Language of document : ECLI:EU:T:2000:20

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Terceira Secção)

27 de Janeiro de 2000 (1)

«Fundo Social Europeu — Acção por omissão — Admissibilidade — Recurso de anulação — Decisão de suspensão de contribuições financeiras — Certificação pelo Estado-Membro — Erro de apreciação dos factos — Confiança legítima — Direitos adquiridos — Segurança jurídica — Proporcionalidade»

Nos processos apensos T-194/97 e T-83/98,

Eugénio Branco, Ld.², sociedade de direito português, com sede em Lisboa (Portugal), representada por B. Belchior, advogado em Vila Nova de Gaia, com domicílio escolhido no Luxemburgo no escritório do advogado J. Schroeder, 6, rue Heine,

demandante,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada, no processo T-194/97, por A. M. Alves Vieira e K. Simonsson e, no processo T-83/98, por M. T. Figueira e K. Simonsson, membros do Serviço Jurídico, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de C. Gómez de la Cruz, membro do Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,

demandada,

que tem por objecto, no processo T-194/97, um pedido de declaração de omissão da demandada consistente numa alegada abstenção ilegal de decidir sobre um pedido de pagamento de saldo de contribuições financeiras concedidas pelo Fundo Social Europeu nos dossiers n.° 870301 P1 e n.° 870302 P3 e, no processo T-83/98, um pedido de anulação das decisões C (1998) 47 e C (1998) 48 da Comissão, de 17 de Fevereiro de 1998, que suspenderam essas contribuições financeiras,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Terceira Secção),

composto por: M. Jaeger, presidente, K. Lenaerts e J. Azizi, juízes,

secretário: A. Mair, administrador

vistos os autos e após as audiências de 8 de Julho de 1999,

profere o presente

Acórdão

Enquadramento jurídico

1.
    O artigo 124.°, primeiro parágrafo, do Tratado CE (actual artigo 147.°, primeiro parágrafo, CE) confia à Comissão a administração do Fundo Social Europeu (FSE).

2.
    Nos termos do artigo 1.°, n.° 2, alínea a), da Decisão 83/516/CEE do Conselho, de 17 de Outubro de 1983, relativa às funções do FSE (JO L 289, p. 38; EE 05 F4 p. 26), este participa no financiamento de acções de formação e orientação profissional. Segundo o artigo 5.°, n.° 1, da mesma decisão, a contribuição do FSE é concedida na base de 50% das despesas elegíveis, sem que, todavia, possa ultrapassar o montante da contribuição financeira das entidades públicas do Estado-Membro em causa.

3.
    O artigo 1.° do Regulamento (CEE) n.° 2950/83 do Conselho, de 17 de Outubro de 1983, que aplica a Decisão 83/516 relativa às funções do FSE (JO L 289, p. 1; EE 05 F4 p. 22, a seguir «Regulamento n.° 2950/83»), enumera as despesas que podem ser objecto de contribuições do FSE.

4.
    A aprovação pelo FSE de um pedido de financiamento implica, nos termos do artigo 5.°, n.° 1, do Regulamento n.° 2950/93, o pagamento, na data prevista para o início da acção de formação, de um adiantamento de 50% da contribuição. Por

força do n.° 4 do mesmo artigo, os pedidos de pagamento de saldo devem incluir um relatório pormenorizado sobre o conteúdo, os resultados e os aspectos financeiros da acção em causa; o Estado-Membro certifica a exactidão factual e contabilística das indicações constantes dos pedidos de pagamento.

5.
    Nos termos do artigo 7.°, n.° 1, do Regulamento n.° 2950/93, tanto a Comissão como o Estado-Membro em causa podem fiscalizar a utilização da contribuição. O artigo 7.° da Decisão 83/673/CEE da Comissão, de 22 de Dezembro de 1983, relativa à gestão do FSE (JO L 377, p. 1; EE 05 F4 p. 52, a seguir «Decisão 83/673»), impõe ao Estado-Membro que efectua um inquérito sobre a utilização de uma contribuição, devido a uma suspeita de irregularidade, que informe desse facto imediatamente a Comissão.

6.
    Finalmente, nos termos do disposto no artigo 6.°, n.° 1, do Regulamento n.° 2950/93, quando a contribuição do FSE não seja utilizada nas condições fixadas pela decisão de aprovação, a Comissão pode suspender, reduzir ou suprimir a contribuição, depois de ter dado ao Estado-Membro em causa a possibilidade de apresentar as suas observações. O n.° 2 do mesmo artigo estabelece que as importâncias pagas que não tenham sido utilizadas nas condições fixadas pela decisão de aprovação dão lugar a restituição, e que, na medida em que paga à Comunidade as importâncias a reembolsar pelos responsáveis financeiros da acção, o Estado-Membro fica subrogado nos direitos da Comunidade.

Matéria de facto e tramitação processual

7.
    A demandada aprovou, por decisões notificadas à demandante pelo Departamento para os Assuntos do FSE (a seguir «DAFSE») respectivamente em 31 de Abril e em 27 de Maio de 1987, duas contribuições financeiras de 11 736 792 PTE (dossier n.° 870302 P3) e de 82 700 897 PTE (dossier n.° 870301 P1) destinadas a acções de formação.

