Language of document : ECLI:EU:T:2008:415

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quinta Secção)

8 de Outubro de 2008 (*)

«Concorrência – Acordos, decisões e práticas concertadas – Mercado dos produtos à base de carbono e de grafite para aplicações eléctricas e mecânicas – Excepção de ilegalidade – Artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento n.° 17 – Imputabilidade do comportamento infractor – Orientações para o cálculo do montante das coimas – Gravidade e efeitos da infracção – Efeito dissuasivo – Cooperação durante o procedimento administrativo – Princípio da proporcionalidade – Princípio da igualdade de tratamento – Pedido reconvencional de aumento da coima»

No processo T‑69/04,

Schunk GmbH, com sede em Thale (Alemanha),

Schunk Kohlenstoff‑Technik GmbH, com sede em Heuchelheim (Alemanha),

representadas inicialmente por R. Bechtold e S. Hirsbrunner e, em seguida, por R. Bechtold, S. Hirsbrunner e A. Schädle, advogados,

recorrentes,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada inicialmente por F. Castillo de la Torre e H. Gading e, em seguida, por F. Castillo da Torre e M. Kellerbauer, na qualidade de agentes,

recorrida,

que tem por objecto, por um lado, um pedido de anulação da Decisão 2004/420/CEE da Comissão, de 3 de Dezembro de 2003, relativa a um processo de aplicação do artigo 81.° [CE] e do artigo 53.° do Acordo EEE (Processo n.° C.38.359 – Produtos de carbono e de grafite para aplicações eléctricas e mecânicas), bem como, a título subsidiário, de redução do montante da coima aplicada às recorrentes nesta decisão, e, por outro, um pedido reconvencional da Comissão para efeitos do aumento do montante da referida coima,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Quinta Secção),

composto por: M. Vilaras (relator), presidente, M. Prek e V. Ciucă, juízes,

secretário: K. Andová, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 27 de Fevereiro de 2008,

profere o presente

Acórdão

 Factos na origem do litígio

1        A Schunk Kohlenstoff‑Technik GmbH (a seguir «SKT») é uma empresa alemã que fabrica produtos de carbono e de grafite para aplicações eléctricas e mecânicas. A SKT é uma filial da Schunk GmbH (a seguir, conjuntamente, «Schunk» ou as «recorrentes»).

2        Em 18 de Setembro de 2001, os representantes da Morgan Crucible Company plc (a seguir «Morgan») encontraram‑se com agentes da Comissão, a fim de proporem a sua cooperação para a demonstração da existência de um cartel no mercado europeu dos produtos de carbono para aplicações eléctricas e mecânicas e solicitar o benefício das medidas de clemência previstas na Comunicação 96/C 207/04 da Comissão, sobre a não aplicação ou a redução de coimas nos processos relativos a acordos, decisões e práticas concertadas (JO 1996, C 207, p. 4, a seguir «comunicação sobre a cooperação»).

3        Em 2 de Agosto de 2002, a Comissão, em aplicação do artigo 11.° do Regulamento n.° 17 do Conselho, de 6 de Fevereiro de 1962, Primeiro Regulamento de execução dos artigos [81.° CE] e [82.° CE] (JO 1962, 13, p. 204; EE 08 F1 p. 22), dirigiu à C. Conradty Nürnberg GmbH (a seguir «Conradty»), à Le Carbone‑Lorraine (a seguir «LCL»), à SGL Carbon AG (a seguir «SGL»), à SKT, à Eurocarbo SpA, à Luckerath BV e à Gerken Europe SA pedidos de informações sobre o seu comportamento no mercado em causa. O ofício enviado à SKT respeitava também às actividades da empresa Hoffmann & Co. Elektrokohle AG (a seguir «Hoffmann»), adquirida pela Schunk em 28 de Outubro de 1999.

4        Por carta de 2 de Setembro de 2002, a SKT informou a Comissão da sua intenção de com ela colaborar no quadro do procedimento administrativo e verificar se, para além das respostas ao pedido de informações, estava na posição de lhe comunicar outras informações úteis, tendo em conta os elementos de prova já na posse da instituição.

5        Após ter obtido, em 5 de Outubro de 2002, uma versão alemã do pedido de informações, a SKT, por carta de 25 de Outubro de 2002, respondeu ao referido pedido.

6        Em 23 de Maio de 2003, com base nas informações que lhe tinham sido comunicadas, a Comissão enviou uma comunicação de acusações às recorrentes e às outras empresas implicadas, concretamente, a Morgan, a Conradty, a LCL, a SGL e a Hoffmann.

7        Na sequência da audição das empresas implicadas, com excepção da Morgan e da Conradty, a Comissão adoptou a Decisão 2004/420/CE, de 3 de Dezembro de 2003, relativa a um processo de aplicação do artigo 81.° [CE] e do artigo 53.° do Acordo EEE (Processo C.38.359 – Produtos de carbono e de grafite para aplicações eléctricas e mecânicas) (a seguir «decisão»). Foi publicado um resumo da decisão no Jornal Oficial de 28 de Abril de 2004 (JO L 125, p. 45).

8        Na decisão, a Comissão indicou que as empresas desta destinatárias participaram numa infracção única e continuada ao artigo 81.°, n.° 1, CE e, a partir de 1 de Janeiro de 1994, ao artigo 53.°, n.° 1, do Acordo sobre o Espaço Económico Europeu (EEE), consistente na fixação directa ou indirecta dos preços de venda e de outras condições de transacção aplicáveis aos clientes, na repartição dos mercados, nomeadamente através da atribuição de clientes, e na prática de acções coordenadas (restrições quantitativas, aumentos de preços e boicotes) contra concorrentes que não eram membros do cartel (considerando 2 da decisão).

9        A decisão contém as seguintes disposições:

«Artigo 1.°

As seguintes empresas infringiram as disposições do artigo 81.°, n.° 1, [CE] e, a partir de 1 de Janeiro de 1994, do artigo 53.°, n.° 1, do Acordo EEE tendo participado, nos períodos indicados, num conjunto de acordos e práticas concertadas no sector dos produtos de carbono e de grafite para aplicações eléctricas e mecânicas:

–        [Conradty], de Outubro de 1988 a Dezembro de 1999;

–        [Hoffmann], de Setembro de 1994 a Outubro de 1999;

–        [LCL], de Outubro de 1988 a Junho de 1999;

–        [Morgan], de Outubro de 1988 a Dezembro de 1999;

–        [Schunk], de Outubro de 1988 a Dezembro de 1999;

–        [SGL], de Outubro de 1988 a Dezembro de 1999.

Artigo 2.°

São aplicadas as seguintes coimas relativamente às infracções referidas no artigo 1.°:

–        [Conradty]: 1 060 000 euros;

–        [Hoffmann]: 2 820 000 euros;

–        [LCL]: 43 050 000 euros;

–        [Morgan]: 0 euro;

–        [Schunk]: 30 870 000 euros;

–        [SGL]: 23 640 000 euros.

As coimas devem ser pagas no prazo de três meses a contar da notificação da presente decisão: […]

Findo este prazo, serão automaticamente devidos juros à taxa aplicada pelo Banco Central Europeu às suas principais operações de refinanciamento a partir do primeiro dia do mês no decurso do qual a presente decisão foi adoptada, acrescidos de 3,5 pontos percentuais.»

10      No respeitante ao cálculo do montante das coimas, a Comissão qualificou a infracção de muito grave, tendo em conta a sua natureza, o seu impacto no mercado do EEE dos produtos em questão, mesmo que este não possa ser avaliado com precisão, e o âmbito geográfico do mercado em causa (considerando 288 da decisão).

11      A fim de ter em conta a importância específica do comportamento ilícito de cada empresa implicada no cartel e, portanto, do seu impacto real na concorrência, a Comissão agrupou as empresas em questão em três categorias, em função da sua importância relativa no mercado em causa, determinada em termos das suas quotas de mercado (considerandos 289 a 297 da decisão).

12      Por conseguinte, a LCL e a Morgan, consideradas as duas maiores operadoras, com quotas de mercado superiores a 20%, foram classificadas na primeira categoria. A Schunk e a SGL, que são operadoras médias, com quotas de mercado compreendidas entre 10% e 20%, foram classificadas na segunda categoria. A Hoffmann e a Conradty, consideradas pequenas operadoras em razão de quotas de mercado inferiores a 10%, foram agrupadas na terceira categoria (considerandos 37 e 297 da decisão).

13      Com base nas precedentes considerações, a Comissão estabeleceu um montante de partida, determinado em função da gravidade da infracção, de 35 milhões de euros, para a LCL e a Morgan, de 21 milhões de euros, para a SGL e as recorrentes, e de 6 milhões de euros, para a Hoffmann e a Conradty (considerando 298 da decisão).

14      No tocante à duração da infracção, a Comissão considerou que todas as empresas implicadas tinham cometido uma infracção de longa duração. Com fundamento no facto de a infracção ter durado onze anos e dois meses, a Comissão aumentou 110% o montante de partida determinado para a Schunk, a Morgan, a SGL e a Conradty. Quanto à LCL, a Comissão concluiu que a infracção tinha durado dez anos e oito meses e aumentou 105% o montante de partida. Com respeito à Hoffmann, o montante de partida foi aumentado 50%, atendendo a uma duração da infracção de cinco anos e um mês (considerandos 299 e 300 da decisão).

15      O montante de base da coima, determinado em função da gravidade e da duração da infracção, foi, pois, fixado em 73,5 milhões de euros, para a Morgan, em 71,75 milhões de euros, para a LCL, em 44,1 milhões de euros, para as recorrentes e a SGL, em 12,6 milhões de euros, para a Conradty, e em 9 milhões de euros, para a Hoffmann (considerando 301 da decisão).

16      A Comissão considerou que não havia circunstâncias agravantes ou atenuantes contra ou a favor das empresas implicadas (considerando 316 da decisão) e não acolheu o pedido das recorrentes no sentido de que a coima aplicada fosse limitada, em conformidade com o artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento n.° 17, a 10% do volume de negócios mundial da SKT (considerando 318 da decisão).

17      No que respeita à aplicação da comunicação sobre a cooperação, a Morgan beneficiou de imunidade em matéria de coimas, devido ao facto de ter sido a primeira empresa a assinalar a existência do cartel à Comissão (considerandos 319 a 321 da decisão).

18      Em conformidade com a secção D da referida comunicação, a Comissão concedeu à LCL uma redução de 40% do montante da coima que lhe teria sido aplicada na falta de cooperação, de 30% à Schunk e à Hoffmann e de 20% à SGL, que foi a última a cooperar (considerandos 322 a 338 da decisão).

 Tramitação processual e pedidos das partes

19      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 20 de Fevereiro de 2004, as recorrentes interpuseram o presente recurso.

20      Dado que foi alterada a composição das secções do Tribunal, o juiz‑relator foi afecto, na qualidade de presidente, à Quinta Secção, à qual, por conseguinte, o presente processo foi distribuído.

21      Com base no relatório do juiz‑relator, o Tribunal (Quinta Secção) decidiu dar início à fase oral. Foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às questões colocadas pelo Tribunal na audiência de 27 de Fevereiro de 2008.

22      As recorrentes concluíram pedindo que o Tribunal se digne:

–        anular a decisão;

–        a título subsidiário, reduzir o montante da coima aplicada;

–        condenar a Comissão nas despesas.

23      A Comissão concluiu pedindo que o Tribunal se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        aumentar o montante da coima aplicada às recorrentes;

–        condenar as recorrentes nas despesas.

 Questão de direito

 Quanto ao pedido de anulação da decisão

24      Embora o recurso interposto pelas recorrentes tenha um duplo objecto, a saber, a título principal, um pedido de anulação da decisão, e, a título subsidiário, um pedido de redução do montante da coima, as diversas alegações feitas pelas recorrentes nos seus articulados foram, porém, formuladas de forma indistinta. Convidadas pelo Tribunal, na audiência, a apresentar as suas observações sobre o alcance exacto da sua argumentação, as recorrentes declararam, essencialmente, que confiavam na apreciação do Tribunal.

25      Importa, a este respeito, referir que a excepção de ilegalidade do artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento n.° 17 e a contestação da responsabilidade conjunta e solidária da Schunk GmbH e da SKT se inserem claramente no pedido de anulação da decisão.

26      As recorrentes também alegam que a Comissão violou os princípios da proporcionalidade e da igualdade de tratamento, no momento da fixação do montante da coima, o que, a priori, se insere no pedido de redução da coima. A argumentação desenvolvida em apoio da referida alegação contém, todavia, contestações no que respeita à infracção considerada pela Comissão e suscita, pois, a questão da responsabilidade das empresas em causa, como definida no artigo 1.° da decisão. Estas contestações devem, portanto, ser examinadas no quadro do pedido de anulação da decisão na sua integralidade, incluindo o seu artigo 1.°

 Quanto à excepção de ilegalidade do artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento n.° 17

27      As recorrentes sustentam que o artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento n.° 17 confere à Comissão uma margem de apreciação quase ilimitada no respeitante à fixação da coima, o que é contrário ao princípio da legalidade definido no artigo 7.°, n.° 1, da Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais (CEDH), assinada em Roma, em 4 de Novembro de 1950, como interpretado pelos órgãos jurisdicionais europeus.

28      Resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que o princípio da legalidade das penas é um corolário do princípio da segurança jurídica, que constitui um princípio geral do direito comunitário e que exige, designadamente, que uma regulamentação comunitária, mais especificamente, quando imponha ou permita que sejam impostas sanções, seja clara e precisa, a fim de que as pessoas às quais diz respeito possam conhecer sem ambiguidade os direitos e obrigações que desta decorrem e agir em conformidade (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal de Justiça de 9 de Julho de 1981, Gondrand Frères e Garancini, 169/80, Recueil, p. 1931, n.° 17; de 18 de Novembro de 1987, Maizena, 137/85, Colect., p. 4587, n.° 15; de 13 de Fevereiro de 1996, van Es Douane Agenten, C‑143/93, Colect., p. I‑431, n.° 27; e de 12 de Dezembro de 1996, X, C‑74/95 e C‑129/95, Colect., p. I‑6609, n.° 25).

29      Este princípio, que faz parte das tradições constitucionais comuns aos Estados‑Membros e que foi consagrado por vários tratados internacionais, nomeadamente pelo artigo 7.° da CEDH, impõe‑se tanto às normas de carácter penal como aos instrumentos administrativos específicos que impõem ou permitem que sejam impostas sanções administrativas (v., neste sentido, acórdão Maizena, referido no n.° 28, supra, n.os 14 e 15 e jurisprudência aí referida). Aplica‑se não apenas às normas que estabelecem os elementos constitutivos de uma infracção mas igualmente às que definem as consequências decorrentes de uma infracção às primeiras (v., neste sentido, acórdão X, referido no n.° 28, supra, n.os 22 e 25).

30      Constitui ainda jurisprudência assente que os direitos fundamentais são parte integrante dos princípios gerais de direito cujo respeito é assegurado pelo Tribunal de Justiça (parecer 2/94 do Tribunal de Justiça, de 28 de Março de 1996, Colect., p. I‑1759, n.° 33, e acórdão do Tribunal de Justiça de 29 de Maio de 1997, Kremzow, C‑299/95, Colect., p. I‑2629, n.° 14). Para este efeito, o Tribunal de Justiça inspira‑se nas tradições constitucionais comuns aos Estados‑Membros, bem como nas indicações fornecidas pelos instrumentos internacionais relativos à protecção dos direitos do homem, em que os Estados‑Membros colaboraram ou a que aderiram. Neste quadro, a CEDH reveste um significado particular (acórdãos do Tribunal de Justiça de 15 de Maio de 1986, Johnston, 222/84, Colect., p. 1651, n.° 18, e Kremzow, já referido, n.° 14). Além disso, nos termos do artigo 6, n.° 2, UE, «[a] União respeitará os direitos fundamentais tal como os garante a [CEDH] e tal como resultam das tradições constitucionais comuns aos Estados‑Membros, enquanto princípios gerais do direito comunitário» (acórdão do Tribunal de Justiça de 22 de Outubro de 2002, Roquette Frères, C‑94/00, Colect., p. I‑9011, n.os 23 e 24, e acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 20 de Fevereiro de 2001, Mannesmannröhren‑Werke/Comissão, T‑112/98, Colect., p. II‑729, n.° 60).

31      A este propósito, cabe recordar a redacção do artigo 7.°, n.° 1, da CEDH:

«Ninguém pode ser condenado por uma acção ou uma omissão que, no momento em que foi cometida, não constituía infracção, segundo o direito nacional ou internacional. Igualmente não pode ser imposta uma pena mais grave do que a aplicável no momento em que a infracção foi cometida.»

32      Segundo o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (a seguir «TEDH»), resulta desta disposição que a lei deve definir claramente as infracções e as penas que as reprimem. Este requisito está preenchido quando o litigante pode saber, a partir do teor da disposição pertinente e, se necessário, com o auxílio da interpretação que lhe foi dada pelos tribunais, quais são os actos e omissões que determinam a sua responsabilidade penal (v. TEDH, acórdão Coëme e o./Bélgica de 22 de Junho de 2000, Recueil des arrêts et décisions, 2000‑VII, p. 1, § 145).

33      Além disso, o artigo 7, n.° 1, da CEDH não exige que os termos das disposições por força das quais estas penas são aplicadas sejam a tal ponto precisos que as consequências que podem decorrer de uma infracção a estas disposições sejam previsíveis com uma certeza absoluta. Efectivamente, segundo a jurisprudência do TEDH, a existência de termos vagos nas disposições não determina necessariamente a violação do artigo 7.° da CEDH, e o facto de uma lei conferir um poder de apreciação não infringe, por si só, a exigência de previsibilidade, na condição de o alcance e as modalidades do exercício de tal poder se encontrarem definidos com nitidez suficiente, tendo em conta a finalidade legítima em jogo, para fornecer ao indivíduo uma protecção adequada contra o arbítrio (v. TEDH, acórdão Margareta e Roger Andersson de 25 de Fevereiro de 1992, série A n.° 226, § 75). A este respeito, para além do texto da própria lei, o TEDH tem em conta a questão de saber se os conceitos indeterminados utilizados foram esclarecidos por uma jurisprudência constante e publicada (v. TEDH, acórdão G. de 27 de Setembro de 1995, série A n.° 325‑B, § 25).

