do acórdão.

121.
    Em primeiro lugar, no que respeita ao n.° 55 do acórdão Emesa, a recorrente sustenta que o Tribunal de Justiça tomou como ponto de partida da sua apreciação as afirmações contidas no sétimo considerando da decisão impugnada, sem se interrogar sobre a sua exactidão.

122.
    Este argumento não pode ser acolhido. Com efeito, o controlo da legalidade de um acto implica que se atenda à sua fundamentação. Assim, para apreciar se o Conselho não violou o princípio da proporcionalidade, o Tribunal de Justiça recordou, no n.° 55 do seu acórdão, os fundamentos que o Conselho apresentou na decisão impugnada em apoio da limitação das importações de açúcar que beneficia do cúmulo de origem ACP/PTU. Todavia, o Tribunal de Justiça não considerou as afirmações do Conselho factos estabelecidos. Com efeito, nos n.os 56 e 57 do seu acórdão, verificou se as afirmações contidas no sétimo considerando da decisão impugnada não assentavam em erros manifestos de apreciação, o que, no entender do Tribunal de Justiça, não acontecia.

123.
    Em seguida, a recorrente alega que o Tribunal de Justiça cometeu erros de facto no n.° 55 do seu acórdão Emesa, que punham em causa a conclusão de que a decisão impugnada não violava o princípio da proporcionalidade.

124.
    A este propósito, a recorrente explica que o açúcar que beneficia do cúmulo de origem ACP/PTU nunca foi, antes da adopção da decisão impugnada, objecto de medidas de protecção. Além disso, era falso alegar que «determinados produtos» foram abrangidos por medidas de protecção. Com efeito, só o arroz dos PTU foi objecto de tais medidas.

125.
    Todavia, forçoso é observar que nem o Conselho, no sétimo considerando da decisão impugnada, nem o Tribunal de Justiça, no seu acórdão Emesa, sustentaram que a Comunidade, no passado, adoptara medidas de protecção para limitar as importações de açúcar. O sétimo considerando da decisão impugnada deve ser interpretado no sentido de que, a exemplo «de graves perturbações no mercado comunitário [causadas por] certos produtos sujeitos a uma organização comum do mercado [que] levaram, por várias vezes, à adopção de medidas de salvaguarda», eram também de temer perturbações no que respeita ao açúcar. Essas perturbações justificavam, segundo o Conselho, a medida estrutural adoptada, e o Tribunal de Justiça, no seu acórdão Emesa, subscreveu esta apreciação.

126.
    Além disso, mesmo que no passado só o arroz originário dos PTU tenha sido abrangido por medidas de protecção, o Conselho não cometeu nenhum erro manifesto de apreciação ao invocar a adopção de medidas de protecção para «determinados produtos». Com efeito, a título exemplificativo, a medida de protecção que esteve na origem do acórdão Antillean Rice Mills e o./Comissão, referido no n.° 42 supra,referia-se a diferentes produtos, ou seja, os diferentes tipos de arroz abrangidos pelos códigos NC 1006 30 21 a NC 1006 30 48. Por outro lado, o artigo 108.°-B, n.° 1, da decisão PTU alterada, que aparentemente se aplica a umsó produto, ou seja, o açúcar, diz, na verdade, respeito a produtos diferentes, ou seja, «os produtos abrangidos pelas posições pautais SH 1701, 1702, 1073 e 1704».

127.
    Quanto ao n.° 56 do acórdão Emesa, o Tribunal de Justiça também cometeu, segundo a recorrente, erros de facto nessa passagem do acórdão.

128.
    Todavia, interrogada a este respeito na audiência, a recorrente explicou que contestava as apreciações que o Tribunal de Justiça fez a propósito dos factos e não a sua exactidão material.

129.
    A recorrente observa, a este propósito, que o Tribunal de Justiça baseou a sua apreciação, no que respeita à necessidade e à proporcionalidade da limitação das importações de açúcar que beneficia do cúmulo de origem ACP/PTU, em três elementos, ou seja, em primeiro lugar, num excedente da produção comunitária de açúcar de beterraba relativamente à quantidade consumida na Comunidade à data da decisão impugnada, em segundo, na existência de um grande volume de importações preferenciais de açúcar e, em terceiro, nas obrigações decorrentes dos acordos celebrados no seio da OMC (a seguir «acordos OMC»).