8.
    Em 24 de Julho de 1987, em aplicação do artigo 5.°, n.° 1, do Regulamento n.° 2950/93, a demandante recebeu um adiantamento.

9.
    No início de Julho de 1988, isto é, depois de estarem concluídas as acções de formação, que decorreram de 1 de Janeiro a 31 de Dezembro de 1987, a demandante apresentou ao DAFSE pedidos de pagamento do saldo das contribuições.

10.
    O DAFSE certificou a exactidão factual e contabilística das indicações constantes desses pedidos, nos termos do disposto no artigo 5.°, n.° 4, do Regulamento n.° 2950/93.

11.
    Em 22 de Agosto de 1988, o DAFSE pediu à Inspecção-Geral de Finanças (a seguir «IGF») que efectuasse uma auditoria em relação com o pedido de

pagamento de saldo, nos termos previstos pelo n.° 1 do artigo 7.° do Regulamento n.° 2950/93.

12.
    Tendo a IGF detectado irregularidades, o DAFSE informou a demandada, por dois ofícios datados de 24 de Abril de 1989, de que suspendera o pagamento do saldo, nos termos do artigo 7.° da Decisão 83/673.

13.
    Em 16 de Maio de 1989, a IGF remeteu o seu relatório, para conhecimento, à Polícia Judiciária.

14.
    Em 30 de Julho de 1990, o DAFSE informou a Comissão de que, sem prejuízo do comunicado pelos ofícios de 24 de Abril de 1989 e na sequência das auditorias efectuadas pela IGF, considerava não elegíveis determinadas despesas. Nesta data, a demandada teve conhecimento da auditoria da IGF e das conclusões desta.

15.
    Por ofícios do mesmo dia, recebidos no dia seguinte, o DAFSE exigiu à demandante que lhe restituísse no prazo de dez dias os adiantamentos de 1 535 946 PTE (dossier n.° 870302 P3), 4 399 475 PTE (dossier n.° 870301 P1) pagos pelo FSE, bem como de 1 256 683 PTE (dossier n.° 870302 P3) e de 3 599 570 PTE (dossier n.° 870301 P1), pagos pelo Estado português a título da contribuição nacional.

16.
    Por carta de 12 de Maio de 1994, a demandante pediu ao DAFSE que a informasse dos motivos por que a demandada não tinha ainda tomado qualquer decisão sobre esses dossiers.

17.
    Por ofício de 25 de Maio de 1994, o DAFSE explicou à demandante que a Comissão entendia não ter que tomar uma decisão de redução da contribuição ou de não pagamento do saldo quando, como acontecia no caso, a autoridade nacional tinha ela própria decidido reduzir a contribuição.

18.
    Por carta de 30 de Maio de 1994, a demandante perguntou à demandada por que razão não tinha ainda tomado uma decisão final sobre os seus dossiers.

19.
    Por ofício de 16 de Junho de 1994, a demandada respondeu que as autoridades portuguesas a tinham informado, nos termos do artigo 7.° da Decisão 83/673, que os dossiers em causa eram objecto de uma auditoria devido a suspeitas de irregularidades.

20.
    Por petição de recurso de 22 de Julho de 1994, a ora demandante pediu neste Tribunal a anulação de uma decisão alegadamente tomada pela Comissão e notificada por ofícios do DAFSE e da Comissão, datados respectivamente de 25 de Maio de 1994 e de 16 de Junho de 1994, que, por um lado, teria indeferido um pedido de pagamento de saldo das contribuições financeiras concedidas pelo FSE para dois programas de formação e, por outro, teria reduzido essas contribuições

financeiras, e exigido a restituição de adiantamentos pagos pelo FSE e pelo Estado português.

21.
    Por acórdão de 11 de Julho de 1996, Branco/Comissão (T-271/94, Colect., p. II-749), o Tribunal julgou o recurso inadmissível, entendendo que a Comissão não tinha decidido sobre o pedido de pagamento do saldo.

22.
    Em 25 de Outubro de 1996, a demandada foi notificada da abertura de um processo de inquérito no Tribunal de Instrução Criminal da comarca do Porto por desvio de subsídios e fraude na obtenção de subsídios, relacionado com as acções de formação financiadas pelo FSE.

23.
    Por carta de 27 de Fevereiro de 1997, que deu entrada nos serviços da Comissão em 3 de Março de 1997, a demandante interpelou a Comissão convidando-a a tomar uma decisão sobre o pedido de pagamento de saldo.

24.
    Em 17 de Abril de 1997, a demandada enviou ao DAFSE, em relação a cada um dos dossiers em causa, um projecto de decisão de suspensão da contribuição.

25.
    Em 5 de Maio de 1997, a demandante recebeu cópia desses projectos através do DAFSE.

26.
    Em 19 de Maio de 1997, o DAFSE recebeu as observações da demandante sobre os projectos em causa, observações que foram melhor precisadas e rectificadas pela demandante numa carta de 21 de Maio de 1997 dirigida a este mesmo organismo.