34      Quanto às tradições constitucionais comuns aos Estados‑Membros, não há nenhum elemento que permita ao Tribunal atribuir ao princípio geral do direito comunitário que constitui o princípio da legalidade uma interpretação diferente da que resulta das precedentes considerações. Assim, as recorrentes limitam‑se a afirmar, sem mais esclarecimentos, que, a nível nacional, não existe uma competência comparável de uma autoridade que lhe permita aplicar coimas de modo quase ilimitado.

35      No presente caso, quanto à legalidade do artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento n.° 17 à luz do princípio da legalidade das penas, como reconhecido pelo juiz comunitário em conformidade com as indicações fornecidas pela CEDH e as tradições constitucionais comuns aos Estados‑Membros, há que concluir que, contrariamente ao que sustentam as recorrentes, a Comissão não dispõe de uma margem de apreciação ilimitada para a fixação das coimas por infracção às regras da concorrência.

36      Com efeito, o próprio artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento n.° 17 limita o poder de apreciação da Comissão. Por um lado, quando precisa que «[a] Comissão pode, mediante decisão, aplicar às empresas e associações de empresas [coimas] de [1 000 euros], no mínimo, a [1 000 000 de euros], podendo este montante ser superior desde que não exceda dez por centro do volume de negócios realizado, durante o exercício social anterior, por cada uma das empresas que tenha participado na infracção», prevê um limite máximo para as coimas, em função do volume de negócios das empresas implicadas, ou seja, em função de um critério objectivo. Assim, embora não haja um limite máximo absoluto aplicável à globalidade das infracções às regras da concorrência, o montante da coima que pode ser aplicado tem um limite absoluto, calculado em função de cada empresa, para cada caso de infracção, de modo que o montante máximo da coima que pode ser aplicada a uma dada empresa é previamente determinável. Por outro lado, esta disposição impõe que a Comissão, ao fixar as coimas, em cada caso concreto, tome «em consideração, além da gravidade da infracção, a duração da mesma».

37      Sendo certo que estes dois critérios deixam à Comissão uma ampla margem de apreciação, é também verdade que se trata de critérios consagrados por outros legisladores em disposições semelhantes, que permitem à Comissão adoptar as sanções tendo em conta o grau de ilicitude do comportamento em causa.

38      Há que concluir que, tendo previsto, em caso de infracção às regras da concorrência, coimas compreendidas entre 1 000 euros e 10% do volume de negócios da empresa implicada, o Conselho não conferiu à Comissão uma margem de manobra excessiva. Mais especificamente, cabe considerar que o limite de 10% do volume de negócios da empresa implicada é razoável, tendo em conta os interesses defendidos pela Comissão no quadro do procedimento e da punição de tais infracções.

39      A este respeito, importa recordar que as sanções previstas no artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento n.° 17 para os casos de infracção aos artigos 81.° CE e 82.° CE constituem um instrumento‑chave de que a Comissão dispõe para zelar pela instituição, na Comunidade, de um «regime que garanta que a concorrência não seja falseada no mercado interno» [artigo 3, n.° 1, alínea g), CE]. Este regime permite que a Comunidade cumpra a sua missão que consiste, através da criação de um mercado comum, promover, em toda a Comunidade, o desenvolvimento harmonioso, equilibrado e sustentável das actividades económicas e um elevado grau de competitividade (artigo 2.° CE). Este regime é ainda necessário para a instituição, na Comunidade, de uma política económica conduzida de acordo com o princípio de uma economia de mercado aberto e de livre concorrência (artigo 4.°, n.os 1 e 2, CE). Assim, o artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento n.° 17 permite a implementação de um regime que assegure o cumprimento das missões fundamentais da Comunidade.

40      Há, portanto, que considerar que o artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento n.° 17, embora deixando à Comissão uma certa margem de apreciação, define os critérios e os limites que são impostos à Comissão no exercício do seu poder de aplicar coimas.

41      Cabe ainda observar que, para a fixação das coimas ao abrigo do artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento n.° 17, a Comissão está obrigada ao respeito dos princípios gerais do direito, e muito particularmente dos princípios da igualdade de tratamento e da proporcionalidade, como interpretados pela jurisprudência do Tribunal de Justiça e do Tribunal de Primeira Instância. Importa ainda acrescentar que, por força do artigo 229.° CE e do artigo 17.° do Regulamento n.° 17, estes dois órgãos jurisdicionais decidem com competência de plena jurisdição dos recursos interpostos das decisões através das quais a Comissão fixa as coimas e podem, assim, não apenas anular as decisões tomadas pela Comissão mas também suprimir, reduzir ou aumentar a coima aplicada. Assim, a prática administrativa da Comissão está sujeita à plena fiscalização do juiz comunitário. Contrariamente às afirmações das recorrentes, esta fiscalização não conduz a que o juiz comunitário, ao qual, pretensamente, terá sido delegada a tarefa do legislador, ultrapasse as suas competências em violação do artigo 7.°, n.° 1, CE, dado que, por um lado, esta fiscalização foi expressamente prevista pelas disposições já referidas, cuja validade não foi impugnada, e, por outro, o juiz comunitário a exerce no respeito dos critérios enunciados no artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento n.° 17.

42      A tudo isto acresce que, com base nos critérios consagrados no artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento n.° 17 e precisados na jurisprudência do Tribunal de Justiça e do Tribunal de Primeira Instância, a própria Comissão desenvolveu uma prática decisória publicamente conhecida e acessível. Apesar de a prática decisória anterior da Comissão não servir de quadro jurídico às coimas aplicadas em matéria de concorrência (acórdãos do Tribunal de Justiça de 21 de Setembro de 2006, JCB Service/Comissão, C‑167/04 P, Colect., p. I‑8935, n.os 201 e 205, e de 7 de Junho de 2007, Britannia Alloys & Chemicals/Comissão, C‑76/06 P, Colect., p. I‑4405, n.° 60), a verdade é que, por força do princípio da igualdade de tratamento, que constitui um princípio geral do direito a cuja obediência a Comissão está obrigada, esta última não pode tratar situações comparáveis de modo diferente ou situações diferentes da mesma maneira, salvo se esse tratamento se justificar por razões objectivas (acórdãos do Tribunal de Justiça de 13 de Dezembro de 1984, Sermide, 106/83, Recueil, p. 4209, n.° 28, e do Tribunal de Primeira Instância de 14 de Maio de 1998, BPB de Eendracht/Comissão, T‑311/94, Colect., p. II‑1129, n.° 309).

43      Segundo jurisprudência assente, é certo que a Comissão pode, em qualquer altura, adaptar o nível das coimas se a aplicação eficaz das regras comunitárias da concorrência o exigir (acórdão do Tribunal de Justiça de 7 de Junho de 1983, Musique diffusion française e o./Comissão, 100/80 a 103/80, Recueil, p. 1825, n.° 109, e acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 20 de Março de 2002, LR AF 1998/Comissão, T‑23/99, Colect., p. II‑1705, n.° 237), podendo tal alteração da prática administrativa ser então considerada objectivamente justificada pelo objectivo de prevenção geral das infracções às regras comunitárias da concorrência. O último aumento do nível das coimas alegado e impugnado pelas recorrentes não pode, pois, por si só, ser considerado ilegal à luz do princípio da legalidade das penas, uma vez que não exorbita do quadro legal definido pelo artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento n.° 17, como interpretado pelos órgãos jurisdicionais comunitários.

44      Há ainda que ter em conta que, para assegurar a transparência e a fim de aumentar a segurança jurídica em benefício das empresas implicadas, a Comissão publicou Orientações para o cálculo das coimas aplicadas por força do n.° 2 do artigo 15.° do Regulamento n.° 17 e do n.° 5 do artigo 65.° [CA] (JO 1998, C 9, p. 3, a seguir «orientações»), nas quais enuncia o método de cálculo que impôs a si própria para cada caso concreto. A este propósito, o Tribunal de Justiça considerou, aliás, que, ao adoptar tais regras de conduta e ao anunciar, através da sua publicação, que as aplicará no futuro aos casos a que essas regras dizem respeito, a instituição em causa impõe limites a si própria no exercício do seu poder de apreciação e não pode renunciar a essas regras sob pena de poder ser sancionada, eventualmente, por violação dos princípios gerais do direito, como o da igualdade de tratamento ou o da protecção da confiança legítima. Além disso, embora as orientações não constituam o fundamento jurídico da decisão controvertida, determinam, de maneira geral e abstracta, a metodologia que a Comissão impôs a si própria para efeitos da fixação do montante das coimas aplicadas por esta decisão e asseguram, por conseguinte, a segurança jurídica das empresas (acórdão do Tribunal de Justiça de 28 de Junho de 2005, Dansk Rørindustri e o./Comissão, C‑189/02 P, C‑202/02 P, C‑205/02 P a C‑208/02 P e C‑213/02 P, Colect., p. I‑5425, n.os 211 e 213). Donde decorre que a adopção das orientações pela Comissão, na medida em que está inserida no quadro jurídico imposto pelo artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento n.° 17, contribuiu unicamente para precisar os limites do exercício do poder de apreciação da Comissão que resultavam já desta disposição, sem que daí se possa deduzir uma insuficiência inicial da determinação, pelo legislador comunitário, dos limites da competência da Comissão no domínio em causa.

45      Assim, vistos os diversos elementos atrás salientados, um operador diligente pode, eventualmente com recurso a consultadoria jurídica, prever de modo suficientemente preciso o método de cálculo e a ordem de grandeza das coimas em que pode incorrer por causa de determinado comportamento. O facto de este operador não poder, antecipadamente, conhecer com precisão o nível das coimas que a Comissão aplicará em cada caso concreto não pode constituir violação do princípio da legalidade das penas, tendo em conta que, em razão da gravidade das infracções que a Comissão deve punir, os objectivos de repressão e de dissuasão justificam que se evite que as empresas possam avaliar os benefícios que retirariam da sua participação numa infracção, tendo desde logo em conta o montante da coima que lhes seria aplicada em razão deste comportamento ilícito.

46      A este propósito, apesar de as empresas não poderem, antecipadamente, saber com precisão o nível das coimas que a Comissão fixará em cada caso concreto, importa salientar que, em conformidade com o artigo 253.° CE, a Comissão está obrigada, na decisão de aplicação de uma coima e sem prejuízo do contexto habitualmente conhecido em que esta decisão se insere, a fornecer uma fundamentação, designadamente, quanto ao montante da coima aplicada e ao método seguido a esse respeito. Esta fundamentação deve deixar transparecer, de modo claro e inequívoco, o raciocínio da Comissão, de modo a permitir que os interessados conheçam as justificações da medida tomada, a fim de apreciarem a oportunidade de um recurso para o juiz comunitário e, sendo esse o caso, de permitir a este último exercer a sua fiscalização.

47      Por último, quanto ao argumento segundo o qual, na definição do quadro da coima através da adopção das disposições do artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento n.° 17, o Conselho não observou o dever de indicar claramente os limites da competência conferida à Comissão e, por essa razão, transferiu para esta uma competência que era sua por força do Tratado, em violação dos artigos 83.° CE e 229.° CE, há que concluir que não é desprovido de fundamento.

48      Por um lado, como antes exposto, embora o artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento n.° 17 confira à Comissão uma ampla margem de apreciação, limita, porém, o seu exercício através da instituição dos critérios objectivos que devem ser observados pela Comissão. Há, por outro, que recordar que o Regulamento n.° 17 foi adoptado com base no artigo 83.°, n.° 1, CE, o qual prevê que «[o]s regulamentos ou directivas necessários à aplicação dos princípios constantes dos artigos 81.° [CE] e 82.° [CE] são estabelecidos pelo Conselho […] sob proposta da Comissão, após consulta do Parlamento Europeu». Estes regulamentos ou directivas têm designadamente por finalidade, nos termos, respectivamente, das alíneas a) e d) do artigo 83.°, n.° 2, CE, «garantir o respeito das proibições referidas no n.° 1 do artigo 81.° [CE] e no artigo 82.° [CE], pela cominação de multas e adstrições» e «definir as funções respectivas da Comissão e do Tribunal de Justiça quanto à aplicação do disposto no presente número». Cabe ainda recordar que, nos termos do artigo 211.°, primeiro travessão, CE, a Comissão «vela pela aplicação das disposições do presente Tratado bem como das medidas tomadas pelas instituições, por força deste» e que dispõe, ao abrigo do terceiro travessão deste mesmo artigo, de um «poder de decisão próprio».

49      Donde decorre que o poder de aplicar coimas em caso de infracção aos artigos 81.° CE e 82.° CE não pode ser considerado como tendo pertencido originalmente ao Conselho, que seguidamente o teria transferido ou cuja execução teria delegado na Comissão, ao abrigo do artigo 202.°, terceiro travessão, CE. Efectivamente, em conformidade com as disposições do Tratado antes citadas, este poder insere‑se na própria função da Comissão, de velar pela aplicação do direito comunitário, tendo esta função sido precisada, enquadrada e formalizada, no tocante à aplicação dos artigos 81.° CE e 82.° CE, pelo Regulamento n.° 17. O poder de aplicar coimas que este regulamento confere à Comissão provém, pois, das disposições do próprio Tratado e destina‑se a permitir‑lhe a aplicação efectiva das proibições previstas nos referidos artigos (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 12 de Julho de 2001, Tate & Lyle e o./Comissão, T‑202/98, T‑204/98 e T‑207/98, Colect., p. II‑2035, n.° 133). Não procede, portanto, o argumento das recorrentes.

50      Resulta do conjunto das precedentes considerações que a excepção de ilegalidade deduzida relativamente ao artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento n.° 17 deve ser julgada improcedente (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 27 de Setembro de 2006, Jungbunzlauer/Comissão, T‑43/02, Colect., p. II‑3435, n.os 69 a 92, e de 5 de Abril de 2006, Degussa/Comissão, T‑279/02, Colect., p. II‑897, n.os 66 a 88).

51      Importa, finalmente, salientar que as recorrentes alegam, «a título subsidiário», que o artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento n.° 17 poderia ser considerado compatível com o princípio da legalidade se a Comissão o interpretasse de modo restritivo, o que esta não aceita fazer.

52      Há que concluir, a este respeito, que as recorrentes se limitam a formular considerações de ordem geral sobre o modo como a Comissão deveria, de maneira geral, alterar a sua política em matéria de coimas através do desenvolvimento de uma prática decisória transparente e coerente, mas não avançam nenhuma alegação concreta contra a decisão.

 Quanto à responsabilidade conjunta e solidária da Schunk GmbH e da SKT

53      Importa, a título liminar, observar que, contrariamente ao que afirmam as recorrentes, as condições que determinaram que a Schunk GmbH seja destinatária da decisão estão claramente indicadas nesta.

54      Resulta do considerando 257 da decisão que a Comissão entendeu que, «embora a [SKT] seja a pessoa colectiva que participou directamente nos acordos, decisões e práticas concertadas proibidos, a Schunk GmbH, sua sociedade‑mãe a 100%, podia exercer uma influência determinante sobre a política comercial da [SKT] à época da infracção e é possível pressupor que influenciou efectivamente a sua participação nos acordos, decisões e práticas concertadas proibidos». A Comissão considerou, portanto, que estas duas empresas «form[av]am a unidade económica que fabrica e vende produtos de carbono e de grafite para aplicações eléctricas e mecânicas no EEE e que participou nos acordos, decisões e práticas concertadas proibidos» e que deviam, pois, ser declaradas conjunta e solidariamente responsáveis pela infracção cometida.

55      A este propósito, importa lembrar que o comportamento anticoncorrencial de uma empresa pode ser imputado a outra, quando aquela não determinou de forma autónoma o seu comportamento no mercado, mas aplicou no essencial as instruções que lhe são dadas por esta última, tendo em conta, em particular, os laços económicos e jurídicos que as unem (acórdãos do Tribunal de Justiça de 16 de Novembro de 2000, Metsä‑Serla e o./Comissão, C‑294/98 P, Colect., p. I‑10065, n.° 27, e Dansk Rørindustri e o./Comissão, referido no n.° 44, supra, n.° 117). Assim, o comportamento da filial pode ser imputado à sociedade‑mãe, quando a filial não determinar de forma autónoma a sua conduta no mercado, mas aplicar no essencial as instruções que lhe são dadas pela sociedade‑mãe, constituindo estas duas empresas uma unidade económica (acórdão do Tribunal de Justiça de 14 de Julho de 1972, ICI/Comissão, 48/69, Colect., p. 205, n.os 133 e 134).

56      No caso específico em que uma sociedade‑mãe detém 100% do capital da sua filial autora do comportamento infractor, há uma presunção simples, segundo a qual a referida sociedade‑mãe exerce uma influência determinante no comportamento da sua filial (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 25 de Outubro de 1983, AEG/Comissão, 107/82, Recueil, p. 3151, n.° 50, e acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 20 de Abril de 1999, Limburgse Vinyl Maatschappij e o./Comissão, dito «PVC II», T‑305/94 a T‑307/94, T‑313/94 a T‑316/94, T‑318/94, T‑325/94, T‑328/94, T‑329/94 e T‑335/94, Colect., p. II‑931, n.os 961 e 984) e que constituem, portanto, uma única empresa na acepção do artigo 81.° CE (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 15 de Junho de 2005, Tokai Carbon e o./Comissão, T‑71/03, T‑74/03, T‑87/03 e T‑91/03, não publicado na Colectânea, a seguir «acórdão Tokai II» n.° 59). Compete, por conseguinte, à sociedade‑mãe, que contesta perante o juiz comunitário uma decisão da Comissão de lhe aplicar uma coima por um comportamento da sua filial, ilidir esta presunção mediante a apresentação de elementos de prova susceptíveis de demonstrar a autonomia desta última (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 27 de Setembro de 2006, Avebe/Comissão, T‑314/01, Colect., p. II‑3085, n.° 136; v., também, neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 16 de Novembro de 2000, Stora Kopparbergs Bergslags/Comissão, C‑286/98 P, Colect., p. I‑9925, a seguir «acórdão Stora», n.° 29).