130.
    Ora, quanto ao excedente de produção, era estrutural e sempre existira, mesmo no momento da adopção da decisão PTU em 1991. Assim, era falso afirmar, como o Tribunal de Justiça faz no n.° 56 do acórdão Emesa, que existia um equilíbrio precário no mercado comunitário do açúcar. Além disso, as importações preferenciais aumentaram sempre, sem que a Comunidade tenha considerado a hipótese da necessidade, até 2000 ou 2001, de reduzir a sua própria produção. Esta atitude explicava-se pelo facto de a organização comum de mercado possuir um sistema de autofinanciamento cujos custos eram suportados pelos consumidores.

131.
    Segundo a recorrente, é erróneo pensar que as importações de açúcar originário dos PTU implicavam exportações com restituição da mesma quantidade de açúcar. Com efeito, não existia sistema de vasos comunicantes entre as duas, como, aliás, o reconheceram a Comissão e o Conselho (despacho de 30 de Abril de 1999, Emesa Sugar/Comissão, referido no n.° 25 supra).

132.
    Além disso, era incorrecto afirmar que as importações provenientes dos PTU, que, a termo, atingiriam no máximo 100 000 a 150 000 toneladas por ano, constituíam um problema no quadro das obrigações que, para a Comunidade, resultavam dos acordos OMC. Aliás, a Comissão reconheceu, durante o processo de medidas provisórias, que a Comunidade exportava, com restituição, uma quantidade de açúcar inferior à autorizada pelos acordos OMC. Esta margem suplementar era da ordem das 1 120 000 toneladas para o período correspondente às campanhas de 1995/1996 a 1997/1998 (despacho do presidente do Tribunal de Primeira Instância de 8 de Outubro de 1997, CEFS/Conselho, T-229/97 R, Colect., p. II-1649). De acordo com os cálculos da Comissão, a referida margem foi de 998 200 toneladas em 1 de Julho de 1997 (despacho de 30 de Abril de 1999, Emesa Sugar/Comissão, referido no n.° 25 supra, n.° 107). Para a campanha de 2000/2001, excederia aindaas 400 000 toneladas. Assim, o baixo nível das importações dos PTU não impediu a Comunidade de respeitar as suas obrigações que decorrem dos acordos OMC, pelo menos até à campanha de 2000/2001. A recorrente sustenta ainda que o açúcar de origem PTU se pode incluir na categoria do açúcar de origem ACP desde que acumule essas duas origens. Ora, tratava-se de açúcar preferencial não abrangido pelos compromissos que a Comunidade assumiu no quadro dos acordos OMC (v. nota de pé de página 1 da «Schedule CXL»).

133.
    A situação de excesso de produção estrutural da indústria do açúcar comunitário constituía o verdadeiro problema dessa indústria. No passado, nunca se considerou que este excesso de produção, que existia desde pelo menos 1973, poderia conduzir a uma limitação das importações preferenciais de açúcar para a Comunidade. Assim, fora desproporcionado reduzir, através da decisão impugnada, as importações de açúcar provenientes do PTU para 3 000 toneladas em 1997, quando essas importações apenas atingiram 10 000 toneladas e que a Comunidade dispunha, nesse momento, de uma margem de exportação suplementar de cerca de 1 milhão de toneladas no quadro dos acordos OMC. A recorrente assinala que, quando, em 1999, a importação de açúcar proveniente dos PTU, em razão do cúmulo de origem ACP/PTU, excedia 50 000 toneladas, a Comunidade nem sequer considerou ser necessário impor restrições quantitativas, antes impondo preços mínimos.