27.
    Por petição que deu entrada na Secretaria do Tribunal em 30 de Junho de 1997, a demandante intentou a acção por omissão. O processo foi registado sob o número T-194/97.

28.
    Em 17 de Julho de 1997, o DAFSE informou a Comissão que estava plenamente de acordo com os projectos de decisão de suspensão das contribuições.

29.
    Em 1 de Outubro de 1997, em requerimento separado, a demandada levantou uma questão prévia de inadmissibilidade da acção por omissão, ao abrigo do artigo 114.°, n.° 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância. A demandante apresentou as suas observações sobre esta questão em 19 de Novembro de 1997.

30.
    Em 26 de Novembro de 1997, a Comissão teve conhecimento do despacho de acusação das autoridades judiciárias portuguesas contra a demandante.

31.
    Em 17 de Fevereiro de 1998, a Comissão aprovou as decisões de suspensão das contribuições financeiras em questão.

32.
    Em 26 de Maio de 1998, a demandante interpôs um recurso de anulação das decisões de suspensão das contribuições financeiras de 17 de Fevereiro de 1998. O processo foi registado sob o n.° T-83/98.

33.
    Por despacho de 16 de Julho de 1998, o presidente da Quinta Secção decidiu remeter para final a decisão quanto à inadmissibilidade levantada no processo T-194/97.

34.
    No quadro dos processos T-194/97 e T-83/98, o Tribunal fez perguntas às partes, por escrito, a que estas responderam nos prazos estabelecidos.

35.
    Com base no relatório preliminar do juiz relator, o Tribunal de Primeira Instância (Terceira Secção) deu início à fase oral em cada um dos processos. Foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às perguntas do Tribunal nas audiências de 8 de Julho de 1999.

36.
    Nas audiências em causa, as partes declararam-se de acordo com a apensação dos dois processos para efeitos do acórdão.

Pedidos das partes

37.
    No processo T-194/97, a demandante conclui pedindo que o Tribunal se digne:

—    declarar verificada a abstenção de decisão da Comissão;

—    condenar a Comissão nas despesas.

38.
    A demandada conclui pedindo que o Tribunal se digne:

—    declarar a acção inadmissível ou absolvê-la da instância por falta de objecto ou, a título subsidiário, julgar a acção improcedente;

—    condenar a demandante nas despesas.

39.
    A demandante pede que a questão prévia de inadmissibilidade suscitada seja julgada improcedente.

40.
    No processo T-83/98, a aqui recorrente pede que o Tribunal se digne:

—    anular as decisões de suspensão das contribuições financeiras, de 17 de Fevereiro de 1998;

—    condenar a Comissão nas despesas.

41.
    A Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne:

—    rejeitar o recurso;

—    condenar a recorrente nas despesas.

A acção por omissão

Argumentação das partes

42.
    Em primeiro lugar, a demandante sublinha que interpelou a demandada, convidando-a a tomar posição, por carta de 27 de Fevereiro de 1997, que esta recebeu em 3 de Março do mesmo ano. Alega que os projectos de decisões de suspensão das contribuições, enviados ao DAFSE em 17 de Abril de 1997, só lhe foram comunicados em 5 de Maio de 1997, data em que o prazo de dois meses previsto no artigo 175.°, segundo parágrafo, do Tratado CE (actual artigo 232.°, segundo parágrafo, CE) já tinha expirado.

43.
    Sustenta, em segundo lugar, que nem os projectos de decisões de suspensão de 17 de Abril de 1997 nem as decisões de suspensão de 17 de Fevereiro de 1998 constituem uma tomada de posição na acepção do artigo 175.° do Tratado, visto que a omissão subsiste. Com efeito, tendo em conta o prazo de quase dez anos transcorrido desde o pedido de pagamento do saldo até à aprovação das decisões, a demandante considera que a demandada estava obrigada a tomar uma decisão final, isto é, uma decisão de pagamento do saldo, de supressão das contribuições ou de redução destas.

44.
    Caso contrário, a demandada poderia deixar eternizar-se o procedimento administrativo e, desse modo, protelar indefinidamente a adopção da decisão final sobre o pedido de pagamento de saldo.

45.
    A alegada existência de uma acção penal num tribunal português não teria qualquer relevância para efeitos do presente processo. Primeiro, porque é aberto um inquérito de cada vez que uma auditoria conclui pela existência de indícios de irregularidades, e este inquérito não desemboca forçosamente num julgamento penal. Além disso, neste processo só estariam em causa os dados constantes do relatório da auditoria da IGF, de que a demandada já tinha conhecimento. Por último, esta última teria admitido ela própria só ter tido conhecimento deste processo em 26 de Fevereiro de 1997, data em que já estaria em falta há muito tempo.

46.
    A demandada invoca inadmissibilidade da acção, sublinhando que tomou posição, na acepção do artigo 175.° do Tratado, quando enviou ao DAFSE, em 17 de Abril de 1997, os projectos de decisão de suspensão das contribuições e quando adoptou, em 17 de Fevereiro de 1998, as decisões de suspensão dessas mesmas contribuições. Estas decisões seriam justificadas pela abertura de uma acção penal ligada aos dossiers litigiosos, actualmente pendente no Tribunal de Instrução

Criminal da comarca do Porto (n.° 17937/95 — OTDPRT-PR), e no quadro da qual a demandante foi acusada de fraude em 2 de Abril de 1997.