57      A este respeito, cabe salientar que, sendo certo que o Tribunal de Justiça evocou, nos n.os 28 e 29 do acórdão Stora, referido no n.° 56, supra, para além da detenção de 100% do capital da filial, outras circunstâncias, como a não contestação da influência exercida pela sociedade‑mãe na política comercial da sua filial e a representação comum das duas sociedades durante o procedimento administrativo, é também verdade que as referidas circunstâncias foram referidas pelo Tribunal de Justiça, unicamente, a fim de expor o conjunto dos elementos nos quais o Tribunal de Primeira Instância tinha fundado o seu raciocínio para concluir que este não assentara apenas na detenção da totalidade do capital da filial pela sua sociedade‑mãe. Por conseguinte, o facto de o Tribunal de Justiça ter confirmado a apreciação do Tribunal de Primeira Instância nesse processo não pode ter como consequência alterar o princípio enunciado no n.° 50 do acórdão AEG/Comissão, referido no n.° 56, supra. Importa acrescentar que o Tribunal de Justiça indicou expressamente, no n.° 29 do acórdão Stora, referido no n.° 56, supra, que, «perante a detenção da totalidade do capital desta, aquele Tribunal podia legitimamente supor, como sublinhou a Comissão, que a sociedade‑mãe exercia efectivamente uma influência determinante no comportamento da sua filial» e que, nestas condições, cabia à recorrente ilidir esta «presunção» através de elementos de prova suficientes.

58      No presente caso, a Schunk GmbH confirmou expressamente, na audiência e em resposta a uma questão do Tribunal, que controlava a SKT a 100%, à época da infracção, e há, pois, que presumir que exercia efectivamente uma influência determinante no comportamento da sua filial, podendo a Schunk GmbH ilidir esta presunção fornecendo elementos de prova susceptíveis de demonstrar a autonomia da SKT.

59      Decorre dos articulados da Schunk GmbH que a sua argumentação sobre a autonomia da SKT se funda essencialmente apenas na afirmação da sua natureza específica, isto é, a de uma sociedade holding. Daqui a Schunk GmbH deduz a independência funcional da SKT, invocando, além disso, a sua independência orgânica, o que contradiz a afirmação da Comissão de que a Schunk GmbH e a SKT constituem uma unidade económica e actuaram, no caso em apreço, como uma empresa, na acepção do artigo 81.° CE.

60      O conceito de holding abrange várias situações, mas, de um modo geral, uma holding pode ser definida como uma sociedade que detém participações numa ou em várias sociedades, a fim de as controlar.

61      No considerando 260 da decisão, a Comissão recordou o teor do artigo 3.° dos estatutos da Schunk GmbH, nos termos do qual «o objecto da empresa consiste na aquisição, alienação e administração, designadamente a gestão estratégica, de participações industriais».

62      Embora esta definição do objecto social da Schunk GmbH corrobore a sua afirmação de que mais não é do que uma holding financeira, que não exerce nenhuma actividade comercial ou industrial, a expressão «gestão estratégica de participações industriais» é suficientemente ampla para abranger e permitir, na prática, uma actividade de gestão e de direcção das filiais. Importa salientar que este mesmo artigo 3.° dos estatutos da Schunk GmbH prevê ainda que «[a] sociedade é competente para tomar todas as medidas adequadas ao cumprimento directo ou indirecto do objectivo» definido no número anterior.

63      Além disso, no contexto de um grupo de sociedades, como no presente caso, uma holding é uma sociedade que tem por vocação reunir as participações nas diversas sociedades e cuja função consiste em assegurar a unidade da direcção destas. Decorre do considerando 30 da decisão que a Schunk GmbH é a principal sociedade‑mãe do grupo Schunk, que conta mais de 80 filiais, e que é «responsável, designadamente, pela divisão ‘grafite e cerâmicas’ do grupo, que se ocupa nomeadamente dos produtos de carbono e de grafite para aplicações eléctricas e mecânicas».

64      A existência de uma unidade de direcção e de coordenação é atestada pelas condições em que a SKT definiu e apresentou à Comissão o seu volume de negócios, relativo ao ano de 1998, referindo que tinha o direito de excluir do seu volume de negócios o valor das escovas pré‑instaladas nos porta‑escovas.

65      Efectivamente, no considerando 262 da decisão, a Comissão refere o seguinte:

«[E]stes porta‑escovas são fabricados pela Schunk Metall‑ und Kunststofftechnik GmbH, outra filial do grupo Schunk. Se a [SKT] tivesse verdadeiramente prosseguido uma política comercial autónoma, teria sistematicamente incluído as vendas destas escovas à Schunk Metall‑ und Kunststofftechnik GmbH nos dados respeitantes ao seu volume de negócios. O facto de se ter proposto não actuar deste modo demonstra que considera que se tratava de vendas que implicavam uma transferência a outra sociedade do grupo, sujeita ao controlo de entidades jurídicas com posição superior no seio do grupo Schunk, e não de vendas autónomas a um comprador independente. Com efeito, a [SKT] qualificou estas vendas à Schunk Metall‑ und Kunststofftechnik GmbH de ‘volume de negócios interno’ e de ‘utilização própria’.»

66      A situação assim descrita revela uma inegável tomada em consideração dos interesses do grupo e contradiz a alegação de uma independência total da SKT. Importa ainda salientar a importância da filial SKT para o grupo Schunk e a Schunk GmbH, em particular, detentora de 100% do capital da SKT. Assim, quando relativamente ao ano de 2002, o grupo apresentava um volume de negócios consolidado de 584 milhões de euros, a SKT realizou, no mesmo ano, um volume de negócios global de 113,6 milhões de euros.

67      Para além do teor do artigo 3.° dos estatutos da Schunk GmbH, a Comissão faz referência à forma jurídica específica da SKT, que está constituída em sociedade de responsabilidade limitada (Gesellschaft mit beschränkter Haftung, GmbH). A Schunk GmbH não contestou o teor do considerando 259 da decisão, que tem a seguinte redacção:

«Nos termos do direito das sociedades alemão, os [sócios] de uma sociedade […] de responsabilidade limitada (GmbH) controlam estritamente a direcção da GmbH. Designadamente, nomeiam e exoneram os directores‑gerais da GmbH. Tomam igualmente as medidas necessárias para examinar e controlar o modo como a GmbH é dirigida. Além disso, os directores‑gerais da GmbH estão obrigados, a pedido de qualquer [sócio], a fornecer imediatamente informações a respeito das actividades da sociedade e a permitir o acesso às suas contas e documentos.»

68      No plano orgânico, a Schunk GmbH afirma que não existe sobreposição pessoal entre as duas sociedades, no sentido de «estruturas pessoais comuns a várias sociedades como, por exemplo, uma mesma pessoa que exerça as funções de membro do conselho de administração simultaneamente e durante um período relativamente longo em diversas sociedades ou nomeações recíprocas para a direcção e o conselho de administração».

69      Porém, é forçoso concluir que a Schunk GmbH não fornece nenhuma prova documental em apoio das suas alegações, prova esta que, contudo, podia ser apresentada para, designadamente, a lista nominativa dos membros dos órgãos estatutários das duas empresas à época da infracção.

70      Nestas circunstâncias, o facto de o objecto social da Schunk GmbH permitir concluir que ela constituía realmente uma holding, cuja missão estatutária era gerir as suas participações no capital de outras sociedades, não basta, por si só, para ilidir a presunção decorrente da detenção da integralidade do capital social da SKT.

71      Esta conclusão torna inútil a apreciação da força probatória de um indício mencionado no considerando 261 da decisão, destinado a demonstrar o facto de a direcção da Schunk GmbH não ter podido ignorar a participação da SKT nos acordos restritivos da concorrência, a saber, o papel desempenhado por M. F., cujo nome figurava numa agenda de contactos de um representante da Morgan, que, posteriormente, veio a ser director‑geral da Schunk GmbH.

72      Cabe, além disso, referir que a comparação feita pela Schunk GmbH com a situação da Hoffmann e o tratamento autónomo de que esta foi objecto por parte da Comissão é totalmente irrelevante, na medida em que a Comissão considerou a responsabilidade específica desta sociedade relativamente ao período decorrido entre Setembro de 1994 e Outubro de 1999, isto é, antes da sua aquisição pela Schunk GmbH.

73      Por último, a Schunk GmbH sustenta que, para que uma sociedade‑mãe possa ser considerada responsável por uma infracção cometida pela sua filial, é necessário que esteja demonstrada uma violação pessoal das regras da concorrência pela sociedade‑mãe, e que a imputação a outra pessoa de uma infracção cometida viola o princípio da responsabilidade individual, que impõe que um sujeito jurídico só possa ser punido se lhe puder ser imputada uma infracção pessoal.

74      Basta referir que a argumentação da Schunk GmbH assenta numa premissa errada, segundo a qual não foi verificada nenhuma infracção a seu respeito. Pelo contrário, decorre do considerando 257 e do artigo 1.° da decisão que a Schunk GmbH foi pessoalmente condenada por uma infracção que ela própria terá cometido em razão dos vínculos económicos e jurídicos que a ligavam à SKT e que lhe permitiam determinar o comportamento desta última no mercado (v., neste sentido, acórdão Metsä‑Serla e o./Comissão, referido no n.° 55, supra, n.° 34).

75      Decorre das considerações precedentes que a Schunk GmbH não demonstrou que foi erradamente que a Comissão a declarou conjunta e solidariamente responsável, com a SKT, pelo pagamento da coima de 30,87 milhões de euros.

76      Consequentemente, não colhe a alegação de que a Comissão aplicou mal o artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento n.° 17, quando teve em conta o volume de negócios mundial da Schunk GmbH, que foi erradamente considerada conjunta e solidariamente responsável com a SKT, visto que assenta numa premissa errada.

 Quanto às contestações da infracção

–       Considerações preliminares

77      Como já foi exposto, a argumentação desenvolvida pelas recorrentes em apoio da alegação relativa à violação, pela Comissão, dos princípios da proporcionalidade e da igualdade de tratamento no momento da fixação do montante da coima comporta contestações da infracção declarada pela Comissão e suscita, portanto, a questão da responsabilidade das empresas em causa.

78      Assim, as recorrentes alegam que foi erradamente que a Comissão concluiu:

–        que as empresas implicadas no cartel tinham decidido de comum acordo renunciar à publicidade e às participações em feiras;

–        que a SKT tinha participado nos acordos relativos à proibição de fornecimento de blocos de carbono a processadores;

–        que os produtos e clientes dos sectores dos equipamentos para automóveis e dos bens de consumo tinham sido objecto de acordos anticoncorrenciais;

–        que as empresas em causa seguiram «um plano global que visava modificar duradouramente a estrutura da concorrência no mercado através da aquisição de empresas», nunca tendo existido tal plano ou só tendo podido ser concebido pela SGL e a Morgan, sem o conhecimento das recorrentes;

–        que as empresas em causa recorreram a um mecanismo extremamente sofisticado para controlar e aplicar os seus acordos.

79      Em reacção a estas alegações, a Comissão contrapõe que as recorrentes não contestaram, na sua resposta à comunicação de acusações, a materialidade de certos factos que figuram na referida comunicação e que são contestados, pela primeira vez, no recurso de anulação interposto para o Tribunal. Ora, segundo a jurisprudência, os factos reconhecidos durante o procedimento administrativo devem ser considerados assentes e já não podem ser objecto de impugnação judicial.

80      Cabe recordar, a este respeito, que a comunicação de acusações, que se destina a assegurar às empresas suas destinatárias o exercício efectivo dos direitos de defesa, tem por efeito circunscrever o objecto do procedimento instaurado a uma empresa, na medida em que fixa a posição da Comissão relativamente à referida empresa e que a instituição não tem o direito de considerar, na sua decisão, acusações que não figuram na comunicação (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal de Justiça de 14 de Julho de 1972, Francolor/Comissão, 54/69, Recueil, p. 851, n.° 12, Colect., p. 305; e de 15 de Outubro de 2002, Limburgse Vinyl Maatschappij e o./Comissão, C‑238/99 P, C‑244/99 P, C‑245/99 P, C‑247/99 P, C‑250/99 P a C‑252/99 P e C‑254/99 P, Colect., p. I‑8375, n.° 86).

81      Designadamente, é com base nas respostas à comunicação de acusações fornecidas pelas empresas suas destinatárias que a Comissão deve fixar a sua posição quanto ao resultado do procedimento administrativo.

82      Por um lado, a instituição tem o direito ou, eventualmente, o dever de proceder a novos inquéritos se o procedimento administrativo revelar a necessidade de verificações complementares (acórdão do Tribunal de Justiça de 14 de Julho de 1972, Geigy/Comissão, 52/69, Recueil, p. 787, n.° 14, Colect., p. 293), que podem levar a que a Comissão dirija às empresas em causa uma comunicação de acusações complementar.

83      Pode, por outro lado, entender, à luz das respostas à comunicação de acusações e, mais especificamente, da admissão pelas empresas em causa dos factos que lhes são imputados, bem como dos elementos recolhidos durante o inquérito, que está em posição de adoptar uma decisão definitiva que põe termo ao procedimento administrativo e à sua missão que consiste na determinação e na prova dos factos que estão na base das infracções em causa. Nessa decisão, a Comissão define as responsabilidades das empresas em causa e fixa o montante das coimas que lhes serão eventualmente aplicadas.

84      Foi neste contexto que o Tribunal de Justiça declarou, no n.° 37 do acórdão de 16 de Novembro de 2000, SCA Holding/Comissão (C‑297/98 P, Colect., p. I‑10101), que, na falta de reconhecimento expresso por parte da empresa posta em causa, a Comissão deverá ainda provar os factos, dispondo a empresa de liberdade para apresentar, chegado o momento e nomeadamente na fase contenciosa do processo, todos os meios de defesa que lhe parecerem úteis. Daí se pode concluir, a contrario, que não é esse o caso quando existe um reconhecimento dos factos pela empresa em questão (acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 9 de Julho de 2003, Archer Daniels Midland e Archer Daniels Midland Ingredients/Comissão, T‑224/00, Colect., p. II‑2597, n.° 227; de 29 de Abril de 2004, Tokai Carbon e o./Comissão, T‑236/01, T‑239/01, T‑244/01 a T‑246/01, T‑251/01 e T‑252/01, Colect., p. II‑1181, n.° 108, a seguir «acórdão Tokai I»; v., igualmente, neste sentido, acórdão Tokai II, referido no n.° 56, supra, n.os 324 e 326).

85      Esta jurisprudência não tem por objecto restringir a interposição do recurso contencioso por uma empresa punida pela Comissão, mas sim esclarecer o alcance da contestação que pode ser submetida ao juiz a fim de evitar qualquer transferência da determinação dos factos na base da infracção em causa, da Comissão para o Tribunal, cabendo recordar que este, um vez que conhece do recurso baseado no artigo 230.° CE, é competente para fiscalizar a legalidade da decisão que aplica a sanção e para, eventualmente, reformar esta última no âmbito da sua competência de plena jurisdição (despacho do Tribunal de Primeira Instância de 9 de Novembro de 2004, FNICGV/Comissão, T‑252/03, Colect., p. II‑3795, n.° 24).

86      No presente caso, a Comissão dirigiu, em 23 de Maio de 2003, uma comunicação de acusações às recorrentes, dando‑lhes um prazo de oito semanas para a examinar e formular a resposta. No decurso deste período, as recorrentes, assistidas pelos seus consultores jurídicos, puderam analisar as acusações formuladas pela Comissão e decidir, com conhecimento de causa, a posição que deviam tomar, tendo igualmente em conta os termos da comunicação sobre a cooperação.

87      Na sua resposta à comunicação de acusações, a Schunk GmbH refere que não contesta a materialidade dos factos nem a qualificação jurídica destes factos como acordos e decisões proibidos e/ou como prática concertada, mas insurge‑se contra o facto de lhe ser imputada uma infracção da SKT ao direito da concorrência. Assim, a resposta da Schunk GmbH é consagrada à contestação da responsabilidade solidária e conjunta com a SKT.

88      No tocante à SKT, a sua resposta reveste uma forma particular, no sentido de que comporta uma introdução onde se refere, de um modo geral, o seguinte:

«A [SKT] não contesta a materialidade dos factos […] Também não contesta a qualificação jurídica destes factos como acordos e decisões proibidos e/ou como prática concertada. A [SKT] insurge‑se unicamente, nas presentes observações, contra certas apreciações dos factos e as conclusões jurídicas da Comissão. Portanto, completaremos a exposição dos factos no que respeita a certos pontos.»

89      A formulação escolhida revela o reconhecimento global e expresso, não apenas dos factos apurados mas ainda das qualificações jurídicas de que estes foram alvo na comunicação de acusações, acompanhado, porém, de reserva quanto a certos factos e conclusões jurídicas que a Comissão deles pôde extrair.

90      Importa, a este propósito, salientar que a Comissão concedeu à Schunk uma redução de 10% do montante da coima, valor precisado na audiência, em aplicação da secção D, n.° 2, segundo travessão, da comunicação sobre a cooperação, que prevê a atribuição desta redução se «uma empresa, após ter recebido a comunicação de acusações, informar a Comissão de que não contesta a materialidade dos factos em que a Comissão baseia as suas acusações».