134.
    O Tribunal recorda, antes de mais, que o Tribunal de Justiça considerou, no n.° 40 do acórdão Emesa, com base numa apreciação da situação no sector do açúcar que efectuou, designadamente, no n.° 56 do acórdão, que fora justificadamente que o Conselho considerara que era necessário restringir o alcance da regra de cúmulo de origem ACP/PTU no que respeita ao açúcar, visto que a aplicação dessa vantagem nesse sector «era susceptível de ocasionar importantes perturbações no funcionamento de uma organização comum de mercado».

135.
    Como não cabe ao Tribunal de Primeira Instância pôr em causa as apreciações que o Tribunal de Justiça fez sobre os factos, cuja exactidão material não é contestada (v. n.° 128 supra), os argumentos da recorrente relativos ao n.° 56 do acórdão Emesa - e relativos, designadamente, à questão de saber se o Conselho não cometeu um erro manifesto de apreciação quando considerou, em 1997, que a aplicação sem limites da regra de cúmulo de origem ACP/PTU «era susceptível de ocasionar importantes perturbações no funcionamento de uma organização comum de mercado» - apenas serão examinados por mera cautela.

136.
    A este propósito, importa sublinhar, antes de mais, que as partes não contestam que, no momento da adopção da decisão impugnada, o preço comunitário do açúcar era duas vezes superior ao preço do mercado mundial. Ora, a recorrente afirmou, na sequência de uma questão escrita do Tribunal de Primeira Instância, que em Aruba não é devido qualquer direito na importação sobre o açúcar adquirido num país ACP. Como o açúcar de origem ACP transformado nos PTUbeneficia, por aplicação da regra de cúmulo de origem ACP/PTU, de uma origem PTU e se encontra, a esse título, isento de direitos aduaneiros na Comunidade, a diferença significativa entre o preço mundial e o preço comunitário do açúcar criava, no momento da adopção da decisão impugnada, um risco real de aumento das exportações para a Comunidade de açúcar que beneficia do cúmulo de origem ACP/PTU.

137.
    Assim, enquanto, em 1996, as exportações, para a Comunidade, de açúcar que beneficia do cúmulo de origem ACP/PTU eram inferiores a 3 000 toneladas, a própria recorrente previa que, se a decisão impugnada não tivesse sido adoptada, atingiriam 100 000 a 150 000 toneladas nos próximos anos. Além disso, esta estimativa nem sequer tinha em consideração as exportações potenciais, antes se baseando na produção das duas empresas existentes e de duas outras empresas cujo início da actividade devia ocorrer no momento da adopção da decisão impugnada (v. relatório NEI, página 85, n.° 6.5). Todavia, perante a diferença notável entre o preço mundial e o preço comunitário do açúcar, é mais do que provável que outras sociedades entrassem no mesmo mercado se o Conselho não tivesse restringido a aplicação da regra de cúmulo de origem ACP/PTU relativamente ao açúcar.

138.
    Existia, além disso, quando a decisão impugnada foi adoptada, como sublinhado pelo Tribunal de Justiça no n.° 57 do seu acórdão Emesa, um risco incontestável «de desvio artificial dos produtos provenientes dos Estados ACP, pelo território dos PTU, com vista a entrarem no mercado comunitário quantidades de açúcar superiores àquelas em relação às quais esses Estados beneficiavam convencionalmente de um acesso garantido a esse mercado com isenção de direitos». Deve recordar-se, a este propósito, que, nos termos da regra de cúmulo de origem ACP/PTU, operações de transformação muito simples (mesmo as que normalmente nunca são de natureza a atribuir a origem PTU) bastam para que produtos ACP sejam considerados produtos PTU e possam entrar no mercado comunitário com isenção de direitos de importação.

139.
    Com base no que precede, há que concluir que, no momento da adopção da decisão impugnada, existia um risco real de um aumento considerável das exportações para a Comunidade de açúcar que beneficia do cúmulo de origem ACP/PTU.