Apreciação do Tribunal

47.
    Para decidir sobre o pedido na acção por omissão, há que verificar se, no momento em que a Comissão foi interpelada nos termos do disposto no artigo 175.° do Tratado, recaía sobre a instituição uma obrigação de agir.

48.
    Nos termos do artigo 6.°, n.° 1, do Regulamento n.° 2950/93, quando a contribuição do FSE não for utilizada nas condições fixadas pela decisão de aprovação, a Comissão pode suspender, reduzir ou suprimir a contribuição.

49.
    Tendo o legislador comunitário distinguido estas três possibilidades de acção da Comissão, há que considerar que cada uma delas se refere a eventualidades diferentes. Sendo da competência da Comissão decidir sobre os pedidos de pagamento de saldo [acórdão do Tribunal de Primeira Instância, de 13 de Dezembro de 1995, Comissão/Branco, T-85/94 (122), Colect., p. II-2993, n.° 23] num prazo razoável, mas não lhe sendo possível calcular o montante exacto das despesas elegíveis se não depois de ter recebido um relatório detalhado da acção realizada (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 14 de Julho de 1997, Interhotel/Comissão, T-81/95, Colect., p. II-1265, n.° 43 e acórdão aí citado), a decisão de suspensão só pode ser tomada nos casos em que esse cálculo ainda não é possível.

50.
    O fim visado pela atribuição à Comissão da faculdade de suspender uma contribuição financeira do FSE é, portanto, o de permitir a suspensão do pagamento do saldo enquanto a Comissão tiver razões sérias para suspeitar da existência de irregularidades na utilização dessa contribuição, mantendo-se, porém, a obrigação da Comissão de tomar, num prazo razoável, uma decisão final sobre o pedido de pagamento de saldo, quer ordenando o seu pagamento integral, quer reduzindo ou suprimindo essa contribuição. Esta suspensão permite evitar um eventual novo processo para recuperação dos montantes indevidamente pagos. Com efeito, se a decisão final for a de suprimir as contribuições, quando já foram pagos adiantamentos ao beneficiário dessas contribuições, ter-se-á necessariamente que iniciar um processo de recuperação dos montantes pagos.

51.
    Tendo a Comissão, no presente caso, dúvidas sérias quanto à regularidade da utilização das contribuições na sequência do relatório da IGF, por um lado, e estando em curso uma acção num tribunal penal português contra o beneficiário das contribuições a respeito de certas operações efectuadas no quadro dos projectos financiados, no momento em que a Comissão foi interpelada, por outro, esta não estava obrigada a tomar uma decisão final quanto ao pedido de pagamento de saldo e podia legitimamente suspender as contribuições, nos termos do artigo 6.°, n.° 1, do Regulamento n.° 2950/93.

52.
    A demandante convidou a Comissão, por carta datada de 27 de Fevereiro de 1997 e recebida pela Comissão em 3 de Março de 1997, a aprovar o pedido de pagamento de saldo. Na sequência desta interpelação para agir, a demandada enviou ao DAFSE projectos de decisões de suspensão das contribuições em 17 de Abril de 1997 e adoptou as decisões de suspensão em 17 de Fevereiro de 1998.

53.
    Note-se que, nos termos do artigo 6.°, n.° 1, do Regulamento n.° 2950/93, a Comissão só pode suspender uma contribuição financeira depois de ter dado ao Estado-Membro em causa oportunidade de apresentar as suas observações. Por outro lado, a circunstância de, nos termos dessa disposição, o Estado-Membro em causa dever ser previamente consultado antes de a Comissão adoptar uma decisão de suspensão, redução ou supressão não permite concluir pela não aplicação de um princípio de direito comunitário tão fundamental como o que garante a qualquer pessoa o direito de ser ouvida antes da adopção de uma decisão susceptível de o lesar (acórdão do Tribunal de Justiça de 24 de Outubro de 1996, Comissão/Lisrestal e o., C-32/95 P, Colect., p. I-5373, n.° 30). Ora, uma decisão de suspensão de contribuição priva, pelo menos provisoriamente, o interessado da totalidade da contribuição que lhe tinha sido inicialmente concedida. Sofre, assim, directamente, as consequências económicas de uma decisão que o lesa e deve, consequentemente, ser-lhe reconhecido o direito de apresentar as suas observações antes da adopção de uma decisão de suspensão dessa contribuição.

54.
    Daqui decorre que a Comissão só pode tomar decisões de suspensão no termo de um processo que comporta várias fases, sendo uma delas constituída pelo envio dos projectos de decisão de suspensão tanto ao Estado-Membro em causa como ao beneficiário das contribuições. Se esses projectos, como medidas interlocutórias cujo objectivo é preparar decisões, não são susceptíveis de ser objecto de recurso de anulação (v., num contexto diferente, o acórdão do Tribunal de Justiça de 18 de Março de 1997, Guérin automobiles/Comissão, C-282/95, Colect., p. I-1503, n.° 34 e acórdão aí citado), constituem, no entanto, tomadas de posição que põem termo à omissão. Esses projectos garantem o respeito dos direitos da defesa do beneficiário da contribuição e do Estado-Membro em causa no quadro de um processo que pode levar a decisões de suspensão da contribuição, que são, estas sim, susceptíveis de ser objecto de recurso de anulação. Através desses projectos, a demandada deu, portanto, a conhecer a sua intenção de adoptar decisões de suspensão, exprimindo implicitamente a sua recusa de aprovar, pelo menos provisoriamente, o pedido de pagamento do saldo.