91      Há, pois, que verificar se as contestações mencionadas no n.° 78, supra, abrangem as reservas expressas pela SKT na sua resposta à comunicação de acusações.

–       Quanto à proibição da publicidade

92      A Comissão sustenta que as recorrentes contestam, pela primeira vez, no requerimento introdutivo da instância, a existência de um acordo relativo à publicidade e à participação em feiras, expressamente mencionado na comunicação de acusações, ao passo que as recorrentes defendem nunca ter reconhecido a exactidão do facto em causa durante o procedimento administrativo.

93      É forçoso constatar que a questão da proibição da publicidade foi claramente evocada nos n.os 106 e 107 da comunicação de acusações. Assim, a Comissão indicou que os membros do cartel tinham acordado não fazer publicidade e não participar em feiras e exposições (n.° 106) e fez referência ao facto de o comité técnico ter concluído, na sua reunião de 3 de Abril de 1998, na rubrica «Regras em matéria de publicidade», que «a Morgan Cupex e a Pantrak fizeram publicidade para as escovas de carbono, o que não é permitido» (n.° 107).

94      Importa recordar que, nas suas respostas à comunicação de acusações, a SKT e a Schunk GmbH indicaram que não contestavam a materialidade dos factos nem a qualificação jurídica destes factos como acordos e decisões proibidos e/ou como prática concertada, sem prejuízo, no respeitante à SKT, de certas apreciações e conclusões da Comissão evocadas nos n.os 3 a 33 da sua resposta. Ora, nos referidos números, não se faz referência nenhuma às apreciações e conclusões da Comissão a respeito da proibição da publicidade.

95      Nestas circunstâncias, há que concluir que as recorrentes reconheceram claramente a existência de um acordo anticoncorrencial sobre a proibição da publicidade, que já não pode ser contestado, pela primeira vez, perante o Tribunal.

–       Quanto ao fornecimento de blocos de carbono

96      A SKT sustenta que, contrariamente às afirmações da Comissão, não participou nos acordos relativos à proibição de fornecimento de blocos de carbono a processadores.

97      Resulta da decisão que esta alegação decorre de uma leitura parcial e errada desta última e não pode, consequentemente, ser analisada como uma verdadeira contestação tardia dos factos imputados.

98      No considerando 154 da decisão, a Comissão explica que, para além de venderem produtos de carbono acabados, como as escovas de carbono, os membros do cartel também vendiam blocos de carbono prensados, que ainda não tinham sido cortados nem processados para fabricar escovas ou outros produtos. Um certo número de processadores que não são partes nos acordos, decisões e práticas concertadas compram estes blocos de carbono, cortam‑nos e transformam‑nos em produtos acabados que vendem aos clientes. Embora sendo clientes dos membros do cartel, esses processadores representam também para eles uma fonte de concorrência no tocante aos produtos acabados.

99      Decorre dos considerandos 154 a 166 da decisão que a política do cartel visava limitar a concorrência que os processadores podiam exercer relativamente aos produtos acabados fabricados a partir desses blocos, e isso através da recusa de fornecimento ou, quando eram abastecidos, da fixação de preços para os blocos de carbono fornecidos a níveis elevados.

100    No considerando 161 da decisão, a Comissão acusa claramente a Schunk de ter abastecido os processadores, aplicando‑lhes os preços previamente acordados com os outros membros do cartel, o que as recorrentes não contestam nos seus articulados. A alegação das recorrentes de que não participaram nos acordos relativos à proibição de fornecimento de blocos de carbono é, portanto, absolutamente irrelevante.

101    Donde decorre que foi correctamente que a Comissão considerou que as recorrentes tinham infringido o artigo 81.° CE, ao participarem num conjunto de acordos anticoncorrenciais que incluíam, nomeadamente, acordos sobre os preços dos blocos de carbono destinados aos processadores.

–       Quanto às práticas anticoncorrenciais relativas aos fabricantes de equipamentos para automóveis e aos produtores de bens de consumo

102    Segundo as recorrentes, resulta dos autos e da própria decisão que os acordos anticoncorrenciais não diziam respeito aos produtos e clientes dos sectores de actividade relativos aos fabricantes de equipamentos para automóveis e aos bens de consumo. De resto, nunca reconheceram a existência de tais acordos, relativos a esses sectores, no quadro do procedimento administrativo.

103    A Comissão alega que os dois sectores de actividade em causa foram claramente descritos no n.° 11 da comunicação de acusações e que a infracção no tocante a estes sectores não consiste na aplicação do sistema de preços‑alvo, mas na concertação dos membros do cartel a respeito dos argumentos a utilizar para recusar reduções de preços nas negociações com os operadores dos referidos sectores, o que resulta já dos n.os 91 e 94 da comunicação de acusações.

104    A Comissão acrescenta que a SKT reconheceu estes factos no n.° 24 da sua resposta à comunicação de acusações, que tem a seguinte redacção:

«No domínio das escovas de carbono e dos módulos para o sector da indústria automóvel e para os fabricantes de aparelhos domésticos e de máquinas e utensílios, os produtores faziam face a clientes de grande dimensão, que dispunham de poder de compra e estavam na posição de se servirem de uns produtores contra outros. Estes clientes nunca foram objecto de um acordo generalizado nas reuniões do cartel ao nível europeu. É certo que tiveram lugar estes encontros. Mas foram realizados exclusivamente com a finalidade de os produtores puderem trocar mutuamente argumentos a fim de os poderem opor aos clientes de grandes dimensões que exigiam reduções de preços.»

105    Verifica‑se, assim, que, apesar de a SKT negar a existência de um acordo sobre os preços, admite, em contrapartida, a realidade de uma concertação ilícita entre as empresas implicadas no cartel, que tinha por objecto o nível dos preços dos produtos destinados aos fabricantes de equipamentos para automóveis e aos produtores de bens de consumo, facto que já não pode ser contestado pela primeira vez perante o Tribunal.

106    Todavia, as recorrentes contestam que as declarações que figuram no n.° 24 da resposta da SKT à comunicação de acusações possam ser compreendidas e qualificadas como a confissão expressa de uma infracção ao artigo 81.° CE.

107    Partindo do princípio de que, tendo em conta uma certa imprecisão da comunicação de acusações a respeito da natureza e da qualificação jurídica exacta do comportamento infractor imputado, as declarações anteriormente referidas podiam não ser consideradas como um reconhecimento expresso dos factos imputados, a alegação das recorrentes relativa à ausência de infracção no sector dos fabricantes de equipamentos para automóveis e dos produtores de bens de consumo deveria ser admissível, mas, em todo o caso, ser julgada improcedente.

108    Convém observar que resulta da decisão que a Comissão considerou que o comportamento das várias empresas implicadas nos acordos, decisões e práticas concertadas constituía uma infracção única e continuada, que se concretizou progressivamente nos acordos e/ou nas práticas concertadas.

109    Assim, o artigo 1.° da decisão enuncia que as empresas em causa, entre as quais as recorrentes, infringiram o artigo 81.°, n.° 1, CE, ao participarem «num conjunto de acordos e práticas concertadas» no sector dos produtos de carbono e de grafite para aplicações eléctricas e mecânicas. A este propósito, há que recordar que, no âmbito de uma infracção complexa, que implicou vários produtores durante vários anos, prosseguindo um objectivo de regulação em comum do mercado, não se pode exigir que a Comissão qualifique especificamente a infracção, para cada empresa e em cada momento preciso, de acordo ou de prática concertada, uma vez que, de qualquer modo, ambas essas formas de infracção são visadas pelo artigo 81.° CE (acórdão PVC II, referido no n.° 56, supra, n.° 696).

110    No tocante às actividades ilícitas a respeito dos fabricantes de equipamentos para automóveis e dos produtores de bens de consumo, a Comissão esclareceu, no considerando 40 da decisão, que estes fazem parte da primeira categoria dos «clientes de grandes dimensões» para os produtos destinados a aplicações eléctricas e se caracterizam pelo seu pequeno número, pelas compras em grandes quantidades e um importante poder de negociação.

111    Apoiando‑se, designadamente, nas declarações da LCL, a Comissão indicou que «os únicos tipos de clientes que parecem ter sido excluídos do cálculo dos preços de tabela são os fabricantes de equipamentos para automóveis e talvez os produtores de bens de consumo» (considerando 120 da decisão), mas houve contactos directos entre os potenciais fornecedores, antes das negociações anuais com os operadores em questão, tendo estes contactos tido por objecto não tanto um acordo sobre os preços, mas sim chegar a um acordo sobre os argumentos a opor aos pedidos de redução dos preços formulados por estes clientes de grandes dimensões (considerando 124 da decisão).

112    As recorrentes afirmam que o documento proveniente da LCL, no qual se apoiam as conclusões da Comissão, não contém nenhum indício que permita concluir que a troca de argumentos em causa respeitava aos sectores dos equipamentos para automóveis e dos bens de consumo e que a referida troca não constitui um comportamento proibido pelo artigo 81.° CE.

113    Importa, em primeiro lugar, constatar que o documento em causa respeita ao «método de cálculo dos preços das escovas para motores eléctricos» e que a primeira parte está consagrada às «escovas para automóveis» e às «escovas FHP». Após ter descrito o contexto da procura para estes dois produtos, em termos análogos aos mencionados no n.° 110, supra, a LCL indicou o seguinte:

«Neste contexto, as concertações entre concorrentes durante o período incriminado tinham unicamente por objecto tentar resistir a uma relação de forças muito desequilibrada a favor dos clientes.

[…]

Os preços dos produtos ‘escovas para automóveis’ e ‘escovas FHP’ nunca foram objecto de discussões no quadro das reuniões técnicas [da European Carbon and Graphite Association]. Nunca foram fixados a partir de métodos ou tabelas comuns aos vários concorrentes.

Durante o período de existência dos acordos, decisões e práticas concertadas proibidos, que expirou em 1999, os concorrentes concertavam‑se por ocasião das reuniões anuais com os clientes para trocar informações e os argumentos que cada concorrente procurava seguidamente utilizar para resistir às pressões dos clientes e aos seus pedidos contínuos de redução dos preços.

[…]

Conclusão

Durante o período de infracção, verificaram‑se concertações entre os concorrentes a respeito das ‘escovas para automóveis’ e das ‘escovas FHP’ com a finalidade de ajudar os concorrentes a resistir melhor às fortes pressões e pedidos reiterados de redução dos preços por parte dos clientes.»

114    Tendo em conta a natureza dos produtos a que se alude no documento em causa, não há dúvida que a concertação evocada respeitava aos sectores dos equipamentos para automóveis e dos bens de consumo. É ponto assente que os produtos de carbono e de grafite para aplicações eléctricas servem principalmente para a condução da electricidade. Entre estes produtos, figuram as escovas em grafite, que incluem as «escovas para automóveis», que são montadas nos motores eléctricos destinados a equipar os automóveis, e as «escovas FHP», que são montadas nos motores eléctricos de produtos electrodomésticos e de utensílios portáteis.

115    Acresce que, no n.° 24 da sua resposta à comunicação de acusações, a SKT situou claramente a concertação em causa «[n]o domínio das escovas de carbono e dos módulos para o sector da indústria automóvel e para os fabricantes de aparelhos domésticos e de máquinas e utensílios».

116    Convém, em segundo lugar, recordar que o conceito de «prática concertada» consiste numa forma de coordenação entre empresas que, sem se ter desenvolvido até à celebração de uma convenção propriamente dita, substitui cientemente uma cooperação prática entre elas com riscos para a concorrência (acórdão ICI/Comissão, referido no n.° 55, supra, n.° 64). Os critérios de coordenação e de cooperação em causa, longe de exigirem a elaboração de um verdadeiro «plano», devem ser entendidos à luz da ideia, implícita nas disposições do Tratado relativas à concorrência, segundo a qual cada operador económico deve determinar com independência a política comercial que tenciona adoptar no mercado comum. Esta exigência de independência não priva os operadores económicos do direito de se adaptarem inteligentemente ao comportamento efectivo ou previsível dos seus concorrentes, mas impede rigorosamente qualquer contacto directo ou indirecto entre esses operadores, com o objectivo ou o efeito de influenciar o comportamento no mercado de um concorrente efectivo ou potencial ou de revelar a tal concorrente o comportamento que eles próprios decidiram adoptar ou tencionem adoptar no mercado (acórdão do Tribunal de Justiça de 16 de Dezembro de 1975, Suiker Unie e o./Comissão, 40/73 a 48/73, 50/73, 54/73 a 56/73, 111/73, 113/73 e 114/73, Colect., p. 563, n.° 301; acórdão PVC II, referido no n.° 56, supra, n.° 720).

117    É evidente que o objecto dos contactos directos havidos entre os participantes no cartel, como relatados pela LCL e a SKT, se insere numa concertação ilícita, na acepção da jurisprudência supra‑referida. Ao trocarem informações com a finalidade de manterem um certo nível dos preços para os produtos destinados aos fabricantes de equipamentos para automóveis e aos produtores de bens de consumo, as empresas em causa adoptaram práticas colusórias que facilitaram a coordenação do seu comportamento comercial, em contradição manifesta com a exigência segundo a qual qualquer operador económico deve determinar de forma autónoma a política que tenciona seguir no mercado.

118    No seu acórdão de 8 de Julho de 1999, Comissão/Anic Partecipazioni (C‑49/92 P, Colect., p. I‑4125), o Tribunal de Justiça esclareceu que, como resulta dos próprios termos do artigo 81.°, n.° 1, CE, o conceito de prática concertada implica, para além da concertação entre as empresas, um comportamento no mercado que dê seguimento a essa concertação e um nexo de causalidade entre estes dois elementos (n.° 118). Enunciou ainda que há que presumir, sem prejuízo da prova em contrário que aos operadores interessados cabe fazer, que as empresas que participam na concertação e que continuam activas no mercado levam em linha de conta as informações que trocaram com os seus concorrentes para determinar o seu comportamento nesse mercado (acórdão Comissão/Anic Partecipazioni, já referido, n.° 121).

119    No caso em apreço e na falta da prova em contrário que lhe competia fazer, há que considerar que a SKT, que se manteve activa no mercado em causa durante todo o período que durou a infracção, teve em conta a concertação ilícita, na qual participou, para determinar o seu comportamento no referido mercado (v., neste sentido, acórdão Comissão/Anic Partecipazioni, referido no n.° 118, supra, n.° 121).

120    Donde resulta que foi correctamente que a Comissão considerou que as recorrentes tinham infringido o artigo 81.° CE, através da sua participação num conjunto de acordos e de práticas concertadas relativos, nomeadamente, aos produtos destinados aos fabricantes de equipamentos para automóveis e aos produtores de bens de consumo, e que não colhem, pois, as alegações das recorrentes, assentes na premissa errada de que os acordos, decisões e práticas concertadas proibidos não diziam respeito aos referidos produtos, no que se refere à necessidade de não ter em conta os volumes de negócios realizados nos sectores em causa.

–       Quanto à inexistência de um plano global dos participantes no cartel destinado a modificar duradouramente a estrutura da concorrência no mercado através da aquisição de empresas

121    No quadro das suas observações sobre a gravidade da infracção, as recorrentes salientam que, a propósito das aquisições de empresas feitas no passado, a Comissão concluiu, no considerando 173 da decisão, pelo menos na sua versão em língua alemã, que «estas várias medidas permitiram ao cartel resolver o problema da quase totalidade dos ‘outsiders’ presentes no mercado do EEE».

122    A Schunk alega que, com esta afirmação, a Comissão presumiu que as empresas em causa seguiam um plano global que visava modificar duradouramente a estrutura da concorrência no mercado através da aquisição de empresas e sustenta que tal plano nunca existiu ou que só poderia ter sido concebido e posto em prática pela SGL e pela Morgan, e isto sem o seu conhecimento.

123    Na medida em que estas alegações possam ser entendidas como uma contestação, pelas recorrentes, da infracção pela qual foram declaradas responsáveis, como descrita no considerando 2 da decisão, é forçoso concluir que provêm de uma leitura manifestamente errada da decisão e que não devem ser acolhidas por serem absolutamente irrelevantes.

124    Importa, a este respeito, salientar que o considerando 173 da decisão constitui uma frase conclusiva que não se refere unicamente às aquisições de empresas concorrentes efectuadas por certos participantes no cartel.

125    A expressão «estas várias medidas» remete para todas as actuações anticoncorrenciais descritas no considerando 167 da decisão e que visavam persuadir os concorrentes a cooperar, a forçar os concorrentes a cooperar, a forçar os concorrentes, através de uma acção coordenada, a retirarem‑se do mercado ou, pelo menos, a indicar‑lhes claramente que não tinham interesse em contrariar o cartel, reforçando estas acções com a aquisição de concorrentes. O considerando em causa não comporta, pois, nenhuma afirmação ou suposição da Comissão a respeito da existência de um «plano global dos participantes no cartel destinado a modificar duradouramente a estrutura da concorrência no mercado através da aquisição de empresas».

126    Há ainda que observar que, tanto na comunicação de acusações como na decisão, a Comissão não imputa às recorrentes operações de aquisição de empresas concorrentes e que as recorrentes não contestam a realidade das actuações anticoncorrenciais imputadas aos participantes no cartel e que visavam as empresas concorrentes, excepto as medidas de aquisição de empresas, como descritas nos considerandos 168 a 171 da decisão.

–       Quanto à existência de um mecanismo extremamente sofisticado para controlar e aplicar os acordos em causa

127    Resulta dos considerandos 2 e 219 da decisão que a Comissão entendeu que as empresas suas destinatárias participaram numa infracção única e continuada ao artigo 81.°, n.° 1, CE e, a partir de 1 de Janeiro de 1994, ao artigo 53.°, n.° 1, do Acordo EEE, no quadro da qual essas empresas, nomeadamente, recorreram a «um mecanismo extremamente sofisticado para controlar e aplicar os seus acordos».