140.
    Quanto à questão de saber se o aumento iminente das exportações podia perturbar a organização comum de mercado do açúcar, deve-se recordar que a recorrente não contesta as afirmações factuais contidas no n.° 56 do acórdão Emesa, ou seja, que existia um «excedente da produção comunitária de açúcar de beterraba em relação à quantidade consumida na Comunidade», que, além disso, a Comunidade era obrigada a «importar uma certa quantidade de açúcar de países terceiros, devido aos acordos [OMC]», e que, a tudo isto, acresciam as «importações de açúcar de cana provenientes dos Estados ACP para fazer face ao pedido específico deste produto». Perante o nível elevado do preço comunitário relativamente aopreço mundial, «a Comunidade era igualmente obrigada a subvencionar as exportações de açúcar, sob a forma de restituições à exportação e nos limites dos acordos [...] [OMC]».

141.
    Quanto ao argumento da recorrente, segundo o qual o excesso de produção de açúcar na Comunidade era estrutural e já existia em 1991, no momento em que a regra de cúmulo de origem ACP/PTU foi adoptada, deve sublinhar-se que o açúcar não é o único produto a que esta regra se aplica. Pelo contrário, trata-se de uma vantagem geral aplicável a qualquer produto transformado nos PTU. Quando a aplicação desta vantagem causa ou pode causar perturbações num sector específico, a Comunidade pode adoptar medidas pontuais ou estruturais para fazer face ao problema.

142.
    Segundo o Tribunal de Justiça, «o Conselho pôde considerar, justificadamente, que qualquer quantidade suplementar de açúcar, mesmo mínima relativamente à produção comunitária, que aceda ao mercado da Comunidade obrigaria as instituições desta última a aumentar o montante das subvenções à exportação, dentro dos limites [dos acordos OMC], ou a reduzir as quotas dos produtores europeus, o que perturbaria a organização comum do mercado do açúcar, cujo equilíbrio era precário, e seria contrário aos objectivos da política agrícola comum» (acórdão Emesa, n.° 56).

143.
    A recorrente põe em causa esta apreciação dos factos. Segundo a recorrente, não existia um risco verdadeiro de perturbação do mercado do açúcar comunitário.

144.
    Todavia, se, no mercado comunitário do açúcar, cujo sistema de preços é protegido, a oferta já excede a procura, é razoável considerar que qualquer aumento de oferta através das importações é susceptível de causar perturbações. Com efeito, para manter o equilíbrio precário no mercado - que é sobretudo um desequilíbrio controlado, na medida em que o equilíbrio só é alcançado através de exportações subvencionadas -, haveria que ou baixar consideravelmente o preço de intervenção para travar as importações e aumentar a procura, ou reduzir a produção comunitária e/ou aumentar as exportações que, perante a diferença entre o preço comunitário e o preço mundial, devem ser subvencionadas.

145.
    Perante o risco iminente de um aumento considerável das importações de açúcar para a Comunidade, criado pela regra de cúmulo de origem ACP/PTU (v. n.° 139 supra), o Conselho, depois de ter confrontado os interesses dos PTU com os da política agrícola comum, pôde razoavelmente decidir restringir a aplicação dessa regra para travar as importações, provenientes dos PTU, desse produto que, só graças a uma ficção jurídica, possuía uma origem PTU.

146.
    Quanto ao argumento da recorrente de que a Comunidade exporta uma quantidade de açúcar com restituição à exportação inferior à autorizada pelos acordos OMC, importa sublinhar que nem o Conselho nem o Tribunal de Justiçasustentaram que a restrição das importações isentas através do artigo 108.°-B, n.° 1, da decisão PTU modificada poderia encontrar a sua justificação no facto de a Comunidade já não poder, ao abrigo dos acordos OMC, aumentar o nível das suas exportações de açúcar subvencionadas.

147.
    Deve observar-se que os acordos OMC, designadamente a «Schedule CXL», estabelecem um limite às exportações de açúcar subvencionadas. Todavia, não estabelecem qualquer obrigação de esgotamento dessa quantidade autorizada. Com efeito, o objectivo dos acordos OMC é o de reduzir gradualmente as exportações subvencionadas.

148.
    Assim, não pode considerar-se que o Conselho violou o princípio da proporcionalidade ao decidir restringir as importações de açúcar que beneficia do cúmulo de origem ACP/PTU, ainda que as exportações suplementares que essas importações podiam gerar ficassem abaixo do limiar fixado pelos acordos OMC.