55.
    Para apreciar se a instituição interpelada a agir tomou posição no prazo de dois meses fixado no artigo 175.°, segundo parágrafo, do Tratado, há que verificar se a posição tomada pela instituição foi dada a conhecer ao autor da interpelação no prazo de dois meses seguintes à recepção pela instituição dessa interpelação. Com efeito, esta tomada de posição tem precisamente como objectivo responder ao convite para agir e dar a conhecer esta resposta à pessoa que está na origem da interpelação. Altera a posição jurídica desta, porque põe termo à omissão. Ora,

para poder defender os seus direitos no procedimento administrativo, na sequência da tomada de posição da instituição, o interessado deve ter sido notificado para tomar conhecimento do seu conteúdo. Por conseguinte, a omissão deixa de existir não no dia em que a instituição toma efectivamente posição mas na data da recepção dessa tomada de posição pelo autor da interpelação. É esta última data que se deve, portanto, ter em consideração para apreciar se o prazo de dois meses imposto pelo artigo 175.°, segundo parágrafo, do Tratado CE foi respeitado.

56.
    Tendo a demandada recebido a interpelação para agir em 3 de Março de 1997 e só tendo os projectos de decisão de suspensão das contribuições sido comunicados à demandante em 5 de Maio de 1997, o prazo de dois meses previsto no artigo 175.°, segundo parágrafo, do Tratado não foi respeitado.

57.
    Porém, há que constatar que a demandante só intentou a acção por omissão em 30 de Junho de 1997, depois de ter recebido os referidos projectos de decisão. Devendo estes ser considerados como tomadas de posição, para efeitos do artigo 175.° do Tratado, a demandante já não (v. supra, n.° 54), a demandante já não tinha interesse em obter a declaração da omissão, visto que esta tinha cessado. Com efeito, um acórdão do Tribunal que, num caso destes, declarasse verificada a abstenção da instituição não poderia levar a que fossem tomadas as medidas de execução previstas no artigo 176.°, primeiro parágrafo, do Tratado (actual artigo 233.°, primeiro parágrafo, CE). (v., a respeito de um recurso de anulação, o despacho de 13 de Junho de 1997, TEAM e Kolprojekt/Comissão, T-13/96, Colect., p. II-983, n.° 28).

58.
    Resulta de quanto precede que a acção por omissão é inadmissível (acórdão de 1 de Abril de 1993, Pesqueras Echebastar/Comissão, C-25/91, Colect., p. I-1719, n.os 11 a 13).

Quanto ao recurso de anulação

59.
    A demandante invoca cinco fundamentos de anulação, baseados, em primeiro lugar, em violação do Regulamento n.° 2950/83, em segundo lugar, em erro de apreciação dos factos, em terceiro lugar, em violação dos princípios da protecção da confiança legítima e da segurança jurídica, em quarto lugar, em violação de direitos adquiridos e, finalmente, em violação do princípio da proporcionalidade.

Quanto ao primeiro fundamento baseado em violação do Regulamento n.° 2950/83

Argumentação das partes

60.
    A demandante refere que, durante o mês de Outubro de 1988, o DAFSE certificou, nos termos do disposto no artigo 5.°, n.° 4, do Regulamento n.° 2950/93, a exactidão factual e contabilística das indicações constantes do seu pedido de pagamento de saldo. Ora, após a transmissão desta certificação à Comissão, qualquer intervenção do Estado-Membro em causa no tratamento do dossier

carece de fundamento legal. Com efeito, a regulamentação aplicável, e mais especificamente o Regulamento n.° 2950/83, não prevê a possibilidade de este último proceder a uma «reanálise» do dossier e de alterar a certificação, como o fez o DAFSE no presente caso.

61.
    O Estado-Membro devia analisar se existiam irregularidades antes de elaborar o acto de certificação. Caso contrário, efectuaria uma certificação falsa. Tendo-lhe sido apresentado um pedido de pagamento de saldo, o DAFSE só poderia ter tomado uma das duas decisões seguintes: concluir pela autenticidade dos elementos apresentados e certificá-los, ou verificar a sua inexactidão e, neste caso, recusar a certificação. Ao certificar o pedido de pagamento de saldo, o DAFSE aprovou assim definitivamente as indicações contidas neste pedido.

62.
    A demandante observa, finalmente, que a reanálise acima referida foi realizada pela IGF, a qual não está habilitada a controlar as acções financiadas pelo FSE nem está tecnicamente em condições de se pronunciar sobre a aplicação da regulamentação comunitária.

63.
    A Comissão contesta a argumentação da demandante, referindo-se ao acórdão de 15 de Setembro de 1998, Branco/Comissão (T-142/97, Colect., p. II-3567).