128    As recorrentes sustentam que tal mecanismo nunca existiu e que a decisão não esclarece o teor deste.

129    Cabe, porém, salientar que a decisão contém dois considerandos relativos ao «[m]odo de assegurar o respeito das regras do cartel».

130    O considerando 89 tem a seguinte redacção:

«O acordo de 1937 que instituiu a associação europeia dos produtores de escovas de carbono previa um procedimento oficial de arbitragem a fim de resolver os diferendos entre os membros do cartel em caso de alegações de desrespeito das regras do cartel. Estes procedimentos formais, destinados a assegurar o respeito das regras do cartel, tornaram‑se impossíveis após a entrada em vigor das regras da concorrência da Comunidade. Os membros do cartel passaram então a controlar estritamente as ofertas de preços que cada um deles fazia aos clientes e insistiram, nas reuniões ou por ocasião de outros contactos, na necessidade de respeitar as regras e preços acordados no seio do cartel. Exemplos:

Numa reunião do comité técnico de 16 de Abril de 1993:

‘G [Schunk] pede que:

1. A oferta de preços feita à Burgmann [um cliente] e que é inferior de 25[%] a 30% à tabela seja retirada por escrito.

2. Não seja proposta qualquer oferta a este nível de preços’.

Reunião local nos Países Baixos em 27 de Outubro de 1994:

‘Morganite − Bélgica problemas com os colegas. Nenhum aumento dos preços aplicado no Verão’.»

131    Apoiando‑se em diversos documentos, a Comissão acrescentou, no considerando 90 da decisão, que «[o]s casos das empresas que praticavam preços demasiado baixos eram examinados nas reuniões do cartel e podiam conduzir a pedidos de compensação».

132    Nos seus articulados, a Comissão sustenta que as recorrentes contestam, pela primeira vez, perante o Tribunal os factos antes referidos, os quais figuram efectivamente no n.° 62 da comunicação de acusações.

133    Importa salientar que as reservas e observações críticas formuladas pela SKT na sua resposta à comunicação de acusações e que relativizam o alcance da declaração de princípio inicial relativa à admissão da materialidade dos factos e da sua qualificação jurídica não respeitam à questão do controlo da aplicação dos acordos, a qual, portanto, não pode ser discutida pelas recorrentes, pela primeira vez, perante o Tribunal.

134    Partindo do princípio de que a contestação avançada pelas recorrentes pudesse, contudo, ser admissível, tendo em conta o facto de que foi na decisão que a Comissão utilizou, pela primeira vez, a expressão «mecanismo extremamente sofisticado», ela deve, em todo o caso, ser julgada improcedente. Efectivamente, basta constatar que as recorrentes não forneceram nenhum elemento que permitisse contradizer as conclusões a que a Comissão chegou nos considerandos 89 e 90 da decisão, mais particularmente a respeito da existência de um mecanismo de controlo da política de preços dos participantes no cartel que incluía indemnizações a pagar pelas empresas que tivessem praticado ofertas de preços demasiado baixas.

135    Cabe, por último, salientar que, numa parte da petição consagrada à «contribuição da Schunk para a infracção» e à circunstância de, alegadamente, a Comissão a ter sobrestimado, as recorrentes criticam a posição da Comissão expressa no considerando 178 da decisão e qualificam de «anormal» o facto de, logo na reunião constitutiva da European Carbon and Graphite Association (ECGA, associação europeia do carbono e da grafite), em 1 de Março de 1995, alguns membros terem referido a necessidade de um comité das grafites especiais, sem que, todavia, pudessem, à época, indicar as questões lícitas que ficaria encarregado de examinar.

136    Além do carácter sumário e hermético da argumentação das recorrentes, verifica‑se que as declarações da Comissão anteriormente referidas se inscrevem no quadro da apreciação do papel desempenhado nos acordos, decisões e práticas concertadas pelas associações profissionais e, mais especificamente, pela ECGA. Nestas condições, esta argumentação das recorrentes não é de natureza a pôr em causa a apreciação, pela Comissão, da responsabilidade das recorrentes, nem, de resto, a apreciação da gravidade da infracção.

137    Decorre do conjunto das precedentes considerações que foi de forma juridicamente correcta que a Comissão considerou que as recorrentes cometeram uma infracção ao artigo 81.° CE, como descrita no considerando 2 da decisão, através da sua participação num conjunto de acordos e de práticas concertadas no sector dos produtos de carbono e de grafite para aplicações eléctricas e mecânicas.

 Quanto ao pedido de redução da coima

138    As recorrentes acusam a Comissão de ter violado os princípios da proporcionalidade e da igualdade de tratamento no momento da fixação do montante da coima.

139    Resulta da decisão que as coimas foram aplicadas ao abrigo do artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento n.° 17 e que a Comissão – apesar de a decisão não se referir expressamente às orientações – determinou o montante das coimas por aplicação do método definido nas orientações.

 Quanto à alegada sobrestimação da gravidade da infracção pela Comissão, tendo em conta a sua natureza e os seus efeitos

140    Segundo o método definido nas orientações, a Comissão toma como ponto de partida para o cálculo do montante das coimas a aplicar às empresas implicadas um montante determinado em função da gravidade da infracção. A avaliação do grau de gravidade da infracção deve ter em consideração o carácter da própria infracção, o seu impacto concreto no mercado, quando este for quantificável, e a dimensão do mercado geográfico de referência (ponto 1 A, primeiro parágrafo). Neste quadro, as infracções são classificadas em três categorias, a saber, as «infracções pouco graves», para as quais os montantes previstos para as coimas estão compreendidos entre 1 000 euros e 1 milhão de euros, as «infracções graves», para as quais os montantes previstos para as coimas estão compreendidos entre 1 milhão e 20 milhões de euros, e as «infracções muito graves», para as quais os montantes previstos para as coimas excedem os 20 milhões de euros (ponto 1 A, segundo parágrafo, primeiro a terceiro travessões).

141    Na decisão, a Comissão salientou os três elementos seguintes:

–        a infracção em causa consistiu essencialmente na fixação directa ou indirecta dos preços de venda e de outras condições de transacção aplicáveis aos clientes, na repartição dos mercados, nomeadamente através da atribuição de clientes, e na condução de acções coordenadas contra concorrentes que não eram membros do cartel, constituindo estas práticas, pela sua própria natureza, o tipo de infracção mais grave às disposições do artigo 81.°, n.° 1, CE e do artigo 53.°, n.° 1, do Acordo EEE (considerando 278 da decisão);

–        os acordos colusórios foram postos em prática e tiveram impacto no mercado do EEE dos produtos em questão, mas este impacto não podia ser medido com precisão (considerando 286 da decisão);

–        o cartel abrangia integralmente o mercado comum e, após a sua criação, o EEE na sua integralidade (considerando 287 da decisão).

142    A conclusão da Comissão, exposta no considerando 288 da decisão, é do seguinte teor:

«Tendo em conta todos estes factores, a Comissão considera que as empresas às quais a presente decisão diz respeito cometeram uma infracção muito grave. Entende a Comissão que a natureza da infracção e sua dimensão geográfica são de tal ordem que a infracção deve ser qualificada de muito grave, quer o seu impacto no mercado possa ou não ser medido. Em todo o caso, é manifesto que os acordos anticoncorrenciais do cartel foram aplicados e tiveram impacto no mercado, mesmo não podendo este impacto ser medido com precisão.»

143    As recorrentes afirmam que a Comissão sobrestimou a gravidade da infracção e avançam, a este propósito, diversos argumentos que se prendem, essencialmente, com a análise da própria natureza da infracção. Criticam ainda a apreciação, feita pela Comissão, dos efeitos da referida infracção.

–       Quanto à natureza da infracção

144    Importa salientar, a título preliminar, que a fundamentação da Comissão relativa à natureza da infracção se divide em duas partes, uma referente à tomada em conta da própria substância das actividades anticoncorrenciais em causa (considerando 278 da decisão) e a outra relativa a elementos extrínsecos, mas relacionados com a apreciação da natureza da infracção (considerando 279 da decisão).

145    Na primeira parte, a Comissão indicou que a infracção em causa tinha consistido «essencialmente» na fixação directa ou indirecta dos preços de venda e de outras condições de transacção aplicáveis aos clientes, na repartição dos mercados, nomeadamente através da atribuição de clientes, e na condução de acções coordenadas contra concorrentes que não eram membros do cartel.

146    Cabe recordar que as alegações das recorrentes quanto à ausência de um acordo anticoncorrencial sobre a proibição da publicidade, à inexistência de um plano global dos participantes no cartel destinado a modificar duradouramente a estrutura da concorrência no mercado através da aquisição de empresas e à ausência do recurso a um mecanismo extremamente sofisticado para controlar e aplicar os seus acordos, que figuram na parte dos seus articulados consagrados formalmente à contestação da apreciação pela Comissão da gravidade da infracção, não foram acolhidas pelos motivos anteriormente referidos.

147    Além disso, decorre da formulação do considerando 278 da decisão que, no momento da apreciação da gravidade da infracção, a Comissão ponderou de forma diferente as actividades anticoncorrenciais das empresas implicadas no cartel e nem sequer mencionou a proibição da publicidade e o recurso a um mecanismo extremamente sofisticado para controlar e aplicar os seus acordos, tendo em conta o carácter objectivamente menos importante e meramente complementar destas práticas.

148    Nestas circunstâncias e mesmo partindo do princípio de que as contestações das recorrentes relativas à proibição da publicidade e ao mecanismo antes referido pudessem ser fundamentadas, não permitem pôr em causa a apreciação feita pela Comissão a respeito da gravidade da infracção.

149    No âmbito da segunda parte da fundamentação a respeito da apreciação da gravidade da infracção (considerando 279 da decisão), a Comissão indicou o seguinte:

«Procurando ser exaustivo, também se pode referir que todas as grandes operadoras do EEE, que em conjunto controlam mais de 90% do mercado do EEE, participaram nos esquemas constitutivos dos acordos, decisões e práticas concertadas proibidos. Estes esquemas eram dirigidos, ou pelo menos cientemente tolerados, pelas mais altas esferas das empresas em questão. As partes tomaram muitas precauções para evitar que fossem descobertos os acordos, decisões e práticas concertadas proibidos, o que não deixa qualquer dúvida quanto ao facto de estarem plenamente conscientes do carácter ilícito das suas actuações. Os acordos, decisões e práticas concertadas proibidos tinham atingido um elevado grau de institucionalização e eram amplamente respeitados. Os contactos havidos entre as partes, na forma ou não de reuniões, eram frequentes e regulares. Os acordos, decisões e práticas concertadas proibidos eram aplicados exclusivamente em benefício das empresas participantes e em detrimento dos seus clientes e, em última análise, do público em geral.»

150    Em apoio da alegação de uma apreciação errada da gravidade da infracção, as recorrentes sustentam que a Comissão se equivoca quando escreve na nota 4 da decisão que, «[p]ara os efeitos dos acordos sobre os preços», os acordos, decisões e práticas concertadas distinguiam várias grandes categorias, entre os produtos para aplicações eléctricas, e que a tese da Comissão segundo a qual os acordos foram aplicados graças a um sistema organizado de forma vinculativa assenta, «já por esta razão», numa interpretação errada dos factos.

151    Para além da aparente ausência de nexo lógico entre as duas afirmações antes referidas, basta observar que as alegações das recorrentes são totalmente estranhas à apreciação da gravidade da infracção efectuada pela Comissão na decisão e que, consequentemente, são absolutamente irrelevantes no que respeita à crítica a propósito da sobrestimação da dita gravidade.

152    As recorrentes sustentam ainda que nem o carácter secreto dos acordos, decisões e práticas concertadas nem o prejuízo sofrido pelo público em geral podiam ser tomados em consideração como circunstâncias agravantes na decisão (considerando 279), por se tratar de elementos inerentes a qualquer acordo, decisão e prática concertada já tomados em conta pelo legislador no momento da determinação do quadro da coima. De resto, a Comissão não forneceu nenhuma prova em apoio da sua tese segundo a qual os participantes no cartel se esforçaram metodicamente por dissimular as suas actuações ilícitas.

153    Cabe relembrar que, em conformidade com jurisprudência assente, a gravidade de uma infracção é determinada tendo em conta vários elementos, como as circunstâncias específicas do caso, o seu contexto e o carácter dissuasivo das coimas, e relativamente aos quais a Comissão dispõe de uma margem de apreciação (acórdãos do Tribunal de Justiça, Dansk Rørindustri e o./Comissão, referido no n.° 44, supra, n.° 241, e de 10 de Maio de 2007, SGL Carbon/Comissão, C‑328/05 P, Colect., p. I‑3921, n.° 43).

154    Neste contexto, para determinar a gravidade da infracção, a Comissão podia legitimamente ter em consideração o facto de as empresas terem tomado muitas precauções para evitar que os acordos, decisões e práticas concertadas fossem descobertos e o prejuízo sofrido pelo público em geral, cabendo observar que estes dois elementos não constituem, em sentido próprio, «circunstâncias agravantes», como alegaram as recorrentes.

155    Contrariamente às afirmações das recorrentes, a Comissão forneceu uma descrição pormenorizada das precauções tomadas para garantir o segredo das reuniões e dos contactos, nos considerandos 81 a 87 da decisão, descrição esta apoiada por elementos de prova documentais que não foram contraditos pelas recorrentes.

156    De resto, como salientou a Comissão, nem todas as infracções ao direito da concorrência causam, da mesma maneira, um prejuízo à concorrência e aos consumidores. Esta tomada em consideração do prejuízo sofrido pelo público distingue‑se da referente à capacidade económica que um membro nos acordos, decisões e práticas concertadas tem para causar um prejuízo à concorrência e aos consumidores, a qual intervém no quadro de uma fase do cálculo do montante da coima previsto nas orientações e destinado a operar um tratamento diferenciado, designadamente na hipótese de a infracção, como no presente caso, implicar várias empresas.

157    Finalmente, há que salientar que o teor do considerando 279 da decisão revela que os elementos aí mencionados o foram a título subsidiário relativamente aos relatados no considerando 278 da decisão. Nestas circunstâncias e mesmo pressupondo que a contestação, pelas recorrentes, da tomada em consideração do carácter secreto dos acordos, decisões e práticas concertadas e do prejuízo sofrido pelo público pudesse ser julgada procedente, tal não teria como consequência pôr em causa a apreciação da natureza da infracção, feita pela Comissão, como resulta da fundamentação relevante e bastante que consta do considerando 278 da decisão.

–       Quanto aos efeitos da infracção

158    No quadro da sua alegação relativa à sobrestimação da gravidade da infracção, as recorrentes afirmam que a Comissão cometeu um duplo erro na apreciação dos efeitos da infracção.

159    Sustentam, em primeiro lugar, que a Comissão determinou de forma errada a dimensão do mercado em questão, quando entendeu que os acordos, decisões e práticas concertadas incluíam acordos colusórios a respeito dos fabricantes de equipamentos para automóveis e dos produtores de bens de consumo, acordos estes cuja existência nunca reconheceram.

160    Como já antes exposto, esta argumentação revela uma contestação da infracção declarada verificada pela Comissão na decisão, tendo‑se já concluído que, contrariamente às afirmações das recorrentes, as práticas anticoncorrenciais do cartel respeitavam, na verdade, aos fabricantes de equipamentos para automóveis e aos produtores de bens de consumo. Alem disso, ela é absolutamente irrelevante, no tocante ao exame da exactidão da apreciação dos efeitos dos acordos, decisões e práticas concertadas, que, contrariamente às alegações das recorrentes, é independente do volume de negócios realizado pelas empresas com os produtos em questão.

161    As recorrentes alegam, em segundo lugar, que a Comissão cometeu um erro na apreciação da aplicação dos acordos e sustentam, simultaneamente, que a Comissão não fez a menor prova de um impacto concreto dos acordos, decisões e práticas concertadas, contrariamente aos requisitos impostos pelas suas próprias orientações, e não teve em conta de forma bastante o facto de os acordos só parcialmente terem sido aplicados.

162    No considerando 281 da decisão, a Comissão concluiu pela existência de verdadeiros efeitos anticoncorrenciais que resultavam, no caso em apreço, da aplicação dos acordos colusórios, mesmo não sendo possível quantificá‑los com precisão, conclusão que se segue à descrição da própria natureza da infracção e precede a determinação da sua dimensão geográfica. O teor do considerando 288 da decisão, mais especificamente a utilização da expressão «[t]endo em conta todos estes factores», permite concluir que a Comissão tomou realmente em conta o impacto concreto dos acordos, decisões e práticas concertadas no mercado, para qualificar a infracção de «muito grave», embora tenha acrescentado que esta qualificação se justificava independentemente do facto de o impacto poder ser ou não avaliado.

163    Decorre, pois, dos considerandos 244 a 248 e 280 a 286 da decisão que a Comissão deduziu claramente da aplicação dos acordos, decisões e práticas concertadas a realidade do seu impacto concreto no sector em causa.

164    A Comissão indicou, a este propósito, que «[t]odos os membros do cartel aplicaram os aumentos gerais de preços (expressos em percentagem) acordados, difundindo as novas listas de preços […] as sociedades de transportes públicos adjudicaram os contratos à sociedade cuja proposta tinha sido manipulada de modo a ser ligeiramente inferior às das outras partes nos acordos, decisões e práticas concertadas proibidos, os clientes privados não tiveram outro remédio senão abastecerem‑se no fornecedor pré‑designado e a um preço predeterminado, sem que pudesse jogar a concorrência, e os processadores viram‑se na impossibilidade de adquirir os blocos, ou unicamente a preços artificialmente elevados, o que lhes tornou impossível fazerem uma concorrência eficaz no mercado dos produtos acabados». Tendo em conta a duração do período da infracção e o facto de as empresas em questão controlarem conjuntamente mais de 90% do mercado do EEE, não cabia a mínima dúvida, segundo a Comissão, de que os acordos, decisões e práticas concertadas produziram verdadeiros efeitos anticoncorrenciais neste mercado (considerandos 245 e 281 da decisão).