149.
    A recorrente ainda explica que o aumento das importações de açúcar que beneficia do cúmulo de origem ACP/PTU não deve influenciar a produção comunitária. Assinala que a produção comunitária dos últimos anos ficou sempre abaixo das quotas de produção fixadas pela Comunidade.

150.
    Todavia, importa recordar que, ao longo do processo, a recorrente sublinhou o excesso de produção estrutural existente no mercado comunitário. Na audiência, a recorrente referiu-se ainda ao Relatório Especial n.° 20/2000 do Tribunal de Contas, relativo à gestão da organização comum do mercado do açúcar, (JO 2001, C 50, p. 1), de onde resulta que, em 1997, esse excesso de produção era da ordem de cerca de 2 milhões de toneladas. Assim, independentemente da questão de saber se as quotas de produção estavam esgotadas, é razoável considerar que o mercado do açúcar comunitário, cuja oferta excede em muito a procura, seria perturbado se as importações de açúcar tivessem aumentado consideravelmente em razão da aplicação da regra de cúmulo de origem ACP/PTU.

151.
    Nestas circunstâncias, há que concluir que o Conselho pôde razoavelmente considerar que era necessário limitar as importações de açúcar que beneficia do cúmulo de origem ACP/PTU com o objectivo de proteger a estabilidade da organização do mercado do açúcar.

152.
    Importa ainda examinar se, ao restringir a aplicação da regra de cúmulo de origem ACP/PTU às 3 000 toneladas, o Conselho não violou o princípio da proporcionalidade.

153.
    Todavia, forçoso é observar que o Tribunal de Justiça já decidiu, no seu acórdão Emesa, que o limite imposto no artigo 108.°-B, n.° 1, da decisão PTU alterada, ou seja, a limitação das importações que beneficiam do cúmulo de origem ACP/PTU às 3 000 toneladas por ano, não pode considerar-se contrário ao princípio da proporcionalidade. Refere-se, a este propósito, no n.° 57 do seu acórdão,designadamente, ao facto de que «o contingente anual de 3 000 toneladas não é inferior ao nível das importações tradicionais de açúcar provenientes dos PTU, não produzindo eles próprios esse produto», de que a indústria afectada pela decisão impugnada «só podia contribuir de modo reduzido para o desenvolvimento [dos PTU]» e de que «a aplicação ilimitada da regra de cumulação de origem envolve um risco de desvio artificial dos produtos provenientes dos Estados ACP, pelo território dos PTU, com vista a entrarem no mercado comunitário quantidades de açúcar superiores àquelas em relação às quais esses Estados beneficiavam convencionalmente de um acesso garantido a esse mercado com isenção de direitos».

154.
    Nas suas alegações de 9 de Outubro de 2000, a recorrente critica igualmente essa passagem do acórdão Emesa. Na medida em que os argumentos apresentados pela recorrente apenas se referem às apreciações que o Tribunal de Justiça fez dos factos não contestados, apenas serão examinados por mera cautela (v. n.° 135 supra).

155.
    A recorrente insiste no facto de que não existem importações tradicionais de açúcar proveniente dos PTU. O surgimento da indústria do açúcar nos PTU devia-se à regra de cúmulo de origem ACP/PTU. Em 1996, as exportações foram inferiores a 3 000 toneladas, pois as empresas em causa ainda não estavam totalmente operacionais. A justificação do contingente de 3 000 toneladas através da referência, como o Tribunal de Justiça fez no n.° 57 do seu acórdão Emesa, a importações tradicionais era, nestas condições, incompreensível. A recorrente assinala que a quantidade de 3 000 toneladas é inferior à sua produção mensal. Recorda que o presidente do Tribunal de Primeira Instância declarou, no seu despacho de 30 de Abril de 1999, Emesa Sugar/Comissão, referido no n.° 25 supra, que era necessário importar 15 000 toneladas de açúcar de origem PTU para garantir a sua sobrevivência. Mesmo que a restrição das importações de açúcar que beneficia do cúmulo de origem ACP/PTU fosse necessária, a recorrente sustenta que o Conselho devia ter tomado em atenção, na decisão impugnada, os interesses das empresas do sector do açúcar existentes nos PTU e deveria ter fixado um contingente a um nível que permitisse a essas empresas manterem-se no mercado. Refere-se, para este efeito, à perspectiva adoptada pelo Conselho relativamente a outros produtos, designadamente a isoglucose e a inulina.