Apreciação do Tribunal

64.
    Ao confirmar a exactidão factual e contabilística das indicações contidas nos pedidos de pagamento de saldo, o Estado-Membro assume a responsabilidade perante a Comissão das certificações que efectua.

65.
    Além disso, nos termos do artigo 2.°, n.° 2, da Decisão 83/516, os Estados-Membros interessados devem garantir a boa execução das acções financiadas pelo FSE. Por outro lado, nos termos do artigo 7.°, n.° 1, do Regulamento n.° 2950/83, a Comissão pode proceder a verificações dos pedidos de pagamento de saldo, «sem prejuízo do controlo efectuado pelos Estados-Membros».

66.
    Terá que se constatar que essas obrigações e poderes dos Estados-Membros não estão limitados por qualquer restrição temporal.

67.
    Em consequência, num caso como o vertente, em que o Estado-Membro já certificou a exactidão factual e contabilística dos elementos constantes do pedido de pagamento de saldo, o referido Estado pode ainda alterar a sua apreciação, quando considerar que foi confrontado com irregularidades que não se tinham revelado anteriormente.

68.
    Finalmente, nada se opõe a que uma autoridade como o DAFSE recorra a um organismo especializado em auditorias contabilísticas e financeiras, como a IGF,

a fim de o auxiliar a controlar a exactidão factual e contabilística das indicações contidas num pedido de pagamento de saldo.

69.
    Resulta do que antecede que o fundamento baseado em violação do Regulamento n.° 2950/83 é improcedente (acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 16 de Julho de 1998, Proderec/Comissão, T-72/97, Colect., p. II-2847, n.os 61 a 74, e Branco/Comissão, já referido no n.° 63 supra, n.os 44 a 50).

Quanto ao segundo fundamento, baseado em erro na apreciação dos factos

Argumentação das partes

70.
    A demandante afirma ter respeitado rigorosamente as disposições do Regulamento n.° 2950/93 e as condições de utilização das contribuições impostas pela Comissão nas decisões de aprovação. Não existiria qualquer razão para «reduzir» as contribuições concedidas.

71.
    O relatório da IGF em que se baseiam as decisões impugnadas estaria errado e limitar-se-ia a fazer conjecturas quanto à inelegibilidade de determinadas despesas a propósito da taxa horária da remuneração dos formandos, da subcontratação da empresa E.B. — Contabilidade e Estudos Económicos, Ld², das amortizações e do equipamento informático objecto de um contrato de leasing.

72.
    Segundo a demandada, a argumentação da demandante é totalmente desprovida de objecto, uma vez que a Comissão ainda não adoptou nenhuma decisão definitiva, visto que as decisões impugnadas só se pronunciaram sobre a suspensão das contribuições. A Comissão refuta, no entanto, a argumentação da demandante com base nos elementos constantes do relatório da IGF.

Apreciação do Tribunal

73.
    Nos termos do artigo 6.°, n.° 1, do Regulamento n.° 2950/83, quando uma contribuição do FSE não for utilizada nas condições fixadas pela decisão de aprovação, a Comissão pode suspender, reduzir ou suprimir essa contribuição.

74.
    Resulta, por outro lado, das declarações de aceitação das decisões de aprovação que o beneficiário das contribuições se comprometeu expressamente a respeitar, na utilização dessas contribuições, as disposições nacionais e comunitárias aplicáveis.

75.
    Neste contexto, dado que tanto o direito português como o direito comunitário fazem depender a utilização dos fundos públicos de uma exigência de boa gestão financeira, a Comissão pode suspender, reduzir ou suprimir uma contribuição do FSE quando esta não foi utilizada em conformidade com esta exigência (v. supra, n.os 48 a 50).

76.
    A aplicação do artigo 6.°, n.° 1, do Regulamento n.° 2950/83 pode implicar a necessidade de proceder a uma avaliação de situações factuais e contabilísticas complexas, para a qual a instituição dispõe de um largo poder de apreciação. A fiscalização pelo Tribunal dessas avaliações deve limitar-se à verificação da observância das regras processuais, à exactidão dos factos considerados para efectuar a escolha contestada, à inexistência de erro manifesto de apreciação desses factos ou à inexistência de desvio de poder (acórdão Branco/Comissão, já referido no n.° 63 supra, n.os 64 a 67).

77.
    Como a fiscalização da legalidade incide, no presente caso, sobre decisões de suspensão da contribuição, não há que examinar se as apreciações constantes do relatório da IGF são fundadas, mas sim, se a Comissão cometeu um erro manifesto de apreciação ao considerar que existiam indícios de irregularidades susceptíveis de justificar essa suspensão. Portanto, mesmo que se admita que algumas apreciações constantes do relatório da IGF em que as decisões impugnadas se basearam são falsas, estas decisões não ficariam, só por esse facto, feridas de erro manifesto de apreciação.

78.
    A condição de que existam indícios de irregularidades para justificar uma suspensão da contribuição está manifestamente satisfeita quando, como acontece no presente caso, um acção intentada contra o beneficiário das contribuições respeitante a determinadas operações realizadas no quadro das acções financiadas pelo FSE se encontra pendente num tribunal penal, no momento em que são adoptadas as decisões de suspensão.