165    Deve recordar‑se que, para apreciar o impacto concreto de uma infracção no mercado, cabe à Comissão tomar como referência a concorrência que normalmente haveria se não se tivesse verificado a infracção (v., neste sentido, acórdãos Suiker Unie e o./Comissão, referido no n.° 116, supra, n.os 619 e 620; acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 14 de Maio de 1998, Mayr‑Melnhof/Comissão, T‑347/94, Colect., p. II‑1751, n.° 235; de 11 de Março de 1999, Thyssen Stahl/Comissão, T‑141/94, Colect., p. II‑347, n.° 645 e acórdão Archer Daniels Midland e Archer Daniels Midland Ingredients/Comissão, referido no n.° 84, supra, n.° 150).

166    No que respeita a um cartel sobre preços, é legítimo que a Comissão deduza que a infracção produziu efeitos pelo facto de os membros do cartel terem adoptado medidas para aplicar os preços acordados, por exemplo, ao anunciá‑los aos clientes, ao darem instruções aos seus funcionários para os utilizarem como base de negociação e ao fiscalizarem a sua aplicação pelos seus concorrentes e os seus próprios serviços de venda. Com efeito, para se concluir pela existência de impacto no mercado, basta que os preços acordados tenham servido de base à fixação dos preços de transacção individuais, limitando assim a margem de negociação dos clientes (acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 17 de Dezembro de 1991, Hercules Chemicals/Comissão, T‑7/89, Colect., p. II‑1711, n.os 340 e 341, e PVC II, referido no n.° 56, supra, n.os 743 a 745, e de 14 de Dezembro de 2006, Raiffeisen Zentralbank Österreich e o./Comissão, T‑259/02 a T‑264/02 e T‑271/02, Colect., p. II‑5169, n.° 285).

167    Em contrapartida, não se pode exigir da Comissão, quando estiver estabelecida a aplicação de um acordo, decisão e prática concertada, a demonstração sistemática de que os acordos permitiram efectivamente às empresas em causa atingir um nível de preços de transacção superior ao que se teria verificado na ausência do acordo, decisão e prática concertada. A este respeito, não pode ser acolhida a tese segundo a qual só pode ser tomado em consideração o facto de que o nível dos preços de transacção teria sido diferente na ausência de colusão para efeitos da determinação da gravidade da infracção (acórdão do Tribunal de Justiça de 16 de Novembro de 2000, Cascades/Comissão, C‑279/98 P, Colect., p. I‑9693, n.os 53 e 62). De resto, não seria proporcionado exigir tal demonstração, que absorveria recursos consideráveis, pois necessitaria do recurso a cálculos hipotéticos, baseados em modelos económicos cuja exactidão só dificilmente poderia ser verificada pelo tribunal e cuja infalibilidade não está de todo provada (conclusões do advogado‑geral J. Mischo no processo em que foi proferido o acórdão do Tribunal de Justiça de 16 de Novembro de 2000, Mo och Domsjö/Comissão, C‑283/98 P, Colect., pp. I‑9855, I‑9858, n.° 109).

168    Com efeito, para apreciar a gravidade da infracção, é determinante saber que os membros do cartel fizeram tudo o que estava ao seu alcance para a concretização das suas intenções. O que sucedeu em seguida, ao nível dos preços de mercado efectivamente praticados, era susceptível de ser influenciado por outros factores, fora do controlo dos membros do cartel. Os membros do cartel não podem, portanto, para tentar beneficiar de uma redução da coima, invocar factores externos que contrariaram os seus esforços (conclusões do advogado‑geral J. Mischo no processo em que foi proferido o acórdão Mo och Domsjö/Comissão, referido no n.° 167, supra, n.os 102 a 107).

169    Por conseguinte, a Comissão podia legitimamente fundar‑se na aplicação dos acordos, decisões e práticas concertadas, para concluir pela existência de um impacto no mercado, após ter referido, de forma pertinente, que os acordos, decisões e práticas concertadas tinham durado mais de onze anos e que os membros nos ditos acordos, decisões e práticas concertadas controlavam mais de 90% do mercado do EEE.

170    Quanto à exactidão das constatações a partir das quais a Comissão retirou esta conclusão no caso em apreço, há que salientar que as recorrentes não provaram nem sequer afirmaram que os acordos, decisões e práticas concertadas não foram aplicados. Decorre dos articulados das recorrentes que estas se limitam a invocar o facto de os acordos, decisões e práticas concertadas só terem sido aplicados parcialmente, afirmação que, a ser exacta, não é de natureza a demonstrar que a Comissão avaliou de forma errada a gravidade da infracção quando teve em conta o facto de as práticas ilícitas em causa terem produzido um verdadeiro efeito anticoncorrencial no mercado do EEE dos produtos em questão (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 25 de Outubro de 2005, Groupe Danone/Comissão, T‑38/02, Colect., p. II‑4407, n.° 148).

171    Por último, cabe salientar que, mesmo supondo que a Comissão não tivesse feito prova bastante do impacto concreto do acordo, decisão e prática concertada, a qualificação da presente infracção como «muito grave» não deixaria de ser adequada. Com efeito, os três aspectos da apreciação da gravidade da infracção não têm o mesmo peso no quadro do exame global. A natureza da infracção assume um papel primordial, designadamente, para caracterizar as infracções «muito graves». A este respeito, resulta da descrição das infracções muito graves, feita nas orientações, que os acordos ou práticas concertadas que visem, nomeadamente, como neste caso, a fixação dos preços podem ser objecto, com fundamento apenas na sua natureza específica, da qualificação de «muito grave», sem que seja necessário caracterizar tais comportamentos através de um impacto ou de uma dimensão geográfica particular. Esta conclusão é corroborada pelo facto de que, embora a descrição das infracções graves mencione expressamente o impacto no mercado e os efeitos em amplas zonas do mercado comum, a descrição das infracções muito graves, em contrapartida, não menciona nenhuma exigência de impacto concreto no mercado, nem de produção de efeitos numa zona geográfica particular (acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 27 de Julho de 2005, Brasserie nationale e o./Comissão, T‑49/02 a T‑51/02, Colect., p. II‑3033, n.° 178, e Groupe Danone/Comissão, referido no n.° 170, supra, n.° 150).

172    Resulta do conjunto das precedentes considerações que a acusação relativa à sobrestimação da gravidade da infracção, tendo em conta a sua natureza e os seus efeitos, deve ser rejeitada.

 Quanto à repartição das empresas por categorias

173    As recorrentes alegam que a Comissão, em contradição com as suas orientações, determinou o montante de partida das coimas independentemente do volume de negócios global das empresas, o que conduziu a uma violação do princípio da igualdade de tratamento. Assim, a Schunk e a SGL foram classificadas na mesma categoria, quando a dimensão da SGL representa quase o dobro da dimensão da Schunk. Na decisão, a Comissão recorreu a «montantes fixos predeterminados» e não teve em conta certos factores, como a estrutura das recorrentes à luz do direito das sociedades e a sua maior dificuldade de acesso aos mercados financeiros, que teriam permitido uma apreciação da capacidade individual de as empresas lesarem a concorrência.

174    Cabe salientar, em primeiro lugar, que, contrariamente ao que sustentam as recorrentes, a Comissão não é obrigada, quando determina o montante das coimas em função da gravidade e da duração da infracção em questão, a efectuar o cálculo da coima a partir de montantes baseados no volume de negócios das empresas envolvidas e, mais especificamente, no volume de negócios global (acórdão Dansk Rørindustri e o./Comissão, referido no n.° 44, supra, n.° 255).

175    Sem prejuízo do respeito do limite superior previsto no artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento n.° 17 e que se reporta ao volume de negócios global (acórdão Musique diffusion française e o./Comissão, referido no n.° 43, supra, n.° 119), é permitido à Comissão ter em conta o volume de negócios da empresa em causa, a fim de apreciar a gravidade da infracção quando da determinação do montante da coima, mas não deve ser atribuída uma importância desproporcionada a esse volume em relação aos outros elementos de apreciação (acórdão Dansk Rørindustri e o./Comissão, referido no n.° 44, supra, n.° 257).

176    No caso em apreço, a Comissão aplicou o método de cálculo definido nas orientações e que prevê a tomada em consideração de um grande número de elementos, no momento da apreciação da gravidade da infracção, para a fixação do montante da coima, entre os quais figuram, designadamente, a própria natureza da infracção, o seu impacto concreto, a dimensão geográfica do mercado afectado e o necessário alcance dissuasivo da coima. Embora as orientações não prevejam que o montante das coimas seja calculado em função do volume de negócios global ou do volume de negócios pertinente, elas não se opõem a que esses volumes de negócios sejam tomados em consideração na determinação do montante da coima, a fim de respeitar os princípios gerais do direito comunitário e quando as circunstâncias o exijam (acórdão Dansk Rørindustri e o./Comissão, referido no n.° 44, supra, n.os 258 e 260).

177    Atenta a grande disparidade de dimensão das empresas implicadas e a fim de ter em conta o peso específico de cada uma delas e, portanto, a verdadeira incidência do seu comportamento infractor na concorrência, a Comissão procedeu, na decisão e em conformidade com o ponto 1 A, quarto e sexto parágrafos, das orientações, a um tratamento diferenciado das empresas que participaram na infracção. Para este efeito, repartiu as empresas em questão em três categorias, baseando‑se no volume de negócios realizado por cada empresa com os produtos em causa no presente processo, à escala do EEE, nele incluindo o valor do consumo cativo de cada empresa. Donde resulta uma percentagem de quotas de mercado que representa o peso relativo de cada empresa na infracção e a sua capacidade económica efectiva para causar um prejuízo importante à concorrência (considerandos 289 a 291 da decisão).

178    A comparação assentou nos dados relativos ao volume de negócios (expresso em milhões de euros) imputável aos produtos em questão, referentes ao último ano da infracção, a saber, 1998, como resultavam do quadro 1 que figura no considerando 37 da decisão e intitulado «Estimativa do volume de negócios (incluindo o valor correspondente ao uso cativo) e das quotas de mercado no EEE, em 1998, para o grupo de produtos objecto do procedimento»:

Fornecedores

Volume de negócios (incluindo o valor do uso cativo)

Quota de mercado no EEE

(em %)

Conradty

9

3

Hoffmann

17

6

[LCL]

84

29

Morgan

68

23

Schunk

52

18

SGL

41

14

Diversos

20

7

Total

291

100


179    Consequentemente, a LCL e a Morgan, consideradas as duas maiores operadoras com quotas de mercado superiores a 20%, foram classificadas na primeira categoria. A Schunk e a SGL, que são operadoras de média importância com quotas de mercado compreendidas entre 10% e 20%, foram colocadas na segunda categoria. A Hoffmann e a Conradty, consideradas pequenas operadoras em razão de quotas de mercado inferiores a 10%, foram agrupadas na terceira categoria (considerandos 37 e 297 da decisão).

180    Com base nas precedentes considerações, a Comissão calculou um montante de partida, determinado em função da gravidade da infracção, de 35 milhões de euros, para a LCL e a Morgan, de 21 milhões de euros, para a Schunk e a SGL, e de 6 milhões de euros, para a Hoffmann e a Conradty (considerando 298 da decisão).

181    Importa salientar, em segundo lugar, que o cartel abrangia todo o mercado comum e, após a sua criação, o EEE na sua integralidade, e que o volume de negócios dos produtos em causa constitui uma base adequada para avaliar, como fez a Comissão na decisão, as lesões à concorrência no mercado do produto em questão no seio do EEE e a importância relativa dos participantes nos acordos, decisões e práticas concertadas no mercado afectado. Resulta de jurisprudência assente (v., designadamente, acórdão Musique diffusion française e o./Comissão, referido no n.° 43, supra, n.° 121, e acórdão Mayr‑Melnhof/Comissão, referido no n.° 165, supra, n.° 369), que a parte do volume de negócios proveniente das mercadorias objecto da infracção é de natureza a proporcionar uma correcta indicação da amplitude de uma infracção no mercado em causa. Mais especificamente, como salientou o Tribunal, o volume de negócios realizado com os produtos que constituíram o objecto de uma prática restritiva constitui um critério objectivo que dá uma justa medida do carácter nocivo dessa prática para o funcionamento normal da concorrência (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 11 de Março de 1999, British Steel/Comissão, T‑151/94, Colect., p. II‑629, n.° 643).

182    Cabe salientar, em terceiro lugar, que o método que consiste em repartir os membros de um cartel por categorias, para efeitos da aplicação de um tratamento diferenciado na fase da fixação dos montantes de partida das coimas, cujo princípio foi aprovado pela jurisprudência do Tribunal de Primeira Instância, apesar de se traduzir em ignorar as diferenças de dimensão entre empresas de uma mesma categoria (acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 19 de Março de 2003, CMA CGM e o./Comissão, T‑213/00, Colect., p. II‑913, n.° 385, e Tokai I, referido no n.° 84, supra, n.° 217), conduz à aplicação de montantes fixos predeterminados ao montante de partida fixado às empresas pertencentes à mesma categoria.

183    Não deixa de ser verdade que a repartição por categorias, à qual a Comissão procedeu na decisão, deve respeitar o princípio da igualdade de tratamento, segundo o qual é proibido tratar situações comparáveis de modo diferente e situações diferentes de maneira igual, salvo se esse tratamento for objectivamente justificado. Por outro lado, segundo a jurisprudência, o montante das coimas deve, pelo menos, ser proporcionado relativamente aos elementos tidos em conta na apreciação da gravidade da infracção (v. acórdão Tokai I, referido no n.° 84, supra, n.° 219 e a jurisprudência aí referida).

184    Para verificar se uma repartição dos membros de um cartel por categorias é conforme aos princípios da igualdade de tratamento e da proporcionalidade, o Tribunal, no âmbito da sua fiscalização da legalidade do exercício do poder de apreciação de que a Comissão goza na matéria, deve, porém, limitar‑se a controlar que esta repartição é coerente e objectivamente justificada (acórdão CMA CGM e o./Comissão, referido no n.° 182, supra, n.os 406 e 416, e acórdão Tokai I, referido no n.° 84, supra, n.os 220 e 222).

185    Há que observar, em quarto lugar, que as recorrentes se limitam a criticar a regularidade da composição da segunda categoria, alegando tratamento discriminatório relativamente à SGL. As recorrentes foram classificadas nesta categoria, à semelhança da SGL, com, respectivamente, quotas de mercados de 18% e 14%, que representam volumes de negócios, no mercado em questão, de 52 e 41 milhões de euros, o que as situa claramente no escalão compreendido entre 10% e 20% das quotas de mercado.

186    Há que salientar que a diferença de dimensão entre a Schunk e a SGL (4 pontos percentuais), que pertencem à mesma categoria, é menos importante do que a existente entre, por um lado, a Schunk e a Morgan, a operadora menos importante da primeira categoria, e, por outro, a Schunk e a Hoffmann, a mais importante operadora da terceira categoria. Assim, a limitada diferença que separa a Schunk da SGL, tendo em conta a quota de mercado que não é particularmente elevada da SGL, permitiu à Comissão, de modo absolutamente coerente e objectivo e, portanto, sem violar os princípios da igualdade de tratamento e da proporcionalidade, tratar a Schunk, a par da SGL, como um operador de média importância e, consequentemente, fixar o mesmo montante de partida de 21 milhões de euros, inferior ao calculado para a LCL e a Morgan, que detinham uma posição importante no mercado em causa (29% e 23%), e superior ao aplicado à Hoffmann e à Conradty, que ocupavam uma posição muito marginal no referido mercado (6% e 3%).

187    Conclui‑se, pois, que as recorrentes não podem validamente invocar um tratamento discriminatório ou desproporcionado, visto que o ponto de partida da coima que foi fixado se justifica à luz do critério adoptado pela Comissão para a apreciação da importância de cada uma das empresas no mercado relevante (v., neste sentido, acórdão LR AF 1998/Comissão, referido no n.° 43, supra, n.° 304), sendo, ainda, de observar que o montante de 21 milhões de euros fixado corresponde quase ao montante mínimo previsto nas orientações para as infracções «muito graves».

188    Nestas circunstâncias, são irrelevantes as alegações que versam sobre o facto de a SKT, sociedade não cotada na bolsa e detentora, a nível mundial, de uma quota de mercado claramente inferior a 10%, dispor de um poder económico bem menos importante do que o das empresas cotadas na bolsa, como a Morgan, a LCL ou a SGL, sociedades‑mãe de grupos mundiais que gozam de mais fácil acesso aos mercados financeiros.

189    Aliás, mesmo partindo do princípio de que foi demonstrada a existência de um nexo obrigatório entre a natureza específica de uma empresa e um acesso mais fácil aos mercados financeiros, este elemento não seria relevante, no caso em apreço, para determinar in concreto a amplitude da infracção cometida por cada uma das empresas implicadas nos acordos, decisões e práticas concertadas e a sua verdadeira importância no mercado afectado.

 Quanto ao efeito dissuasivo

190    As recorrentes sustentam, em primeiro lugar, que a Comissão apreciou a necessidade da dissuasão das empresas em questão de um modo indiferenciado e uniforme, independentemente dos seus volumes de negócios, contrariamente aos requisitos da jurisprudência e das orientações.

191    Há que lembrar que as sanções previstas no artigo 15.° do Regulamento n.° 17 têm por objectivo reprimir os comportamentos ilícitos e prevenir a sua reiteração (acórdão do Tribunal de Justiça de 15 de Julho de 1970, ACF Chemiefarma/Comissão, 41/69, Colect. 1969‑1970, p. 447, n.° 173; acórdão PVC II, referido no n.° 56, supra, n.° 1166).