156.
    O Tribunal observa, antes de mais, que a própria recorrente reconhece não existir produção de açúcar nos PTU. De qualquer modo, caso existisse, não seria de modo algum afectada pela decisão impugnada, pois beneficiava, enquanto produção inteiramente obtida nos PTU, na acepção do artigo 2.° do anexo II, de uma origem PTU.

157.
    Quanto ao açúcar «transformado» nos PTU, importa recordar que o açúcar que sofre uma transformação suficiente em conformidade com as regras de origem usuais (v. n.° 77 supra) constitui um produto de origem PTU que pode entrar naComunidade com isenção dos direitos aduaneiros, sem qualquer limitação quantitativa.

158.
    Ao aditar o artigo 108.°-B, n.° 1, à decisão PTU, o Conselho apenas fixou um limite para as importações de açúcar que beneficia do cúmulo de origem ACP/PTU, ou seja, de açúcar originário dos Estados ACP que sofreu uma transformação nos PTU que, normalmente, seria insuficiente para lhe conferir uma origem PTU, mas que, todavia, se considera possuir essa origem em virtude de uma ficção jurídica.

159.
    O Conselho fixou o limite contido no artigo 108.°-B, n.° 1, da decisão PTU alterada num nível aproximadamente igual ao das exportações existentes de açúcar que beneficiava do cúmulo de origem ACP/PTU no momento da adopção da decisão impugnada.

160.
    Com efeito, a recorrente confirma que, no ano que antecedeu a adopção da decisão impugnada, a quantidade de açúcar que acumulava a origem ACP/PTU que foi exportada para a Comunidade foi de 2 310 toneladas. Durante os seis primeiros meses de 1997, foi, segundo a recorrente, de 1 404,3 toneladas. Segue-se que o Conselho não procedeu de forma desrazoável quando limitou, em Novembro de 1997, a aplicação da regra de cúmulo de origem ACP/PTU, no que respeita ao açúcar, a 3 000 toneladas por ano.

161.
    Quanto ao argumento segundo o qual as instituições comunitárias deveriam ter tomado em consideração o facto de que a indústria do açúcar dos PTU estava numa fase de arranque, importa sublinhar que a regra de cúmulo de origem ACP/PTU existe desde a adopção da decisão PTU em 1991. A constituição da recorrente só ocorreu em 6 de Fevereiro de 1997, num momento em que a Comissão já tinha feito uma proposta ao Conselho no sentido da abolição total da regra de cúmulo de origem ACP/PTU no que respeita ao açúcar (v. n.° 94 supra).

162.
    Em seguida, se a sobrevivência da recorrente dependesse verdadeiramente da manutenção da regra de cúmulo de origem ACP/PTU, como afirma, devia considerar-se que o investimento efectuado fora absolutamente temerário. Com efeito, a regra de cúmulo de origem ACP/PTU é excepcional e a sua abolição, no que respeita ao açúcar, já tinha sido anunciada antes da constituição da recorrente.

163.
    Na audiência, a recorrente insistiu ainda no facto de que, relativamente a todo o ano de 1997, as importações de açúcar não excederam as 10 000 toneladas. Como esta quantidade não era susceptível de perturbar o mercado do açúcar comunitário, a fixação do limite previsto no artigo 108.°-B, n.° 1, da decisão PTU alterada era absolutamente exagerada.

164.
    Todavia, importa recordar que a própria recorrente sustenta, com base numa estimativa que não atende às exportações potenciais, que, se a decisão impugnada não tivesse sido adoptada, as exportações de açúcar que beneficia do cúmulo de origem ACP/PTU teriam sido de 100 000 a 150 000 toneladas por ano (v. n.° 137supra). Ora, como já se indicou, o Conselho pôde razoavelmente considerar que essa quantidade era susceptível de perturbar o mercado do açúcar comunitário (v. n.os 144 e 145 supra).