79.
    Este fundamento não merece, pois, acolhimento.

Quanto ao terceiro fundamento, baseado em violação dos princípios da protecção da confiança legítima e da segurança jurídica

Argumentação das partes

80.
    A demandante alega que o DAFSE transmitiu o seu pedido de pagamento de saldo à Comissão logo no mês de Outubro de 1988 e que esta só tomou as decisões impugnadas em Fevereiro de 1998. Este prazo de quase dez anos teria criado na esfera da demandante uma confiança legítima na aprovação pela Comissão do seu pedido, tal como este fora certificado pelo DAFSE.

81.
    A demandante sublinha que a Comissão deve tomar qualquer decisão num prazo razoável. Não pode deixar arrastar indefinidamente o processo e protelar indefinidamente a decisão final sobre o pedido de pagamento de saldo, sob pena de violar os princípios da protecção da confiança legítima e da segurança jurídica.

82.
    No presente caso, o prazo de dez anos transcorrido desde o pedido de pagamento de saldo até à adopção das decisões impugnadas seria excessivamente longo e violaria o princípio da segurança jurídica.

83.
    Segundo a demandante, a demandada estava obrigada a adoptar uma decisão final de pagamento do saldo, de supressão ou de redução das contribuições, em vez de as suspender, o que, na prática, já acontecia há vários anos (v. supra, n.° 43).

84.
    A invocação da pendência de uma acção penal num tribunal português seria irrelevante no presente caso (v. supra, n.° 45). Aliás, ao referir-se ao despacho de acusação, cuja cópia juntou como anexo 4 à contestação, a demandada estaria a infringir o segredo de justiça. Este documento deve, portanto, ser desentranhado do processo, segundo a demandante.

85.
    A demandada conclui pedindo a rejeição deste fundamento. A suspensão das contribuições justificar-se-ia pela abertura de um processo penal respeitante aos dossiers em discussão, que se encontra pendente, e no qual foi proferido contra a demandante despacho de acusação por fraude em 2 de Abril de 1997.

86.
    A Comissão acrescenta que, mesmo que se admitisse que a certificação pelo DAFSE tinha criado, para a demandante, uma confiança legítima no pagamentodo saldo, as decisões impugnadas não a privam desse direito, dado que se limitam a suspender a contribuição.

Apreciação do Tribunal

87.
    A suspensão de uma contribuição financeira inicialmente concedida não prejudica em nada a decisão final a adoptar pela Comissão sobre o pedido de pagamento do saldo. Por conseguinte, uma decisão de suspensão não priva o beneficiário da contribuição do direito de receber o montante integral do saldo, nos termos do seu pedido, se se apurar que a contribuição foi efectivamente utilizada em conformidade com as condições fixadas na decisão de aprovação.

88.
    As decisões impugnadas não são, portanto, susceptíveis de violar o princípio da confiança legítima.

89.
    A demandante invoca igualmente violação do princípio da segurança jurídica, por ter sido excedido o prazo razoável para a tomada das decisões em causa. O carácter razoável deste prazo deve ser apreciado, no presente caso, em função do tempo transcorrido entre a prolação do acórdão Comissão/Branco, já referido no n.° 49 supra, n.° 23, e a adopção das decisões impugnadas, em 17 de Fevereiro de 1998. Com efeito, no seu acórdão de 13 de Dezembro de 1995, o Tribunal declarou claramente que é a Comissão que decide sobre os pedidos de pagamento do saldo e é a ela — e apenas a ela — que cabe o poder de reduzir uma contribuição financeira do FSE, nos termos do artigo 6.°, n.° 1, do Regulamento n.° 2950/93. A partir dessa data, a Comissão não podia ignorar que lhe competia decidir, ao

abrigo de uma competência exclusiva, sobre os pedidos de pagamento de saldo que lhe tinham sido apresentados, quer ordenando o pagamento integral desse saldo, quer adoptando decisões de suspensão, redução ou supressão da contribuição.

90.
    Atendendo à existência de indícios de irregularidades na utilização das contribuições concedidas e ao facto de não dispor de informações suficientes para calcular o montante exacto das despesas elegíveis em 13 de Dezembro de 1995, a Comissão podia e devia ter preparado rapidamente projectos de decisão de suspensão das contribuições. Ora, a demandada só enviou esses projectos ao DAFSE em 17 de Abril de 1997, quando a sua elaboração não exigia um trabalho de grande envergadura nem um longo processo. Em consequência, o prazo de mais de dezasseis meses transcorrido entre a prolação do acórdão de 13 de Dezembro de 1995, já referido, e o envio desses projectos é excessivo.

91.
    Se o facto de o prazo razoável ser excedido pode, em certas circunstâncias, levar à anulação de uma decisão, já o mesmo não pode acontecer no caso de um recurso de anulação contra decisões de suspensão da contribuição. Com efeito, se estas fossem anuladas unicamente devido ao facto de serem tardias, a demandada só poderia, porque continua a não dispor de todos os elementos que lhe permitam calcular as despesas elegíveis, adoptar novas decisões de suspensão das contribuições, nos termos do artigo 176.° do Tratado. Nestas circunstâncias, uma decisão de anulação seria destituída de qualquer utilidade. Daqui resulta que não se justifica a anulação das decisões impugnadas por violação do princípio da segurança jurídica resultante de ter sido excedido o prazo razoável para a adopção dessas decisões.