192    Assim, constituindo a dissuasão uma finalidade da coima, a exigência de assegurar a dissuasão constitui uma exigência geral que deve nortear a Comissão quando do cálculo da coima e não requer necessariamente que esse cálculo se caracterize por uma etapa específica destinada à avaliação global de todas as circunstâncias pertinentes para efeitos da realização desta finalidade (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 15 de Março de 2006, BASF/Comissão, T‑15/02, Colect., p. II‑497, n.° 226).

193    Para efeitos da tomada em consideração do objectivo de dissuasão, a Comissão não definiu nas orientações metodologia ou critérios individualizados cuja exposição específica pode assumir força obrigatória. O ponto 1 A, quarto parágrafo, das orientações, no contexto das indicações a respeito da avaliação da gravidade de uma infracção, menciona unicamente a necessidade de determinar o montante da coima a um nível que lhe assegure carácter suficientemente dissuasivo.

194    No caso em apreço, a Comissão salientou expressamente a necessidade de fixar as coimas a um nível dissuasivo no quadro da exposição da abordagem geral seguida para a fixação das coimas, que aplicou às participantes nos acordos, decisões e práticas concertadas um tratamento diferenciado em função da sua quota de mercado determinada a partir dos relevantes volumes de negócios e que fixou o montante de partida da coima da Schunk em 21 milhões de euros (considerandos 271 e 289 da decisão).

195    Resulta claramente da decisão que, para a fixação do montante de partida da coima em função da gravidade da infracção, a Comissão, por um lado, qualificou a infracção enquanto tal, tendo em conta elementos objectivos, a saber, a própria natureza da infracção, o seu impacto no mercado e a extensão geográfica deste mercado e, por outro, tomou em conta elementos subjectivos, a saber, o peso específico de cada uma das empresas implicadas nos acordos, decisões e práticas concertadas e, portanto, a verdadeira incidência do seu comportamento ilícito na concorrência. Foi no âmbito desta segunda parte da sua análise que, designadamente, prosseguiu o objectivo de assegurar um nível dissuasivo à coima.

196    Ora, cabe recordar que, no quadro desta análise, a Comissão repartiu as empresas em causa por três categorias, com base no volume de negócios realizado por cada empresa com os produtos em causa no presente processo, à escala do EEE, incluindo neles o valor do consumo cativo de cada empresa. Donde resulta uma percentagem de quota de mercado que representa o peso relativo de cada empresa na infracção e a sua efectiva capacidade económica para causar um prejuízo importante à concorrência (considerandos 289 a 291 da decisão).

197    Assim, verifica‑se que, contrariamente às alegações das recorrentes, a Comissão não apreciou a necessidade da dissuasão das empresas em causa de um modo indiferenciado e uniforme, mas, pelo contrário, teve em conta a sua importância no mercado afectado a partir dos respectivos volumes de negócios relevantes.

198    As recorrentes alegam, em segundo lugar, que, na decisão, a Comissão exigiu às empresas em causa que pusessem termo à infracção, quando estas já tinham posto termo à infracção em Dezembro de 1999, mais de quatro anos antes, o que demonstra que a Comissão baseou a sua apreciação da dissuasão necessária numa circunstância errada.

199    Esta alegação deve ser rejeitada, uma vez que assenta numa premissa errada. Efectivamente, decorre da simples leitura do considerando 268 e do artigo 3.° da decisão que a injunção feita às empresas destinatárias da decisão, de porem imediatamente termo à infracção verificada, na medida em que não o tivessem ainda feito, não apresenta o mínimo nexo com a apreciação da Comissão a respeito da dissuasão.

200    As recorrentes sustentam, em terceiro lugar, serem vítimas de discriminação relativamente à SGL, pois a Comissão apreciou a dissuasão necessária sem ter em conta o facto de a SGL, enquanto empresa cotada na bolsa, dispor de mais fácil acesso aos mercados financeiros.

201    Importa lembrar que, como foi já demonstrado nos n.os 184 a 187, supra, a classificação da Schunk e da SGL na mesma categoria, com base nos seus volumes de negócios provenientes da venda dos produtos em causa, não revela discriminação em detrimento da Schunk.

202    Supondo que se devesse considerar que uma empresa cotada na bolsa pode mobilizar mais facilmente os fundos necessários ao pagamento da sua coima, tal situação poderia, eventualmente, justificar a aplicação de uma coima proporcionalmente mais elevada, tendo em vista assegurar‑lhe um efeito dissuasivo suficiente, do que a aplicada a uma empresa que cometeu uma infracção idêntica, mas não dispõe de tais recursos.

203    Nestas circunstâncias, a eventual violação do princípio da não discriminação pela Comissão poderia unicamente conduzir a um aumento do montante da coima aplicada à SGL e não a uma redução da coima aplicada à Schunk, como esta última pede nos seus articulados. A este propósito, deve recordar‑se que o respeito do princípio da igualdade de tratamento deve conciliar‑se com o respeito do princípio da legalidade, segundo o qual ninguém pode invocar, em seu benefício, uma ilegalidade cometida a favor de terceiro (acórdão do Tribunal de Justiça de 4 de Julho de 1985, Williams/Tribunal de Contas, 134/84, Recueil, p. 2225, n.° 14; acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 14 de Maio de 1998, SCA Holding/Comissão, T‑327/94, Colect., p. II‑1373, n.° 160, e LR AF 1998/Comissão, referido no n.° 43, supra, n.° 367).

204    As recorrentes afirmam, em quarto lugar, que o carácter desproporcionado da coima aplicada pela Comissão ressalta à luz das sanções aplicadas, no quadro do «mesmo processo», pelas autoridades antitrust dos Estados Unidos, cujo mercado será, em dimensão, mais ou menos idêntico ao da Europa.

205    A este respeito, há que notar que o exercício dos poderes pelas autoridades dos Estados terceiros encarregadas da protecção da livre concorrência, no quadro da respectiva competência territorial, obedece a exigências que são próprias aos referidos Estados. Com efeito, os elementos que subjazem aos ordenamentos jurídicos de outros Estados, no domínio da concorrência, não só comportam finalidades e objectivos específicos mas conduzem ainda à aprovação de normas materiais específicas e às mais variadas consequências jurídicas no domínio administrativo, penal ou cível, quando as autoridades dos referidos Estados tenham verificado a existência de infracções às regras aplicáveis em matéria de concorrência (acórdão do Tribunal de Justiça de 29 de Junho de 2006, SGL Carbon/Comissão, C‑308/04 P, Colect., p. I‑5977, n.° 29).

206    Em contrapartida, totalmente diferente é a situação jurídica na qual uma empresa é exclusivamente visada, em matéria de concorrência, pela aplicação do direito comunitário e do direito de um ou de vários Estados‑Membros, isto é, na qual um cartel se situa exclusivamente no quadro do âmbito de aplicação territorial do ordenamento jurídico da Comunidade Europeia (acórdão de 29 de Junho de 2006, SGL Carbon/Comissão, referido no n.° 205, supra, n.° 30).

207    Donde decorre que, quando a Comissão pune o comportamento ilícito de uma empresa, mesmo que este tenha origem num cartel de carácter internacional, visa salvaguardar a livre concorrência no interior do mercado comum, o que constitui, por força do artigo 3.°, n.° 1, alínea g), CE, um objectivo fundamental da Comunidade. Com efeito, em razão da especificidade do bem jurídico protegido a nível comunitário, as apreciações feitas pela Comissão, ao abrigo das suas competências na matéria, podem divergir consideravelmente das efectuadas pelas autoridades de Estados terceiros (acórdão de 29 de Junho de 2006, SGL Carbon/Comissão, referido no n.° 205, supra, n.° 31).

208    No tocante à alegada inobservância dos princípios da proporcionalidade e/ou da equidade, invocada pelas recorrentes, há que observar que qualquer consideração assente na existência de coimas aplicadas pelas autoridades de um Estado terceiro só poderá entrar em linha de conta no quadro do poder de apreciação de que goza a Comissão em matéria de fixação de coimas pelas infracções ao direito comunitário da concorrência. Por conseguinte, embora não se possa excluir que a Comissão tome em conta as coimas anteriormente aplicadas pelas autoridades de Estados terceiros, ela não está, contudo, obrigada a isso (acórdão de 29 de Junho de 2006, SGL Carbon/Comissão, referido no n.° 205, supra, n.° 36).

209    Com efeito, o objectivo de dissuasão que a Comissão tem o direito de prosseguir, quando da fixação do montante de uma coima, tem em vista garantir que as empresas, na condução das suas actividades no seio do mercado comum, respeitem as regras da concorrência fixadas no Tratado CE (v., neste sentido, acórdão ACF Chemiefarma/Comissão, referido no n.° 191, supra, n.os 173 a 176). Por conseguinte, ao apreciar o carácter dissuasivo de uma coima a aplicar por uma violação das referidas regras, a Comissão não tem o dever de tomar em conta as eventuais sanções aplicadas a uma empresa em razão de violações das regras da concorrência de Estados terceiros (acórdão de 29 de Junho de 2006, SGL Carbon/Comissão, referido no n.° 205, supra, n.° 37).

210    No caso em apreço, basta lembrar que os acordos, decisões e práticas concertadas que foram objecto da decisão se situam exclusivamente no seio do âmbito de aplicação territorial do ordenamento jurídico da Comunidade Europeia e que, no quadro da sua apreciação do carácter dissuasivo das coimas, a Comissão não estava, pois, de maneira nenhuma, obrigada a tomar em consideração as sanções aplicadas pelas autoridades americanas a empresas que infringiram as regras de concorrência nacionais. Tendo em conta as especificidades do controlo e da repressão das infracções ao direito da concorrência nos Estados Unidos, que se prendem com a importância das acções de indemnização e dos procedimentos penais, as recorrentes não podem invocar utilmente o montante das coimas impostas no quadro do processo instaurado nesse Estado terceiro, para tentar demonstrar o carácter desproporcionado da coima que lhes foi aplicada na decisão.

 Quanto à cooperação da Schunk

211    Há que recordar que a Comissão beneficia de um amplo poder de apreciação no que diz respeito ao método de cálculo das coimas e pode, a esse respeito, ter em conta múltiplos elementos, entre os quais figura a cooperação das empresas em causa durante a investigação conduzida pelos serviços desta instituição. Nesse âmbito, cabe à Comissão efectuar apreciações factuais complexas, como as que incidem sobre a cooperação respectiva das referidas empresas (acórdão de 10 de Maio de 2007, SGL Carbon/Comissão, referido no n.° 153, supra, n.° 81).

212    A Comissão goza, a este propósito, de uma ampla margem de apreciação para avaliar a qualidade e a utilidade da cooperação prestada por uma empresa, designadamente em comparação com as contribuições de outras empresas (acórdão de 10 de Maio de 2007, SGL Carbon/Comissão, referido no n.° 153, supra, n.° 88).

213    Na comunicação sobre a cooperação, a Comissão esclareceu as condições em que as empresas que com ela cooperem durante um inquérito sobre acordos, decisões e práticas concertadas poderão ficar isentas de coima ou beneficiar de uma redução do montante da coima que de outra forma lhes teria sido aplicada (v. secção A, n.° 3, da comunicação sobre a cooperação).

214    A secção D da comunicação sobre a cooperação prevê:

«1. A partir do momento em que uma empresa se propõe cooperar sem se encontrarem preenchidas todas as condições expostas [nas secções] B ou C, a mesma beneficiará de uma redução de 10% a 50% do montante da coima que lhe teria sido aplicada na falta da sua cooperação.

2. Esta situação pode verificar‑se, nomeadamente, se:

–        uma empresa, antes do envio de uma comunicação de acusações, fornecer à Comissão informações, documentação ou outras provas que contribuam para confirmar a existência da infracção,

–        uma empresa, após ter recebido a comunicação de acusações, informar a Comissão de que não contesta a materialidade dos factos em que a Comissão baseia as suas acusações.»

215    No presente caso, a Schunk beneficiou de uma redução de 30% do montante da coima que lhe foi aplicada, ao abrigo da secção D da comunicação sobre a cooperação.

216    Para justificar a sua apreciação, a Comissão referiu o seguinte no considerando 328 da decisão:

«À semelhança da [LCL], a Schunk pediu para beneficiar das medidas de clemência após ter recebido o ofício que a Comissão lhe enviou nos termos do artigo 11.° [do Regulamento n.° 17], mas apresentou os seus elementos de prova um mês mais tarde que a [LCL]. Na sua declaração, a Schunk admitiu a existência dos acordos, decisões e práticas concertadas e a sua participação nestes, mas não apresentou relatórios datados da época sobre as reuniões do cartel. O mais útil dos elementos de prova apresentados consiste numa lista das reuniões do cartel cuja realização a Schunk admite. Esta lista compreende algumas reuniões das quais a Comissão não tinha conhecimento. A Schunk também apresentou um lote de documentos de viagem a respeito de várias reuniões. A maioria respeitava a reuniões das quais a Comissão já tinha conhecimento e para as quais tinha solicitado que todos os documentos disponíveis lhe fossem comunicados no seu ofício enviado nos termos do artigo 11.° No decurso do inquérito, a Schunk também respondeu a várias questões que lhe foram colocadas pela Comissão no quadro da sua cooperação no inquérito, a fim de completar as informações que já tinha fornecido espontaneamente. Todavia, a Comissão observa que, contrariamente à [LCL], a Schunk não tomou a iniciativa de prestar à Comissão informações complementares sobre os acordos, decisões e práticas concertadas. Na globalidade, a Comissão considera que as provas fornecidas espontaneamente pela Schunk preenchem o critério que consiste em contribuir para a confirmação da existência da infracção.»

217    A Comissão referiu ainda que, após ter recebido a comunicação de acusações, a Schunk a informou que não contestava a materialidade dos factos em que assentavam as suas acusações (considerando 329 da decisão).

218    Importa salientar que não se contesta que a Schunk preenchia, no momento da adopção da decisão, as condições previstas na secção D, n.° 2, primeiro e segundo travessões, da comunicação sobre a cooperação. O litígio versa unicamente sobre a importância da redução concedida, que foi de 30%, contra 40% a favor da LCL, cabendo observar que as duas empresas beneficiaram da mesma redução de 10% em razão da não contestação da materialidade dos factos. A Schunk sustenta, essencialmente, que a fundamentação que consta da decisão a propósito desta diferença está errada e que se está perante um tratamento discriminatório.

219    Quanto à afirmação da Schunk, de que reagiu mais depressa do que a LCL, cabe referir que, após ter recebido um pedido de informações, constante de um ofício da Comissão de 2 de Agosto de 2002 redigido em inglês, a Schunk solicitou, em 8 de Agosto de 2002, uma versão do ofício em língua alemã, que obteve em 4 de Outubro de 2002. Esta situação explica, segundo a Schunk, por que é que só pôde fornecer uma resposta ao pedido de informações em 25 de Outubro de 2002, ou seja, três semanas apenas após a recepção do referido pedido traduzido em alemão, ao passo que a LCL respondeu mais de sete semanas após o pedido de informações que lhe fora dirigido.

220    É, porém, forçoso observar que a SKT escreveu à Comissão logo em 2 de Setembro de 2002, para a informar da sua intenção de com ela colaborar no quadro do procedimento administrativo e de verificar se, para além das respostas ao pedido de informações, lhe podia comunicar outros esclarecimentos úteis, tendo em conta os elementos de prova já na posse da instituição.

221    Em 30 de Setembro de 2002, a SKT, por intermédio do seu advogado, apresentou comentários pormenorizados e críticos a respeito do teor do pedido de informações, procedendo, nomeadamente, à sua análise exegética a fim de demonstrar que as questões colocadas exorbitavam do quadro definido pela jurisprudência e que as respostas a essas questões e a apresentação dos correspondentes elementos de prova excediam, do ponto de vista jurídico, a cooperação que se exigia da empresa. A SKT indicava, contudo, que iria responder voluntariamente a essas questões e que as informações que iam além da cooperação exigida figurariam em negrito na sua resposta.

222    Estes dois documentos da SKT provam uma perfeita compreensão do pedido de informações antes da sua tradução em língua alemã e, nestas circunstâncias, as recorrentes não podem seriamente defender que só puderam prestar a sua contribuição a partir da recepção da referida tradução.

223    A esta conclusão, acresce o facto de a LCL também ter recebido o pedido de informações redigido em inglês, e não em francês, e ter fornecido as informações sobre os acordos e as práticas concertadas em causa, logo em 22 de Agosto de 2002 e, seguidamente, em 24 e 30 de Setembro de 2002. Nestas circunstâncias, foi correctamente que a Comissão considerou que a SKT forneceu os seus elementos de prova, no mínimo, um mês mais tarde do que a LCL.

224    Mesmo supondo que esta última conclusão pudesse ser considerada errada, por só dever ser tomada em conta a recepção da tradução do pedido de informações em língua alemã, os outros motivos que figuram no considerando 328 da decisão justificam a diferença de tratamento contestada.

225    Como decorre do considerando 328 da decisão, a Comissão fundou essencialmente a sua apreciação do montante da redução concedida no valor da contribuição prestada pela SKT. A este respeito, há que lembrar que, segundo a jurisprudência, a redução das coimas em caso de cooperação das empresas que participem em infracções ao direito comunitário da concorrência tem por base a consideração de que tal cooperação facilita a tarefa da Comissão destinada a verificar a existência de uma infracção e, eventualmente, a pôr‑lhe termo (acórdão Dansk Rørindustri e o./Comissão, referido no n.° 44, supra, n.° 399; acórdãos do Tribunal de Primeira Instância, BPB de Eendracht/Comissão, referido no n.° 42, supra, n.° 325; de 14 de Maio de 1998, Finnboard/Comissão, T‑338/94, Colect., p. II‑1617, n.° 363; e Mayr‑Melnhof/Comissão, referido no n.° 165, supra, n.° 330).

226    A Comissão, por um lado, considerou essencialmente que os elementos de prova fornecidos pela SKT tinham apenas um reduzido valor acrescentado, tendo em conta os elementos de prova já na sua posse.