165.
    A recorrente critica ainda a afirmação do Tribunal de Justiça, no n.° 57 do seu acórdão Emesa, segundo a qual «recebendo a mercadoria proveniente dos Estados ACP apenas um baixo valor acrescentado no território dos PTU, a indústria afectada pela [d]ecisão [impugnada] só podia contribuir de modo reduzido para o desenvolvimento destes últimos».

166.
    Todavia, não se pode seriamente negar que as operações que, segundo as regras de origem usuais, conferem uma origem PTU a um produto atribuem mais valor intrínseco a este do que as operações que beneficiam do cúmulo de origem ACP/PTU, que são operações simples. Além disso, estas últimas operações, habitualmente, não estão na origem de muitos postos de trabalho. Assim, há que considerar que a importância da indústria afectada pela decisão impugnada só muito limitadamente poderia contribuir para o desenvolvimento dos PTU.

167.
    Em seguida, a recorrente observa que, contrariamente ao que o Tribunal de Justiça alega no n.° 57 do seu acórdão Emesa, não existem indícios de um desvio artificial dos produtos provenientes dos Estados ACP aquando da adopção da decisão impugnada.

168.
    Todavia, como já se observou no n.° 138 supra, o risco desse desvio era real devido à diferença entre o preço comunitário do açúcar e o preço do açúcar no mercado mundial.

169.
    A recorrente indigna-se, por último, com o facto de as importações de açúcar originário dos PTU serem objecto de um tratamento menos favorável do que as importações originárias dos Estados ACP ou dos países terceiros. Sublinha que as importações preferenciais de açúcar originário dos Estados ACP e dos países terceiros representam 1,7 milhões de toneladas. Essas importações eram subvencionadas pelo FEOGA até 0,8 mil milhões de euros, anualmente. Este montante excedia em muito o custo da subvenção potencial das exportações de açúcar originário dos PTU. A recorrente insiste ainda no facto de os PTU estarem no topo da hierarquia dos países com os quais a União Europeia mantém relações privilegiadas. Assim, os produtos originários dos PTU deviam beneficiar de uma posição privilegiada.

170.
    Esta argumentação baseia-se numa falsa premissa. Com efeito, os produtos de origem PTU beneficiam e continuam a beneficiar de uma isenção total dos direitos aduaneiros. O Conselho limitou a 3 000 toneladas a aplicação da regra de cúmulo de origem ACP/PTU no que respeita ao açúcar que, através de uma pura ficção jurídica, confere uma origem PTU a produtos que, na verdade, são produtos ACP.

171.
    De tudo o que precede resulta que o fundamento decorrente da violação do princípio da proporcionalidade também não pode ser acolhido.

172.
    Como o exame dos fundamentos de anulação não revelou a existência de uma violação de uma regra jurídica que confere direitos aos particulares e sem que seja necessário examinar as duas outras condições fixadas para que exista responsabilidade extracontratual da Comunidade, há que declarar que o pedido de indemnização não pode ser acolhido.

173.
    Assim, o recurso deve ser julgado improcedente na sua integralidade.

Quanto às despesas

174.
    Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a recorrente sido vencida, há que condená-la nas despesas, incluindo nas que respeitam aos processos de medidas provisórias, em conformidade com os pedidos do Conselho.

175.
    Nos termos do n.° 4 do artigo 87.° do mesmo regulamento, a Comissão, o Reino de Espanha e a República Francesa, que intervieram em apoio dos pedidos do Conselho, suportarão as suas despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Terceira Secção)

decide:

1.
     O recurso é julgado improcedente.

2.
    A recorrente suportará, para além das suas próprias despesas, as despesas suportadas pelo Conselho, incluindo as relativas aos processos de medidas provisórias.

3.
    Os intervenientes suportarão as suas próprias despesas.

Azizi
Lenaerts
Jaeger

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 6 de Dezembro de 2001.

O secretário

O presidente

H. Jung

M. Jaeger


1: Língua do processo: neerlandês.