Quanto ao quarto fundamento, baseado em violação dos direitos adquiridos

Argumentação das partes

92.
    Referindo-se às conclusões do advogado-geral, M. Darmon, no processo Interhotel/Comissão, em que foi proferido acórdão em 7 de Maio de 1991 (C-291/89, Colect., p. I-2257), a demandante sustenta que as decisões de aprovação dos pedidos de contribuição criaram, na sua esfera jurídica, direitos subjectivos e, mais precisamente, o direito de exigir o pagamento integral das contribuições.

93.
    A Comissão contesta a argumentação da demandante, referindo-se ao acórdão Branco/Comissão, já referido no n.° 63 supra, n.os 97 e 105 a 107).

Apreciação do Tribunal

94.
    Embora seja certo que uma decisão de aprovação cria na esfera do beneficiário de uma contribuição do FSE o direito de exigir o pagamento da contribuição, tal só pode acontecer na hipótese de a contribuição ter sido utilizada em conformidade com as condições fixadas pelas decisões de aprovação.

95.
    No presente caso, existem sérios indícios de irregularidades que apontam para a não observância dessas condições pela demandante, situação esta que justifica a suspensão das contribuições.

96.
    As decisões de suspensão não prejudicam a decisão final da demandada sobre o pedido de pagamento de saldo, não privam a demandante do direito de receber o montante integral do saldo nos termos do seu pedido, se se apurar que as contribuições foram rigorosamente utilizadas em conformidade com as condições fixadas nas decisões de aprovação.

97.
    Daqui resulta que o fundamento baseado em violação de direitos adquiridos deve ser rejeitado.

Quanto ao quinto fundamento, baseado em violação do princípio da proporcionalidade

Argumentação das partes

98.
    Segundo a demandante, a demandada violou o princípio da proporcionalidade, porque não cumpriu o compromisso por ela assumido de reembolsar, em execução das decisões de aprovação, as despesas efectuadas pela demandante no quadro das acções de formação realizadas.

99.
    A Comissão objecta que, tendo em conta, por um lado, as dúvidas expressas pelas autoridades portuguesas, logo desde 1989, sobre a regularidade de determinadas operações realizadas pela demandante no quadro das referidas acções e, por outro, o processo penal pendente, qualquer outra decisão que não a suspensão seria prematura.

Apreciação do Tribunal

100.
    No presente caso as suspensões decididas pela Comissão estão directamente ligadas aos sérios indícios de irregularidades que lhe foram comunicados pelas autoridades portuguesas logo desde 1989 e não prejudicam a decisão final a adoptar sobre o pedido de pagamento do saldo.

101.
    Estas suspensões são, portanto, conformes ao princípio da proporcionalidade.

102.
    Daqui resulta que o fundamento baseado em violação do princípio da proporcionalidade deve ser rejeitado.

103.
    Resulta de quanto precede que o recurso de anulação deve ser rejeitado na íntegra.

Quanto às despesas

104.
    Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas, se tal tiver sido requerido. No presente caso, a demandante foi vencida e a demandada pediu a sua condenação nas despesas.

105.
    O Tribunal entende, porém, que se devem ter em conta, para decidir sobre as despesas, os desenvolvimentos do processo que levaram à adopção das decisões impugnadas, tal como foram descritos acima, designadamente nos n.os 56 e 91, e que colocaram a demandante numa situação de incerteza quanto ao pagamento das contribuições financeiras que lhe tinham sido concedidas. Nestas circunstâncias, não se pode criticar a demandante por ter recorrido a este Tribunal, pedindo-lhe que apreciasse o comportamento da Comissão e que daí tirasse as necessárias ilações. Há assim que reconhecer que o comportamento da demandada favoreceu o surgimento do litígio.

106.
    Ora, o artigo 87.°, n.° 3, primeiro e segundo parágrafos, do Regulamento de Processo, prevêem que o Tribunal pode condenar uma parte, mesmo vencedora, a pagar à outra as despesas ocasionadas por um processo suscitado pelo seu próprio comportamento (acórdão Interhotel/Comissão, já referido no n.° 49 supra, n.° 82).

107.
    Em consequência, há que condenar a Comissão a suportar, além das suas próprias despesas, 10% das despesas da demandante.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Terceira Secção),

decide:

1)    Os processos T-194/97 e T-83/98 são apensos para efeitos de acórdão.

2)    A acção por omissão com o número de processo T-194/97 é inadmissível.

3)    O recurso de anulação com o número de processo T-83/98 é rejeitado.

4)    A demandada é condenada a suportar, além das suas próprias despesas, 10% das despesas da demandante.

Jaeger
Lenaerts
Azizi

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 27 de Janeiro de 2000.

O secretário

O presidente

H. Jung

K. Lenaerts


1: Língua do processo: português.