227    Observou, sem ser contradita pela Schunk, que recebeu da SKT uma lista das reuniões do cartel, da maioria das quais já tinha conhecimento, correspondendo algumas a reuniões oficiais da associação profissional europeia do sector, concretamente, da ECGA.

228    Contrariamente às afirmações da Schunk, a Comissão não indicou, no considerando 328 da decisão, que a SKT não comunicou documentos que se reportassem à época dos factos incriminados. Aliás, está assente que a SKT transmitiu, com a sua resposta ao pedido de informações, a correspondência dirigida aos representantes da ECGA e um grande número de documentos que provavam as deslocações e as estadas em hotéis, relacionadas com as reuniões do cartel mencionadas na lista. Porém, estes documentos não constituem «relatórios» ou actas sobre o teor das reuniões, que sejam contemporâneos destas.

229    Como correctamente salienta a Comissão nos seus articulados, a lista das reuniões e os correspondentes documentos sobre as deslocações só tinham sentido quando relacionados com as informações fornecidas por outras empresas sobre o teor das referidas reuniões. Por outro lado, a Comissão indicou, sem ser contradita pela Schunk, que, embora a SKT tenha respondido às diversas questões que lhe foram colocadas no âmbito da sua cooperação no inquérito, a fim de completar as informações já prestadas espontaneamente, a dita empresa, contrariamente à LCL, não tomou a iniciativa de fornecer informações complementares sobre os acordos, decisões e práticas concertadas.

230    A Schunk sustenta ainda que, no considerando 328 da decisão, a Comissão salientou o facto de a sua cooperação ter ocorrido numa época posterior à recepção do pedido de informações, e isto em contradição com a jurisprudência segundo a qual essa circunstância não constitui razão para se considerar que a cooperação tem menos valor.

231    O primeiro período do considerando 328 da decisão tem a seguinte redacção:

«À semelhança da [LCL], a Schunk pediu para beneficiar das medidas de clemência após ter recebido o ofício que a Comissão lhe enviou nos termos do artigo 11.° [do Regulamento n.° 17], mas apresentou os seus elementos de prova um mês mais tarde que a [LCL].»

232    Tendo em conta esta formulação, a interpretação feita pela Comissão na sua contestação, segundo a qual esta frase significa que só teve em conta as informações que ultrapassem o dever de fornecer informações ao abrigo do artigo 11.° do Regulamento n.° 17, é muito extensiva e não pode ser acolhida. Resulta do teor do considerando anteriormente referido que a Comissão tomou em conta o momento em que foi reivindicado o benefício da comunicação sobre a cooperação, para apreciar a importância da redução que podia ser concedida a título da contribuição dada pela SKT.

233    A Schunk remete para o acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 9 de Julho de 2003, Daesang e Sewon Europe/Comissão (T‑230/00, Colect., p. II‑2733, n.° 139), para sustentar que tal tomada em consideração é contrária à jurisprudência. Resulta, contudo, do n.° 139 deste acórdão, expressamente invocado pela Schunk, que este é absolutamente irrelevante para o caso em apreço. Nesse acórdão, o Tribunal considerou que o facto de se «recusar» às recorrentes o benefício da redução prevista na secção C da comunicação sobre a cooperação, e não da secção D como no presente caso, devido a um pedido de informações que lhes tinha sido enviado, violava as condições impostas nessa disposição.

234    Na verdade, decorre da jurisprudência que, como foi anteriormente exposto, a Comissão goza de uma ampla margem de apreciação na valoração da qualidade e da utilidade da cooperação prestada por uma empresa (acórdão de 10 de Maio de 2007, SGL Carbon/Comissão, referido no n.° 153, supra, n.° 88), e, no âmbito de uma apreciação global, pode ter em conta o facto de esta empresa só lhe ter comunicado os documentos após a recepção de um pedido de informações (acórdão LR AF 1998/Comissão, referido no n.° 43, supra, n.° 365, confirmado em recurso pelo acórdão Dansk Rørindustri e o./Comissão, referido no n.° 44, supra, n.° 408), sem, porém, o poder considerar determinante para minimizar a cooperação prestada pela empresa, nos termos da secção D, n.° 2, primeiro travessão, da comunicação sobre a cooperação (acórdão Tokai I, referido no n.° 84, supra, n.° 410). O considerando 328 da decisão obedece a esta jurisprudência.

235    Em todo o caso, decorre da leitura dos considerandos 324 e 328 da decisão que a Comissão tomou em conta, tanto a respeito da Schunk como da LCL, o facto de estas duas empresas terem requerido o benefício da comunicação sobre a cooperação, após a recepção do pedido de informações, e que foram, portanto, objecto, a este respeito, de idêntico tratamento.

236    Por último, cabe referir que a Schunk salienta nos seus articulados algumas observações feitas na decisão pela Comissão a respeito da utilidade relativa das informações fornecidas pela LCL. Na medida em que a Schunk invoca a redução ilegal da coima obtida pela LCL e mesmo supondo que a Comissão tenha concedido indevidamente uma redução a essa empresa através de uma aplicação incorrecta da comunicação sobre a cooperação, há que recordar que o respeito do princípio da igualdade de tratamento se deve conciliar com o respeito do princípio da legalidade, segundo o qual ninguém pode invocar, em seu benefício, uma ilegalidade cometida a favor de terceiro (acórdão Williams/Tribunal de Contas, referido no n.° 203, supra, n.° 14; acórdãos de 14 de Maio de 1998, SCA Holding/Comissão, referido no n.° 203, supra, n.° 160; e LR AF 1998/Comissão, referido no n.° 43, supra, n.° 367).

237    Resulta das precedentes considerações que deve ser rejeitada a alegação relativa à errada apreciação pela Comissão da cooperação das recorrentes e ao tratamento discriminatório relativamente à SGL.

 Quanto ao pedido reconvencional da Comissão

238    A Comissão pede que o Tribunal faça uso da competência de plena jurisdição que lhe conferem os artigos 229.° CE e 17.° do Regulamento n.° 17 e aumente o montante da coima aplicada às recorrentes, as quais contestaram, pela primeira vez, perante o Tribunal os factos expostos na comunicação de acusações. A Schunk contesta a própria possibilidade de a Comissão apresentar um pedido de aumento do montante da coima e, em todo o caso, a sua procedência.

 Quanto à admissibilidade

239    No caso em apreço, o Tribunal conhece de um recurso, interposto pela Schunk nos termos dos artigos 230.° CE e 231.° CE, que tem por objecto, a título principal, a anulação da decisão e, a título subsidiário, a redução do montante da coima aplicada.

240    Há que lembrar que, em conformidade com o artigo 229.° CE, os regulamentos adoptados, nomeadamente pelo Conselho, por força das disposições do Tratado podem atribuir plena jurisdição ao Tribunal de Justiça, no que respeita às sanções neles previstas.

241    Esta competência foi conferida ao juiz comunitário pelo artigo 17.° do Regulamento n.° 17, que prevê que «[o] Tribunal de Justiça decidirá com plena jurisdição, na acepção do artigo [229.° CE] os recursos interpostos das decisões em que tenha sido fixada uma [coima] ou uma [sanção pecuniária compulsória] pela Comissão».

242    O Tribunal de Primeira Instância tem competência para apreciar, no âmbito do poder de plena jurisdição que lhe é reconhecido pelos artigos 229.° CE e 17.° do Regulamento n.° 17, o carácter apropriado do montante das coimas (acórdão do Tribunal de Justiça de 16 de Novembro de 2000, KNP BT/Comissão, C‑248/98 P, Colect., p. I‑9641, n.° 40; e acórdãos Cascades/Comissão, referido no n.° 167, supra, n.° 41, e Weig/Comissão, C‑280/98 P, Colect., p. I‑9757, n.° 41). Com efeito, no âmbito da sua competência de plena jurisdição, os poderes do juiz comunitário não se limitam, como previsto no artigo 231.° CE, à anulação da decisão impugnada, mas permitem‑lhe reformar a sanção por esta aplicada (despacho FNICGV/Comissão, referido no n.° 85, supra, n.° 24).

243    O juiz comunitário está, portanto, habilitado, para além da simples fiscalização da legalidade da sanção, a substituir a apreciação da Comissão pela sua própria apreciação e, deste modo, a anular, reduzir ou aumentar a coima ou sanção pecuniária compulsória aplicada (acórdão do Tribunal de Justiça de 8 de Fevereiro de 2007, Groupe Danone/Comissão, C‑3/06 P, Colect., p. I‑1331, n.° 61).

244    Nestas circunstâncias, embora o exercício da competência de plena jurisdição seja solicitado mais frequentemente pelos recorrentes, no sentido de obterem a redução do montante da coima, nada se opõe a que a Comissão possa igualmente submeter ao juiz comunitário a questão do montante da coima e formular um pedido de aumento do seu montante.

245    De resto, esta possibilidade está expressamente prevista na secção E, n.° 4, da comunicação sobre a cooperação, que dispõe que se «uma empresa, que tenha beneficiado de uma redução da coima por não ter contestado a materialidade dos factos, a vier a contestar pela primeira vez num recurso de anulação perante o Tribunal […], a Comissão solicitará em princípio a este último que aumente o montante da coima aplicada a essa empresa». O pedido apresentado pela Comissão no caso em apreço assenta precisamente nesta disposição.

246    Há ainda que salientar que a competência de plena jurisdição só pode, todavia, ser exercida pelos órgãos jurisdicionais comunitários no âmbito da fiscalização dos actos das instituições comunitárias e, mais particularmente, do recurso de anulação. Com efeito, o artigo 229.° CE tem por único efeito aumentar a extensão dos poderes de que dispõe o juiz comunitário no âmbito do recurso previsto no artigo 230.° CE (despacho FNICGV/Comissão, referido no n.° 85, supra, n.° 25).

247    Donde decorre que a argumentação da Schunk, segundo a qual o pedido de aumento do montante da coima apresentado pela Comissão é incompatível com o artigo 230.° CE e não respeita o objecto do litígio definido na petição, deve ser julgada improcedente.

248    Acresce que o argumento da Schunk de que o pedido anteriormente referido viola o «princípio da boa fé», na medida em que o referido pedido é motivado por comportamentos de que a Comissão já tinha conhecimento no decurso do procedimento administrativo, deve igualmente ser julgado improcedente, pois assenta numa errada leitura dos articulados da Comissão.

249    Efectivamente, como foi exposto, o pedido de aumento do montante da coima é motivado pela atitude da Schunk, que, segundo a Comissão, contesta, pela primeira vez, perante o juiz, os factos anteriormente admitidos durante o procedimento administrativo.

250    Resulta das precedentes considerações que o referido pedido deve ser julgado admissível e que cabe ao Tribunal conhecer do seu mérito.

 Quanto ao mérito

251    Tendo em conta o poder que é conferido ao Tribunal para aumentar o montante de uma coima aplicada nos termos do Regulamento n.° 17, há que determinar se, como sustenta em substância a Comissão, as circunstâncias do presente caso justificam que se suprima a redução de 10% concedida à Schunk com base na sua cooperação, o que conduziria ao aumento do montante final da coima.

252    Nos termos da secção D, n.° 2, segundo travessão, da comunicação sobre a cooperação, uma empresa beneficiará de uma redução da coima se, «após ter recebido a comunicação de acusações, informar a Comissão de que não contesta a materialidade dos factos em que a Comissão baseia as suas acusações».

253    Importa, no caso em apreço, salientar que os pedidos das recorrentes não visam unicamente a redução do montante da coima, mas ainda a anulação da decisão enquanto tal, e que, no âmbito da sua argumentação desenvolvida em apoio das alegações relativas à violação dos princípios da proporcionalidade e da igualdade de tratamento, as recorrentes contestam directamente os factos que lhes foram imputados nas comunicações das acusações e nos quais assenta a conclusão da violação do artigo 81.° CE.

254    Como foi anteriormente exposto, as recorrentes contestaram, pela primeira vez, perante o Tribunal, os acordos sobre a proibição da publicidade, as práticas anticoncorrenciais a respeito dos produtos destinados aos fabricantes de equipamentos para automóveis e dos produtores de bens de consumo e o sistema de controlo da aplicação dos acordos colusórios, os quais, nomeadamente, serviram de base à conclusão, na decisão, da infracção ao artigo 81.° CE.

255    A Comissão alega que as recorrentes também contestaram, pela primeira vez, na petição, a importância do documento reproduzido na folha n.° 9823 dos autos da presente instância (anexo A 21), a respeito dos fabricantes de equipamentos para automóveis e dos produtores de bens de consumo, bem como a respeito dos acordos relativos à exclusão dos concorrentes.

256    O referido documento refere‑se à contestação relativa às práticas anticoncorrenciais a respeito dos produtos destinados aos fabricantes de equipamentos para automóveis e dos produtores de bens de consumo, evocada no n.° 254, supra.

257    Quanto aos acordos relativos à exclusão dos concorrentes, a Comissão refere‑se à alegação das recorrentes relativa à inexistência de um plano global dos membros do cartel destinado a modificar duradouramente a estrutura da concorrência no mercado através da aquisição de empresas, a respeito da qual foi referido que provém de uma leitura manifestamente errada do considerando 173 da decisão e não pode, portanto, ser analisado como uma contestação intempestiva dos factos imputados.

258    Nesta fase, cabe lembrar que as três contestações a que se refere o n.° 254, supra, não foram acolhidas em aplicação da jurisprudência segundo a qual são considerados provados os factos que uma empresa tenha expressamente reconhecido no âmbito do procedimento administrativo, deixando de poder apresentar fundamentos com vista à sua contestação no processo contencioso (acórdão Archer Daniels Midland e Archer Daniels Midland Ingredients/Comissão, referido no n.° 84, supra, n.° 227; acórdão Tokai I, referido no n.° 84, supra, n.° 108; e acórdão Tokai II, referido no n.° 56, supra, n.os 324 e 326).

259    Nestas condições, não há que suprimir a redução mínima de 10% concedida à Schunk, nos termos da secção D, n.° 2, segundo travessão, da comunicação sobre a cooperação, pelo que deve ser julgado improcedente o pedido reconvencional da Comissão (v., neste sentido, acórdão Archer Daniels Midland e Archer Daniels Midland Ingredients/Comissão, referido no n.° 84, supra, n.° 369).

260    Cabe ainda salientar que, nos seus articulados, a Comissão remete para o acórdão Tokai I, referido no n.º 84, supra, no qual o Tribunal julgou procedente um pedido de aumento da coima apresentado pela Comissão, quando, afinal, a argumentação da recorrente não punha em causa factos expressamente admitidos, indicando que a Comissão, contra qualquer expectativa que podia razoavelmente assentar na cooperação objectiva da recorrente durante o procedimento administrativo, se viu obrigada a elaborar e a apresentar perante o Tribunal uma defesa centrada na contestação dos factos constitutivos da infracção, a respeito dos quais tinha considerado de forma juridicamente correcta que a recorrente já não os poderia pôr em causa.

261    Os articulados da Comissão levam a pensar que o que foi declarado num caso em que a argumentação da parte recorrente não punha em causa factos expressamente admitidos deve forçosamente valer num caso, como o presente, em que há contestação intempestiva dos factos admitidos durante o procedimento administrativo.

262    Na verdade, como correctamente salientaram as recorrentes, o artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento n.° 17 prevê que o montante de uma coima só pode ser determinado em função da gravidade e da duração de uma infracção. A circunstância de a Comissão se ter visto obrigada a elaborar uma defesa centrada na contestação de factos a respeito dos quais tinha considerado correctamente que a recorrente já não os poderia pôr em causa não é de natureza a servir de base a um aumento da coima, tendo em conta os dois critérios exclusivos para a determinação do montante desta. Por outras palavras, as despesas suportadas pela Comissão com o processo perante o Tribunal não constituem um critério para a determinação do montante da coima e devem unicamente ser tomadas em consideração no âmbito da aplicação das disposições do Regulamento de Processo relativas ao reembolso das despesas.

263    Tendo em conta tudo o que precede, devem ser rejeitados todos os pedidos apresentados no âmbito do presente recurso.

 Quanto às despesas

264    Por força do disposto no artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo as recorrentes sido vencidas, há que condená‑las nas despesas, em conformidade com o pedido da Comissão.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quinta Secção)

decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      A Schunk GmbH e a Schunk Kohlenstoff‑Technik GmbH são condenadas nas despesas.

Vilaras

Prek

Ciucă

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 8 de Outubro de 2008.

O secretário

 

      O presidente

E. Coulon

 

      M. Vilaras

Índice


Factos na origem do litígio

Tramitação processual e pedidos das partes

Questão de direito

Quanto ao pedido de anulação da decisão

Quanto à excepção de ilegalidade do artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento n.° 17

Quanto à responsabilidade conjunta e solidária da Schunk GmbH e da SKT

Quanto às contestações da infracção

– Considerações preliminares

– Quanto à proibição da publicidade

– Quanto ao fornecimento de blocos de carbono

– Quanto às práticas anticoncorrenciais relativas aos fabricantes de equipamentos para automóveis e aos produtores de bens de consumo

– Quanto à inexistência de um plano global dos participantes no cartel destinado a modificar duradouramente a estrutura da concorrência no mercado através da aquisição de empresas

– Quanto à existência de um mecanismo extremamente sofisticado para controlar e aplicar os acordos em causa

Quanto ao pedido de redução da coima

Quanto à alegada sobrestimação da gravidade da infracção pela Comissão, tendo em conta a sua natureza e os seus efeitos

– Quanto à natureza da infracção

– Quanto aos efeitos da infracção

Quanto à repartição das empresas por categorias

Quanto ao efeito dissuasivo

Quanto à cooperação da Schunk

Quanto ao pedido reconvencional da Comissão

Quanto à admissibilidade

Quanto ao mérito

Quanto às despesas


* Língua do processo: alemão.